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CURSO DE PSICOLOGIA
Profa. Msc. Roberta da Costa Borges
Referência:
século XX, e também devido à sua contribuição para a compreensão do existir humano
Guerra Mundial, os homens tiveram seus valores tradicionais e o orgulho por sua
é uma constante interrogação a este respeito, por isso, acreditamos ser essa opção muito
pertinente para nosso estudo, em função da natureza do fenômeno por nós indagado:
de filhos e filhas. E ainda por considerarmos o homem como ser intencional, possuindo
Heidegger, tanto em suas obras quanto de outros autores que se fundamentaram em suas
existir humano. A metodologia descrita em todo este capítulo deve considerar esses
aspectos.
revela, o que se mostra em si mesmo [...] ‘os fenômenos’ constituem a totalidade do que
Sobre logos diz: “logos deixa ver e faz ver (phainestai) aquilo sobre o que se
discorre e o faz para quem discorre (...) e para todos aqueles que discursam com os
revelação do que trata o discurso. O sentido mais fundo de logos é deixar que algo
apareça.
fenomenologia significa deixar que as coisas se manifestem como são, sem que
uma inversão de orientação a que estamos acostumados; não somos nós que indicamos
objetos ou seres da vida cotidiana com os quais nos defrontamos e o próprio mundo que
os contém. Ente4 é tudo aquilo que é, no sentido concreto, tudo que existe: homens,
animais, objetos, utensílios, natureza. Porém, Boemer (2004) esclarece que o homem é
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“O ente é tudo aquilo de que falamos, aquilo que significamos, aquilo relativo ao qual nos comportamos
de tal ou tal maneira; o ente é também aquilo que somos nós mesmos e a maneira de sê-lo” (GILES,
1989, p. 97)
um ente privilegiado porque pode questionar seu ser ontológico, é o único ente que
O que se oculta e será preciso mostrar é “o ser do ente”, isto é, o sentido de ser
desse ente, aquilo que constitui sentido e fundamento. Giles (1989, p. 94) escreveu que:
Se a fenomenologia tem por tarefa essa relação original com o ser podemos
Sendo assim, Heidegger transcende a visão de homem como ser vivo, dotado de
razão, para a compreensão de que a sua essência reside em sua existência, concebida
Dasein, termo alemão designado pelo filósofo como Ser-aí, ser-no-mundo, pre-sença,
diferente do modo de ser dos demais entes. Giles (1989) esclarece, ainda, que é um ente
que é cada um de nós e que tem, entre outras possibilidades de ser, a de questionar,
sendo assim: “O homem é o aí (Da) onde o Ser (sein) se coloca em questão, de modo
que se trata no homem de muito mais do que o homem” (DARTIGUÊS, 2005, p. 113).
linguagem, é uma interrogação que o homem traz em si, antes mesmo de formulá-la por
ser ele próprio, esta interrogação. O homem é, portanto, o único questionador entre os
outros entes e, por isso, só o homem vivo e concreto poderá ser chamado Dasein, a
partir de sua possibilidade de ser ele próprio ou de não ser ele próprio e, “por sua vez,
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Ontologia é a “parte da filosofia que trata do ser enquanto ser, isto é, do ser concebido como tendo uma
natureza comum que é inerente a todos e a cada um dos seres” (ESPÓSITO, 1991, p. 86).
está implicado na investigação, já que o ser está em questão no ser do Dasein”
Dasein interroga. É com Heidegger que a fenomenologia muda de orientação, não sendo
mais apenas descrição, mas interrogação do dado que aparece sob o título de
hermenêutica.
sua vez, comporta três sentidos: dizer, explicar, traduzir (PALMER, 1986). Dentro da
interpretação das estruturas principais que constituem o ser do dasein, do ser-aí, ou seja,
o sentido para o qual conflui é a ontologia: “Aquilo que deve se tornar manifesto não é
o ente que se impõe, mesmo que fosse o Ser-aí, mas aquilo que é escondido em todo
ente, a saber, o seu Ser e o sentido desse Ser” (GILES, 1989, p. 95).
seja, o conteúdo típico humano que se imprime a qualquer contexto histórico, no qual
não existem apenas fatos dados, acontecimentos externos, mas também, “significação,
sentido e valores”.
ontológico. No nível ôntico, o Ser-aí seria determinado pela presença do ser, entre os
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Ôntico refere-se a “tudo que é percebido, entendido, conhecido de imediato” (SPANOUDIS, 1981, p.
11).
Aqui reside a originalidade de Heidegger, como coloca Giles (1989, p. 98), pois
ele se preocupou em distinguir o ente do ser do ente e, sendo assim, “o ser do ente é o
diante das coisas para tentar mostrar que o cotidiano e o habitual, em sua aparente
vez que busca a compreensão e interpretação do Dasein, tal como ela se mostra em si
mesma. Heidegger (2001b, p. 141) acrescenta que a “analítica tem a tarefa de mostrar o
Ele não põe em questão o “conceito de ser”, pois este é indefinível, mas sim o
“sentido do ser”, não pretendendo conceituar, mas sim interpretar, mostrando que a
impossibilidade de se definir o ser exige que o seu “sentido” seja colocado em questão.
não é nem um objeto no meio do mundo, nem um sujeito sem mundo, mas ele ‘é’ seu
mundo”. E Stein (1988) acrescenta que a situação total que Heidegger designa ser-no-
mundo pode ser tomada como situação de cuidado. A relação de cuidado consigo
com a vida como um todo. Destacamos o que diz Heiddeger (2001a, p. 182):
Quer dizer que todos os elementos do Ser-aí são reais, mas apenas enquanto
possibilidades para um ente que já está lançado no mundo, isto é, para um ente cuja
essência consiste em estar além de si, dentro do mundo. Estar lançado no mundo é o que
Conforme Nunes (2002), o Dasein como ente é ser-no-mundo. Portanto este ser-
no mundo desde o primeiro instante de sua existência e por ele ser-no-mundo, a sua
própria existência constitui-se por suas relações com o ambiente das coisas e de outras
num ser-em-comum. É no mundo da existência que estamos juntos com outros Seres-aí
que o homem realiza para viver junto aos outros, referindo-se sempre a uma rede de
relações significativas. É mais uma região ontológica do que uma realidade dada
sem Dasein, não há sujeito sem mundo. Quanto a isso, Heidegger (2001b, p. 167)
escreveu: “O mundo não é algo a mão e nem algo simplesmente dado. O mundo se
temporaliza na temporalidade. [...] Ele ‘é’ e está ‘pre’-sente com o fora de si [...]. Se não
“Mundo ambiente ou circundante” (Umwelt) ou mundo dos objetos que nos rodeiam,
o mundo natural. Seria o mundo das leis da natureza, dos seus ciclos, de sono e vigília,
essência do homem).
nele e com suas possibilidades de projetar-se nele. Pela compreensão, o Dasein não está
somente lançado no mundo, mas está também definido por possibilidades que o fazem
ultrapassar seus limites de ser simplesmente (DARTIGUÊS, 2005). Como projeto, a
ente dotado de fala que pode questionar-se e tecer questões acerca do mundo que o
‘como isto ou aquilo’”. E Steiner (1978) complementa dizendo que, para Heidegger, ser
um homem significa ser um ente que fala e se em sua essência, não incluísse o “poder
da linguagem”, todos os outros entes estariam fechados para ele. Quer dizer que ser é
questionar-se.
Por sua vez, a afetividade diz respeito ao modo como o homem se relaciona com
utensílios e entes, ou seja, como é atraído por tudo que existe no mundo (BRUNS;
TRINDADE, 2003). A afetividade segundo nos revela Nunes (1992) tem para
Heidegger uma dominância, ela revela-nos o nosso aí, onde sempre já nos encontramos
“disposição de ânimo”.
seguir normas de agir, permitindo que outros decidam por ele, passando a viver no
humana. Lançados entre outros, interpretando e realizando o nosso próprio Dasein como
um ser-cotidiano-com-outros, nos dizeres de Steiner (1978), acabamos não sendo nós
tempo em vez de tomar-se a seu próprio encargo como esclarece Dartiguês (2005). Essa
existência inautêntica é o estado habitual do Dasein, no qual ele deve conquistar sua
autenticidade.
e que não partem do seu interior, no desejo de se sentir aceito, de ser parte dos grupos
sociais que compõem suas redes de relações afetivas e sua identidade pessoal. Esse falar
não implicam em “certo” e “errado”. Ambos são modos possíveis de cuidar de ser no
mundo. Entretanto, na vida cotidiana, o homem justamente por ser o ente que pode
que esses outros vivam suas potencialidades. Caso isso não ocorra, a solicitude pode
manifestar-se de modo deficiente, impedindo-o de ver, inclusive, a si como horizonte de
possibilidades.
condição pode ser experienciado. Então como entender o estatuto fundamental da morte
e de sua antecipação?
Dartiguês (2005) afirma que a angústia abre o ser para sua existência porque é
um sentimento que antecipa a morte e, com isso, nos coloca diante do si-mesmo. Esta
superada e, por mais que o homem fuja, ele é ser-para-a-morte, possibilidade extrema de
sua existência e que não está determinada a acontecer num futuro distante. É por isso
que Heidegger injeta pulsão em sua ontologia, com a noção de angústia, o único
sentimento que nos constitui propriamente e que é capaz de nos colocar diante do
sentido do ser.
que não nos expõe a prejuízo real ou a efeito nocivo imediato, carece de objeto. O que
nos ameaça não ‘está em parte alguma. A angústia não sabe o que é aquilo ante que se
angustia’”. Complementa-o Nunes (2002, p. 19) dizendo que o que na angústia é temido
se desloca para o mundo. “O perigo que nos espreita e em toda parte nos acua é o
mundo como mundo, originário e diretamente, que se abre para o Dasein desabrigado”.
A angústia não tem objeto, ou mundo, ou outro. Angustiar-nos é não mais nos sentirmos
movimento existencial de resgate do si para si, e isso nos faz abandonar o que não
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A temporalidade “não se reduz a uma série de instantes que deslizam do passado para o presente e deste
para o futuro”, como nos diz Giles (1989, p. 107), mas é o processo de acontecer.
Por se tratar de um sentimento ontológico, a angústia é pura e não sofre
limite do Ser-aí, que o faz compreender-se como projeto, em vista de sua possibilidade
antecipá-la.
medida em que pode revelar o ser, porém, a linguagem não necessariamente faz isso, ela
possibilita que o ser se desvele, mas isso irá depender do modo como o homem existe
Por isso que cada vez mais, Heidegger se volta pra linguagem, como diz
limite que une a facticidade e o projeto do existente, seu já-aí e seu possível”.
porque ouço posso escutar o que me dizem, não como simples som, mas
insere nesse circuito em que o ouvir se encadeia ao dizer em que é possível o silenciar.
Como diz Heidegger (2001b, p. 165) “somente no discurso autêntico é possível o
genuíno silêncio. Para poder silenciar, necessita o Dasein ter algo a dizer, isto é, dispor
se revela ao homem como coloca Dartiguês (2005). Nunes (1992) vem acrescentar que
existência e, como tal, uma possibilidade do Dasein. Cada modo de existência traz a
acordo com o mundo, dispondo-nos a que sejamos afetados pelas coisas. À todas as
um existencial que junto com outras estruturas existenciais compõe um todo chamado
coisas e ainda a solicitude, relação com as pessoas, outros Daseins. O foco da analítica
modo próprio (ou autêntico) e o modo impróprio (ou inautêntico), constituídos a partir
da solicitude com as outras pessoas e por meio da preocupação para com as coisas do