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Direito Constitucional- prático – aula de 16 de novembro

Casos práticos: princípio da segurança jurídica e retroatividade das leis


Em que contexto podemos encontrar a matéria da retroatividade e retrospetividade? Estamos
perante regras que se enquadram no princípio mais amplo do estado de direito, da segurança
jurídica e da proteção da confiança.
Porque é que é no contexto da segurança jurídica que encontramos a base princípio lógica de
proibição à retroatividade?
O princípio do estado de direito diz que o estado deve atuar de acordo com o direito. o estado
deve comportar-se como uma pessoa de bem. A segurança jurídica surge para prevenir que o
estado atue de forma organizada.
A segurança jurídica relaciona-se com o poder legislativo, jurisdicional e executivo. Quando
está em causa a questão da retroatividade e retrospetividade, falamos da relação entre segurança
jurídica e poder legislativo
Relação entre segurança jurídica e poder legislativo- não se centra apenas na proibição da
retroatividade ou da retrospetividade, mas também, a clareza das normas (boa prática
legislativa- o legislador deve ser claro, não deve ser dúbio; uma norma clara potencia o
respetivo cumprimento); e a proibição de pré-efeitos (uma norma antes de entrar em vigor não
pode produzir os seus efeitos – art 119 CRP). a produção de efeitos e a entrada em vigor não
coincide com a publicação. Antes da entrada em vigor de uma norma, depois da publicação, a
norma entra em vigor e só depois os efeitos começam a ser produzidos.
Dimensão da retroatividade/retrospetividade
Esta matéria coloca em causa a ideia que as normas só deve ter efeitos para o futuro (ex nunc –
para o futuro)
As normas visam produzir efeitos para o futuro.
A AR cria uma lei para o futuro com o objetivo que a norma comece a ser cumprida.
Para o direito, ex nunc, seria uma forma de limitar o alcance que o direito é capaz de assumir.
Ex: Em 2000, o António e a Berta celebraram um contrato de casamento. Este ano vão
divorciar-se. No dia de hoje entra uma lei que traz um novo fundamento para o divórcio.
Poderão eles invocar como fundamento do divórcio, o motivo que só começou a produzir os
seus efeitos hoje.
Quando as normas produzem efeitos para o passado, chamamos de ex tunc.
O contrato de casamento foi celebrado em 2000, mas pode beneficiar da aplicação da nova lei
A norma vigora para o futuro, mas em certas circunstâncias, as normas têm, devem ou acabam
por produzir efeitos para o passado.
De que forma é que o passado pode ser detetado por uma lei nova?
Retroatividade- a lei nova vai afetar factos passados; já consumados; que já não existem e não
produzem os seus efeitos; situações resolvidas; aqui encontramos a retroatividade pura ou
autêntica
Retrospetividade- a lei nova afeta relações jurídicas que se constituíram no passado, factos do
passado, mas que ainda existem no presente. Relação jurídica que começou no passado e vai
continuar a produzir os seus efeitos
Esta questão da retroatividade e retrospetividade prende-se com normas novas que surgem, que
vão contrariar o regime de normas anteriores e que afeta situações que não são de agora. Será
que a situação jurídica já não existe? É facto passado? Ou ainda existe?
Retrospetividade- a norma afeta as expectativas das pessoas envolvidas.; disciplina para o
futuro, mas ao fazê-lo afeta as expectativas formadas no passado.
O que é que se permite e não permite na CRP?
A CRP proíbe no artigo 18/3; 29/1 e 103/3 o efeito retroativo
Estes artigos proíbem a retroatividade, afetam casos já passados ,mas não afastam, na opinião
doutrinária, a retrospetividade.
A retroatividade nos termos da CRP só é proibida nestes casos. Fora deste contexto,
encontramos uma situação de retroatividade e essa norma poderá não padecer de
inconstitucionalidade. Se a norma não se conduz a nenhuma destas situações e produz efeitos
retroativos, está em conformidade com a CRP. Na retrospetividade acontece o mesmo.
Se porventura, poderemos proteger a situação jurídica, que os efeitos retroativos são violadores
da CRP ao abrigo do princípio da proteção da confiança (podemos chegar à conclusão que poe
em causa uma matéria de atribuição de subsídios de verão e natal. Será que os funcionários
veem as suas expectativas protegidas? Princípio da proteção da confiança consegue chegar onde
estes domínios não conseguem
Princípio da proteção da confiança- derivação do princípio do estado de direito e pressupõe
que se atenda às ideias seguintes:
- Necessidade de atender ao facto de que o legislador deverá ter criado expectativas de
continuidade, isto é, o legislador atuou de uma forma que nada fazia prever que o quadro
constitucional ia ser alterado; se o estado atuou de forma capaz de criar expectativa de
continuidade
-Se os destinatários das normas formaram legitimas expectativas fundadas em boas razões
quanto à continuação da vigência da norma
-Necessário demonstrar que os destinatários das normas fizeram planos de vida; se estes
existiam em função do quadro normativo vigente
-Saber se existe ou não uma razão de interesse publico que se sobreponha a interesses privados
(proteger as expectativas)
Perante uma situação pratica relativamente aos efeitos das normas, a primeira preocupação é
identificar se é um caso de retroatividade e retrospetividade.
Se é retrospetividade (não é proibida pela CRP; olhar para o princípio da proteção da confiança
e analisar se esses pressupostos estão ou não preenchidos)
Se é retroatividade (se se conduz a alguma das situações acima descrita, a norma é
inconstitucional; se não se conduzir àqueles casos, temos de regressar ao princípio da proteção
da confiança)
Em que termos a segurança jurídica se relaciona se relaciona com o poder jurisdicional?
Caso julgado- situação que se encontra totalmente resolvida no contexto da ordem jurídica e
não é suscetível de recurso
Quando uma decisão transita em julgado, se dizemos que o caso está estabilizado, dizemos por
segurança jurídica. Na CRP há um a proteção que não é eminentemente expressa (art 282, a
decisão jurisdicional não afeta um caso julgado)
Em que termos a segurança jurídica se relaciona se relaciona com o poder executivo?
Atuação da administração pública; quando substanciam um caso decidido devem manter-se nos
termos em que o caso foi decidido; mantém-se estável
Ex: o António fez um pedido de licenciamento à camara para instalar uma esplanada. A câmara
rejeita e o António sabe disso. Apensas dois anos depois reage a essa decisão. Não o pode fazer,
pois passou o prazo

No contexto criminal, nota-se que há uma forma de interpretar as normas de uma forma gravosa
para quem praticou o crime. Fazer uso deste tipo de interpretações é aplicar o direito como ele
existe
A ideia do art 29/4 admite a aplicação retroativa se for mais favorável
Ex: lei fiscal que vem diminuir as taxas de IRS. Lei introduzida hoje e atendendo aos
rendimentos de 2019 vai ser aplicada uma taxa mais reduzida e os contribuintes têm direito ao
reembolso. É uma solução nova que produz efeitos retroativos para os contribuintes. É uma
situação retroativa permitida? Tendencialmente a retroatividade também pode ser aplicada aos
contribuintes. No entanto, há quem entenda que qualquer efeito retroativo é favorável ou
desfavorável.

Casos práticos
1.
Em 1990, a Assembleia da República aprovou a lei x sobre as incompatibilidades de
cargos políticos e que vinha impedir os deputados ao Parlamento europeu de exercerem funções
enquanto presidentes das câmaras municipais e vereadores a tempo inteiro. Segundo a lei x, os
actuais Deputados ao Parlamento Europeu não eram abrangidos por aquela norma.
Entretanto, a lei y veio revogar esta disposição transitória e sujeitar os actuais
Deputados ao Parlamento Europeu àquele regime de incompatibilidades.
Aquando da promulgação da lei y, o Tribunal Constitucional foi chamado a apreciar
preventivamente a constitucionalidade daquela norma, tendo então decidido não se pronunciar
pela inconstitucionalidade da mesma.
Mais tarde, o Provedor de Justiça veio a requerer ao Tribunal Constitucional a
declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral da norma constante da lei y.
Na sequência do pedido do Provedor de Justiça, o Tribunal Constitucional veio a
declarar a inconstitucionalidade com força obrigatória geral da lei y.
Na fundamentação deste último Acórdão, pode ler-se que “toda a norma que estabelece
uma incompatibilidade tem natureza restritiva; independentemente da sua etiologia e, bem
assim, da sua dimensão legal, contém, por definição, um limite. O direito de participar na vida
pública, previsto no artigo 48°, da Constituição, o direito de sufrágio a que se reporta o artigo
49°, nomeadamente na sua dimensão de capacidade eleitoral passiva – e o direito de ser eleito
implica o da manutenção no cargo eleito -, o direito de acesso a cargos públicos e o direito a não
ser prejudicado em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos
públicos, reconhecidos pelo artigo 50° n°s. 1 e 2, são direitos fundamentais de cuja restrição só
pode ocorrer nos precisos casos contemplados no n° 2 do artigo 18º da Lei Fundamental, sendo
certo que as leis que autorizadamente os restrinjam, além de revestirem carácter geral e abstrato,
não podem ter efeito retroativo nem diminuir a extensão e o conteúdo essencial daqueles
preceitos constitucionais(…)
E, mais adiante, “a imprevisibilidade da alteração de critérios contribui
reflexamente para afetar o princípio da confiança decorrente desse outro princípio estruturante
que é o do Estado de Direito (artigo 2°).’
Concluindo que se trata “de uma restrição que na sua imediata aplicação – não se
vislumbrando que súbita emergência de interesse público a justificaria –se releva
desproporcionada e onerosamente excessiva (…)”.
[Acórdão do TC n.º 473/92]

A norma cuja inconstitucionalidade se discute violava o princípio do Estado de


Direito? Justifique a sua resposta.
A lei y possui efeitos de retrospetividade sobre a lei x. vai ter efeitos sobre a norma do passado
vai perdurar para o futuro.
Quem já era deputado em 1990 não era afetado. António começou a exercer funções em 1989 e
não ia ser afetado.
Mais à frente surge a lei Y que revoga a disposição transitória e sujeita os atuais deputados ao
parlamento europeu ao regime das incompatibilidades. António vai ser afetado pela lei Y. Diz
que os eurodeputados que assumiram funções do passado e que assumem agora são afetados.
Situação de retrospetividade. Como o António esteve a acumular funções durante este tempo,
era eurodeputado e ainda é. Se falamos de lei que ainda existe, é retrospetividade.
Os artigos 48,49 e 50 estão a ser afetados pela lei Y. Afeta a forma como o exercício dos
direitos é realizado.
Falamos de leis que se sucedem no tempo. A lei Y, veio a revogar a disposição da lei X
Não podemos fazer uso do artigo 18, pois não é um caso de retroatividade.
Temos de aferir se há expectativas afetadas à luz do princípio da confiança.
-Aferir se o estado promoveu expectativas de continuidade relativas ao quadro vigente
-Estas expectativas devem ser legitimas e fundadas em boas razões
-Será que existe algum interesse público que se sobreponha ao interesse privado?
A lei Y é inconstitucional. Inconstitucionalidade material, por violar o princípio do estado de
direito
A proporcionalidade exige ponderação. O princípio da proporcionalidade pressupõe que se
ponderem os meios e os fins; saber se os meios adotados são adequados aos fins.
Os fins são evitar a concentração na mesma pessoa de funções que são distintas. O meio para o
atingir foi instituir o regime das incompatibilidades. Temos de saber se o regime das
incompatibilidades é adequado e proporcional em sentido estrito; se o meio é apto; se por via
daquele caminho, o efeito pretendido é conseguido – o regime é apto
Será o meio necessário? Saber se existem outros meios capazes de concretizar esses fins de
forma menos onerosa
A questão da proporcionalidade pressupõe conhecer bem o meio em que nos encontramos
Queremos saber se o desvalor decorrente da adoção desta medida, suplanta os custos da medida
Quais as vantagens que superam as desvantagens?
Princípio da proporcionalidade- artigo 18/2; artigo 2 CRP
A violação do principio da incoscitucinalidade é material
(em situação de teste é importante distinguir a retroatividade da retrospetividade)

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