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MÍDIAS DIGITAIS E ELEIÇÕES: REFLEXÕES


ACERCA DA INFLUÊNCIA DAS REDES SOCIAIS
SOBRE AS DECISÕES DO ELEITORADO
Matheus Prestes Tavares Duarte1

INTRODUÇÃO

Como é cediço, os meios de comunicação influenciam


diretamente nas relações de poder. Cientes do potencial desses
meios como forma de dominação política, os pensadores da Escola
de Frankfurt descreveram, a partir de uma leitura marxista, os meios
de comunicação em massa como sendo uma estratégia de controle
utilizada pela elite para alcançar seus interesses econômicos.
Nesses termos, Theodor Adorno e Max Horkheimer, expoentes
da aludida vertente, enxergavam os meios de comunicação como
sendo a depravação dos ideais iluministas forjados no século XVIII, já
que, ao contrário do que esperavam os pensadores daquela época,
a racionalidade técnica não teria servido à libertação do homem
das amarras da mitologia, mas sim à sua completa alienação. Tal
entendimento, de viés pessimista, foi compartilhado por autores
filiados a outras linhas de pensamento, os quais, assim como Adorno
e Horkheimer, assistiram regimes totalitários como o nazista e o
fascista lançarem mão dos meios de comunicação em massa como
forma de manipulação e disseminação de suas ideologias moralmente
iníquas (FIANCO, 2010, p.134).
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a verificação dos
desastrosos efeitos das campanhas dos regimes totalitários, a
influência dos meios de comunicação no campo da formação da
opinião pública passou a ser relevante objeto de estudo, tendo sido a
Mass Communication Research (MCR), escola pertencente à sociologia
empirista americana, uma das pioneiras no desenvolvimento de
pesquisas na referida área do saber (LIMA, 2014, p.15), impulsionando
1  Mestrando em Direito Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ), Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e
Bacharel em Ciência Política pelo Centro Universitário Internacional (UNINTER).
https://orcid.org/0000-0003-2751-1129

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a ideia de que os meios de comunicação possuem capacidade de


persuasão extremamente eficaz.
Nesse seguimento, com a consolidação do rádio, da imprensa,
da televisão, do cinema e a constatação de que os referidos meios
não se trataria apenas de vetores de emissão de mensagens, mas
sim, possuiriam uma estreita relação com o modo que os indivíduos
percebem a realidade, as pesquisas sobre as mídias se disseminaram
entre mais diversas áreas, como a linguística, as ciências sociais e o
marketing, tornando-se um verdadeiro campo híbrido de análise.
Na seara da ciência política, por seu turno, a mídia demorou a
ser incorporada como uma variável significativa para a compreensão
das ideias políticas partilhadas pela população (MIGUEL, 2002, p.156).
Nesse sentido, a dificuldade de incorporar a mídia nos estudos políticos
e, mais precisamente, na análise sobre o comportamento eleitoral, foi
entendida por Porto (1997, apud GUAZINA, 2007, p.12) como sendo
uma consequência da preferência da ciência política em abordar o
tema aludido sob as lentes da teoria da escolha racional, a qual não
reconhece a importância do valor das emoções no comportamento
político.
Apontando para uma mudança paradigmática no estudo da
relação entre o comportamento político e os meios de comunicação,
Aldé (2001) buscou investigar a influência das mídias de massa nas
atitudes políticas dos indivíduos, tendo identificado, quando realizou
sua pesquisa, uma posição singularmente vantajosa ocupada pela
televisão na construção da opinião pública, e, consequentemente,
na visão dos telespectadores sobre os contornos da política.
Hodiernamente, sabe-se que não só a televisão, o rádio, o
cinema e a imprensa, que compõem a denominada mídia tradicional,
têm o poder de influenciar o comportamento dos indivíduos e
modular o processo eleitoral, mas também as mídias digitais, as
quais vêm ganhando destaque em razão da existência de diversos
“ambientes” e plataformas, que acabam por gerar, cada uma delas,
como aponta Marques (2016, p. 8), um conjunto diferente de efeitos
sobre fenômenos, linguagens e comportamentos que caracterizam
a comunicação política.

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Nesse sentido, ao se deparar com uma nova ferramenta digital, o


cientista político encontrará, em seu objeto de estudo, consequências
diversas no campo da política, uma vez que o modo de interação entre
os atores políticos, os eleitores e o formato de comunicação, varia
substancialmente a depender de qual plataforma se analisa, sendo
possível verificar conjuntos de pontos positivos e negativos distintos
em cada uma delas. Cumpre destacar, porém, que a descrição das
vantagens e das desvantagens da comunicação política por meio
de determinada ferramenta digital deixou de ser o foco de análise
das ciências políticas, como bem preleciona Marques (2016, p. 10):
O fato, contudo, é que a literatura de ponta
em democracia digital, já se encontra em
uma etapa na qual a questão principal não
se refere somente a inventariar benefícios e
malefícios, vantagens e desvantagens. Parece
ter se tornado mais importante averiguar, por
exemplo, as formas de uso dos media digitais e
os efeitos que tais usos geram sobre o processo
de produção da decisão política, abrigado nas
instituições do Estado.
Nesses termos, aponta, atualmente, a literatura especializada,
que muito embora não seja necessário abandonar por completo os
prognósticos sobre os pontos positivos e negativos do uso das mídias
digitais como meio de comunicação política, deve ser dada ênfase aos
efeitos da sua utilização para esse fim, sob os mais diversos aspectos.
Cabe ainda ressaltar, nesse sentido, que o estudo das plataformas
digitais deve levar em consideração os paradigmas experimentados
pela sociedade, nos que diz respeito ao desenvolvimento de diversos
processos, os quais culminaram na economia informacional, sobre
qual dispõe Manuel Castells (2003, p. 100) que:
É extremamente dependente de tecnologia
da comunicação. Como em revoluções
tecnológicas anteriores, essa transformação
sociotécnica abre caminho para uma enxurrada
de novos produtos — havendo graus variados
de adequação entre estes, a demanda do
mercado e as necessidades sociais. Por

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exemplo, o telefone móvel, que parecia ser


uma inovação de produto sem importância,
tornou-se o aparelho de comunicação de maior
interesse no planeta, enquanto a tão propalada
TV interativa ainda espera por capacidade de
transmissão e conteúdo atraente para se tornar
um negócio lucrativo.
Assim sendo, o modelo informacional vivenciado na atualidade,
em que predominam os novos meios de telecomunicação, bem como
o acesso facilitado à informação, permite a criação de novas formas
de exploração da atividade econômica, tanto para empresas que
criam essas tecnologias, como as que se utilizam das ferramentas
ofertadas pelo ciberespaço para aumentar sua performance no
mercado, o que, certamente, influencia em diversos aspectos das
variáveis política e comunicação por meio da internet.
Exposto e contextualizado o objeto de estudo, importante
mencionar que o presente trabalho possui como objetivos analisar
de que forma o uso das redes sociais, como meio de mobilização e
divulgação de notícias sobre política, influencia na tomada de decisão
do eleitor, bem como em que medida a internet se constitui como
um espaço de discussão democrática que foge à mídia tradicional e
seus respectivos meios de comunicação.
Tais objetivos serão alcançados por meio de revisão da
bibliografia atinente ao tema, orientando-se o artigo pela teoria da
racionalidade de Popkin (1994), ora firmada como marco teórico
do presente trabalho, bem como pelas diversas obras referenciadas
no desenvolvimento do estudo em comento, ao fim do qual serão
apresentadas as seguintes considerações finais: conquanto não se
olvide existirem profundas desigualdades no tocante ao acesso
à internet, as redes sociais, como meio de mobilização política e
propagação de informações, bem como de divulgação de notícias
pela chamada mídia alternativa, auxiliam no amadurecimento de
uma democracia deliberativa.

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REDES SOCIAIS E A EFETIVAÇÃO DA DEMOCRACIA

Evidenciados os escopos do artigo, imperioso se afigura analisar


os efeitos do uso das novas tecnologias digitais de comunicação no
tocante à participação política, problemática que perpassa, dentre
inúmeras outras questões, perguntas como em que medida as mídias
digitais propiciam, ou não, um espaço para debate capaz de contribuir
no processo de amadurecimento de uma democracia deliberativa2.
Num primeiro momento, sobreleva mencionar que as plataformas
digitais são vistas, por parte da literatura especializada, como a
grande esperança de efetiva inclusão da sociedade civil nos debates
políticos. Sobre isso, Ferreira (2011, p. 49) destaca que:
Em termos concretos, os precursores deste
ideal olhavam os meios de comunicação digital
como um instrumento pleno de potencial para
enfrentar os crescentes níveis de desinteresse
político dos cidadãos comuns e a concomitante
atrofia da vida cívica.
Nesses termos, partindo-se da premissa de que fomentar a
participação da maior quantidade de indivíduos possível é fundamental
para o desenvolvimento de uma democracia deliberativa, as mídias
digitais, mais precisamente as redes sociais, ao permitirem o
engajamento direto dos eleitores, que podem fazer da plataforma
um meio de expor suas opiniões, reagir à notícias e promover atos
de campanha para os representantes ou o partido a que se filiam,
mostram-se muito mais colaborativas que a mídia tradicional na
busca pela garantia da soberania popular, já que o envolvimento dos
eleitores nas redes sociais pressionam os candidatos a elevarem suas
propostas e a manterem seus discursos de maneira minimamente
coerente.

2  A teoria da democracia deliberativa, que teve como precursor Jürgen Habermas
pressupõe, dentre outros requisitos, processos de debate altamente inclusivos e
públicos, dos quais não podem ser, a princípio, excluído qualquer cidadão. Nesse
sentido, ver: FARIA, Cláudia Feres. Democracia deliberativa: Habermas, Cohen e
Bohman. Lua Nova, São Paulo, n. 50, p. 47-68, 2000. Disponível em: http://www.
scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-64452000000200004&lng=en&
nrm=iso. Acesso em: 30 de nov. de 2020.

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Ademais, observando-se o uso das redes sociais como meio


de disseminação de campanha, ou seja, analisando-se a questão por
meio do ponto de vista do candidato político, é de se destacar que a
utilização das plataformas de redes sociais diminui sobremaneira os
custos referentes à participação política, bem como contribui para o
pluralismo político. Isso porque, a divulgação de um vídeo nas mídias
digitais, ou a realização de uma live para que o ator político possa
debater com os eleitores o seu plano de candidatura, é uma das
formas de fazer a sua campanha com nenhum ou quase nenhum custo.
Noutro giro, não se pode olvidar que o acesso à internet não
é universal, o que, por certo, é um obstáculo à participação plena.
Nesses termos, se por um lado as redes sociais retiram o eleitor
da condição de mero expectador, posição que adota o votante no
contexto da comunicação pela via das mídias tradicionais, por outro,
os níveis de acesso à internet ainda reproduzem as desigualdades
semelhantes às encontradas em outras esferas de debate político.
Nesse sentido, asseveram Gomes e Maia (2008, p.317, apud FERREIRA,
2011, p. 57) que:
Verifica-se, assim, que o problema que se
coloca à ciberdemocratização reside na
desigualdade de competências técnicas,
culturais e educacionais, entre outras, que
acaba por se transformar numa desigualdade
de oportunidades políticas – a qual, em vez
de resolver as desigualdades anteriores,
acrescenta-se a elas e torna-as ainda
mais graves. Noutros termos: quando se
aumentam as oportunidades sociais (no caso,
as oportunidades digitais de participação
política) e uma parte considerável dos cidadãos
não pode aproveitá-las, novas formas de
desigualdade ganharão dimensão.
Assim sendo, se por um lado a comunicação política por meio
das redes sociais possibilita maior engajamento dos eleitores, por
outro, não podem ser consideradas as mídias digitais, genericamente,
como uma ferramenta que ameniza as desigualdades no campo do
debate político, já que grande parcela da população não tem, ainda,

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acesso aos recursos necessários para que possam efetivamente


participar desse tipo de deliberação pública.

REDES SOCIAIS E O COMPORTAMENTO ELEITORAL

Uma pesquisa de opinião realizada no ano de 2018, pelo


Instituto DataSenado (BRASIL, 2019), apontou haver uma crescente
influência do uso das redes sociais como meio do eleitor obter
informações sobre política, o que indica serem as plataformas
relacionais um fator considerável na escolha dos eleitores, já que,
45% (quarenta e cinco por cento) dos entrevistados declararam ter
decidido seu voto com base em conteúdos vistos em alguma rede
social.
Sobre a faixa etária das pessoas que mais se apoiam nos aludidos
meios de comunicação para formarem suas opiniões, verificou-se
que o público jovem é o que mais leva em consideração aquilo que
percebe nas redes sociais, sendo que, o percentual de indivíduos
que afirmou ter votado com base em conteúdos das redes sociais é
mais significativo entre pessoas de dezesseis até vinte e nove anos.
Nesse sentido, o supramencionado crescimento da utilização
pelos eleitores das redes sociais como meio de coleta de informações,
pode ser bem compreendido pela intersecção entre as teorias:
econômica, sociológica e da psicologia cognitiva, aparato metodológico
utilizado por Samuel Popkin (1994), para a construção de sua teoria
da racionalidade eleitoral.
Popkin esclarece haver um desestímulo na busca do eleitor
pela construção das suas próprias conclusões e percepções políticas,
já que aliados ao alto custo de se manter informado, os governos, em
sua maioria, não realizam transformações significativas no sentido
de aumentar o bem-estar da sociedade. Assim, os eleitores buscam
o que o autor denomina de “atalhos cognitivos”, sendo os principais
as experiências do cotidiano, os meios de comunicação de massa e
as relações interpessoais com familiares e amigos, meios que não
demandam grandes esforços para a obtenção de informações.
Partindo-se desse entendimento, importante mencionar
que as redes sociais constituem um grande atalho informacional,

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já que por meio das referidas plataformas relacionais, são eleitos


formadores de opinião, indivíduos que se empenham em estudar
os cenários políticos, bem como os candidatos e suas propostas de
governo, repassando suas impressões para terceiros sobre o jogo
político por meio das redes sociais.
Nesse sentido, o eleitor que, sob o já aludido enfoque da análise
econômica da redução dos custos, não se interessa por aprofundar
ele próprio no tema e construir suas percepções, opta por se valer
da opinião alheia para definir seu voto, o que, certamente, vai ao
encontro da pesquisa mencionada anteriormente, bem como do
entendimento de que o uso das plataformas relacionais têm, de fato,
influenciando sobremaneira na decisão do votante.

OS LAÇOS FRACOS CONSTRUÍDOS NAS REDES


SOCIAIS E SUA INFLUÊNCIA NA DECISÃO DO ELEITOR

Outro fator relevante a ser analisado ao se estudar o


comportamento do votante diante da utilização das redes sociais
como meio de comunicação política, é a influência que os laços fracos
construídos por meio dessas plataformas relacionais, apresentam
sobre a formação da opinião do eleitor.
Imperioso se afigura, nesse sentido, definir o que se entende
por laços fracos e, ainda, por laços fortes, conteúdo que remete ao
estudo de Mark Granovetter, expoente da Sociologia Econômica, que
cunhou os retromencionados termos, estes, por sua vez, relacionados
pelo autor ao grau de interatividade existente entre as pessoas. Laços
fortes seriam, então, aqueles construídos entre pessoas que possuem
intimidade, como familiares e amigos próximos, enquanto os laços
fracos seriam aqueles em que as pessoas possuem um relacionamento
muito mais distante e casual (KAUFMAN, 2012, p. 208).
Nesse sentido, pessoas que têm entre si laços fortes, se
identificam, compartilham a mesma realidade social, possuem
experiências e opiniões semelhantes, bem como um relacionamento
permeado por confiança. Lado outro, indivíduos que possuem laços
fracos, apresentam um relacionamento distante, que funciona como
uma verdadeira ponte entre as relações baseadas em laços fortes. É

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de se destacar que, ao contrário do que ocorre nos relacionamentos


baseados em laços fortes, os laços fracos são marcados por uma
heterogeneidade de posicionamentos e opiniões, sendo que os
indivíduos componentes desses laços possuem vivências muito
diversificadas. Trazendo a teoria dos laços para o contexto das
redes sociais, verifica-se que os relacionamentos desenvolvidos
nesses “ambientes” são, via de regra, baseados em laços fracos,
impulsionados pelas plataformas relacionais, como bem pontua
KAUFMAN (2012, p.209):
Observando os perfis dos membros das
principais comunidades, encontramos
participantes com mais de mil “amigos” sem, no
entanto, aparentemente apresentar qualquer
tipo de interação social entre os envolvidos.
Assemelham-se mais a uma “coleção de perfis”,
gerados por uma relação puramente aditiva, já
que basta aceitar a inclusão da rede social em
seu perfil sem qualquer relacionamento prévio.
Trata-se de um vínculo que não demanda
interações para ser mantido, é uma relação
mais fluida e menos conectada, na qual não há
intimidade, reciprocidade ou mesmo confiança.
Essas conexões ou “coleções de perfis” guardam
semelhança com a definição de “Laços Fracos”
de Granovetter, ao desempenharem o papel
de propagadores de inovações, difundindo
referências e experiências, facilitadas pela
tecnologia que amplia o acesso e acelera as
interações com um número maior de pontos
de contato.
Assim, os laços fracos desenvolvidos nas redes sociais são
importantes propagadores de opiniões divergentes, inclusive, sobre
política e eleições. Jefrey Levine (2005, apud. ROSSINI; LEAL, 2012, p.
5) indica que a influência social desses laços é uma variável de suma
importância para a compreensão do comportamento dos eleitores.
Segundo o autor, muito embora os indivíduos sejam mais suscetíveis
ao posicionamento de seus cônjuges, as relações baseadas em laços
fracos também influenciam a tomada de decisão do votante.

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Levine aponta, inclusive, estudos que verificam maior potencial


de influência no comportamento eleitoral nos relacionamentos mais
casuais e distantes do que nas relações mais íntimas, à exceção dos
cônjuges. Isso porque, nos debates em que a realidade social e as
opiniões dos falantes são divergentes, as pessoas tendem a ser mais
influenciadas – tendo seu posicionamento desafiado ou, até mesmo
alterado em razão dos argumentos expostos – o que não ocorre com
habitualidade em relações baseadas em laços fortes, uma vez que,
como já aludido anteriormente, pessoas que possuem tais laços
apresentam vivências muito semelhantes.
Importante mencionar, nesse sentido, que quanto mais for
diversificada a rede de laços fracos de um indivíduo, maior será a
quantidade de informações que divergem dos posicionamentos por
ele adotados, o que, certamente, pode influenciar seu voto, uma
vez que estará exposto à argumentação de outras pessoas, as quais
podem conduzi-lo a modificar suas convicções. É, inclusive, esse
verdadeiro amálgama de opiniões que dá suporte à hipótese de
que as redes sociais contribuem para a cultura da democracia, que
pressupõe a pluralidade.

JORNALISMO INDEPENDENTE, REDES SOCIAIS


E A AUTONOMIA DO ELEITOR

Outro fenômeno relevante para a análise dos efeitos das


redes sociais no processo eleitoral e na decisão política do votante,
é o emprego das plataformas relacionais para fins de divulgação de
notícias pela mídia alternativa. Como é cediço, com o advento da
internet, a mídia tradicional deixou de ser o único sistema informativo
existente, passando, então, a coexistir com outras formas de divulgação
de informação.
Nesses termos, é certo que houve uma diminuição da
importância da mediação do jornalismo tradicional na busca pela
formação da opinião política, o que, por sua vez, significou o
esfacelamento do monopólio da informação antes detido pela mídia
tradicional. Ademais, os próprios candidatos passaram a ser menos
dependentes da mídia tradicional para divulgar suas propostas e, até

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mesmo, responder a eventuais críticas feitas publicamente contra


si. Nessa toada, preleciona GOMES (2001, p. 4):
O mundo profissional da política, por exemplo,
passa a depender menos da mediação dos
agentes profissionais do jornalismo, dos
valores e critérios de noticiabilidade, da sua
rotina produtiva, da sua gramática expressiva,
dos seus interesses enquanto instituição
na medida que pode ele mesmo tornar
disponível a informação política ao usuário
cidadão. Da mesma maneira, a sociedade civil
institucionalmente organizada e até mesmo
a cidadania individual e privada desses novos
tempos podem encontrar na internet uma
forma de escapar à dependência dos media
tradicionais na disputa pela formação da
opinião política pública, na competição pelo
estabelecimento das prioridades da agenda
política, na formação de climas de opinião
e mobilizações para pressão a ser exercida
sobre o mundo da política e sobre os media
tradicionais.
Assim, o que se verificou com a ascensão da divulgação
de notícias sobre política por meios diversificados foi o aumento
substancial da autonomia do cidadão na gerência das informações
disponíveis, já que além de consultar meios diversificados de
divulgação de notícias, o cidadão tem acesso a matérias criadas
por comentaristas que possuem diferentes posicionamentos, que,
inclusive, representam, em se tratando da mídia alternativa, a opinião
própria daquele que redige o texto, não ficando o autor adstrito, como
ocorre muitas vezes, com o jornalista operante nas mídias tradicionais,
ao posicionamento adotado pela empresa em que trabalha, o que
contribui, também, para o pluralismo de opiniões. Nesses termos, o
indivíduo pode acessar quantas páginas julgar necessário, a qualquer
tempo, para que se mantenha informado (GOMES, 2001, p. 4):
Além disso, a informação na rede disponível ao
acesso on-line não é formada prioritariamente
por material circulante - isto é, por materiais

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referentes a um certo hiato de tempo, que


se tornam, portanto, rapidamente caducos,
de modo a estarem sendo constantemente
substituídos por novos materiais – mas por
material arquivado facilmente disponível. O
que significa que a formação da opinião e
da vontade política depende menos de um
acompanhamento diário e global da agenda
política, econômica e social do jornalismo
porque, em princípio esta informação
estará disponível on-line por um tempo
indeterminado, podendo o cidadão dela se
servir no momento em que sentir necessidade,
usando os critérios de edição e seleção que
considere adequados, estabelecendo os
nexos e contextos que a imprensa tradicional
normalmente não disponibiliza.
Não se torna forçoso repisar, neste seguimento, que o indivíduo
possui um aparato muito mais elaborado para que possa confrontar as
notícias e os posicionamentos a que é exposto, podendo, para tanto,
valer-se de inúmeras páginas existentes nas plataformas digitais de
divulgação de informações. Soma-se a isso a possibilidade de que o
usuário possa se desviar do conjunto de media disponíveis em seu
espaço físico, os quais podem ser corruptos e tendenciosos, uma vez
que, independentemente de sua localização geográfica, poderá ele
consultar os diversos meios por meio da internet (GOMES, 2001).
Importante mencionar, ainda, que a mídia tradicional também
passou a divulgar notícias por meio do ciberespaço, todavia, de
maneira mais fluida, contando com a participação do indivíduo
que, antes, tratava-se de mero expectador. Sobre isso, OLIVEIRA,
FERREIRA (2016, p. 7):
Esse processo de ressignificação da notícia nos
meios digitais e, nas redes sociais, acontece de
maneira oposta ao da construção “tradicional”
utilizada até então. A notícia ressignificada
pelas redes passa a ser (re)construída de forma
colaborativa e participativa a partir do momento
que é interpretada pelo interator. Nesse caso,

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o conceito de “cultura participativa” proposto


por Henry Jenkins (2009) se torna um ponto
focal para entender esse processo, uma vez que
destaca o esfacelamento das barreiras entre
emissor e receptor de conteúdo como principal
característica da “cultura participativa”.
Assim sendo, constata-se que as redes sociais, ao abrigarem
os veículos independentes de propagação de informações, também
ampliaram as possibilidades de que o eleitor tenha acesso a diferentes
leituras de um fato ou notícia, e, até mesmo, possa interagir na
construção desse conhecimento, conquanto não se afaste, como já
abordado em tópicos anteriores, as diversas limitações e reproduções
de desigualdades que as plataformas relacionais apresentam.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É fato que o ciberespaço, assim como as redes sociais nele


inseridas, modificaram permanentemente a forma com que as pessoas
se relacionam, se comportam e raciocinam. Há, praticamente, um
consenso de que as mídias sociais influenciam sobremaneira o modo
com que as pessoas se vestem, se alimentam, consomem produtos
e, também, informações dos mais variados gêneros, já que como se
buscou evidenciar no desenvolvimento do presente artigo, as redes
sociais deixaram em determinado momento de se limitarem ao lazer
dos indivíduos, tornando-se uma ferramenta utilizada, também na
formação da opinião pública, quer pelos efeitos gerados pelos laços
fracos presentes nas redes sociais, quer pelo crescente aumento da
presença do jornalismo e da mídia alternativa que diferentemente
dos veículos tradicionais, buscam construir a informação de maneira
dialética, incluindo o receptor da mensagem.
Nessa toada, intencionou-se analisar de que maneira as redes
sociais podem influenciar na decisão do eleitorado e em que medida
essas plataformas relacionais podem, ou não, auxiliar na efetivação
de uma democracia de viés deliberativo, sem contudo, deixar de
destacar a existência de diversas falhas, mormente, em relação à
exclusão digital que é uma vívida realidade.

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Sem embargo da inexistência de acesso igualitário às mídias


digitais em razão de seu alto custo, principalmente para as camadas
mais pobres da sociedade, é certo que a internet e as redes sociais,
por si sós, não desenvolveram tais assimetrias no acesso aos meios
de comunicação mais recentes, bem como à informação diversificada,
já que tais desigualdades são estruturais e, já permeiam a sociedade
muito antes de o próprio ciberespaço ser imaginado. Cabe a essas
novas tecnologias, então, o papel de buscar minimizar as discrepâncias
e colaborar cada vez mais por meio de incentivos, na democratização do
debate político e na ascensão da pluralidade de opiniões, providências
essas que podem incentivar o desenvolvimento de novas reflexões
e pesquisas ulteriores.

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