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Globalização e Modelos Econômicos de Estado
Globalização e Modelos Econômicos de Estado
Sumário
1. Introdução. 2. O que se denominou cha-
mar de globalização: a visão de Rubens Ricu-
pero. 3. O “novo” modelo de Estado: as ori-
gens do discurso liberalizante. 4. A forma de
atuação das empresas transnacionais: poder
paralelo ao Estado? 5. É o fim do Welfare State?
6. Conclusão: a opção por um Estado forte: Es-
tado indutor, normativo e regulador – uma
nova estatalidade (Republicização do Estado).
1. Introdução
Este trabalho tem como linha mestra o
livro de Gilberto DUPAS, Economia global e
exclusão social: pobreza, emprego, estado e o
futuro do capitalismo, em especial seu capí-
tulo quarto, ponto em que o autor se debru-
ça sobre a urgente demanda por um novo
Estado.
Articula-se, ademais, com leituras atu-
ais de ensaístas e economistas que estão a
se debruçar sobre a temática proposta, cada
um com seu enfoque próprio, como, por
exemplo, Joseph STIGLITZ (A globalização e
seus malefícios), Amartya SEN (Desenvolvi-
mento como liberdade) e Rubens RICUPERO
(O Brasil e o dilema da globalização).
Perpassa, ainda, a compreensão do pro-
grama de privatização instaurado no Bra-
sil, de forma mais organizada a partir da
Lei n o 8.031/90 (Programa Nacional de De-
Leandro Novais e Silva é Procurador do sestatização), que foi resultado da insurgên-
Banco Central do Brasil e Mestrando em Direi- cia de um modelo de Estado “consensual”
to Econômico pela UFMG. de retomada liberal. E desse ponto discute a
Brasília a. 41 n. 163 jul./set. 2004 331
instabilidade do modelo proposto e a ne- sobre o “Consenso de Washington”, con-
cessidade e a reivindicação crescente por um cepção uniformizadora prevalecente de eco-
Estado forte, retomando a idéia de um Esta- nomistas americanos que serviu de orienta-
do atuante e regulador. ção, e por vezes até de imposição, por meio
Nesse ponto, é significativo salientar, co- dos choques econômicos do Fundo Mone-
ordena-se bem a parte de ensaio do estudo tário Internacional – FMI, para readequa-
com o arcabouço teórico do Direito Econô- ção das economias dos países periféricos
mico, suas definições e categorias, em espe- (em desenvolvimento ou emergentes). Será
cial no que se relaciona com as normas jurí- hora também, nesse item, de realizar as pri-
dicas – efeito de juridicização do estrato eco- meiras objeções ao modelo sugerido e algu-
nômico –, que se releva pela política econô- mas vezes imposto, surgimento da instabi-
mica adotada, com o nítido viés ideológico. lidade da qual nos fala o título do trabalho.
Um novo modelo de Estado só surge, e de- O item 4 cuida de um dos efeitos mais
pois é questionado por sua instabilidade, importantes do processo globalizatório,
por ser resultado de um conjunto de idéias, qual seja, a concepção atual da empresa mul-
sobretudo econômicas (nos dias de hoje), tinacional, codificada nos anos 90 de em-
mas também políticas e culturais, que se for- presa transnacional, sua nova forma de atu-
mam com relativo consenso e constituem ação, em especial no que diz respeito à frag-
uma ideologia2. mentação da produção e à flexibilização dos
Assim, definido o escopo geral do arti- direitos trabalhistas. A empresa transnaci-
go, ver-se-á que o tópico 2 se propõe a discu- onal é ao mesmo tempo causa e efeito do
tir aquilo que se convencionou chamar de processo de globalização. Para que a pro-
globalização3, termo já enormemente citado, dução se espalhe, fragmente-se e ganhe es-
de inúmeras significações, que se encontra cala (processo que será explicado adiante),
desgastado, com significativa carga pejora- é indispensável uma redefinição econômi-
tiva, mas que, ainda assim, é o que melhor ca dos países periféricos, de liberalização
reflete o processo transformador da economia econômica, abertura dos mercados e priva-
por que passam os países centrais e periféri- tização maciça, razão pela qual a empresa
cos – na expressão de Gilberto DUPAS (1999). transnacional é também fomentadora do
É um processo que continua ou até se apro- processo globalizatório, associada às idéi-
funda, daí por que indispensável retomar as de Washington. De toda forma, sofre tam-
rapidamente suas características, seus efei- bém os efeitos da implementação desse dis-
tos benéficos e seus prejuízos, de forma a curso, adaptando-se às variações e realida-
contextualizar adequadamente o fenômeno, des econômicas de cada país que a recepci-
abrindo-se a oportunidade para a compre- ona. Por fim, caberá a pergunta nesse item,
ensão das raízes do modelo liberalizante de sobre o poder constituído por essas empre-
Estado. Esse item baseia-se no trabalho de sas, se ele é suficiente a rivalizar com o po-
Rubens RICUPERO (2001). der estatal. E quais os efeitos dessa eventual
No item 3, debate-se as origens do dis- constatação em face do funcionamento na-
curso liberalizante, é dizer, a forma de defi- tural do Estado, da perda de poder de inge-
nição e de atuação de um Estado liberal ou rência, controle, regulação e indução da ati-
neoliberal (o Estado como veículo das con- vidade econômica. Seria a derrocada da es-
cepções liberais que se formaram), constru- tatalidade?
ído entre os anos 80 e 90, de inspiração niti- O tópico seguinte tem o propósito de res-
damente americana e inglesa, decorrente dos ponder à indagação feita no parágrafo an-
governos de Ronald Reagan nos Estados terior. Compreender se houve ou não uma
Unidos e Margareth Thatcher na Inglaterra. verdadeira redução do Estado do bem-estar
É significativo aqui dizer algumas palavras social. Como o Estado pôde responder à in-