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IMPACTO DO CASAMENTO TRADICIONAL NA CONSERVAÇÃO DOS

VALORES CULTURAIS DOS OVIMBUNDU: UM ESTUDO DE CASO NO


MUNICÍCIO DO HUAMBO.

Autora: MANUEL SAMBALANGA KAPINGALA 1

Introdução

“Quem educa uma mulher, educa um povo”. Este provérbio africano de um autor
desconhecido citado por Santos (2017, p. 1), possui um conhecimento a partir do contexto
do papel social da mulher, e este sustenta a centralidade da família atrás do casamento
tradicional, como forma de preservação dos valores culturais dos povos africanos.

O casamento tradicional é um costume que consiste na celebração de uma cerimónia em


que o homem se torna esposo da mulher, mediante rituais entre duas famílias, tendo em
conta os costumes familiares”(Melo, 2018). Assim, Mundombe (2011), define o
casamento tradicional como uma aliança legítima entre as duas famílias que une linhagens
familiares sem a intervenção das autoridades.

O casamento tradicional na cultura ovimbundu, constitui uma cerimónia de capital


importante, pois nela, reside a preservação dos valores culturais e garante a continuidade
da raça humana, na fortificação das famílias, da sociedade e do Estado.

A problemática do tema, está associado ao facto de que os ritos praticados no


continente africanos no geral constituem uma simbologia ou uma identidade para
salvaguarda do bem-estar das comunidades, felicidades e união. Portanto, tendo em conta
a globalização, tem vindo a por em causa a salvaguarda dos ritos associado ao casamento
tradicional na cultura dos Ovimbundu, adulterando a essência principal do casamento
tradicional nesta cultura. E isto faz com que muitas vezes o casamento deixa de ter a
essência da harmonia de valores culturais, muitos estão focados nos bens económicos, e
como consequência compromete a felicidade e união permanente dos casais.

Assim, com base nesta problemática elaborou-se os seguintes problemas


científicos: Que benefício tem, o casamento tradicional na cultura dos Ovimbundu
no município do Huambo, para a vida futura do casal e das famílias? E o que é

1
Huambo-Angola/2023
Licenciado em contabilidade e Auditoria
necessário para a conservação dos valores culturais do casamento tradicional na
cultura dos Ovimbundu?

Desta forma, para responder os problemas científicos elaborados, elaborou-se o


seguinte objectivo geral: compreender o impacto que o casamento tradicional na vida e
na conservação dos valores na cultura dos Ovimbundu. E tem como objectivos
específicos: i)-Realizar um marco teórico sobre o impacto do casamento tradicional na
cultura dos Ovimbumdu; ii) -Identificar os Benefícios do casamento tradicional na
cultura dos Ovimbundu na vida social do casal e das famílias; iii) - Analisar a influência
da globalização, no casamento tradicional do na cultura dos Ovimbundu e; iv) -
Estabelecer medidas para a conservação dos valores culturais do casamento tradicional
no município do Huambo.

Justificativa

A escolha do presente tema em estudo, justifica-se pelo facto de que enquanto


africanos temos uma identidade cultural, ritos e hábitos que nos diferencia de outros
continentes, entres eles o casamento tradicional ou simplesmente o alambamento. Esta
tradição constitui para os povos (Ovimbundu) um rito muito importante na conservação
de valores, e consequentemente na união social, educacional e sobretudo no respeito entre
as diversas famílias, tribos e povos. E em Angola, em todas as tribos em particular o povo
Ovimbundu, o casamento tradicional constitui um rito muito importante e indispensável
na união entre duas pessoas do sexo oposto. Pois na ausência do casamento tradicional,
descarta-se outros tipos de casamento (Civil e religioso) não existe nenhum outro
casamento.

Estrutura do trabalho: Após a introdução, o presente trabalho será estruturado


em (3) três capítulos. O primeiro capítulo fará referencia a fundamentação teórica sobre
o impacto do casamento tradicional na conservação dos valores. O segundo, descreverá
a metodologia de pesquisa com vista a alcançar os objectivos estabelecidos e responder
o problema científico, desde os métodos, a pesquisa quanto aos objectivos,
procedimentos, problema, população e amostra, instrumento de recolha de dados bem
como os instrumentos de tratamento de dados. O terceiro capítulo, fará menção à
apresentação e análise dos resultados que serão obtidos ou recolhidos, e por último, terá
as conclusões, Limitações do estudo e sugestões.
1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1 A Origem e significado do casamento tradicional “Alambamento”

Segundo Batsikama, o termo alembamento é aportuguesado vem de Lemba: que quer


dizer que pede a mão da futura noiva. Alembada, é a noiva. Conceituou o termo cultural
como a identidade do homem que a constituição defende.

Segundo dados antigamente, quando um jovem gostasse de alguém a primeira coisa


era dar a conhecer nos tios o seu sentimento por aquela pessoa, naquela altura não era
permitido ter relações sexuais (Raúl, 2022) .

Segundo a definição de Santos, “a palavra casamento derivou da palavra casa, que em


latim significa: cabana tenda, prédio rústico, pequena quinta. É a união de duas pessoas
de sexos diferentes, que vão viver juntos numa casa”.

O autor afirma ainda que, os tios do rapaz avaliavam o comportamento da moça e a


sua linhagem familiar. Depois de chegarem a um acordo familiar os pais do pretendente,
dirigiam-se aos pais da moça, alegando que seu filho gostou da filha deles e levavam um
valor monetário, símbolo de união dos dois.

A partir daquele momento, os pais da noiva, levavam ao conhecimento da


comunidade que a sua filha está ocupada e aumentam o controlo sobre ela. Passando
algum tempo, os tios da menina enviavam a carta a descriminar os artigos que devem
apresentar como dote (alambamento). A família do rapaz então prapara-se e marca a data
do encontro com a contraparte, munidos dos artigos e valores monetários exigidos pela
família da moça como dote, (Ovilombo)

Entre estes artigos, há um fato do pai, outro para mãe, panos e roupas para as tias, um
litro de aguardente, o Owalende , um garrafão de vinho tinto, grades de gasosa, igual
quantidade de cerveja e tabaco em rama ou volume de cigarros e fosfóros. A seguir dava-
se conselhos de como viver na sociedade ambas famílias aos recém-casados.

1.2 Conceitos fundamentais

Podemos definir o casamento, seja ele religioso, civil ou costumeiro (tradicional;


alembamento), como uma das instituições mais antigas oriundas do costume. Esta prática
é por norma incentivada por um direito ou dever moral, religioso ou por dignidade. Para
alguns cidadãos, o casamento é uma das condições para obter alguns direitos dentro de
uma comunidade, de um estado ou de país.
Casamento é, basicamente, um acordo entre duas pessoas que implicam direitos e
deveres recíprocos. Trata-se, no entanto, de um acordo complexo, já que além de envolver
pressupostos sentimentais, engloba todo um conjunto de relações mais objectivas, onde
se destacam as de carácter patrimonial (Limo, 1999, p. 348).

O alambamento é a união matrimonial acompanhada de uma formalidade ritual que


confere o valor jurídico a união segundo o direito consuetudinário (Raúl, 2022).

O casamento tradicional é um processo em que os aspectos económicos, sociais e


religiosos, estão muitas vezes misturados, sendo por isso difícil eliminar a linha divisória
das águas.

Desta feita, Mbambi (2005, p. 70), define o casamento tradicional ou


“alembamento” como um neologismo criado pelos angolanos para preencher a lacuna
verificada na língua portuguesa para designar Ovilombo que significa (pedido de
casamento) de Umbundu para o português significa pedir". E Ribeiro (S/D, p. 4) define o
casamento tradicional como a união de, dois indivíduos que compartilham necessidades
e beneficiam-se mutuamente, formando uma sociedade e uma comunhão de vida".

No casamento tradicional cada um exerce a sua função de acordo o gênero.


Ninguém pode exercer o papel que não lhe pertence. Ou seja, a mulher por mais poderosa
ela for, nunca é proibida desrespeitar o seu marido. Portanto, não existe o casamento sem
o cumprimento de todos os deveres culturais nem a representação dos rituais de cada
região.

Portanto todos os conceitos sobre casamentos, terminam sempre em apresentar o


homem e a mulher como os pilares que sustentam esta afirmação para a progressão da
humanidade tal conforme consta no livro sagrado acima (Bíblia Sagrada) no seu livro de
gênese 2:24 "homem deixa o seu pai e à sua mãe e se une a sua mulher, e os dois se
tornam um só ser ou uma só carne". Na verdade Tornar-se uma só carne ou um só ser,
presume-se como viver e partilhar todos os momentos bons e maus sobre o mesmo teto e
sentir a dor e alegria do seu parceiro ou parceira como se fosse o seu.
1.3 Rituais do casamento tradicional como forma de conservação dos valores
culturas

Os casamentos tradicionais em Angola obedecem a muitos aspectos importantes,


simbólicos e solenes, quer seja para a noiva ou noivo, para a família da noiva ou do noivo,
ou para todos os participantes envolvidos. De acordo com Soba Tchiteculu, na operação
ovilombo, alguns tecidos africanos (geralmente tecidos congoleses) foram substituídos
pelas cerimônias de recepção do noivo.

É uma espécie de tapete ou tapete para mostrar respeito pela família. Antes de a
tia da noiva do noivo entrar, a família do noivo é obrigada a depositar dinheiro para entrar
no território dos pais da noiva.

Na casa da noiva ou no local escolhido para o casamento, o noivo é cercado pelas


tias da noiva, que se preparam como se fossem um rei. Limpe seus sapatos, descubra os
fatos, limpe sua testa. Na sala de conferências, a família do noivo está à direita e a família
da noiva à esquerda. No altar frontal e central, há duas cadeiras para os noivos. A
cerimônia começa de acordo com a carta do pedido.

O anfitrião da família da noiva inicia a cerimônia, esperando dar as boas-vindas à


família do noivo e convidá-los a falar. Por outro lado, o porta-voz do noivo explicou os
motivos que os levaram a ir à casa da noiva, embora os fatos sejam bem conhecidos. Em
seguida, apresentou todos os familiares que o acompanhavam.

1.4 A importância do alambamento e o seu impacto na vida social

O alambamento é extremamente importante para o futuro casal, visto que as duas famílias
se entrosam através dos noivos e estes têm a possibilidade de ouvir os velhos conselhos
e experiências que lhes serão indispensáveis na vida a dois. Por favor angolanos não
percam está cerimónia tão especial, honrosa e inesquecível na vida e que nos identifica
como angolanos” (Florindo, Citado por Raúl, 2022).

Desde a antiguidade o casamento tradicional constituiu e constitui para os povos


africanos de modo geral, um rito muito importante na união das famílias, valores, respeito
e sobretudo, na conservação do respeito entre famílias, na criação e preservação da raça
humana, pois que não se pode falar da continuidade do ser humano por intermédio da
reprodução sem falar da união de duas pessoas de sexos opostos.
Os ritos no casamento tradicional, constituem a simbologia mais importantes na
celebração, onde apresenta-se as coisas da carte e a mulher é tapada com um pano junto
as outras duas primas, e o homem terá de identificar a sua companheira, caso erre, é
obrigado a pagar uma multa, da mulher, dote, entre outros ritos, representando simbólicos
na celebração (Mundombe, 2011).

O alembamento na cultura Ovimbundu vai muito além de anel no dedo, muito


além de um joelho dobrado apoiado no chão. É um enlace de grande importância, uma
vez que enaltece a família e é visto como o ‘pilar’ da felicidade. Em muitos casos tem
apresentado o mesmo objectivo, colocando de parte apenas os ritos como demostração de
hábitos e costumes de qualquer povo.

O alambamento tradicional tem uma linguagem, tanto na família da noiva e na


família do noivo. O que vai explicar o comportamento da futura noiva é a quantidade das
coisas pedidas pela família dela. Assim, a menina se for preguiçosa, gatuna, boateira,
apaixonadora ou outros vícios, a carta de pedido vem fraca e será o contrário se tiver um
bom comportamento preciso, por mais que não for bonita a carta virá com todos itens que
diz a tradição para o bom alambamento. Na recepção do dote, a família da noiva ficará
muita atenta, para observar cuidadosamente os bens trazidos.

Nesta se a menina não for higiénica as peças de vestuário virão sujas e outro caso
mais pesado é quando a menina, não conservar a sua castidade antes do encontro com o
noivo. Aí, as garrafas de vinho virão tapadas a caroços de milho e não seladas, e os lenços
furados, logo, as tias da menina pretendida, tem a responsabilidade de educar a menina
em todos sentidos para não envergonhar a família no dia do alambamento.

Na cultura dos Ovimbundu reprova-se de igual modo, a atitude de fechar as


miúdas nos quartos de seus namorados para os familiares da mesma em concordância
com membros das igrejas, legalizar está união. Segundo a Anciã este procedimento é o
sinónimo de incapacidade financeira, falta de educação ou os que praticam isto, vivem
fora das orientações de seus familiares.

O alambamento tem uma grande importância no Kutenda, pois, quando alguém


pretende uma menina tem de dar alguma coisa para ter mais respeito, e considerar a sua
verdade. José Kaivala, afirma que actualmente as coisas que são entregue no
alambamento que têm ocorrido no Kutenda são: oito (8) grades de cerveja e gasosa,
panos, fatos para os pais, um chapéu, sapatos, dois litros de óleo, sabão e pequeno valor
de dinheiro. Os mais velhos no passado não deixavam que a sua filha casasse sem lhe dar
nada. Para com a família do futuro noivo é mais para terem o respeito de que são potentes
em económia, no facto de conseguir de dar tudo que lhes foram pedidos.

1.5 O valor do alambamento hoje

Hoje o alambamento perdeu o valor, a sociedade e em geral, não prevê as


consequências vindouras na vida desse casal que se uniu sem o consentimento da família
da miúda ou sem dar o alambamento exigido. O possível perigo que pode acontecer com
o casal cuja união é desconhecida por duas famílias é: falta de procriação e morte precoce
de crianças, por vezes provocadas por famílias da mulher, na tentativa de esperar até
quando este marido e sua família vão reconhecer e respeitar os progenitores de sua noiva.
Alguns familiares por falta de alambamento, como símbolo de valorizar a noiva
sacrificam as crianças do casal até quando reconhecer os pais de sua mulher.

“hoje o que está em causa para nós é a medição de capacidades económica, isto é,
na riqueza. Se o alambamento exigido na família do futuro noivo não conseguir é o sinal
de não conseguir cuidar bem a nossa filha”. O dia de hoje pode-se muito bem, casar a
maneira tradicional, porque uma sociedade sem usos e costumes, não podem existir, basta
ter paciência às etapas exigidas.

Os valores monetários e os produtos que a família da noiva pede são símbolos.


Mesmo que, em primeira vista é exagerada, isto é, para criar o clima ao diálogo.
Actualmente o alambamento é uma grande festa que se confunde com uma festa de
casamento, pois envolve uma quantidade exagerada de bens, sobretudo alimentares.

Em Cabinda por exemplo o alambamento é uma fortuna, é preciso dar 20 grades


de cerveja, dez para cada lado, porque eles pedem tudo a dobrar, 10 grades para cada
família paterna e materna, cada um faz a sua festa, um fato do pai uma peça de pano, um
par de chinelas, dinheiro, vinho e muito mais.

Ainda em algumas áreas dona cultura dos Ovimbundus, o alambamento entrega-


se: duas grades de cerveja e gasosa, dois (2) litros de vinho, dez (10) kilogramas de fuba,
uma galinha, um balde de quissangua e vaselina. O alambamento tem grande valor, nunca
se divorciar, se por acaso acontecer o futuro marido desta divorciada tem obrigação de
devolver os gastos do alambamento.
1.6 Vantagens do alambamento tradicional na cultura dos Ovimbundos

O alambamento tradicional tem muita vantagem. Para além de valorizar as duas


famílias valoriza igualmente o futuro casal que se respeitam. A principal vantagem do
alambamento tradicional, consiste no facto das duas famílias comungarem ideias para
solucionar os possíveis problemas e dificuldades deste recém-casado. A família da mulher
dá mais respeito ao genro que deu alambamento, a própria mulher de seu marido obedece
normalmente as orientações do esposo e seus sogros.

O alambamento é uma cultura que identifica o povo angolano, fico chateado com
certas famílias que estão a estragar esta bela cultura, por favor não estraguem o que os
nossos antepassados deixaram, ela faz parte da nossa identidade (Mungongo, 2011, p 89).
O alambamento marca o respeito para a família da mulher e que ninguém pode vir mais
nessa mulher com a ideia de lhe pedir namoro. Se a filha for alambada, no seu casamento,
a família dela passa a confiar que o noivo e sua família irão de assumir a nossa filha nas
possíveis dificuldades vindouras.

O alambamento é um ritual muito lindo e respeito, espero cumprir quando for o


momento. Tal como uma sociedade que seja Angola também tem cultura própria e o
alambamento se destaca entre as quais, casamento ritual ou simplesmente alambamento
(Jorge, 2011 p 67). Concordamos com Jorge, que o alambamento é um ritual que
identifica o povo angolano, é necessário cumprirmos com este ritual, pois vem sendo
praticado desde os nossos antepassados. O alambamento é nossa identidade cultural e
temos de cumpri-lo como manda a tradição, conforme diz o eufuísmo histórico, não existe
povo sem cultural

Bibliografia
Malumbu, M. (2005). Os Ovimbundu de Angola: Tradição-Economia e cultura
organizativa. Roma: Edizioni Vivere.
Mundombe, A. (2011). Casamento Tradicional na Cultura Umbundu. Jornal de Angola,
s/p.
Neto, T. J. (2014). História da Educação e Cultura de Angola: Grupos Nativos,
Colonização e a Indenpendência. Luanda: ZAINA EDITORES.
Raúl, T. M. (2022). A IMPORTÂNCIA DO ALAMBAMENTO NO CASAMENTO
TRADICIONAL, NA ETNIA DOS OVIMBUNDU DO KUTENDA. Angola-
Lubango.
Venan, & Santos, V. (2017). CASAMENTO TRADICIONAL. Luanda.

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