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Amostra Avaliacao Multidimensional Do Idoso 4ed
Amostra Avaliacao Multidimensional Do Idoso 4ed
4ª SA
VI
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IÇ E
ÃO AM
Coleção Guia de Bolso em
· 2 PL
01 IAD
Coleção Guia de Bolso em Geriatria e Gerontologia
4 A
Geriatria e Gerontologia
Avaliação
Livro 1. Avaliação Multidimensional do Idoso
Multidimensional
Disponível também
na versão ebook
a partir de julho/2014
Disponível a
partir de Julho
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Avaliação iBooks Store
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Avaliação Multidimensional do Idoso contém galerias,
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impossível na forma impressa, facilitando o ensino e
a aprendizagem dos principais aspectos da Geriatria
e da Gerontologia. Nesta versão, há possibilidade de
visualização de filmes que mostram a aplicação dos
principais instrumentos de avaliação do idoso em
pacientes reais, exemplificando testes normais e
alterados. Todos os filmes são legendados e contêm
a discussão dos erros e acertos mais frequentes na
sua realização.
Avaliação
Multidimensional do Idoso
4a edição
Direitos exclusivos
Copyright © 2014 by
Folium Editorial
Av. Carandaí, 161 - sala 702
30130-060 - Belo Horizonte - MG
Tel. (31) 3287-1960
e-mail: folium@folium.com.br
www.folium.com.br
Ficha catalográfica
ISBN 978-85-88361-74-4
1.Geriatria. I. Título. II. Série. III. Moraes, Flávia Lanna.
NLM WT 100
CDU 616-053.9
2. A Entrevista Geriátrico-Gerontológica............................ 27
3. Avaliação Multidimensional do Idoso............................. 35
Funcionalidade Global........................................................................... 37
Sistemas Funcionais............................................................................. 42
Cognição.............................................................................................................. 43
Humor / Comportamento..................................................................................... 61
Mobilidade............................................................................................................ 72
Comunicação....................................................................................................... 90
Sistemas Fisiológicos............................................................................ 99
Saúde bucal........................................................................................................ 105
Sono.................................................................................................................... 106
Nutrição............................................................................................................... 108
Avaliação Sócio-Familiar...................................................................... 115
Exame Físico do Idoso......................................................................... 116
Ectoscopia........................................................................................................... 118
Sistema cardiovascular....................................................................................... 127
Sistema respiratório............................................................................................. 132
Sistema gênitourinário......................................................................................... 132
Sistema gastrointestinal...................................................................................... 132
Sistema nervoso.................................................................................................. 135
Sistema músculo-esquelético............................................................................. 143
4. Diagnóstico Geriátrico-Gerontológico
e Plano de Cuidados..........................................................157
5. Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional (IVCF).........171
Referências bibliográficas................................................... 181
1. BASES CONCEITUAIS
DA SAÚDE DO IDOSO
1
reto e bem feito), esta informação isolada não deixa claro o quadro funcional do
idoso. Indivíduos com o mesmo diagnóstico clínico podem ter a capacidade
funcional absolutamente distinta um do outro. Assim, a fronteira entre os concei-
tos de saúde, doenças, dependência e incapacidades deve estar bem definida.
Na tentativa de contribuir para a elucidação desse contexto, em 2001 a
Organização Mundial de Saúde, responde a essa demanda e aprova, em sua
54ª Assembléia, a utilização da Classificação Internacional de Funcionalidade,
Incapacidade e Saúde (CIF), em complementação à CID. Além de estabelecer
uma linguagem comum e internacional entre os profissionais na clínica e em
pesquisas, a CIF tem a proposta da compreensão da saúde e da funcionalida-
de a partir de três componentes inter-relacionados: estrutura e função do
corpo (refere-se às partes anatômicas e as funções fisiológicas e psicológicas
dos sistemas corporais), atividade (capacidade de realizar ações e tarefas em
diferentes contextos) e a participação social (envolvimento do indivíduo na
sociedade). Nesse modelo, o processo de saúde e funcionalidade é resultante
da interação dinâmica entre estas três dimensões, que são influenciadas pelos
fatores contextuais, pessoais, sociais e ambientais do indivíduo (Organização
Mundial da Saúde, 2003). Assim o modelo teórico proposto pela CIF possibili-
ta a compreensão do impacto do processo de envelhecimento nas diferentes
dimensões da saúde e suas consequências funcionais, para que os profissio-
nais da saúde possam direcionar suas intervenções de acordo com as neces-
sidades específicas do indivíduo.
Dessa forma, a saúde pode ser definida como uma medida da capacidade
de realização de aspirações e da satisfação das necessidades e não simples-
mente como a ausência de doenças. A maioria dos idosos tem doenças ou
disfunções orgânicas que, na maioria das vezes, não estão associadas à limita-
ção das atividades ou à restrição da participação social. Assim, mesmo apresen-
tando doenças, o idoso pode continuar desempenhando as suas atividades e os
papéis sociais. O foco da saúde está estritamente relacionado à funcionalidade
global do indivíduo, definida como a capacidade de gerir a própria vida e de
cuidar de si mesmo. A pessoa é considerada saudável quando é capaz de reali-
zar as tarefas do cotidiano, de forma independente e autônoma, mesmo na
presença de doenças (Moraes, 2009; Ramos, 2003). Faz-se necessário definir
também a diferença entre capacidade funcional e desempenho funcional. A
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) utiliza
os termos desempenho funcional para descrever o que o indivíduo consegue
fazer no seu ambiente habitual, ou seja, no contexto real que vive, já a capacida-
2
de funcional é testada por instrumentos ou testes específicos em ambientes
controlados (CIF, 2003).
A portaria que institui a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa consi-
dera que “o conceito de saúde para o indivíduo idoso se traduz mais pela sua
condição de autonomia e independência do que pela presença ou ausência de
doença orgânica” (Brasil, 2006). Bem-estar e funcionalidade são complementa-
res. Representam a presença de autonomia (capacidade individual de decisão e
comando sobre as ações, estabelecendo e seguindo as próprias convicções) e
independência (capacidade de realizar algo com os próprios meios), permitindo
que o indivíduo cuide de si e de sua vida. Cabe ressaltar que a independência e
a autonomia estão intimamente relacionadas, mas são conceitos diferentes.
Existem pessoas com dependência física, mas capazes de decidir e escolher
com autonomia as atividades de seu interesse. Por outro lado, há pessoas que
têm condições físicas para realizar determinadas tarefas do cotidiano, mas não
têm condições de decidir e escolher com segurança sobre como, quando e onde
se envolver nestas atividades. A perda da independência nem sempre vem asso-
ciada com a perda de autonomia: um idoso com perda da capacidade de deam-
bular, pode perfeitamente gerenciar sua vida com autonomia e participação
social. Assim, a funcionalidade global é a base do conceito de saúde do idoso.
O declínio funcional é a perda autonomia e/ou da independência, pois restringe
a participação social do indivíduo. Por sua vez, a independência e autonomia
estão intimamente relacionadas ao funcionamento integrado e harmonioso dos
seguintes sistemas funcionais principais (Moraes, 2012).
• cognição: é a capacidade mental de compreender e resolver adequada-
mente os problemas do cotidiano;
• humor/ comportamento: é a motivação necessária para a realização das
atividades e/ou participação social. Inclui também o comportamento do
indivíduo, que é afetado pelas outras funções mentais, como a senso-
-percepção, o pensamento e o nível de consciência.
• mobilidade: é a capacidade individual de deslocamento e de manipula-
ção do meio. Por sua vez, a mobilidade depende quatro subsistemas fun-
cionais: a capacidade aeróbica e muscular (massa e função), o alcance/
preensão/pinça (membros superiores) e a postura, transferência e mar-
cha. A continência esfincteriana é também considerada um subsistema
da mobilidade, pois a sua ausência (incontinência esfincteriana) é capaz
de interferir na mobilidade, restringindo a participação social do indivíduo;
3
• comunicação: é a capacidade estabelecer um relacionamento produtivo
com o meio, trocar informações, manifestar desejos, ideias e sentimen-
tos. Depende de três subsistemas funcionais: visão, audição e produção/
motricidade orofacial. Este último é representado pela voz, fala e masti-
gação/deglutição.
4
FUNCIONALIDADE
Atividades de Vida Diária (AVD básicas, instrumentais e avançadas)
IMOBILIDADE
5
Fragilidade: uma nova proposta conceitual e operacional
O termo fragilidade é utilizado para representar o grau de vulnerabilidade do
idoso a desfechos adversos, como institucionalização, dependência ou morte.
Todavia, apresenta várias definições, dificultando sua aplicação na prática clíni-
ca. O desafio atual é a operacionalização do conceito de fragilidade, a fim de
permitir o seu reconhecimento e estabelecer intervenções capazes de maximizar
a independência e autonomia do indivíduo e impedir ou retardar o surgimento de
desfechos adversos (Clegg, 2013; Cesari, 2014; Gordon, 2014).
Fried, em 2001, definiu fragilidade (frailty) como sendo uma síndrome geriátri-
ca, de natureza multifatorial, caracterizada pela diminuição das reservas de energia
e pela resistência reduzida aos estressores, condições essas que resultam do
declínio cumulativo dos sistemas fisiológicos. A partir deste conceito, desenvolveu
o “fenótipo da fragilidade”, caracterizado pela presença de três ou mais dos seguin-
tes critérios: perda de peso, fatigabilidade (exaustão), fraqueza (redução da força
muscular), baixo nível de atividade física e lentificação da marcha. A presença de
três ou mais parâmetros definiu o “idoso frágil”, e a presença de dois parâmetros
definiu o idoso “pré-frágil”. Os idosos que não apresentaram nenhuma destes
parâmetros são considerados robustos. Para a definição deste fenótipo, os autores
realizaram um estudo de base populacional, onde foram excluídos os idosos por-
tadores de doença de Parkinson ou usuários de Levodopa, acidente vascular
cerebral (AVC), Mini Exame do Estado Mental (MEEM) menor que 18 pontos, uso
de anticolinesterásicos para demência de Alzheimer (Donepezil) e de antidepressi-
vos. Este fenótipo da fragilidade ou “frailty” esteve presente em cerca de 7% dos
idosos e foi maior com o aumento da idade, sexo feminino, baixo nível sócio-eco-
nômico, presença de comorbidades, particularmente, o diabetes mellitus, doenças
cardiovasculares, respiratórias e osteoarticulares. A prevalência de idosos “pré-
-frágeis” e “robustos” foi de 47% e 46%, respectivamente. O fenótipo da fragilidade
foi um preditor independente para o risco de quedas, piora da mobilidade, depen-
dência funcional, hospitalização e morte (OR: 1,86 a 4.46) (Fried, 2001; Fried, 2004).
Em 2004, FRIED fez uma distinção entre fragilidade, comorbidades e depen-
dência (incapacidade). Estas três condições crônicas de saúde são caracteriza-
das por uma maior vulnerabilidade e maior complexidade clínica, exigindo cuida-
dos especializados. Incapacidade funcional ou dependência foi definida como a
dificuldade para a realização de tarefas essenciais para uma vida independente,
incluindo as atividades de auto-cuidado e as domiciliares, com necessidade da
ajuda mecânica ou de outra pessoa. O nível dependência para a realização des-
6
sas tarefas é variável para cada indivíduo, podendo ser parcial ou total. Além de
um fenômeno social, a incapacidade funcional pode ser considerada como um
complexo problema no qual todos os profissionais de saúde deveriam estar
envolvidos e comprometidos em sua resolução. Estima-se que 20 a 30% dos
idosos residentes na comunidade apresentem dependência para as atividades
instrumentais de vida diária (preparo de refeições, fazer compras, cuidar das
finanças, etc) ou para as atividades básicas de vida diária (tomar banho, vestir-se,
uso do banheiro, etc). Esta prevalência aumenta progressivamente com o passar
dos anos. Alto grau de dependência em AVD básicas está presente em 5% dos
idosos. A incapacidade funcional é resultante de doenças ou comorbidades mais
frequentes nos idosos e de alterações fisiológicas do envelhecimento, que atuam
de forma independente ou, mais provavelmente, têm um efeito sinérgico. Cerca
de 50% das causas de dependência funcional desenvolvem-se agudamente, de
forma catastrófica, como o acidente vascular cerebral ou a fratura de fêmur. A
incapacidade funcional é também um fator de risco para desfechos negativos ou
eventos adversos, como a piora da mobilidade (“imobilidade gera imobilidade”),
maior risco de hospitalização, maior custo e maior mortalidade. Por sua vez, a
síndrome da fragilidade é um estado fisiológico de alta vulnerabilidade para des-
fechos negativos, como incapacidades, dependência, quedas, institucionaliza-
ção e morte. É a expressão do acúmulo de déficits múltiplos associados ao
envelhecimento fisiológico ou de doenças subclínicas, capazes de comprometer
os sistemas fisiológicos, reduzindo a reserva homeostática. A prevalência desta
síndrome também aumenta com o envelhecimento e está presente em cerca de
30% dos octagenários. A definição de comorbidades utilizada pela autora é a
presença simultânea de duas ou mais doenças no mesmo indivíduo, com base
em critérios diagnósticos bem estabelecidos, dentre nove doenças pré-defini-
das: hipertensão arterial (HAS), diabetes mellitus (DM), doença pulmonar obstru-
tiva crônica (DPOC), doença arterial periférica, câncer, artrite, insuficiência car-
díaca (ICC), doença arterial coronariana e infarto agudo do miocárdio (IAM). Nos
EUA, aproximadamente 48% dos idosos são portadores de artrite, 36% de HAS,
27% de ICC, 10% de diabetes mellitus e 6% de AVC. Desta forma, cerca de
35,3% dos idosos americanos com idade entre 65 e 79 anos são portadores de
duas ou mais doenças. Após os 80 anos, a prevalência de comorbidades chega
a cerca de 70,2%. Estima-se que dois terços dos idosos apresentem duas ou
mais comorbidades, e um terço tenha quatro ou mais comorbidades.
Fried demonstrou que a superposição entre estas três entidades foi elevada.
No entanto, a diferenciação entre elas é fundamental para a definição do plano de
7
cuidados, com intervenções específicas para cada uma delas, seguindo uma
priorização de cuidados. Intervenções direcionadas a uma comorbidade podem
afetar negativamente outra comorbidade (American Geriatrics Society, 2012). O
idoso frágil apresenta menor reserva homeostática e é mais vulnerável a reações
adversas a drogas, a procedimentos médicos invasivos e a internação hospitalar.
Assim, fragilidade e comorbidades são preditores de incapacidade funcional. Por
sua vez, o nível de dependência pode exacerbar a fragilidade e as comorbidades.
E ainda, as comorbidades podem contribuir para o desenvolvimento da fragilida-
de. Esta interdependência caracteriza a síndrome de fragilidade como multifatorial
e com desenvolvimento em espiral. A coexistência de fragilidade, comorbidades
e dependência foi observada em 21,5% dos idosos (Fried, 2004). A autora chama
atenção para o fato de que 26,6% dos idosos apresentavam a fragilidade de forma
isolada, sem comorbidades ou dependência, justificando a necessidade de ser
entendida como uma síndrome clínica específica. No modelo que propomos, a
dependência, as comorbidades e a “fragilidade física” estão incluídas na
Fragilidade Clínico-Funcional. Por sua vez, a fragilidade clínico-funconal e a sócio-
familiar são partes indissociáveis da fragilidade multidimensional (Figura 2).
FRAGILIDADE
MULTIDIMENSIONAL
Fragilidade
Clínico-Funcional
Dependência Comorbidades
(Incapacidades)
Fenótipo da Fragilidade
Fragilidade física
Frailty
Fragilidade
Sócio-Familiar
8
O mecanismo fisiológico discutido e descrito por Fried, justificando o fenótipo de
fragilidade, tem como principal determinante a sarcopenia e as alterações imunológi-
cas e neuroendócrinas. Neste caso, a síndrome de fragilidade está também associa-
da à presença de alterações nos índices dos marcadores inflamatórios como o
aumento da interleucina-6 (IL-6), proteína C reativa (PCR) e fator de necrose tumoral
(TNF-α), e de marcadores hormonais como a redução do hormônio do crescimento
(Insulin-like-growth-factor/ IGF-1), do sulfato de dehydroepandrosterona (DHEA) e
dos hormônios esteroidais (estrógeno e testosterona). A fragilidade seria resultante
do processo de envelhecimento e representaria a fronteira entre o envelhecimento
fisiológico (senescência) e patológico (senilidade). Todavia, esta abordagem fenotípi-
ca defendida por Fried valoriza excessivamente a dimensão física (Lacas; Rockwood,
2012) e o conceito de fragilidade foi encapsulado no fenótipo da fragilidade, limitando
sua utilização e aplicabilidade clínica (Martin, Brighton, 2008).
Por outro lado, o modelo de fragilidade desenvolvido por Rockwood, em 2005,
no Canadian Study of Health and Aging , tem como princípio a importância da
presença de déficits cumulativos, expressados através do Índice de Fragilidade (IF)
e apresenta caráter multidimensional. O IF é uma medida ponderada do acúmulo
individual de 30 a 70 déficits clínicos, que incluem doenças específicas (insuficiência
cardíaca congestiva, hipertensão arterial, acidente vascular encefálico, infarto
agudo do miocárdio, doença de Parkinson, câncer, etc), sinais e sintomas (tremor,
bradicinesia, cefaleia, síncope, etc), perdas funcionais (dependência nas atividades
de vida diária, problemas de memória, problemas de humor, alterações da marcha
e equilíbrio, quedas, imobilidade, incontinência urinária, etc). Cada item recebe um
“peso”, que varia de zero a um, representando a sua frequência ou gravidade. O
índice é calculado dividindo-se o número de índices presentes pelo total de índices
considerados. A presença de IF maior ou igual a 0,25 define o idoso frágil. IF entre
0,09 e 0,25 define o idoso pré-frágil, e IF menores ou iguais a 0,08 definem o idoso
robusto. A prevalência de idosos frágeis foi de 22,7%. Os autores sugerem sua
aplicação junto com a Avaliação Geriátrica Ampla (Song, 2010).
É crescente a ideia de que a fragilidade é multidimensional e que sua
operacionalização deve considerar componentes sócio-demográficos, médicos,
funcionais, afetivos, cognitivos e físicos (Lacas; Rockwood, 2012). A inclusão de
incapacidades e comorbidades é também recomendada, pois tais componentes
contribuem para o maior risco de desfechos adversos. Dentro desta perspectiva,
Ravaglia e cols, em 2008, sugeriram nove preditores independentes fragilidade:
idade maior ou igual a 80 anos, sexo masculino, baixa atividade física, comorbi-
dades, déficits sensoriais, circunferência da panturrilha menor que 31 cm,
9
dependência nas AVD instrumentais, desordens da marcha e equilíbrio e pessi-
mismo quanto à própria saúde. A presença destes indicadores foram relaciona-
dos a maior risco de internação hospitalar, fraturas e piora funcional.
Em 2012, Theou e cols mostraram uma estreita correlação entre depen-
dência funcional e comorbidades com a presença de maiores níveis de fragili-
dade. Menos de 10% dos idosos frágeis não apresentavam dependência fun-
cional ou comorbidades, diferentemente do que foi observado no Cardiovascular
Health Study (Fried, 2004). A proposta de exclusão da dependência funcional
dos critérios propostos para avaliar a síndrome de fragilidade é mais semântica
do que real. É difícil encontrar idosos frágeis que não tenham comorbidades e
dependência funcional, da mesma forma que é raro a presença dependência
e comorbidades, sem a síndrome da fragilidade. Desta forma, os autores suge-
rem a aplicação do termo fragilidade para aqueles indivíduos com maior risco
de desfechos negativos.
A prevalência de fragilidade em idosos residentes na comunidade é de
10,7%, variando de 4,0% a 59,1%, conforme o critério utilizado (Collard, 2012). O
fenótipo de fragilidade de Fried é o critério mais utilizado e, nestes casos, a pre-
valência foi menor, variando de 4 a 17%. A utilização de modelos multidimensio-
nais aumenta a prevalência da fragilidade (4,2% a 59,1%). Outros achados rele-
vantes são: aumento da prevalência com o passar dos anos e maior ocorrência
entre as mulheres. Assim, Collard e cols (2012) propõem a utilização do modelo
proposto por Linda Fried (2001) e daquele proposto por Rockwood (2005), da
seguinte forma: o modelo fenotípico (Fragilidade física) seria mais útil para pes-
quisas clínicas, enquanto que o modelo multidimensional seria mais adequado
para a organização e planejamento de sistemas de saúde.
Entendemos que ambos os modelos são complementares, com aplicabili-
dade distinta e integrantes do espectro da fragilidade (Figura 3).
É crescente a ideia de que a fragilidade é multidimensional e que sua
operacionalização deve considerar componentes sócio-demográficos, clínicos,
10
FUNCIONALIDADE
Atividades de Vida Diária (AVD básicas, instrumentais e avançadas)
Fenótipo da Fragilidade
(Fried 2001)
11
FRAGILIDADE MULTIDIMENSIONAL
FRAGILIDADE FRAGILIDADE
CLÍNICO-FUNCIONAL SÓCIO-FAMILIAR
Presença de Presença de
condições crônicas preditoras dependência funcional
de dependência funcional, estabelecida
institucionalização e/ou óbito
COMORBIDADES
MÚLTIPLAS SARCOPENIA
Fragilidade Clínico-Funcional
O componente clínico-funcional tem o declínio funcional como a principal
manifestação de vulnerabilidade e é o foco da intervenção geriátrica e geron-
tológica, independente da idade do paciente. Pode ser estabelecido ou iminen-
te. Declínio funcional estabelecido é a presença de incapacidade funcional ou
12
de dependência propriamente dita. Declínio funcional iminente é a presença de
condições crônicas preditoras de dependência funcional, como idade avança-
da, comorbidades múltiplas (polipatologia, polifarmácia e sarcopenia). O
modelo de classificação clínico-funcional proposto é baseado em uma visão de
saúde pública, fortemente ancorado na multidimensionalidade dos determi-
nantes da saúde do idoso, sem desprezar a importância das doenças ou das
alterações físicas, como a sarcopenia (Morley, 2013). Nele, o termo fragilidade
é utilizado para representar as seguintes situações: a) Presença de condições
crônicas preditoras de declínio funcional, institucionalização e/ou óbito; b)
Dependência funcional estabelecida (Figura 4). Desta forma, os idosos podem
ser classificados em (Figura 5):
• Idoso Robusto: é o idoso capaz de gerenciar sua vida de forma
independente e autônoma e não apresenta incapacidade funcional ou
condição crônica de saúde associada a maior vulnerabilidade;
• Idoso em Risco de Fragilização: é o idoso capaz de gerenciar sua vida
de forma independente e autônoma, todavia encontra-se em um estado
dinâmico entre senescência e senilidade, resultando na presença de li-
mitações funcionais (declínio funcional iminente), mas sem dependência
funcional. Apresenta uma ou mais condições crônicas de saúde preditoras
de desfechos adversos, como: a) Evidências de Sarcopenia: presen-
ça de alterações da massa e da função muscular (força e desempenho
muscular). Os critérios de operacionalização do diagnóstico de sarco-
penia são variáveis e incluem o fenótipo de fragilidade descrito por Fried
(emagrecimento significativo não intencional, fatigabilidade, fraqueza,
baixo nível de atividade física e lentificação da marcha) e os critérios ba-
seados na medida quantitativa da massa muscular, associadas medidas
de função muscular, como a força de preensão palmar e a velocidade da
marcha. A lentificação da marcha é o principal determinante de sarcope-
nia/dinapenia e pode ser definida quando for igual ou menor que 0,8 m/s
(distância padronizada de quatro metros, com velocidade pouco acima
da usual, sem distância para aceleração ou desaceleração) (Sayer, 2013).
Outro bom indicador de sarcopenia é o perímetro da panturrilha menor
ou igual a 31 cm. Também podem ser preditores de sarcopenia a perda
significativa de peso não intencional de 4,5kg ou 5% do peso corporal
no último ano, 6 kg ou mais nos últimos seis meses ou 3 kg ou mais no
último mês, além do IMC < 22 kg/m2 (Cruz-Jenkoft, 2010; Fielding, 2011);
13
14
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICO-FUNCIONAL DO IDOSO
IDOSO FRÁGIL
Apresenta dependência funcional nas atividades
IDOSO FRÁGIL de vida diária e encontra-se estável clinicamente,
sem apresentar dúvidas diagnósticas e/ou terapêuticas;
Incapacidade cognitiva
Incontinência Esfincteriana
Apresenta alto grau de dependência
Incapacidade Comunicativa IDOSO FRÁGIL EM funcional e sobrevida estimada menor que
FASE FINAL DE VIDA seis meses (cuidados paliativos).
Figura 5. Classificação clínico-funcional do idoso.
b) Presença de comorbidades múltiplas representadas por polipatolo-
gia (presença simultânea de cinco ou mais condições crônicas de saúde,
acometendo sistemas fisiológicos diferentes) ou polifarmácia (uso regular
e concomitante de cinco ou mais medicamentos por dia para condições
crônicas diferentes) ou história de internações recentes (≤ 6 meses) e/ou
pós-alta hospitalar.
• Idoso Frágil: é o idoso com declínio funcional estabelecido e incapaz de
gerenciar sua vida, em virtude da presença de incapacidades únicas ou
múltiplas, como incapacidade cognitiva (demência, depressão e “doen-
ça mental”); instabilidade postural (história de duas ou mais quedas nos
últimos seis meses e/ou dificuldades da marcha caracterizada por dese-
quilíbrio e alterações no padrão da marcha, capazes de restringir a partici-
pação social do indivíduo); imobilidade parcial ou completa; incontinência
esfincteriana capaz de restringir a participação social do indivíduo; incapa-
cidade comunicativa (distúrbios da comunicação oral/escrita, da audição
e da visão, capazes de restringir a participação social do indivíduo). Por
sua vez, os idosos frágeis podem ser subdivididos em:
• idoso frágil com declínio funcional estabelecido: apresenta
dependência funcional nas atividades de vida diária e encontra-
-se estável clinicamente, sem apresentar dúvidas diagnósticas
e/ou terapêuticas.
• idoso frágil de alta complexidade: apresenta dependência fun-
cional nas atividades de vida diária associada a condições de
saúde de difícil manejo clínico (dúvida diagnóstica, terapêutica
ou reabilitacional).
• idoso frágil em fase final de vida: apresenta alto grau de de-
pendência funcional e sobrevida estimada menor que seis me-
ses (cuidados paliativos).
15
ser subdivididos em três estratos (1, 2 e 3), os idosos em risco de fragilização em
dois estratos (4 e 5) e os frágeis em cinco estratos (6, 7, 8, 9 e 10), conforme pode
ser visto na figura 6 e quadro 1.
O termo fragilidade inclui o idoso em risco de fragilização e o idoso frágil
propriamente dito. Esta proposta de classificação clínico-funcional do idoso não
nega a importância do diagnóstico correto e bem feito das doenças, dentro da
complementariedade proposta pela Classificação Internacional de Funcionalidade
(CIF) e das morbidades, como registrado na Classificação Internacional das
Doenças (CID). Ela propõe ampliar a importância da funcionalidade, no contexto
do envelhecimento, sabendo-se que, sendo idosa, a pessoa provavelmente vive
com alguma ou com um conjunto de patologias.
Fragilidade Sócio-Familiar
O componente sócio-familiar da fragilidade multidimensional resgata a impor-
tância de outros determinantes da saúde, como sexo, raça/cor, escolaridade,
estado civil, arranjos familiares, viuvez recente, idoso cuidador, participação e
apoio social, acesso a serviços e situação laboral (Gobbens, 2010). A importância
destes marcadores e as justificativas para a sua importância são apresentados no
quadro 2. A avaliação da saúde do idoso deve, portanto, utilizar informações
sobre os aspectos clínico-funcionais e sócio-familiares, resgatando o conceito de
saúde como sendo “o estado de mais completo bem estar biopsicossocial, e não,
simplesmente, a ausência de doenças” (Organização Mundial da Saúde, 1947).
Como vimos, o envelhecimento é o principal fator de risco para as grandes
síndromes geriátricas, como a incapacidade cognitiva, a instabilidade postural, a
imobilidade, a incontinência urinária, a incapacidade comunicativa e a iatrogenia.
Mais comumente, estas incapacidades apresentam-se de forma associada,
condição que denominamos de poli-incapacidades. A dependência ou incapaci-
dade funcional é a grande consequência das síndromes geriátricas, que exige
cuidados diferenciados e por longo tempo. O cuidado de longa duração é o
“apoio material, instrumental e emocional, formal ou informalmente oferecido por
um longo período de tempo às pessoas que o necessitam, independentemente
da idade” (Camarano, 2010). Estes serviços podem ser oferecidos no domicílio,
na comunidade ou em instituições de longa permanência. Habitualmente, estes
cuidados são prestados pela família. Famílias despreparadas para este cuidado
de longa duração podem desencadear ou perpetuar a perda de autonomia e
independência do idoso.
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Figura 6. Escala analógica da fragilidade clínico-funcional