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PROGRAMA FRANCISCO EDUARDO MOURÃO SABOYA DE

PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA MECÂNICA


ESCOLA DE ENGENHARIA
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Dinâmica dos Fluidos Não Newtonianos


TCE 00038

TRABALHO FINAL

MARCEL FREITAS DE SOUZA

NOVEMBRO DE 2017
RESUMO

Este trabalho tem como objetivo apresentar o comportamento reológico da

carragena, que é um hidrocolóide extraído de algas marinhas das espécies Gigartina,

Hypnea, Eucheuma, Chondrus e Iridaea. As aplicações de carragena estão concentradas

na indústria alimentícia e podem ser divididas em sistemas lácteos, aquosos e bebidas.

Entretanto, diversas outras aplicações de carragena já existem atualmente para uma

grande variedade de aplicações industriais.

A viscosidade de soluções de carragena depende da concentração, temperatura,

presença de outros solventes, tipo de carragena e peso molecular. A tixotropia do tipo da

carregana, uma vez que géis aquosos de iota carragena possuem propriedades reológicas

tixotrópicas, enquanto que o gel de kappa carragena não apresenta a propriedade

tixotrópica, pois uma vez quebrado o gel, o mesmo não volta a recuperar sua forma

original a menos que o gel seja aquecido e resfriado novamente.

As gomas carragenas comerciais apresentaram comportamento diferente em

relação a carragena padrão, indicando a adição de outros polissacarídeos, sais ou outras

substâncias utilizadas que influenciaram nas características reológicas.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 2.1 - Representação gráfica do fluido newtoniano, sendo (a) a curva de tensão de

cisalhamento x taxa de cisalhamento e (b) a curva de viscosidade x taxa de cisalhamento.

.......................................................................................................................................... 9

Figura 2.2 - Comparação de fluidos newtonianos: (a) água, (b) óleo e (c) glicerina. ...... 9

Figura 2.3 - Curvas de fluxo de fluidos independentes do tempo. ................................. 10

Figura 2.4 - Curvas de fluxo para fluidos reopéxicos e tixotrópicos.............................. 11

Figura 2.5 - Classificação dos fluidos segundo seus comportamentos reológicos. ........ 12

Figura 2.6 - Classificação da carragena de acordo com sua estrutura e propriedades físico-

químicas: (a) tipo kappa, (b) tipo iota e (c) tipo lambda. Fonte: Agargel (2003)........... 19

Figura 4.1 - Variação da viscosidade (cP) em função da velocidade (rpm) da carragena

padrão a: (a) 0,15%, (b) 0,20%, (c) 0,25%, (d) 0,30% e (e) 0,35%. .............................. 31

Figura 4.2 - Viscosidade (cP) das Soluções da Carragena Padrão de Acordo com a

Velocidade (rpm) em Diferentes Concentrações. As Siglas Car15, Car20, Car25, Car30 e

Car35 Correspondem as Concentrações de 0,15; 0,20; 0,25; 0,30 e 0,35% (m/m),

Respectivamente. As Siglas R60, R70, R80, R90 e R100 correspondem a velocidade de

60, 70, 80, 90 e 100 rpm, respectivamente. .................................................................... 32

Figura 4.3 – Variação da Viscosidade (cP) em função da velocidade (rpm) da carragena

comercial a 0,35%: (a) carragena comercial 1, (b) carragena comercial 2, (c) carragena

comercial 3, (d) carragena comercial 4, (e) carragena comercial 5, (f) carragena comercial

6, (g) carragena comercial 7, (h) carragena comercial 8 e (i) carragena comercial 9. ... 35

Figura 4.4 - Valores de viscosidade (cP) da carragena padrão a 0,15% e das carragenas

comerciais a 0,35% (m/m) com as seguintes velocidades de rotação: (a) 60 rpm, (b) 70
rpm, (c) 80 rpm, (d) 90 rpm e (e) 100 rpm. Sendo que a letra “v” nos gráficos representa

a curva descendente. ....................................................................................................... 37

Figura 4.5 - Correlação entre as viscosidades observada e prevista pelo modelo proposto

para solução de leite e carragena. ................................................................................... 40

Figura 4.6 - Determinação da viscosidade intrínseca: dados experimentais da viscosidade

reduzida vs. concentração do polímero. ......................................................................... 40


LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1 - Classificação das gomas industriais em função da origem. ...................... 16


SUMÁRIO

1. SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 8

2.1. CLASSIFICAÇÃO REOLÓGICA .................................................................... 8

2.2. BIOPOLÍMEROS ............................................................................................ 13

2.3. CARRAGENA................................................................................................. 17

2.3.1. Definição .................................................................................................. 17

2.3.2. Propriedades da carragena ........................................................................ 22

3. MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................... 26

3.1. PREPARO DAS SOLUÇÕES DA CARRAGENA PADRÃO ....................... 26

3.2. PREPARO DAS SOLUÇÕES DAS CARRAGENAS COMERCIAIS .......... 27

3.3. AVALIAÇÃO DA VISCOSIDADE DA CARRAGENA PADRÃO E

COMERCIAL ............................................................................................................. 27

3.4. ANÁLISE DA EQUAÇÃO CONSTITUTIVA PARA CARRAGENA EM

ALTAS TEMPERATURAS ....................................................................................... 28

3.5. ANÁLISE REOLÓGICA DE SISTEMA POLIMÉRICO AQUOSO DE

METILCELULOSE E CARRAGENAS LAMBDA E KAPPA ................................ 28

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 29

5. CONCLUSÕES ....................................................................................................... 41
7

1. INTRODUÇÃO

A adição de aditivos e ingredientes nos alimentos é de fundamental importância,

pois auxilia na conservação, melhora a cor, textura, aroma, sabor e os tornam mais

nutritivos. Os aditivos alimentares são determinados segundo a ANVISA (Agência

Nacional de Vigilância Sanitária) como qualquer ingrediente adicionado

intencionalmente aos alimentos, sem propósito de nutrir, com o objetivo de modificar as

características físicas, químicas, biológicas ou sensoriais, durante a fabricação,

processamento, preparação, tratamento, embalagem, acondicionamento, armazenagem,

transporte ou manipulação de um alimento. Ao serem adicionados nos alimentos, os

aditivos ou seus derivados podem se converter em um componente do alimento. Esta

definição não inclui os contaminantes ou substâncias nutritivas que sejam incorporadas

ao alimento para manter ou melhorar suas propriedades nutricionais.

Muitas propriedades físicas de preparações alimentares, tais como a estabilidade

e capacidade de formação de géis, dependem principalmente das interações entre

proteínas e polissacarídeos em solução. As interações entre esses biopolímeros também

são um elemento essencial na textura dos alimentos. A goma Carragena é um aditivo

alimentar que possui propriedades de modificar as características reológicas do produto,

pois tem a capacidade de tornar a solução mais viscosa ou de formar géis, sendo

amplamente utilizada em produtos de consumo diário pela sua ampla faixa de

propriedades de textura e sensorial.

Assim, o presente trabalho tem como objetivo analisar o comportamento reológico

da goma carragena utilizando os conceitos aprendidos no curso de dinâmica dos fluidos

não newtonianos.
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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. CLASSIFICAÇÃO REOLÓGICA

A reologia é uma área da física que analisa as deformações ou as tensões de um

material provocadas pela aplicação de uma tensão ou deformação. O material pode estar

tanto no estado líquido, gasoso quanto no estado sólido. A deformação de um sólido pode

ser caracterizada por leis que descrevem a alteração do volume, tamanho ou forma,

enquanto que o escoamento de um fluido que pode estar no estado gasoso ou líquido, é

caracterizado por leis que descrevem a variação contínua da taxa ou grau de deformação

em função da tensão aplicada.

Quanto à deformação, os fluidos podem ser classificados em reversíveis ou

elásticos, que são sistemas que não escoam, sua deformação é reversível e o sistema

obedece à Lei de Hooke, e irreversíveis ou viscosos, que são sistemas que escoam, sua

deformação é irreversível e o sistema obedece à Lei de Newton, de viscosidade constante.

Também podem ser classificados quanto à relação entre a taxa de deformação e a

tensão de cisalhamento em fluidos newtonianos, sua viscosidade é constante, seguem a

lei de Newton, e fluidos não newtonianos, em que a relação entre a taxa de deformação e

a tensão de cisalhamento não é constante.

Os fenômenos newtonianos são aqueles em que sua viscosidade é afetada pela

temperatura e pressão. Entretanto, sua viscosidade não varia com o aumento da taxa ou

tensão cisalhante, sendo esta denominada como viscosidade absoluta. A representação

gráfica de um fluido Newtoniano está apresentada nas Figuras 2.1 e 2.2.


9

(a) (b)

Figura 2.1 - Representação gráfica do fluido newtoniano, sendo (a) a curva de tensão de

cisalhamento x taxa de cisalhamento e (b) a curva de viscosidade x taxa de

cisalhamento.

Figura 2.2 - Comparação de fluidos newtonianos: (a) água, (b) óleo e (c) glicerina.

Os fenômenos não newtonianos são divididos em três grandes grupos:

independentes do tempo, dependentes do tempo e viscoelásticos.

Os fluidos não newtonianos independentes do tempo são aqueles cujas

propriedades reológicas independem do tempo de aplicação da tensão de cisalhamento,

podendo ainda serem divididos em (Figura 2.3):

• Sem tensão inicial, que são aqueles que não necessitam de uma tensão de

cisalhamento inicial para começarem a escoar, e compreendem a maior parte dos fluidos
10

não newtonianos. Dentro desta classe destacam-se os pseudoplásticos, que, em repouso,

apresentam suas moléculas em um estado desordenado, e quando submetidas a uma

tensão de cisalhamento, suas moléculas tendem a se orientar na direção da força aplicada,

logo quanto maior esta força, maior será a ordenação e, consequentemente, menor será a

viscosidade aparente. Os fluidos dilatantes são substâncias que apresentam um aumento

de viscosidade aparente com a tensão de cisalhamento. No caso de suspensões, à medida

que se aumenta a tensão de cisalhamento, o líquido intersticial que lubrifica a fricção

entre as partículas é incapaz de preencher os espaços devido a um aumento de volume

que frequentemente acompanha o fenômeno, ocorre, então, o contato direto entre as

partículas sólidas e, consequentemente, um aumento da viscosidade aparente.

• Com tensão inicial, que são os que necessitam de uma tensão de cisalhamentos

inicial para começarem a escoar. Dentre os fluidos desta classe se encontram os plásticos

de Bingham, que apresentam uma relação linear entre a tensão de cisalhamento e a taxa

de deformação, a partir do momento em que se atinge uma tensão de cisalhamento inicial.

Figura 2.3 - Curvas de fluxo de fluidos independentes do tempo.


11

Os fluidos não newtonianos dependentes do tempo apresentam propriedades que

variam, além da tensão de cisalhamento, com o tempo de aplicação desta tensão, para

uma velocidade de cisalhamento constante. Podem ser classificados em tixotrópicos, em

que a viscosidade diminui com o tempo de aplicação da tensão de cisalhamento, voltando

a ficar mais viscosos com quando esta cessa, e reopéticos, que apresentam um

comportamento inverso ao dos tixotrópicos, ou seja, a viscosidade destes fluidos aumenta

com o tempo de aplicação da tensão, retornando à viscosidade inicial quanto esta força

cessa. A Figura 2.4 apresenta a curva de fluxo para fluidos reopéxicos e tixotrópicos.

Figura 2.4 - Curvas de fluxo para fluidos reopéxicos e tixotrópicos.

Os fluidos viscoelásticos possuem características de líquidos viscosos com

propriedades elásticas (Modelo de Maxwell) e de sólidos com propriedades viscosas

(Modelo de Kelvin-Voigt), ou seja, possuem propriedades elásticas e viscosas acopladas.

Estas substâncias quando submetidas à tensão de cisalhamento sofrem uma deformação

e quando esta cessa, ocorre uma certa recuperação da deformação sofrida.

A Figura 2.5 apresenta um fluxograma da classificação dos fluidos em relação a

reologia.
12

Figura 2.5 - Classificação dos fluidos segundo seus comportamentos reológicos.


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2.2. BIOPOLÍMEROS

O consumo de produtos plásticos ao longo dos anos vem produzindo grande

número de resíduos desse material os quais se acumulam pelos aterros gerando problemas

ambientais consideráveis. Os plásticos ou polímeros não biodegradáveis contribuem

bastante para esses problemas, pelo fato de possuírem elevada resistência a degradação

demorando anos para se decompor. Portanto, pesquisadores e indústria vêm buscando

alternativas para minimizar os impactos ambientais causados pelo descarte inadequado

de produtos fabricados com plásticos. Dentre as alternativas estão o reaproveitamento e

a reciclagem, práticas que vêm aumentando com o tempo. A conscientização de um

descarte e destino adequados também é de fundamental importância (Brito et al., 2011).

Recentemente a produção e utilização de biopolímeros, polímeros biodegradáveis

e polímeros verdes surge como mais uma alternativa, a qual, devido sua viabilidade

técnica e econômica, apresenta grande potencial de expansão.

Os biopolímeros são polímeros obtidos a partir de seres vivos ou de matérias

primas de fontes renováveis, que podem ser encontrados desde a estrutura do DNA até

muitos produtos usados para a fabricação de embalagens plásticas. No caso do DNA, e

de outras moléculas, como o RNA, proteínas e enzimas, são os organismos vivos os

responsáveis por sua síntese. Já os plásticos e outros biopolímeros sintéticos, por sua vez,

são polimerizados pelo homem, a partir de matérias primas de fontes naturais renováveis,

e vários deles substituem os polímeros derivados do petróleo, os quais levam, em média,

40 anos para se decompor, enquanto que os biopolímeros demoram no máximo 180 dias

(Borges et al., 2004).

Os polímeros são macromoléculas constituídas de repetições de pequenas e

simples unidades estruturais chamadas monômeros. Nos biopolímeros produzidos pelos


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seres vivos, como polissacarídeos, peptídios, DNA e RNA, as unidades monoméricas são,

respectivamente, açúcares, aminoácidos e nucleotídeos. A matéria-prima principal para

sua manufatura é uma fonte de carbono renovável, geralmente um carboidrato derivado

de plantios comerciais de larga escala como cana-de-açúcar, milho, batata, trigo e

beterraba, ou um óleo vegetal extraído de soja, girassol, palma ou outra planta oleaginosa

(Pradella, 2006; Sociedade Nacional de Agricultura, 2012).

Alguns fatores ambientais e socioeconômicos que estão relacionados ao crescente

interesse pelos biopolímeros são os grandes impactos ambientais causados pelos

processos de extração e refino utilizados para produção dos polímeros provenientes do

petróleo, a escassez do petróleo e aumento do seu preço. Outro fator preponderante é a

não biodegradabilidade da grande maioria dos polímeros produzidos a partir do petróleo,

pois contribui para o acúmulo de lixo plástico sem destino apropriado que levará de

dezenas a centenas de anos para ser novamente assimilado pela natureza (Brito et al.,

2011).

Morfologicamente são três os tipos de biopolímeros encontrados: intracelular, da

parede celular e extracelular. Por razões práticas, os microrganismos que produzem

polissacarídeo extracelular são os primeiros a serem explorados, para evitar os

procedimentos dispendiosos de purificação que são necessários aos outros tipos de

polissacarídeos. Os polissacarídeos extracelulares têm um grande potencial industrial,

porque podem ser extraídos em grandes quantidades no meio líquido.

Os biopolímeros extracelulares estão localizados fora da parede celular, sendo que

alguns são encontrados ligados às células, como uma verdadeira cápsula. No entanto,

outros são excretados pelas células no meio de crescimento. Provavelmente, o

polissacarídeo extracelular tenha a função natural de proteger o microrganismo contra

vários fatores adversos do meio ambiente.


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Os biopolímeros são, na maioria, compostos atóxicos, biodegradáveis, produzidos

extracelularmente por microrganismos não patogênicos a partir de fermentação em

batelada com eficiência próxima a 50% na conversão do substrato.

As gomas são substancias poliméricas que, usualmente em solventes, mesmo a

baixas concentrações, são capazes de formar soluções altamente viscosas.

Industrialmente classificam-se em três grandes grupos: naturais, modificadas ou

semissintéticas e sintéticas. As gomas naturais podem ser obtidas de exsudatos de árvores,

sementes, algas ou por fermentação, enquanto as modificadas são derivadas de

polissacarídeo, como a celulose (Faria, 2009). A Tabela 2.1 mostra os tipos e origens

destes polissacarídeos.
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Tabela 2.1 - Classificação das gomas industriais em função da origem. Fonte: Faria, 2009.

Tipo Origem Gomas

Naturais Exsudatos de plantas terrestres Arábica, alcatira, caraia

Extratos de plantas terrestres Pectina

Sementes Guar, alfarroba, tamarindo

Algas marinhas Ágar, alginatos, carragena

Amido de tubérculos Tapioca

Gomas microbianas ou Dextrana, xantana, gelana,

Biosintética pululana

Modificadas ou Celulose Carboximetilcelulose,

semissintéticas metilcelulose,

hidroxietilcelulose

Amido Dextrina, xantato de

amilose, hidroxietilamido

Extrato de origem animal Derivados hidrossolúveis

da quitina

Sintéticas Derivadas da petroquímica Álcool polivinílico, sais do

ácido poliacrílico,

polivinilpirrolidona,

policarboxivinil, polímeros

de óxido de etileno
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2.3. CARRAGENA

2.3.1. Definição

A carragena é um hidrocolóide extraído de algas marinhas vermelhas das espécies

Gigartina, Hypnea, Eucheuma, Chondrus e Iridaea. É utilizada em diversas aplicações

na indústria alimentícia como espessante, gelificante, agente de suspensão e estabilizante,

tanto em sistemas aquosos quanto em sistemas lácteos em virtude de uma ampla gama de

propriedades texturizdoras e sensoriais (Brenner et al., 2014; Agoda-RTandjawa et al.,

2017).

Os hidrocolóides são polissacarídeos, que contêm a capacidade de formar géis ou

soluções viscosas com a água, controlando assim a atividade de água e conferindo textura

e corpo aos alimentos fabricados. Apresentam também função de agentes emulsificantes,

espessantes, geleificantes e estabilizantes de emulsões. A carragena é um polissacarídeo

de alto peso molecular com conteúdo de éster sulfato de 15% a 40% formado por unidades

alternadas de D-galactose e 3,6-anidro-galactose (3,6-AG) unidas por ligações α-1,3 e β-

1,4-glicosídica.

A carragena é um ingrediente multifuncional e comporta-se diferentemente em

água e em leite. Na água, apresenta-se tipicamente como hidrocolóide com propriedades

espessantes e gelificantes. No leite, tem ainda a propriedade de reagir com as proteínas e

fornecer funções estabilizantes.

A carragena possui uma habilidade única de formar uma ampla variedade de

texturas de gel à temperatura ambiente: gel firme ou elástico; transparente ou turvo; forte

ou fraco; termo-reversível ou estável ao calor; alta ou baixa temperatura de


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fusão/gelificação. Pode ainda ser utilizado como agente de suspensão, retenção de água,

gelificação, emulsificação e estabilização em diversas outras aplicações industriais.

Ela é classificada de acordo com sua estrutura e propriedades físico-químicas em

Kappa (gel rígido, quebradiço, termo-reversível, alta força de gel, apresenta sinérise), Iota

(gel elástico, termo-reversível, não apresenta sinérise, propriedade tixotrópica) e Lambda

(solúvel a frio, não gelificante, produz altas viscosidades), conforme Figura 2.6, sendo

que as carragenas do to tipo Kappa e Iota tem a capacidade de formar géis

termorreversíveis na presença de cátions que promovem géis (Agoda-RTandjawa et al.,

2017; Roldán et al., 2017).

A posição e o número de grupos de éster sulfato bem como o conteúdo de 3,6-AG

determinam as diferenças primárias entre os tipos de carragena kappa, iota e lambda.

Maiores níveis de éster sulfato implicam em menor força de gelificação e baixa

temperatura de solubilização. A carragena tipo kappa contém de 25% a 30% de éster

sulfato e de 28% a 35% de 3,6-AG. A carragena tipo iota contém de 28% a 35% de éster

sulfato e de 25% a 30% de 3,6-AG. A carragena tipo lambda contém de 32% a 39% de

éster sulfato e não contém 3,6-AG (Martínez et al., 2015; Yang et al., 2012; Palanisamy

et al., 2018).

A carragena é classificada quanto ao processo de produção em semi-refinada (gel

opaco, com muita celulose e fibra, baixo grau de pureza) e refinada (gel claro,

transparente, alto grau de pureza).


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(a) (b)

(c)

Figura 2.6 - Classificação da carragena de acordo com sua estrutura e propriedades

físico-químicas: (a) tipo kappa, (b) tipo iota e (c) tipo lambda. Fonte: Agargel (2003).

A carragena é obtida de diversos gêneros e espécies de algas marinhas da classe

Rodophyta. O teor de carragena nas algas varia de 30% a 60% do peso seco, dependendo

da espécie da alga e das condições marinhas tais como luminosidade, nutrientes,

temperatura e oxigenação da água. Algas de diferentes espécies e fontes produzem

carragenas de diferentes tipos: kappa, iota e lambda. Algumas espécies de algas podem

produzir carragenas de composição mista como kappa/iota, kappa/lambda ou

iota/lambda. As espécies produtoras de carragena tipo kappa são a Hypnea Musciformis,

a Gigartina Stellata, a Eucheuma Cottonii, a Chondrus Crispus e a Iridaea. As espécies

produtoras de carragena tipo iota são a Gigartina Teedi e a Eucheuma Spinosum. As

espécies produtoras de carragena tipo lambda são em geral do gênero Gigartina.

Existem ainda as carragenas hibrídas kappa/iota que são polissacarídeos naturais

extraídos de algas das espécies Gigartinaceae, Petrocelidaceae, Phyllophoraceae (Hilliou

et al., 2014).
20

As algas são em geral coletadas manualmente por pescadores em zonas

intermareais ou por mergulho através do uso de equipamentos adequados. Após a coleta,

as algas são colocadas ao sol para secagem até atingirem um nível de umidade ideal para

seu processamento.

O processo de extração da carragena para produção industrial é baseado nas duas

principais propriedades da goma: a solubilidade em água quente e a insolubilidade em

solvente orgânico polar. O processo é formado de várias fases, sendo elas: o tratamento

inicial, a extração, filtração, clarificação, concentração, moagem e mistura. Para que não

apresente nenhuma impureza, antes de realizar o processo deve-se fazer a lavagem através

da operação de secagem em estufa e moagem para melhorar o contato entre as algas e os

solventes nas diversas operações seguintes.

Estas gomas são elementos altamente solúveis em água, sendo esta propriedade

que deve ser utilizada no momento de extração. Após a lavagem, ocorre a etapa de

extração que é realizada por meio de moagem, onde posteriormente são aquecidas em

água a 90ºC, com potencial hidrogeniônico (pH) entre 8,0 e 9,0, no qual as carragenas

são estáveis. Nestas medições de pH é possível aumentar o rendimento, fazendo com que

ocorra a desagregação das ligações entre as proteínas e as carragenas. Quando o pH for

ácido ou básico demais, pode ocorrer a destruição das moléculas. Posteriormente, é

realizado o processo de filtração e clarificação, onde o extrato aquoso quente passa por

um primeiro estágio de filtração mais grosseiro para que ocorra a retirada dos resíduos

das algas.

Em um segundo estágio, adiciona-se um auxiliar de filtração, sendo filtrado sob

pressão. Desse polimento se obtém um xarope transparente contendo carragena em

solução, que irá ser concentrado e/ou purificação por precipitação seletiva. A purificação

é baseada na capacidade das carragenas em formar um precipitado.


21

No processo de concentração, o xarope obtido na etapa anterior passa por um

procedimento de precipitação que pode ocorrer na presença de um excesso de álcool, por

precipitação dos polissacarídeos na forma de polímeros, eliminando-se assim as pequenas

moléculas ou de forma mais seletiva, realizado pela adição de íons metálicos. Isto pode

ser feito com a adição de um sal quaternário de amônio ou pela adição de uma solução

diluída de cloreto de potássio.

Após a secagem por evaporação a vácuo, o produto deve ser moído até obter-se

um pó branco ou bege claro, inodoro e insípido, com o tamanho de partículas desejado.

Antes da comercialização, o produto passa por uma etapa na qual é diluído com a adição

de açúcares e misturado com sais para alcançar as características gelificantes e

espessantes oferecidas por cada marca ou produto. Obviamente, nas várias fases da

produção existem operações de controle de processo destinadas a garantir a qualidade do

produto acabado.

As carragenas podem ser refinadas (gel claro, transparente, alto grau de pureza)

ou semi-refinadas (gel opaco, com muita celulose e fibra, baixo grau de pureza). As

refinadas são extraídas por aquecimento em solução aquosa, seguidas de filtração ou

centrifugação para remoção de resíduos. Para remover a água da carragena existem dois

métodos: por precipitação da carragena com álcool, ou pela gelificação com cloreto de

potássio a 0,2%, seguida de congelamento e descongelamento. Já as semi-refinadas são

obtidas através da extração em solução aquosa quente de hidróxido de potássio, seguida

de lavagens.
22

2.3.2. Propriedades da carragena

2.3.2.1. Gelificação

2.3.2.1.1. Mecanismo

Soluções quentes de carragenas kappa e iota possuem a habilidade de formar géis

termo-reversíveis através do seu resfriamento. Este fenômeno ocorre devido à formação

de uma estrutura de dupla hélice pelos polímeros da carragena. Em temperaturas acima

da temperatura de fusão do gel, os polímeros da carragena existem na solução como

espirais aleatórias. Durante o resfriamento da solução, uma rede de polímeros

tridimensional é formada onde as hélices duplas constituem os pontos de junção das

cadeias de polímero. O resfriamento adicional causa a agregação dos pontos de junção

para formar a estrutura de gel tridimensional. A presença de alças na cadeia bem como o

número, tipo e posição dos grupos de éster sulfato têm efeitos importantes nas

propriedades de gelificação. Esse mecanismo de gelificação é básico para soluções de

carragenas tipo kappa e iota. Sais de potássio ou cálcio são necessários para a obtenção

do gel em água, porém não são necessários em leite.

2.3.2.1.2. Textura

As carragenas kappa e iota formam gel em água somente na presença de certos

cátions. A kappa carragena é sensível ao íon potássio e produz géis rígidos e quebradiços

em soluções aquosas com sais de potássio. O gel de kappa carragena apresenta sinérese

(extrusão espontânea de água através da superfície do gel em repouso) e quanto maior a


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concentração de potássio na solução maior será a sinérise. A iota carragena é sensível ao

íon cálcio e produz géis macios e elásticos em soluções aquosas com sais de cálcio. A

iota carragena não apresenta sinérise. A força de gel é diretamente proporcional à

concentração de carragena e sais. A concentração de cátions superior a um certo limite

implicará na diminuição da força de gel. O gel formado é termo-reversível e pode ser

submetido a ciclos de aquecimento e resfriamento sem considerável alteração na estrutura

do gel (pH neutro). As temperaturas de gelificação e fusão do sol/gel dependem da

concentração de cátions. O aumento da concentração de sais de potássio ou cálcio em

soluções aquosas resultará no aumento da temperatura de gelificação.

2.3.2.2. Viscosidade

A viscosidade de soluções de carragena deve ser determinada em condições onde

não exista nenhuma tendência de gelificação da solução. Quando uma solução quente de

carragena é resfriada, a viscosidade aumenta gradualmente até que seja atingida a

temperatura de gelificação. À medida que se inicia a formação do gel, há um aumento

repentino e intenso da viscosidade. Portanto, a medida de viscosidade de soluções de

carragena deve ser determinada a temperaturas suficientemente altas (75º C) para evitar

o efeito da gelificação. A concentração de carragena na solução é em geral de 1,5% em

peso do volume de água. As carragenas disponíveis comercialmente apresentam em geral

viscosidades variando de 5 a 800 cps medidas a 75º C em soluções de 1,5% de carragena.

A viscosidade de soluções de carragena depende da concentração, temperatura,

presença de outros solventes, tipo de carragena e peso molecular. Maior peso molecular,

maior concentração ou diminuição da temperatura da solução aumentam

consideravelmente a viscosidade.
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2.3.2.3. Estabilidade

A solução de carragena é bastante estável em pHs neutros ou alcalinos. Entretanto,

pHs baixos afetam a sua estabilidade, especialmente a altas temperaturas. A diminuição

do pH causa a hidrólise do polímero da carragena resultando na diminuição da

viscosidade e da força de gelificação. Entretanto, uma vez formado o gel, mesmo a pHs

baixos (3,5 a 4,0) não há mais ocorrência da hidrólise e o gel permanece estável. Para

aplicações práticas, é importante estar atento às limitações da carragena em meios ácidos

(solução e gel). O processamento de soluções de carragena com pH baixo a altas

temperaturas por um tempo prolongado deve ser evitado.

2.3.2.4. Reatividade com proteínas

Uma das propriedades que diferenciam a carragena de outros hidrocolóides é a

sua habilidade de interagir com as proteínas do leite. A alta reatividade da carragena no

leite deve-se à forte interação eletrostática entre os grupos de éster sulfato negativamente

carregados da molécula da carragena com a micela de caseína do leite que possui regiões

de forte carga positiva. Outra forma de interação é através de pontes entre grupos de éster

sulfato da carragena com resíduos carboxílicos dos aminoácidos que compõem a proteína.

A reatividade com proteínas depende de muitos fatores como concentração de carragena,

tipo de proteína, temperatura, pH e ponto isoelétrico da proteína. Este fenômeno de

interação e reatividade da carragena com as proteínas do leite em combinação com sua

habilidade de formar gel e reter água torna-o um ingrediente eficaz para a estabilização e

gelificação de produtos lácteos.


25

2.3.2.5. Interação com outras gomas

A kappa carragena apresenta uma sinergia incomum com a goma de alfarroba

(LBG) em sistemas aquosos. O gel obtido da mistura de carragena com LBG apresenta

um considerável aumento de força de gel, melhora na capacidade de retenção de água,

redução de sinérise e uma alteração da textura do gel de quebradiça para elástica.

A iota carragena apresenta sinergia com os amidos. Um sistema que contenha uma

mistura de iota carragena e amido apresenta um aumento de viscosidade até 10 vezes

superior à viscosidade de um sistema que contenha somente o amido. Desta forma, a

carragena iota torna-se muito útil para a alteração de textura, palatabilidade e

propriedades de processo de sistemas baseados em amido.

2.3.2.6. Tixotropia

A baixas concentrações, os géis aquosos de iota carragena possuem propriedades

reológicas tixotrópicas. Esses géis podem ser fluidizados por agitação ou corte e voltam

a recuperar sua forma de gel elástico uma vez parados os esforços de agitação ou corte.

Esta propriedade tixotrópica é especialmente útil para suspender partículas insolúveis

como especiarias em molhos para salada.

O gel de kappa carragena não apresenta a propriedade tixotrópica. Uma vez

quebrado o gel, o mesmo não volta a recuperar sua forma original a menos que o gel seja

aquecido e resfriado novamente.


26

3. MATERIAIS E MÉTODOS

A análise do comportamento reológico de soluções de carragena do presente

trabalho baseou-se primeiramente no trabalho de conclusão de curso em tecnologia de

alimentos da Universidade Tecnológica Federal do Paraná intitulado “Avaliação da

viscosidade de carragenas comerciais” de autoria de Djonathan Adamante e Natiele

Minosso.

Posteriormente, utilizando o artigo “Rheological Characterization of Skim Milk

Stabilized with Carrageenan at High Temperatures” de autoria de Anderson, Daubert,

Farkas (2002) descreveu-se a caracterização reológica da carragena em altas

temperaturas.

E finalmente, utilizando o artigo “Physicochemical data on aqueous polymeric

systems of methyl cellulose and lambda- and kappa-carrageenan: SAXS, rheological,

densitometry, and sound velocity measurements” de autoria de Cerar et al. (2017)

descreveu-se as equações que descrevem a viscosidade da solução utilizada no

experimento.

3.1. PREPARO DAS SOLUÇÕES DA CARRAGENA PADRÃO

Foram preparadas cinco soluções da carragena padrão nas concentrações de 0,15;

0,20; 0,25; 0,30 e 0,35% em água ultra-pura (Sistema de purificação de água osmose

reversa - modelo OS10LX e Ultrapurificador microprocessado Master System, ambos da

marca GEHAKA). Para o preparo das soluções, a carragena e a água foram pesadas em

balança analítica (marca Marte, modelo AW220) e em béqueres de polietileno de 100


27

mL. Para completa dissolução da carragena, as soluções foram mantidas em banho-maria

a 60ºC (marca Quimis) até completa dissolução da amostra (aproximadamente 1h e 20

min). Posteriormente, as soluções foram deixadas em repouso até atingirem a temperatura

ambiente de 25ºC e em seguida, a viscosidade foi analisada.

3.2. PREPARO DAS SOLUÇÕES DAS CARRAGENAS COMERCIAIS

Para o preparo das amostras da carragena comercial foi utilizado o mesmo

procedimento empregado no preparo das soluções da carragena padrão. A concentração

utilizada para as 10 marcas comerciais avaliadas foi somente de 0,35% (m/m) devido a

mesma apresentar um caráter visual fraco em comparação a padrão.

3.3. AVALIAÇÃO DA VISCOSIDADE DA CARRAGENA PADRÃO E

COMERCIAL

Os parâmetros foram obtidos na temperatura de 25ºC. O aumento da tensão de

cisalhamento foi dado pelo aumento da rotação, sendo utilizadas rotações entre 60 e 100

rpm com acréscimo de 10 rpm a cada 3 min, em curvas ascendentes e descendentes e

spindle LV2. Os parâmetros reológicos foram determinados usando-se o programa

computacional Reocalc for Windows (Brookfield, Stoughton, USA).


28

3.4. ANÁLISE DA EQUAÇÃO CONSTITUTIVA PARA CARRAGENA EM

ALTAS TEMPERATURAS

Utilizando leite pasteurizado processado a temperatura de 79°C por 18 segundos

adicionou-se goma carragena comercial especialmente desenvolvida para uso industrial

diário pela FMC Corporation. A goma carragena foi adicionada lentamente ao leite em

concentrações de 0,005, 0,010, 0,02 e 0,04% As soluções foram aquecidas a 85°C por

aproximadamente 5 minutos, permitindo a carragena hidratar-se e solubilizar-se.

Posteriormente, cada amostra foi resfriada até a temperatura ambiente sem agitação

seguida pela análise reológica.

3.5. ANÁLISE REOLÓGICA DE SISTEMA POLIMÉRICO AQUOSO DE

METILCELULOSE E CARRAGENAS LAMBDA E KAPPA

O artigo “Physicochemical data on aqueous polymeric systems of methyl cellulose

and lambda and kappa-carrageenan: SAXS, rheological, densitometry, and sound velocity

measurements” está relacionada aos recentes estudos a respeito do Sistema polimérico

aquoso formado por metilcelulose, carragena lambda e carragena kappa. A carragena

lambda, a carragena kappa e o metilcelulose foram usados como comprados, sem nenhum

tipo de purificação. As massas moleculares médias do polímero original foram

determinadas utilizando resultados da viscosidade intrínseca de (6,2±0,6) dLg-1,

(8,1±0,7) dLg-1 e (3,0±0,5) dLg-1. Essas viscosidades intrínsecas foram obtidas pela

equação de Mark-Houwink.
29

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A viscosidade das soluções de carragena quando determinada nas soluções a 0,15;

0,20 e 0,25% (m/m), não apresentou tendência de geleificação (Figuras 4.1a, 4.1b e 4.1c).

Entretanto, na solução de carragena a 0,30% (m/m) foi possível observar uma tendência

a formação de gel (Figura 4.1d) e a 0,35% (m/m) a formação de gel propriamente dita

(Figura 4.1e).

Por meio de agitação ou cortes esses géis podem ser fluidizados, mas se deixados

em repouso sem agitação e corte, voltam a recuperar sua forma de gel. O gel formado

pela Kappa carragena não apresenta esta propriedade tixotrópica, ou seja, se seu gel for

quebrado, ele não voltará a sua forma original, a não ser que seja aquecido e resfriado

novamente.

Nas Figuras 4.1a, 4.1b, 4.1c e 4.1d observou-se que o cisalhamento aumentou a

frequência das colisões entre as moléculas da carragena, que levou a um aumento de

agregados e consequentemente um leve aumento da viscosidade. Este tipo de

comportamento caracteriza a solução de carragena nas concentrações de 0,15%, 0,20%,

0,25% e 0,30% (m/m) como um fluido dilatante.

A Figura 4.2 apresenta a viscosidade da carragena padrão em diferentes

concentrações estudadas de acordo com a velocidade (60 a 100 rpm), confirmando o

aumento da viscosidade de acordo com o aumento da velocidade para todas as

concentrações estudadas, exceto para a concentração de 0,35% (m/m), ou seja,

observamos nas concentrações de 0,15; 0,20; 0,25 e 0,30% (m/m) de carragena um

comportamento característico dilatante.


30

O comportamento pseudoplástico pode ser observado na solução de carragena a

0,35% (m/m) (Figuras 4.1e e 4.2), como dito anteriormente, nesta concentração pode-se

observar a formação de gel fraco, ou seja, nas condições analisadas o cisalhamento da

solução separou as partículas agregadas e desta forma, ocorreu uma menor resistência.

Todo fluido tixotrópico é pseudoplástico, e esse comportamento pseudoplástico

da carragena é uma característica muito desejada em diversas situações. Do ponto de vista

sensorial, os polissacarídeos que possuem comportamento pseudoplástico provocam

menor sensação de gomosidade na boca do que aqueles com comportamento newtoniano.

Como podemos observar a viscosidade da carragena depende da concentração, e

ainda segundo a literatura, dependem da temperatura, presença de outros polímeros, tipo

e massa molar da carragena.

(a) (b)

(c) (d)
31

(e)

Figura 4.1 - Variação da viscosidade (cP) em função da velocidade (rpm) da carragena

padrão a: (a) 0,15%, (b) 0,20%, (c) 0,25%, (d) 0,30% e (e) 0,35%.

(a) (b)

(c) (d)
32

(e)

Figura 4.2 - Viscosidade (cP) das Soluções da Carragena Padrão de Acordo com a

Velocidade (rpm) em Diferentes Concentrações. As Siglas Car15, Car20, Car25, Car30 e

Car35 Correspondem as Concentrações de 0,15; 0,20; 0,25; 0,30 e 0,35% (m/m),

Respectivamente. As Siglas R60, R70, R80, R90 e R100 correspondem a velocidade de

60, 70, 80, 90 e 100 rpm, respectivamente.

Observou-se diferença no comportamento reológico entre as 10 amostras de

carragena comerciais analisadas e quando comparadas à carragena padrão na

concentração de 0,35% (m/m). Quando analisada a carragena padrão nesta concentração,

observamos um comportamento pseudoplástico (Figura 4.1e), e a formação de gel fraco,

sendo a viscosidade inicial de aproximadamente 300 cP (curva ascendente) e ao final,

aproximadamente 260 cP (curva descendente).

As amostras de carragena comercial que apresentaram comportamento

pseudoplástico foram a CarC1 (Figura 4.3a), CarC3 (Figura 4.3c), CarC5 (Figura 4.3d),

CarC6 (Figura 4.3e), CarC8 (Figura 4.3h) e CarC9 (Figura 4.3i), porém todas

apresentaram a viscosidade inferior a carragena padrão, sendo a amostra CarC3 a que

apresentou viscosidade mais próxima a da carragena padrão na concentração de 0,35%

(m/m), sendo aproximadamente 115 cP (curva ascendente) a viscosidade inicial e 230 cP


33

(curva descendente) a viscosidade final. Esta viscosidade inferior à da carragena padrão

na concentração de 0,35% (m/m) poderia ser atribuída a menor concentração de carragena

nas amostras comerciais, porém, ao estudarmos a viscosidade da carragena padrão em

concentrações inferiores a 0,30% (m/m) (Figura 4.1d), observamos um comportamento

dilatante, o que não foi observado nestas amostras.

Na concentração 0,30% (m/m), a viscosidade inicial da carragena padrão foi de

aproximadamente 16 cP (curva ascendente) e final de 25 cP (curva descendente), e com

característica de um fluido dilatante. Das amostras comerciais analisadas, somente a

CarC2 (Figura 4.3b), CarC4 (Figura 4.3d) e CarC7 (Figura 4.3g) apresentaram

comportamento dilatante e viscosidades inferiores a carragena padrão na concentração de

0,30% (m/m). Desta forma, podemos concluir que as carragenas comerciais analisadas

(CarC1, CarC3, CarC5, CarC6, CarC8, CarC9) foram adicionadas de outros ingredientes

que contribuíram para sua viscosidade, como por exemplo outras gomas, maltodextrinas

entre outros.

E ainda das dez amostras comerciais uma não teve sua viscosidade

analisada (CArC10) devido a formação de um gel forte, indicando claramente a

adição de possíveis adulterantes, ou seja, nas condições que o estudo foi realizado, 70%

das amostras apresentaram comportamento diferente da carragena padrão,

indicando a adição de outros polissacarídeos, sais ou outras substancias utilizadas

que influenciaram nas suas características reológicas.


34

(a) (b)

(c) (d)

(e) (f)
35

(g) (h)

(i)

Figura 4.3 – Variação da Viscosidade (cP) em função da velocidade (rpm) da carragena

comercial a 0,35%: (a) carragena comercial 1, (b) carragena comercial 2, (c) carragena

comercial 3, (d) carragena comercial 4, (e) carragena comercial 5, (f) carragena comercial

6, (g) carragena comercial 7, (h) carragena comercial 8 e (i) carragena comercial 9.

As amostras da carragena padrão CarC2, CarC4 e CarC7 na concentração de

0,35% (m/m) (Figura 4.4) quando tiveram sua viscosidades comparadas à carragena

padrão a 0,15% (m/m), apresentaram comportamento similar de viscosidade em todas as

condições analisadas, tanto para valores da curva ascendente como para a curva

descendente (comportamento dilatante), o que poderia indicar que estas três amostras não

foram adicionadas ou foram adicionadas de quantidades mínimas de outras substâncias

responsáveis por contribuírem nas viscosidades destas amostras.


36

A amostra CarC6 apresentou comportamento pseudoplástico (Figura 4.3f), o que

também não é característico para a carragena nestas condições. O contrário foi observado

nas demais amostras comerciais analisadas que tiveram o comportamento da viscosidade

completamente diferente da carragena padrão (comportamento pseudoplástico).


37

(a) (b)

(c) (d)

(e)

Figura 4.4 - Valores de viscosidade (cP) da carragena padrão a 0,15% e das carragenas

comerciais a 0,35% (m/m) com as seguintes velocidades de rotação: (a) 60 rpm, (b) 70

rpm, (c) 80 rpm, (d) 90 rpm e (e) 100 rpm. Sendo que a letra “v” nos gráficos representa

a curva descendente.
38

Segundo Nussinovitch (1998) as carragenas comerciais possuem viscosidades de

aproximadamente 5 a 900 mPas a 75°C e concentração de 1,5%. Se as viscosidades

medidas são inferiores a 100 mPas elas possuem propriedades reológicas próximas a

fluidos Newtonianos. As soluções de carragena geralmente exibem propriedades

pseudoplásticas. Em outras palavras, com soluções é importante especificar a qual taxa

de cisalhamento a viscosidade foi analisada e essa taxa deve ser ajustada conforme a

aplicação. O comportamento pseudoplástico da carragena pode ser descrita pela equação

constitutiva descrita na Equação 4.1:

log 𝜂𝑎 = log 𝑎 + (𝑏 − 1) log 𝛾̇ 4.1

Sendo 𝜂𝑎 a viscosidade aparente, 𝛾̇ a taxa de cisalhamento, 𝑎 é o índice de

consistência e 𝑏 é o índice de comportamento ou de fluxo. Para melhor ajuste, um termo

quadrático pode ser adicionado conforme Equação 4.2:

log 𝜂𝑎 = log 𝑎 + (𝑏 − 1) log 𝛾̇ + 𝑐 log 2 𝛾̇ 4.2

Em geral, a viscosidade aumenta quase exponencialmente com a concentração.

Esse comportamento é típico da carragena como consequência de interações entre a

cadeia dos polímeros. A presença de sais reduz a viscosidade de soluções de carragena

(macromoléculas iónicas) através da redução da repulsão eletrostática. Carragenas como

do tipo Kappa e Iota podem ser gelificar na presença de potássio e cálcio. Como regra

geral, o aumento da temperatura provoca a queda da viscosidade da solução. Em

temperaturas acima do ponto de gelificação, soluções gelificadas e não gelificads

comportam-se similarmente.

A relação entre a viscosidade aparente e o peso molecular médio M são

relacionados a partir da equação de Mark-Houwink descrita pela Equação 4.3:

[𝜂] = 𝐾𝑀𝛼 4.3


39

Sendo K e 𝛼 constantes. A depolimerização pode ocorrer em hidrólise em ácido

catalisado, sendo relacionado a 3,6-anidro. A carragena é estável em pH9, sendo a reação

de depolimerização dependente da atividade do íon hidrogênio e temperatura, e a taxa de

reação pode ser estimada por relações matemáticas simples. A degradação da carragena

Kappa por hidrólise em ácido de cloreto de lítio/hidroclorídrico de pH 2 foi estudado em

temperaturas de 35, 45 e 55°C por Singh e Jaconsson (1994) conforme Nussinovitch

(1998).

Segundo Anderson et al. (2002) a equação final para viscosidade Newtoniana é

descrita pela Equação 4.4:

𝐴 4.4
𝜇=
𝑇 𝑑 𝐶𝑔

Sendo T a temperatura, C a concentração, A d e g constantes empíricas. A

constante empírica A é dada pela Equação 4.5:

𝜇∗ 4.5
𝐴=
𝑏 ∙ 𝑓

Sendo 𝜇 ∗ a viscosidade de referência, b e f constantes empíricas.

Anderson et al. (2002) desenvolveram um modelo baseado na Equação 4.4 para

prever a viscosidade da solução de leite com carragena para a faixa de temperatura de 25°

até 125°C e concentrações de 0,005% até 0,0040%. Esse modelo é descrito pela Equação

4.6.

𝐶 0,11 4.6
𝜇 = 37 ( )
𝑇 0,75

A correlação entre a viscosidade medida e a prevista pela Equação 4.6 é

apresentada na Figura 4.5, sendo a equação é aplicável apelas a faixa de temperatura e

concentração do experimento.
40

Figura 4.5 - Correlação entre as viscosidades observada e prevista pelo modelo proposto

para solução de leite e carragena.

Cerar et al. (2017) estudaram amostras com carragena kappa (KC) e carragena

lambda (LC) preparadas com 0,1 molar de NaCl, enquanto as soluções com metilcelulose

(MC) foram preparadas com água pura. A viscosidade reduzida é obtida pela Equação

4.7.
𝜂 − 𝜂0 4.7
𝜂=
𝜂0 𝑐

Sendo 𝜂0 a viscosidade do solvente e c a concentração em massa do polímero.

Figura 4.6 - Determinação da viscosidade intrínseca: dados experimentais da

viscosidade reduzida vs. concentração do polímero.


41

5. CONCLUSÕES

O presente trabalho que teve como o objetivo analisar o comportamento reológico

da carragena possibilitou as seguintes conclusões:

1. A goma carragena apresenta propriedades que modificam as características

reológicas do produto, pois oferece a capacidade de tornar a solução mais viscosa

e/ou de formar gel.

2. A viscosidade da carragena padrão em concentrações iguais ou inferiores a 0,30%

(m/m), apresentou comportamento dilatante e viscosidade máxima de 25 cP.

3. 70% das carragenas comerciais analisadas apresentaram comportamento diferente

da carragena padrão, indicando a adição de outros polissacarídeos, sais ou outras

substâncias utilizadas que influenciaram nas suas características reológicas.

4. A equação do comportamento reológico depende da faixa de temperatura e da

concentração de carragena utilizada na solução.


42

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