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Joaquim Racy
RESUMO
Este artigo tem por objetivo apresentar algumas importância para a construção do conhecimento
considerações sobre a historiografia da política da história geral do país, bem como para o apoio
externa brasileira. Buscando entender a história às decisões relativas ao posicionamento e ao
das relações internacionais como um campo conseqüente relacionamento internacional do
específico de conhecimento a partir de elementos Brasil. Assim, também, como resultado, o artigo
básicos de teoria da história, procuramos mapear sugere a necessidade de constituição de uma área
sumariamente a produção de história da política específica de pensamento histórico das relações
externa brasileira de maneira a destacar sua internacionais brasileiras.
PALAVRAS-CHAVE
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A definição das gerações dos Annales aqui considerada foi desenvolvida por Burke (1997).
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os historiadores sobre a história resumida a episódios de aspectos particulares da
realidade, como acontece especialmente na política, uma vez que esta concepção de
conhecimento histórico remete a uma tradição historiográfica originada na idéia
de que a história se faz a partir de grandes acontecimentos que se restringem a
campos muito específicos da realidade.
Em boa medida, essa é uma situação que também se observa em outros cam-
pos do conhecimento nas ciências sociais, gerando mesmo certa tensão para com
a história enquanto ciência. Para Braudel, a resistência por parte de uma parcela
relativamente ampla de cientistas sociais à intromissão do historiador nos assuntos
atuais da realidade social é o produto de uma visão episódica dos fenômenos sociais,
negando o sentido de duração por meio de continuidades ou descontinuidades,
que justificam a existência de um campo próprio do conhecimento histórico.
A partir disso, inclusive, muitas vezes aos sociólogos, politólogos, economistas
e outros cientistas que não os historiadores, tem sido atribuída a responsabilidade
pela construção do conhecimento do passado. O estado da arte da ciência política
indica inelutavelmente essa situação.
No entanto, Braudel, comungando as mesmas idéias de Bloch e Febvre sobre
o fato de o passado e o presente esclarecerem-se mutuamente, questiona se a his-
tória, enquanto dialética da duração, não é, à sua maneira, a explicação do social
em toda a sua realidade, inclusive atual.
Nesse sentido, para ele, a história política, como de resto as histórias que remetem
a realidades particulares, não deve ser necessariamente episódica, pois ela pode se
constituir como importante recurso na construção de um modelo explicativo do todo
social. As idéias e as ações conduzidas por instituições políticas, tais como o Estado,
por exemplo, podem elucidar ou possibilitar a compreensão da ordem assumida pela
realidade social como um todo. Para tanto, os modelos, que também se constroem na
história, assumem um papel de destaque na medida em que a pesquisa histórica saia
da realidade social para o modelo e dele volte para aquela realidade.
Assim, também Braudel indica como possibilidade para a produção histo-
riográfica o recurso a técnicas de quantificação presentes na ciência econômica
com a idéia de ciclos e interciclos e refletindo a noção de estrutura e conjuntura,
conforme fez originalmente Ernest Labrousse.
O pensamento de Braudel, portanto, encontra identificação com a perspectiva
de compreensão da realidade social de Marx. Esta só se dá por meio de modelos
acima de tudo históricos; para o próprio Braudel, o poder de Marx viria exatamente
de sua capacidade de construir modelos a partir da duração histórica.
Mas aqui se coloca nova e relevante questão dizendo respeito à agência dos
indivíduos no processo histórico. Não cabe aqui resgatar as importantes discus-
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Para uma visão resumida e organizada do problema ver Portelli (1983).
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Destacam-se aí suas “Eras”: das Revoluções, do Capital, do Império e dos Extremos.
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O debate entre realistas e globalistas pode ser encontrado, por exemplo, em Baldwin (1993).
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Conforme indicado no texto, os programas de estudos históricos em geral no Brasil não dis-
ponibilizam cursos e linhas de pesquisa voltados para a área internacional. Esses dispositivos
são encontrados em outras áreas cujas preocupações se concentram em questões específicas
ou não observam as questões metodológicas inerentes ao ofício do historiador.
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This article aims at presenting some considera- as a source of knowledge about the general history
tions concerning the Brazilian foreign policy his- of the country and as a support to decision making
toriography. Assuming the Brazilian international referred to external relations of Brazil. The article
relations as a specialized field of knowledge, we try also suggests the need of the constituition of a
to map the history production focused on Brazilian specific area of studies focusing on the historical
foreign policy intending to reinforce its importance thought in this field of policy-making in Brazil.
KEY WORDS
historical knowledge
Annales
marxism
nation
RECEBIDO EM
julho de 2008
APROVADO EM
fevereiro de 2009
JOAQUIM RACY
Economista, Cientista Político, Mestre e Doutor em História (Política Externa Brasileira) pela Pontifícia