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Numa época em que se discutem tanto os malefícios de vida nas grandes

cidades e se defende o regresso a uma vida simples e em contacto com a


natureza, o livro de Eça de Queirós, “A Cidade e as Serras” surge como uma
boa oportunidade para refletir sobre uma questão que define a nossa própria
vida.

Afinal todos teremos que decidir, como na velha fábula, se vamos ser ratos do
campo ou ratos da cidade.

O próprio Eça, habituado aos espaços urbanos, cultivou sempre um ideal de


vida doméstica e familiar próxima da natureza e da simplicidade do campo…

Esta também foi a decisão que o protagonista desta obra teve de fazer…

Neste romance, publicado em 1901, a personagem de José ("Zé") Fernandes


relata a história do protagonista Jacinto de Tormes. Na primeira parte da
história, Zé Fernandes justifica sua aproximação de Jacinto, ligando-se a ele por
amizade fraternal em Paris.

Jacinto nascera e sempre morara num palácio, nos Champs-Élysées, número


202. A mudança da sua família de Tormes, em Portugal, para Paris deveu-se ao
seu avô Jacinto Galião. O seu neto, ao contrário do pai, que morrera
tuberculoso, foi sempre fisicamente forte e, além de rico, era inteligente,
voltando toda sua atividade para o conhecimento. Mas detestava o campo e
amontoara no seu palácio, em livros, toda a conquista das filosofias e ciências,
além dos aparelhos tecnicamente mais sofisticados da época. E, para Jacinto,
"o homem só é superiormente feliz quando é superiormente civilizado". Zé
Fernandes era decididamente contrário a essa orientação tecnicista e vai
registando como Jacinto rompe totalmente com seu passado campesino,
deteriorando-se na cidade.

Um dia, porém, Jacinto, aborrecido da vida urbana, participa a Zé Fernandes a


sua partida para Portugal, a pretexto de reconstruir a capela de Tormes (onde
os seus antepassados estariam enterrados), deslocando para lá os confortos do
palácio.

No entanto, o seu criado Grilo perde-se com as bagagens, que, por engano,
foram remetidas para Alba de Tormes, em Espanha.

Assim o supercivilizado Jacinto chega a Tormes apenas com a roupa do corpo.

Obrigado a um contato estreito com a natureza, Jacinto acaba por renovar-se,


numa atitude de encantamento.

Nesta fase da narrativa é mostrado o maior contraste entre as cidades e as


serras e o autor descreve todos os detalhes daquela região do Douro.
Integrando-se depois na vida produtiva do campo, aplica os seus
conhecimentos técnicos e científicos à situação concreta de Tormes, projeta
construir queijarias, plantar lavouras. Sem romper totalmente com os valores
da "civilização", Jacinto adapta o que pode ao campo. Modernizam-se dessa
forma as serras e Jacinto vê a serra como um lugar perfeito e ideal.
Compadecido da situação de uma camponesa doente, traz médico para cuidar
dela. Desse ponto em diante, Jacinto passa a ser visto como um verdadeiro "pai
dos pobres". Ao “príncipe da Grã-Ventura” (como carinhosamente Zé Fernandes
o trata), só faltava um lar, o que vai acontecer, por meio de seu casamento
com a prima de Zé Fernandes, Joaninha, com quem tem dois filhos.

Assim completamente feliz, no quotidiano das serras, Jacinto não volta mais a
Paris, ao contrário de Zé Fernandes, que vai mais uma vez a Paris e entende o
motivo da tristeza de Jacinto quando estava lá: a pressa, a falsidade, a
degeneração do espírito da cidade e das pessoas que nela vivem.

Zé Fernandes volta a Tormes onde é esperado por Joaninha, Jacinto e os filhos


deles e nesse momento Zé Fernandes percebe que Tormes é o Castelo da Grã-
Ventura de que o seu príncipe precisava para ser feliz.

“A Cidade e as Serras” é, pois, uma variação sobre a velha história do rato do


campo e o rato da cidade…

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