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Sinais e sintomas
Causas
Os parasitas da malária pertencem ao género Plasmodium (filo Apicomplexa). No ser humano, a
malária é provocada por P. falciparum, P. malariae, P. ovale, P. vivax e P. knowlesi.[21][22] Entre a
população infectada, a espécie com maior prevalência é a P. falciparum (~75%), seguida pela P.
vivax (~20%).[5] Embora a P. falciparum seja a responsável pela maioria das mortes,[23] existem
dados recentes que sugerem que a malária por P. vivax está associada a condições que colocam
a vida em risco em igual número com a infecção por P. falciparum.[24] A P. vivax é, em proporção,
mais comum fora de África.[25] Estão também documentadas várias infecções humanas com
diversas espécies de Plasmodium de origem símia; no entanto, com a exceção da P. knowlesi –
uma espécie zoonótica que provoca malária nos macacos[22] – a relevância para a saúde pública
destas infecções é apenas residual.[26]
Ciclo de vida do parasita
Ciclo de vida dos parasitas da malária. Ao alimentar-se de sangue, um mosquito dá origem à infecção. Numa primeira fase,
os esporozoítos entram na corrente sanguínea, depositando-se no fígado. De seguida, infectam as células hepáticas, nas
quais se multiplicam formando merozoítos, os quais rasgam as células e regressam à corrente sanguínea. Por último, os
merozoítos infectam os glóbulos vermelhos, nos quais se desenvolvem em formas anelares, trofozoítos e esquizontes, que
por sua vez irão produzir mais merozoítos. São também produzidas formas sexuais capazes de infectar outro mosquito e
dar continuidade ao ciclo de vida.
Fisiopatologia
Micrografia de uma placenta de um nado-morto devido a um caso de malária durante a gravidez. As estruturas mais
escuras nos glóbulos vermelhos indicam a presença dos parasitas.
A infecção de malária desenvolve-se em duas fases: uma que envolve o fígado (fase
exoeritrocítica) e outra que envolve os glóbulos vermelhos, ou eritrócitos (fase eritrocítica).
Quando um mosquito infectado perfura a pele de uma pessoa para se alimentar de sangue, os
esporozoítos presentes na saliva do mosquito penetram na corrente sanguínea e depositam-se
no fígado, onde infectam os hepatócitos, reproduzindo-se assexualmente e sem haver
manifestação de sintomas ao longo de 8-30 dias.[34]
Depois de um período de dormência no fígado, estes organismos diferenciam-se para produzir
milhares de merozoítos, os quais, após romperem as células hospedeiras, se introduzem na
corrente sanguínea e infectam os glóbulos vermelhos, dando início à fase eritrocítica do ciclo de
vida.[34] O parasita é capaz de abandonar o fígado sem ser detectado, ao se envolver com
a membrana celular da célula hepática do hospedeiro.[35] No interior dos glóbulos vermelhos, os
parasitas reproduzem-se novamente, também de forma assexuada, rompendo periodicamente as
células hospedeiras para infectar novos glóbulos vermelhos.[34]
Alguns esporozoítos P. vivax não se desenvolvem imediatamente em merozoítos, produzindo em
vez disso hipnozoítos que permanecem adormecidos por intervalos de tempo que variam entre
alguns meses, geralmente 7 a 10 meses, e vários anos. Após o período de hibernação, os
hipnozoítos são reativados e produzem merozoítos. Os hipnozoítos são responsáveis pelos
longos períodos de incubação e recidivas tardias em infecções por P. vivax,[32] embora se
desconheça ainda a sua existência em casos de P. ovale.[36]
O parasita encontra-se relativamente protegido de ataques do sistema imunitário do corpo, uma
vez que durante a maior parte do seu ciclo de vida humano se encontra no interior das células do
fígado e dos glóbulos vermelhos, sendo por isso relativamente invisível à vigilância imunitária. No
entanto, os glóbulos vermelhos infectados em circulação são destruídos no baço. Para evitar a
sua destruição, o parasita P. falciparum introduz proteínas adesivas na superfície dos glóbulos
vermelhos infectados, o que faz com que os glóbulos se agarrem às paredes dos vasos
sanguíneos mais pequenos e não tenham que percorrer o sistema circulatório e passar pelo baço.
[37]
O bloqueio dos vasos pode provocar malária placentária.[38] Os glóbulos vermelhos
sequestrados podem penetrar na barreira hematoencefálica e provocar malária cerebral.[39]
Resistência genética
De acordo com uma revisão de 2005, os elevados níveis de letalidade e morbidade provocados
pela malária, especialmente pela espécie P. falciparum, são responsáveis pela maior pressão
seletiva sobre o genoma humano da história recente. Algumas características genéticas
proporcionam alguma resistência à malária, entre os quais a anemia
falciforme, talassemia, deficiência em glucose-6-fosfato desidrogenase e a ausência do antígeno
de Duffy nos glóbulos vermelhos.[40][41]
A anemia falciforme provoca um defeito nas moléculas de hemoglobina do sangue. As moléculas
de hemoglobina S fazem com que os glóbulos vermelhos assumam uma forma curva semelhante
a uma foice (falciforme), em vez da forma bicôncava normal. Devido a esta deformação, a
molécula perde alguma da sua eficácia na absorção e libertação de oxigénio. A infeção faz com
que os glóbulos vermelhos se curvem ainda mais, sendo por isso removidos de circulação mais
cedo, o que por sua vez reduz a frequência com que os parasitas completam o seu ciclo de vida
na célula. Os indivíduos homozigóticos (com duas cópias do alelo anormal) desenvolvem anemia
falciforme, enquanto que os heterozigóticos (com um alelo anormal e outro normal) apresentam
resistência à malária.[41][42]
Insuficiência hepática
É pouco comum a ocorrência de insuficiência hepática provocada por malária, sendo geralmente
o resultado da coexistência com outras condições que afectam o fígado, como a hepatite viral ou
qualquer doença crónica do fígado. A síndrome é por vezes denominada “hepatite malárica”.
Embora a sua ocorrência seja ainda considerada rara, a hepatopatia malárica tem vindo a
aumentar, sobretudo na Índia e no Sudeste Asiático. A presença de doenças hepáticas em
pacientes de malária aumenta a probabilidade de complicações ou morte.[43]
Diagnóstico
A análise de esfregaços de sangue por microscopia é o exame padrão de diagnóstico de malária. Nesta amostra pode-se
observar formas anelares e gametócitos de Plasmodium falciparum entre os glóbulos vermelhos.
Os exames de diagnóstico rápido (RDT) determinam resultados em cerca de 20 minutos e são úteis em regiões onde não
estão disponíveis análises laboratoriais
Devido à natureza não específica dos sintomas, o diagnóstico de malária em regiões onde não
seja endémica exige confirmação redobrada e deve levar em conta factores de diagnóstico
auxiliares, como o histórico recente de viagens, aumento de volume do baço, febre, número
reduzido de plaquetas no sangue e quantidade de bilirrubina no sangue superior ao normal com
quantidade normal de glóbulos brancos.[5]
A malária é geralmente confirmada através de exame microscópico de esfregaços ou através de
testes de diagnóstico rápido (DRT) baseados na deteção de antígenos.[44][45] A microscopia é o
método mais comum na deteção do parasita.[46] No entanto, apesar do seu uso generalizado, o
diagnóstico por microscopia tem duas desvantagens: muitos locais, sobretudo em meios rurais,
não têm equipamento para a realização do exame e a precisão dos resultados depende da
destreza do examinador e da quantidade de parasitas no sangue. A sensibilidade dos esfregaços
varia entre 75–90% em condições normais, podendo diminuir até 50%. Os testes de diagnóstico
rápido disponíveis são mais precisos a determinar a presença de parasitas da malária do que a
análise microscópica, embora a sua sensibilidade e especificidade dependam do fabricante e não
sejam capazes de determinar o número de parasitas.[46]
Em regiões onde estejam disponíveis análises de laboratório, deve-se suspeitar a presença de
malária em qualquer paciente que manifeste sintomas e que tenha estado numa região onde a
malária seja endémica. Em regiões onde não há capacidade de disponibilizar facilmente análise
laboratorial, tem vindo a tornar-se rotina usar apenas o histórico de febre subjetiva como indicador
de tratamento para malária – um diagnóstico presuntivo que assume que febre corresponde a
malária, a não ser que haja prova em contrário. Uma desvantagem desta prática é
o sobrediagnóstico de malária e a gestão inadequada de casos de febre sem relação com a
malária, o que desperdiça recursos, diminui a confiança no sistema de saúde e aumenta a
resistência a fármacos.[47] Embora tenham já sido desenvolvidos testes que têm por base a reação
em cadeia da polimerase, não estão ainda difundidos pelas regiões onde a malária é endémica
devido à sua complexidade.[5]
Classificação
A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a malária em “grave” ou “não complicada”.
[5]
Classifica-se como grave quando está presente ‘’qualquer um’’ dos seguintes critérios; caso
contrário, é considerada não complicada.[48]
Prevenção
Um mosquito Anopheles stephensi, pouco depois de se ter alimentado de sangue de um ser humano. Este mosquito é o
principal transmissor da malária e o seu controlo representa uma forma eficaz de reduzir a sua incidência.
Vaporização residual de paredes com DDT. Os mosquitos permanecem na parede até caírem mortos no chão.
As Redes mosquiteiras proporcionam uma barreira de proteção contra picadas noturnas de mosquitos infetados. A sua
eficácia pode ser melhorada com a aplicação de inseticida.
Os métodos usados para reduzir a malária através da diminuição do número de transmissões são
denominados controlo de vetores. Em termos de proteção individual, os repelentes de insetos à
base de DEET ou Icaridina são os mais eficazes.[52] A vaporização residual de interiores com
inseticida e o uso de redes mosquiteiras, às quais é aplicado também inseticida, são outras
técnicas de erradicação que têm demonstrado ser altamente eficazes na prevenção de malária
em regiões endémicas.[53][54]
Vaporização residual designa uma técnica que consiste na vaporização de inseticida nas paredes
interiores de casas em regiões afetadas pela malária. Depois de se alimentarem, muitas espécies
de mosquito descansam numa superfície próxima enquanto digerem o sangue. Se as paredes da
habitação tiverem sido revestidas com inseticida, é provável que o mosquito morra antes de picar
outra pessoa e transferir o parasita da malária.[55] À data de 2006, a Organização Mundial de
Saúde recomenda o uso de doze inseticidas para ações de vaporização residual, entre os
quais DDT e os piretoides ciflutrina e deltametrina.[56] O uso de pequenas quantidades de DDT
para ações de saúde pública é autorizado pela Convenção de Estocolmo para os poluentes
orgânicos persistentes, a qual proíbe o seu uso na agricultura.[57] Um dos problemas da
vaporização residual é a resistência ao pesticida. Os mosquitos afetados pela vaporização
geralmente vivem e descansam no interior das habitações e, devido à irritação provocada pela
vaporização, os seus descendentes tendem a viver no exterior, o que significa que serão menos
afetados pela técnicas de vaporização residual.[58]
As redes mosquiteiras ajudam a manter os mosquitos afastados de pessoas e reduzem as taxas
de infeção e transmissão de malária. No entanto, as redes não constituem uma barreira perfeita e
são muitas vezes tratadas com um inseticida próprio para matar o mosquito antes que seja capaz
de encontrar uma forma de passar a rede. Estima-se que as redes tratadas com inseticida sejam
duas vezes mais eficazes que redes não tratadas e que ofereçam mais 70% de proteção quando
comparada com os dados na ausência de qualquer rede.[59] Entre 2000 e 2008, o uso de redes
tratadas com inseticida salvou a vida a mais de 250 000 crianças na África Subsariana.[60] Embora
as redes com inseticida possam prevenir a malária, só estão presentes em cerca de 13% dos
lares nos países subsarianos.[61] O método de uso recomendado é a suspensão de uma rede de
grande dimensão por cima do centro da cama, de modo a envolvê-la por completo, e amarrar as
pontas. As redes tratadas com piretroides e inseticidas de longa duração proporcionam a
proteção pessoal mais eficaz, sobretudo quando usadas desde o anoitecer ao amanhecer.
[62]
Usando uma ferramenta de edição de gene conhecido como CRISPR/Cas9, em 2015,
pesquisadores fizeram uma "vacina genética" que continuamente injetar-se no DNA de
mosquitos. Uma vacina deste tipo, conhecida como uma unidade de gene, pode difundir para
quase todos os mosquitos numa população em algumas gerações.[63] Um método para prevenir a
transmissão da malária que consiste em limitar o acesso de mosquitos a casas, bloqueando
aberturas e instalação de tubos "eave" que contêm um tipo único de ataque com mosquiteiro com
inseticida que mata os insetos quando eles tentam entrar, recebeu $10,2 milhões de dólares da
da Fundação Bill & Melinda Gates em 2015.[64]
Existem outros métodos destinados a reduzir o número de picadas de mosquito e abrandar a
disseminação da malária. Uma vez que a larva do mosquito se desenvolve em águas estagnadas,
drenar essa água ou acrescentar-lhe substâncias que diminuem o seu desenvolvimento é uma
técnica eficaz nalgumas regiões.[65] No entanto, não há qualquer evidência que os aparelhos
eletrónicos repelentes de insetos através de ultrassons sejam minimamente eficazes.[66]
Medicação
Existem diversos fármacos disponíveis para a prevenção de malária em viajantes que se
desloquem para regiões onde a malária é endémica. Muitos destes fármacos são também usados
no tratamento da doença. Nos casos em que o parasita ainda seja sensível, pode ser
usada cloroquina.[67] No entanto, a maior parte dos Plasmodium é resistente a um ou mais
fármacos, pelo que geralmente é necessário recorrer a outros fármacos ou a combinações entre
fármacos. Entre estes estão a mefloquina, doxiciclina (disponível em genéricos) ou a combinação
de atovaquona e proguanil.[67] A combinação entre doxiciclina e a combinação atovaquona-
proguanil é a que é melhor tolerada pelo organismo. A mefloquina está associada a episódios de
suicídio, morte e sintomas psiquiátricos.[67]
O efeito protetor não começa imediatamente após a primeira toma, pelo que os viajantes devem
começar a tomar os medicamentos entre uma e duas semanas antes da chegada e continuar a
tomá-los ao longo de duas semanas após terem deixado a região (à exceção da combinação
atovaquona-proguanl, que só necessita de ser iniciada dois dias antes e prolongada por mais sete
dias após).[68] O uso de fármacos preventivos não é prático para os residentes em regiões onde
existe malária, pelo que o seu uso se restringe a viajantes e turistas de curta estadia. Isto deve-se
ao preço dos medicamentos, aos efeitos secundários provocados pelo uso prolongado e à
dificuldade em obter anti-maláricos fora dos países desenvolvidos.[69] O uso de fármacos
preventivos nas regiões onde haja mosquitos podem contribuir para o desenvolvimento de
resistência parcial.[70]
Outros métodos
Entre as comunidades dos países em vias de desenvolvimento, as campanhas de saúde que
promovem a consciencialização para o problema da malária e a importância de medidas de
controlo têm-se revelado eficazes para a redução da incidência da doença.[71] Identificar os
estágios iniciais de malária pode impedir que a doença se torne fatal. As campanhas alertam
também as pessoas no sentido de cobrirem áreas de água estagnada, como tanques ou
depósitos, os quais são o meio ideal para a reprodução do mosquito e do parasita.[72] Outra
intervenção que tem demonstrado ser eficaz no controlo da malária em grávidas e crianças é a
Terapia Preventiva Intermitente, na qual é fornecida medicação anti-malárica a estes grupos de
risco.[73][74]
Tratamento
A malária é tratada com medicação anti-malárica. A escolha do fármaco depende do tipo e
gravidade da doença. Apesar de geralmente serem também usados medicamentos para baixar a
febre, a sua influência no tratamento não é ainda conclusiva.[75]
A malária não complicada pode ser tratada com medicação oral. O tratamento mais eficaz para a
infeção por P. falciparum é o uso de artemisinina combinada com outros anti-maláricos,
denominada Terapia Combinada de Artemisinina ou ACT. A combinação de fármacos diminui as
hipóteses de se verificar resistência do parasita a qualquer um dos componentes individuais.
[76]
Entre os outros anti-maláricos com que a artemisinina é combinada estão
a amodiaquina, lumefantrina, mefloquina ou sulfadoxina/pirimetamina.[77] Outra combinação
recomendada é a associação dihidroartemisinina-piperaquina.[78][79] A ACT é eficaz em 90% dos
casos de tratamento de malária sem a presença complicações.[60] Para o tratamento de malária na
gravidez, a OMS recomenda o uso de quinino e clindamicina no primeiro trimestre e ACT nos
restantes trimestres.[80] Na década de 2000, surgiu no Sudeste Asiático malária parcialmente
resistente a artemisinas.[81][82] A infeção por’P. vivax, P. ovale or P. malariae é geralmente tratada
sem necessidade de internamento hospitalar. O tratamento de’P. vivax requer não só o
tratamento das fases sanguíneas (com cloroquina ou ACT), como também da eliminação das
formas hepáticas com primaquina.[83]
O tratamento recomendado para a malária grave é a administração intravenosa de fármacos anti-
maláricos. Em casos graves, o artesunato é superior ao quinino, tanto em crianças como em
adultos.[84] O tratamento de malária grave envolve medidas de apoio que são melhor realizadas
numa unidade de cuidados intensivos, onde se possa gerir a febre elevada e as convulsões que
dela derivam. As unidades hospitalares também permitem monitorizar o esforço respiratório, a
descida da quantidade de açúcar no sangue e a descida da quantidade de potássio.[23]
Prognóstico
Esperança de vida corrigida pela incapacidade para a malária por cada 100 000 pessoas em 2004
Quando tratada de forma adequada, uma pessoa com malária pode contar com recuperação
total.[85] No entanto, a malária grave pode progredir muito rapidamente e provocar a morte num
prazo de horas ou dias.[86] Nos casos mais graves da doença, a taxa de letalidade pode atingir os
20%, mesmo com cuidados intensivos.[5] Têm sido documentados casos de atraso no
desenvolvimento a longo prazo de crianças que vivenciaram episódios de malária grave.[87]
Durante a infância, a malária pode provocar anemia ou, no caso de malária cerebral, lesões
cerebrais.[87] Alguns dos sobreviventes de malária cerebral apresentam um risco acrescido de
défice neurológico e cognitivo e manifestam transtornos emocionais e epilepsia.[88] Quando
comparada com grupos placebo em ensaios clínicos, a profilaxia de malária demonstrou melhorar
a função cognitiva e o desempenho escolar.[87]
Epidemiologia
A Organização Mundial de Saúde estima que em 2010 tenham ocorrido 219 milhões de casos de
malária que provocaram a morte a 600 000 pessoas.[89][5] Outras fontes estimaram o número de
casos entre 350 e 550 milhões para a malária falciparum[90] e 1,24 milhões de mortes em 2010,
[91]
uma subida em relação ao milhão de mortes estimado em 1990.[92] A maioria dos casos (65%)
ocorre em crianças com idade inferior a 15 anos.[91] Cerca de 125 milhões de grávidas estão em
risco de ser infetadas a cada ano. Na África subsariana, estima-se que a malária materna esteja
associada à morte de 200 000 crianças anualmente.[19] Tanto a incidência global como a
mortalidade que daí resulta têm vindo a diminuir nos últimos anos. De acordo com a OMS, as
mortes atribuídas à malária em 2010 correspondem a uma diminuição de cerca de um terço,
quando comparadas com a estimativa de 985 000 para o ano 2000, devido em grande parte à
disseminação do uso de redes mosquiteiras tratadas com inseticida e da terapia combinada de
artemisinina.[60]
História
Recolha de larvas e pulverização de inseticida no controlo de malária na Indonésia durante o início do século XX.
Drenagem de água estagnada através da abertura de valas no sul dos Estados Unidos durante a década de 1920. O
controlo de vetores permitiu na primeira metade do século XX erradicar a doença da Europa e da América do Norte
Em abril de 1894, Patrick Manson e o médico escocês Ronald Ross iniciam uma colaboração ao
longo de quatro anos, a qual culminaria em 1898 no momento em que Ross, que trabalhava no
hospital geral de Calcutá, demonstra o ciclo de vida completo do parasita da malária nos
mosquitos, provando que o mosquito é o vector da malária em humanos ao mostrar que
determinadas espécies de mosquitos transmitem malária às aves. Ross isolou parasitas de
malária a partir das glândulas salivares dos mosquitos que se tinham alimentado de aves
infectadas.[123] Em 1902, Ross foi agraciado com o Nobel de Medicina. Depois de se demitir do
Serviço de Medicina indiano, Ross foi admitido na nova Escola de Medicina Tropical
em Liverpool, onde administrou campanhas de controlo da malária
no Egito, Panamá, Grécia e Maurícia.[124] As descobertas de Finlay e Ross foram confirmadas em
1900 por uma comissão médica presidida por Walter Reed, cujas recomendações foram
implementadas durante a construção do canal do Panamá. Esta estratégia pioneira salvou a vida
a milhares de trabalhadores e ajudou a definir os métodos usados em futuras campanhas de
saúde pública contra a doença.[125]
O primeiro tratamento eficaz para a malária surge a partir da casca do arbusto cinchona, a qual
contém quinino. Este arbusto cresce nas encostas dos Andes, sobretudo no Peru. Os índios
peruanos faziam uma tintura de cinchona para o tratamento da febre. Descobriu-se que era eficaz
contra a malária e, por volta de 1640, foi introduzida pelos Jesuítas na Europa. Em 1677 estava já
inscrita na farmacopeia de Londres enquanto tratamento antimalárico.[126] No entanto, foi apenas
em 1820 que o princípio ativo, o quinino, foi extraído da casca, isolado e batizado pelos químicos
franceses Pierre Joseph Pelletier e Joseph Bienaimé Caventou.[127][128]
O quinino tornou-se o principal medicamento antimalárico até à década de 1920, quando se
começaram a desenvolver novos fármacos. Na década de 1940, o quinio é substituído
pela cloroquina enquanto tratamento de eleição caso não se verifique resistência, tanto para a
malária não complicada como para a malária grave. A cloroquina começou a ser usada no
Sudeste Asiático e na América do Sul na década de 1950, e em todo o mundo na década de
1980.[129] A artemisinina, descoberta a partir da planta Artemisia annua pela equipa da cientista
chinesa Tu Youyou na década de 1970, tornou-se o tratamento recomendado para a malária
falciparum, administrado em associação com outros fármacos.[130]
O Plasmodium vivax foi usado entre 1917 e a década de 40 na malarioterapia – a injeção
propositada de parasitas da malária de modo a induzir febre para combater determinadas
doenças como a sífilis. Em 1917, o inventor desta técnica, Julius Wagner von Jauregg, recebeu o
Nobel de Medicina. No entanto, a técnica era perigosa, matando cerca de 15% dos pacientes,
pelo que deixou de ser usada.[131]
O primeiro pesticida usado para a vaporização residual interior foi o DDT.[132] Embora inicialmente
fosse usado em exclusivo para combater a malária, rapidamente começou a ser usado também
na agricultura. Com o decorrer do tempo, o produto passou a ser usado principalmente para o
controlo de pragas em larga escala, o que provocou a resistência dos mosquitos ao pesticida em
inúmeras regiões. Durante a década de 1960, aumentou a consciencialização pública do impacto
negativo do seu uso indiscriminado, o que levaria na década seguinte à interdição do DDT na
agricultura em vários países.[57] Antes do DDT, nas áreas tropicais como o Brasil ou o Egito, a
malária era eliminada ou controlada através da remoção ou envenenamento dos habitats de
reprodução do mosquito ou dos habitats aquíferos das larvas ao aplicar, por exemplo, o composto
altamente tóxico Verde de Paris em águas estagnadas.[133]
A investigação procura ainda uma vacina contra a malária. Os primeiros estudos promissores que
demonstraram o potencial para a possibilidade de uma vacina foram realizados em 1967, através
da inoculação de ratos com esporozoítos vivos atenuados por radiação, os quais ofereceram
proteção significativa perante injeções posteriores com esporozoítos normais. Desde a década de
1970 que tem havido esforços consideráveis no sentido de desenvolver uma estratégia de
vacinação semelhante em seres humanos.[134]
Sociedade e cultura
Impacto económico
A malária não é apenas uma doença associada à pobreza; algumas conclusões sugerem que a
própria doença seja uma das causas de pobreza e um entrave significativo ao desenvolvimento
económico.[9][10] Embora as regiões mais afetadas sejam as tropicais, a malária atinge também
regiões temperadas com alterações sazonais profundas. A doença tem vindo a ser associada a
efeitos nefastos muito significativos na economia das regiões onde está disseminada.[135] Em 1995,
a comparação do PIB per capita, corrigido pela paridade do poder de compra, entre países com
malária e países sem malária indicou uma diferença na proporção de um para cinco (1 526 $ e
8 268 $, respetivamente). No período entre 1965 e 1990, nos países onde a malária era endémica
o crescimento económico do PIB ‘’per capita’’ foi, em média, de apenas 0,4% ao ano, em
contraste com os 2,4% dos restantes países.[136]
A pobreza pode aumentar o risco de malária, uma vez que aqueles que vivem na pobreza não
têm recursos financeiros para prevenir ou tratar a doença. Estima-se que o custo global do
impacto da malária em África seja anualmente de 12 mil milhões de dólares. O impacto
económico engloba as despesas com cuidados de saúde, dias de trabalho perdidos, dias
perdidos na educação, diminuição da produtividade devido às lesões cerebrais e perda de
receitas de investimento e de turismo.[11] A doença representa um fardo pesado para alguns
países, nos quais é responsável por 30-50% dos internamentos hospitalares, até 50% dos
doentes de ambulatório, e até 40% da despesa pública de saúde.[137]
A malária cerebral é uma das principais causas de deficiências neurológicas em crianças
africanas.[88] Os estudos comparativos de funções cognitivas antes e após o tratamento para a
malária grave continuam a demonstrar a diminuição do desempenho escolar e das capacidades
cognitivas, mesmo após o recobro.[87] Assim, a malária grave e cerebral representam
consequências sócio-económicas que se prolongam muito para além das consequências
imediatas da doença.[138]
Contrafação e falsificação de medicamentos
Têm sido encontrados diversas contrafações sofisticadas de medicamentos provenientes de
vários países asiáticos como o Camboja,[139] China,[140] Indonésia, Laos, Tailândia e Vietname. Estas
falsificações são responsáveis por mortes de outra forma evitáveis nesses países.[141] A OMS
refere que há estudos que estimam que até 40% dos medicamentos de malária à base de
artesunato sejam contrafeitos, sobretudo na região do Grande Mekong, tendo implantado um
sistema de alerta rápido que permite que a informação sobre medicamentos contrafeitos seja
rapidamente reportada às autoridades dos países aderentes.[142] Não existe um método eficaz que
permita aos médicos ou à população em geral detectar medicamentos de contrafação sem a
ajuda de um laboratório. As farmacêuticas combatem o aumento de fármacos falsificados com o
recurso a novas tecnologias que ofereçam maior segurança desde a fonte à distribuição.[143]
Outro problema de saúde clínica e pública é a proliferação de medicamentos anti-maláricos de
qualidade inferior, os quais resultam da concentração inapropriada de ingredientes, contaminação
com outros fármacos ou impurezas tóxicas, ingredientes de fraca qualidade, pouca estabilidade e
embalamento inadequado.[144] Um estudo de 2012 demonstrou que cerca de um terço dos
medicamentos anti-maláricos no Sudeste Asiático e na África subsariana ou eram falsificados ou
não passavam nos exames químicos e padrões de embalagem.[145]
Estratégias de erradicação
Têm sido realizadas diversas tentativas notáveis com o intuito de eliminar o parasita de várias
partes do mundo, ou de o erradicar por completo. Em 2006, a organização Malaria No
More anunciou o objetivo de erradicar a malária de África em 2015.[146] Existem várias vacinas em
fase de ensaio clínico, destinadas a proporcionar proteção para as crianças de regiões endémicas
e reduzir a velocidade de transmissão da doença. Em 2012, o Fundo Global de luta contra a
SIDA, Tuberculose e Malária distribuiu 230 milhões de redes tratadas com inseticida destinadas a
impedir a transmissão através da picada do mosquito.[147] A norte-americana Fundação Clinton tem
trabalhado para gerir a procura e estabilizar preços no mercado da artemisinina.[148] Outros
projetos, como o Projeto do Atlas da Malária, estão focados na análise de dados climáticos e
meteorológicos que permitam prever a propagação de malária com base na disponibilidade de
habitats para os vectores de parasitas.[149]
A malária já foi erradicada ou bastante reduzida em determinadas regiões. A doença já foi comum
nos Estados Unidos e na Europa do sul, mas as iniciativas de controlo de vectores em conjunto
com a monitorização e tratamento de indivíduos infetados, proporcionaram a sua erradicação.
Para tal contribuíram vários factores: a drenagem de terrenos alagados para agricultura, diversas
alterações nas práticas de gestão de recursos hídricos, generalização do saneamento e uso de
janelas de vidro e redes mosquiteiras nas habitações.[150] Os mesmos métodos permitiram
erradicar a malária da maior parte dos Estados Unidos no início do século XX, restando apenas
nalguns focos no Sul, tendo sido erradicada por completo na década de 1950 com recurso a DDT.
[151]
No Suriname, a doença foi erradicada da capital e regiões costeiras em 1955 através de um
programa que consistia em três medidas: controlo de vectores através do uso de DDT e
vaporização residual; recolha regular de amostras de sangue da população para identificar casos
da doença; e tratamento com quimioterapia para todos os infetados.[152] O Butão tem
implementada uma estratégia agressiva de erradicação, tendo conseguido entre 1994 e 2010
uma redução de 98,7% dos casos confirmados através de microscopia. Estas metas foram
conseguidas com recurso a técnicas de controlo de vectores, como a vaporização residual em
áreas de risco e através da distribuição de redes tratadas com pesticidas, auxiliadas pelo
desenvolvimento económico e melhoria no acesso a serviços de saúde.[153]
Investigação
Em animais
Estão identificadas cerca de 200 espécies parasíticas de Plasmodium capazes de infetar aves,
répteis e outros mamíferos,[171] e cerca de 30 espécies que infetam naturalmente outros primatas
para além do ser humano.[172] Alguns dos parasitas de malária que afetam outros primatas
funcionam como organismos modelo para os parasitas humanos; por exemplo o P. coatneyi é um
modelo para o P. falciparum e o P. cynomolgi para o P. vivax. As técnicas de diagnóstico usadas
para detectar parasitas em primatas são semelhantes às usadas para detectar em humanos.
[173]
Os parasitas de malária que afetam roedores são amplamente usados como modelos na
investigação, como por exemplo o P. berghei.[174]A malária aviária afeta principalmente as espécies
da ordem dos Passeriformes, e constitui uma ameaça significativa para as aves
de arquipélagos como as Galápagos ou o Havai. Sabe-se, por exemplo, que o parasita P.
relictum desempenha um papel na limitação da distribuição e abundância das aves endémicas do
Havai. Prevê-se que o aquecimento global aumente a prevalência e distribuição mundial da
malária aviária, à medida que a subida da temperatura proporciona condições ótimas para a
reprodução do parasita.[175]