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Aderaldo Pereira dos Santos

Os primeiros
anos da escola
joão luis alves
(1926 - 1929)
1a Edição

Rio de Janeiro
2018
Governador do Estado do Rio de Janeiro Luis Fernando de Souza

Secretaria de Educação Vagner Victer

Diretor Geral Novo DEGASE Alexandre Azevedo de Jesus

Assessoria de Sistematização Institucional Claudia Lucia Silva Mendes

Capa Fernando Diaz Picamilho


Gabriela Costa

Diagramação Fernando Diaz Picamilho


Gabriela Costa

Revisão Antonino Souza Fona


Apresentação

A ASSIST (Assessoria de Sistematização) tem a satisfação


de apresentar aos servidores do DEGASE mais uma publicação
do CEDOM (Centro de Documentação e Memória do DEGASE).
Desta vez, o objetivo foi recuperar uma parte da história e da
memória da mais antiga unidade do Departamento: a EJLA
(Escola João Luiz Alves).
Inaugurada no ano de 1926, a EJLA é considerada a primeira
escola criada pelo poder público na cidade do Rio de Janeiro para
atender, exclusivamente, adolescentes infratores que, à época,
eram julgados pelo Juizado de Menores. Diante da extensa
história desta instituição educativa, o professor de História do
DEGASE, Aderaldo Pereira dos Santos, autor da obra, optou em
tratar dos primeiros anos da EJLA.
Pelo que foi exposto no texto do professor, percebe-se que
sua preocupação consistiu em refletir sobre o impacto que o
surgimento da EJLA causou na opinião pública da época, além de
buscar conhecer de que modo a escola foi concebida em termos
pedagógicos.
A título de conclusão do livro, o autor apresentou uma
análise interessante sobre a memória de um egresso da EJLA.
Desta feita, considerando o momento do DEGASE voltado
para o fortalecimento dos processos educativos e, cada vez
mais, buscando adequar a instituição ao Sistema de Garantia de
Direitos, as publicações do CEDOM assumem importância neste
contexto, sobretudo, pela possibilidade de contribuir na produção
de conhecimento e na recuperação da memória socioeducativa
da instituição, além de servir como estímulo aos servidores que
desejam investir na pesquisa sobre história da Socioeducação.
Claudia Lúcia Silva Mendes – Gestora da ASIST (Assessoria
de Sistematização).
Raul Japiassu Câmara – Prof. de História (CEDOM).
Setembro/2018.
Considerações Iniciais

Por Aderaldo Pereira dos Santos1

O moderno Direito suprimiu inteiramente a prisão para menores


delinquentes de idade inferior a dezoito anos, e em vez dos cárceres
estabelecem escolas; a repressão penal foi substituída pelo regime
educativo disciplinar: trabalho, aprendizado profissional, exercícios
físicos e militares, instrução literária e técnica, educação moral. Em
lugar de punição, procura-se obter a reeducação e regeneração: oficinas,
serviço agrícola, tratamento higiênico, médico e moral. (Dr. Mello
Mattos, Juiz de Menores, em entrevista ao Jornal do Brasil a respeito da
inauguração da Escola João Luiz Alves , 12.11.1926, p. 6).

A muito custo, inaugurou-se a ‘Escola João Luiz Alves’, num velho


edifício fradesco da Ilha do Governador (...). Quem visita a ‘Escola’,
e tem capacidade para saber o de que ela ainda carece, admira quanto
ali já se realiza, não se podendo eximir a aplaudir a orientação do
respectivo diretor. (Evaristo de Morais, Jornal do Correio da Manhã,
23.01. 1929, p. 04).

Figura 1 – Foto da entrada principal da EJLA


Fonte: Acervo CEDOM
1 Doutorando da Faculdade de Educação da UFRJ, Mestre em Educação
pela UERJ, Especialista em História da África e do Negro no Brasil e em História do
Século XX, pela UCAM, Graduado em História pela UFF, Professor de História da
Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC) e do Departamento Geral de Ações
Sócio Educativas (DEGASE), Integrante do Centro de Documentação e Memória do
DEGASE (CEDOM), Coordenador de pesquisa do Centro de Memória da FAETEC
(CEMEF).

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Instituição mais antiga do Departamento Geral de Ações
Socioeducativas (Novo DEGASE), a Escola João Luiz Alves é
uma unidade que atende adolescentes do sexo masculino em
cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação.
Prevista como “Escola de Reforma”, através do artigo 74
do decreto 16.272 de 20 de dezembro de 1923 (Regulamento de
Proteção e Assistência aos Menores Abandonados e Delinquentes),
denominada “Escola João Luiz Alves”, por resolução do decreto
17.172 de 30 de dezembro de 1925. O primeiro Regulamento foi
apresentado através do decreto 17.508 de 04 de novembro de
1926. A Escola João Luiz Alves teve sua inauguração, segundo
os jornais da época, em 11 de novembro de 1926, surgindo como
uma seção da antiga Escola XV de Novembro. A instituição foi
criada com a incumbência de recuperar pelo “trabalho, educação e
instrução”, adolescentes em situação de delinquência que fossem
julgados pelo Juiz de Menores. Foi, portanto, a primeira escola
criada na cidade do Rio de Janeiro para atender, exclusivamente,
adolescentes infratores.
O nome da instituição é uma homenagem a João Luiz Alves
(1870-1925), Ministro da Justiça e Negócios Interiores do governo
do presidente Artur Bernardes. O local de sua instalação foi
previsto pelo Decreto 4.983A, de 30 de dezembro de 1925, em
seu artigo quarto, que estabelecia funcionamento da escola na
Ilha do Governador, em terrenos da antiga Fazenda de São Bento
onde se localizava a Colônia de Alienados.
Conhecida pela sigla EJLA, a escola passou por vários
momentos em sua longa história. Inicialmente criada como
“Seção de Reforma” da Escola XV de Novembro, assumiu, depois
da inauguração, administração independente. Com a criação
do Serviço de Assistência ao Menor (SAM), através do decreto
3799, de 05.11.1941, a Escola João Luiz Alves passou a integrar
essa nova estrutura. Posteriormente, a escola foi incorporada à
Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), criada

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no ano de 1964 em substituição ao SAM, que sofrera grandes
críticas da opinião pública. A referida Fundação existiu durante
pouco mais de vinte anos, sendo, então, extinta e transformada
em Centro Brasileiro da Infância e Adolescência (CBIA) em 1990,
passando a Escola João Luiz Alves a integrá-la.
A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), em 1990, inaugurou uma nova conjuntura para as
políticas públicas da infância e adolescência no Brasil. A
responsabilidade de atendimento às crianças e adolescentes
abandonados e infratores passou a cargo dos municípios e
estados. Foi neste contexto que surgiu o Departamento Geral
de Ações Socioeducativas (DEGASE) no ano de 1993 (Decreto
Estadual 18493 de 26.01.93), criado para atender adolescentes em
conflito com a lei no estado do Rio de Janeiro. A instituição, no
entanto, só começou a funcionar no ano seguinte. As instituições
vinculadas ao CBIA (extinta em 1995), a exemplo da Escola João
Luiz Alves, tiveram de passar por um processo de transição para
se adaptar a este novo contexto.
O texto a seguir procurou destacar alguns dos momentos
da Escola João Luiz Alves entre o ano de sua fundação, em 1926,
até o ano de 1929. Neste sentido, a partir da análise de alguns
jornais de época, abordo sobre o modo como a EJLA foi noticiada
pela imprensa do período aqui considerado (1926 a 1929).
Por fim, optei também por apresentar análise do
depoimento de um egresso da Escola João Luiz Alves. A
entrevista foi realizada, por mim, no ano de 2012, quando
exercia a função de Coordenador Adjunto do Centro de
Memória da Fundação Estadual de Apoio à Escola Técnica
(CEMEF/FAETEC). Obviamente que o entrevistado fora
interno da EJLA em época posterior a que se baseou o texto em
questão, no entanto, achei por bem destacar as lembranças que
ele teve da EJLA, pois, qualquer que seja a época, a experiência
da privação da liberdade será sempre algo marcante na vida de

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uma pessoa. Além disto, a partir do seu depoimento, foi possível
apresentar algumas considerações sobre as diferenças entre os
dois momentos da Escola.
Aderaldo Pereira dos Santos
Integrante do Centro de Documentação e Memória do
DEGASE (CEDOM/DEGASE)
Professor de História do DEGASE

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SUMÁRIO

Escola João Luiz Alves\Regulamento da


EJLA de 04.11.1926.................................................. 10
Escola João Luiz Alves nas páginas
da imprensa carioca (1926-1929)........................... 25
Memórias de um egresso da Escola
João Luiz Alves........................................................ 72
Considerações finais................................................ 82
Escola João Luiz Alves

Figura 2 - Placa de Inauguração afixada na entrada da EJLA


Fonte: Acervo CEDOM.

Apesar da placa que está fixada na entrada da Escola João


Luiz Alves indicar que a escola fora inaugurada em 30.10.1926,
veremos mais adiante que os jornais da época divulgaram a
inauguração da escola como tendo ocorrido em 11.11.1926. Em
que pese esta divergência de informação, o fato mais importante a
destacar é que a Escola João Luiz Alves foi a primeira escola criada
pelo governo no Distrito Federal para atender, exclusivamente,
adolescentes infratores julgados pelo Juiz de Menores.
Inicialmente pensada como anexa à Escola XV de Novembro,
no momento de seu funcionamento, no entanto, tomou a forma
de uma administração independente. Analisar o modo como foi
concebida é um dos objetivos deste texto. Pretende-se também
investigar de que forma a escola, em seus primeiros anos de
funcionamento, foi vista por parte da opinião pública da época.
Sendo assim, faremos análise de alguns jornais que divulgaram
notícias sobre a referida escola.
Para entender a concepção e a estrutura da escola, optou-
se por analisar o seu primeiro Regulamento datado de 1926. Esse
Regulamento foi fundamentado, em vários de seus artigos, no
que já fora apresentado pela Lei 16.272 de 20 de dezembro de

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1923, que tratou sobre a “assistência e proteção dos menores
abandonados e delinquentes”. Vamos nos ater também à análise
do livro referente à folha de pagamento da escola do ano 1928,
documento disponível no Arquivo Nacional. Esse documento
nos permite visualizar, por exemplo, quais os profissionais
que exerceram função na referida escola. Confrontar o que o
Regimento propunha, em termos dos funcionários necessários
para o funcionamento da escola, com o documento que informa
aqueles que efetivamente receberam salários pelo trabalho,
possibilita ter um parâmetro para se pensar sobre o que de fato
foi realizado em comparação ao que fora projetado através do
Regulamento oficial.
Antes de apresentar uma análise do primeiro Regulamento
da Escola João Luiz Alves, convém tratar de dois decretos surgidos
no ano de 1925: o primeiro, Decreto 17.172, de 30 de dezembro
de 1925, que resolveu nomear a Escola de Reforma como Escola
João Luiz Alves, em homenagem ao anterior Ministro da Justiça e
Negócios Interiores do Presidente Arthur Bernardes; o segundo,
o Decreto 4.983-A, de 30 de dezembro de 1925, o qual estabeleceu
complementos às leis referentes à “assistência e proteção aos
menores abandonados e delinquentes”. No art. 4º deste decreto,
constam as decisões sobre a administração independente que a
escola teria, assim como o lugar da sua localização:

Art. 4º. A Escola de Reforma para menores do sexo masculino, a que


se refere o art. 74 do regulamento aprovado pelo decreto n.16272, de
20 de dezembro de 1923, é desanexada da Escola 15 de Novembro e
terá administração independente, sendo instalada no próprio nacional
do Galeão, na Ilha do Governador, onde funcionou a Colônia de
Alienados.( Decreto 4983-A, de 30 de dezembro de 1925).

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O artigo 74, referido acima, como vimos anteriormente,
apresentava a proposta de criação de uma Escola de Reforma
que seria anexa à Escola XV de Novembro. O decreto de 30 de
dezembro veio, portanto, alterar esta proposição e estabelecendo
a independência da futura Escola de Reforma.
O art. 5º quinto deste mesmo decreto, por sua vez, autoriza
o governo “a confiar a associações civis de sua escolha a direção
e administração dos institutos disciplinares, regidos pelo decreto
n. 16272, de 20 de dezembro, sitos no Distrito Federal, excetuada
a Escola 15 de Novembro” (Art. 5º. Item IV do decreto 4.983-A
de 30.12.1925).
Sendo assim, com exceção da Escola XV de Novembro que
permaneceu sob o controle administrativo do Estado, as demais
instituições que prestavam atendimento à infância desamparada
no Distrito Federal poderiam ser administradas por particulares.
Essa é uma questão importante, porque criava a condição
para que o governo tivesse certo descompromisso com a
administração direta da instituição, o que, por sua vez, recaia
sobre a questão financeira da escola.

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O Regulamento da
Escola João Luiz Alves de 04.11.1926
O Regulamento é constituído dos “Títulos I e II”. O
primeiro diz respeito à “Criação e Organização” da escola, sendo
formado por quatro capítulos. O segundo trata “Dos alunos
durante sua estadia na escola”, em que constam também quatro
capítulos. O Regulamento, como um todo, tem 100 artigos. Não
temos a intenção de proceder à análise de todos os artigos do
Regulamento em questão, destacaremos, no entanto, aqueles
que considerarmos pertinentes, de modo a esclarecer o sistema
educacional e disciplinar proposto à escola pelo Governo Federal
da época.
No Capítulo I, seis artigos estabeleciam os aspectos referentes
às finalidades da escola, sua denominação e estrutura básica das
turmas. Os artigos 2º, 3º e 4º destacam-se por apresentarem os
fundamentos iniciais da estrutura da escola.
O artigo 2º informava a que público a escola se destinava:

Art. 2º. Essa escola destina-se a receber, para regenerar pelo trabalho,
educação e instrução, os menores do sexo masculino, de mais de 14 e
menos de 18 anos de idade, que forem julgados pelo juiz de menores, e por
este mandados internar. (Decreto nº 17.508 de 4 de novembro de 1926).

No que tange à prática do isolamento como método de se


exercer a observação e punição do interno à qual se refere o artigo
acima, nota-se que tal procedimento se manteve no decorrer do
tempo em instituições similares.
O artigo 4º, por sua vez, reservava ao professor grande
responsabilidade neste processo de “regeneração” a que a escola
se propunha:

Art. 4º. Cada turma ficará sob a regência de um professor, que tratará
paternalmente os menores, morando com estes, partilhando de seus
trabalhos e divertimentos, ocupando-se de sua educação individual,
incutindo-lhes os princípios e sentimentos de moral necessários à sua
regeneração, observando cuidadosamente em cada um seus vícios,

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tendências e virtudes, os efeitos da educação que recebem, e o mais que
seja digno de atenção, anotando suas observações em livro especial.
(Decreto nº 17.508 de 4 de novembro de 1926).

Percebe-se que, para além da sua função específica de


ensinar, o professor também teria que agir como um misto de
pai e psicólogo. Isso dava ao professor uma espécie de poder
significativo perante os alunos, sobretudo, porque, além do
poder tradicional que o professor tem, caberia a ele também o
registro escrito do que definisse como desenvolvimento positivo
ou negativo do internado.
Os três artigos destacados acima revelam aspectos que se
articulam com questões pertinentes às reflexões apresentadas
pelos autores citados anteriormente. No artigo 2°, por exemplo,
fica evidente a preocupação de situar o Regulamento em sintonia
com a ordem jurídica da época, ao delimitar a faixa etária dos
internos e destacar o papel central destinado ao Juiz de Menores,
ou seja, como alerta Faria Filho , no tocante à dimensão da
legislação escolar como “ordenamento jurídico”, a análise do
Regulamento deve se ater a este aspecto. O 2° artigo também
sinaliza para questões referentes às estratégias do poder publico
da época tocante à “reforma do povo” (PAULILO e SILVA,
2012), “povo” este que aparece no Regulamento através da
personificação de um determinado grupo específico oriundo do
universo popular, no caso, os chamados “menores delinquentes”,
cuja proposta de “reforma” (ou “regeneração”) se basearia num
tipo de escola que atuasse de forma articulada em três campos:
“trabalho, educação e instrução”. Os artigos 3° e 4° nos remetem
à reflexão relacionada à cultura escolar (FARIA FILHO, VIDAL,
GONÇALVES, E PAULILO, 2012), ao fazerem referências às
questões de método e organização das turmas (artigo 3°) e ao
papel a ser desempenhado pelo professor (artigo 4°). No tocante a
este aspecto da categoria cultura escolar, como veremos a seguir,
o Capítulo II do Regimento é particularmente elucidativo, pois
se reporta ao “regime educativo e disciplinar” da escola.

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Em relação ao Capítulo II do Regulamento, serão
destacados os artigos 7°, 8° e 9°, cada um destes é constituído
por parágrafos que evidenciam alguns dos fundamentos pelos
quais as autoridades da época pensaram o formato pedagógico
da escola. Quais foram estas autoridades? Quais objetivos
pretendiam? Que debates ocorreram até se chegar ao formato de
Regulamento proposto? São algumas das questões que não serão
trabalhadas aqui devido ao limite do texto, mas que precisam
estar no horizonte do pesquisador, pois nos remetem ao aspecto
destacado por Faria Filho de se tomar o documento em questão
não apenas como “fonte”, mas também como “objeto”.
O artigo 7º, que abre o capítulo e que informa o tipo de
educação que seria oferecida aos internos, é constituído por
quatro parágrafos bastante esclarecedores quanto à proposta
pedagógica da escola, vejamos:

Art. 7º. Aos menores será ministrada educação física, moral, profissional
e literária.§ 1º A educação física compreenderá a higiene, a ginástica,
os exercícios militares, os jogos desportivos e todos os exercícios
próprios para o desenvolvimento e robustecimento do organismo.§ 2º
A educação moral será dada pelo ensino da moral prática, abrangendo
os deveres do homem para consigo, a família, a escola, a oficina, a
sociedade e a Pátria. Serão facultadas aos internados as práticas da
religião de cada um compatível com o regime escolar.§ 3º A educação
profissional consistirá na aprendizagem de uma arte ou de um ofício,
adequado à idade, força e capacidade dos menores e às condições do
estabelecimento. Na escolha da profissão a adoptar o diretor atenderá
à informação do médico, procedência urbana ou rural do menor, sua
inclinação à aprendizagem adquirida anteriormente ao internamento,
e ao provável destino.§ 4º A educação literária constará do ensino
primário obrigatório. (Decreto nº 17.508 de 4 de novembro de 1926).

Gostaria de destacar, a partir da análise do artigo 7°, a


evidência que este apresenta quanto ao ideal de “educação
eugênica” tão badalada na época por políticos, médicos, juristas,
psicólogos, sociólogos e educadores, alguns do porte de Fernando

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de Azevedo (1894-1974)2. A obsessão pelo “higienismo”, o apelo
constante à “ginástica”, tendo como parâmetro os “exercícios
militares” em busca de se atingir o “robustamento do organismo”,
aspectos sinalizados no primeiro parágrafo, eram ideais muitos
divulgados pelos entusiastas da eugenia, tendo a frente o médico
Renato Ferraz Kehl (1889-1974).
Ao se considerar o parágrafo segundo, percebe-se também
a influência dos ideais eugênicos na proposta pedagógica
apresentada. A ênfase nas ideias de “família”, “sociedade”,
“escola”, “trabalho” e “pátria” são questões constantes tratadas
pelos divulgadores do movimento eugênico no Brasil. Este
movimento foi tão forte que chegou a ser incluída a proposta da
educação eugênica nos debates sobre o projeto da Constituição
de 1934. Por sua vez, o Regulamento apresenta evidências de
que na década de 1920 tais questões já se colocavam no universo
da cultura política da época. Mais do que parte da plataforma de
eugenistas, tais preocupações se inseriam no próprio contexto de
modernizar a sociedade a partir da escola (PAULILO e SILVA, 2012).
O parágrafo terceiro, por sua vez, além de tocar no tema da
“educação profissional”, que será mais fundamentada no artigo
oitavo, evidencia o poder do saber médico como um definidor do
futuro que o interno teria em termos de aprendizado de oficio.
O quarto parágrafo, que estabelecia a obrigatoriedade
do “ensino primário”, proposição que já aparecia na Lei 16.272
de 1923, define este ensino como sendo “educação literária”,
não confundir, entretanto, esta expressão como se referindo
apenas à literatura, veremos, no artigo nono, que o programa
da “educação literária” consistia nos respectivos conteúdos de
diversas disciplinas referentes ao ensino primário da época.
Antes de tratarmos do artigo nono, porém, vejamos o oitavo:

Art. 8º. O ensino profissional será organizado de acordo com o das


escolas industriais comuns, visando-se a habilitação do menor, sem
2 Ver D´AVILA, 2006.

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o fito de lucro ou renda para o Estado, de preferência a formação do
operário, antes que a renda da produção.§ 1º. A aprendizagem de
um ofício ou arte compreenderá vários graus. A passagem de um
grau a outro será baseada sobre aptidões devidamente comprovadas
individualmente.§ 2º. Notas dos chefes de oficina estabelecerão no
fim de cada mês a marcha dos progressos de cada aprendiz.§ 3º. Os
alunos, cuja formação for acabada, passarão a «operários».§ 4º. Além
da aprendizagem prática, os alunos receberão ensino teórico, devendo
ser dada, ao menos, uma lição diária.§ 5º. O produto líquido da
venda de artefatos e dos trabalhos de campo realizados pelos alunos
será dividido em três partes iguais: uma será aplicada à compra de
matérias primas e às despesas da casa; outra a prêmios e gratificações
aos menores, que se distinguirem por sua assiduidade e perícia
no trabalho, por seu estudo e aplicação, por seu comportamento e
regeneração moral e a terceira constituirá um pecúlio dos menores, que
será depositado trimestralmente em cadernetas da Caixa Econômica, e
lhes será entregue à saída do estabelecimento. (Decreto nº 17.508 de 4
de novembro de 1926).

Como é possível perceber ao analisar o artigo acima, a


proposta de organização do ensino profissional tinha por base
as “escolas industriais comuns” que se tratavam das “escolas
de trabalho” da época. Isto demonstrava a intenção do poder
público de enquadrar, pelo menos em teoria, a Escola João Luiz
Alves no campo das escolas que eram criadas para preparar a
formação dos futuros operários. Um exemplo de escola assim foi
a centenária Escola Técnica Visconde de Mauá, situada no bairro
de Marechal Hermes.
O primeiro parágrafo do artigo em questão dispõe sobre
o processo de aprendizagem do ofício: o aluno tinha que
comprovar sua aptidão para o ofício escolhido. O segundo
sinaliza para o trabalho do “chefe de oficina”, outro profissional
da escola que, assim como o professor, teria também sobre o
aluno um tipo de poder importante no que tange ao controle de
sua aprendizagem.
O terceiro parágrafo, por sua vez, informava sobre o título
que o aluno receberia, caso chegasse a concluir a formação, ou

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seja, tornar-se-ia um “operário”. Não confundir, no entanto, esta
definição como sendo apenas relativa às oficinas propriamente
relacionadas a atividades da indústria, pois veremos que
muitas das oficinas oferecidas destinavam-se a preparar futuros
trabalhadores do campo.
O quarto parágrafo sugere uma reflexão quanto à relação
entre teoria e prática dentro da proposta pedagógica da escola.
Como se tratava de um ensino considerado “primário”, o peso
da “prática” sobrepõe-se ao da “teoria”, ao ponto de se ter a
necessidade de estabelecer que a teoria devesse ser trabalhada
pelo menos numa “lição diária”, como se, com esta observação,
houvesse o desejo de impedir que ocorresse, na prática, a ausência
total de um ensino teórico.
No quinto parágrafo do artigo 8°, observam-se aspectos
relacionados ao modo como o poder público compreendia
algumas das questões financeiras que estavam inseridas na
proposta pedagógica da escola, que, inclusive, já fora apontada na
lei relativa à “assistência de proteção dos menores abandonados
e delinquentes” (Lei 16.272 de 20 de dezembro de 1923).
Em primeiro lugar, a informação de que as oficinas
oferecidas não seriam apenas espaços para o aprendizado prático
do ofício, mas também lugar de produção de mercadorias,
chamadas, no parágrafo em questão, de “artefatos” e “trabalhos
de campo”. O produto adquirido pela venda das mercadorias
seria dividido em “três partes iguais”, utilizadas, por um lado,
para dar conta “das despesas da casa” e “compra de matérias-
primas” que seriam utilizadas no aprendizado das oficinas. Com
isso, observa-se o quanto o Estado buscou uma estratégia de se
utilizar do próprio trabalho dos internos para suprir gastos com
o funcionamento da Escola.
Em segundo lugar, a outra parte da venda dos produtos
seria usada para “comprar” ou servir como mecanismo de
incentivo, para que o interno viesse a assumir compromisso de
vir atingir um dos principais objetivos da escola, ou seja, a sua
“regeneração moral”.

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Por fim, a proposta de ficar uma parte da venda voltada
para uma poupança, depositada na Caixa Econômica Federal,
que o interno receberia no momento de saída da escola. Resta
saber qual foi a dimensão, pelo menos em linhas gerais, deste
tipo de proposição.
O artigo nono esclarecia o programa do que o Regulamento
definia como “ensino literário”, formado por “leitura, escrita,
aritmética elementar, o sistema legal dos pesos e medidas,
desenho, noções elementares de gramática, história e geografia
do Brasil”. Portanto, o tal programa era, na verdade, o que
correspondia ao ensino primário.
Ainda constam neste artigo dois parágrafos. O primeiro
informava sobre a obrigatoriedade de ir à escola e o segundo
estabelecia a divisão dos alunos em três classes: “os analfabetos
e os que sabem imperfeitamente ler, escrever e contar” e as
outras duas seriam formadas de acordo com o nível dos demais
alunos. É importante destacar o aspecto que informava sobre a
obrigatoriedade de frequência à escola, isto em um Regulamento
de 4 de novembro de 1926, portanto, anterior à publicação
do próprio Código de Menores da época, publicado em 1 de
dezembro do mesmo ano. Cabe ressaltar, por sua vez, que este
aspecto de ensino primário obrigatório já constava no parágrafo
quarto do artigo 80 da Lei 16. 272 de 20.12.1923 (Regulamento
da Assistência e Proteção aos Menores Abandonados e
Delinquentes), referente aos artigos sobre o funcionamento
dos “Institutos Disciplinares” (Capítulo IV) e os artigos que
formavam o referido Código foram acrescidos à Lei de 1923.
Aos alunos internados que já tivessem o curso primário
era dada a orientação de receberem “estudos e trabalhos” de
acordo com as conveniências e decisões do professor e diretor da
instituição (artigo 10). Os que se destacassem pela “inteligência
e aplicação” poderiam servir como monitores (artigo 11). Os
demais artigos do capítulo em questão tratavam do “Regime
Disciplinar” que estabelecia, como era de se esperar, orientação
pautada em rígida disciplina.

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Outro aspecto interessante que aparece no Regulamento de
1926 da Escola João Luiz Alves diz respeito ao que constava no
Capítulo III, denominado de “Classificação Moral”. Constituído
por quinze artigos, esse capítulo apresentou procedimentos
voltados a por em prática estratégia meritória pautada na
progressão por “graus”, de modo a classificar os grupos de alunos
atribuindo-lhes “pontuação” e “qualificação” que permitia
dividi-los em “Melhores”, “Bons”, “Em prova” e “Punição”
(artigos 17 e 18). Além disso, havia a preocupação de identificar e
recompensar a “classificação moral” que a escola fazia de acordo
com o que era estabelecido no artigo 31 do Regulamento:

Art. 31. Aos alunos da secção dos «Bons» e dos «Melhores» serão
concedidos sinais distintivos e recompensas especiais, que o Regimento
interno da Escola determinará; os das secções de «Prova» e «Punição» não
usarão distintivo algum. ( Decreto nº 17.508 de 4 de novembro de 1926).

No extenso capítulo sobre a administração da Escola


(Capítulo IV) constam os profissionais e suas respectivas
atribuições. Vamos aqui comparar o que o Regulamento
informou sobre os tipos de funcionários que a escola teria com
uma tabela feita com base no que está informado no Livro da
Folha de Pagamento da Escola João Luiz Alves de 1928 que se
encontra no Arquivo Nacional.
Começando pelo artigo do Regulamento que tratou do
pessoal, temos a informação sobre quais funcionários a lei
estabelecia para a escola:
Outra fonte importante para se conhecer os tipos de
funcionário da escola é a folha de pagamento. Apresenta-se
abaixo uma tabela feita com base nas informações contidas no
Livro da Folha de Pagamento da EJLA do ano de 1928 que se
encontra no Arquivo Nacional.
Art. 32. A Escola João Luiz Alves terá o seguinte pessoal:
1 diretor.
1 escriturário.

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1 amanuense.
1 almoxarife.
1 médico.
1 farmacêutico.
1 dentista.
1 inspetor-geral.
4 inspetores.
4 professores primários.
1 agrônomo.
4 mestres de oficinas.
1 mestre de desenho.
1 mestre de música.
1 mestre de ginástica.
1 porteiro.
1 despenseiro.
1 enfermeiro.
1 roupeiro.
8 guardas.
4 serventes.
8 lavadeiras-engomadeiras.
1 cozinheiro.
1 ajudante de cozinheiro.
2 jardineiros.
2 chacareiros.
1 cocheiro.
1 ajudante de cocheiro.
1 carreiro.
1 capineiro.
Parágrafo único. Haverá também um mestre de pedreiro ou de pintor,
conforme as exigências dos serviços. ( Decreto nº 17.508 de 4 de
novembro de 1926).

21
Figura 3 – Foto da capa do Livro da Folha de Pagamento da
EJLA que se encontra no Arquivo Nacional.
Fonte: Acervo CEDOM

Cargo Quantitativo
Diretor 1
Escriturário 1
Amanuense 1
Almoxarife 1
Médico 1
Farmacêutico 1
Dentista 1
Inspetor Geral 1
Inspetor 4
Professor Primário 4
Agrimensor 1
Porteiro 1

22
Despenseiro 1
Roupeiro 1
Mestre de Desenho Não consta
Mestre de Música 1
Mestre de Ginástica Não consta
Mestre de Oficina 2
Enfermeiro 1
Guarda 8
Servente 8
Cozinheiro 1
Ajudante de Cozinheiro 1
Lavadeira 8
Jardineiro 2
Chacareiro 2
Cocheiro 1
Ajudante de Cocheiro 1
Carreiro 1
Capineiro 1
Total 62

Fonte: Centro de Documentação e Memória do NOVO DEGASE (CEDOM)3

Comparando as informações apresentadas no Regulamento


com às da Folha de Pagamento (tabela acima), percebe-se que
os mestres de “Desenho” e de “Ginástica” são profissionais
que não constam na respectiva folha de pagamento da EJLA
do ano de 1928. Além disso, em relação ao Mestre de Oficina, o
número estabelecido no Regimento é de quatro, mas apenas dois
constam na relação do Livro da Folha de Pagamento. Em relação
3 A tabela acima foi produzida pela equipe do CEDOM com base no Livro da
Folha de Pagamento da EJLA do ano de 1928 que se encontra no Arquivo Nacional.

23
à previsão de pedreiro ou pintor, apresentada no parágrafo único
do artigo 32, não há nenhuma referência na folha de pagamento.
Tanto o Regulamento da Escola João Luiz Alves, analisado
parcialmente nas páginas anteriores, quanto o Livro da Folha de
Pagamento da escola do ano de 1928 são documentos oficiais,
trabalhados aqui de modo a permitir a análise inicial do projeto
de criação daquela que foi a primeira escola fundada para
atender adolescentes infratores no Rio de Janeiro, na época,
Distrito Federal do país. A seguir, outro tipo de fonte histórica
será investigada: alguns jornais, revistas e periódicos da época,
disponibilizados através da Hemeroteca da Biblioteca Nacional,
com o intuito de compreender de que modo a Escola João Luiz
Alves apareceu na imprensa escrita da antiga capital do Brasil.

24
A Escola João Luiz Alves nas páginas
da imprensa carioca (1926 a 1929).
Muitas foram as notícias de jornais, periódicos e revistas
que informaram algo referente à Escola João Luiz Alves.
Perante um número tão grande de notícias de diversos órgãos
de comunicação da época, vamos aqui destacar algumas que
achamos pertinentes, no sentido de possibilitar o entendimento
do tipo de impacto que a EJLA produziu na imprensa escrita
durante a República Velha, entre os anos de 1926 a 1929.
Gostaríamos de informar aos interessados pelo tema
que a pesquisa feita na Hemeroteca da Biblioteca Nacional foi
transformada em tabelas, em que constam informações resumidas
das notícias, como: nome do jornal, título da manchete e síntese
da matéria. As referidas tabelas vão em anexo para melhor
visualização do assunto em questão. As notícias veiculadas são
de tipos variados, desde informações de órgão oficias (decretos
assinados, pagamentos do Tesouro, atos do Ministro da Justiça,
pagamentos de folha de funcionários, designações, concorrências,
nomeações, e exonerações do Ministério da Justiça) até aquelas
tratando sobre denúncias de maus tratos, reflexões a respeito
do problema da delinqüência, irregularidades na escola,
notícias sobre obras, visitas de autoridades, atos e julgamentos
de adolescentes infratores, notícias sobre eventos ocorridos na
escola e outras mais.
Deste amplo universo de notícias, optou-se por apresentar
separadamente cada órgão de comunicação. Falaremos no geral
sobre as matérias destacadas e de algumas destas apresentaremos
uma análise mais detalhada, de modo a fornecer informação
sobre a opinião pública da época relacionada à temática da
escola em questão e à delinquência juvenil. Não trataremos aqui
de notícias de cunho informativo dos órgãos oficiais (decretos
assinados, pagamentos do Tesouro, atos do Ministro da Justiça,
pagamentos de folha de funcionários, designações, concorrências,
nomeações, e exonerações do Ministério da Justiça). Daremos
prioridade àquelas referentes à temática política e social.

25
Jornal Gazeta de Notícias

Destacamos onze matérias divulgadas pelo jornal Gazeta de


Notícias entre os anos de 1926 a 1928. No ano de 1926, achamos
importante citar duas. Uma ocorrida no mês de fevereiro, em
09.02.1926, cujo conteúdo diz respeito à visita do até então
Ministro da Justiça, o Sr. Dr. Affonso Penna Junior (1879-1968),
às obras que estavam sendo realizada no local em que seria
instalada a Escola João Luiz Alves, ou seja, a antiga Colônia
dos Alienados, na Ilha do Governador. O Ministro esteve em
companhia do Dr. José Cândido de Albuquerque Mello Mattos
(1864-1934), Juiz de Menores e também de Burle de Figueiredo,
representante da Diretoria do Patronato de Menores. A outra
notícia, de 09.09.1926, tratou de nova visita do Ministro da
Justiça ao local de instalação da EJLA, desta vez em companhia
do diretor da Escola XV de Novembro.
Já é possível perceber, a partir da descrição feita acima, que
o Ministro da Justiça, o Juiz de Menores e o diretor da Escola XV
de Novembro eram figuras centrais nesse período antecedente
à inauguração da Escola João Luiz Alves, ocorrida, de fato, em
11.11.1926, como veremos mais a frente.

Figura 4 – Colônia de Alienados, trabalho agrícola.


Fonte: Instituto Philippe Pinel (IPP)

26
Com o título “O Senhor Ministro da Justiça na Escola de
Reforma”, a matéria divulgada em 09.02.1926 informou que
“o edifício principal da futura escola, os pavilhões laterais de
oficinas e a Capela” passaram por uma “completa restauração”.
Todos esses espaços foram visitados pelo Ministro e demais
convidados, assim como os “terrenos adjacentes, destinados
aos trabalhos agrícolas e exercícios dos internados”. O ministro
também determinou, segundo o jornal, imediatas providências
“para que no mais curto prazo possível a Escola João Luiz Alves”
tivesse sua instalação definitiva. A conclusão da matéria foi feita
de modo a exaltar esta iniciativa do governo: “Com essa mudança
o governo dará integral cumprimento ao que dispõe a lei que
rege a assistência aos menores delinquentes, proporcionando-
lhes um instituto reformatório, organizado de modo a facilitar
a sua reabilitação pelo trabalho, pelo estudo e pelo regime a que
serão sujeitos”.
A outra notícia sobre a nova visita do Ministro, em
companhia do Diretor da Escola XV, Dr. Lemos Britto, trás a
informação de que a Escola João Luiz Alves seria “inaugurada no
dia 12 outubro próximo”, fato não ocorrido, pois a inauguração
ocorreu, segundo os jornais da época, em 11.11. 1926.
Do ano de 1927, destacamos cinco matérias divulgadas
pelo jornal Gazeta de Notícias. A Escola João Luiz Alves já tinha
sido inaugurada e estava sob a direção do Dr. Mário Dias. Em
2 de janeiro, foi noticiada a festa da passagem do ano de 1926
para 1927. A matéria informou que o diretor da Escola e o Juiz de
Menores, Dr. Mello Mattos, foram figuras centrais para o sucesso
da mesma. Se o ano de 1927 iniciou-se com a divulgação da festa
do Ano Novo, as notícias seguintes não foram tão agradáveis,
sobretudo, porque trataram de escândalos e irregularidades em
que o próprio diretor Mário Dias encontrava-se no centro das
denúncias.
O Dr. Mário Dias que, segundo uma matéria de 05.03.27,
era delegado de Polícia no interior do Estado, esteve nas páginas

27
do Gazeta de Notícias nos dias 05, 25 e 31 de março, além de em
4 de agosto. Ele foi acusado, através de denúncia anônima, de
ter batido, no início do ano, em um interno de nome Manoel que
teria assassinado um quitandeiro na rua do Rezende. Manuel, por
sua vez, fugiu da Escola João Luiz Alves, mas foi capturado pelo
Diretor da Escola no mesmo dia. Depois deste fato, a denúncia
foi feita ao Juiz de Menores que abriu inquérito administrativo
contra o diretor.
O Gazeta de Notícias fez, então, uma série de reportagens
em que se colocou na defesa do Diretor Mario Dias que, segundo
o jornal, contrariara os interesses de grupos de funcionários da
EJLA que desejavam a sua saída. A direção da EJLA foi, então,
substituída, segundo o jornal, por “um ex-caixeiro viajante que
era amigo íntimo do Ministro Vianna do Castelo”, o, até então,
Ministro da Justiça do governo do presidente Washington Luiz.
O jornal deixa a entender que o fato repercutiu e que o
juiz Mello Mattos esteve mais inclinado em dar ouvidos aos
acusadores do que ao acusado. Compararemos os pontos de
vistas de outros jornais sobre este episódio mais a frente. É
importante citar que, de acordo com o jornal, o eminente jurista
Evaristo de Morais foi o advogado de defesa do Dr. Mário Dias.
Do ano de 1928, duas matérias foram selecionadas. Uma
de 28 de março (também reproduzida em 30 de março) e outra
de 16 de novembro. A primeira tratando da visita do Juiz de
Menores da época, o Dr. Cândido Lobo, a segunda sobre a
palestra realizada pelo jurista Evaristo de Morais no auditório
da Escola João Luiz Alves. Em relação a esta palestra, feita por
um dos principais analistas da problemática da infância infratora
da época, a matéria do jornal não se aprofundou no conteúdo
tratado pelo jurista na palestra, destacando apenas que o mesmo
buscou incutir no “celebro dos menores as mais elevadas noções
de moral e patriotismo”. Cabe lembrar também que a palestra
ocorreu um dia depois da data de comemoração da Proclamação
da República e que o jurista buscou tratar do tema com os

28
presentes (funcionários, professores e alunos). Com relação à
matéria da visita do Juiz, por sua vez, há um trecho que cabe um
ligeiro comentário.
Com o título “A Escola João Luiz Alves – O juiz Dr. Cândido
Lobo, visitou ontem, a escola para menores delinquentes”, a
matéria se inicia informando que o então Juiz de Menores Dr.
Cândido Lobo foi acompanhado do “Dr. Bueno de Andrade,
médico do Abrigo de Menores, do Sr. Brandão, funcionário do
Juízo e representantes da imprensa.”. O que denota a preocupação
de fazer da visita algo que tivesse repercussão junto à opinião
púbica, sobretudo, pela mesma ter sido feita com a presença de
representantes de órgãos de comunicação.
O diretor da Escola era o Sr. Luiz Nogueira da Gama que,
como era de se esperar, fez as honras da casa, segundo o jornal,
cercadas de “gentilezas”. Em seguida, o conteúdo da matéria se
voltou para emitir um ponto de vista a respeito da instituição e
do público atendido: “A escola João Luiz Alves, para menores
delinquentes, funciona há ano e meio, sob a jurisdição do Juízo
de Menores, e é um instituto de tão elevados desígnios, que
forma com o ‘Abrigo de Menores’, o recolhimento próprio para
a parte da raça, sendo constituída de crianças já contaminadas
pelo vírus da criminalidade.”.
Mais uma vez nos deparamos com visões da época que
expressavam pontos de vistas preconceituosos em relação aos
“chamados menores”. Por um lado, o pensamento de definir
o “lugar próprio” daquela “parte da raça” de “crianças” que
tinham sido contaminadas por uma “doença”, ou seja, o “vírus
da criminalidade”. Por outro, a definição de que este lugar seria
o da “internação” em instituições disciplinares.
O uso do termo “raça” também não é gratuito. Não
esqueçamos que estamos numa época marcada por uma
conjuntura em que o debate racial era muito presente. Seja
através das discussões sobre “eugenia”, “embranquecimento
da população”, “regeneração” e “males da miscigenação”. Seja

29
através da visão explícita de “racismo científico” que legitimou
ideologicamente a ocupação da África pelos europeus. Ao falar
em “parte da raça”, o jornal se referia à maioria de crianças e
adolescentes negros que estavam internados nestas instituições.
Muitos nem eram infratores, como no caso dos que se encontravam
no Abrigo para Menores Abandonados, mas não houve nenhuma
preocupação de fazer essa distinção, porque para muitos da
época, todos eles eram definidos como “menores”, termo síntese
cunhado para classificar os filhos das classes mais empobrecidas
da sociedade (RIZZINI, 1993).

Jornal O Paiz

Selecionamos cinco notícias divulgadas pelo jornal O Paiz,


duas de 1926, uma de 1927 e duas de 1929.
As matérias de 1926 tiveram divulgação no mês de maio.
A primeira tratava de avisos do Ministro da Justiça ao Patronato
de Menores e ao diretor da Escola XV de Novembro, referente
à Escola João Luiz Alves (18.05.1926). A segunda a respeito
da visita do Sr. Dr. Lemos de Britto, diretor da Escola XV de
Novembro, ao local em que ocorreria a instalação da referida
escola (21.05.1926).
Vamos analisar a que fora divulgada na data de 18 de
maio de1926, cujo título era “Escola João Luiz Alves – a sua
instalação”. Vejamos o conteúdo:

O Sr. Ministro da Justiça determinou, por avisos dirigidos ao Patronato


de Menores e ao diretor da Escola 15 de Novembro que a este último
seja entregue o edifício da Antiga Colônia de Alienados na Ilha do
Governador, onde vai ser instalada a Escola João Luiz Alves. § Resulta
essa providência do fato de ter sido confiada temporariamente ao
Patronato a guarda do referido edifício, que acabou de passar por uma
radical transformação para receber a atual Seção de Reforma da Escola
15 de Novembro, seção esta que, consideravelmente segmentada, vai

30
ter organização especial e distinta sob a denominação de Escola João
Luiz Alves, que lhe foi dada em virtude de recente decreto executivo.
(O Paiz, edição 15184-15185, 18.05.1926, p. 02).

A notícia acima traz a informação de que o prédio da


antiga Colônia de Alienados, inaugurada em 1890 para atender
pacientes com problemas psiquiátricos e localizada na Ilha do
Governador, estava sob a responsabilidade do Patronato de
Menores, associação criada por juristas brasileiros em 1906
no Distrito Federal e que tinha como um dos seus objetivos a
fiscalização de asilos e institutos destinada às infâncias pobre e
abandonada, além de buscar solução para o problema da infância
que vivia nas ruas. (JUNIOR, 1991, p.23,).
Como já tinha sido previsto no artigo 4º do Decreto 4.983-
A, de 30 de dezembro de 1925, a Escola João Luiz Alves seria
instalada no prédio da referida Colônia, sendo assim, a matéria
informou sobre o aviso do Ministro da Justiça para que o diretor
da Escola XV de Novembro assumisse a responsabilidade do
imóvel. Além disso, há a informação de que o prédio sofrera
uma “radical transformação” visando à implantação da nova
escola. Fica, portanto, a ideia de que o poder público estaria de
fato investindo no projeto de criar uma escola exclusiva para os
“menores infratores” no Distrito Federal.
A matéria também transmite a informação de que a nova
escola viria a ser a “atual Seção de Reforma da Escola XV de
Novembro”, contrariando, inclusive, o que estava escrito no artigo
4º do Decreto 4.983-A, na passagem em que consta a informação
de que a Escola João Luiz Alves seria “desanexada da Escola 15
de Novembro” e teria “administração independente.” Afinal, a
Escola João Luiz Alves seria ou não uma Seção de Reforma da
Escola XV de Novembro? Teria ou não teria ela administração
independente?
Talvez para dirimir a dúvida que o próprio jornal lançara
na opinião pública três dias antes (notícia acima), o mesmo jornal

31
(O Paiz) noticiou, em dia 21 de maio de 1926, a visita do Dr.
Lemos Britto às instalações da Escola de Reforma, através de uma
matéria cujo título foi “Assistência aos Menores”. O conteúdo
desta matéria, além de tratar da expectativa positiva no tocante
à criação da escola para “menores delinquentes”, apresentou
esclarecimento das questões levantadas no parágrafo anterior:

Vai ser felizmente criada, pelo Sr. Ministro da justiça e com o concurso
do juiz de menores, uma escola para os infelizes menores delinquentes.
§ Já há bastante tempo que, um grupo de educadores se bate junto do
Sr. Presidente da República, para a criação dessa casa regeneradora,
que seria a Escola de Menores Delinquentes. § O Sr. ministro da justiça,
afinal, conseguiu os meios necessários para a realidade dessa obra. §
Ontem, na propriedade da União, sita à Ilha do Governador, e onde
se vai instalar a Escola João Luiz Alves, para menores delinquentes,
esteve o Dr. Lemos Britto, diretor da Escola Quinze de Novembro e da
Seção de Reforma, subordinada àquela até que o governo instale o novo
estabelecimento e lhe dê direção autônoma.§ O Dr.Lemos Britto, partiu
do Cais Phroux, em lancha especial, às 8 horas da manhã, levando
em sua companhia o Dr. Sylvio de Sá Freire, médico da Escola 15 de
Novembro. § Ali visitou todo o edifício e suas dependências, devendo
apresentar hoje, ao Sr. Dr. Affonso Penna Junior, Ministro da Justiça,
as sugestões e as bases para a organização do importante serviço que o
atual governo deseja deixar condignamente instalado. ( O Paiz, edição
15188-1, 21.05.1926, p. 02).

Analisando, portanto, a notícia citada acima, percebe-se


que ela se inicia contrapondo a “felicidade” pelo surgimento
da nova escola (“vai ser felizmente criada”) com a qualificação
dos que seriam atendidos pela escola como sendo “infelizes
menores delinquentes”. Além disso, a matéria informou sobre
a ocorrência ( “já há bastante tempo”) de debates, envolvendo
“grupo de educadores” e o poder público na figura do presidente
da República, a respeito da necessidade de criação deste tipo de
escola. A notícia também esclareceu que a nova escola estaria sob
a responsabilidade do diretor da Escola XV de Novembro até o
momento em que fosse instalada, depois disso, receberia uma
direção e passaria a ter administração autônoma. Entretanto,

32
como a matéria informou, coube ao diretor da Escola XV de
Novembro apresentar relatório com “as sugestões e as bases
para a organização” da nova escola, evidenciando que o jurista
Dr. Lemos Britto foi pessoa muito influente no que diz respeito
ao projeto da EJLA.
Lemos Britto pensou em fazer da EJLA “estabelecimento
modelar”, idealizando-a como uma instituição educativa “sem
muros e grades” (RIZZINI, 2005, p.18). O jurista teve, inclusive,
de enfrentar oposição a projeto deste tipo por aqueles que tinham
o “temor das evasões”, mas segundo o próprio Britto, “nos dois
primeiros anos de funcionamento da Escola não houve fugas ou
motins” (RIZZINI, 2005, p.18). Apesar desta fala positiva do Dr.
Lemos Britto, destacada por Irma Rizzini, em relação aos dois
primeiros anos da Escola, há notícias que vão noutra direção,
ou seja, denúncias de que os internos passaram fome e também
escândalos e demissão do primeiro diretor da Escola, o senhor
Mario Dias, como veremos adiante.
A pesquisadora Irma Rizzini, por sua vez, nos informou
também que “o sonho de Lemos Britto sofreu derrocada em 1941,
quando a Escola foi transferida para um pavilhão construído nas
terras da Escola XV de Novembro” (p.18). Não há explicação
oficial dos motivos desta transferência, de acordo com Rizzini,
entretanto, ela afirmou que “pode-se deduzir que fugas e
rebeliões motivaram a transformação do estabelecimento em
escola primária” (2005, p.18).
Irma Rizzini está se referindo à decisão das autoridades,
no início da década de 1940, de transferir o atendimento aos
“menores infratores” para o denominado “Pavilhão Anchieta”
que funcionava no bairro de Quintino onde se localizava a Escola
XV de Novembro. Além disso, fica aqui o registro importante
fornecido pela pesquisadora que, na época em questão, a Escola
João Luiz Alves transformou-se “em escola primária”.
Do ano de 1927, selecionamos matéria divulgada pelo
jornal O Paiz referente à visita do Ministro da Justiça e outras

33
autoridades da época à Escola João Luiz Alves, ocorrida em
15 de junho do respectivo ano. A notícia informou que a visita
do ministro da justiça fora acompanhada do Juiz de Menores,
Dr. Mello Mattos, apresentando a informação de que a Escola
encontrava-se em “novas obras de conservação e adaptação”.
De acordo com a matéria, as autoridades inspecionaram
as dependências da Escola e ficaram impressionadas com “a
boa ordem e higiene encontradas em todos os departamentos
daquele estabelecimento penitenciário”. Essa passagem é
interessante, porque a surpresa de encontrar em “boa ordem” e
com a devida “higiene” o espaço da Escola, talvez se deva ao fato
de que esta não era a regra no que tangia as instituições similares
da época. Se bem que, quase sempre, visitas de autoridades são
informadas com antecedência, o que possibilita à administração
do lugar visitado preparar esta “boa impressão”.
Torna-se também interessante o uso do termo “penitenciário”
para definir o espaço da Escola, o que denota que por mais que
se tentasse qualificar a instituição como um espaço educacional,
a visão que imperava nos órgãos da imprensa e, possivelmente,
na opinião púbica era de que se tratava de um espaço prisional.
De 1928 não selecionamos notícias importantes deste
jornal, mas no ano seguinte, em 1929, duas merecem destaques.
A primeira foi em 07 de dezembro e se refere à visita do Ministro
da Justiça, desta vez, ao Instituto Sete de Setembro. Este
Instituto, anteriormente conhecido como Abrigo de Menores,
funcionava em São Cristóvão e se constituía na instituição que
abrigava “menores” de diversas idades, desde os abandonados,
os que viviam nas ruas e também os infratores que aguardavam
sentença do juiz. Chegou a funcionar nesta instituição um
Laboratório de Biologia, criado na década de 1930, vinculado ao
Juizado de Menores, que buscava por em prática os chamados
“métodos científicos” da época voltados para o atendimento à
infância.
Tais métodos tinham a pretensão de classificar e identificar

34
os menores, de modo a constatar os graus de periculosidade e
inteligência de cada um (PINHEIRO, 1985, p. 121). Na década de
1940, o Instituto Sete de Setembro foi transformado em Serviço
de Assistência a Menores (SAM). Era, portanto, uma instituição
importante de assistência à “infância desvalida”. Neste sentido,
achamos pertinente analisar a referida matéria, pois a mesma
apresenta um quadro de como se encontrava a instituição que na
época funcionava também como “internação provisória” para os
“menores infratores” que recebessem como sentença a internação
na Escola João Luiz Alves. O título era: “O Sr. Ministro da justiça
visitou o Instituto 7 de Setembro”. Veremos a seguir, na intera, o
seu conteúdo e depois faremos análise de alguns trechos:

O Dr. Vianna do Castello, ministro da justiça, esteve ontem, pela


manhã em visita ao Instituto Sete de Setembro, antigo Abrigo de
Menores de S. Cristóvão. § O titular da pasta da justiça chegou aquele
estabelecimento, acompanhado do diretor de seu gabinete, Dr. Mello e
Souza, sendo recebido na porta principal do estabelecimento pelo Dr.
Amaral Pimenta, diretor do Instituto, formando, por essa ocasião, o
batalhão do instituto, que prestou a S. Ex. as continências relativas ao
seu alto cargo. § O Sr. ministro Vianna de Castello percorreu todas as
dependências do estabelecimento, inteirando-se de suas condições, das
providências ultimamente postas em prática em benefício da disciplina
e da higiene dos menores ali internados. § Com uma lotação máxima
de 350 menores, o instituto acolhe presentemente a 570, número que
tende a aumentar em consequência da dificuldade com que luta o
juiz de menores para encaminhar aos patronatos agrícolas e seus
estabelecimentos os meninos desamparados. § Figuram no número
dos internados 120 delinquentes, que aguardam o termo natural dos
respectivos processos, e a transferência, em caso de condenação, para
a Escola João Luiz Alves. § O Instituto abriga, porém, além desses
delinquentes, e de outros internados de idade superior a 16 e 17
anos, muitos de 4, 5 e 2 anos, e outros de idade compreendida entre
esses limites. § Apesar dessa variedade de tamanhos e idades, e da
proveniência da maioria dos internados, a disciplina tem sido perfeita,
sem necessidades de castigos corporais. § O Sr. ministro visitou também
as quatros novas salas de aula do Instituto, criadas pelo diretor, que
encontrou devidamente providas de mobiliário e material didático,
assim como os novos melhoramentos ali introduzidos pelo Dr. Amaral

35
Pimenta. § Depois de se informar com o diretor quanto às necessidades
materiais de que ainda se ressente o Instituto, e ao meio de as resolver,
o Sr. Ministro retirou-se, declarando-se agradavelmente impressionado
com o que vira no estabelecimento, após a nomeação do Dr. Amaral
Pimenta para aquele cargo. ( O Paiz, edição 16484-1, 07.12.1929, p. 05).

O primeiro aspecto a considerar, antes de analisar as


informações que estão presentes na matéria acima, diz respeito ao
formato da notícia que se assemelha a outras em que o conteúdo
em questão diz respeito a visitas de autoridades às instituições
correlatas. Tudo está sempre na mais “perfeita ordem”, as
autoridades visitam “todas as dependências” e os elogios são
constantes aos diretores. Isto ocorria, em geral, quando o órgão
de imprensa buscava exaltar os feitos do governo.
Analisando agora cada parágrafo da matéria, logo no
início é apresentada a importante informação da localização
da instituição, em São Cristóvão, e que a mesma é resultado da
transformação do “antigo Abrigo de Menores” que passou a se
chamar Instituto Sete de Setembro, a partir do decreto n° 18.923 de
30 de setembro de 1929. O referido Abrigo fora previsto pela Lei
16.272 de 20 de dezembro de 1923 (artigo 62) que regulamentava a
assistência e proteção aos menores abandonados e delinquentes.
É interessante observarmos o argumento que consta no referido
decreto para a mudança do nome:

O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, usando da


atribuição que lhe confere o art. 48, n. 1, da Constituição Federal e
considerando que, conforme a prática tem demonstrado, a denominação
dada ao estabelecimento de que trata o art. 62 do regulamento anexo
ao decreto n. 16.272, de 20 de dezembro de 1923, não corresponde
aos serviços prestados pelo mesmo aos menores ali internados, nem
contribui para estimular a formação cívica destes, resolve dar ao
referido estabelecimento a denominação de “Instituto Sete de Setembro
(Abrigo de Menores)”. (Decreto 18.923 de 30 de setembro de 1929).

Como num passe de mágica, a simples mudança do nome


resolveria os problemas sinalizados acima, transformando a

36
nova instituição em algo que viesse a contribuir para a “formação
cívica” dos menores ali internados. Poderíamos supor que o alvo
da mudança foi outro. Enquanto Instituto, a nova instituição
poderia transformar-se em um órgão que prestasse serviço
auxiliar ao Juizado de Menores, o que de fato passou a ocorrer a
partir da década de 1930, abrigando, por exemplo, o Laboratório
de Biologia Infantil. A própria matéria jornalística que está sendo
analisada indica um problema existente no Instituto Sete de
Setembro, também enfrentado no tempo em que este se chamava
Abrigo de Menores, ou seja, o problema da superlotação, como
veremos adiante.
Continuando, então, a análise, o segundo parágrafo
aponta para uma prática comum nos institutos disciplinares da
época: a disciplina militar, através da formação do “batalhão
do instituto”. Em seguida, o terceiro parágrafo volta a falar na
questão da “disciplina” e cita outro aspecto bastante tratado nos
estabelecimentos para a infância: o tema da “higiene”, um dos
pontos mais debatidos na conjuntura da sociedade da época.
Do quarto ao sexto parágrafos, o texto da notícia toca no
aspecto do contingente, tanto no que tange ao quantitativo
quanto à variedade das idades daqueles que se encontravam
ali internado. É evidente a preocupação com a lotação, apesar
da matéria não enfatizar isto como problema. Mas se a lotação
máxima, de acordo com o jornal, era de “350 menores”, e,
segundo o respectivo órgão da imprensa, a instituição estava
com um quantitativo de 570, que tenderia “a aumentar”, isto era
ou não era de fato um problema preocupante? Certamente e, no
caso, não apenas para o próprio Instituto Sete de Setembro, mas
também para a Escola João Luiz Alves, pois é informado que “120
delinquentes” aguardavam sentença judicial. O outro aspecto
problemático sinalizado é a situação da presença no mesmo
espaço de crianças tão pequenas, “muitas de 4, 5 e 2 anos”, com
jovens de “idade superior a 16 e 17 anos”.

37
Chegamos ao sétimo parágrafo que toca num assunto
por demais criticado, pelo fato de se tornar prática corriqueira
em instituições disciplinares: o método de usar “os castigos
corporais” para obter-se a tão almejada “disciplina perfeita”.
Segundo a matéria, apesar da “variedade de tamanhos e idades”,
os castigos não foram necessários, o que deixa nas entrelinhas a
percepção de que, sendo necessários, eles ocorreriam.
O penúltimo parágrafo da matéria, finalmente, diz algo
a respeito da educação escolar, ao informar que “quatro novas
salas de aulas” foram criadas no referido Instituto e que as
mesmas estavam “providas de mobiliário e material didático”.
Resta saber , num universo de 570 internos, quantos tiveram
acesso a esse recurso, previsto como direito nas leis da época.
O parágrafo final deixa a entender que, apesar da “agradável
impressão” que tivera o digníssimo ministro, o Instituto Sete de
Setembro ressentia ainda de “necessidades materiais”, talvez, de
grandes necessidades materiais.
A segunda matéria noticiada pelo jornal O Paiz destacada
aqui foi divulgada em 28 de dezembro de 1929 com o título
“Menores delinquentes postos em liberdade vigiada”. Ela trata
da decisão do Juiz Mello Mattos de por em “liberdade vigiada”,
nas vésperas do Natal, “cinco menores delinquentes que estavam
cumprindo sentença na Escola João Luiz Alves.” A matéria se
inicia discorrendo sobre os objetivos da “escola de reforma”,
ou seja, “a regeneração” do “menor delinquente” através do
“trabalho, instrução e educação”. Depois justifica o porquê da
existência do “instituto da liberdade vigiada”, que fora concebida
no sentido de observar “durante certo tempo” se o interno tinha
de fato condições de “voltar à vida ordinária da sociedade”. Em
seguida esclarece a própria definição deste preceito que fora
previsto no Código de Menores (1927). Vejamos, neste ponto, o
texto do jornal: “ Consiste a liberdade vigiada em ficar o menor em
companhia e sob a responsabilidade dos pais, tutor ou guarda, ou
aos cuidados de um patronato, e sob a vigilância do juiz, de acordo
com os preceitos dos artigos 92 a 99 do Código de Menores”.

38
Seria importante uma pesquisa que pudesse dimensionar
o uso e a eficácia deste benefício, que pode ser visto como uma
espécie de “ideia-mãe” do que veio a ser previsto no Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA-1990) como “Liberdade
Assistida”. Ressalve-se de que o termo “assistida” sugere que o
adolescente receba algum tipo de assistência para conseguir voltar
a se integrar à vida sócia, enquanto “vigiada” indica que o mesmo
permaneceria sob a vigilância dos “olhos da lei”, ou seja, do juiz.

Jornal do Brasil

Vamos destacar aqui duas matérias divulgadas pelo Jornal


do Brasil. Uma em 12 de novembro de 1926 e outra em 30 de
dezembro de 1927. Ambas têm como foco importante autoridade
da época, o juiz de menores Dr. Mello Mattos, destacado pela
imprensa nos noticiários sobre a Escola João Luiz Alves. A
primeira matéria apresentou entrevista em que o Dr. Mello
Matos falou dos objetivos e do programa da Escola João Luiz
Alves, recém-inaugurada. A segunda fez uma análise crítica da
atuação do juiz no Juizado de Menores.
Antes, porém, é importante ressaltar que o Juizado de
Menores, criado pelo Decreto 16.272 de 20 de dezembro de 1923,
tinha, na época da entrevista, apenas três anos de existência,
sendo o Dr. Mello Mattos o primeiro juiz de menores da América
Latina. Nos artigos 37 e 38 do referido decreto, que informam
sobre as competências do juiz de menores, fica evidente o poder
que esta autoridade exercia sobre a destinação e futuro dos
“menores abandonados e delinquentes”:

Art. 37. É criado no Distrito federal um Juizo de Menores para


assistência, proteção, defesa, processo e julgamento dos menores
abandonados e delinquentes.
Art. 38. Ao juiz de menores compete:
I- processar e julgar o abandono de menores, nos termos deste

39
regulamento, e os crimes ou contravenções por eles perpetrados; II-
inquirir e examinar e estado físico, mental e moral dos menores que
comparecerem a juízo, e, ao mesmo tempo, a situação social, moral e
econômica dos pais, tutores e responsáveis por sua guarda; III - ordenar
as medidas concernentes ao tratamento, colocação, guarda, vigilância
e educação dos menores abandonados ou delinquentes; IV - decretar a
suspensão ou a perda do pátrio poder ou a destituição da tutela e nomear
tutores; V - praticar todos os atos de jurisdição voluntária tendentes à
proteção e assistência aos menores; VI - impor e executar as multas a
que se refere este regulamento; VII- fiscalizar os estabelecimentos de
preservação e de reforma, e quaisquer outros em que se achem menores
sob sua jurisdição, tomando as providências que lhe parecerem
necessárias; VIII - exercer as demais atribuições pertencentes aos juízes
de direito e compreensivas na sua jurisdição privativa; IX - cumprir e
fazer cumprir as disposições deste regulamento, aplicando nos casos
omissos as disposições de outras leis, que forem aplicáveis às causas
civis e criminais da sua competência; X - organizar uma estatística
anual e um relatório documentado do movimento do juiz, que remeterá
ao Ministro da Justiça. (Decreto 16.272 de 20 de dezembro de 1923).

O poder do juiz também se estendia às instituições que


atendiam ao respectivo público. O juiz era, sem dúvida, um dos
atores centrais no desenvolvimento das políticas públicas para a
infância pobre e infratora, e a sua voz era revestida de uma áurea
de sabedoria e poder, muito valorizada pela imprensa.
A entrevista foi noticiada pelo Jornal do Brasil, em 12 de
novembro de 1926, tendo como título “A Escola de Reforma dos
Menores Delinquentes – Seus fins e seu programa – Interview com
o Juiz de Menores”. A entrevista foi publicada um dia depois dos
jornais noticiarem a inauguração da Escola, em 11 de novembro,
apresentando a foto do Dr. Mello Mattos. Analisaremos toda a
matéria, pois a mesma é rica em informações sobre a escola e sobre
outras instituições da época que recebiam “menores infratores”,
além de apresentar pistas para se compreender o contexto da
chamada “questão do menor”, nos anos 20, na capital federal.
O texto apresenta inicialmente as perguntas com as
respectivas respostas do juiz, ao final há um comentário
conclusivo. A primeira pergunta tratou de questão quantitativa:

40
“quantos menores pode comportar o edifício da escola?”. O
juiz, então, respondeu: “duzentos no mínimo”. Não deixa de ser
surpreendente o parâmetro do juiz que, ao invés de responder
sobre o que de fato lhe foi perguntado (o máximo de alunos os
quais a escola comportava), respondeu sobre o mínimo, deixando-
nos a possibilidade de entender que, em relação ao número
máximo de internos, poderia ser o tanto quanto fosse necessário.
Fica também o registro de que, tomando por base a realidade
atual da EJLA, duzentos já seria um número preocupante.
A pergunta seguinte foi feita pelo jornalista de modo a
relacionar o quantitativo mínimo estabelecido pelo juiz ao
número de menores que estariam na Casa de Detenção: “Na
Casa de Detenção acham-se menores nesse número para serem
internados na nova escola?”. O juiz Mello Mattos deu, então, a
seguinte resposta:

Não. Estão sendo processados em juízo menores em número superior a


esse; mas na Casa de Detenção existem apenas 28 à espera da internação.
Na escola de reforma só podem ser internados os menores condenados;
os que estão apenas submetidos a investigações ou instrução criminal
devem ser recolhidos ao Abrigo até ser proferida sentença condenatória.
(Jornal do Brasil, edição 00270-1, 12.11.1926, p. 06).

Em primeiro lugar, o juiz sinalizou para o fato de existir


grande número de processos no Juizado de Menores, citando
ainda outra instituição importante da época, o Abrigo de Menores,
que também prestava atendimento ao público em questão. O juiz
esclareceu que o Abrigo funcionava como um tipo de internação
provisória, ou seja, os que aguardavam o resultado da sentença,
enquanto a Escola João Luiz Alves ficava reservada somente aos
“menores” que já tinham condenação proferida pelo juiz.
Pela resposta que o Dr. Mello Mattos apresentou era de
supor que o Abrigo de Menores acolhia grande número de
menores que aguardavam sentença, como, aliás, foi a pergunta
feita depois pelo jornalista: “Então ao Abrigo há grande número

41
de menores nessas condições?”. O juiz mais uma vez surpreendeu
ao responder que preferiu deixar em liberdade aqueles que
aguardavam o resultado da sentença. Vejamos o que ele disse:

Também não. Como a seção criminal do Abrigo ainda não foi


inaugurada, esses menores teriam de ser recolhidos a uma seção
especial da Casa de Detenção; e como isso me pareceu iníquo e
pernicioso a esses infelizes, que já lá iriam corromper-se mais, preferi
deixá-los em liberdade, como o permite a lei, até que lhes possa dar
conveniente colocação. Outrossim, como a escola de reforma ainda
não estava instalada, se eu desse andamento aos processos com eles
em liberdade, os condenados teriam de cumprir a sentença na Casa
de Detenção; por isso, preferi deixar os processos parados. Só foram
internados na Detenção e julgados os menores implicados em crimes
mais graves. (Jornal do Brasil, edição 00270-1, 12.11.1926, p. 06).

Os motivos destacados pelo Dr. Mello Mattos, para deixar


em liberdade os menores que aguardavam sentença, apresenta,
por um lado, um modo de ganhar tempo para proceder outras
internações, pois como ele mesmo disse ainda não tinha sido
inaugurada a “seção criminal do Abrigo”. Por outro lado, o bom
senso no sentido de evitar que ocorresse a mistura dos que tinham
cometido infrações mais graves com as de menor gravidade,
pois, como disse o próprio juiz, a Casa de Detenção não era
lugar adequado para os jovens. Enviá-los para lá significaria algo
“iníquo e pernicioso para aqueles infelizes” que, segundo o juiz,
poderiam “corromper-se” ainda mais.
Em seguida o jornalista perguntou: “E agora, o que pretende
fazer?”. Respondeu, então, o magistrado: “Dar andamento
rápido aos processos, conservando os menores em liberdade,
internando na Escola João Luiz Alves os que forem condenados”.
Fica evidente, na resposta do juiz Mello Mattos, que, a partir do
momento em que a Escola fosse inaugurada, sua estratégia de
retardamento dos processos cessaria e a partir daí seu trabalho
consistiria em acelerar a internação daqueles que recebessem
condenação.

42
A entrevista prosseguiu apresentando a preocupação
do jornalista em saber quando a EJLA teria lotação completa,
uma vez que o juiz respondera que aceleraria o julgamento dos
processos contra os menores. O jornalista, então, perguntou-
lhe: “Acha que dentro de pouco tempo a Escola terá a lotação
completa?”. Vejamos a resposta do Dr. Mello Mattos:

Não o creio, mas é provável que o número de internos cresça depressa,


porque os menores a internar devem ter permanência mais ou menos
demorada. Por lei a internação deve durar de um a seis anos, o que quer
dizer que haverá acumulação de sentenciados e custará a haver vagas;
mas é provável que neste primeiro ano não sejam internados mais de
100 menores. (Jornal do Brasil, edição 00270-1, 12.11.1926, p. 06).

A resposta do juiz é dúbia. Ele, ao mesmo tempo em que disse


não crer na lotação da Escola, afirmou que o número de internos
devia crescer “depressa”. A sequência da resposta evidencia
uma questão preocupante, pois o juiz fala em “acumulação de
sentenciados” pelo fato da internação ser longa e de não “haver
vagas” para todos que recebessem sentença. Afinal, se não existia
vaga para todos os que recebessem sentenças do juiz, para onde
iriam os menores infratores que não pudessem ser internados
na Escola João Luiz Alves? Provavelmente encheriam a Seção
Criminal do Abrigo de Menores, se não fossem enviados à Casa
de Detenção. Ou seja, a “questão do menor infrator” era um
problema complexo na conjuntura da época, desafiando, assim,
o poder público.
A ausência de escolas adequadas para prestar atendimento
àqueles que recebiam condenação judicial e o crescente número de
crianças, adolescentes e jovens pobres que viviam abandonados
e fora da escola era um problema crônico dos grandes centros
urbanos do país como no Rio de Janeiro e São Paulo. As políticas
públicas, além de não resolverem o problema da pobreza que
afetava a maior parte da população, não davam conta de ampliar
o acesso à escola pública, ainda muito escassa na época. Para

43
aqueles que desafiavam a ordem, o aprisionamento era a opção
mais imediata, o que fazia crescer a lotação das instituições
prisionais e aquelas, como a Escola João Luiz Alves, que foram
concebidas para por em prática um “regime educacional”.
Neste sentido, o Dr. Mello Mattos era um entusiasta da
proposta pedagógica da EJLA. Quando o jornalista lhe perguntou
se os sentenciados seriam submetidos ao “regime prisional”, a
resposta do juiz foi peremptória:

Não. O moderno Direito suprimiu inteiramente a prisão para menores


delinquentes de idade inferior a dezoito anos, e em vez dos cárceres
estabelecem escolas; a repressão penal foi substituída pelo regime
educativo disciplinar: trabalho, aprendizado profissional, exercícios
físicos e militares, instrução literária e técnica, educação moral. Em
lugar de punição, procura-se obter a reeducação e regeneração:
oficinas, serviço agrícola, tratamento higiênico, médico e moral. (Jornal
do Brasil, edição 00270-1, 12.11.1926, p. 06).

Na verdade, o juiz resumiu o que estava previsto no


Regulamento da Escola. Sendo ele um “homem da lei”, ele
não só acreditava naquilo que fora escrito no Regulamento
da Escola João Luiz Alves (documento analisado em páginas
anteriores), como também era defensor do que ele mesmo
definira como “moderno Direito”. Infelizmente, no que tange
às políticas públicas para infância pobre e infratora, nem tudo
que estava previsto em lei foi de fato estabelecido na prática. A
Escola João Luiz Alves não fugiu a esta regra e a imprensa da
época divulgou notícias que contrariavam as palavras do nosso
nobre juiz, como veremos mais a frente. Antes, porém, convém
destacar o comentário final da entrevista que se constituiu na
defesa do papel exercido pelo juiz de menores na sociedade e
na representação positiva deste ator, tão importante no contexto
das políticas públicas para a infância:

44
O juiz não é perseguidor do menor, porém, pai, mestre, amigo e
médico espiritual. Por isso ele tem o arbítrio de diminuir a pena e
soltar o menor, se este fica curado, isto é, moralmente regenerado antes
de terminar o tempo da internação; ou em caso contrário, prorrogar
esta até ao máximo legal, se dentro do prazo marcado da sentença o
menor delinquente não se mostrar regenerado. § E com estes informes,
despedimo-nos do íntegro magistrado, que qual o juiz Magnaud, le
bom juge, orgulho da França e exemplo do mundo inteiro, vai servindo
a Justiça, amparando o menor que delinque, mas, sempre elemento,
moderado e conciliador. (Jornal do Brasil, edição 00270-1, 12.11.1926, p. 06).

O jornal fechou a matéria exaltando o juiz Mello Mattos


que se transformou numa síntese de “pai, mestre, amigo e
médico espiritual” do “menor”. A exaltação chegou ao ponto
de compará-lo com o famoso juiz francês Paul Magnaud (1848-
1926) que falecera no mesmo ano em que a entrevista ocorrera4.
Convém destacar, por fim, o quanto o comentário final
expressou a visão que se tinha na época: o menor infrator era
compreendido como sendo uma pessoa que sofria de uma
“doença moral”, necessitando, portanto, de um “remédio” que
o “curasse”, que o “regenerasse”, remédio esse que tinha como
sinônimo a “internação” em instituição disciplinar como a Escola
João Luiz Alves.
A outra matéria, de 30 de dezembro de 1927, que tinha como
título “Progressos de uma instituição”, apresentou uma análise
crítica da atuação do Juizado de Menores, em funcionamento
há três anos. O conteúdo da matéria sinaliza o crescimento
das atribuições do Juizado e, consequentemente, a ampliação
do aparato institucional. De certa forma, o conteúdo da notícia
deixa a entender o quanto o Estado foi, paulatinamente, pondo
em prática uma estratégia de tornar mais complexo o aparato
institucional para tentar dar conta da magnitude do problema
4 O juiz Magnaud era conhecido como “o bom juiz”, tendo se destacado por
emitir sentenças “imbuído de ideias humanitárias e avançadas.” (ver artigo “O bom
juiz Magnaud: conheça o juiz que viveu a frente de seu tempo” de Vladimir Passos
de Freitas - site http://www.conjur.com.br/2009-mar-08/segunda-leitura-paul-mag-
naud-juiz-viveu-frente-tempo, acesso em 26.12.2016).

45
da chamada “infância desvalida”. Cada vez mais se buscou a
criação de instituições com o intuito de, através de uma política
de internação, resolver a “questão do menor”. Vejamos como é
apresentada a introdução do conteúdo da matéria:

De começo, o Juizado de Menores veio apenas para tratar da assistência


judiciária aos menores, defendendo os abandonados e processando os
delinquentes, de acordo com as novas ideias da política social. Não
era pequeno o trabalho. No primeiro ano de seus encargos, o Juízo de
Menores amparou 3.121 abandonados e processou 216 delinquentes.
Foi o bastante para que o Sr. Mello Mattos deixasse comprovada a sua
dedicação à função que em boa hora se confiou a sua competência e
probidade. (Jornal do Brasil, edição 00311-3, 30.12.1927, p. 05).

Fica claro, logo no início, que a notícia buscou destacar a


grandiosidade do trabalho que o Juizado tinha de enfrentar. Em
seu primeiro ano de existência, atendeu “3.121 abandonados”
e “216 delinquentes”, o que deixava evidente que “não era
pequeno o trabalho”. Em seguida a matéria avança para a crítica,
ao demonstrar que, a partir da criação do Juizado de Menores,
um processo cumulativo de atribuições foi se instalando, gerando
uma ampliação da burocracia que teve como contrapartida o
crescimento dos gastos públicos:

Mas abismo chama abismo, forma geral dessa outra verdade mais certa:
função pública atrai função pública. Já no primeiro ano ampliaram os
aparelhos pertencentes ao maquinismo geral. Depois, prosseguiu o
esforço de ampliação, sem se deter, até chegar ao Código de Menores
que, sob o pretexto de consolidação, inova uma infinidade de relações
jurídicas, entregues ao Código Civil e ao Código Penal. E num simples
decreto do Executivo, não só se impõem essas novidades, como se
autoriza a criação de lugares. Vemos ai que o Juizado de Menores, com
três anos de vida, superintende um conjunto de repartições, onde se
pagam mais de duzentas pessoas, num total próximo de mil contos de
réis para a despesa em ordenados e gratificações. Compreendem-se aí,
além do Juízo de Menores, com vinte e cinco funcionários, o Abrigo
de Menores, a Escola João Luiz Alves e a Escola Quinze de Novembro.
Acima de todos, como uma espécie de ministro, o Juiz de Menores,

46
cheio de incumbências, umas administrativas, outras judiciais. Essas
funções serão enormes. Envolvem uma enorme parte processual, com
o julgamento dos delinquentes, que vimos excederem de duzentos no
primeiro ano. Há atribuições de assistência aos desamparados, encargo
realmente digno de Hércules, pelo número de crianças que vão bater
às portas do Juízo de Menores. Além dessas funções, o Código outorga
ainda muitas outras, quer administrativas, na direção desse enorme
maquinismo, quer policiais, na execução de vários dispositivos do
decreto. (Jornal do Brasil, edição 00311-3, 30.12.1927, p. 05).

O jornal elegeu alguns alvos para atacar. Sendo assim,


apresentou argumentos para criticar o surgimento do Código de
Menores, como se não houvesse necessidade de se estabelecer
uma legislação específica para aqueles que tinham menos de 18
anos, uma vez que já existiam os Códigos Civil e Penal. Parece que
o jornal não comungava com as orientações mais progressistas
da época que apontavam exatamente para uma legislação
específica para os menores de idade. Outro alvo foi o acúmulo
de poder do próprio juiz que, além das atribuições propriamente
jurídicas, também tinha que dar conta das administrativas e
assistencialistas.
A crítica ao surgimento de outras instituições voltadas
para o atendimento à infância desvalida também está presente
na matéria, articulada com o questionamento quanto aos gastos
para a manutenção do aparato institucional. Pela maneira como
os argumentos são colocados e articulados, percebe-se que o
conteúdo da crítica orienta-se pelo pensamento liberal, que
questiona gastos voltados para o crescimento de um Estado
assistencialista. A matéria prosseguiu apresentando novos
argumentos contra o Código de Menores, assim como contra o
Juizado, mas, em nenhum momento, foi apresentada alguma
saída para o problema da infância pobre e abandonada, talvez
porque esta problemática não fosse, para o articulista do jornal,
algo que merecesse a sua atenção.

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Jornal A Manhã

Destacaremos desse jornal duas matérias. A primeira,


divulgada em 30 de novembro de 1926, diz respeito à
“transferência de menores infratores da Casa de Detenção para
a Escola João Luiz Alves”. A segunda, que veio a público em 23
de setembro de 1927, apresenta críticas contundentes quanto à
política em prol da infância pobre. Veja-se o conteúdo da primeira
cujo título era “Os menores delinquentes – Foram transferidos
da detenção para os novos estabelecimentos penais”:

Instalada, há pouco, na Ilha do Governador, a Escola de Reforma João


Luiz Alves recebeu, ontem, dez menores condenados, os quais, por falta
de presídios apropriados, cumpriam sentença na Casa de Detenção.
§ Eram 35 os menores recolhidos no presídio da rua Frei Caneca.
Além dos dez transferidos para o novo estabelecimento, 18 menores,
que respondem a processo, foram também, ontem, removidos para o
Abrigo de Menores de S. Cristóvão, sendo quatro, do sexo feminino,
transportadas para a Escola Alfredo Pinto, na Tijuca. § Na Casa de
Detenção continuam, cumprindo sentença, em virtude de decisão do
Supremo Tribunal, três condenadas, entre as quais se destaca Maria
José Alves, a celebre crioulinha que matou a patroa a golpes de enxada,
em Copacabana, e que ficou em evidência mais tarde, quando deu à luz
um pretinho no cubículo em que ela vive no estabelecimento de que o
coronel Meira Lima é diretor. § A Escola João Luiz Alves, assim como
o Abrigo de Menores e a Escola Alfredo Pinto, só recebem por força
das leis, os menores condenados pelo juiz Mello Mattos, continuando
naquele presídio as delinquentes que atingiram a maior idade no
cárcere, isto porque não possuímos ainda uma prisão especial para as
mulheres que infringem o Código Penal. § Em todo o caso, é possível
registrar aqui o primeiro passo dado em prol do grande problema que
consiste na separação dos menores delinquentes, os quais, a despeito da
separação feita pelo coronel Meira Lima, viviam de um certo modo, na
promiscuidade de criminosos reincidentes, o que lhes tornavam difícil
o aperfeiçoamento moral. O juiz Mello Mattos, que se tem dedicado
ao assunto, dirigiu, ontem, pessoalmente, os trabalhos da transferência
para os estabelecimentos referidos em os quais os menores receberão a
educação baseada nos métodos penais que a nova lei estabeleceu. ( A
Manhã, Rio de Janeiro, 30 de novembro de 1926, p. 5).

48
Já no título da matéria é passada a ideia de que a Escola
João Luiz Alves, para onde seriam levados os “menores
delinquentes” da Casa de Detenção, era entendida como um
“novo estabelecimento penal”. Esta mesma ideia é também
transmitida ao final da notícia, quando informa que “os menores
receberão a educação baseada nos métodos penais que a nova
lei estabeleceu”. Ideias assim eram recorrentes na imprensa da
época, como vimos anteriormente. O fato de ser infrator era
entendido, por boa parte daqueles que escreviam as matérias de
jornais da época, como sendo alguém que merecia um tratamento
penal, mesmo tratando-se de menor de idade. Por tal razão, nas
notícias referentes à EJLA, era comum associá-la a mais um tipo
de estabelecimento penal.
Outro aspecto a considerar diz respeito à questão de
gênero. Mesmo sabendo que o quantitativo em relação aos
meninos era bem inferior, e, talvez, também por isso, a atenção
dada às meninas consideradas “delinquentes” pela justiça era
diferenciada. A notícia informou que quatro meninas infratoras
seriam internadas na Escola Alfredo Pinto que depois se
protagonizou como estabelecimento voltado para a formação
de auxiliares de enfermagem. Entretanto, ficou evidente que as
jovens, envolvidas em casos mais graves, permaneciam na própria
Casa de Detenção, e, como não havia estabelecimento específico
para atender ao sexo feminino, quando se tornavam maiores
de idade, tinham que cumprir a pena na Casa de Detenção,
em “promiscuidade” com os detentos do sexo masculino. Tal
realidade propiciava situações como a noticiada pela matéria: o
fato da jovem interna engravidar, estando dentro da instituição,
para não falar de outras situações mais graves enfrentadas por
essas meninas .
O aspecto da questão racial também aparece sinalizado
na matéria. O uso de expressões como “crioulinha” e “pretinho”
evidencia certo preconceito racial ao tratar das pessoas a quem
se referem esses nomes, ou seja, a menina negra que teria
assassinado a patroa, e o seu filho, nascido na Casa de Detenção.

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Se, ao invés de negra, a menina fosse branca, dificilmente a
expressão “branquinha” apareceria no texto. Nesse sentido, é
bom frisar que se, até nos dias de hoje, o preconceito racial e o
racismo são fenômenos ainda presentes na sociedade brasileira,
imagina numa época em que boa parte da intelectualidade e da
opinião pública debatia teorias raciais, como “racismo científico”,
“eugenia” e “miscigenação”.
A segunda matéria foi publicada em 23 de setembro de
1927, numa coluna do jornal intitulada “Liberdade de Opinião”.
Vejamos o que foi divulgado:

Nova indústria... § A infância está agora engordando muita gente. § Só


se fala em proteger os futuros homens da pátria... § E os menores, com
o juiz Mello Mattos, que não têm recursos para ampará-los, andam por
aí, mendigando restos de comida, pela cidade, ou no xadrez infecto da
Polícia Central. § A Infância! § E a gatunagem oficial faz prédios, anda
de automóvel, vai ao Municipal... § A Escola João Luiz Alves. § O Abrigo
de Menores. § A Escola 15... § Tudo isso são blagues deslavadíssimas,
mas que só serve para encher de dinheiro uma corja que, em outro
país, estaria irremediavelmente no xadrez... § As crianças brasileiras
estão sem colégio e sem pão. §Nós não estamos aqui para ludibriar o
público.§ E por isso dizemos que essa história de assistência à infância é
chantagem grossa que reclama um exame longo e pertinaz. ( A Manhã,
23 de setembro de 1927, p. 3).

As críticas são contundentes quanto ao uso do tema


da “infância pobre” para beneficiar o que a matéria definiu
como “gatunagem oficial”. A matéria começa com o título
“Nova Indústria”, dando a ideia de que as políticas em prol da
infância pobre, materializadas através das instituições como a
Escola João Luiz Alves, o Abrigo de Menores e a Escola XV de
Novembro, estariam produzindo “piadas descaradas” (“blagues
deslavadíssimas”). Na prática, segundo o que foi escrito no
jornal, tais políticas estariam enchendo de dinheiro “uma corja”
que deveria estar no “xadrez”. Fica aqui a referência a uma
possível corrupção de agentes públicos. No entanto, a matéria
não apresenta prova alguma a esse respeito.

50
Outro aspecto que aparece na notícia é a referência à falta de
verba para o Juizado de Menores que fazia com que o juiz Mello
Mattos ficasse a “mendigar restos de comida”. Há também na
matéria a sinalização de algo importante: “as crianças brasileiras
estão sem colégio e sem pão”. Fome e falta de escolas públicas
faziam parte do conjunto de problemas para os quais o poder
público deveria apresentar à sociedade soluções, no entanto, tais
problemas não faziam parte da pauta de prioridade dos governos
da República Velha, que, como já dissemos em outro momento
(C MARA e SANTOS, 2013), via a “questão social” como “caso
de polícia”.
Ao final da matéria, há a afirmação de que “essa história
de assistência à infância é chantagem grossa” que mereceria um
“exame longo e pertinaz”. Fica evidente que se, por um lado,
muitas críticas feitas tinham sentido e razão de ser, por outro,
não era apresentada solução alguma para as inúmeras crianças
pobres e abandonadas que viviam pelas ruas.

Jornal A Noite

O Jornal A Noite noticiou em 11 de novembro de 1926


a inauguração da EJLA. O título da matéria foi “Foi hoje
inaugurada, na Ilha do Governador, a Escola João Luiz Alves”.
Além das informações referentes à presença das autoridades, no
caso “o Ministro da Justiça, o Juiz de Menores, o diretor da Escola
Quinze de Novembro e outras altas autoridades da República”, a
notícia trouxe importantes informações no tocante às obras que
foram realizadas para que a EJLA fosse instalada:

No local onde acaba de ser fundada a Escola de Reforma, funcionava


antigamente a Colônia de Alienados, para homens, que foi transferida
para uma fazenda em Jacarepaguá. § O prédio da Ilha do Governador
passou agora por uma completa remodelação, sendo-lhe feitas
instalações e adaptações adequadas aos novos fins a que é destinado

51
o edifício. § Foram restauradas e transformadas as antigas ruínas,
reformou-se, totalmente, o serviço de luz, água e esgotos, instalaram-
se oficinas de marceneiro, carpinteiro, ferreiro e sapateiro, com
maquinismos modernos; o prédio foi totalmente remodelado na
sua parte interna, instalando-se os compartimentos apropriados ao
funcionamento da Escola. Construíram-se dormitórios, com capacidade
para 150 menores e um grande refeitório, com capacidade para 200.( A
Noite, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 1926, p. 8).

A considerar o que foi descrito acima, percebe-se o quanto o


Governo Federal buscou criar as condições para que a Escola de
Reforma prevista por lei (1923) pudesse sair do papel e se tornasse
realidade três anos depois. A informação sobre as oficinas que
foram instaladas também deixam ver que tipo de “instrução” os
internos receberiam: aquela que fosse voltada para a formação
de mão de obra, exclusivamente pautada em ofícios das classes
populares. Outra parte da matéria fez questão de esclarecer que
o novo estabelecimento não era mais uma prisão:

Ali, somente são internados os rapazes condenados pelo Juízo de


Menores, e embora vão eles cumprir sentença, o estabelecimento não
é considerado penitenciária, nome aplicado às outras casas destinadas
ao cumprimento de penalidades impostas pela justiça a indivíduos de
maior idade. § Na Escola João Luiz Alves não há celas, e sim, oficinas e
lavoura. Não é uma casa de punição de crimes, em que os seus autores
sofrem horrores da prisão como castigo de seus atos. .( A Noite, Rio de
Janeiro, 11 de novembro de 1926, p. 8).

Ao buscar esclarecer a distinção entre a nova Escola e as


“casas” destinadas aos “de maior idade”, o texto acima evidencia
que um dos aspectos desta diferença consistia no fato de que “na
Escola João Luiz Alves não há celas, e sim, oficinas e lavoura”,
enquanto na “casa de punição de crimes”, os internos “sofrem
horrores da prisão como castigo de seus atos”. Considerando
que a Escola fora recém-inaugurada e que muitos dos “menores
infratores” ainda se encontravam em outras “casas”, pode-
se supor, evidentemente, que os mesmos “horrores” também
faziam parte da vivência de tais jovens.

52
Em seguida, a notícia explicou o significado da “Escola de
Reforma” e informou a respeito de “menores sentenciados” que
aguardavam transferência para a respectiva escola:

A Escola de Reforma, como o seu nome indica, é um estabelecimento


de regeneração, de ensino disciplinar, em que, durante o tempo de
segregação a que foram ondenados os delinquentes, estes aprenderão
conhecer os caminhos que devem seguir, depois de postos em
liberdade, tornando-se homens de bem, úteis à família e à sociedade,
e à pátria. § Não estão eles sujeitos às disposições do Código Penal; o
processo contra os mesmos é regido por lei especial; existem na Casa
de Detenção desta capital, em compartimentos especiais, aguardando
remoção para a Escola da Ilha do Governador, cerca de 29 menores
sentenciados. .( A Noite, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 1926, p. 8).

A conclusão da matéria, portanto, consistiu em esclarecer


o sentido da proposta de uma “Escola de Reforma” que fora
concebida para atender “menores delinquentes condenados”
pela justiça. O outro tipo de estabelecimento era a chamada
“Escola de Prevenção” que atendia principalmente os pobres e
abandonados, a exemplo da Escola XV de Novembro, no período
em questão.
Outro aspecto importante que a passagem acima apresentou
diz respeito à finalidade da Escola que, fundamentalmente,
tinha o propósito de, através da “regeneração”, transformar o
adolescente infrator em uma pessoa útil “à família, à sociedade
e à pátria”, ou seja, aos ideais positivistas e republicanos da
época. Por fim, a referência à “lei especial”, no caso o Código de
Menores, em contraponto ao Código Penal que se aplicava aos
adultos.
A passagem, então, termina informando que “29 menores
sentenciados”, internados na Casa de Detenção, aguardavam
remoção para a Escola, ou seja, sairiam de uma prisão, para irem
a um estabelecimento educacional. Pelo menos era isso que se
pretendia acontecesse.

53
Jornal A Rua

Destacamos do jornal A Rua duas matérias que trataram


sobre uma mesma denúncia, muito grave por sinal, caso o que foi
denunciado tenha de fato ocorrido da maneira como apresentado
nos textos das notícias. A primeira foi divulgada em 07 de abril
de 1927, tendo como título: “Os menores delinquentes estão
sofrendo os horrores da fome – Enquanto que os dirigentes da
Escola João Luiz Alves vivem a tripa forra”. Ela começa deixando
a entender que a troca de diretores na instituição poderia ser o
“pano de fundo” do problema denunciado:

É uma vergonha que ora se registra na Escola João Luiz Alves,


situada na Ponta do Galeão, escola esta destinada à reclusão dos
menores delinquentes. § Com o afastamento do Dr. Mario Dias, do
cargo de diretor, acusado de haver mandado espancar os menores ali
internados, o que não ficou apurado, foi designado para aquela função,
interinamente, o Sr. Luiz Nogueira da Gama, ex-caixeiro viajante. §
Resulta daí, que nunca mais se falou em espancamentos, mas, queixam-
se, não só os infelizes menores, como também os serventes e guardas
do referido estabelecimento, estarem todos sofrendo os horrores da
fome. ( A Rua, Rio de Janeiro, 7 de abril de 1927, p.1).

De qualquer modo, o fato de tratar-se de algo que estaria


levando os internos e funcionários a sofrerem “os horrores da
fome” faz a gravidade da denúncia ser grande não só pela fome
em si, que já é muito sério, mas também pelo que vem depois:

Sobre esse fato recebemos hoje, a visita dos Srs. Euclydes Braga e
Álvaro Pinto Cidade, que nos declararam terem sido demitidos da
referida escola, porque não quiseram prestar falsas declarações contra o
diretor Dr. Mario Dias. § Acrescentaram eles que ultimamente, a carne
fornecida para alimentação dos menores e empregados subalternos
é toda podre, e isso tem enfermado alguns menores com infecção
intestinal. . ( A Rua, Rio de Janeiro, 7 de abril de 1927, p. 1).

54
Dois ex-funcionários se colocaram como testemunhas
trazendo à tona outra denúncia também muito séria em relação
à possível alimentação estragada que estaria “enfermando
alguns menores com infecção intestinal”. Nesse ponto surge
uma dúvida: a princípio, pelo modo como foi intitulada a notícia,
parecia ser a falta de comida a causa da fome, mas, com esta
outra denúncia, ficou a ideia de que o fato da comida estar podre
poderia ser o que estaria ocasionando a situação de fome, já que
ninguém come para passar mal e ficar doente. Mas a denúncia
não parou por aí:

Enquanto isso, dizem os queixosos, o Dr. Theophilo, encarregado da


dispensa, leva para a sua casa grande quantidade de mantimento, todo
ele escolhido. § Aí está um fato, para o qual chamamos a atenção do
governo, afim de que seja tomada providência, pelo menos no sentido
de prevenir qualquer mortandade na escola, pois os infelizes menores
estão sendo alimentados com gêneros deteriorados. . ( A Rua, Rio de
Janeiro, 7 de abril de 1927, p.1).

Além da fome e da comida podre haveria também o roubo


de mantimento, ou seja, os alimentos bons estariam sendo
usurpados pelo “encarregado da dispensa”. Exagero ou não, fica
aqui uma sensação de tristeza pelo fato da EJLA, com apenas
cinco meses de vida, já aparecer em páginas da imprensa com
notícia tão grave assim. Mas isso é só o início. Quatro dias depois,
em 11 de abril, o jornal divulgou nova notícia sobre o mesmo
ocorrido: “Como se confirma uma denúncia de ‘A Rua’ – Como
os meninos da ‘Escola João Luiz Alves’ chegam a batizá-la com o
nome de Clevelância!”.
A matéria não só reafirma a denúncia anterior como também
apresenta uma novidade um tanto quanto surpreendente:
divulgação de uma carta assinada pelos internos da Escola. De
acordo com a carta divulgada, a EJLA estava sendo comparada
ao temível presídio de Clevelância do Norte, que existira entre
os anos de 1924 e 1926, localizado na fronteira do Amapá com a

55
Guiana Francesa (Cidade de Oiapoque). O presídio fora criado
pelo presidente Artur Bernardes e para lá foram enviados
diversos tipos de presos como sindicalistas, anarquistas, militares
rebelados (tenentistas), menores abandonados, suspeitos de
conspiração e criminosos comuns (BRITO, 2008). Esse presídio
ficou conhecido na época pela forma cruel no tratamento dado
aos aprisionados, submetidos a torturas diárias que fizeram
com muitos morressem em suas dependências. A violência no
presídio era tanta que teve de ser fechado, durando apenas dois
anos. Comparar uma escola ao presídio de Clevelândia era por
demais estarrecedor.
No início da matéria, o jornal procurou justificar sua atitude
em relação à denúncia feita em 7 de abril:

Os leitores de A RUA certo ainda se lembram da nota em que


denunciávamos as irregularidades que vinham sendo praticadas na
‘Escola João Luiz Alves’. Os alunos eram maltratados não recebendo
a menor consideração de sua diretoria. Até a boia era tão escassa que
dir-se-ia haver o propósito de matá-los de fome. § Fomos desmentidos.
É sempre assim. § Hoje chegou as nossas mãos a carta abaixo. § Ela
exprime tudo. É suficiente. Supre quaisquer comentários, provando
que A RUA tinha carradas de razão quando solicitou do Ministro da
Justiça as providências necessárias.§ Ontem foi A RUA que gritou.
Hoje são os próprios alunos que apelam.( A Rua, Rio de Janeiro, 11 de
abril de 1927, p. 3).

Depois de apresentar justificativa a respeito da denúncia


sobre maus-tratos que supostamente os alunos da Escola João Luiz
Alves estariam sofrendo depois da troca do diretor da Escola, a
matéria preparou o leitor para aquilo que fora apresentado como
uma prova de que a denúncia era verídica, ou seja, a divulgação
de uma carta que teria sido escrita pelos alunos da escola:

Eis a carta que recebemos dos infelizes da ‘Escola João Luiz Alves:
Escola João Luiz Alves – 8.4.927. – Exmo. Sr. redator d’A RUA – Cordiais
saudações.§ Tendo-nos chegado ao conhecimento a denúncia por

56
vós recebida de que aqui na ‘Escola João Luiz Alves’ nós os menores
delinquentes estávamos passando o regime da fome, resolvemos não
só vos afirmar ser verídica a denúncia, como também pedir-vos, como
defensor dos pequeninos, que advogue a nossa causa junto ao ‘Ministro
da Justiça’, pois com a atual Diretoria isto aqui deixou de ser escola
para ser a Clevelândia – o que não se dava quando era nosso diretor o
Dr. Mario Dias. § Sem mais lhe agradecemos a publicação desta e como
prova de fé assinamos – Seguem-se diversas assinaturas de alunos. ( A
Rua, Rio de Janeiro, 11 de abril de 1927, p. 3).

Por um lado não deixa de ser interessante ter colocado em


prática a de estratégia de se utilizar de um veículo da imprensa
para divulgar reivindicações dos internos. Por outro, percebe-se
que, além do possível “regime de fome”, a questão da troca do
diretor da Escola era uma das motivações para a iniciativa de
escrever uma carta a ser divulgada pelo jornal A Rua. Havendo,
ainda, com o possível propósito de chocar a opinião pública, o
requinte da ousadia de dizer que o estabelecimento em questão
“deixou de ser escola para ser a Clevelândia”.

Revista Fon Fon

Figura 5 - Visita de autoridades à Escola João Luís Alves


Fonte: Revista FON FON – 1928, p.55, Edição 0014(1), Hemeroteca BN.

57
O que será agora analisado diz respeito, primeiramente, a
uma fotografia divulgada na Revista FON FON no ano de 1928.
Como vemos acima, é uma foto tirada na escadaria de entrada da
Escola João Luiz Alves que, apesar das obras feitas durante seus
oitenta e oito anos de existência, ainda mantém, na atualidade, o
padrão que aparece na fotografia, pelo menos no recorte que foi
feito. Na imagem em si, em primeiro plano, aparecem, vestidos
de terno, autoridades da época em visita à escola, entre elas, o Dr.
Cândido Lobo, juiz de menores interino, como informa a legenda
logo abaixo da foto. Ao fundo, funcionários da instituição, vestidos
com seus respectivos uniformes. A maioria dos fotografados é
composta de pessoas brancas e todas são homens. Até aí tudo
leva a crer que é apenas uma foto divulgando a visita do juiz de
menores à Escola João Luiz Alves.
A fotografia em questão foi acompanhada de uma matéria
apresentada logo abaixo. À primeira vista, tem-se a impressão de
que o texto da matéria estivesse relacionado à foto, mas a matéria
trata de outro assunto. Ela faz comentários a um telegrama
vindo da “Oceania”. Optamos em apresentá-la juntamente
com a fotografia, não só porque a boa reprodução faz com que
seja possível lê-lo, mas também para que fosse visualizada a
montagem feita pela revista.
Ao ler o texto da matéria, para saber se dizia alguma coisa
sobre a Escola João Luiz Alves, eis a surpresa: nada tinha a ver com
a escola. O conteúdo apresentado era no mínimo curioso, pois,
além de expressar forte preconceito para com os presidiários,
fazia referência ao temível presídio de Clevelândia, já tratado na
análise da matéria do jornal anterior, A Rua. Uma questão vem
logo à cabeça: por que um conteúdo deste tipo logo abaixo de uma
fotografia da Escola João Luiz Alves? Haveria algum propósito
da Revista de passar uma mensagem subliminar associada à
escola? Questões de difíceis respostas. Para se entender melhor,
convém analisar o conteúdo da matéria.

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Ela começa informando a respeito de um telegrama da
Oceania sobre o ocorrido na Ilha de Tulagi, arquipélago de
Salomão, dizendo o que acontecera com trinta e sete presos
“os quais foram condenados àquele degredo por terem, no ano
passado, em Smarayo, assassinado alguns funcionários da polícia
britânica.” De acordo com a matéria, “desses 37 criminosos,
onze já morreram na prisão e vinte seis se acham gravemente
enfermos, devido a uma epidemia”. O que causou surpresa foi
o que aparece no trecho final da matéria, pois, além de revelar o
que seria talvez o ponto de vista da Revista pelo ocorrido com
os presos, ainda sugeriu que o presídio em questão mudasse o
nome para Clevelândia:

No fundo, não achamos de todo mau que uma epidemia se encarregue


de levar desta para melhor algumas dezenas de nativos da Oceania que
tiraram a vida a policiais brancos. Mas não podemos deixar de achar
que essa epidemia foi decerto muito bem arranjada e de aconselhar ao
governo do colossal Império Britânico que mude o nome da tal Ilha
Tulagi para outro muito mais significativo: Clevelândia...( Revista FON
FON, Rio de Janeiro, 1928, página 55, Edição 0014-1, Hemeroteca BN).

Assim como na notícia do jornal A Rua, a Revista FON


FON fez também referência ao temível presídio de Clevelândia.
Além disso, deixou a entender que presidiário morto é melhor
que presidiário vivo, ainda mais se tratando de criminosos de
“policiais brancos”. Estaria a Revista sugerindo algo semelhante
para os internos da Escola João Luiz Alves ao colocar essa matéria
logo abaixo da foto da escola? Talvez não. Mas há de convir que
a montagem foi no mínimo estranha.

59
Jornal A Crítica

Este jornal divulgou no ano de 1928 (só conseguimos


identificar o ano), uma notícia curiosa sobre o furto de uma
canoa que, segundo o jornal, foi roubada por internos da Escola
João Luiz Alves para fugir da instituição. A matéria informou
que o pescador, dono da canoa, senhor Antonio Pereira da
Rosa, estava tentando reavê-la, mas passava dificuldades para
conseguir o transporte de volta a sua propriedade que, depois
de encontrada, ficara “exposta ao tempo, na rampa do mercado
velho”. O fato demonstrou até que ponto a garotada se arriscava
para buscar a todo custo liberdade. De acordo com o jornal, a
empreitada juvenil teve êxito.
A Escola João Luiz Alves também apareceu nas páginas
de Crítica em uma série de reportagens a respeito de um
“correcional” (termo usado à época para ex-detento que cumprira
pena na prisão) de nome e Eugênio Rocca, condenado a trinta
anos de prisão por um crime que ficou conhecido na época como
“o crime do bote Fé em Deus”. Esse crime consistiu, de acordo
com a acusação, no assassinato de Carlos Fuoco cujo corpo foi
jogado ao mar, por Eugênio Rocca e Carleto (suposto cúmplice),
no bote em que os dois embarcaram junto com a vítima. O
crime foi cometido para a obtenção das chaves da ourivesaria
em que Carlos Fuoco trabalhava, a fim de que a dupla roubasse
o estabelecimento. Depois de cumprir vinte dois anos de
prisão, Eugenio Rocca recebeu liberdade condicional por bom
comportamento. Mesmo com a idade já avançada, conseguiu o
emprego de porteiro na Escola João Luiz Alves. O jornal, então,
durante vários dias, divulgou reportagens a respeito da vida do
senhor Eugênio.
Por força da função que exercia, sua residência era na própria
Escola João Luiz Alves. O objetivo das reportagens, realizadas
pelo jornalista Walter Prestes, era dar voz ao ex-sentenciado
que, mesmo depois de condenado, se dizia inocente. Como o

60
propósito foi registrar vários aspectos da vida do agora porteiro
da “Escola de Reforma”, as matérias tocaram em assuntos
espinhosos como o cotidiano da vida de um presidiário. Para
realizar as entrevistas, o jornalista teve de dirigir-se várias vezes
à EJLA, revelando também informações sobre a mesma. Veremos
a seguir partes de um trecho da primeira reportagem cujo título
foi “Rocca será inocente?”, divulgada em 01.12.1929. A matéria
foi apresentada em forma de relato em que o jornalista começa
relatando o encontro que teve com o filho de Eugênio:

Quando procuramos Eugênio Rocca, depois de termos organizado


o primeiro capítulo dessa reportagem, não o encontramos mais na
residência do seu filho, em São Cristóvão.
- Papai arranjou um emprego – disse-nos ele. É porteiro da Escola João
Luiz Alves, na Ponta do Galeão.
- Vem dormir em casa todas as noites?
- Não. As suas funções não permitem que saia de lá, a não ser em casos
especiais. Além disso, o lugar onde trabalha é muito afastado da cidade,
Mas papai está contente. Ficou muito agradecido às autoridades que o
colocaram. ( Crítica, Rio de Janeiro, 1º de dezembro de 1929, p. 1).

O trecho então revelou que o emprego conseguido por


Eugênio foi obra da ação de alguma “autoridade” e que a função
de porteiro o obrigava a dormir no emprego. Passo seguinte
do repórter foi relatar o momento em que encontrou Eugênio
na portaria da Escola João Luiz Alves. O relato demonstrou um
pouco do cotidiano da escola naquela época:

Eis-nos, afinal, novamente diante de Eugênio Rocca. Estávamos


na portaria da Escola João Luiz Alves. (...) Os empregados do
estabelecimento chegavam a cada instante para assinar o ponto.
- Bom dia, Rocca – iam dizendo carinhosamente. Você está bem?
Alguns alunos, rostos sombrios de criminosos precoces, tristes verônicas
de crianças abandonadas, aproximavam-se do porteiro de espaço a
espaço. Um queria licença para dar milho às galinhas. Outro desejava
tratar da horta. Ainda outro pedia permissão para ir ao alojamento.
§ Enquanto não cessava de todo aquele movimento característico do

61
início do dia, impossível seria abordarmos Eugenio Rocca sobre o
assunto que nos levava à sua presença. ( Crítica, Rio de Janeiro, 1º de
dezembro de 1929, p. 1).

O relato possibilita identificar alguns aspectos do cotidiano


da escola, sobretudo, em relação aos internos que, aos olhos do
repórter, seriam alunos de “rostos sombrios”, considerados por
ele como “criminosos precoces”. Ele inclusive chegou ao ponto
de fazer alusão a uma imagem religiosa, ao utilizar-se do termo
“verônica” que, segundo o dicionário Aurélio, é um substantivo
feminino que diz respeito à imagem de sofrimento de Jesus Cristo
crucificado. Sendo assim, ao identificar os alunos da Escola João
Luiz Alves como “tristes verônicas de crianças abandonadas”,
deixa entender que se tratava de seres humanos que careciam de
piedade. Além disso, o relato informa algumas das atividades
realizadas pelos internos, como “dar milho às galinhas” e “tratar
da horta”.
Em seguida, o jornalista emitiu uma opinião a respeito
da contratação de uma ex-presidiário para ser porteiro de uma
escola para menores delinquentes:

Muito acertado andou o governo ao colocar o liberado condicional à


porta desta casa – pensávamos. Se Rocca foi um criminoso sua velhice
dolorosa é a maior lição para os menores que ele guarda. Se é um
inocente, suas palavras de avô comunicarão conforto àquelas almas
tão cedo desabrochadas para o mal. ( Crítica, Rio de Janeiro, 1º de
dezembro de 1929, p. 1).

O jornalista considerou um acerto que o “liberado


condicional” pudesse trabalhar em proximidade com os internos
da Escola João Luiz Alves, isto porque, aos olhos do repórter,
a experiência do ex-presidiário podia ser repassada para os
adolescentes como “lição” de vida que deveria ser evitada. Mais
uma vez o repórter fez alusão negativa aos internos que seriam
para ele “almas tão cedo desabrochadas para o mal”. O relato
prosseguiu e constitui-se importante registro para quem deseja

62
conhecer de que modo o presidiário era tratado no início do
século XX.
Em outra reportagem publicada em 13 de dezembro de
1929, o jornalista Walter Prestes procurou saber o que o diretor
da Escola João Luiz Alves, Sr. Luis Nogueira Gama, achava da
publicação da entrevista com Eugenio Rocca: “não lhe causa
desprazer qualquer referência a essa casa de educação em meio
da reportagem que ora se publica?”, perguntou o jornalista. A
resposta do diretor da Escola João Luiz Alves foi categórica:
“Absolutamente. Pode ficar certo de que quando se procurava
emprego para o Sr. Rocca e se cogitava de colocá-lo num
estabelecimento público, houve um diretor de repartição que
teve prazer em recebê-lo. Fui eu.”.

Jornal O Imparcial

O jornal O Imparcial divulgou, em 27 de dezembro de 1928,


matéria que cita a Escola João Luiz Alves, sendo o conteúdo
centrado no debate sobre a aprovação da lei para o Ensino
Técnico Profissional. O autor da matéria foi o jurista Evaristo de
Morais.
O Dr. Evaristo começou o texto elogiando o Deputado
Fidélis Reis, autor da lei referente ao Ensino Técnico Profissional
no Brasil. Em seguida, o nobre jurista fez referência ao fato de
que a preocupação com o assunto também já foi sua e cita a obra
em que tratou do assunto:

Ainda agora, lendo um discurso do aludido deputado, vindo,


integralmente, no O Jornal, consolidei o meu juízo acerca da seriedade
da sua atitude, mantendo, durante três legislaturas, o mesmo ardor
na pregação das suas ideias, e, depois de vê-las vitoriosas no papel,
promovendo os meios de vê-las realizadas na prática. E da minha
parte não é recente a preocupação com o assunto, pois dele tratei, em
1916, na primeira edição da monografia Criminalidade da Infância

63
e da Adolescência, com que colaborei no 1º. Congresso da Infância,
então reunido em Buenos Aires. (O Imparcial, 27 de dezembro de 1928,
Editorial, p. 6).

Evaristo de Morais se referia ao Primeiro Congresso


Americano da Infância que teve como sede Buenos Aires, na
Argentina, em1916. O segundo foi realizado em Montevidéu,
no Uruguai, em 1919, o terceiro no Rio de Janeiro, no Brasil, em
1922 e o quarto em Santiago, no Chile, em 1924. O jurista também
se referiu, no trecho acima, ao texto que ele apresentara no
Primeiro Congresso, a obra clássica, Criminalidade da Infância e
da Adolescência, que se constituiu, na época, em uma das obras
que mais influenciaram as políticas públicas para a chamada
“infância desvalida”. Nessa obra, o Dr. Evaristo articula vários
campos do conhecimento, sobretudo, aqueles que se debruçaram
a pensar sobre a “questão do menor” e da “criminalidade”, ou
seja, as Ciências Jurídicas, a Medicina, a Psicologia, a Sociologia
e a Educação. Esse tipo de articulação era comum no período
a que estamos nos referindo. Havia uma grande presença do
saber médico pautando os argumentos a respeito dos problemas
advindos da sociedade, dessa forma, o fenômeno da criminalidade
era entendido do mesmo modo como se compreendia uma
doença orgânica. Desta feita, a propensão ao crime era visto como
algo que podia ser transmitido por “herança genética”, como as
palavras do jurista afirmavam, quando disse que “a mesma lei
preside à transmissão dos atributos físicos e à transmissão das
qualidades morais e intelectuais” (MORAES, 1927, p.12).
A lei do Deputado mineiro Fidélis Reis a respeito do Ensino
Técnico Profissional foi aprovada em agosto de 1927. Evaristo de
Morais, em seu artigo no jornal O Imparcial, escreveu sobre sua
surpresa pela legislação ter sido colocada em prática, pois, como
afirmou o jurista, “tinha triste experiência com outras leis, as
quais não obstante decretadas, ficaram sem execução, ou tiveram
execução deficiente e imperfeita”. Evaristo, então, enumerou
algumas destas leis que foram decretadas, mas que não tiveram a

64
devida execução, e, entre estas, as que se referiam aos “menores
delinquentes”:

Não preciso – creio- lembrar aos que se acostumaram a me aturar


na imprensa, as leis relativas às casas populares, à prevenção do
alcoolismo, ao asilo especial para toxicômanos, à reeducação dos
menores delinquentes (...). (O Imparcial, 27 de dezembro de 1928,
Editorial, p. 6).

Em seguida, o jurista citou o motivo alegado pelo governo


para não cumprir aquilo que era aprovado pelo Legislativo no
que tange às leis informadas: o velho argumento da “falta de
recursos financeiros”. E fez referência ao crédito “de 5.000 contos”
aprovado para o Ensino Técnico Profissional que, segundo ele,
era “evidentemente mesquinho”. Mesmo sendo, na concepção
de Evaristo de Macedo, um valor pequeno, ele concluiu o artigo
informando que, com crédito inferior àquele que fora aprovado,
já se poderia ter resolvido muito dos problemas enfrentados por
instituições necessitadas como a Escola João Luiz Alves:

Não é de pasmar que tal coisa aconteça, porquanto se sabe que, com
muito menos, seria possível, por exemplo, remover obstáculos opostos
ao regular funcionamento da ‘Escola João Luiz Alves’, do Abrigo de
Menores, do Hospício Nacional, etc., e, no entanto, vão ficando sem
realização os alvitres e sugestões dos respectivos diretores e sem
satisfação a boa vontade do Ministério do qual dependem as citadas
instituições... (O Imparcial, 27 de dezembro de 1928, Editorial, p. 6).

Todas as leis citadas por Evaristo de Morais que não


receberam do governo a devida atenção para executá-las
como foram previstas, são referentes às pessoas mais pobres,
desamparadas e excluídas da sociedade.

65
Jornal Correio da Manhã

A última matéria a ser analisada foi publicada no jornal


Correio da Manhã, em 23 de janeiro de 1929, tendo sido escrita
pelo advogado Antônio Evaristo de Morais (1871-1939). Com o
título “A reeducação dos menores delinquentes e uma ‘gaffe’
policial”, o Dr. Evaristo tocou em assuntos que, ainda nos dias
de hoje, fazem parte das preocupações daqueles que estudam e
lutam em prol da recuperação de adolescentes infratores.
A matéria iniciou-se fazendo alusão a um problema que
preocupou boa parte dos especialistas da época e daquelas
pessoas que efetivamente se importavam com o futuro dos
chamados “menores delinquentes”: “a promiscuidade dos
menores com adultos nas prisões comuns”:

Não é totalmente desconhecida dos leitores do Correio da Manhã a sua


porfiosa campanha de que resultou a especialização da magistratura dos
menores abandonados e delinquentes e a criação do estabelecimento
destinado à reeducação dos últimos. A despeito das prescrições do
Código em vários dos seus artigos, visando evitar a promiscuidade dos
menores com adultos nas prisões comuns, e da consequente instituição
de estabelecimentos especiais, viu-se a Justiça Penal, durante alguns
decênios, constrangida a recolher menores de 14, 15 e 16 anos, em
lugares impróprios onde se lhes completava a corrupção. ( Correio da
Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

O jurista então pontuou a postura da “Justiça Penal” que


“durante alguns decênios” mandou prender “menores de 14, 15
e 16 anos” em prisões na companhia de criminosos adultos, a
exemplo do que ocorrera “na famigerada Colônia dos Dois Rios”:

Tamanha era, neste particular, a nossa penúria que, num regulamento


oficial de 1908, foi autorizada a internação de menores condenados
como vagabundos na famigerada Colônia dos Dois Rios, cujos defeitos
não escaparam a quantas autoridades se tem dela ocupado. ( Correio
da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

66
Em seguida, Evaristo de Morais citou a campanha em
prol de uma legislação menorista ocorrida na década de 1920,
fazendo referência ao surgimento do Juizado de Menores e da
proposta de uma Escola de Reforma que viria a ser, como já
vimos anteriormente, a Escola João Luiz Alves:

Empenharam-se juristas, juízes, membros do Ministério Público,


diretores de prisões, publicistas, na memorável campanha, e, afinal,
mediante deliberação do Congresso, na lei orçamentária de 1921, se
obteve o Juízo de Menores, com o necessário aparelhamento, inclusive
uma ‘Escola de Reforma’. (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de
janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

O passo seguinte do autor da matéria foi criticar a


morosidade das autoridades do governo no “fiel cumprimento
da lei”, destacando a demora em se criar a referida escola de
reforma, considerada por ele como “imprescindível para a obra
de reeducação dos menores delinquentes”. Ele também se referiu
à situação problemática que ocorria na Casa de Detenção, onde
a separação entre menores e adultos não era algo que de fato
ocorria de forma “absoluta”:

Provida a nova judicatura na pessoa do senhor Mello Mattos, (cujo


nome dispensa qualquer elogio) ainda decorreram muitos meses para
que se tornasse possível o fiel cumprimento da lei. Observara-se, antes,
por longo tempo, este espetáculo deplorável: - lutar o Juízo de Menores
com a falta da aludida escola – reconhecidamente imprescindível para
a obra de reeducação dos menores delinquentes, devendo contentar-se
com um triste sucedâneo, a separação deles na Casa de Detenção! O
próprio diretor desse estabelecimento, (que foi, sem nenhum exagero,
o seu remodelador benemérito) confessava a impossibilidade absoluta
de manter, ali, a separação pressuposta. Demais, o sistema de medidas
reeducadoras adotadas pela legislação especial nunca poderia produzir
os frutos previstos na vigência daquela situação provisória. ( Correio
da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

67
Chega-se ao ponto em que Evaristo de Morais exaltou o
trabalho realizado na EJLA, na gestão de Nogueira da Gama,
apesar do que “ela ainda carece”. Ele pontuou os procedimentos do
diretor da Escola como positivos, desenvolvendo um trabalho que
conseguia transformar em “um dos melhores alunos” jovem interno
que “fora condenado como autor de ruidoso e bárbaro crime”:

A muito custo, inaugurou-se a ‘Escola João Luiz Alves’, num velho


edifício fradesco da Ilha do Governador, adaptado tant bien que mal...
§ Quem visita a ‘Escola’, e tem capacidade para saber o de que ela ainda
carece, admira quanto ali já se realiza, não se podendo eximir a aplaudir
a orientação do respectivo diretor. Inspirando-se nos propósitos do
juiz de Menores, que dedica ao estabelecimento os maiores carinhos,
procura o Sr. Nogueira da Gama, conforme vimos, preparar os seus
reeducandos para a vida livre, incutindo-lhes, com a instrução e os
hábitos de trabalho, os sentimentos mais elevados. Enérgico, sem
brutalidade, disciplinador rigoroso, é, também, em compensação,
paternal e afetivo, quando se trata de erguer o moral daqueles precoces
transviados, ou de os estimular no bom procedimento. Basta dizer, em
comprovação dos resultados obtidos, que um dos melhores ‘alunos’
fora condenado como autor de ruidoso e bárbaro crime, de que muito
se ocupou a imprensa de ter ele péssimos precedentes... (Correio da
Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

Continuando a exaltar “as práticas salutares da Escola”,


o jurista destacou dois aspectos fundamentais no processo de
recuperação de adolescentes infratores, qualquer que seja a
época a ser considerada: a efetiva educação e o direcionamento
para um trabalho que lhe permita obter “meios de subsistência”
ao sair da internação:

Entre as práticas salutares da administração da ‘Escola’ avulta a de


promover a colocação dos egressos em empregos, dos quais, possam
tirar meios de subsistência, forrando-se à vagabundagem e à inevitável
recaída. § Mais de um menor, havendo entrado analfabeto e preguiçoso
para a ‘Escola’, tem dali saído com suficiente instrução primária e
bastante aptidão para o trabalho, sendo efetivamente empregado por
instâncias do diretor.§ Supre ele, assim, a função dos patronatos, que

68
não temos devidamente organizados, e tão essenciais são, tanto para
menores como para adultos, quando egressos das Escolas de reforma e
das penitenciárias. . (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de
1929, Edição 10446-1, p. 4).

Sem dúvida, as questões apontadas por Evaristo, na


passagem acima, são por demais pertinentes para o processo de
recuperação do adolescente infrator. O problema é que, ao invés
de ser uma ação apenas pautada pela boa vontade do diretor,
deveria constituir-se numa política do próprio Estado. Mas no
mesmo estado que aprisionava e prendia, havia aqueles que
dificultavam o retorno à sociedade dos presos e internos que
cumpriam as determinações da justiça. Neste sentido, o jurista
pontuou criticamente a ação, por exemplo, da polícia que se
tornava um obstáculo à inserção do interno e do preso na vida
social dentro dos padrões legais. Para fundamentar sua crítica,
ele então recorreu a um exemplo de algo que ocorrera com um
“menor” da Escola João Luiz Alves:

Pois bem, acaba de chegar fidedignamente ao nosso conhecimento


um fato deveras lamentável, sob todos os aspectos. Foi o caso que,
prosseguindo na sua faina redentora, lograra o diretor da ‘Escola’
modesta colocação para um menor, cujo comportamento era penhor
seguro de reabilitação. Filho de boa família, havendo aprendido a ler,
escrever e contar naquele instituto, onde permanecera durante dois
anos, merecia o pupilo do Juízo de Menores a proteção que lhe fora
dispensada. Estava pronto para entrar em funções no Departamento
da Saúde Pública. Sucedeu, porém, que ali o encontrou um subalterno
policial e, logo, sem consciência da abominação de tal procedimento, o
apontou como suspeito, por haver sofrido condenação!§ Fracassaram
as diligencias da diretoria da ‘Escola...§ Simplesmente absurda essa
investida policial, destruidora de árdua e profícua reeducação. (Correio
da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

Mas não parou por aí. O jurista argumentou que o ocorrido


com o “menor” era algo que também acontecia com o adulto egresso:

69
Cumpre notar que o mesmo acontece, frequentemente, com alguns
adultos, cuja regeneração somente não se verifica pela pertinaz, estúpida
e, não raro, interesseira perseguição de maus auxiliares da Polícia.
Casos há que revoltam os espíritos mais calmos e mais acomodados às
iniquidades sociais. (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro
de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

Por fim, nosso nobre jurista concluiu a matéria apresentando


um breve balanço do quanto de negativo e problemático consistia
a visão preconceituosa de que o egresso, seja ele menor ou adulto,
é um ser humano irrecuperável:

Às vítimas da ojeriza de certos agentes não adianta buscar trabalho


honesto, dar repetidas demonstrações de arrependimentos, fugir às más
companhias, constituir famílias, etc. Repetem-se as prisões sem motivo
declarado, para averiguações; engrossam-se os prontuários; avolumam-
se as prevenções dos superiores informados tendenciosamente. E um
dia, quando, aflito, desesperado, sem outro recurso, o indivíduo se
deixa atrair, de novo, para o caminho do crime, engana-se a justiça
diante de carregadíssima folha de antecedentes, enxergando no
perseguido uma criatura totalmente incapaz de se reabilitar, sobre a
qual devem cair os rigores da repressão.§ De quem a culpa? . (Correio
da Manhã, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1929, Edição 10446-1, p. 4).

A questão apontada por Evaristo de Morais, ao final da


matéria, ainda é uma questão que carece de respostas até nos
dias de hoje. Os problemas abordados pelo jurista, no final da
República Velha, ainda atormentam nossas cabeças em função
dos exemplos que vemos no dia a dia: jovens que não apresentam
passagem nenhuma pela polícia são confundidos com bandidos
e, em vários casos, perdem a vida por isso, principalmente, se
forem negros.

70
Memórias de um egresso da
Escola João Luiz Alves
A memória é vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido,
ela está em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do
esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável
a todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de
repentinas revitalizações.
PIERRE NORA.

Quando exerci a função de Coordenador Adjunto do


Centro de Memória da FAETEC (CEMEF), nos anos de 2011 e
2012, realizei algumas entrevistas com egressos da FUNABEM,
para a constituição de um banco de dados em História Oral. Tais
entrevistas fazem parte do acervo deste Centro de Memória.
Dentre os entrevistados, havia um egresso da Escola João Luiz
Alves, ao qual chamaremos de J.S., que nos contou algumas de
suas lembranças no tempo em que esteve internado na referida
escola. Neste sentido, a referida entrevista foi transcrita por
estagiário do CEDOM, o que nos possibilitou incluir nesta
parte do texto algumas das experiências que J.S. vivenciou no
tempo em que era aluno da EJLA. Mesmo se tratando de época
distinta da que nos debruçamos até aqui, as memórias de J.S.
possibilitam-nos não só conhecer uma pouco sobre a época da
escola no tempo em esta fazia parte da FUNABEM, mas também
proceder algumas considerações comparativas entre as duas
épocas.
A entrevista ocorreu em 06 de dezembro de 2012, na sala do
CEMEF na FAETEC de Quintino. Filho de família pobre, J.S. foi
internado aos três anos de idade. Passou por várias instituições
,pois à medida que ia avançando na idade era transferido de
uma instituição para outra. No começo de sua trajetória, iniciada
em 1961, as unidades eram ligadas à SAM, posteriormente ao
término desta, todas ligadas à FUNABEM.
A primeira foi a “Casa Lar” onde ficou até os seis anos
aproximadamente. Depois, até os oito anos, foi para o “Lar Tereza
Cristina”, quando foi, então, transferido para a Escola João Luiz
Alves. Na Escola João Luiz Alves ele ficou internado, juntamente

71
com o irmão mais velho, segundo suas lembranças, até os 13
anos, tempo este confirmado através da cópia do seu prontuário
apresentado no momento da entrevista e que foi conseguido
por ele no Arquivo Nacional. Entre quatorze e quinze anos, ele
foi novamente transferido, desta vez, para uma escola agrícola
chamada “Rodolfo Fux”, localizava em “Sacra Família”, próximo
das cidades de Paracambi e Rodeios. Depois, aos dezesseis anos,
ele foi para o Instituto Getúlio Vargas que ele também chamou
de “Cidade dos Meninos”, em Caxias. Quando fez dezoito anos,
foi desligado da FUNABEM, passando a viver por conta própria.
A entrevista é muito extensa, assim, destacaremos alguns
aspectos, de modo a contribuir para que verifiquemos as lembranças
referentes, sobretudo, ao período em que esteve na Escola João
Luiz Alves. O primeiro fato que J.S. pontuou no que diz respeito a
uma característica comum às in stituições da FUNABEM em que
ele passou como interno, foi no tocante à disciplina:

Eu peguei uma disciplina muito dura, ainda mais depois que os


militares pegaram o poder, que aí virou um regime militar, tanto dentro
do quartel, quanto dentro da escola. Eram muitas, muitas formas,
dorme, dormir na hora certa, tudo assim tipo um quartel. Lá agente
levantava cedinho pra fazer educação física, e dormia cedo também.
(Acervo CEMEF/FAETEC)

O aspecto da “disciplina militar” foi algo que também


esteve presente no primeiro Regulamento da Escola, em 1926.
Quarenta anos depois, a proposta de incutir nos internos um tipo
de disciplina aos moldes militares permanecera, com o fato de
que, à época de J.S, como ele mesmo sinalizou em sua fala, isto
se reforçou ainda mais, sobretudo, porque os próprios militares
detinham o poder no Estado.
J.S nos contou que ele e aproximadamente quinze internos,
quando estavam no Lar Teresa Cristina, foram transferidos para
Escola João Luiz Alves. Ele tinha de sete para oito anos de idade.
Lembrou que muitos choraram, pois a assistente social tinha

72
dito que não seria uma mudança muito boa. Os garotos ficaram
confusos, pois outra pessoa dissera o contrário. O fato é que a
transferência ocorreu:

Aí, todo mundo chorando, não querendo ir, mas depois chegou uma
pessoa e disse que lá era muito bom, lá tem tudo, uma escola que vocês
vão ter tudo de rico, aí tudo bem, entramos no ônibus e fomos embora,
disse ele. (Acervo CEMEF/FAETEC).

De acordo com a memória de J.S., o grupo de meninos era


formado “por muitos negros, mas tinha brancos também”.

Perguntado a respeito das lembranças do momento da


transferência e da chegada à Escola João Luiz Alves, J.S. nos
contou sobre o que fizeram assim que chegaram à escola e nos
deu outras informações importantes, como o fato de poderem
sair aos finais de semana para ficar com a família:

Então o que aconteceu: aí nós pegamos o ônibus, chegamos lá, a primeira


coisa que fizeram quando nós chegamos lá foi dar um café com leite e
um pão com queijo, um doce e uma maçã. Aí, nós adoramos, e deu pra
sentir que era bem melhor que lá na Thereza Cristina, tá entendendo?
E aí, porque ali na Thereza Cristina, era uma Instituição que o governo
alugava tá entendendo? Isso quer dizer que eles alugaram. Quer dizer,
não era um lugar direto. Aí o que aconteceu? De lá a gente fomos para
a João Luiz Alves que era do governo, ficamos lá, aí tomamos café,
aquele negócio todo, aí depois fomos acostumando, tá entendendo? Aí
filas, escola, sala de aula, futebol, aquele negócio todo, então passei a
gostar lá da João Luiz Alves. E na João Luiz Alves tinha também esse
negócio de ir para casa. Minha mãe sempre vinha no final de semana,
quando tinha liberação pra ir pra casa, aí ela chegava lá, aí chamava a
gente, quando os pais chegavam, chamavam o aluno. Aí eu ia lá, dava
a benção a ela, o diretor dava uma liberação né pra a gente, e a gente ia.
(Acervo CEMEF/FAETEC).

73
O relato de J.S. destacou uma possível diferença entre
uma instituição privada, como a em que estava anteriormente,
e a instituição “do governo”, no caso a escola para a qual foi
transferido. Ele deixou evidente que a segunda era “bem melhor”
do que a primeira e que aos poucos foi se acostumando com a
rotina da escola. Nosso entrevistado também nos revelou que
podia sair aos finais de semana para ficar com familiares. Neste
sentido, é importante frisar a diferença entre a Escola João Luiz
Alves na época da sua fundação em 1926 e a da época em que
J.S. foi aluno. Como vimos, no decorrer deste texto, a Escola João
Luiz Alves foi criada para atender, especificamente, adolescentes
infratores julgados pelo Juiz de Menores. Sendo assim, não havia,
para os internos, o benefício de sair aos finais de semana para
ficar com a família. J.S. não era infrator, foi internado por ser
pobre, a iniciativa que partiu da própria família. Nesta época, a
escola não atendia infratores que, no caso, eram encaminhados
para o Instituto Padre Severino. J.S. tinha a possibilidade de sair
aos finais de semana pelo fato de ser um aluno interno e não um
infrator que recebera sentença da justiça.
Perguntado sobre o que aconteceria, se não voltasse para
a escola após o final de semana em que estivesse com a família,
J.S. relatou que “eles iam buscar a gente em casa”. Na sequência,
contou o tipo de punição que havia quando o interno descumpria
as ordens estabelecidas:

Tinha a punição assim, tinha castigo, não tinha solitária não, mas tinha
aquele castigo mão pra trás, ficava em pé, mão pra trás assim, sem se
mexer, ai o inspetor ficava sentado olhando, ai ficava uma hora, duas
horas, até quando saia fora do eixo, ficava de castigo. Ai eles formavam
um pelotão de castigo, ai aos poucos eles iam falando, fulano vai dormir,
sicrano, ai ia liberando aos poucos, tudo de acordo com o inspetor, ai
ia liberando até o último ir dormir. A gente acordava muito cedo, fazer
física isso, depois tomar banho, café, arrumar a cama, ai cada um ia
estudar, se estudasse de tarde ia pro trabalho, se estudava de manhã ia
pro trabalho de tarde, eu estudava sempre de tarde. (Acervo CEMEF/
FAETEC).

74
O procedimento de punir quem contrariasse as regras
era algo que se manteve presente na realidade vivida pelo
adolescente internado em várias épocas. O aspecto, por exemplo,
da “solitária” que J.S. nos disse não existir na época em fora
estudante da Escola João Luiz Alves, estava, inclusive, presente
no primeiro Regulamento da Escola. Aliás, este tem sido uns dos
principais problemas das instituições de deste tipo, que muitas
vezes exageram na dose punitiva, causando, algumas vezes,
situações irreparáveis para o interno que submetido a maus-
tratos.
J.S. nos contou também sobre as lembranças do seu processo
escolar. Mais uma vez associou o aprendizado na escola a uma
formação militar. O interessante também foi o fato de sinalizar,
ao mesmo tempo em que falava de como era o ensino, para o
aspecto de que havia na instituição psicólogos para cuidar da
“depressão” dos alunos:

Olha, eu estudava Matemática, Português, História, Moral e Cívica,


hierarquia de quartel, e você acabou crescendo como um soldado
assim, que era pra ser educado: sim senhor, não senhor, me dá licença,
senhor, senhora, tá entendendo? Quando tava em casa, beijava a mão
da minha vó, da minha mãe e assim você fica muito assim deprimido,
é, depressão, né? Porque cada vez que você vai entrando na vida, ela
vai mudando, né? Aí você vai fica assim deprimido, com depressão,
fica triste, com toda essa dificuldade familiar, então tinha muitos
psicólogos para orientar a gente, em toda a escola, e muitas festas.
Assim, eu ia ao cinema lá dentro pra gente vê. O Claudio Roberto
Clemente, ele era de lá também, então ele falou sobre a vida do Pelé, no
J. Silvestre, então, ele ganhou, nós até acompanhamos pela televisão na
época, aí ele perguntou ‘o que você quer ganhar? Eu quero botar um
playground lá na escola?’, aí botam o playground lá, lá no alto, assim
, aí botaram o playground, lá trás, perto do ginásio, naquela parte do
ginásio, e aí a gente jogava futebol, ficava brincando, e vendo aquelas
coisas de televisão. (Acervo CEMEF/FAETEC).

Na mesma passagem, o entrevistado destacou: o tipo


de educação que recebia, segundo ele, “crescendo como um
soldado”; a tristeza que causava depressão, possivelmente, em

75
função do fato de ter de lidar com a privação de liberdade e com
toda a “dificuldade familiar”; as atividades de desconcentração
como forma de compensar a lembrança triste que surgia na
memória. Em relação à imagem de tristeza que lhe veio à cabeça,
observamos que este aspecto também esteve presente nas
expressões utilizadas por alguns dos jornalistas que escreveram
sobre os alunos da Escola João Luiz Alves, na década de 1920.
Termos como “aqueles infelizes”, de “olhares sombrios”, por
exemplo, eram usados para qualificar os internos. O fato é que,
tanto na década de 1920, quanto na época de J.S., o público em
questão tinha pelo menos uma característica comum: tratavam-se
de crianças e adolescentes pobres, e, a maioria de negros. Quanto
a este aspecto racial, J.S. nos revelou que a temática também era
trabalhada de alguma forma na escola. Ele nos disse sobre uma
professora que ficava ensaiando com os alunos apresentações a
respeito da cultura afro-brasileira:

Na época de negro, época de Zumbi, eles ensinavam a gente uma dança,


não é isso, dança e música, aí depois no dia nós viemos se apresentar
aqui em Quintino, neste ginásio aqui, uma dança ligada ao Zumbi, tinha
uma música, tá entendendo, aí ficamos um mês treinando, ensaiando.
(Acervo CEMEF/FAETEC).

Em outra passagem, falou a respeito do aprendizado que se


destinava a prepará-lo para o trabalho:

Quando eu fiz 12 anos, passo a ser aluno aprendiz, eu fui para a cozinha.
Me chamaram pra ir para a cozinha, porque eu era um cara muito forte,
aí a garota falou: ‘- você vai ficar aqui, pra lavar panela, pra quando os
alunos vir com as bandejas sujas jogar fora e botar na água quente, e
botar pra lavar.’ Então a vida ali foi assim, trabalhar na cozinha mesmo.
(...) também pegava pessoas pra arrumar o pátio, o quintal, o pátio
geral, e eu fiquei fixo na cozinha, fiquei fixo até ser transferido. (Acervo
CEMEF/FAETEC).

76
Pelo que J.S nos contou, não havia propriamente um
aprendizado de ofício, mas sim o uso do trabalho dos internos em
atividades para manutenção da escola. Sendo assim, sua tarefa
foi “aprender” a lavar pratos, garfos, louças, panelas e todas as
atividades que permitissem colocar a cozinha em funcionamento.
Outros iam para a horta ou limpar o pátio e os demais espaços da
escola. Havia também quem ficava como “monitor”, ajudando os
inspetores, geralmente, os “mais velhos”. Ele lembrou, também,
que, quando era necessário “construir um pavilhão”, a garotada
ia ajudar o “mestre de pedreiro”. Quase cinquenta anos depois de
criada a EJLA, a lógica do chamado “ensino de ofício” mantinha
a característica de, na prática, usar o trabalho do interno para
suprir as necessidades da escola no que tange ao funcionamento
da sua rotina. Em outra passagem, ele voltou a falar da sua rotina
de trabalho na escola:

O sistema de trabalho era o seguinte: eu estudava de manhã, a gente


acordava e tal e ia pra cozinha, ai quando eu ia pra escola, ia pra sala de
aula, só que na hora do almoço, eu ia pra copa, ia ajudar lá. Aí ficava,
aí depois limpava o refeitório, jogava água, esse negócio todo, puxava,
puxava, passava o pano, aí ficava tudo intacto, pra depois à tarde
montar o café, né. Era o tanjal e o sanduíche que dava pra todo mundo,
aí a vida ia seguindo. (Acervo CEMEF/FAETEC).

Quando perguntado a respeito das suas lembranças em


relação a possíveis rebeliões ocorridas na época em que estivera
na Escola, J.S. fez uma análise do sistema de adaptação pelo qual
o aluno passava, sobretudo, se fosse internado desde criança,
como era o seu caso:

Não. Rebelião nunca teve, parece que eles faziam um negócio no sistema
que não tinha condições de fazer rebelião, tinha gente que ajudava,
como tinha lá, um pedreiro, parece que ele virou mendigo, todo mundo
levava comida pra ele lá, a gente passava mais a ajudar as pessoas,
tá entendendo, ajudar realmente, ai rebelião nunca teve não, ali não.
(...) engraçado eles faziam um sistema, que quando você está desde

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pequeno, né, você não sente, você vai levando, se a criança entre lá um
pouco maiorzinho, já entendendo, e vindo de rua, lá dentro ele vai ficar
uma pessoa revoltada, então, devido eu ter ido desde pequeno, bebê,
eu não sentia muito esse negócio assim de, eu saber agora, você abre
a internet, pá pá pá, FUNABEM, ai você sabe que alguns apanhavam,
essas coisas, poxa, nunca vi isso, engraçado, só se foi depois que eu saí,
que talvez foi ficando difícil, depois os militares largaram o poder né?
Ai de repente pode ter sido isso, que eu passei minha vida todinha na
escola no regime militar. (Acervo CEMEF/FAETEC).

A passagem acima é muito rica no sentido de apresentar


o quanto o processo de adaptação do interno à privação da
liberdade se diferencia quando este vem “desde pequeno”, como
no caso de J.S., daquele que é internado “pouco maiorzinho,
já entendendo, e vindo da rua”. O primeiro, “não sente” e
“vai levando”, o segundo, “lá dentro ele vai ficar uma pessoa
revoltada”. Isto porque enquanto um teve a vivência da liberdade
de forma limitada, pois a maior parte do tempo tinha de cumprir
as obrigações que lhe eram determinadas na escola, o outro, pelo
contrário, teve a liberdade interrompida e tinha de se adaptar,
quase sempre na “marra”, a uma rotina disciplinar alheia a sua
forma de vida.
Outro aspecto importante que a fala de J.S. permite refletir,
diz respeito à associação que ele faz entre não ter se lembrado
de rebelião ocorrida na escola e o fato de ter passado a “vida
todinha na escola no regime militar”. É possível supor que de
fato, num regime autoritário que cerceava e vigiava o livre
arbítrio do cidadão em toda parte (na casa, no trabalho, na rua
...), fosse muito mais difícil haver rebelião. Além disso, mesmo
ocorrendo, a conjuntura antidemocrática que existia na época
dificultava em muito a denúncia e a divulgação da mesma.
A respeito dos funcionários da EJLA, as lembranças do
nosso entrevistado foram as seguintes:

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Os funcionários, é aquele negócio, tinha uns caxias, e outros legais.
Com quem eu trabalhei foram todos legais, tanto na cozinha quanto
na padaria, e os inspetores, tinha um que não gostava de mim não, no
futebol a gente dava olé, esse negócio todo (...). Da João Luiz Alves tem
o seu Josias, que trabalhava sabe aonde? Lá no Saara. Seu Josias, não
sei se trabalha lá ainda, era segurança(...) Tinha o seu Artur que foi
diretor lá, já faleceu, tinha a Dra. Lúcia, que teve uma vez que eu estava
bagunçando lá, aí ela deu uma tapa assim em mim. Engraçado, quando
estavam distribuindo assim os presentes, ela é que me deu o presente,
acabou me dando um beijo aqui, aonde ela bateu, engraçado né. Tinha
uma que era, como era o nome daquela cantora? Era o nome daquela
cantora, Regina, era professora Regina. Engraçado naquela época ela
parecia todinha com a Elis Regina. (Acervo CEMEF/FAETEC).

O fato de se lembrar de vários nomes depois de ter passado


tanto anos, deixa a entender que alguns dos funcionários da EJLA
marcaram a vida de J.S. no tempo em que fora aluno interno. A
divisão que ele fez entre “uns caxias” e “outros legais”, nos remete
a pensar outra vez no aspecto disciplinar, pois, ao lembrar-se,
distinguiu em dois tipos, ou seja, aqueles que eram mais rígidos
no tocante aos procedimentos disciplinares da escola e os mais
flexíveis que, possivelmente, pressionavam menos os alunos.
Outro ponto importante do depoimento de J.S foi quando se
lembrou do seu número na EJLA, uma prática que não é comum
em nenhuma escola quando se estuda para além dos muros das
instituições para “menores”. Seja em escola pública ou particular,
com turmas grandes ou não, os estudantes são chamados pelos seus
respectivos nomes. Transformar a identificação de alguém num
número contribui, de certa forma, para despersonificar o indivíduo:

Lá na Sacra Família o alojamento era direto, aqui (na João Luiz Alves)
acho que era dividido (...) você entrava e tinha as camas, aí depois tinha
outro bloco, era aquela cama de altos e baixos, eram uns quinze (por
alojamento) (...). O banheiro era coletivo, o banheiro geralmente era
aquele de pastilha e cheio de chuveiro, água fria e a escova de dente.
Cada um tinha um painel lá e a gente atendia por número, se não
me engano na João Luiz Alves meu número era 135. (...) Quando era
evento, assim, externo, muita gente, assim, chamava pelo nome, mas

79
quando era, assim, interno, era por número, tá entendendo? Todo lugar
tinha número, na roupa, onde você botava sua pasta de dentes, nas
roupas, tá entendendo? Cama tinha número, até pra dar uma saída,
quando minha mãe me buscava tinha número, por nome, mais número.
(Acervo CEMEF/FAETEC).

Com treze para quatorze anos de idade J.S, foi transferido


da Escola João Luiz Alves para outra instituição da FUNABEM,
Rodolfo Fux, e aos dezesseis anos foi internado no Instituto
Getúlio Vargas, também da FUNABEM. Aos dezoito anos, foi
desligado da Fundação. Suas lembranças deste momento não
foram agradáveis, pois, segundo ele, “a Fundação te abandonou
porque não te arrumou emprego”. Ao procurar emprego, sofreu
também, do estigma de ter sido ex – aluno da FUNABEM, fato
que lhe criou dificuldades, pois as pessoas em geral associavam
tal situação à ideia de que a instituição era “lugar de bandido”.
Outra coisa que lhe veio à cabeça, quando relembrou do período
em que procurava emprego, foi a dificuldade que teve por ser
ex-aluno da FUNABEM e, ainda por cima, por ser negro, pois
o racismo existente na mente de algumas pessoas se constituía
em mais um obstáculo para exercer a vida como cidadão livre.
O exemplo que ele citou foi quando buscou ser contínuo na
DATAPREV: “como era lugar de pessoa com dinheiro, eu senti
que tinha muitas pessoas que eram racistas”, disse ele.
O último jornal analisado neste texto, escrito pelo grande
criminalista Evaristo de Morais em 1929, destacou o problema
que o egresso sofria para voltar a ter uma vida normal, depois
de ter cumprido as determinações judiciais. Ao final da matéria,
o jurista fez a seguinte pergunta: “de quem é a culpa?”. Nosso
entrevistado, mesmo não sendo um infrator, e, depois de passados
cinquenta anos da época em que escreveu o senhor Evaristo, nos
revelou situações que ainda persistem. Parece que a pergunta do
jurista ainda ecoa aos nossos ouvidos: de quem é a culpa?
A avaliação final de J.S. a respeito da história de vida que
passou como interno da FUNABEM talvez nos aponte uma pista:

80
É aquele negócio que eu falei pra você, quando você vem desde pequeno,
você vem num tempo assim que você não sente, a mesma coisa a criança
com o pai e a mãe vai crescendo ali, aí a mãe tem que falar ‘oh, teu pai
tá ali’, aí a criança vai se adaptando, tudo vai se adaptando dentro de
casa. Então, quando você vem desde bebê destes lugares, você vai se
adaptando; agora, quem chega depois, um pouco grande, fica assim
meio perdido, porque a pessoa não tem assim como, eu até achei legal,
não tenho nada assim para dizer, só que no final... E agora é que você
está vendo alguns furos, assim, eles eram pra ter feito isso, pra fazer
aquilo, eles eram pra te aproveitar melhor a sua saída da escola, é o que
eles não fizeram muito (...). Eu queria mais que o governo deixasse pra
gente certas coisas que ele esqueceu no passado (...). O governo poderia
olhar mais para os ex-alunos, porque o governo está ligando muito
pra esse tal de exilados, dando dinheiro pra eles, não sei o quê, mas a
gente, ex-aluno, nós ficamos na escola estudando, trabalhando, então
muitos não tiveram muita sorte assim. E outra, quando os ex-alunos,
muitos conseguiram, vir a ser funcionário, muitos conseguiram, mas
teve outros como eu, no meu caso, que não fiquei sabendo de nada,
agora estou vendo pelas leis que as pessoas eram funcionários pelos
decretos da época, e eu acho que o governo pode olhar melhor pelos ex-
alunos, os antigos principalmente, pra ver quem tá bem, quem não está,
encaixar aonde, no meu caso, no meu caso agora estou tentando esse
negócio de funcionalismo, porque você na época era um funcionário, a
gente não sabia, mas a gente era. (Acervo CEMEF/FAETEC).

Ele pode não conseguir o intento de tentar provar que foi,


na verdade, “funcionário” do estado, mas há de se considerar o
fato de que por mais de cinco anos ajudou a produzir pão para os
funcionários e todos os internos de duas instituições vinculadas
à FUNABEM e, por dois anos, ter trabalhado na cozinha da
Escola João Luiz Alves. Assim, não resta dúvida que de fato
trabalhou para o Estado. Tal qual aqueles que estudaram na
EJLA na década de 1920, o nosso J.S. também ajudou a manter,
com sua força de trabalho, a rotina da escola. Não foi apenas um
estudante, foi trabalhador também.

81
Considerações Finais

Figura 6 – Foto da arte que se encontra na parede do Colégio


Estadual Candeia. Este colégio está localizado na EJLA
Fonte: Acervo CEDOM

A Escola João Luiz Alves, quando foi fundada em 1926,


surgiu para cumprir uma tarefa bastante árdua: ser a primeira
instituição escolar criada exclusivamente para adolescentes
infratores no, até então, Distrito Federal, localizado na Cidade
do Rio de Janeiro. Lugar que enfrentava na época grandes
problemas urbanos, dentre os quais o problema da delinquência
juvenil, que, aliás, ainda é um problema bastante preocupante
na atualidade, não só no Rio de Janeiro, mas também em outras
capitais dos estados do Brasil.
A dimensão mais dramática deste problema é o crescente
processo de encarceramento e genocídio da juventude negra
brasileira, que, historicamente, foi e ainda é o grupo da sociedade
mais vulnerável a esta situação, pois, por fatores históricos e
estruturais de nossa sociedade, a camada mais pobre, onde se
encontra a maior parte do povo negro brasileiro, ainda carece
de políticas públicas que consigam, efetivamente, equilibrar
a balança da desigualdade social e racial do país. Apesar dos
esforços de alguns governos atuais, o Brasil ainda é um dos
países mais desiguais no mundo.

82
Neste texto, procurou-se tratar de alguns aspectos da
história do atendimento à infância pobre e abandonada no Brasil,
de modo a situar este processo que, desde os tempos coloniais,
passando pelo Império e a chamada República Velha (época
em que a EJLA surgiu), deu forma às políticas públicas para a
infância. Neste sentido, buscou-se também tratar do impacto que
a Lei de Ventre Livre exerceu sobre as respectivas políticas.
Vários atores sociais fizeram parte deste processo.
Instituições religiosas, instituições da sociedade civil, instituições
criadas pelo Estado, religiosos, médicos, juristas, psicólogos,
sociólogos, profissionais do serviço social e educadores foram
protagonistas na tentativa de encontrar soluções que muitas
vezes esbarravam na falta de vontade política dos governantes
de priorizarem esta demanda social.
Durante a República Velha propriamente dita, contexto em
que surgiu a Escola João Luiz Alves, o Estado foi cada vez mais
buscando institucionalizar a chamada “infância desvalida”. Só
para citar alguns exemplos, no Rio de Janeiro, além da Escola
João Luiz Alves, já haviam criado a Escola XV de Novembro e o
Abrigo de Menores, que depois se transformou em Instituto Sete
de Setembro. Instituições que careciam de recursos financeiros
para dar conta dos seus objetivos e que sofriam com um problema
cada vez mais frequente: a superlotação.
Neste cenário um tanto quanto sombrio, buscou-se destacar
o modelo de organização da Escola XV de Novembro que foi
uma espécie de “instituição-mãe” do que veio a ser depois a
Escola João Luiz Alves. A diferença básica entre as duas foi o fato
de a segunda ter surgido para atender a um público específico:
“os menores delinquentes” que fossem julgados pelo Juizado de
Menores.
A partir da análise do seu primeiro Regulamento, procurou-
se investigar como a Escola João Luiz Alves foi concebida em
termos de objetivos e funcionamento, destacando-se os aspectos
mais característicos da sua proposta pedagógica.

83
Para entender de modo a criação da EJLA repercutiu na
imprensa da época, foram feitas, com base no banco de dados da
Hemeroteca da Biblioteca Nacional, análises de algumas matérias
jornalísticas, dentre as muitas divulgadas pela imprensa do
período, tomando-se como critério notícias que citassem o nome
da EJLA. Sendo assim, vários assuntos e temas apareceram,
alguns como denúncias de problemas que ocorreram na Escola,
outros com reflexões sobre o problema da delinquência juvenil e
de demais instituições correlatas.
Considerando importante o registro da memória de um
ex-interno da Escola João Luiz Alves, mesmo que a internação
tenha ocorrida em época diferente daquela que o texto trata,
foram analisadas e descritas as lembranças de J. S., de modo
a demonstrar, a partir da fonte oral, o processo de vida deste
egresso da Escola. A entrevista de J.S. revelou passagens
importantes que ajudam a compreender a dimensão, às vezes
desprezada, da vivência e experiência das pessoas.
Espera-se, assim, com o referido texto, ter contribuído para
trazer a público alguns aspectos dos primeiros tempos da Escola
João Luiz Alves, escola que se mantém até hoje com o mesmo
nome, que tem na verdade uma longa história nestes seus oitenta
e oito anos e que foi o lugar em que entrei pela primeira vez para
exercer minha função de professor de História no DEGASE.

84
Referências Bibliográficas

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e eugenia: exploração do trabalho e violência à infância
desamparada no Brasil (1930-1945). Campinas: UNICAMP, 2011
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1903 (Primeiro Regulamento da Escola Correcional XV de
Novembro);

- DECRETO FEDERAL 8.203 de 8 de setembro de 1910


(Regulamento da Escola Premonitória XV de Novembro);

- DECRETO 16.272 de 20 de dezembro de 1923 (Regulamento


de Proteção e Assistência aos Menores Abandonados e
Delinquentes);

85
- DECRETO 17.172 de 30 de dezembro de 1925 (denominação
da Escola de Reforma em “Escola João Luiz Alves”);

- DECRETO 4.983A de 30 de dezembro de 1925 (Estabelece o


local de instalação da Escola de Reforma na Ilha do Governador/
Antiga Colônia de Alienados);

- DECRETO 17.508 de 04 de novembro de 1926 (Primeiro


Regulamento da Escola João Luiz Alves);

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- A Noite (11.11.1926);
- A Rua (07.04.1927 e 11.04.1927);
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- Gazeta de Notícias (09.02.1926, 09.09.1926, 02.01.1927,
05.03.1927, 25.03.1927, 31.03.1927, 04.08.1927,
28.03.1928, 16.11.1928);
- Jornal do Brasil (12.11.1926 e 30.12.1927);
- O Imparcial (03.03.1927 e 27.12.1928);
- O Paiz (18.05.1926, 21.05.1926, 15.06.1927, 07.12.1929,
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Organizadores: Luiz Cavalieri Bazílio, Maria de Lourdes Sá
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com.br/2009 );

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(Cria o Departamento Geral de Ação Socioeducativa);

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‘menor’ na prática jurídica”. In: RIZZINI, Irene. A criança no
Brasil hoje: desafio para o terceiro milênio. Rio de Janeiro: Ed.
Universitária Santa Úrsula, 1993.

89
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internação de menores delinquentes.”. In: Para além das grades:
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organizadora: Maria Helena Zamora. Rio de Janeiro: Ed. PUC-
Rio; São Paulo: Loyola, 2005;

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revendo as fontes produzidas entre os séculos XIX e XX”.
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(Dissertação de Mestrado);

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cientistas, instituições e questão racial no Brasil. São Paulo:
Companhia das Letras, 1993;

VEIGA, Cynthia Greive. História da Educação. São Paulo:


Ática, 2007.

90
Anexos

I - PESQUISA DE PERÍODICOS DIGITALIZADOS NA


BIBLIOTECA NACIONAL
Palavra-chave: Escola João Luiz Alves
Década: 1920-1929
Notícias de crimes, prisões e questões sociais.

JORNAL MANCHETE NOTÍCIA/RESUMO


A Manhã, 23/09/1927 Sim & Não: Liberdade de Coluna do Jornal feita,
Opinião de caráter liberal, para a
colaboração de leitores.
Consta um artigo sobre
menores vagabundos na
cidade
A Noite, 23/03/29 Carlos Nobrega Falleceu o inspetor geral
Guimarães de Almeida da Escola de Reforma
Jornal do Brasil, 12/11/26 A Escola de Reformas dos Interview com o juiz de
Menores Delinquentes menores Dr. Mello Mattos
Jornal do Brasil, 26/03/27 Associação Brasileira de Sobre uma carta da JLA
Imprensa enviada a imprensa para
que retificassem a infor-
mação sobre a fuga de um
menor, que, na verdade,
encontrava-se preso
Jornal do Brasil, 30/12/27 Progressos de uma Sobre as melhorias na
repartição jurisdição e assistência aos
menores; sobre o Código
de Menores e a necessida-
de de mais obras
Jornal do Brasil, 28/11/28 In Memoriam Ministro João Luiz Alves.
A solemne cerimonia da
inauguração do mausoléo
do Dr. JLA
Diário Carioca, 24/03/29 Fallecimento Em sua residencia, a rua
Dias da Cruz, faleceu,
hontem, ás 13 horas,
o sr Carlos Nobrega
Guimaraes de Almeida,
inspetor geral da EJLA

91
Diário Carioca, 26/10/28 Homicidio involuntário O infrator foi condenado
por atropelamento de a um ano de internação
automóvel praticado por na EJLA
um menor
Diário Carioca, 28/12/29 Menores Delinquentes O artigo explica o sentido
postos em liberdade da internação e dos
cuidados que devem ser
observados na medida da
liberdade vigiada
Diário Carioca, 27/12/28 A proposito do ensino Artigo levantando as
technico profissional vantagens e os proble-
mas enfrentados para a
implantação das medidas
socioeducativas
O Imparcial, 01/05/27 Visitas officiaes Visita de ministros e do
juiz de menores a JLA,
e relatam que os alunos
estão satisfeitos com o
regime disciplinar e a
alimentação.
O Imparcial, 03/08/27 Na Escola João Luiz Alves “Ao ministro do Interior,
o seu colega da Viação
comunicou que autorizará
a colocação e telefone na
Escola João Luiz Alves,
se o ministério de que S.
Ex. é o titular fornecer o
material necessario [...]
O Paiz, 02/06/27 Reclamações Reclamações quanto a
falta de estrutura (telefo-
ne) na EJLA
O Paiz, 31/08/28 Escola João Luiz Alves Visita do ministro da
justiça a EJLA
O Paiz, 28/11/28 Ministro João Luiz Alves Sobre quem irá compare-
cer a cerimônia da inau-
guração do mausoléu.
O Paiz, 29/11/28 A inauguração, hoje, do “Realiza-se hoje, ás 10 ho-
mausoléo ao ministro João ras, no cemiterio de São
Luiz Alves João Baptista, a inaugura-
ção do mausoléo manda-
do erigir pelos Estados do
RJ, RS, MG, AM, BA e ES,
a memoria do Dr. João
Luiz Alves”

92
O Paiz, 28/12/29 Menores Delinquentes Sobre a função da interna-
postos em liberdade ção e uma explicação so-
privada bre o que seria a liberdade
privada
Correio da Manhã, Verba dos Reptis Os menores internos con-
14/04/27 seguiram fazer chegar a
imprensa suas queixas
Correio da Manhã, sem A Febre Amarella Entrevista com um
data médico sobre a epide-
mia de febre na Ilha do
Governador
Correio da Manhã, Homicidio Involuntario Notícias sobre o acidente
26/10/28 por Automovel, praticado no ano anterior onde um
por um menor menor de 15 anos, diri-
gindo, matou um menor
de 9 anos. O infrator foi
punido tendo que perma-
necer internado um ano
na EJLA, mas entrou com
recurso e cumpriu a pena
em liberdade vigiada.
Correio da Manhã, A Reeducação de Menores Sobre a atenção da Justiça
23/01/29 Delinquentes e uma “gaf- em acolher da melhor for-
fe” policial ma possível os menores
infratores. Elogios acerca
do trabalho executado na
EJLA.
Crítica, 01/12/29; Rocca Será Inocente? Reportagem de cobertura
03/12/29; 07/12/29; do caso Rocca
13/12/29; XX/12/29
Crítica, 05/04/1930 O Pacto da Morte Notícia sobre um crime de
vingança que acabou com
o infrator sendo encami-
nhado para EJLA
Crítica, 08/04/30 O Sinistro Achado da Sobre o misterioso crime
Ponta da Mãe Maria ocorrido na Ilha e as
Revella Um Assassinato dificuldades de comuni-
cação e falhas estruturais
da EJLA
Gazeta de Notícias, O sr. Ministro da Justiça Visita do ministro a futura
09/02/26 na E. de Reforma EJLA

93
Gazeta de Notícias, Escola João Luiz Alves: A O ministro da Justiça de-
18/05/26 Sua Instalação termina que seja entregue
o edifício para a instalação
da EJLA
Gazeta de Notícias, Assistencia aos Menores Sobre a visita do diretor
21/05/26 da escola 15 de Novembro
ao espaço em que será
instalada a EJLA
Gazeta de Notícias, A Escola de Menores Sobre a visita do ministro
02/09/26 Delinquentes da Justiça às obras da
EJLA
Gazeta de Notícias, Os menores delinquentes Sobre as festas ocorridas
02/01/27 da EJLA e as festas de na EJLA
Ano Novo
Gazeta de Notícias, O Natal dos menores Sobre as festas ocorridas
04/01/27 delinquentes na EJLA
Gazeta de Notícias, O Escandalo da Escola As verdadeiras causas
05/03/27 João Luiz Alves do inquérito no Juizo
de Menores – Novos
Esclarecimentos – A pas-
sagem do Dr. Mario Dias
pela polícia
Gazeta de Notícias, A Escola João Luiz Alves, “Está provado que a
25/03/27 novamente em foco anarchia daquelle estabe-
lecimento não pôde ser
attribuida ao seu diretor
effectivo que se acha afas-
tado do cargo”
Gazeta de Notícias, A Escola João Luiz Alves “É espantoso o que se está
27/03/27 passando em torno da
premeditada demissão do
seu diretor effectivo. Dr.
Mario Dias.”
Gazeta de Notícias, A Escola João Luiz Alves “Um ex-caixeiro viajante,
31/03/27 amigo intimo do minis-
tro Vianna de Castello,
pratica violências contra o
diretor effectivo daquelle
estabelecimento – Praças
de polícia impedem a en-
trada do Dr. Mário dias,
no edifício da Escola!”

94
Gazeta de Notícias, A Escola João Luiz Alves “Continuam as graves ir-
08/04/27 regularidades verificadas
naquelle estabelecimento
de ensino – O inquerito
administrativo do Juizo
de Menores.”
Gazeta de Notícias, A Escola João Luiz Alves Visita e impressões do
28/03/28 ministro da justiça à EJLA
Gazeta de Notícias, Uma palestra do Dr.
16/11/28 Evaristo de Moraes na
EJLA
Gazeta de Notícias, Homicidio Involuntario Noticia do mesmo caso
26/11/28 por atropelamento de presente em “Correio da
automovel praticado por Manhã, 26/10/28”
um menor
A Esquerda, 01/02/28 Para que server o criterio “Mais um automovel para
do duodecimo? Os gastos o diretor da ‘Escola João
continuam a ser feitos do Luiz Alves’”
mesmo modo...
A Rua, 07/04/27 Os menores delinquentes Relata que o diretor Mario
estão soffrendo os hor- dias foi afastado supos-
rores da fome. Enquanto tamente por espancar
que os dirigentes da EJLA menores. Seu substituto é
vivem a tripa fôrra acusado de deixar funcio-
nários e detentos passan-
do fome.
A Rua, 11/04/27 Como se confirma uma Matéria que transcreve
denuncia de “A Rua”: uma carta dos detentos
como os meninos da EJLA confirmando as acusações
chegam a baptizal-a com dos maus tratos dados aos
o nome de Cievelandia! menores na EJLA
O Malho, 12/05/28 Como está organizada Matéria mostrando as
nossa Policia Militar obrigações da Policia
Militar, entre elas, a as-
sistência À EJLA e outros
prédios públicos

95
II - PESQUISA DE PERÍODICOS DIGITALIZADOS NA
BIBLIOTECA NACIONAL
Palavra-chave: Escola João Luiz Alves
Década: 1920-1929
Notícias institucionais e burocráticas.
JORNAL MANCHETE NOTÍCIA/RESUMO
A Manhã, 1925, 1928, Decretos Assinados Designação de
14/09/28, 07/03/28, funcionários,
24/03/28, 06/04/29, transferências, demissões,
25/07/29 nomeações, etc.
A Manhã, 1925 O Regulamento da Escola
J. L. Alves
A Manhã, 30/11/26 Os menores Delinquentes Foram transferidos da
Detenção para os novos
estabelecimentos penaes
A Manhã, 16/08/1927 Informações Dia 23 – Escriptorio de
Commerciaes/ Obras do Ministerio
Concorrencias da Justiça e Negocios
Annunciadas Interiores para obras e
concertos na EJLA, na Ilha
do Governador
A Manhã, 05/03/1927, Pagamentos do Thesouro Anúncio de folhas de
07/03/28 07/11/28, pagamentos
07/12/28, 04/07/29
A Manhã, 01/11/1928 Actos do Ministro da Designação de inspetor
Justiça geral, interino, por conta
das férias do funcionário
efetivo; além de outras
licenças concedidas a
outros funcionários
A Manhã, 17/09/29 Polícia Militar por dentro Matéria sobre os
e por fora problemas enfrentados
no interior da polícia.
Menciona o contingente
policial a serviço da EJLA

96
A Manhã, 29/05/29 Mais uma conferência do O dr. Luiz Paixão,
Dr. Luiz Paixão realisou mais uma
conferencia sobre a
fabre amarela, na Ilha
do Governador. Essa
ultima palestra, teve logar
na EJLA, tendo a ella
comparecido consideravel
assistência, inclusive
alumnos e professores
A noite,04/03/27, Pagamentos Pagamentos de folha de
06/08/25, 06/03/28, funcionários
06/11/28, 06/12/28,
04/07/29, 03/07/29,
03/09/29, 05/12/29
A Noite, 11/11/26 Foi hoje inaugurada, na Sobre a inauguração e as
Ilha do Governador, a modificações estruturais
EJLA para receber a nova
instituição
A Noite, 09/05/29, Nomeações Designações, nomeações,
09/07/29, 24/07/29, e exonerações, no M. da
19/03/29, 05/04/29, Justiça
Jornal do Brasil, Decretos Assinados Nomeações, designações...
05/11/26; 06/11/26;
04/12/28; 10/05/29
Jornal do Brasil, 07/06/27 Pagamentos Pagamento de folha de
funcionários
Jornal do Brasil, Concorrências Dia 23 – Escriptorio de
17/08/27; 19/08/27; Obras do Ministerio
20/08/27; 23/08/27 da Justiça e Negocios
Interiores para obras e
consertos na escola João
Luiz Alves, na Ilha do
Governador
Jornal do Brasil, Concorrências Dia 2 – Escola João
27/03/28 Luiz Alves, para o
fornecimento de diversos
artigos
Diário Carioca, 07/11/28; Pagamento Pagamento da folha de
07/12/28; 05/02/29/ funcionários
Diário Carioca, Decretos assinados Licenças, nomeações,
12/09/28; 14/09/28; exonerações...
17/01/29; 01/03/29;
09/03/29; 03/08/29;
04/10/29; 23/01/29;
25/07/29;

97
Diário Carioca, 29/03/29 O novo inspetor da Escola “Por portaria de hontem,
João Luiz Alves do ministro da justiça, foi
nomeado Roberto Pires
de Lima para exercer,
interinamente, o cargo de
inspetor geral da Escola
de Reforma João Luiz
Alves”
O Imparcial, 03/03/27 Inquerito na “Escola João Foi afastado da direção o
Luiz Alves” Dr. Mario Dias
O Imparcial, 04/11/26; Decretos assinados Licenças, nomeações,
17/06/27; 23/09/27; exonerações
09/03/29; 04/12/28;
23/01/29
O Imparcial, 07/10/27; Pagamento Pagamento de folha de
05/01/28 funcionários
O Imparcial, 12/11/26 Um estabelecimento “Foi, hontem, inaugurada,
destinado á regeneração na Ilha do Governador, a
dos menores delinquentes Escola de Reforma João
Luiz Alves”
O Paiz, 31/12/25; Decretos assinados Nomeações, exonerações,
03/03/27; 06/04/27; licenças...
11/05/27; 28/05/27;
12/06/27; 11/07/27;
22/07/27; 07/03/28;
24/03/28; 23/07/28;
28/07/28; 29/07/28;
17/09/28 20/04/29;
09/08/28; 04/10/28;
09/11/28; 19/11/28;
04/12/28; 24/04/29;
17/07/29; 04/10/29;
22/12/29
O Paiz, 06/06/27; Pagamentos Pagamentos da folha de
07/08/27; 07/05/28; funcionários
07/07/28; 06/10/28;
07/11/28; 04/04/29;
04/07/29; 04/08/29;
04/09/29; 06/10/29
06/12/29
O Paiz, 17/05/26 Escola João Luiz Alves Sobre a entrega do
edifício XV de Novembro
para EJLA e sobre a
transformação para
receber a nova escola

98
O Paiz, 08/02/26 Ministério da Justiça Sobre a visita do ministro
ao local do futuro local a
ser instalada a EJLA
O paiz, 20/05/26 Escola João Luiz Alves Diretor da escola XV
de Novembro irá tomar
posse da propriedade que
virá a ser a EJLA

O Paiz, 21/05/26 Escola João Luiz Alves Sobre a confirmação da


criação da EJLA
O Paiz, 31/07/26 Escola João Luiz Alves Pedido de informações do
Ministro quanto a verba
para a EJLA
O Paiz, 25/08/26 Para ocorrer a despeza Sobre a confirmação da
com as obras da EJLA verba para a oba
O Paiz, 06/11/26 Echos & Fatos “O Dr. Mario Dias
esteve hontem, á tarde,
no palacio do Catete,
onde foi agradecer ao Sr.
Presidente da Republica
e a sua nomeação para o
cargo de diretor da Escola
João Luiz Alves
O Paiz, 07/05/27; Escola João Luiz Alves Visita do ministro a
15/06/27 EJLA para inspecionar as
dependências da escola
O Paiz, 07/12/29 O Sr. Ministro da justiça Sobre a capacidade do
visitou o Instituto 7 de Instituto 7 de setembro e
setembro as transferências para a
EJLA
Correio da Manhã, Decretos assinados Nomeações, licenças,
31/12/25, 05/11/26, exonerações...
31/12/25, 06/11/26,
22/7/27; 24/07/27;
23/09/27; 24/11/27,
27/04/27, 23/09/27;
22/07/27; 07/07/28;
14/09/28; 01/11/28;
04/09/28; 04/12/28;
14/09/28; 20/05/28;
24/07/28; 29/08/28;
18/09/28;

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Correio da Manhã, A escola de reforma de
11/11/26 menores delinquentes
será inaugurada hoje
Correio da Manhã, Concorrências Dia 23 – Escriptorio de
12/08/27; 13/08/27; Anunciadas Obras do MInisterio
23/02/28 da Justiça e Negocios
Interiores, para obras e
concertos na EJLA
Correio da Manhã, Pagamentos Pagamento da folha de
05/03/27; 07/04/27; funcionários
07/09/27; 07/07/27;
07/08/27; 07/12/27;
07/02/28; 08/05/28;
06/07/28; 07/09/28;
06/10/28
Correio da Manhã, Escola João Luiz Alves Suspensão do Expediente
19/08/28 e nomeação de uma
comissão para prestar
homenagem no grande
“az” Italiano Carlo Del
Preto
Crítica, 05/02/29; Pagamentos Pagamento da folha de
05/03/29; 03/06/29; funcionários
Gazeta de Notícias, Decretos Assinados Nomeações, licenças,
31/12/25; 14/11/26; exonerações, etc...
31/12/26; 12/02/27/;
27/04/27; 11/05/27;
07/03/28; 17/06/27;
27/10/27; 17/03/28;
06/04/28; 20/05/28;
29/08/28; 04/09/28;
14/09/28; 04/10/28;
17/01/29; 23/01/29;
14/02/29; 19/03/29;
06/04/29; 17/07/29;
25/07/29; 20/10/29;
22/12/29
Gazeta de Notícias, Pagamentos Pagamento da folha de
07/05/27; 07/10/27; funcionários
08/11/27; 05/01/28;
06/07/28; 06/11/28;
07/12/28

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Gazeta de Notícias, A EJLA tem novo diretor “[...] designou o inspetor
01/11/28 interino geral interino da
EJLA Carlos Nobrega
Guimarães de Almeida
para substituir o diretor
interino, da mesma escola,
Luis Nogueira da Gama,
a quem foram concedidos
15 dias de férias, de
acordo com a lei.”
Gazeta de Notícias, Fallecimentos Faleceu o inspetor geral
24/03/29 da EJLA, Nobrega
Guimarães de Almeida
A Esquerda, 07/02/28; Pagamentos Pagamento da folha de
07/03/28 funcionários
A Esquerda, 09/08/28 Decretos Assinados Nomeação de funcionário
O Pharol, 04/01/26 À memoria do Dr. João “Rio – O governo
Luiz Alves resolveu dar a secção de
reforma da Escola 15 de
Novembro o nome de
Escola João Luiz Alves em
homenagem a memoria
do saudoso ministro, que
tão bons serviços prestou
ao paiz.”
A Rua, 23/08/27 Concorrencias “Dia 23 – Escriptorio
annunciadas de Obras do Ministerio
da Justiça e negócios
interiores para obras e
concertos na EJLA.

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