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https://doi.org/10.

1590/S1413-24782020250049

ARTIGO
Sexualidades no contexto escolar:
violência ética e disputas por reconhecimento

Marco Antônio TorresI


Izabella Marina Martinho SaraivaI
Rubens Modesto GonzagaI

RESUMO
Este texto apresenta uma pesquisa que investigou a produção da violência ética
e do reconhecimento das sexualidades em contextos escolares. Entendemos que
a radicalização da teoria do reconhecimento, por Judith Butler, tem possibilitado
análises importantes sobre os vínculos entre política e moral. Uma das facetas da
violência ética caracteriza-se pela obliteração do relato de si, do silenciamento das
lutas e dos sofrimentos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, intersexuais
e mais (LGBTI+). Para nossas análises, promovemos grupos focais e uma entrevista
narrativa com docentes da educação básica de escolas públicas. A pesquisa é fruto
do trabalho de um conjunto de pesquisadores/as que nos últimos quatro anos, em
um curso de mestrado, se envolveram com o tema das sexualidades nos contextos
escolares. Nossas análises apontam tanto para a produção de vidas insuportáveis
como para a constituição de resistências que buscam pela possibilidade de vidas
habitáveis, porém numa ambiência marcada por discursos contrários às sexualidades.
PALAVRAS-CHAVE
sexualidades; escola; violência ética; reconhecimento; LGBTfobia.

I
Universidade Federal de Ouro Preto, Mariana, MG, Brasil.

Revista Brasileira de Educação   v. 25  e250049  2020 1


Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

SEXUALITY IN THE SCHOOL CONTEXT: ETHICAL


VIOLENCE AND DISPUTES FOR RECOGNITION
ABSTRACT
This paper presents a research that investigated the production of ethical
violence and the recognition of sexualities in school contexts. We unders-
tand that Judith Butler’s radicalization of the theory of recognition has
provided important insights on the links between politics and morals.
One of the facets of ethical violence is characterized by the obliteration
of self-reporting, the silencing of lesbians, gays, bisexuals, transgenders,
intersexes, and more (LGBTI+) struggles and sufferings. For our analysis,
focus groups and a narrative interview with teachers of basic education
of public schools were promoted. The research is the result of the work of
a group of researchers who, in the last 4 years, in a master’s degree cour-
se, have been involved with the theme of sexualities in school contexts.
Our analyzes point to both the production of unbearable lives and the
constitution of resistances that seek the possibility of livable lives, but in
an environment marked by discourses contrary to sexualities.
KEYWORDS
sexualities; school; ethical violence; recognizing; LGBTphobia.

SEXUALIDAD EN EL CONTEXTO ESCOLAR: VIOLENCIA


ÉTICA Y DISPUTAS POR RECONOCIMIENTO
RESUMEN
Este artículo presenta una investigación que investigó la producción de
violencia ética y el reconocimiento de las sexualidades en contextos esco-
lares. Entendemos que la radicalización de la teoría del reconocimiento
por parte de Judith Butler ha proporcionado importantes conocimientos
sobre los vínculos entre política y moral. Una de las facetas de la violencia
ética es la eliminación de la autoinforme, el silenciamiento de las luchas
y sufrimientos de lesbianas, gais, bisexuales, transgéneros, intersexuales y
más (LGBTI+). Para nuestro análisis promovimos grupos focales y una
entrevista narrativa con maestros de educación básica de escuelas públicas.
La investigación es el resultado del trabajo de un grupo de investigadores
que en los últimos 4 años, en un curso de maestría, se han involucrado
con el tema de las sexualidades en contextos escolares. Nuestros análisis
apuntan tanto a la producción de vidas insoportables como a la constitución
de resistencias que buscan la posibilidad de vidas habitables, pero en un
ambiente marcado por discursos contrarios a las sexualidades.
PALABRAS CLAVE
sexualidades; escuela; violencia ética; reconocimiento; LGBTfobia.

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Sexualidades no contexto escolar

INTRODUÇÃO
O presente artigo apresenta uma pesquisa que investigou a produção da
violência ética e do reconhecimento das sexualidades nos contextos escolares.
Aqui utilizamos a noção de sexualidades para pensar na afirmação das identidades e
das não identidades que se apresentam na contemporaneidade, algo que se aproxima
do acrônimo LGBTI+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais
e o sinal de + indicando uma abertura a outras performatividades de gênero)1, sem
abrirmos mão dos desdobramentos da sigla no cotidiano escolar e nas políticas
públicas. Acreditamos que a noção LGBTfobia é uma derivação do acrônimo, bem
como transfobia e lesbofobia, sendo ambas irredutíveis uma à outra e tendo seus usos
orientados por estratégias políticas e metodológicas. Ainda assim, ressaltamos que
o uso menos rigoroso dessas noções, por nós, indica a necessária atenção a termos
êmicos negociados no contexto atual, pois opções teórico-metodológicas podem
dizer de posições políticas presentes em nossas vidas. A identidade dos sujeitos como
afirmação possível de si, a partir e além dos processos identitários, se torna inteligível
com a compreensão do gênero como um ato performático. Esse ato fala do modo
como as formas de existência se aproximam da norma de gênero (Butler, 2003).
O regime de performatividade trazido por Judith Butler refere-se à reiteração
da matriz heterossexual e a suas falhas no ato de repetição, o que possibilita outras
formas de performatividade (Butler, 2003) que nem sempre desfrutam inteligibi-
lidade moral e política por contestarem e/ou transformarem a norma, ainda que
isso não se faça livre das amarras normativas do gênero e das sexualidades (Butler,
2015). Butler elaborou essa análise utilizando de maneira intensa a obra de Michel
Foucault. Assim, ela entende que a adesão ou contestação de uma performativida-
de heterossexual pelos sujeitos sempre ocorrerá em dado regime de verdade, este
considerado haja vista a obra foucaultiana (Foucault, 2018a). Logo, as siglas e suas
transformações são marcadores históricos que indicam os processos de produção
de diferenças e diferenciações da des/articulação de sujeitos políticos (Brah, 2006).
Pelo ato de nomeação que fazem na arena pública, siglas como LGBTI+ têm con-
seguido, muitas vezes, produzir inteligibilidade política na cena pública, bem como
formas de reconhecimento.
As noções de violência ética e de reconhecimento foram escolhidas por le-
varmos em conta que elas possuem grande potência na análise de disputas morais
e políticas, como julgamos ser a questão das sexualidades nos contextos escolares.
Butler (2015) analisa as noções de violência ética, reconhecimento e esperança
para pensar os limites/as possibilidades do sujeito em relatar a si mesmo diante das
interpelações que sofre. Tal reconhecimento pode acontecer em três momentos, que
se entrecruzam: diante do coletivo, diante do outro e diante de si mesmo. Moral e
política constituem ambiência para a produção do silenciamento ou reconhecimen-

1 O uso do acrônimo LGBTI+ foi escolhido seguindo a orientação do Manual de


Comunicação LGBTI+, produzido pela Aliança Nacional LGBTI e GayLatino,
entidades que possuem articulações importantes com o movimento LGBTI+ em nosso
contexto de pesquisa (Reis, 2018).

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to de LGBTI+, tendo entre uns e outros zonas cinzentas que dizem de ruídos ou
indícios de vozes possíveis.
Uma das facetas da violência ética caracteriza-se pela obliteração do relato
de si, da emergência do reconhecimento daqueles/as que sofrem interpelações e
ataques com base em sua contestação da norma de gênero, ou seja, no dimorfis-
mo sexual, no privilégio do homem e na heterossexualidade compulsória (Butler,
2003). Essa violência surge sempre que um jovem gay é impedido de narrar seu
sofrimento, seja na sua escola, seja em outro lugar. O impedimento dá-se pelo
desprezo do coletivo, pelas ameaças do outro, pelas coações emocionais do sujeito
ou por tantos modos em que a mudez fabrica silêncios e medo. Portanto, temos
a violência ética operando em favor da LGBTfobia. Esta pode ser compreendi-
da como um dispositivo (Foucault, 1988) de regulação dos corpos de LGBTI+,
entre outras formas de existência que desafiam a norma de gênero por práticas
discursivas ou não discursivas.
Ainda que certa polêmica exista acerca das noções como homofobia, les-
bofobia e seus similares (Costa e Nardi, 2015; Junqueira, 2007), como a junção
LGBTfobia, elas adentram cada vez mais como conceitos e/ou categorias analíticas
na produção acadêmica (Borrillo, 2010), nos textos das políticas públicas e nos
instrumentos de direitos humanos (Brasil, 2009). Esses termos provêm da pauta
do ativismo social e dão inteligibilidade à experiência das sexualidades. A tensão,
não rara, entre posições acadêmicas, políticas públicas e movimentos sociais, no
contexto de gênero e sexualidades, não deveria bloquear alianças necessárias para
o avanço de pautas políticas, pois poderia produzir o epistemicídio de importantes
elementos na articulação de direitos de LGBTI+.
Aqui trazemos a noção de epistemicídio articulada por Sueli Carneiro
(2005) na análise das dominações raciais com base nas leituras que ela fez de
outros autores. Para a teórica, essa noção “tem se constituído no instrumento
operacional para a consolidação das hierarquias raciais por ele produzidas,
para as quais a educação tem dado contribuição inestimável” (Carneiro, 2005,
p. 33), sendo capaz de apagar saberes e fazeres no contexto em que se articula.
Acreditamos que negar e/ou desacreditar termos êmicos ou categorias ainda
frágeis das lutas sociais LGBTI+ é operar de modo epistemicida, pois mata em
broto saberes e fazeres irrenunciáveis para a produção de uma frondosa demo-
cracia participativa nos contextos sociais, algo que desejamos a todas as escolas.
Numa  perspectiva dos debates sobre educação, democracia e justiça, temos
autores que apontam cenários para essa ambiência política. Na ótica de uma
justiça curricular, o pesquisador espanhol Jurjo Torres Santomé (2013, p. 163)
considera ser “preciso aceitar a pretensão de que o século XXI deve ser o século
da justiça social, da paz, da compreensão e da solidariedade global e trabalhar
para isso”. Assim, as escolhas metodológicas também dizem das orientações
políticas de uma pesquisa.
Também, entendemos, fundamentados em Wladimir Saflate (2015), que a
radicalização da teoria do reconhecimento, por Butler, tem possibilitado análises
importantes sobre os vínculos entre política e moral. Recortamos em nossa pes-
quisa relatos que falam daqueles/as que têm sido des/classificados/as nas escolas

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Sexualidades no contexto escolar

haja vista formas de existência além da cisheteronormatividade. A noção de cis-


generidade foi proposta por ativistas transfeministas “como um neologismo no
sentido de atribuir um nome às matrizes normativas e ideais regulatórios relativos
às designações compulsórias das identidades de gênero” (Mattos e Cidade, 2016,
p. 133). Portanto, essa noção tem sido capaz de produzir diferenciações de pessoas
auto ou heteroclassificadas como travestis, transexuais, transgêneros etc. A noção
de cisheteronormatividade articula-se como “uma perspectiva que tem a matriz
heterossexual como base das relações de parentesco e a matriz cisgênera como or-
ganizadora das designações compulsórias e experiências das identidades de gênero”
(Mattos e Cidade, 2016, p. 134).
Consideramos que é relevante o uso dessas noções por proporcionarem
análises que se aproximam de uma semântica das lutas de LGBTI+ e de suas
experiências. “O saber da experiência é aquele que se adquire no modo como
alguém vai respondendo ao que lhe vai acontecendo, ao longo da vida e no modo
como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece” (Bondía, 2015,
p. 32). A voz do eu da experiência pode emergir dos relatos de docentes, das lutas
de movimentos sociais e muitas vezes, de forma inusitada, do silêncio diante da
violenta inquirição normalizadora. Desse modo, “não se trata apenas de a ética
se encontrar envolvida na tarefa da teoria social, mas a teoria social, se tiver que
produzir resultados não violentos, deve encontrar um lugar de vida para esse ‘eu’”
(Butler, 2015, p. 19).
Nossa perspectiva teórico-metodológica escolheu a construção de dados
com base na voz de docentes da educação básica pública, pois ela também produz
as análises levando em conta termos que se sustentam por semânticas produzi-
das pela voz dos sujeitos da experiência. A voz desses docentes permite analisar
saberes e fazeres que ocorrem no cotidiano escolar, a partir e além do currículo
oficial, apontando-nos a qualidade das relações humanas que ali são engendradas,
conforme nos indica Torres Santomé (2013). Este compreende que nossa época
vive um conjunto de 12 revoluções em diferentes domínios da existência, como
comunicação, ecologia, lazer, entre outros, com destaque às revoluções na educação.
Nesta podemos identificar a emergência de grupos que historicamente sofreram
exclusão imposta, como mulheres, negros/as, LGBTI+, entre outros. Tais grupos
produzem resistência por meio das lutas de coletivos, de movimentos sociais, entre
outros tipos de ativismo. Também, revolucionam os domínios educacionais pautan-
do desde as práticas pedagógicas até os conteúdos dos livros didáticos, alcançando
práticas além do currículo oficial.
O que essas/es docentes escutam e/ou como se posicionam diante daquilo
que se produz na escola acerca das sexualidades? Como dialogam com as revoluções
da educação conforme apontado anteriormente? Para responder a essas questões,
além do diálogo teórico, temos produzido análises empíricas. Os autores deste
artigo possuem diferentes contatos com a escola: uma pedagoga/pesquisadora da
educação infantil e ensino fundamental, um professor de cursos profissionalizan-
tes/pesquisador e um professor universitário pesquisador, todos envolvidos com o
projeto de pesquisa que deu origem ao presente texto. A pesquisa foi desenvolvida

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em duas cidades de médio porte2, num raio de 100 km aproximadamente de Belo


Horizonte (MG). Ainda assim, omitimos os nomes dos municípios considerando
que sua menção poderia quebrar o anonimato da entrevista narrativa.
Nossa pesquisa situa-se num prisma que dialoga com os debates sobre gê-
nero e sexualidades numa visão pós-estruturalista, politicamente posicionada no
desenho metodológico que se propõe a seguir. Essa posição pode ser percebida no
reconhecimento da legitimidade das formas de existência que vão além e perma-
necem distantes daquelas reguladas pela cisheteronormatividade. Oliveira e Ferrari
(2018) descreveram esse contexto de produção acadêmica como uma perspectiva
das teorias pós-críticas, dispostas a enfrentar os desafios que permeiam as lógicas
da heteronormatividade, tão presentes nas escolas. Para os autores, investigar os
desdobramentos das questões de gênero e das sexualidades na escola possibilita
entender o sistema educacional por dentro, ou seja, problematizar a construção
social e histórica dos sujeitos. Ainda mais, ao colocar em análise esses processos,
construímos e desconstruímos relações de poder com os outros, isto é, no campo
de pesquisa, em que encontramos pesquisadores/as, colaboradores/as, gestores/as
públicos etc. Isso também se relaciona às práticas docentes que adotamos nas escolas
e em salas de aula, possibilitando visibilidades da potencialidade de sujeitos muitas
vezes negligenciados no contexto escolar (Torres Santomé, 2013).
Nosso trabalho seguiu as orientações e os trâmites solicitados pelo comitê de ética
em pesquisa envolvendo seres humanos, sendo utilizados pseudônimos para todos/as os/
as colaboradores/as da pesquisa. Escolhemos os relatos de docentes por considerarmos a
importância dessa perspectiva de observação no contexto escolar. Apesar de o presente
texto manter o nome de dois pesquisadores e uma pesquisadora, a investigação é fruto
de um conjunto de pesquisadores/as que nos últimos anos, em um curso de mestrado,
se envolveram com o tema das sexualidades nos contextos escolares. Os grupos focais
foram conduzidos pela pedagoga, também autora deste artigo, entre maio e outubro
de 2018. A entrevista narrativa foi realizada pelo professor do curso profissionalizante,
outro autor deste artigo, no ano de 2017. Todos os procedimentos de pesquisa ocorreram
depois de terem sido analisados e discutidos pela equipe de pesquisa.
Nos relatos dos/as docentes, destacamos como eles/as percebem as sexualida-
des, pois isso diz das possibilidades de se nomear/denunciar a LGBTfobia. No co-
tidiano escolar pode se construir uma ciência racista, sexista, classista e homofóbica,
produzindo “a deformação, o silenciamento e a manipulação de determinados dados
e situações” (Torres Santomé, 2013, p. 284). Isso dá-se diante da emergência de
proposições de políticas públicas articuladas às questões de gênero e sexualidades,
como o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos de
LGBT (Brasil, 2009) e seus desdobramentos na administração pública (Vianna,
2018). Problematizamos tal questão, pois consideramos que a violência ética tem

2 Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Brasil, 2011), cidades de


pequeno porte são aquelas com até 50 mil habitantes, e de médio porte, aquelas até
100 mil. As cidades da presente pesquisa têm entre 50 e 100 mil habitantes, porém
podem ser consideradas de médio porte por apresentarem crescimento significativo de
suas populações nos últimos anos.

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Sexualidades no contexto escolar

produzido formas de existência insuportáveis de se viver, impedindo processos de


reconhecimento em diferentes espaços sociais. Dessa insuportabilidade da existência,
os sujeitos movem-se de muitas maneiras. “Tem gente que chega pra ficar. Tem gente
que vai pra nunca mais. Tem gente que vem e quer voltar. Tem gente que vai e quer
ficar. Tem gente que veio só olhar. Tem gente a sorrir e a chorar” (Nascimento e
Brant, 1985). A letra dos compositores mineiros ajuda a entender que a saída de
uma vida insuportável nem sempre é o fim. Os deslocamentos que ela provoca pode
gerar ações, lutas e, entre outras questões, o luto por quem decidiu partir.

VIOLÊNCIA ÉTICA NOS ESPAÇOS ESCOLARES: A PROMOÇÃO DO


DISCURSO REACIONÁRIO RAIVOSO CONTRA AS SEXUALIDADES
A possibilidade de lidar com as formas de existência humana, seja da nossa,
seja de outrem, está relacionada com as possibilidades que temos de relatá-las ou de
exercitar seu reconhecimento. Assim, podemos criar nossos mundos e compartilhá-
-los nas trajetórias de nossas experiências. O contexto escolar é um dos lugares
importantes em que nossas experiências ganham sentido, pois, para uma parte
significativa de crianças, adolescentes e adultos, esse lugar pode ser uma ambiência
em que é possível experimentar-se. Além disso, a escola já não se limita mais por
seus muros, nem está orientada apenas pelas políticas públicas nem por sua gestão,
pelas formas de contestação, transformação e defesa das normas de um regime de
verdade. Este é utilizado com base nas últimas elaborações de Foucault (2018a)
para analisar as performatividades de sexo e gênero (Butler, 2003) nas interde-
pendências sociais da escola. Nestas devemos considerar, conforme aponta Torres
Santomé (2013), que a análise do currículo deve levar à justiça curricular, ou seja,
a efetivar o reconhecimento das demandas das salas de aula, das necessidades de
todos os grupos sociais, principalmente daqueles que apresentam maiores urgên-
cias. Essa ambiência democrática pode propiciar a produção de relações marcadas
pela ética, pela solidariedade e pela colaboração na formação de todos/as diante do
avanço das políticas neoliberais que têm atacado nossas democracias.
Kátia Baggio (2016) produz uma análise que nos ajuda a pensar a articula-
ção de posições consideradas de ultradireita no cenário internacional. Ela analisa
articulações entre certos think-tanks brasileiros com organizações internacionais
desde os anos de 1980, para a promoção de uma agenda da direita ultraliberal.
Baggio produziu dados que nos auxiliaram a percebem como a organização ultralibe-
ral Atlas Network, fundada na década de 1980, construiu articulações no Brasil com
grupos como o Instituto Millenium (IMILL) e com o Estudantes Pela Liberdade
(EPL), ambos provavelmente apoiadores do Escola Sem Partido, algo que ainda
investigamos em outra pesquisa. Isso ajuda-nos a descrever as interdependências
sociais atuais. Com isso, passamos a compreender que plataformas como Facebook,
WhatsApp etc. fazem parte do cotidiano escolar, bem como carreiam para os pátios
e salas da aula, em frações de segundos, disputas de todas as ordens, mesmo aquelas
relacionadas à ofensiva antigênero (Prado e Correa, 2018). Nessa ofensiva, emerge
com destaque na opinião pública e nas políticas públicas em educação o sintagma

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ideologia de gênero ( Junqueira, 2018), buscando sustentar posicionamentos que


“têm sido utilizados para rotular práticas educativas que problematizem opressões e
desigualdades sociais” (Mattos, 2018, p. 573). O mapeamento dessa ofensiva revela
seu recrudescimento na última década.
Nesse mesmo ano (2013) então, no Brasil, forças católicas e evangélicas con-
servadoras e o movimento Escola sem Partido juntaram esforços para incidir,
de forma coordenada, nos debates do Plano Nacional de Educação com o obje-
tivo de excluir o termo gênero dos documentos em debate. Em 2016, o ataque
ao gênero, como ideologia “diabólica e marxista” impactou, negativamente, no
referendo sobre o acordo de Paz na Colômbia. Um ano mais tarde, a filósofa
feminista Judith Butler, ao visitar o Brasil, foi objeto de um virulento ataque
antigênero. No começo de 2018, a mesma diatribe levou um candidato, repre-
sentando a cruzada antigênero, ao segundo turno das eleições presidenciais.
Alguns meses depois, o tropo “gênero” esteve no vórtex central do furacão elei-
toral brasileiro e, no país, o ano de 2019, se iniciou com o anúncio feito no
discurso presidencial ao congresso de que um dos objetivos do governo recém
eleito é combater a “ideologia de gênero”. (Prado e Correa, 2018, p. 444)

Nesse contexto, localizamos a produção de um currículo fechado, em que


as lógicas das políticas neoliberais, numa perspectiva economicista orientada
pelo capitalismo hegemônico (Torres Santomé, 2013), se articulam aos regimes
de verdade e operam na escola. Os regimes de verdade podem dar andamento a
relações de poder nas instituições disciplinares por um conjunto ordenado de ele-
mentos capazes de controlar discursos em vistas de uma verdade (Foucault, 2018a).
O discurso constitui-se em um conjunto de enunciados capazes de “atravessar” a
linguagem, conforme analisa Fischer (2001). Desse modo, podemos compreender
o enunciado da ofensiva antigênero de que a “‘ideologia de gênero’ é diabólica e
marxista”, conforme citado por Prado e Correa (2018, p. 444). O exercício do poder
como uma rede de relações entre sujeitos é “o que se poderia chamar de tecnologia
política do corpo que nada mais é do que uma microfísica do poder posta em jogo
pelos aparelhos e instituições” (Foucault, 1987, p. 29).
Destacamos que Michel Foucault, entre o fim da década de 1970 até seu
falecimento, em 1984, trabalhou a noção de governo para pensar as formas de regu-
lação da vida, sendo importante observar o seguinte. Aqui buscamos operar com a
noção de discurso na mudança que o filósofo propõe do uso da noção de poder para
governo, em que a produção da verdade terá grande relevância analítica para discutir
regimes de verdade. Todavia, cabe ressalvar como ele definiu essa noção em 1980:
Nos cursos dos dois últimos anos, procurei esboçar um pouco essa noção de go-
verno, que me parece muito mais operacional do que a noção de poder, “governo”
entendido, claro, não no sentido estrito e atual de instância suprema das decisões
executivas e administrativas nos sistemas estatais, mas no sentido lato, e aliás an-
tigo, de mecanismos e procedimentos destinados a conduzir os homens, a dirigir
a conduta dos homens, a conduzir a conduta dos homens. (Foucault, 2018a, p. 13)

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Sexualidades no contexto escolar

Um bom exemplo disso é como as noções de gênero e diversidade sexual


passaram de conceitos analisadores/mobilizadores das relações de poder na escola
para termos malditos, banidos da inteligibilidade em muitos planos de educação
em estados e municípios e na esfera nacional. Consideramos que nessa mudança
operam a deformação e o silenciamento (Torres Santomé, 2013) daquilo que se
define como direitos de mulheres e LGBTI+ pela ação da ofensiva antigênero.
A deformação dá-se ao acusar o reconhecimento desses direitos na escola como
ideologia de gênero, ao mesmo tempo em que se pretende silenciar as vozes daque-
les/as que no cotidiano escolar estariam defendendo tais direitos. Essas relações
poderiam ser compreendidas como a produção de formas de governabilidade dos
corpos, ou seja, formas de conduzir os sujeitos por verdades estabelecidas pelas
lógicas cisheteronormativas. Deve-se atentar ao fato de que a emergência do
debate de gênero e das sexualidades na educação sempre foi complicada, mas nas
agendas dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva
ocorreram articulações importantes (Vianna, 2018), como veremos mais adiante.
Isso serviria para pensar o que tem acontecido também com outras minorias
sociais. Destacamos que essas disputas vão além de lógicas nacionais e contextos
específicos, como as escolas.
Nos últimos anos, estudiosos e estudiosas de diversas partes do mundo têm
observado uma marcante e incisiva presença de um ativismo religioso — não
raro, acompanhado por grupos laicos ou não nitidamente confessionais — que
encontraram em um neologismo ou, mais precisamente, no sintagma neológico
“ideologia de gênero” (ou “teoria do gênero” e outras variações), um artefato
retórico e persuasivo em torno do qual reorganizar seu discurso e desenca-
dear novas estratégias de mobilização política e intervenção na arena pública.
( Junqueira, 2018, p. 451)

Entendemos que a LGBTfobia, nessa dinâmica social, opera a produção


de vidas insuportáveis, ou seja, formas de vida que têm negada ou questionada sua
inteligibilidade. Essas existências podem se tornar insuportáveis à medida que se
afastam da cisheteronormatividade, que “medicaliza e criminaliza subjetividades que
não se enquadram nessas normas” (Mattos e Cidade, 2016, p. 141). Pela cishete-
ronormatividade, põem-se em funcionamento dispositivos dinâmicos que buscam
eliminar e/ou subalternizar determinadas formas de existência. Esses dispositivos
têm sido nomeados como lesbofobia, homofobia, bifobia, transfobia ou mesmo
pelo neologismo LGBTfobia. Fazemos o uso desses termos, em nossas pesquisas,
de acordo com o contexto das análises. Observamos que as sexualidades e as ques-
tões de gênero se constituem como outros marcadores sociais da diferença, como
raça, classe social, entre outros. Esses marcadores entrecruzam os campos político
e acadêmico por um aporte feminista e antirracista (Moutinho, 2014; Oliveira e
Ferrari, 2018). Um exemplo disso, verificado pela pedagoga/pesquisadora no con-
texto escolar no qual trabalha, é como meninas negras são inferiorizadas e excluídas
nos momentos de participação coletiva.

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Raça, sexualidade e gênero, por exemplo, são três marcadores que se tornaram
alvo de ataques nos contextos das conferências (municipais, estaduais e nacional)
de educação, sendo algumas das categorias que foram banidas ou esgarçadas nos
documentos finais do Plano Nacional de Educação. Essa análise das mudanças de
noções mobilizadoras para termos malditos não é completa, mas ainda assim diz
de um contexto de influência muito específico no Brasil. A análise da recolonização
da esfera civil pelo discurso religioso tem contribuído para essa mudança.
Percebe-se que se formou uma aliança composta por evangélicos e católicos mais
ortodoxos, quando não fundamentalistas, bem como organizações conservadoras/
reacionárias que defendem o que chamam de família e costumes tradicionais, uni-
das em divulgar e disseminar informações distorcidas para impedir que se alcance
a equidade entre os gêneros e o respeito à diversidade sexual, conforme vem sendo
ratificado internacional e nacionalmente há décadas com a intenção de diminuir
as discriminações e as violências baseadas em gênero. (Reis e Eggert, 2017, p. 18)

A propagação de discursos promotores do medo e do ódio ganha espaço


quando consegue grande penetração social por meio das mídias sociais, principal-
mente quando gestores/as públicos se assumem, nesses contextos, favoráveis ao
que o texto citado define como organizações conservadoras/reacionárias. Podemos
observar essas questões nos grupos focais que aconteceram no ano de 2018, numa
cidade de médio porte próxima a Belo Horizonte. Ao todos, foram três grupos
focais, dos quais todos/as os/as colaboradores/as participaram voluntariamente.
O primeiro ocorreu no modelo de oficina como preparação para os demais. A oficina
de grupo focal foi composta de professores/as que cursam o mestrado do programa
em que a pesquisa foi desenvolvida, nas dependências da universidade, contando
com quatro participantes, e durou pouco mais de 60 minutos. Os outros dois grupos
ocorreram após avaliação da oficina pela equipe de pesquisa. Um deles foi realiza-
do numa escola municipal com sete participantes e duração de aproximadamente
80 minutos; o outro foi numa escola municipal com a participação de cinco pessoas
e levou por volta de 70 minutos. Já com áudio e filmagem ligados, apresentados/as
o/a observador/a e os/as operadores/as de áudio e vídeo, foi reiterado a todos/as o
tema da pesquisa, apresentando aos/às colaboradores/as por escrito um roteiro para
o grupo, após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
e do Instrumento de Cessão de Direitos. A depender do andamento do grupo, a
mediadora propunha ou não mais questões. Os/as colaboradores/as tiveram formas
de participação bem diferentes, porém houve grande colaboração de todos.
Pelos grupos focais, percebemos troca de opiniões, de valores, de crenças, de
experiências. No grupo focal, as interações provocam análises e afetações, criando
uma ambiência para autorreflexões, como apontam discussões dessa metodologia
(Barbour, 2009; Gatti, 2005; Smeha, 2009). Algumas falas num grupo focal indicam
como professoras/es, num processo de reflexividade, conseguem notar a cishete-
ronormatividade no exercício da docência, ainda que a nomeiem de outro modo.
Aqueles fatos que seriam tratados no cotidiano escolar como sem importância
ganham significado.

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Sexualidades no contexto escolar

A gente entra na faculdade, participa desses debates sobre gênero, o que é ser
mulher, o que é ser homem. E diz que nunca vai fazer isso como professor, né,
jamais eu vou fazer isso. E para minha surpresa e durante essa conversa que
eu pensei nisso [...]. E teve um dia inclusive que nós começamos com essa
conversa na sala. E teve um menino que falou assim: “Mas eu procuro fazer
minha letra bonita mesmo, porque a letra quando é bonita a professora dá nota
boa. Porque as meninas têm tudo nota boa”. (Grupo Focal, professor Gilberto
Freyre3, 2017)

O professor Gilberto Freyre indica como a fala do aluno produz uma re-
flexividade que leva o docente a perceber as expectativas de gênero nos processos
avaliativos. Em sua observação, há a contestação de um padrão consensual de
comportamento feminino/masculino que já está naturalizado em nossas ações,
sem que nos demos conta disso. Isso aponta para uma posição crítica do professor
em relação a uma governabilidade sexista sobre o modo de escrever. Outra fala
também analisa o poder da naturalização das questões de gênero e das sexualidades
no nosso cotidiano:
Isso está enraizado na gente mesmo, por mais liberal que a gente seja, ou a
gente acha que a gente é. Mas a gente falando a gente reflete, mas você não está
errado. Não quer dizer que você esteja errado de ser assim. É porque a gente
tem isso tudo enraizado dentro da gente. Eu mesma se for começar aqui a ana-
lisar coisas que eu fiz ou que eu faço em relação a minha vida diante de outras
pessoas ou o meu posicionamento diante de outras pessoas, eu vou encontrar
um monte de coisa que pode ser considerada defeito, pode ser considerada uma
coisa errada. (Grupo Focal, Professora Marie Curie, 2018)

Não obstante, encontramos relatos de aulas de educação física em que ficava


explícita a generificação dos corpos. Esta diz de um modo de distribuição e orga-
nização dos corpos por uma governabilidade que impede às mulheres de acessarem
os mesmos lugares que os homens nos domínios da escola. Dois dos grupos são
enfáticos ao relatar como há separação entre as atividades destinadas aos meninos
e às meninas, de como as meninas enfrentam dificuldades em serem aceitas e par-
ticipar dos times de futebol masculinos:
Eu trabalhei em uma escola que tinha uma menina que ela detestava fazer
qualquer coisa na educação física que não fosse jogar futebol, e ela jogava
futebol muito melhor que qualquer um dos colegas dela. E ela era vetada
pelo professor de educação física o tempo todo, porque a diretora achava que
aquilo estava errado. E ela não podia participar do jogo de futebol porque
aquilo era só para menino. E ela participava de um time de futebol feminino

3 Todos os nomes são pseudônimos e foram escolhidos com base em pesquisadores/as,


autores/as, educadores/as de relevância na área da educação ou ainda de autodenomi-
nações dos/as colaboradores/a.

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Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

fora da escola. E quando tinha campeonato de futebol feminino ela também


participava. Mas aconteceu, por exemplo, de no campeonato masculino faltar
um aluno que era importante durante jogo. E essa menina estava lá disponí-
vel, queria participar, os meninos queriam que ela participasse e ela foi vetada.
Com muito custo, ela conseguir participar e ganhou o jogo. (Grupo Focal,
Professora Marie Curie, 2018)

Outra participante disse que trabalhou em uma escola onde os meninos


faziam uso da quadra e aprendiam as modalidades esportivas, enquanto às me-
ninas era destinado um pequeno espaço do pátio que mal dava para rebater uma
peteca. Não é norma que meninas participem de atividades vistas como masculinas.
No futebol, por exemplo, não cabem mulheres, principalmente se elas denunciam
a não naturalidade da norma com o seu talento e capacidade. A educação física
surge como um local em que meninos e meninas recebem tratamento diferenciado.
Essa separação dos corpos é uma forma de perpetuar padrões de comportamentos
dicotômicos. “Essa luta com as condições não escolhidas da vida — uma ação —
também é possível, paradoxalmente, graças à persistência dessa condição primária
de falta de liberdade” (Butler, 2015, p. 31).
Também destacamos dois relatos que indicam como a homofobia se põe
em defesa de um regime de verdade, orientado pela cisheteronormatividade, que
persiste no cotidiano escolar:
No 6º ano, dos mais novinhos, eu estava estudando um texto lá com eles, o de-
poimento da mãe, mãe de uma jovem homossexual, e aí, no meio do debate, um
menino virou e falou assim: “É... Fulano, você pode preparar que você está na
mira do Bolsonaro”. Eu falei: “Gente, não vamos colocar política aqui no meio,
não, gente”. “Bolsonaro vai matar todos os viados”. (Grupo Focal, Professor
Moreno, 2018)

“No 7º ano falando de política, de Bolsonaro: ‘cuidado, viu, fulano, cuidado’”


(Grupo Focal, Professora Helô, 2018).
No contexto da interpelação que sofre esse menino pode emergir (nele, no
outro e/ou na coletividade) a reflexividade. Tornar-se alvo da homofobia, no caso
desse aluno, não é uma condição, mas uma contingência. Ou seja, “o sujeito luta
invariavelmente com condições de vida que não poderia ter escolhido” (Butler, 2015,
p. 31). Temos a constituição de uma violência ética quando a comunidade escolar
não propicia o relato de si no cenário dessa ameaça. Isso impede possibilidades do
reconhecimento, de fornecer ao sujeito oportunidades de um registro inteligível de
sua existência nas interdependências sociais. Vejamos um pouco mais das relações
entre moral e política no contexto da violência ética.
Butler (2015), com base em Theodor Adorno, considera que, quando o “ethos
coletivo” deixa de ser compartilhado por todos/as, ele passa a utilizar métodos vio-
lentos para impor-se como comunidade. A autora, nessa mesma perspectiva, entende
que, no momento em que as formas de existência não cabem mais nas máximas
morais derivadas desse ethos, essa máxima se torna um anacronismo.

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Sexualidades no contexto escolar

O grande problema surge quando pensamos em termos históricos, no mo-


mento em que esse ethos anacrônico não se torna pretérito. Ao permanecer como
anacronismo, ele esgarça o presente, não consegue dar inteligibilidade às formas de
existência que revelam a possibilidade de universais abertos a diferenças. O anacro-
nismo que não se torna passado aparece quando alguém é ameaçado haja vista sua
sexualidade: “Você está na mira do Bolsonaro” e “Bolsonaro vai matar todos os viados”.
Portanto, “cuidado, viu, fulano, cuidado”. As falas podem emergir como enunciados,
no sentido foucaultiano; a produção de significados apoia-se em sistemas discursivos
(Fischer, 2001) morais, religiosos, pedagógicos, entre outros. “O que permitirá situar
um emaranhado de enunciados numa certa organização é justamente o fato de eles
pertencerem a uma certa formação discursiva” (Fischer, 2001, p. 202). Determina-
do enunciado pode se constituir de diferentes modos, até de uma posição discursiva
do sujeito reflexivo, mas disso não devemos supor a norma como produtora do sujeito
em si, ou mesmo que o sujeito seja plenamente livre para desprezar a norma que
instaura sua reflexividade (Butler, 2015). Todavia, reiteramos, Butler (2015) vê que
a opacidade do sujeito sempre permeia todos os momentos do reconhecimento,
pois o sujeito nunca será totalmente transparente a si mesmo:
Se o sujeito é opaco para si mesmo, ele não totalmente translúcido e conhecível
para si mesmo, ele não está autorizado a fazer o que quer ou a ignorar suas obri-
gações com os outros, decerto o contrário também é verdade. A opacidade do
sujeito pode ser uma consequência do fato de se conceber como ser relacional,
cujas relações primeiras e primárias nem sempre podem ser apreendidas pelo
conhecimento consciente [...]. Então essa opacidade parece estar embutida na
nossa formação e é consequência de nossa condição de seres formados em rela-
ções de dependência. (Butler, 2015, p. 32)

Enunciados LGBTfóbicos, como apresentados anteriormente, emergem de


formações discursivas que operavam durante a campanha do então candidato Jair
Messias Bolsonaro, que venceu as eleições presidenciais no Brasil em 2018. Eles di-
zem da produção de um regime de verdade que busca nomear atos de violência,
injúria e ameaça como liberdade de expressão, defesa da família, opção religiosa etc.
E tudo está imerso em relações de poder e saber, que se implicam mutuamente,
ou seja, enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e ver constituem
práticas sociais por definição permanentemente presas, amarradas às relações
de poder, que as supõem e as atualizam. (Fischer, 2001, p. 200)

Esse menino classificado como viado pelo enunciado “Bolsonaro vai matar
todos os viados” pode experimentar uma vida insuportável. Dessa insuportabilidade,
ele tentará escapar. Nesse momento, quando a possibilidade do armário se tornar
insuficiente, qual será sua destinação? Será ele “gente que chega pra ficar” ou
“gente que vai pra nunca mais”? A questão do suicídio e/ou sua ideação suicida
tem aparecido mais como discussões nas redes do que em pesquisas acadêmicas.
Em nossas análises, a temática do suicídio de LGBT+ (ou suas ideações) tem

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Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

sido recorrente em anais de congressos e publicações livres, porém ainda temos


poucos artigos acadêmicos nacionais discutindo a questão. Das pesquisas encon-
tradas, destacamos uma realizada com adolescentes não heterossexuais, entre 12 e
20 anos, que aponta para a necessidade de abordagens específicas para esse grupo
(Teixeira-Filho e Rondini, 2012).
Assim, temos a emergência de uma das facetas da violência ética. Ela se
constitui quando as vozes desses sujeitos são caladas e/ou desqualificadas, o que
acontece por meio de discursos que historicamente definiram a diferença como
uma anormalidade a ser corrigida pela medicalização ou disciplina, muitas vezes
às custas de muito sofrimento e à revelia do sujeito. O silenciamento dessas vozes
opera em desfavor da potência enquanto estudantes, docentes, participantes de
uma comunidade escolar. Consideramos que a voz é uma metáfora para dizer da-
quilo que a experiência nos informa, mesmo no caso daqueles que não falam por
diferentes motivos. Entre eles, “tem gente que vai pra nunca mais”, pelo suicídio,
pelo assassinato de mulheres, gays, lésbicas e principalmente pelo extermínio de
travestis e transexuais em nosso país. A voz do eu da experiência pode emergir das
narrativas de familiares, das lutas de movimentos sociais e muitas vezes, de forma
inusitada, do silêncio de alguém que se cala diante da inquirição violenta da nor-
malização. Logo, “não se trata apenas de a ética se encontrar envolvida na tarefa
da teoria social, mas a teoria social, se tiver que produzir resultados não violentos,
deve encontrar um lugar de vida para esse ‘eu’” (Butler, 2015, p. 19). Desse modo,
as investigações precisam pensar em sua própria limitação em dizer desses sujeitos,
exigindo de nós, pesquisadores/as, aproximações que reconheçam as vozes daqueles/
as que relatam acerca de si.

RECONHECIMENTO DAS SEXUALIDADES NOS ESPAÇOS


ESCOLARES: OU SOBRE “GENTE QUE CHEGA PRA
FICAR”, “GENTE A SORRIR E A CHORAR”
Butler (2015), ao analisar os sujeitos foucaultianos, concorda que a cena do
reconhecimento se dá num regime de verdade que diz sobre as formas reconhecíveis
ou não reconhecíveis, porém numa dinâmica em que contestação e a transformação
podem surgir.
Isso não significa que dado regime de verdade estabeleça um quadro invariável
para o reconhecimento; significa apenas que é em relação a esse quadro que o
reconhecimento acontece, ou que as normas que governam o reconhecimento
são contestadas e transformadas. (Butler, 2015, p. 35)

A produção e proliferação de confissões acerca do gênero e das sexualidades


alastraram-se por todos os recantos da vida contemporânea, produzindo formas
de contestação e transformação que chegaram às salas de aula. Essa capacidade
rizomática de produção das sexualidades promove contestações e transformações
do regime de verdade, seja os regimes que produziram corpos devassos e pecado-
res, seja aqueles que produziram e ainda produzem, em certa medida, tais corpos

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Sexualidades no contexto escolar

como doentes, como anormais. Quando Foucault (1988) analisou a passagem da


perspectiva confessional religiosa para aquela de uma scientia sexualis, ainda era
difícil imaginar como outras formas de confissão seriam potencializadas pelas redes
digitais e outras mídias.
Como pesquisadores/as no campo da educação, problematizamos esses espaços
de sociabilidade como educativos, uma vez que modificam nossa forma de ver,
ser visto e, principalmente, nossa forma de agir, além de interferir, diretamen-
te, no cotidiano escolar, nos processos de ensino-aprendizagem e nas relações
entre professoras/es e alunas/os. [...] Somos, de muitas formas, convocados/as
a usar a internet nos seus mais variados fins, de modo que ela alterou, de forma
decisiva, as maneiras como pagamos nossas contas, aprendemos e ensinamos,
namoramos, nos locomovemos e, principalmente, nos comunicamos e nos mo-
bilizamos. (Oliveira, Ferrari e Machado, 2019, p. 661)

Na contemporaneidade, é curioso perceber como essas confissões têm


sido capazes de produzir contestações nos regimes de verdade sustentados pelos
discursos. O aparecimento dessas contestações — ligeiras, potentes e efêmeras —
pode ocorrer de muitos modos, penetrando pelas ondas da internet nos lugares
mais inusitados. O sintagma ideologia de gênero é um bom exemplo disso, tanto
em sua articulação internacional ( Junqueira, 2018; Prado e Correa, 2018) como
na maneira como adentrou nos discursos das políticas públicas de educação no
Brasil (Mattos, 2018).
A comunicação eletrônica em suas diversas modalidades tem sido um
veículo poderoso para que os discursos religiosos se articulem ao contexto edu-
cacional de forma significativa, na produção de violências LGBTfóbicas. Mesmo
que deparemos com o crescimento da notificação de violências de todas as ordens
contra os sujeitos identificados pelas sexualidades e contra as mulheres, nem todos/
as sofrem e/ou morrem calados/as. Emergem relatos de vida que frequentam das
páginas da internet às metodologias de pesquisa, das lutas sociais aos espaços de
gestão pública etc. Assim, temos a produção de formas de reconhecimento das
performatividades como contestação da cisheteronormatividade na sociedade. Os
discursos que produzem os sujeitos que frequentam as escolas — docentes, estu-
dantes ou membros do corpo técnico — relatam experiências de performatividade
que forçam os estreitos limites de um ethos anacrônico que recusa tornar-se
passado. O relato das experiências traz palavras com a potência de produzir
reconhecimento, por isso a produção de um discurso reacionário raivoso contra
a possibilidade de determinadas palavras como gênero, LGBT e homofobia no
último Plano Nacional de Educação.
Podemos trazer um pouco das contestações e transformações do regime
de verdade naquilo que nomeiam nossos/as colaboradores/as da pesquisa. Os três
grupos focais possibilitaram bons diálogos que provavelmente não iriam emergir em
entrevistas individuais. Vejamos como essas questões aparecem nos grupos focais e
indicam que existe um processo de reflexividade acerca do gênero e das sexualidades
em curso nesses/as professores/as:

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Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

Eu tenho percebido é que existe hoje uma dificuldade grande da escola [de]
trabalhar essas questões da sexualidade e gênero, e quando a gente toca nesse
assunto a resposta é “os pais não gostam”. Parece uma desculpa, “não vamos fa-
lar disso, porque os pais não gostam”. Eu não sei se isso é uma realidade ou se é
uma forma de fugir da situação, porque é diferente aceitar e respeitar. Ou fazer
de conta que não existe. “Não, eu não tenho preconceito. Desde que não fique
perto de mim, não entre nas rodas onde eu estou”. Então eu percebo que essas
questões são muito mais veladas entre os adultos, entre as gerações mais adultas,
do que entre os próprios jovens. Entre eles, eles são bastante abertos a essas
questões. (Grupo Focal, Professora Luna, 2018)

A professora Luna não aponta apenas o clima de medo em que vivem os/
as docentes; traz em sua fala a emergência de um discurso de reconhecimento
das sexualidades, ainda que precário. Ao afirmar que os jovens “estão bastante
abertos a essas questões”, identifica que existe um reconhecimento em processo,
algo que emerge como contestação e transformação do silêncio imposto pela
violência ética em relação ao gênero e às sexualidades. Aqui poderíamos pensar
em revoluções que ocorrem na educação (Torres Santomé, 2013), mas também
dizem de permeabilidades como outras que se dão em diferentes domínios da
vida. Os movimentos de LGBTI+ conseguem grande capilaridade social, seja
em manifestações, como as paradas LGBTI+, seja ainda em redes da internet,
produzindo semânticas de reconhecimento que, via estudantes e docentes, aden-
tram na escola, como revelam as falas dos/as professores/as que colaboraram com
nossas pesquisas. Destacamos que nos grupos focais não houve questões sobre
travestilidade e transexualidade, indicando como o epistemicídio opera de forma
mais violenta sobre esses corpos. Não abriremos essa discussão neste texto; ela
está em elaboração em nosso grupo de pesquisa.
A entrevista narrativa da professora Luana, autoidentificada como mulher
transexual, possibilitou localizarmos interdependências que se tornam fundamentais
para o sujeito relatar a si para toda a comunidade escolar, produzir uma inteligi-
bilidade capaz de enfrentar a violência ética que atinge as mulheres transexuais.
No contexto de nossas idas a campo, a entrevista narrativa foi importante
para aprofundarmos nossas análises. A entrevista narrativa com Luana foi realizada
pelo professor de curso profissionalizante, também autor deste artigo, em meados
de 2017, com duração de pouco mais de 120 minutos. Também foram seguidos
todos os procedimentos orientados pelo comitê de ética em pesquisa. O pesquisador
conheceu Luana durante sua atividade de professor no mesmo município em que
ela atuava, numa cidade de médio porte a uns 80 km de Belo Horizonte. Após al-
guns encontros informais, Luana mostrou-se muito interessada em colaborar com
a pesquisa, até mesmo mostrando um diário que tem produzido para registrar suas
experiências. No período da pesquisa, ela estava com 25 anos aproximadamente,
vivia com um companheiro e expressava uma performatividade de gênero femi-
nina. Esse formato de entrevista narrativa parte de uma questão aberta com uma
orientação ao narrador de falar o tempo que lhe aprouver. As entrevistas narrativas
“se caracterizam como ferramentas não estruturadas, visando a profundidade, de

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Sexualidades no contexto escolar

aspectos não específicos, a partir das quais emergem histórias de vida, tanto do
entrevistado como as entrecruzadas no contexto situacional” (Muylaert et al., 2014,
p. 194). Também, acreditamos que a narrativa tem a legitimidade de um testemunho
ao colocar alguém diante de uma audiência que está disposta a ouvir o relato dos/
das narradores/as (Hartmann, 2005).
Ao optar pela narrativa de uma mulher transexual, a professora Luana, dese-
jávamos aprofundar o diálogo de nossa pesquisa com as especificidades da transfobia
e/ou o reconhecimento das transexualidades. Em nossos grupos focais, o tema eram
gênero e sexualidades, e nada apareceu acerca das travestilidades e transexualidades.
Esse é um dado que informa como a sigla LGBTI+ ainda é insuficiente e/ou não se
faz entender nos espaços escolares. O relato de professores/as sobre a insegurança
em discutir as transgressões dos padrões hetero, principalmente tratando-se de
identidades não binárias, como as pessoas trans, revela a capacidade da norma em
moldar até a forma como as pessoas vão conhecer o gênero e as sexualidades e se
referir a ambos. Desse modo, podemos entender como o regime de verdade por
nós adjetivado como cisheteronormativo prejudica a semântica de reconhecimen-
to nos processos de governabilidade dos corpos. Pois, ainda que a maioria dos/as
colaboradores/as consiga nomear e denunciar a heteronormatividade, não se sente
preparada para problematizar nem dialogar sobre padrões não dicotômicos de gê-
nero, denunciando a não problematização e/ou o silenciamento acerca de travestis
e transexuais nas escolas. O relato a seguir fala de como os sujeitos da escola se
apropriam de determinadas questões acerca das transexualidades, algo que nos foi
apresentado pela narrativa da professora Luana:
Essas nomenclaturas são um pouco complicadas. Mas é o meu ponto de vista.
Porque definir exatamente até onde vai uma até onde vai a outra é muito com-
plicado! E a cada ano vai aumentando. E o LGBT já virou LGBTTTT, não
sei o quê... E, vai aumentando, porque é muito... vai abrangendo muita coisa...
Porque vai falando, ela é isso, ela é aquilo... É difícil [definir]. Igual a Ivana [per-
sonagem transexual masculino da novela Força do Querer, da Rede Globo, exibida
em 2017], com esse assunto tão em evidência, eu não assisto, quase não assisto
televisão, mas leio muito, vejo as pessoas comentando, porque aí vira assunto da
escola e está nessa evidência toda! A Ivana, pelo que eu entendi, porque as pes-
soas comentam, vira assunto da escola, vira assunto dos funcionários, dos alunos,
pelo que eu entendi, não sei se corresponde, se você assiste, mas, assim, pelo que
eu entendi a Ivana se identifica como homem, mas ela, sexualmente, ela gosta de
homem. Não é de mulher! Que é assim, pra mim, pelo menos, até então e eu já
li muita coisa, é diferente! Porque logo você espera que goste de mulher. Então é
mais uma coisa, mais diferente ainda. Quando as meninas [colegas de trabalho]
me contaram, na escola, porque até então eu não tinha lido sobre, só sobre a
transformação, eu fiquei assim, nossa, é diferente... Porque pra isso um homem
também vai ter que gostar; no caso dela, ela tem um namorado e tudo. E como
que ele vai fazer? Porque, pra ele amar ela, ele vai ter que... Ela vai estar numa
figura de homem, né? É difícil! É difícil! (Professora Luana, 2017)

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Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

Compreendemos que, na narrativa de Luana, o reconhecimento de si se dá nas


relações que contestam as normas do regime de verdade orientado pelas normas de
gênero. A personagem Ivana, da novela, possibilitou a Luana estabelecer diálogos na
escola acerca das possibilidades da experiência transexual: “Quando as meninas [colegas
de trabalho] me contaram, na escola, porque até então eu não tinha lido sobre, só sobre
a transformação...” (Professora Luana, 2017). Nesse diálogo existe uma aproximação
entre Ivana e a professora Luana mediada pelas colegas de trabalho. Ivana é um homem
trans que deseja outros homens. A experiência da professora Luana coloca em funcio-
namento mecanismos de subjetivação das possibilidades dos corpos definidos pelas
transexualidades. O que faz as “meninas” interpelarem a professora com esse assunto?
A aproximação entre “as meninas” e Luana diz de formas de reconhecimento, aponta
para contestações e transformações diante de um regime de verdade que historicamente
produziu corpos travestis e transexuais como abjeções, de maneira muito específica no
contexto educacional. Aqui podemos reconhecer o surgimento de importantes relações
marcadas pela solidariedade e empatia, condições necessárias para a construção de am-
biências escolares mais democráticas e participativas (Torres Santomé, 2013).
Nesse ponto, podemos levar em conta como nos procedimentos de governo,
no sentido proposto por Foucault (2018b), o indivíduo se constitui como sujeito
na relação consigo e com os outros. De acordo com Júlio César Sanches (2010), a
presença na mídia de corpos que rompem com a lógica binária sexual se faz muito
significativa como modo de contestar a norma e reivindicar inteligibilidade e reco-
nhecimento para esses corpos. A personagem Ivana ilustra o início desse processo,
ao colocar em discurso corpos silenciados, pela interpelação da professora Luana.
Esta, entre outros tantos adultos, jovens e adolescentes LGBTI+, constitui-se como
“gente que veio para ficar” na escola. A voz desses sujeitos pode descolar posições
LGBTfóbicas, trazer relatos de si. Talvez pela sua contestação das normas do re-
gime de verdade, a escola como um espaço para todos/as consiga inventar novas
formas de enfrentar a violência ética contra as sexualidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nas falas ocorridas nos grupos focais e na entrevista narrativa de nossa
pesquisa, analisamos como estão em curso disputas pela produção de uma verdade
sobre a distribuição e destinação dos corpos, além da emergência de diferentes
posições discursivas diante de um regime de verdade cisheteronormativo na escola,
desde aquelas que se orientam por esse regime como outras que o contestam e/ou
buscam formas de transformá-lo.
Nesse contexto, uma semântica produzida nas lutas sociais nos parece
extremamente relevante para nomear e averiguar os modos como esse regime de
verdade opera nas dinâmicas sociais. Podemos considerar que essas lutas sociais de
mulheres LGBTI+, entre outros grupos submetidos a processos de des/classifica-
ção, ao afirmarem o reconhecimento de si na escola, tensionam o currículo oficial e
indicam parte das revoluções de nossa época na educação (Torres Santomé, 2013).
O termo LGBTfobia, compreendido como um dispositivo dinâmico nessas disputas,
é um bom exemplo dessa semântica. Ainda que não tenhamos encontrado a ori-

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Sexualidades no contexto escolar

gem desse termo, percebemos pelas mídias sociais sua articulação por ativistas dos
movimentos LGBTI+, principalmente por ocasião dos debates da criminalização
da homofobia, o que é de domínio público. A noção de LGBTfobia ganha sentido
político quando a tomamos como analisadora dos contextos escolares, apesar das
questões teórico-metodológicas que podemos levantar acerca dela.
Foi desse modo que o termo homofobia se articulou a discursos de direitos
humanos e nos movimentos sociais até ganhar sistematização acadêmica (Borrillo,
2010). Qual é a estratégia política em utilizar o termo LGBTfobia? O termo LGBT-
fobia parece emergir numa busca de organizar uma defesa mais alargada de LGBTI+
do que o termo homofobia. Por outro lado, essas siglas sempre portam ambiguidades,
reduções que podem invisibilizar outros sujeitos. Todavia, afastar-se da produção de
categorias êmicas que emergem no contexto das sexualidades, pensar num campo das
sexualidades estritamente acadêmico, poderia nos tornar perpetradores/as da violência
ética que analisamos, não dar lugar ao eu que relata sobre si mesmo.
Tendemos a identificar na escola um discurso que nomeamos como reacioná-
rio raivoso pelos seus efeitos no contexto educacional, pois surge como uma forma
cruel de reagir contra algo ou alguém haja vista certos anacronismos que não se
tornam pretérito. A investida antigênero é uma articulação discursiva potente nas
disputas que se desdobram entre os/as participantes da escola.
Tal investida também diz de uma ambiência internacional em que políticas
neoliberais tomam a educação numa perspectiva economicista do capitalismo hege-
mônico. Aqui, temos o deslocamento das noções de tolerância, também problemá-
ticas, para a explicitação da crueldade. No funcionamento da LGBTfobia temos a
produção do medo, da violência, da constituição daqueles/as que podem ir para não
mais voltar. A eliminação dos sujeitos e/ou de suas vozes se constitui como violência
ética nas escolas, algo que pode ser rompido com o reconhecimento das sexualidades
nesse contexto. Para esse reconhecimento, é preciso trazer a voz do eu que relata a si.
Essa voz e as formas de reconhecimento que assistem a ela, produzindo cadeias
semânticas em que sujeitos podem se vincular moralmente a formas de existência
inteligíveis, são fundamentais para os direitos de LGBTI+. Nos contextos escolares,
isso pode produzir análises que orientem para uma justiça curricular (Torres Santomé,
2013) mais atenta às urgências de enfrentamento da LGBTfobia. Um jovem estudante
que é ameaçado pelo enunciado “Bolsonaro vai matar todos os viados” precisa ter pos-
sibilidades de se defender e de ser defendido por outros no contexto escolar. O “corpo
viado” é um modo de expressão e produção de saberes acerca do mundo, e o desejo
de destruí-lo faz parte da tentativa de se subtrair da escola formas de saberes, o que
entendemos como parte do epistemicídio (Carneiro, 2005) das sexualidades. O desejo
de eliminação do outro, aqui identificado como viado, figura como uma tentativa de
eliminar a inteligibilidade de um corpo que denuncia os anacronismos morais, estes
incapazes de dialogar com performatividades que já não cabem nos estreitos limites
das máximas morais de nossa sociedade, como analisa Butlter (2015).
Na perspectiva de Butler (2015), o relato de si inaugura uma reflexividade
em que o eu está em conformidade com a normalização ética e com os referenciais
morais de uma matriz prevalecente. A autora articula sua análise com base em
Foucault (2018a; 2018b) acerca da constituição dos modos de ser do sujeito nos

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Marco Antônio Torres, Izabella Marina Martinho Saraiva e Rubens Modesto Gonzaga

procedimentos do governo de si e dos outros em determinados regimes de verdade.


Nossas análises apontaram tanto para a produção do contexto de vidas insuportáveis
como para a constituição de resistências que buscam pela possibilidade de vidas
habitáveis. Estas são vidas que sustentam o desejo de reconhecimento, porém num
cenário marcado pelo recrudescimento de posições LGBTfóbicas.
Nem os relatos dos grupos focais nem a narrativa da professora Luana podem
ser considerados um relato de si, mas os/as docentes trazem no que disseram indícios
e ruídos da constituição de condições para que esse relato se articule. Os modos
como docentes e demais membros da comunidade escolar lidam com as contesta-
ções da norma de gênero na escola podem produzir ambiências im/possíveis para
o reconhecimento das sexualidades.
Consideramos que a escola, como território de interdependências humanas
extremamente complexas, é irredutível a análises absolutas, pois os relatos que dela
emanam em nossas pesquisas indicam possibilidades a LGBTI+. Na escola também
se têm articulado outros discursos de reconhecimento das sexualidades. Isso ocorre
até mesmo pelos corpos que rompem com as performatividades reguladas pela
norma de gênero e habitam em seu cotidiano. Determinadas articulações discur-
sivas — ainda que pontuais — realizadas por alguns educadores/as nos indicam
formas de resistência a processos de eliminação e subalternização de participantes
da comunidade escolar, pois a inteligibilidade de muitos dos/as colaboradores/as
desta pesquisa em nomear e denunciar a cisheteronormatividade revelam certa re-
sistência à ofensiva antigênero. Constituem como possibilidades de problematizar
para a comunidade escolar as normas reguladoras do gênero e das sexualidades, que
precisam ser desnaturalizadas, contestadas, transformadas.
O relato da professora Luana e dos/as educadores/as provocados/as a reco-
nhecer outras performatividades de gênero pode sugerir um modo como docentes
reconhecem ou não as sexualidades, que LGBTI+ podem ser considerados/as “gente
que chegou para ficar” na escola, pessoas que pela sua voz podem romper com a vio-
lência ética que silencia as dores e os sofrimentos de muitos/as no cotidiano escolar.

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SOBRE OS AUTORES

Marco Antônio Torres é doutor em psicologia pela Universidade Federal


de Minas Gerais (UFMG). Professor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
E-mail: torresgerais@gmail.com
Izabella Marina Martinho Saraiva é mestranda em educação pela
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
E-mail: bebelamartinho@hotmail.com
Rubens Modesto Gonzaga é mestre em educação pela Universidade Federal
de Ouro Preto (UFOP). Assistente em Administração na mesma instituição.
E-mail: rubensmodesto2006@yahoo.com.br

Recebido em 1º de agosto de 2019


Aprovado em 7 de maio de 2020

© 2020 Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPEd


Este é um artigo de acesso aberto distribuído nos termos de licença Creative Commons.

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