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DE SDLES
1
É.-M. Lajeu·n\ ie
i
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APRESENTAÓÃO
ANCISCO DJ SALES é
~:.
v,:,;: são FRINCISCO
grandes mestres da
tualidade e um verda-
humani sta ~o século
Sua grande preocupa-
fazer os homens che- /
~')'
.
DE SBLES
Deus pelos ' caminhos
<ladeiro amo\r. Lendo
bras - mais de 21DOO
/
E.-M. Lajeunie
, 4000 serm'Õ es, dois
s livros: Introdução
Devota e Tr atado do
e Deus - s$ntiremos
veu com um tinico ob-
VIVER J ESUS. Ele
resenta uma espiri-
ade aberta,~dinâmica
.Espiritua1 · dade es-
nos faz a ingir o
to Amor. Dit .ele,que
fo "pelos c àminhos do
nor nos libJrtaremos
J amor próprio que
iis é do qu~ um amor
i." Ainda f 1ala ele:
:iso disciplinar o
) e não o corpo. Pa-
rcitar-se n~ste ca-
~ preciso muita man-
~ simplicidade" .
E A ESPIRITUALIDADE SALESIANA
ramos que estas pa-
~ssam animá-lo na
encia cristã.
Oblatas de São '\ J)
Francisco de Sale~
são FRIINCISCO
FICHA CATALOGRÁFICA
DE SIILES
LAJEUNIE, E-M.
São Francisco de Sales e a espiritua-
lidade salesiana, Porto Alegre, RS,
Associação dos Amigos de São Francis-
co de Sales. 1983.
S UMÁR I O
Paris, França
I . A VOCAÇÃO PESSOAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Associação dos Amigos de São Francisco de Sales O meio salesiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Vila Santa Isabel, Caixa Postal 1361 14
CEP 90000 - Porto Alegre, RS - Paris (1578-1588) o humanista . . . . . . . . . . .
A crise de desepero . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
Fone: ( O51 2) 3 6 • 3 O. 6 4 O "anjo da escola" . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Pádua (1588-1592) ••..•.•.......••....... 27
O homem e a graça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
O otimismo heróico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
Diante do puro amor . . . . . . . . . . . . . . . ..... . 32
Dulce vivere, dulce mori . . . . . . . . . . . .... . 34
II. A MISSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . · · • . 37
O grande desígnio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
O pioneiro do catolicismo no Chablais .. . 39
o diálogo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
As visitas a Beze e a conferência malogr~
da . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
Genebra, Roma e Paris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
Pela união pacifica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
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I. A VoeAeAo P E S S OA L
O MEIO SALESIANO
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-~·~~·"•,' Era necessário lembrar essa página eloqüente de
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>$. Bremond, que determinou a opinião sobre esse drama
mo ral. Infelizmente, não houve em Paris resposta da
vi rgem negra: a voz que nos fazem ouvir aqui é a que
Fra ncisco empresta a Deus numa crise completamente
dif erente da que sentiu em Pádua, em 1591, cinco a-
nos mais tarde! Em Paris, aliás, ele não se conver-
'; teu do tomismo para o "molinismo", como se diz; ele
era " molinista", como se entende o molinismo, desde
sua i n f ância, antes de Molina, que só publicou sua
Con~ Õ~dia em 1588. Com efeito, desde sua infância
Francis co meditava sobre esse mistério da pred~sti-
nação e seu bom senso de pequeno cristão levava~o
a dizer que Deus nos predestina à glória em vista
}_...,,.~
de noss os méritos, e ao inferno em vista de nossos
desmer ecimentos. Ele havai prosseguido suas pesqui-
sas s obre esse ponto e tudo o havia confirmado em
seu sentimento: é o que nos confia em uma nota pre-
ciosa de 15 de dezembro de 1590, em Pádua (XXIII,
46-4 7 ) . A crise de Paris não foi, pois, de ordemdog
mática , m~s de ordem moral e, sem diivida, mística.-
'Jn
vo, sem o heróico amor necessário para alcançar a mo imen-00; vÕ-0, que -0oi-0 um ju-0to juiz e um Pai m,l-
vitória! Saint-Cyran será preso por causa disso. Mas h ehic.ohdi o-00, eu vo-0 amahei, Senhoh, pelo meno-0 ne-0
Montaigne, no entanto, diz a Francisco que apenas ta vida, -0e não me 6oh c.onc.edido amah-V0-0 na ete~na
duas coisas são certas: o prazer e a dor. Nesta vi- (XII , 19-20).
da, deve-se buscar o primeiro e fugir da segunda; as
certezas da fé dizem respeito a um outro mundo. Se- Vamos acompanhá-lo nesse drama. Ele não inven-
jamos religiosos, usemos a água benta, vamos ã pro- ta uma -0upo-0icão impo-0-0Zvel; pensa estar verdadeir~
cissão de Sua Majestade com capuzes ã cabeça, arma- mente condenado, não por capricho divino, mas por-
dos de chicotes, e saboreamos, em seguida, os fes- que merece. Aqui estão suas palavras_q~e foram ~r~-
tins preparados para consolar nossos sofrimento s! auzi das em sentido oposto: Se meu-0 meh,lt0-0 o ex,{_,g,{_,-
Tal é a vida, a vida natural, a vida de todos; are ~em - -0i mei-0 exigentibu-0 mehiti-0 - maldito enthe
ligião não pode mudar isso, aliás não é essa a suã o-0 maldito-0, devo -0eh daquele-0 que jamai-0 vehão vo-0
finaiidade. E você, quem é? No fundo, apesar de sua ~o doe.e -0emblante; ao meno-0, dai-me não -0eh daque~
devoção, você não é como eles? Você aspira aos seu s le-0 que amaldicoahão vo-0-00 -0anto nome (XXII, 19-20).
prazeres, à sua liberdade: estes lhe fazem falta! Vo os edi tores traduziram: "Se, porque eu o mereço ne-
cê é um deles não se separe deles. cessariamente", o que dá um caráter de predestina-
ção a o seu pensamento. E ele está muito longe do
Esta devoção não é imaginária. Nos jantares da quieti smo: em seu desespero ele ainda tem esperança.
rainha, que freqüenta, ele procura, ao tocar em sua E o amor puro nasceu: sem esperar pelo céu, ele ama
veste "com reverência", uma influência pura jun to rã a Deus neste mundo como se soubesse estar predes
dessa mulher tida como muito casta; raz e, mesmo com tinado ã bem-aventurança. -
outras personagens de mesma reputação (C. A, I, 12).
Em sua crise, todos os gemidos do homem tentado vêm
do fundo do seu coração atê seus lábios: a iniqUida
de e-0tâ aZ, phe-0ente, ela não vai emboha. Ele doh~ O "AN JO VA ESCOLA"
miu muito pehtuhbado. Sente-se atolado numa lama pho
6unda e -0em c.on-0i-0tênc.ia. Vê-se atacado pelo inimi = Segundo nos dizem, foi o título que ele tomou
go muito violentamente, e-0pezinhado, e como que ar- de São Tomás de Aquino, e esta palavra o situa. Sua
rastado para a beira de um abi-0mo, prestes a cair . irrad~ação no meio da juventude universitária foi
muito grande. Ele não ficava encerrado em sua inte-
Crise moral, crise relgiosa. A salvação so s e riori dade; já místico, não se perdia em sua oração;
encontra em Deus; é-lhe necessária umà graça poder o seu r etiro interior não era senão a volta à fontedi
sa: Sou indigente e pobhe: õ Veu-0, ajudai-me! või vina para seu enriquecimento pessoal; além disso~
-0oi-0 meu auxZlio e meu libihtadoh! Finalmente, esta distribuía a todos o tesouro do seu coração manso,
idéia: submeter-se a tudo incondicionalmente: Seh â del icado, serviçal, comovido por qualquer miséria
que minha alma não 6ic.aha ~ubmi-0-0a a Veu-0? (XXII , humana, dando de sua bolsa aos pobres, porque gran-
14-18). Submissão total e mansa, dirá Pascal em cri de era a miséria destes e imenso o seu número, se-
se semelhante. E eis o ato de sua submissão vibran= gu ndo nos informa L'Estoile.
te de amor e trêmula: Aconteça o que ac.ontec.eh, Se-
nhoh, VÕ-0, que tendu em vo-0-0a-0 mão-0 toda-0 a-0 c.oi- Cortês, sempre impecável em sua apresentação ,
-0a-0, VÕ-0, c.ujo-0 c.aminho-0 -0ao ju-0tica e vehdade; -0e- c asto, suscita a admiração dos "artesãos", das mães
ja o que 6oh que tivehde-0 dec.hetado -0obhe meu de-0ti d e familia, das vendedoras de alimentos da época,
no no etehno -0 eghedo de vo~-0 a phedutinacã o e de vo7i nestas ruas cheias de gente e de pregões do bairro
-0a hephovacão; vÕ-0, c.ujo-0 julgamento-0 -0ão um abi-0~ Mouffetard, da rua Coupegueule. Modesto, seu olhar
22 23
nada tem de atrevido, mas tudo observa, tudo ve, t u ma de seu tempo, a sociedade de sua epoca e a nece~
do ouve, experimenta a vida do povo em plena carne sidade que esta tem de uma religião de mansidão e
e sangue. Seus companheiros querem arrastá-lo par a de paz. Através do Jo~nal de L'Estoile, ficamos sa-
os prostíbulos, para esses botequins que equivale m bendo o que ele viu e sentiu. A sociedade ainda es-
às adegas de Saint-Germain: neles não põe os pés , t á dominada pela violência. Uma espécie de selvage-
mas sabe o que lá se passa. Se é otimista, não fun - ri a ferve no sangue com um gosto veemente de feroci
da sua confiança no homem numa visão superficial de dade. Os castigos são atrozes, as repressões terri=
seus costumes, mas numa visão profunda dessa nature veis. Enforca-se, queima-se, esquarteja-se com uma
za humana que só se agita em seus vícios por igno= espécie de alivio. O hoteleiro da Bergerie, em 1584,
rância desse repouso que o verdadeiro amor propor- foi queimado vivo na praça Maubert porque "engravi
ciona, ao qual, no entanto, ele sempre aspira. Fran dou duas de suas sobrinhas". Um jovem, que também
cisco, em seu curso, ~eu muita importância a esta e ngravidou a filha do presidente Bailly, foi conde-
frase de Agostinho: "Tu me fizeste para ti, Senhor ~• nado, em 1582, a ser enforcado na praça de Grªve.
E ele sabe que todos os seus companheiros, que ce - seu s amigos, armados com espadas, punhais e pisto-
dem ao in6ame êxta~e ~en~ual, têm, nas horas de lu - las, inici aram uma pequena rebelião e, ajudados pe-
cidez, o gosto, a necessidade, o desejo do êxta~ e la multidão, conseguiram tirá-lo da corda. Ainda em
e~pi~itual. Ele sabe o que lhes falta, o que possu i 15 82, Salcedo, somente porque projetou a morte do
atualmente, o que deve e quer lhes dar. duque de Alençon, foi esquartejado por quatro cava-
l os: o rei e as rainhas quiseram ver o espetáculo, e
Sua vocação se delineia e já se exerce: ini- deliciar-se com a vingança, de uma janela do Hotel
cialmente, foi membro da "Confraria de Maria", de - da Cidade, "especialmente arrumada e adornada para
pois assistente e, finalmente, seu prefeito. É, pois , ele s". Luta-se, mata-se por um nada. É o reinado da
a elite dos estudantes, cerca de quatrocentos, que v endetta nas ruas,nas praças públicas: as injúrias
se encontra sob o calor de sua ação. Desta elite sur pe ssoais ou familiares são resolvidas com tiros de
girão bispos, abades, vigários, magistrados: ele os pi stola ou com punhaladas. Até o prazer é brutal. Em
marcaria com seu sinal. Alguns lhe deverão sua voca 1583, na terça-feira de Carnaval, Henrique III e seus
ção, com Étienne Binet, seu admirador e amigo e, mais f avoritos ,mascarados,cometem "mil insolências'' em
tarde, seu colaborador. Jean Séguier estava entre Paris; quando anoitece, fazem a ronda de casa em ca
seus condiscípulos. Relacionava-se com essa podero- s a, com intenções hostis. Em 1584,essa brincadeira
sa familia, certamente com a mãe de B~r ulle, com o t orna-se mais exagerada. O rei e seu irmão d' Alen
jovem Pedro e com Bárbara Acarie, que entrava em çon, com seus favoritos, mascarados, disfarçados de co
seus primeiros êxtases. Certamente admirou e imitou merciantes, de padres, de advogados e "de qualquer ou-=
o exemplo que o "Sr. Roussel" dava aos estudantes, tr a espécie de profissão", correm a cavalo pelas ruas,
considerado um santo na paróquia de Saint-Étienne e d errubam algumas pessoas, em outras dão pauladas e
que ficava o dia inteiro rezando ou confessando os cometem "infinitas insolências" na feira Saint-Ger-
estudantes e "várias senhoras devotas": já havia, ma in, Festins e balés coroam esses festejos, enquan
pois, um ambiente de devoção, aberto para o futuro au- t o que os pobres morrem de fome. Estes são vistos~
tor de Filotéia 9 • c erta vez, saindo em bandos para ir comer o trigo
Nesse contato com o povo mais atuante do mundo, nos campos. Quando Henrique III e seus favoritos
aprende,principalmente, a conhecer a França, o dra- s aem em procissão, encapuçados, com chicotes de fan
t asia e o terço de "caveiras" na cintura, o escânda
10 atinge seu ápice. Os pregadores vociferam, mas
~eus clamores adquirem caráter político: a monarquia
9. Ver Boucher, Madame Ac_a~ie, 1854, tomo I, págs.
e desprezada, a Liga atinge o seu ponto alto.
26-27.
O "tripartismo" francês já assume forma e fig~ PÃVUA (1 588 -1 5 92):
ra: à direita, os partidários da Liga; à esquerda,
os huguenotes da oposição; no centro, os políticos.
A decapitação de Maria Stuart, no dia 18 de fevere! Fra nci sco f e z muit as amizades em Pa ris: q ua t ro
rode 1587, agita subitamente os partidos,opõe vio- jovens fidalgos quiseram a comp anhá-lo até Lião, e m
lentamente os partidários da Liga, animados pelos j ulho de 1588. Em Sales, o nde era grande a felicid~
Guise, e os hugenotes, partidários da rainha Elisa- de por r e vê-lo tão belo, t ão perfeito, sua mãe t e -
beth. tpoca trágica! vê-se, pelas notícias recebi- ria p a ssado os dias e as no ites a escutá-lo. Ele te
das de Londres, delinear-se a figura dessa "pobre vede partir novamente para Pádua, onde s e u pai que
rainha" inclinando sua cabeça para receber o golpe, r ia que fizesse o curso de direito. A partir de no=
cabeça que se tornara, pelos desgostos sofridos, "com- vembro, é matriculado na Un iversidade: F!Lanci ~cu~
Sale~iu~, Sabaudu~ Gallu~.
pletamente branca e desfeita". Estremece-se de cóle
ra e de horror. Todos os habitantes de Lorena ves=
tem-se de luto: o conde de Soissons, os duques de Curioso pela vida, p e las coisas e pelas p e s-
so as, suas viagens através da França e da Itália e -
Mercoeur e d'Elbeuf, os cardeais de Vendôme,de Gui-
ram viagens de estudo: ficou deslumbrado ao ent ra r
se, de Joyeuse, Anne d' Este, duquesa de Nemours e seus
filhos, Maria de Luxemburgo. Francisco de Sales par e m Pádua. Era a cidade do Sa nto e da famosa basíl i -
ca. Esta c on tinuava a ser e mbel e zada. Giotto havia
ticipa desse luto, e também a "Corte do Parlamento, decorado a cape la de Santa Maria da A!Le na; Pao lo
a Câmara das Contas, a Corte dos Generais, o Chaste Uccello e Fra Filippo Lippi a enriqueceram com o-
let, os Esleus e o Prévot des Marchans, Eschevins e bras-primas. O grande Donatello, sobretudo, havia
outros oficiais da cidade". A alma da Liga se con- er guido a estátua eqüestre de Gattamelata e o altar
cretiza e na quinta-feira, 12 de maio de 1588,no mo de Santo Antônio, obras admiráveis, inspiradoras de
mento em que Francisco opõe fim aos seus trabalhos~ idéias e de formas novas na arte veneziana. Com Man
ocorrem as barricadas: "Todos pegam em armas"; "o t egna (1431-1506), a escola paduana alcançava seu
artesão deixa seus instrumentos, o mercador seu co- ma is belo esplendor. Fora em Donatello que vira rea
mércio, a Universidade os livros, os procurados suas li zado o ideal de verdade e de beleza que buscavaco
bolsas, os advogados seus barretes, até os presiden mo a um sonho. Nele encontrara unidos a observação
tese os conselheiros empunham alabardas" 1 º. Ardor amorosa e livre da natureza e o culto da arte clá s -
revolucionário: o povo está contra o r ~ i e fiel, a sica, a invenção e a tradição.
favor de um herege, ao princípio de legitimidade.
Mas o que falta a esse · povo? Sem dúvida,a uni - Cidade de arte, Pádua era ainda mais urna cida-
dade social e a unidade política, mas, mais profun- de ciência. De Valle havia construido o belo palá-
damente ainda, a unidade do coração, a unidade d e cio da Universidade com sua "loggia" em arquitrave,
amor.O amor divino não é o senhor das almas; as oai André Vésale (1514-1564) introduzira, em 1540, o mé
xões da carne não estão submissas à realeza do Es= todo experimental em medicina: a anatomia era suces
pírito; a prática religiosa está artificialmente co- so e os estudantes, desenterradores de cadáveres, -
locada sobre uma vida muito mundana, sem influência fr eqüentemente ocasionavam novos mortos matando os
profunda sobre os costumes. E francisco acha que é guardiães de seus túmulos: sabemos que, para evitar
necessário revelar novamente o Amor aos homens, es - Pel o menos urna vez essas matanças, Francisco, pen-
se puro amor que agora triunfa em sua alma. sando que ia morrer, doou seu corpo aos médicos,
G~ ido Panciroli (1523-1599) ensinava, então, a ju-
r i sprudência. Durante esses três anos, nosso estu-
dan te se impregnou com o direito justiniano: um irn-
10. L'Estoile, JoufLnal, 1876, t omo III, pá g s. 11.14, 139 . Pe rador, um papa, uma religião, o direito de espo-
liar e de banir os hereges! Concordou com todos e s- O HO MEM E A GRAÇA
ses principias que anotou em seus cadernos d e cur -
sos, antes de enfrentar seu exame de doutorado, no Ao chegar a Pádua, resolveu estudar teologia
dia 5 de setembro de 1591. Ainda não estamos no t em quatro horas por dia e, assim, colocou-se sob adi-
poda tolerância. - re çào de Antônio Possevin (1534-1611). Este célebre
jesuita, humanista, educ~do~ e teólogo, compunha _e~
Em outro plano, as idéias que enfrenta são be m tão sua grande obra, a B~b l ~ot e ca ~elect a de nat~o -
diferentes. Pomponazzi valorizara em Pádua os méto - ne ~tudi onum (1593). Ele fortaleceu Francisco em sua
dos criticas. Trabalhando em textos autênticos, in - res olução de pertencer à Igreja e deve tê-lo acons~
terpretava Aristóteles como os árabes, não como Sa n lhado em seus estudos de teologia, cujo tema cen-
to Tomás. Em seu Tnatado da alma (1516) e em seu Tna tral foi o da graça. Os cadernos do estudante, in-
tado do de~tino (1520) chegava a um naturalismo qu e feli zmente, se perderam, mas conhecemos seus prin-
fazia franzir as sombrancelhas do inquisidor. Cremo cipai s assuntos: a gnaca e ~eu~ ~oconno~, a gnaca e
ni (1550-1631), com o mesmo espirita, iniciou seus a pnede~tinac~o, a pnede~tinac~o e a nepnovac~ o . O
cursos em 1591 e ensinava um aristotelismo puro: t o tema de suas meditaçoes infantis era agora aborda-
da forma é inseparável de sua matéria; é, pois, im= do d e modo cientifico. Ele se chocava com o agosti-
possivel que a alma exista sem o corpo. Ma s Vi ves nismo e com o tomismo tais como podia c o nhecê-los.
(1492-1550), amigo de Erasmo, havia pr e cis a mente se
parado, em seu De anima et vi ta (Bru ges, 1538), o pon Baius (1513-1589), depois de Lutero, havia en-
to de vista psicológico do ponto de vista fisico, e dure cido e desviado as posições agostinianas e a rea-
havia buscado menos o que é a alma do que seu modo ção contrã o agostianismo, no campo dos libertistas,
perceptivel de agir. Ao descrever fatos de consci ên foi d as mais veementes! Maldonado, principalmente,
eia - precursor da fenomenologia - não conheceria me= não hesitara em criticar Santa Agostinho diretamente:
lhor a natureza da alma por sua destinação moral do se o homem sem a graça, dizia, não pode mais fazer
que por sua função biológica? É por esse caminho q~ o bem, assim como não pode voar sem asas, se Deus
Cremonini, impelido pela Inquisição, parecia abri r só d á aos predestinados essa graça indispensável,
passagem para o pensamento cristão. Encontrãvamos os rep rovados não têm mais liberdade "de agir bem
assim o caminho de são Tomás e o 6eci~ t e no~ ad te ou ma l , assim como não têm o poder de voar", comopo
Domine, e tanto mais pelo fato de o pJ.atonismo fi ei dem então ser punidos aqueles que pecam? 11 Nesta l i
niano ter suscitado na Itália o movimento mistico do nha de raciocinio, havia um sofisma. Se o homem não
amon divino, que em Roma era encarnado pelo flore n- pode a gir bem para a vida eterna sem a graça, ele
tino Filipe Neri (1515-1595). Francisco, como sabe- pode a gir mal sem ela e contra ela. A autoridade ful
mos, possuia uma coletãnea manuscrita sobre o esp i- guran t e de Maldonado arrastava os espiritos e Fran~
rita desse santo. É nesse movimento do amor que e- cisco de Sales, ~ertamente, o seguiu.
le experimentava, se assim pode mos dizer, a reali da
de psicológica da imortalidade da alma, pois ela A reação contra Tomás de Aquino era mais com-
era capaz, sem ilusão possível de um amor eterno: du plexa e mais discreta. Os jesuitas deviam ensinar
vidar disso seria pôr em dúvida a e x periência dos sua d outrina, e trabalharam muito para ampliar sua
santos. Constituia para ele um argumento vital. Foi influência na Escola, fora dos circules dominicanos.
assim que, atacad o para n e nd en- ~e ã hene~ i a, sendo Sobre a predestinação, o Angélico tinha uma posição
obrigado a ler tantos li vno~ qu e connompi am, ele pª
de escapar às seduções do racionalismo paduano.
11. Maldonado, Opena vani a, 1677, torno III, Disput.
IIa, q. IV. f~ 119.
sabil idade ! Podemos merecer o ceu , podemos rrerecer o
alta de teologia pura. A idéia, perguntava-s e ele inferno: nosso mérit~ é terrível. Maldonado traba-
de um mundo que termina no céu ou no inferno seri~ lhav a por sua salvaçao ~0~ temor! ~o~so otimismo p~
compatível com a idéia de um Deus bom? Sua res posta de te r medo: Se, metUi me r~..{_t o.6 o ex.{_ 9..(_Jtem, devo .6e!L
é tão forte quanto sutil, mas sua própria sutileza - , mal dito ent/te o.6 mcd'..d,[to.6 . .. Após cinco anos de or9-:.
mal captada, tornava sua força perigosa. Ate os ção, de med itação e de es~udo, Franc~s~o se abando-
mais doutos tomistas não estavam de acordo. Domin- na, friame nte, por reflexao, nesta hipotese : Se eu
gos Soto, o teólogo do Imperador no Concílio de Tren .6ou.b e.6.6 e uta.Jt c.ondenado (que a..66im nêio J.ieja., Senho!t
to, que fora o mestre de Maldonado em Salamanca , a: Je.6u..6 ! ) po!t eJ.ita. vontade que o.6 tomiJ.i ta..6 c.oloc.a.m em
firmava que o homem, sem merecer a primeira graça, veu. .6 a. 6im de que J.iua. j u.ttica. J.ie ma.ni6e.6te, e.6ponta.
pode livremente recusá-la ou aceitá-la e, assim, de neam ente, eJtgu.endo o.6 olho.ó em meu e.6 tu.po !L pa.Jta o
cidir negativamente seu destino. Contra o que Luís Juiz Su.p!temo, diJtia. eom o p!to6eta.: Minha alma nêio
de Catene, também dominicano, sustentava que, se - e6taJtã nem um pau.e.o .6ubmi.6.6a a. Veu.6? Sim , Pai, poi.6
gundo São Tomás, Deus provê a alma com duas espé- tal 6oi teu beneplác.ito; que tua. vontade J.ieja 6eita.!
cies de graça: uma suficiente, à qual ela pode re-
sistir, a outra eficaz, à qual não pode resistir; Ma..6 i.6to, na am a.Jtgu.Jta. de minha. alma. , eu diJtia.
se todos os homens não se convertem, é porque não atê qu e Veu.6, mudando minha. vida e .6ua. .6entenca, me
estão todos providos eficazmente 1 2 • Assim se coloca Jte.6p onde.6 .6e: Tenha. c.on6ianca., meu. 6ilho ; nêio que!Lo
va a famosa questão de Auxili.6 que, desde então, dÍ a moJtte do pec.ado!t, ma..6 que ele .6e c.onveJtta. e viva.
vidia a Escola. Penso que Domingos Soto era um bom 0.6 moJtto.6 nêio me louva.Jtêio, nem a.quele.6 que vêio pa!ta
tomista e que havia transmitido o espírito a Maldo- o in 6eJtno. Como toda..6 a.6 c.o i.6a.6 , eu te 6iz pa!ta mim;
nado. Francisco de Sales atribuía aos tomistas, e atê o.6 p!tÕp!tio.6 Zmpio.6, de.6tinado.6 po!t .6eu pec.ado
não a São Tomás, como disse Bremond, uma opinião que ao dia. da. de.69Jtaca., ta.mbêm ele.6 eu o.6 6iz pa!ta mim.
não era a de Soto, mas a de Luís de Catene. Mas dei
xemos estas questões para os sábios! Na realidade ~ Não tenho ou.tJta v o ntade a não .6e!L tua .6anti6i-
Francisco de Sales sabia que se opunha a Santo Agos c.acão ; minha. alma. nada. odeia. do que 6ez . Po!L que,
tinha e a São Tomás, e não foi como fanfarrão da entã o , tua. alma eJ.itâ tJti.6te, po!t ~ue J.ie pe!ttu.Jtba?
"teologia moderna", como se disse leviamente, que E.6pe!L a em Veu.6 po!t que tu o lou.vaJta.6 a.inda., Ele, a
ele deixou de acatar esses dois doutores tão ama- .6~lvacão de tua frac.e, Ele, teu Veu.6. Tu não de de-
dos, mas c om "te mor e t remor", pronto ,, aliás, a dar Jta.6, tu .6u.biJtã.6 a montanha. do Senho!t, ã tenda. de
s u a ca beça e s ua dout r ina se a Igreja viesse a jul- Veu.6, do Veu.6 de ]a.e.Ó.
gar de f orma d i f e rente que .e l e.
_N ão eJ.itâ.6 moJtto : doJtm e.6 . Nêio, tu.a en&e!tmida.de
na.o e pa!ta a. moJtte, ma.6 pa.Jta qu e , c.onveJttido, Jten-
O OTIMISMO HERUICO da.6 9l6Jtia a. teu Deu~. CoJta.gem, meu pequeno J.ieJtvo
bem ~ndigno mai.6 6iel. PoJtque pu.6e.6t.e tua. e.6pe!tanca.
A predestinação não impõe nada ao homem, ensi- em m.{_m, e tua c.on6ianca em m~nha bondade, e po!tqu. e
nava São Tomás; a graça o deixa inteiramente livr e ; m~ 6o.6te_6iel em pau.e.a c.oi.6a, p!tonta. a .6o6Jte!L po !t
ele pode recusar a primeira graça; ele pode, tendo - m..{_nha gloJtia. e atê a c.ond en a.cão .6e tal 6o.6.6e do meu.
-a recebido, a ela se subtrair; que terrível respoE agJtad o, eu te eJ.ita.belec.eJtei J.iobJte muito.ó ben.6.
Sim, po!tqu.e tu qui.6ute 9l0Jti6ic.a.Jt meu nome po!t
12. Ver Sarpi, Hi.6toi!t du c.onc.ile de T!t ente (Histi Ut e .6 o 6Jtimento, .6 e p!tec.i.6 o 60.6.6 e - e mboJta. .6eja bem
ria do Concílio de Trento), traduçio de Amelot pequ ena. e.6.6a. 9l0Jti6ic.acêio e e.6.6a. exalta.cão de meu.
de la Houssaye, 1713, p. 192.
nome.. que.. nao ~e..ja paJta c.onde..naJt 1 j , ma~ paJta ~ a tvaJt_ do O ponto de vista do beneplácito do Pai. Tal é a
poJt tua beatitude.. e..te..Jtna tu me.. be..ndi1tâ~: é c.6ta a atit ude ~undarnen~al de Jesus Cristo: tal deve ser_a
g1tande.. gló1tia de.. me..u nom e.. ! ... do cristao; tal e a do doutor do amor, e desde Pa-
dua.
E que.. de..ve..Jtia e..u dize..Jt e..nt ão, ~e.não c.01110 an-t c.J :
Sim, Pai, pai~ tal áoi te..u be..ne.. piác.ito (XXII, 65-6 6 ). AÍ, logo que foi publicado, em 1 589, um teatino
lhe enviou um opúsculo que será seu código de via-
Tal é o clamor de São Fran c isco de Sales dian te gem: o Combate.. e..~pi~itual, de Dom Lorenzo Scupoli.
de um Deus justo e que pode jus t amente condená-lo, ma s 0 q ue encontra nele? Sua finalidade precisamente d~
cujo nome é Jesus. Este otimismo não repousa sobr e a fini da e seu caminho exatamente determinado. Scupo-
bondade natural do homem, que p ode tão facilmente me li procede, em armas espirituais, corno um mestre de
recer o inferno, mas sobre a bo ndade divina que po: esgrima, no estilo inaciano, mas com uma inspiração
de, neste mundo fazer um eleito de um condenado! Por própria e nova. Todo o movimento parte do princi-
tanto, podemos orar sem cessar, pedir a Deus ainda e pio do amor puro - móvel intencional - para chegar
sempre essa vida eterna que, por nosso pecado, perde à p o sse perfeita desse puro amor - finalidade real
mos, e Deus não pode então nos recusar a salvação: õ ou existencial.
poder da oração é infinito. Esta é urna convicção fun
damental no jovem Francisco de Sales. Eis a finalidade. A perfeição não consiste nas
práticas exteriores, na religião formal, mas "em to
tal desapropriação de nossa vontade e resignação ã
DIANTE VO PURO AMOR de Deus, submetendo-nos não apenas a Ele, mas a to-
da cr iatura por seu amor e isto unicamente para seu
O otimismo heróico culmina na submissão absolu- beneplácito, porque Ele assim o quer e porque Ele
ta ao beneplácito divino, qualquer que seja. Ele de- merece ser servido e amado" (Ch. I). Eis o meio es-
fine o ponto essencial do encontro do cristão e do senc ial, ao qual todos os outros se reduzem: "Quan-
Cristo: este ponto se encontra na agonia de Jesus, do se apresentar urna coisa querida por Deus, não in
no momento em que o Filho do homem diz ao Pai, dian- clina tua vontade a desejá-la sem antes ter elevado
te da morte mais atroz que existe: "Sim, Pai, não a tua inteligência até Deus para ver que tal é, de fa
minha vontade, mas a tua". A espiritualidade salesia to, sua vontade, e sem querer essa coisa pelo mesmo
na não é elíptica, não omite o termo t ndi~pe..n~âv c.t: motivo que Ele a quer e somente para agradá-lo" (Ch.
não vai do Tabor da alegria cristã ao triunfo da Pá~ V): o objetivo do amor é agradar a Deus por uma sub
coa sem passar pelo Calvário: Francisco de Sales sa- mis são absol uta de amor; tal é a regra de ouro da
be que Deus nos espera a todos no momento da agonia san tidade salesiana.
e é ai que nos defrontamos com o Absoluto e que nos-
so destino eterno é decidido. Todo caminho espiri- Estamos nos antípodas do homem revoltado. o be
tual deve nos levar, conscientes e confiantes, a es- nepl ácito de Deus nos aparece no ac.onte..c.ime..nto em
se confronto, no qual o beneplácito de Deus tomará que nossa razão fica impotente e nada vê: Jesus dian
para nós o semblante da morte. Estaremos prontos se te d a cruz, "loucura" para o grego, "escândalo" pa::-
cada dia, calmamente, pacientemente, adotarmos em tu ra o judeu! A opção está entre a revolta contra o ir
raci onal aparente ou a submissão confiante a uma sa
bed oria invisível. Submissão confiante, pois a von=
tade de Deus outra coisa não é senão o soberano bem,
13. D'Aubigné, em .te~ TJtagique..~, livro VII, v. 752, e se u beneplácito é a flor e o fruto desse amor sem
em "condarnneurs". limites. A revolta de Ivan Karamazov não pode, pois,
oeu s. Déage o viu ai durante aproximadamente rneiahQ
aparecer ao santo senão nos termos de um irraciona l ra, fulgurante de amor e de graça. Mil bandido~ que
infinitamente mais terrível do que aquele do acont e devastavam a praia de Ancona barraram-lhe o caminho
cimento que nossa razão não compreende, e contra Õ par a Roma. A volta por mar foi penosa: apô~ have4
qual ela se revolta acusando Deus de injustiça. Não pag o ca4o o p4eco da v{agem, diz ele, de~emba4camo~
se pode apelar pela justiça contra Deus: fazê-lo se no dia 5 de novemb4o, a noitinha, junto da~ coluna~
ria abrir ao ponto critico, corno diz Alberto Carnus: da gn.ande p4aca de São Ma4co~, em Veneza. Ele só to!:_
"os abismos mais desnorteadores sob os passos do re nou a sair de Pádua no fim de janeiro de 1592, e na
voltado"; o gênio de são Francisco de Sales abre: via gem de volta visitou Verona, Mântu, Pávia, Milão,
no mesmo ponto critico, a área infinita da liberda- Turim, etapas radiosas nessas cidades célebres, aber
de ao homem submisso; a submissão ao beneplácito di tur a também para o mundo, para a religião e para
vino unicamente liberta; a revolta nos une ao nosso as artes. Essa viagem tornou-lhe quase todo mês de f~
tormento. Aqui começam o céu e o inferno. vere iro. Finalmente, transposta a garganta do Monte
ceni s e atravessada a Maurienne, ele revê sua Sa-
bóia . Sua bonl~~ima e ca4Z~~ima mãe o esperava no
DULCE VIVERE, DULCE MORI catelo de La Thille, no extremo do lago azul com sua
pais agem tão bela de montanhas. No dia 2 de março
Sua teoria do puro amor foi posta à prova. A ele visitou seu bispo, o santo homem Claude de Gra-
"peste" - alguma gripe maligna - grassou em Pádua nie r14. A virtude do estudante já era célebre na al
em 1590: Francisco chegou às portas da morte. Viram deia de Annecy, um grande vilarejo com três ou qua=
-no então sereno e submisso, e suas palavras o def i tro mil habitantes, cercada e cingida em seus muros,
nem: é-me doce viver, é-me doce morrer, dulce, vive à sombra do castelo dos Nernours, irrigada por ca-
4e, dulce mo4i. Ele não mais se pertence, é todo de nais corno uma "pobre Veneza". As comadres cochicha-
Deu s. Supera, finalmente, o perigo e, portanto, é- vam que esse encantador fidalgo não beijava as jo-
lhe doce viver. vens na boca, "à moda da Sabóia", e Dom Granier não
pre cisava ser profeta para prever que ele seria "um
Seu ideal é submeter-se a toda criatura por grande servo de Deus, prelado raro e seu sucessor".
amor de seu Deus e, desde então, concebe a devoção
civil e a prática. Conhece os perigos deste mundo. Na realidade, Francisco teve de armar-se de to
Urna noite, seus companheiros querem pôr à prova a da s ua coragem para obter sua terceira vitória so=
virilidade desse devoto: ele pensa esta r sendo ata- bre seu pai. Ele, no entanto, a obteve e, abandonan
cado de verdade, puxa a espada e o bando recua com do a advocacia, renunciando ao amor da bela Suchet~
medo. Essa famosa castidade que admiram e invejam promovido a preboste no Capi t.ulo de Genebra, foi con
nele seria, pois, invencível? Francisco sai-se bem sagrado sacerdote de Deus no dia 18 de dezembro de
da brincadeira dessa ''famosa jovem" - 6amo~a puell a 159 3. O bispo chorava de emoção - E por que Vossa
- nos braços de quem quiseram jogá-lo. Para ele foi Exc elência está chorando? perguntaram-lhe. - Ah! a
mais difícil acabar com a perseguição de urna jovem aurora dá o orvalho, respondeu. O sol da Sabóia se
princesa, que estava apaixonada por esse belo fidal lev antava, sol que seria também o da França.
go. Sua virtude mostrou-se fulgurante em toda Pádua
e, em seu elogio do doutorado, Panciroli a celebrou.
Francisco, com 24 anos, era todo de Deus e só que- 14 . Ele não teve tempo, pois, de tornar a fazer a
ria viver para Ele. peregrinação fracassada a Roma, e tudo o que se
pôde narrar sobre o encontro de São Francisco
No dia 19 de outubro de 159 1 ele foi ao santuá de Sales com São Felipe Neri é lenda. Ch. A. de
rio d e Loreto cons agrar seu corpo e seu coração ã Sales, ao misturar seus documentos, fez seu tio
seguir, em 1591, o itinerário de 1598.
'l A
-
II. A MI S S A O
O GRANDE DESÍGNIO
4íl
bre a Igreja 16 • Este escrito imperfeito mantémotom
da conferência vivida: seu interesse é fazer com que 1a . É uma nova? Como a ligam a Jesus Cristo? Vocês
assistamos a esse nobre combate. Não se trata, pois, di zem que a primitiva havia se obscurecido, altera-
de um livro de erudição, nem de biblioteca: as idéias, do, que vocês restituiram seu brilho? Mas Nosso Se-
os sentimentos em jogo se acham mais nessas cabeças nho r acendeu essa lâmpada pafl.a cobfl.i-la com u.m al-
e nesses corações do que nos livros, e o tom da po- qu e.l11.e.? Vocês ~etrucam afirmando que a verdadeira
lêmica muda, torna-se mais humano, amistoso. Fran- Igr eja é lnvi.õlve.l: e como todos os povos que devem
cisco de Sales diz Se.nhofl. Calvino; se algum dia lhe ne la entrar a encontrarão, já que não podem vê-la e
escapa e o chama de pu.nai-6 ( fedorento
11 11 )todos se
,
reconhecê-la? O que diz o seu cfl.e.do? Que ela é u.na:
surpreendem! Os insultos homéricos, então tão comuns mas a sua igreja é múltipla e se subdivide a cada
nesse gênero, são por ele banidos e até a ironia se dia . Que é -6anta: onde estãb seus milagres? Que é
suaviza num sorriso; o horror do erro se ameniza em catôlica: suas igrejas são particulares. Que é apo-6
bondade para com os homens. O apologista apresenta .:tÕlica: onde estão os seus apóstolos? Tal é a luz
suas razões com bom cofl.acão a esses l11.mão-6 .õe.pafl.a- de um bom senso otimista que percorre os textos ale
do-6, seus amigos: Nu.nca le.11.e.i-6 algu.m e.ó c11.l.:to qu.e. vo-6 gado s, os argumentos, as refutações. O apologista~
-6e.ja dado pofl. u.m home.m mal.ó a&e.lcoado a vo-6-60 .õe.11.vl com a Biblia, chamava em seu auxilio os antigos pa-
co e.-6pl11.ltu.al do qu.e. e.u. o .óou. (I, 5): Na disputa, e dres que eram reconhecidos por seus ouvintes. E con
urna revolução que se inicia. clu ia: vocês dizem que estão na Igreja; estão fora
O método é também excelente. Esses senhores são de la; vocês dizem que estão na verdadeira fé, mas
doutos, mas não eruditos: abafarão a luz sob um a- não observam suas regras.
montoado de citações. Utilizam-se apenas da pala- A fé é fundada na palavra. É o verdadeiro fun-
vra: 0-6 mlnl.õtfl.o-6 -6Ô qu.e.11.e.m combate.11. com a E.ócfl.itu.- damento, a verdadeira regra; mas esta regra deve ser
11.a, e. e.u. o qu.e.11.0 (I, 346). Vocês acham que ela é bas apl icada: é necessário o compasso e a mão de quemde
tante clara para espiritos comuns; o melhor texto les e serve. O seu uso tanto pode ser be.m como mal
não é o da Vulgata, que foi o texto oficial dessa ne.lto. Não basta saber que a palavra é a regra .óe. e.u
Igreja primitiva que v~cês reconhecem? Assim, esta- não -6 e.l q uai palav11.a ê.. de. Ve.u.-6 , onde. -6 e. e.nco n.:tfl.a,
mos de acordo, com a ressalva de que, nos lugares de que.ma de.ve. p11.opo11., aplicafl. e. de.clafl.alt. Com a regra
cisivos, poderemos recorrer às versões criticas, ao fu ndamental, a palavra de Deus, necessito da Igreja
grego e até ao hebreu. de Deus, Jte.gJta de. apllcacão e. de. e.xpücacão (I, 144-145).
Em seguida, o apologista se interpõe entre os Com efeito, a Escritura só pode ter um sentido
ministros e seus discipulos. Em nome de q uem lhes div ino, mas é sobre esse sentido que há desentendi-
falam esses ministros? Em venho da parte de meu bis mento. Certamente, não ê a Escritura qu.e. te.m ne.ce.-6-
po, que vem do papa, vigário d~ Pedro, que vem do .óld ade. de. Jte.gJta ne.m de luz e..õtJtanha, como Beze. acha
Cristo, que vem de Deus. E eles? Não vêm da Igreja qu.e. nÔ-6 acJte.dLtamo-6, .õâo no-6.óa-6 e.xplicacõu; não te
primitiva: separaram-se dela. Não vêm do povo: o po mos necessidade de um juiz e.n.:t11.e. Ve.u-6 e. nÔ-6, mas sim
vo não tem esse poder. Viriam de Deus, por missãoex ent re um homem tal corno Calvino e um outro tal como
traordinária? Onde estão seus milagres? E mesmo os Mor us. Não perguntamos se Deus entende melhor que
milagres não poderiam bastar: Paulo, suscitado pelo nõs sua palavra, mas se Calvino a entende melhor do
Senhor em pessoa, foi enviado pelos apóstolos. que Agostinho (I, 205-207). Quem vai nos esclare-
cer ? Algum outro homem? E o que tem ele a mais do
Essa Igreja na qual vocês pretendem estar,qual que Lutero ou de Cipriano? Qu.e. e.te. 6ale. tanto quan-
e, de onde vem? É a primitiva? Vocês se separarani. de- ta qu.e.ifl.a da analogia, da e.ntu.-6la-6ma, do Se.nho !t,
da E.õpl11.ito, mas se temos de nos aventurar, prefiro
minha barca. Meu Salvador teria me reduzido a essa
16. Constitui o volume atual das Conthoveh.óe-6, Obras, tomo I. Per igosa travessia? Teria me deixado sem qu.alqu.e.Jt
juiz ~upnemo na tenna? Não poderia ser: Eu a6inmo Francisco de Sales não convenceu todos os seus
que e~~e juiz não é outno ~enão a Igneja católi ca. ouvintes, mas criou neles o desejo da união. Vale
a pena citar aqui os sentimentos do procurador Clá~
Já que a igreja particular deve julgar entre d io Deprez; são de atualidade comovente: "Creio fi~
dois irmãos em desacordo, por que a Igreja univer- memente, escrevia ele aos ministros de Genebra em o~
sal não o poderia fazer entre todos os irmãos divi - tubro de 1598, que não há dificuldade de religião
didos? Paulo, aliás, nos diz que a Ign eja do Deu~ que n ão possa ser resolvida entre pessoas carido-
vivo e coluna e ~u~tentâculo da vendade (1Tm 3,15). sa s e isentas de quaisquer preocupações, mas apenas
Se o Senhor se encontra no meio de dois ou três di s des ej osas de buscar a verdade pela glória de Deus
cípulos reunidos em seu -nome (Mt 18,20), que dinã e pela salvação de sua Igreja; pois é infalível a
que a a~~embléia da Igneja univ en~ al d e todo~ o~ tem promes sa que Jesu~ Cristo fez_aos seus, a de que e~
po~ tenha ~ido abandonada ã men c ê do enno e da im= tar ia com eles ate a con~umaçao do mundo. Mas como
pie dad e? (I , 209-210; 74-77). aco nte cerá isto no meio de uma divisão? Busquemos,
poi s, e abracemos, em nome de Deus, esta união, sem
A Igreja, no entanto, não pode ficar sempre reu a q ual não podemos ser cristãos. O principal laço é
nida em concílio. A quem, pois, recorrer nessas di~ a c aridade: que ela, portanto, nos aqueça, a fim
ficuldades comuns que ~obnevêm dianiamente? O povo de que, não por meio de vãs disputas e discussões,
antigo dispunha de um tribunal e de um padne que se ma s p elo fio da verdade, possamos amortecer o fogo
mantinha à disposição pana o ~enviço de Iahweh (Dt da di ssensão que inflama todo mundo ... '' (XXIII, 254
17, 10-12), ao qual se devia obedecer sob pena de -2 55) . Estit carta reflete, sem dúvida alguma, o es-
morte. O novo povo ficaria sem um juiz supremo a ser pír ito s al8siano.
viço de Jesus Cristo, seu chefe? Pedro lhe foi da=
do: Ona, tudo i~~o não aconteceu apena~ com São Pe-
dno, ma~ também com ~eu~ ~uce~~one~ , pai~ penmane- AS VISI TAS A BtZE E A CONFERÊNCIA MALOGRAVA
eendo a cau~a penmanece o e6eito; a Igneja tem ~em-
pne nece~~idade de um con6inmadon in6allvel ao qual
po~~a dinigin-~e, de um 6undamento que a~ ponta~ do Fr ancisco de Sales tentou estender o diálogo
in6enno, e pnineipalmente o enno, não po~~am dennu- aos min istros: teve relacionamento com vários deles,
ban ( I , 3 O5 ) • sobretudo com Théodore de Beze. O grande ancião pas
sava por d u ra provação naquele momento. Adoentado
Permanecendo a causa, permanece o efeito. A cau desde o mê s de setembro de 1595, tivera de renunciar
sa e a necessidade de um palton univen~al e in6all~ ao ensino da teologia e não via ninguém à sua volta
vel; o efeito é a permanência desse pastor. Ao argu que o pudesse substituir: "Se Deus não nos estender
mento histórico da sucessão apostólica, o apologis= sua mão, e screvia a Grinée, acho humanamente impos-
ta dava como fundamento o fato essencial de uma fun sive l q u e esta escola se mantenha por muito tempo~
ção necessária. Mantinha, no entanto, o princípio A c rise da escola acrescentavam-se a divisão dos mi
de colegialidade da Igreja: o papa não é de tal for nis tro s e o declínio da fé: o povo abandonava apre
ma o bispo universal de quem o~ outno~ bi~po~ ~ãõ gaç ão para jogar "boliche" ou para ir às festas re=
apena~ vigânio~ e ~ ub~tituto~; o~ bi~ po~ ~ão, na nea gio nai s. Tais aborrecimentos fizeram pensar que Be-
tidade, pnlncipe~ e~pinituai~, che6e~ e bi~po~, não ze poderia ser abalado? Penso que uma outra razãode
vigânio~ do papa, e ~im de No~~o Senhon (I, 300). E~ Cid iu Francisco de Sales a tentar suas visitas: Be~
tas coisas difíceis eram ditas em um estilo claro , ze, e m uma carta pública a Henrique IV, exprimiu seu
arejado, vibrante, "não antiquado" e cujo vigor con for te desejo de unidade; não se poderia, dizia ele,
"b u sca-l
- a demasiadamente"; por ela ele daria "mil
ciso faz às vezes pensar em Pascal.
vidas" 17 • Clemente VIII, informado destas coisas,a- a p r ovav am. Este encon ~r o se revestia, pois de impo~
chou bom enviar Francisco de Sales ao encontro do tância única: Roma e Genebra, oficiosamente, iriam
chefe calvinista, a fim de tentar convencê-lo. ai conferenciar, embora isto tivesse de ser feito
apenas sob a responsabilidade do bispo. Mas a opos!
O preboste esteve com ele pelo menos por três ção à conferêncià prevalecia na Companhia: as nego-
vezes a partir de abril de 1597. A primeira conver- cia ções se prolongavam sem resultado.
sa foi sobre a salvação na Igreja romana. Beze concor
dou que era possível salvar-se nela, que não se po= Para sensibilizar os ministros, nossos missio-
dia negar que essa Igreja era a Igreja-mãe. Por que, nár ios decidiram celebrar as Quanenta Hona~ de An-
então, a reforma e tantas guerras? prosseguiu Fran- nema sse, às portas de Genebra. Nos dias 8 e 9 de se
cisco. A salvação, continuou Beze, é muito mais di- t embro de 1597, multidões consideráveis, aos milha=
fícil na Igreja católica por causa das obras que se res, acorreram dos arredores às indulgências. Dian-
julgam necessárias e que nela não se realizam.Assim, te d essas aglomerações, Chérubin intimou os minis-
cumulam-se as almas com grandes pecados; só a fé é tros a cumprir suas promessas e a sustentar o cho-
necessária à salvação; as obras são apenas de conve que d as razões católicas. La Faye respondeu com um
niência. O preboste voltou com muitos textos provan l ibelo sobre a idolatria da cruz 1 8 • Francisco de Sa
do essa necessidade das obras, mas Beze as lia numa les replicou com sua Ve6e~a do E~tandante da Santa
outra ótica; tudo se reduzia à única necessidade da Cnu z . O debate se desviou para uma polêmica inope-
fé: não houve entendimento. rante .
A terceira visita dá, no entanto, o que pensar: Entretanto, em novembro de 1597, Chérubin ha-
Francisco oferece uma honesta pensão a Beze, por par vi a s ubstituído, no cantão de Thonon, o preboste
te do papa, se ele se dispusesse a deixan Genebra ~ doe nte . Com sua poderosa voz, não cessava de desa-
Aqui não se trata mais de fé, mas de uma salda: pa- fi ar o s ministros. Um jovem mestre alemão, chama-
rece que o arquiministro tivera desgostos em Gene- do por Beze para substi tuÍ-lo, Hermann Dürrholz, Ug
bra e aborrecimentos com a república; o Estado não nani du~ em latim, aceitou o desafio. Veio inopida ~
era mais tão dócil à Igreja. Seja como for, é bem mente a Thonon, na véspera de Ramos, em 1598, leu
comovente pensar que São Francisco de Sales estimou uma s notas sobre a inautenticidade dos macabeus e
Beze e celebrou missa por ele. Sempre teve esperan- provou , assim, que era falsa uma religião que se a-
ça de sua volta~ Igreja e conservou cdntato com e- poi ava e m falsos fundamentos. A discu s são teria po-
le por meio de a migos: André de Sauzéa, especialmen dido du rar semanas sem chegar a nenhum resultado,
te, veio visitá-lo de sua pàrte, em 1603, mas sem= mas o p adre Chérubin, felizmente, havia feito seu
pre sem resultado. Be ze morreu em sua crença em 1605. adversário assinar o compromisso de continuar adis
put a at é sua conclusão. Ora, não lhe deram tempo de
Com Beze, e por ele, pretendia-se atingir toda di zer toda s as suas razões na tarde de domingo: Lig
a companhia dos ministros. Um projeto de conferên- nardiu s h a via partido repentinamente desde segu nda=
cia pública havia nascido de diversos contatos do -feira c edo , prometendo voltar, mas não o v i ram mais.
célebre padre Chérubin com os genebrenses. Dois mi- ~hérubi n mandou publicar sua promes s a e int i mou-o
nistros, Carlos Perrot e Simão Goulart, eram seus Jud icia lme nte a cumprir sua pa lavra .
partidários, e também o Conse l ho; Luís de Sales ha-
via negociado suas condições: o bispo e o núncio o
18. Bnieü Tnaitê de la Ventu de la Cnoix et de la
1 7. Manquu de l 't gli~e, 1592, f9 3, 12 - 13. maniene de l'hononen, Genebra, 1597.
A questão assumia repercussão pública. A paz nai s de todas as paróquias do Chablais. A maioria
de Vervins (2 de maio de 1598) reconciliava a Fran- dest es abjurantes eram chefes de fumilia: represen-
ça e a Espanha. O duque de Sabõia estava ai envolvi tav am, ao que parece, a maioria da população, que
do e Henrique IV pretendia incluir Genebra. Os ares, fr ancisco de Sales estimava em 25.000 almas. Aosob~
pois, eram favoráveis à causa católica e grandes fes tin ados, o duque não poupou suas exortações e suas
tas se preparavam em Thonon para dar um poderoso im "conferências". Uma "dezena de familias", diz Geor-
pulso às conversões: deveriam ser celebradas as Qua aes Rolland, não cedeu: o duque os exilou. Aos dele
henta Hoha-0 com uma solenidade excepcional no fim gado s de Berna, que pediam a manutenção de pelo me:-
de setembro e no começo de outubro; o legado ponti- nos três ministros, ele respondeu: Estou de acordo
fício, Alexandre de Médicis, negociador da paz, es- se você s aceitarem três de meus sacerdotes em sua
tava sendo esperado ai pelo duque. A conferência pú cidade. Não se tratava de uma brincadeira espiritu~
blica teria sido o torneio dessas festas, mas os mI sa.
nistros se obstinaram em sua recusa, e esta fuga foi
uma das principais causas do desabamento da Reforma
em Thonon. O sábio historiador da A~ademia de Calvi GENEB RA, ROMA E PARIS
no, Carlos Borgeaud, o reconheceu: "Desertar do cam
po onde o adversário havia lançado a luva do desa=- A conquista do Chablais não podia satisfazer
fio e estava aguardando era uma confissão de incap~ nem o duque, nem o bispo, nem seu preboste: Genebra
cidade" 19 • era o alvo principal. Havia dois meios para conver-
tê-la ao catolicismo: ou a guerra, ou a diplomacia
Pela pena de seu procurador, Cláudio Deprez,os e a penetração pacifica. O duque não recusava meio
calvinistas de Thonon reprovavam energicamente os mi algum, mas deixava o canhão como último argumento. O
nistros de Genebra por sua atitude de decepcionante. papa sabia que mexer com Genebra seria despertar a
Esta disputa, dizia Deprez, era "muito necessária guer ra na Europa; a Inglaterra e Flandres continua-
para fortificar os enfermos": "Vocês viram como a vam lutando contra a Espanha; bastaria ameaçar a ca
tempestade e a tormenta arruinaram nossas igrejas pital calvinista para acender todos os furores pro:-
sem que os marinheiros se tenham oposto". Houve pa- te stantes . Francisco de Sales pensava como o papa:
lavras ásperas: "Se os apóstolos tivessem se conten a gue rra deveria ser proscrita.
tado em ficar encerrados em quartos bem cômodos pa:-
ra ensinar o povo por meio de escritos ~ sem ousar Teri a ele tido conhecimento do Edito de Nantes,
sustentar sua doutrina de viva voz, não teriam pro- cuja publ icação o rei retardava por deferência ao
porcionado tão grande progrésso ao reino de Jesus cardeal legado? De qualquer forma, desde o dia 15
Cristo" (XXIII, 253). de junho de 1598 ele revelou a Riccardi um projeto
diplomático ousado. Ele era de opinião que Henrique
Não se pode, no entanto, dizer que a "redução" IV, a convite do papa, se quisesse mesmo dedicar-se
do Chablais foi um golpe de força do príncipe, mas a isso "com todas suas forças", poderia conseguir
o sucesso inesperado da missão permitiu-lhe proscre que Genebra abrissse suas portas ao culto católico
ver dai o culto protestante, sem violentar demais ã Por me io do Interim: Sehia, dizia ele candidamente,
grande maioria das consciências. Com efeito, em um eohtah o ~alvini-0mo pela haiz (XI, 339). No dia 17
mês pode-se registrar cerca de 3.000 renúncias nomi d~ junho, o bispo, Cláudio de Granier, enviava, sem
duv ida a pedido dele, uma súplica ao papa no mesmo
sent ido. Mas por vários motivos, essa carta ficoues
19. Ch. Borgeaud, Hi-0toihe de l'A~ademie de Calvin, que cida nas gavetas da secretaria de Estado. A San~
1900, p. 252. ta Sé ainda não tinha núncio em Paris. O Edito de
Nantes, sobretudo, tinha deixado o papa muito exal-
tado. Foram necessárias a paciência e a s áb ia diplo
macia do pabre d'Ossat para fazê-lo compreender que
a Igreja poderia tirar ótimo partido desse Edito e
que o rei não estava errado ao dizer que ele seria,
em suma, mais proveitoso para os católicos do que
para os protestantes. Foi então, em fins de dezem-
bro de 1598, que Francisco de Sales foi a Roma para
ai fazer seu exame de episcopado e advogar as cau-
sas de sua igreja de Genebra. Trouxeram à luz a sú-
plica de Granier e o preboste soube convencer Cle-
mente VIII: o resultado era imenso. Pedir a Henri -
que IV para introduzir a missa em Genebra por mei o
do Interim era reconhecer claramente o princípio da
tolerância, fundamento do Edito. Quando o novo nú n
cio, Gasparo Silingardi, portador da carta de Gra=
nier, apresentou-se à audiência real no dia 9 de ju
lho de 1599, Henrique IV louvou as vantagens de seu
Edito: era uma boa abertura. O núncio pediu-lhe, pois,
para querer "com todas as suas forças" introduzi r
a missa em Genebra; ele lhe prometeu Que o faria .
o princípio da tolerância triunfava em Paris, mas não
em Genebra. São conhecidas as trapaças suscitadas
pelo irrequieto e pérfido duque; suas duas políti-
cas, de paz e de guerra, conduzidas simultaneamente,
prejudicavam-se reciprocamente 20 • O golpe fracassa -
do da Escalada (1602) tornava impossível o Interim
em Genebra.
.
PELA UNIÃO PACÍFICA
Apesar dos fracassos, Francisco de Sales perm~
neceu sempre fiel à sua idéia de uma união pacífica
das Igrejas protestantes com a Igreja católica. Com
preendamos bem sua posição: ele reconhecia os erros '
da Igreja romana, sobretudo em suas instituiç6eshis
tóricas, humanas e sujeitas, portanto, à corrupção; 1~!
,.
TEXTO
C: A
se todos os bispos tivessem sido corno ele. O duque i grej a de Genebra e não queria passar nem por ambi-
de Bouillon e os genebrenses mostraram-se de acordo: cioso nem por ingra to para com sua pátria. Henrique
todos os seus concidadãos, garantia Francisco Cha- IV tentou, no entanto, prendª-lo a si por urna doa-
peau-rouge, "o consideravam corno um homem de bem ••• ". ç ão real de bons escudos. O fino filho da Sabóia es-
Que não ter.ia ele feito na França para pacificar pro capou de maneira maravilhosa: náo tendo então neces
testantes e católicos? - sidade dessa pensão, rogou a Sua Majestade para co=
l o cá-la sob a guarda de seu tesoureiro Sully; ele
Além disso, o rei apreciava muito sua devoção. r ecorreria a ela nos dias de penúria. Nunca, confes
Ouvira falar muito de sua quaresma do Louvre e ele sava o rei, havia recebido recusa "me lho r temperada~•
pr6prio ficara encantado com sua eloqüªncia: esta Apr eciou tanto esse filho da Savóia que tentou a-
doutrina elevada e bem esclarecida pelo bom senso cor tra i-lo para sua corte alguns anos mais tarde: so-
respondia ã mais profunda necessidade da França. A= nhava fazer dele um cardeal, talvez um papa. O san-
p6s um século de renascimento pagão, a ambição dos to homem estava pronto, por volta de 1608, para ir
primeiros humanistas cristãos não estava satisfeit a: à França se Paulo V assim o tivesse desejado (XIV,
"Oferecer ao Cristo um culto material, dizia Erasmo, 9-10 ). O rei, a rainha, a corte, os parisienses ha-
e atos materiais, ver nisto a mais alta religiã o, v iam sentido o quanto Francisco de Sales amava a Fran
cornprazer~se nessas práticas e tornar a liberdade de ça; no dia 15 de agosto de 1602, ele compôs para a
condenar o próximo" era, evidentemente, romper com França urna magnifica oração ã Virgem:
o Evangelho. Henrique IV não era devoto, mas era cren
te; colocava, segundo suas magníficas palavras em Ca V -0ac11.atl-0-0ima e. be.m-ave.ntu~ada Se.nho11.a, que.
naye, "sua consciªncia acima de seu reino"; ele via ut ai-0 no mai-0 alto do pa11.aZ-00 da 6e.licidade., te.n-
que um povo não pode ser moralizado sem verdadeir a de. piedade. de. nÕ-0 que., ~n6e.lizme.nte., e.-0tamo-0 no de.-
religião. Francisco seria o ap6stolo dessa religião -0e.11.t o da mi-0é11.ia; e.-0tai-0 na abundância da-0 de.lZcia-0,
ponderada e viva. Não tendo conseguido retê-lo, fe z e.-0tam o-0 num abi-0mo de. de.-0olaçÕe.-0; dai-no-0 6011.ça pa-
com que lhe escrevessem, por seu amigo comum De Hayes, 11.a -0upo11.ta11. toda-0 a-0 a6liçõu e. que. -0e.jamo-0 -0e.mp11.e.
"que ele via muitos de seus súditos viver com toda espé- apoiado-0 pe.lo vo-0-00 Be.m amado, unico -0u-0te.ntãculo
cie de liberdade, dizendo que a bondade e grandeza de. no-0-0a-0 upe.11.ança-0, Única 11.e.compe.n-0a de. no-6-00-0 til.a
de Deus não davam tanta importância ãs ações dos ho bal ho-0, Único 11.e.mêdio pa11.a no-0-00-0 male.-0. Oh! Vi11.ge.m
rnens, o que ele condenava totalmente, mas que el~ 9lo 11.io-0a, 11.ogai pe.la Ig11.e.ja de. vo-0-00 Filho; a-0-0i-0ti
condenava totalmente, mas que havia outros também com vo-0-00-0 6avo11.e.-0 todo-0 0-0 -0upe.11.io11.e.-0, o Santo Pa-
em grande número, que tinham urna opinião tão baixa d11. e. , 0-0 p11.e.lado-0 e. bi-0po-0, e.-0pe.cialme.nte. o de. vo-0-0a
de Deus que acreditavam que · Ele estivesse sempre cid ad e. de. Pa11.i-0. Se.de. pll.opZcia ao 11.e.i: vo-0-00 av& Da
pronto para surpreendª-los em qualquer falta leve a vi be.ne.6icou o 6ilho de. J&nata-0 e.m me.mô11.ia do-0 le.'1.~
f i m decondená- los eternamente, o que ele também não vico -0 e. onlcio-0 11.e.ce.bido-0 de. J&nata-0, e. e.-0te. 11.e.i ê
aprovava. E que ele desejaria que, entre esses dois ne.to de. um de. vo-0-00-0 mai-0 6iêi-0 e. de.voto-0 -0e.11.vo-0,
extremos, o servo de Deus ... instruísse seus súdi- o be. m-ave.ntu11.ado Sã.o Lul-0; nô-0 vo-0 11.ogamo-0 que. lhe.
tos e os afa s tasse desses extremos por suas prega- e onc e.dai-0 a vo-0-0a p11.ote.ção e.m nome. de.-0-0e. -0anto 11.e.i.
ções e confe r ªncias, e ainda pelos livros que rnand~ A 11.ainha, que. te.m a hon11.a de. t11.aze.11. o vo-0 .60 nome.,
ri a i mpr i mi r" (Des Hayes, p. 51) . Nada exprime me- e.-0t e.ja -0e.mp11.e. -0ob o ab11.igo de. vo-0-00-0 -0anto-0 6avo-
lhor a n ec e s s idade que a França tinha, e ntão, de um '1. e.-0. D lZ.11.io ce.le.-0te., 11.e.gai 0-0 li11.io-0 da vo-0-0a F11.an
tal h omem . ca. c om vo-0-0a-0 -0anta.-0 bê.nção-0, a 6im de. que. -0e.ja.m b11.a.n
C~-0 e. pull.0-0 na unida.de. da. ve.11.dade.i11.a nê e. 11.e.ligião~
O r ei mandou buscá- lo em 16 0 2 , pelo d u que d'É- Vo-0, que. -0oi-0 um ma11., conce.de.i a-0 onda.-0 de. vo-0-0a-0
pernon, mas Francisco d e sculpou-se : e s tava ligado à 9'1.a. ça.-0 a. e.-0te. jove.m e.n6im; vÕ-0 que. -0oi-0 e.-0t11.e.la do
mah, -0ede 6avohâvel ao navio de Pahi-0, a 6im de que partidário decidido da espiritualidade teresiana;
ele po-0-0a apohtah no -0anto pohto da gl5hia, paha aI pe rmanecerá por toda sua vida com desconfiança da
louvah o Pai, o Filho e o E-0 plhito Santo, pelo-0 -0~- "v ida supereminente".. Que papel ele desempenha, en-
culo-0 do-0 -0éculo. Am ~m (VII, 461-46 2 ). tão, nesse foco onde se acende a chama da renovação
Urna tal oração, dita com esse coração e essa espiritual na França?
fé, dava ao mundo a sensação de que a Igreja é um
universo de espíritos, abrangendo e ao mesmo tempo Segundo Brernond, o jovem prelado ainda está
ultrapassando o espaço e o tempo, na qual os pere- se buscando: "Ele se cala, observa, admira, critica,
grinos deste mundo estão ligados pela fé, pela ora- ob serva-se, aplica-se, está à escuta"; "pretende gra
ção e pelo amor aos cidadãos do céu, no seio da di- dua r-se" nessa academia de santidade (Brernond, I;
vindade bem-aventurada. É sob essa luz que devemos 93- 94): Mas quais são os fatos? Bárbara Acarie, des
ver o impulso espiritual que esse santo vai suscitar . de sua chegada, o torna corno confessor, e ele lhe en
sin a a se confessar, pois ela não o sabe, acusando=
-se de imperfeições que não são matéria de perdão
O CIRCULO ACARIE (IV , 434). Ele observa, julga, analisa muito lucida
mente seu êxtase e o aprova. Numa conferência deci=
A permanência em Paris, sobretudo, colocou Fran siva, no palacete Acarie, contra a opinião comum,
cisco de Sales em íntimo contato com o "circulo Aca faz com que se decidam pela fundação próxima do car
rie". Em volta da célebre extática havia um grupo melo reformado e pelo projeto de fundar o Oratório
de personagens religiosas das mais eminentes. El as na França 2 1 • Ele entra em contato com Maria de Beau
vão desempenhar papel decisivo na renovação espir i- vill iers, a reformadora de Mont.rnartre, "a abadessa
tual da França. Várias delas escrevem. Pedro de Bé- das abadessas": ele a aconselha sabiamente em seu di
rulle (1557-1629) acaba de publicar o Bheve da abn e fic il empreendimento. Esse pretenso "estudante" é um
gacão, adaptação do Re-0umo da peh6elcão de Isabel le mest re.
Bellinzaga, a famosa "senhora milanesa". Benoit de
Canfeld (1562-1610=, inglês de origem e capuchinho Sua ação sobre Bérulle foi igualmente profunda
em Paris, prepara sua edição francesa da Regha da e, t alvez, decisiva. Ele admira, ele ama esse homem
peh6eicão (1609), toda impregnada da mística nórd i- a quem Veu-0 deu muito e de quem é impo-0-0lvel aphoxi
ca: Brétigny acaba de traduzir as obras de Madre T~ ma~- -0e -0em ti~a~ g~ande p~oveito; ele é, diz, exata
resa (1601); Dom Beaucousin, vigário ~a Cartuxa de ment e como eu go-0ta~ia de -0eh (XII, 181). Reconhece,
Paris, publica sua tradução da Pêhola evangélica pois , seu valor, mas Bérulle, por sua vez, vê em Fran
(1602): estamos, pois, na confluência das correntes cisco de Sales um santo: abre seu interior a ele e
espirituais do Norte, da Itália e da Espanha. Neste toma a decisão de ir fazer um retiro com ele na Sa-
grupo predomina o espirita da mística romana de ten vóia . Em 1602, ele ainda parece incerto quanto ao
dência "abstrata", orientada para a "vida superem i: seu c aminho. Francisco lhe fala do Oratório filipi-
nente" de união direta com a essência divina, por no que viu, admirou, estimou em Roma, em 1599. Os
uma superação de todo conceito positivo e da pró- dois amigos decidiram introduzi-lo na França; este
pria humanidade do Cristo. A mística teresiana, ao Proj eto lhes é tão comum que, chegado o momento de
contrário, dá à humanidade de Jesus, às imagens, ãs estabelecer-lhe as bases, Bérulle tentará, desde 1608,
visões, o lugar que sabemos. Estas duas tendências, atrai r seu amigo a Paris a fim de tornar a iniciati-
no grupo, sutilrnente se arnalgaman e secretamente se va (XIV, 207, n. I; XV, 154-155).
repelem: breve vai resultar urna divisão. A posiç ão
de Francisco de Sales desde então é clara: ele é um
-
21 - Duval, P. 38; Sauzéa, P. 35.
58
A marca de Francisco é visivel também no sorta 50 a is, conseguirá fazer com que o espirita dessa r~
nista André Duval (1564-1638). Um dos três superio= fo rma penetre nos corações. Com muitas dificuldades,
res, com Bérulle e Gallemant, do Carmelo reformado , v ai primeiramente suscitar a devoção em sua diocese.
autor da primeira vida de Madame Acarie, um profes-
sor eminente, do qual dirá Vicente de Paulo: "Tudo Dedicou seus primeiros cuidados ao seu clero.
é santo em M. Duval". Jacques Gallemant, um dos pro seus padres, a seus olhos, formavam seu episcopal;
motores de nossa renascença religiosa, o apóstolode parti lhando de sua tarefa, estavam obrigados a pra-
Gisors, de Pontoise, de Rouen, de Paris, esteve tam ti car a mesmas virtudes, a ter a mesma perfeição que
bém sob a cativante influência do jovem prelado. A ele, como e.te dedicado-0 a Deu-0 como -0envo-0 e-0tigma-
própria duquesa de Longueville, entusiasmada por sua t izad o-0 pana -0eu penpêtuo -0envico, pon uma con-0agna
quaresma do Louvre, quis pedir a opinião do santo cão -0acnamenta.t e pon um canâten e-0pinitua.t que não
sobre a fundação do Carmelo. Afinal, ele conquistou po de -0en eliminado (V, 333~. Com estas palavras bem
toda a corte com essa quaresma. Ao sair de Paris, ponder adas, e le toma posiçao: o p adre diocesano pa~
em 1588, deixou ai muitos amigos; ao encontrá-los tici pa d o es t ado d e per f e i ção, com o bispo, antesdo
novamente, estes o reviam aureolado de glória; não simple s r e li gioso. Com efeito , os bons párocos não
acabara ele de trazer de volta para a Igreja uma pro sao menos ne c essários do que os bo n s bispos, ponque
vincia de vinte e cinco mil habitantes, onde encon: ele-0 -0ão 0-0 pa-0tone-0 imediato-0 que devem andan na
trara apenas cem católicos e onde não deixara ma is 6nente do nebanho (XXII, 400-401).
do que uma centena de protestantes? Para toda es s a
Paris devota Francisco de Sales foi um m0delo, um A primeira base dessa reforma sacerdotal foi a
amigo, um animador; se ele ai aprendeu muito, muito ins tru ção. A acusaçãode ignorância que os reforma-
mais ensinou. Em todo caso, um novo laço se estabe- dos fa ziam ao clero católico era uma das mais funda
lecera entre a França e ele: Fnanci-0cu-0 Sabaud u~ das e das ma i s dolorosas de todas. Para selecionar
Ga.t.tu-0; a irradiação do bispo de Genebra sobre a Fran padre s dignos, Francisco de Sales submeteu inexora-
ça não mais cessará de crescer. Não pensemos,por ou velmen te as paróquias e os beneficias ao "concurso",
tro lado, que a experiência de Madame Acarie viera segundo a regra de Trento: neste caso, nenhuma ami-
abrir-lhe o mundo mistico: nele já havia penetrado zade, nenhuma cólera o fizeram ceder. Para instruir
por sua própria experiência. Definitivamente, temos seus p adres, ele se transformou, no começo de seu
de eliminar a imagem de São Francisco de Sales fre- bispado , em pro f essor de teologia: três vezes por
qüentando aulas de espiritualidade em • Paris em 1602. semana dava suas aulas. Instituiu conferências men-
sai s o nde os leigos tinham acesso e voz. Nunca ces-
sou de exortar seus padres à ciência, e-0-0e oitavo
A REFORMA CATULICA NA SABUIA 6acnamento da hierarquia. Queria, sobretudo, que a
ciênc ia deles fosse santa, pois pode-se estudar, en
Francisco de Sales deixou a capital no fim de Si nar , pregar ou para salvar almas e glorificar a
setembro; nós o encontramos em Sales no dia 14 de o~ Deu s, ou por intene-0-0e, vã g.t5nia e ongu.tho.
tubro. Seu bispo, Claude de Granier, morreu e ele
se prepara para sua consagraçao, que ocorrerá dia 8 . O padre deve saber, em primeiro lugar, para e-
de dezembro. Logo se lança ao trabalho e sua prime~ d~6 i can--0e a -0i me-0mo, certo de assim poder, em se-
ra obra é continuar a reforma empreendida pelo emi- gu ida, edificar a Igreja (XXIII, 303-305).
nente prelado, cujo desaparecimento lamehta. A par-
tir do sinodo de 1603, coloca as bases estatutárias Depois disto queria pastores zelosos, mas de
dessa reforma. Por meio de suas visitas diocesanas, um zelo suave, paciente, complacente e misericordiQ
de suas pregações, de suas direções espirituais pe~ so . Coloca-se totalmente contna o zelo amango. So-
mover o melhor que pôde o ensino das letras nos co-
mo-6 po!L vezu tão au1.iteJL01.i em no1.i1.ia1.i c.oJtJteç_oe1.i, di - lé gios de Annecy, de Thonon, de Thônes , de La Roche,
zia, que no-6 mo1.itJtamo1.i e6etivamente mai-6 Jtep!Leen1.i Z- de Rumilly, de Évian; quis, sem o consegui r , colo -
vei1.i do que aquele1.i q~e admoe1.itamo1.i e.amo c.ulpado-6; a car os jesuítas nos colégios de Thonon e de Annec y ;
pedJta de toque de um pe!L6eito c.on6e1.i1.i0Jt e 1.iua pie da rec orreu, então, aos barnabitas de Milão, seguiu de
de. Ele mantém, no entanto, o meio termo e repro vã per to os programas, o espírito, os costumes. Parti-
essa compaixão que ap!Lel.ienta um tJtave1.i1.ieiJto pa!La o dár io de urna filosofia e de urna teologia modernis-
vZc.io; é preciso que nos coloquemos ao alc.anc.e de tas , apoiou o padre Redento Baranzano, que ensinava
e.ada um e que c.onc.edamo-6 indulgênc.ia não ã malZc.i a, uma doutrina atual: este padre partilhava, em físi-
ma-6 ã en6eJtmidade (XXIII, 297-298). ca, das idéias de Galileu, então em dificuldade em
Roma; Francisco de Sales aprovou suas Nova e o pini o
Para que esses novos costumes penetrem em s eu ne-6 phy1.i i c.a e e o apoiou contra seus superiores 22 • Pa
clero, confere à elite de seus padres, aos quais d á ra melhor armar essa elite saída dos colégios, ele
o nome de deãos, poderes reforçados. Eles cuidam d a fund ou, com Antônio Favre, a "Academia Florirnontana"
boa execução das ordenações sinodais e devem restau (160 7), cuja celebridade se espalhou por toda a Eu-
raras igrejas por toda parte, promover o culto, a= ropa , corno o prova urna carta de Favre. Foi urna espé
cabar com as discussões dos padres em volta dos c a i cie de universidade popular, urna "escola noturna"
xões por causa das velas, expulsar dos presbitérios aberta "a todos esses valorosos mestres das artes
as mulheres suspeitas, impor a residência aos pár o- honestas", pintores, escultores, marceneiros, arqui
cos, expulsá-los das tavernas e privá-los, se nec es tetos. Ai se davam aulas de teologia, de filosofia~
sário, de seus benefícios (XXIII, 262-272; 389-39 8i de retórica, de cosrnografia,d2 geometria, de aritrné
tic a. Tratava-se ai, num e1.itilo de 6ala!L ou de le~
de maneiJta 1.ieJtia, Jte6inada, plena, ma-6 1.iem pedanti1.i
A INSTRUÇÃO DO POVO E O APELO AOS LEIGOS mo, do oJtnamento da-6 lingua-6, 1.iobJtetudo da 6Jtanc.e1.ia
(XXI V] 244-245).
Com essa reforma pastoral, Francisco de Sales
tinha por finalidade instruir o povo, dar-lhe uma Francisco de Sales queria essa elite a serviço
religião verdadeira e viva. Sua visitas pastorai s, do povo. Era necessário, primeiramente, instrui-la.
até 1607, conferiram um impulso vigoroso ao espír i- Ele reavivou as dez escolas populares que existiam
to cristão na massa. Ele as fez com grande zelo. Fo i em sua diocese. Escreveu para a massa urna prática
a todas as paróquias e, coisa que jama is se tinha fác il de compreender e que todos os párocos deve-
feito, aos lugares mais altos e as mais pav oJto J.ia-6 riam ler no domingo; em pouco tempo, diz urna teste-
mo ntanha-6 . Dedicava seu tempo a pregar, confirmar, munha, todos esses homens ficaram conhecendo as prin
confessar, reconciliar, encorajar, corrigir os ab u- cipais verdades da religião e s e sentiram "e.amo que
sos, a dar o impulso para u m culto di g no e honesto.
Ele fazia "todos os ofícios de pároco": todos er am
confortados e somente ele se achava s e m ze lo. A his
tória que l he contaram, a de um camponês q ue c airã 22. XXIV, 200 n. 1. Galileu, aliás, tinha duas vezes
em um despenhadeiro em busca de sua vac a , fazi a-o razão, tanto em sua ciência quanto sobre a Bí-
suspirar: D Veu-6, o aJtdolL de1.i 1.ie c.amp onê-6 que p!L oc.u- blia; os autores sagrado~, afirmava ele, s6 fa-
Jtava 1.iua v ac.a eJta t ão quent e qu e o gelo não o e1.i- lavam da natureza "segundo as aparências"; era,
6Jtiou. E po!L qu e 1.iou tã o le Jtd o em bu1.i c. a de mi nha-6 assim, precursor de vários séculos de Leão XIII.
o v e l h a-6 ? ( XI I I , 1 9 9 ) . Ve r s u a b e 1 a c ar t a a o P . Cas t e 1 1 i , d e 2 1 d e d e z em
bro de 1613, em DTC, VI, 1060, artigo de E. Va~
Para instruir esse povo, ele recorreu a elite. candard sobre Galileu.
Teve, primeiramente, o cuidado de formá-la e de p r~
.6a-Zdo.6 da.ó t11,e,va.6 p'1.a a luz". Como a prática não bas, uenas corno nas grandes cátedras, contanto que pu-
tava, era necessário o catecismo . O santo bispo te, des s e ter igual prove~ to:.. Subia à <:á~edra com gra~
ve muita ~ificuldade ~ara_promovê - lo, ~ois não figu de humildade e dependencia do beneplacito de Deus ...
rava na lista das obrigaçoes cont rat u ais que liga: suscava puramente o provei to das almas e não o apla~
vamos párocos a seus benefícios, ordinariamente 0 50 •• • Pregava tanto por sua vida exemplar quanto por
único objeto de sua preocupação. Ele próprio teve~ sua d outrina ... corno um homem verdadeiramente apos-
dar o exemplo: seu sucesso foi estrondoso. Mas logo tól ico que tinha mais do que o humano" (Chantal, II,
ficou sobrecarregado e teve de recorrer aos seus cõ 17 9- 184).
negas e a outros padres, finalmente aos leigos, aoi
quais confiou a tarefa de instruir a infância den- Por onde passasse, pregava. Por toda parte on-
tro de uma "Confraria diocesana". Talvez tenha sido de pregava, convertia, avivava a chama, levava a a-
o criador do clero especializado ao nomear, em 1610 . mar essa religião vigorosa que renova a vida. Popu-
Claude Dumont como responsável pela catequese diocesa lari zava essa grande idéia da Igreja, corpo rnlstico
na. Organizou congressos diocesanos de catequese. - de Cr isto, na qual Deus nos dá a existência imortal
pela carne e pelo sangue de seu Fi!ho~ Lembrava se~
Francisco de Sales, como podemos constatar por pre a o p~vo que eomendo tod~.6 um ~o pao, .6omo.6 to-
esse esboço, fo i , pois,um bispo inovador: ele pres - do .ó um .60 eo'1.po (Rm 12,5): e, po'1. ,{,/.J/.Jo que .6omo.6 to-
sentiu nosso tempo. "Ele comandava, diz a Madre Chan- do.ó ,i,11,mão.6, po'1.que, pe.fo mumo eo'1.po e. pe.fo me..ómo .6an
tal, santa e muito cuidadosa e diligentemente sua gu e. .6omo.6 nut11,ido.6 pa'1.a a vida e.te.11,na; assim, noCris
diocese. Creio que existem poucas ou nenhuma dioce - to, na Igreja, somos todos eomo nlo'1.e..6 da me..6ma â11,~
se em que os ec l esiásticos vivem mais exemplar e de vo '1.e., eomo a.6 pe.d'1.a.6 p'1.eeio.6a.6 de. uma me..6ma eo'1.oa
votamente do que na de Genebra" (Chantal, II, 224) ~ (VII I, 1 3) . Em suma, por essa grande corrente de pre
gaç ão buscava construir a Igreja fazendo de todo cris
tão um perfeito vivente, um perfeito comungante do
A PREGAÇÃO EVANGtLICA Cris t o nosso chefe. Nesse sentido, pode-se dizer, a-
gor a, que sua ação foi única.
Foi sobretudo pela pregação evangélica que Fr~
cisco de Sales insuflou o espirita da reforma emsw Preocupou-se com comunicar esse zelo pela pala
diocese. Foi um pregador incansável. Pregar o Evan- vra ao s seus melhores padres. Ele havia, há muito tem
gelho era, a seu ver, o primeiro deve r de um bispo . po, fo rmado uma equipe de missionários para evange~
Mais depressa faria um sermão, confessava ele, do liz ar o Chablais. Como bispo, continuou esse traba-
que o tempo de dizer não: nunca recusava um convite lho. I a escutar seus pregadores, "nunca dormia du-
para pregar, e para atender a tantas solicitações ul - ran te o sermão", prestava atenção no que havia de
trapassava, freqüentemente, suas forças. Pregou em bom e d e mau, e depois, delicadamente, corro bom pai,
sua diocese várias quaresmas, em Annecy, em La Ro- dizi a a cada qual o que deveria suprimir, o que de-
che, na Savóia em Chambéry, no território de Gex, ver ia e poderia acrescentar: sua critica era sempre
Quando estava em casa, pregava o mais das vezes ao s construtiva. Mostrava-lhes corno não tornar obscuro
domingos e nas festas em qualquer igreja de AnnecY • se u di scurso: menos sentenças, mas mais claras, cheias
Pregava "de modo completamente apostólico", depõe a de men sagem, mais práticas. Ensinava-lhes a variar
Madre Chantal, "com um zelo e desejo sem igual de 0 t om, a falar sem ênfase, naturalmente. O padre de
conversão e proveito das almas: percebi claramente Bonevil le, seu biógrafo, lembrava-se com emoção de
que ele não tinha nenhuma pretensão al~rn desta em sua bondade sobre esse ponto.
s eus sermões; não pensava, de modo algum, em ser um
gr a nd e pre gador ... Pregava com igual afeição nas P~
Dava o acabamento a essa obra de e vangelizaç ão t os e todos os recursos das almas, e falava em ter-
pela cultura de uma elite popular por meio das Co n- mos tão precisos, tão oportunos e inteligiveis, que
frarias. Eram numerosas: Confrarias do "Rosário" , f azia com que se compreendesse com enorme facilida-
do "Santo Sacramento" , do "Santo Nome de Jesus". Fu n d e as coisas mais delicadas e nobres da vida espiri
dou a "Confraria da Santa Cruz" em Annecy, a de "Nos t ual ... Eu sei disso por uma certa experiência. Ele
sa Senhora da Compaixão" em Thonon: animava-as ou as af irmou a pessoas que lhe comunicavam suas necessi-
reanimava. Finalmente, por rnei6 da direção espiri- d ades e spirituais que via claramente seu coração c o
tual individual, criou um corpo de cristãos zelos os mo através de um cristal. A quantas almas disse ele:
que o ajudavam a renovar a religião. Vo~i n~o e~t~ 6alando tudo ... Ordinariamente, nada
se podia esconder dele ... Dizia freqüentemente aos
s eus penitentes o que desejavam dizer antes de que
PELA DIREÇÃO ESPIRITUAL o declarassem ... ". Era muito reservado sobre as "coi
sa s sobrenaturais": "Não as desprezava, mas também
Francisco de Sales, corno sabemos, foi um dire- não as exaltava. Só atribuia valor e levava em con-
tor espiritual incomparável, mas Santa Chantal o di s ta as verdadeiras virtudes ... Conheço almas que es-
se melhor do que todos: "Entre todos os dons de Deus tavam muito atribuladas e inquietas com várias per-
que nosso bern-avent~rado recebeu, o da direção esp i t urbações, as quais, pela graça de Deus , ele pac i fi
ritual foi dos mais eminentes ... ; por isso, reco r= cou (e sou uma delas), às vezes, com uma s ó palavra'~
ria-se a ele de diversos lugares para ser esclareci René Favre, o filho do pre s idente, veio um dia pro -
do ... Tive conhecimento de que vários prelados, pa= curá-lo, com a alma atribulada; ele "o levou par a
dres, religiosos, eclesiásticos, nobres e pessoa s se u escritório e deu-lhe a ler", sem· qualquer pala-
da justiça, principes, princesas e pessoas de tod a vra, um capitulo do Amo~ divino; nosso homem ficou
qualidade, ricos e pobres de diversas provincias, o ca lmo e completamente liberto da perturbação que o
procuraram para a direção espiritual. O número de af ligia interiormente. Várias pessoas foram pacifi-
almas que ele conduziu para o caminho da perfeiç ão c adas só por seu olhar (Chanta), II, 197-200).
cristã é incontável. Nunca ouvi dizer que alguma de
las tenha caido em qualquer engano, nem que tenha Esse vigoroso retrato de São Francisco de Sa-
se desviado do temor de Deus ... Quando ele passava le s como diretor espiritual põe por terra a imagem
por qualquer cidade, sabemos corno era bastante as se qu e dele se fazem os mundanos como um elegante bis-
diado; até mesmo os diretores espirit~ais mais expe po , cercado por belas senhoras e tagarelando sobre
rientes vinham consultá-lo e lhe enviavam seus di s= de voção. Ele foi um genial e firme diretor espiri-
cipulos a fim de que fosse esclarecidos por ele s~ tual. Seria uma vocação, um atrativo, um prazer? E-
bre as coisas mais dificeis da vida espiritual". O ra , antes de tudo, um dever. Foi criticado por per-
padre Coton, "personagem tão extraordinariamente de r seu tempo com essas condutas tão particulares,
marcada pela piedade, não teve sossego sobre urna al ma s ele as considerava como parte de seu dever. Per
ma conduzida por vias extraordinárias" (talvez Ma - t ence à missão de um bispo conduzir as almas até Deus,
ria de Valência) enquanto não pediu a opinião do sa._!2 pois ele sabe que , no rebanho, as boas ovelhas se
to bispo. O padre Suffren "aprendeu mais sobre a boa a grupam em volta do pastor e são necessárias para
conduta das alma em cerca de nove horas durante as c onduzir as outras: urna diocese precisa de santos,
quais tratou com ele sobre esse assunto, do que o e o bispo deve cuidar deles como chefe; ser-lhe-ia
fizera em toda a sua vida". Ele "possuia urna vi são Proibido fazê-lo em particular? Francisco de Sales
tão penetrante que quando alguém lhe falava ou es - achava que não.
crevia sobre seu intimo, discernia com urna delicad~
za e clareza sem igual as inclinações, os rnovirnen-
Desta maneira ele desperta para a vida ferv oro vo çao e ver que ela não e nem sombria, nem triste,
sa uma grande família de filhos e de filhas espir i: ne m aborrecida, mas, pelo contrário, é uma fonte de
tuais,de Filotéiase de Teótimos. Conhecemos as Fi lo alegria; pois a d e voção con~i~te, e,~~encialmente nu.m
téias, a baronesa de Chantal, a abadessa de Montmar am oJt acendJtado, ela no~ imp ele e, incita não ~omente
tre, Angélica Arnauld, Madame de Charmoisy e tant as a ob~e.JtvaJt o~ mandamento~ da lei de, Veu.~, pltonta,
outras; mas pensemos também aos Teótimos: tantos ativa e, diligentemente, ma~ também a p1tatica1t a~
prelados, abades, cônegos, padres e leigos aos quais bo a~ abJta~, qu.e_ ~ão apena~ con~elho~ ou. in~piJtaçÕe,~
o santo bispo comunicava sua chama: Revol, Ancina, pa1tticu.la1te_~ (V.D. I, 1), o que só pode nos tornar
Frémyot, Bérulle, Duval, Gallemant, Favre, Soulfourt , fel izes na alegria do amor. Com efeito, essa devo-
De Hayes, São Vicente de Paulo. Como as mulheres guar ção inte1tio1t toJtna tu.do ag1tadãvel, doce e, 6acil (V.
daram melhor suas cartas e estão em maior evidênci~ D. I, 2). Ela não está reservada aos monges, às mon
então pensamos que o santo só dirigiu mulheres. Nó s jas , aos padres, mas está ao alcance de todos: dos
nos esquecemos de que ele conquistou para a devoção cortesãos, dos soldados, dos comerciantes e arte-
até seus próprios cônegos! sãos . Seria uma he1tuia pensar o contrário. E o que
ela exige deles? Sem dúvida alguma, uma g1tande, Jte~o
A VEVOÇÃO NO MUNVO lu.ç ão de acabar com uma vida dupla e conquistar a
pur eza da vida: o amor divino exige gJtande, coJtagem.
No entanto, foi para suas Filotéias que e le es "O Reino dos céus sofre violência."
creveu sua I ntJtodu.ção a vida devota ( 1609). Este li=
vro teve um sucesso estrondoso: em dez anos for am A pur2za que Francisco de Sales pede ao cris-
publicadas mais de quarenta edições na França e l o - tão penetra nas profundezas. Como não se pode evi-
go foi traduzido em quase todas as línguas da Euro- tar todos os pecados veniais, é preciso pelo menos
pa, até em basco. Suscitou cóleras, mas sobretudo dete star-lhe o habito, pu.1tga1t-~e_ da a6eição â~ coi-
grandes admirações: atribuiu-se algo de Calvino ao Ja ~ inútei~ e, pe.Jtigo~a~, liberta-se até da~ mã~ in-
autor, mas P. de Villars, arcebispo d e Viena, e scr~ Q[inaçÕe_~, sobretudo por uma prática eficaz e fru-
via-lhe: "O livro que acabais de publicar me encan- tuos a da confissão freqüente, fundada sobre o prin-
ta, me aquece, me extasia" (XIV, 410). Este prel ado cipio do amor, âmago da contrição perfeita. Somente
via, sobretudo, o bem que a obra faria para atr air ness e clima de pureza é que a comunhão freqüente po
os protestantes para a Igreja romana; Antônio Ar- de d ar todos os seus frutos. Arnauld, nesse ponto~
nauld fará os mesmos elogios ao bispo . de Genebr a. esta rá de acordo com Francisco de Sales e se apoia-
rá nele. Para a comunhão cotidiana, o "suave santo"
O livro atendia melhor ainda as necessidades exi ge plte~ eJtvaJt-~ e da maioJtia da~ mã~ incünaçõ~ (V.
dos católicos. Estes estavam imersos numa atmosf era D. II, 20). Não estava sendo nisto jansenista, mas
de humanismo que dissociava, como dis s emos, a r eli- exato. É nestas condições que a missa se torna o sol
gião da vida. Relegava-se a fé para o ápice do espl dos exercícios espirituais, centro da religião cris
rito, prestavam-se a Deus os deveres d e cortesi a a~ tã o coJtação da devoção, a alma da piedade, (V.D. II~
sistindo à missa e fazendo a Páscoa, e depois l eva- 14) e que a comunhão produz todos os seus frutos de
va-se uma vida desenfreada pelo caminho dos praze - beleza, de bondade, e mesmo de pu.Jteza.
res. Reservava-se para o momento da morte o cuidado A vida sacramental e litúrgica encontra-se, pois,
de sua consciência; isto não era novidade, mas pen- na base da espiritualidade salesiana: para suscitar
sava-se que não podia ser de outro modo e assim é a devoção no povo fiel,é indispensável um culto vi-
que se ensinava. Francisco de Sales despertou os e ~ vo ; a liturgia deve normalmente criar um apetite de
piritas: ensinou aos homens de seu tempo queum cri~ d~vino e um clima de contemplação por uma celebra-
tão é um homem que ama a Deus; fê-los saborear a d~ Çao bela e inteligível do Mistério, mas cabe a cada
um penetrar nela e vivê-la pela ona çã o pe~~oal: or a vir encontrá-lo para adorá-lo , a má-lo, invocá-lo com
ção e liturgia atraem-se mutuamente e se completam~ secretas a~pinaçõu , onaçõu jaculatônia~ e bon~ pen
6 am e nt o~ (V. D. II , 1 2 -- 1 3 ) . -
são Francisco de Sales quer, pois, aclimatar a
oração no mundo, quer que a religião seja pessoal, Neste hábito do recolhimento ativo, o método
consciente: é esta sua novidade. A fim de realizar salesi ano da meditação não é mais um árido e arti-
isso, é preciso saber criar para si um espírito de ficial exe r cício como alguns ignorantes pensam; ele
solidão que esteja em perfeito acordo com a vida ci s e torn a uma necessidade da vida interior: se quise
vil e familiar, o que exige ainda uma grande resolu= r es con hecer o Deus de teu coração, busca sua pre=
ção. O devoto salesiano aceita os passatempos, os s ença , invoca sua l uz, escruta sua palavra, não pa
esportes, os jogos, até a dança, as recreações ne- r a conhecê-la curiosamente, mas para guardá-la e curo
cessárias ou convenientes ao espírito e ao corpo, p ri-la, compara tua vida com essa regra e toma-a c~
mas não gosta desses prazeres por eles mesmos: se- mo medida; uma palavra resume tua resolução, e se
ria amar uma finalidade sem finalidade; ele as re- Deus se torna sensível a teu coração, tu te abando-
duz à medida do bem divino; é um ponto delicado,mas na s à graça; se a aridez te torna seco, faça como o
essencial (V. D. 30-34). Para adquirir no meio de seu c amponês que lavr a seu campo deserto na esperança
trabalho e de seus deveres esse espírito de solidão, d a colheit a (V.D. II, 1-9). Este exercício pode ser
deve-se evitar as conversas vãs, as tagarelices re- l ongo ou breve, segundo teu tempo e tuas forças: bas
pugnantes, as leituras dissipantes, a fim de reser- t a que seja feito concientemente. Se a ele fores fiel,
var melhor toda sua atenção à sólida cultura compa- Teótimo, entrarás no caminho do amor.
tível com suas ocupações profissionais. O autor de
Filotéia, não podendo então recomendar a Bíblia por
falta de boas traduções, aconselha os livros espiri O CAMINHO DO AMOR
tuais mais ricos de doutrina evangélica, Ludolfo o
cartuxo, Grenade, os Salmos, sobretudo os de Despor Por esta ascese, Francisco de Sales nos intro-
tes, com os quais a Madre de Chantal se deliciava~ d uz no caminho do amor, pois é "em passos de amor",
Ele próprio possuía sua Bíblia e a citava freqüent~ di z Santo Agostinho, que vamos para Deus. O princí
mente de memória. Sem essa impregnação de leitura pio düste amor acha-se inserido em nossos corações
cristã, a vida de oração, principalmente no mundo, pelo Espírito: canita~ di66u~a; sem ela, não pode-
torna-se impossível, seca e ressecante : ríamos nos elevar até Deus. As pulsações dessa cari
dade nós as percebemos pelas in~pinaçõe~, ou seja~
Nesse clima de recolhimento e de cultura, o e- t odo~ o~ atnativo~, movimento~, admoe~taçõe~ e ne-
xercício essencial da vida fervorosa, o único indis- mo n~o~ intenione~, luze~ e conhecimento~ que Deu~ o-
pensável, torna-se possível. Em que consiste ele?No ~a em nó~. Para viver verdadeiramente de amor, te~
exercício da presença de Deus: onde quen que e~tej~ mo s de acolhê-los e consentir, ma~ com um con~enti-
mo~ encontnamo~ Deu~ pne~ente, mas não pensamos ni~ mento pleno, amono~o e con~tante. Não iríamos, en-
so; temos de pnovocan no~~a alma a uma atenta con~~ tão, cair nas mesquinharias ou no iluminismo? Filo-
denaç~o de~~a pne~ença. Deus não está somente pre- té ia tem bom senso. Para os atos simples, claros e
sente no lugan em que estás, Filotéia, mas ele se puros da vida cotidiana, este perigo não existe; quan
acha muito panticulanmente em teu conação; Ele ai do se trata de coisas impontantu ou ex;(Jw..ondina.JÚM-;
se encontra no âmago de tua alma; tua alma é o tem- de ve-se sempre consultar o diretor espiritual.
plo de Deu~; é neste templo que por meio de santos,
freqüentes, curtos, mas fervorosos recolhimentos,no Esta obediência às inspirações, para Franscis-
meio de teus trabalhos, penas e preocupações, deves co de Sales, era decisiva, pois, como ele ensinava,
as inspirações são para o bem o que as tentaçõe s são d o egoísmo. É bom amar-se a si mesmo, querer para si
para o mal: quem não dá seu consentimento ãs prime i mesmo, querer para si o bem que Deus nos quer, mas
ras, sucumbirá sob o impacto das segundas (V.D. II~ ~ traição amar-se sutilmente no amor e pelo preten-
18). Freqüentemente gememos sob o peso do pecado ou so amor do próximo. Devemos agir lealmente e o amor
da mediocridade porque nos recusamos nos deixar to- e pelo pretenso amor do próximo. Devemos agir leal-
mar e conduzir pelo Espírito Santo, pois é realme n- mente e o amor deve ser puro. Posso, pois, amar a
te por estes atnativo6 que Deus nos de.6pe.nta, no s mim mesmo e seria o amor de cobiça: existe, nos a-
e.xeita, nos impele. à6 6anta6 vintude.6, ao amor ce- fi rma nosso doutor, uma 6anta eobiç_a, não apenas r:er
leste, ãs boas ne6oluç_Õ e6, em 6uma, a tudo o qu e. no~ mi tida, mas necessária. Ao ficar isso bem claro,pos
e.neaminha pana no66o bem e.te.nno. Ê o que. o E6po6 o so e devo também amar meu pr6ximo querendo seu be~
ehama de. bate.n ã ponta (Ct. 5, 2) e 6al an ao eona - e, neste ato, não é o meu bem que eu quero, mas e de
ç_ão de. 6ua e.6po6a (Is. 40, 2), d e.6pe.ntâ -la quando e.la le. A hipocrisia do egoísmo seria buscar meu inte=
utã donmindo (Ct. 8, 5), ehamâ-la e ne.elamâ- la quan re sse no pretexto do amor do próximo. E da mesma for
do e.la utã au6e.nte. (Ct. 2, 10, 13), eonvidâ-la a ma para com Deus: Aman, poi6 a Ve.u6 e o pnôximo com
6eu mel e a eolhe.n maç_ã6 e 6lone6 em 6eu jandim (C~ am on de. can~dade. ... ê que.ne.n bem a Ve.u6 pana 6i me.6
5, 1; 6, 2) e a eantan e 6azen n e66oan 6ua doee. voz mo e ao pnôximo em Veu6 e pana o amon de. Ve.u6. Pode
a 6eu6 ouvido6 (Ct 2, 14). mo s querer a Deus duas espécies de bens: Aquele que
ele tem, pon complacência ne.gozijando-no6 com o qu e.
Vemos como desde 1609 o santo abre para Filo- ele ê ... e aquele. que. ele não tem, a saber, essa gló
téia os caminhos da mística: estas inspirações são ri a exterior que lhe prestam as criaturas: Se ama~
a parte de Deus; elas nos fazem caminhar entusias ti mo 6 ve.ndade,iname.nte. a Ve.u6, tnatamo6 de. naze.n-lhe. u
camente no caminho da caridade, esta virtude admi nã te. bem pon nÕ6 me6mo6, aplicando ã 6ua glônia todo
vel, explicava o bispo de Genebra a João Pedro ca= no 66o 6en e toda6 a6 no66a6 aç_Õu (Lc 1 ,46): este é
mus, que é me.ia e 6im ao me.6mo tempo, o eaminho e a o p uro amor divino.
6inalidade., e a via pana in a e.la me.6ma. E para a-
mar, o que temos de fazer? Não existe maion Mne.za ... Esta é a parte essencial da Intnoduç_ão, o obje
pana ehe.go.n a e.6te. amon 6 e.não aman, poi6 , eomo 6e a- tivo da vida de.vota: Filotéia, nao noi pon nenhum
pne.nde. a e.6tudan e.6tudan e.6tudando, a toean toea ndo, mo tivo de. inte.nu6e. que. Ve.u6 no6 cniou, poi6 nÔ6 lhe.
a danç_an, dançando ... a66im 6e apne.nde. a aman a Ve.u6 6om o6 ab6olutame.nte. inúte.,Ü; 6oi unicamente. pana no6
e o pnôximo amando-06. E aque.le.6 que. aJotam um ou- óa ze.n bem, em no6 6acultando, com 6ua gnaç_a, panti-
tno método 6e enganam. Mas ele acrescentava: O me.ia ei pan de. 6Ua glônia; e, noi pon i660, Filotêia, que.
ee.nto pana aman a Ve.u6 ê amá-lo eada vez mai6: bu6- el e te deu tudo o que. te.n6: o entendimento, pana o
ea 6e.mpne. 6Ua naee., dizia Vavi, e 6ê eon6tante. ne.6- co nhecene6 e adonane.6; a me.mônia, pana te. le.mbnane.6
6a bu6ea (Camus, I, 2o, 30). de le.; a vontade., pana o amane.6; a imaginação panate.
11..epne.he.ntane.6 06 6eu6 be.ne.áicio6; 06 olho6, pana ad-
E o curioso bispo de Bellay insistia: mas, af! minane.6 a6 6ua6 obna6; a l~ngua,pana o louvane.6 (V.
nal, o que é esse amor? E Francisco, sorridente, res D. I, 10). A arte de viver em graça consiste, pois,
pondia: O amon ~ a pnime.ina paixão de. no660 ap e.titI em elevar todas as nossas potências até a glória de
6en6itivo e a pnime.ina a6e.iç_ão do naeional, que. e De us,para que seu explendor apareça em nossos cora-
no66a vontade.; tanto a66im que. a vontade. outna eoi- çõe s,e por eles em seu Cristo e em sua Igreja. Oca
6a não ê 6e.não o amon do bem, e o amon ê que.ne.n o min ho do amor leva,assim,ao devotamento a Deus, ao
bem. Eis, portanto, o problema: é preciso, primei ra engajamento por Deus. t, ao mesmo tempo, o princí-
mente, subordinar a paixão â ane.iç_ão, e isto não e pio e o fim da vida de.vota, inscritos na pnote.6taç_ão
fácil; é então que a graça nos é tão necessária. É autêntica: E conve.nte.ndo-me. a meu Ve.u6 .. . , eu de6e-
preciso em seguida, tomar cuidado com os artifíci os
jo, pll.oponho, deiibe11.o e me 11.e-0oivo i11.11.evogaveiment e A VISITAÇÃO E OS POBRES
a -0e11.vi-io e amáio ago11.a e ete11.namente, con-0ag11.an -
do-me a ele pa11.a e-0t e nim, dedicando e con-0ag11.and o
meu upI11.ito com toda-0 a-0 -0ua-0 nacuidade-0, minha al - o amor de Deus e o amor de nos mesmos e do pr~
ma com toda-0 a-0 -0ua-0 pot~ncia-0, o meu co11.ação c om ximo são apenas um amor que tem um Único motivo, que
todo-0 0-0 -0eu.-0 aneto-0, O meu coll.pO com todo-0 0-0 -0eu.-0 é a bondade divina ou em Deus ou em nós. Francisco
-0entido-0 (V. D. I, 20). de Sales, realmente, amava Deus nos homens e os ho-
Poucos cristãos se comprometem assim com Deus ; me ns em Deus: é o que lhe tornava todos igualmente
consentimos em nos comprometer com a ação pall.a Ve uh, queridos, uns por serem de Deus, os outros porque
mas não com o próprio Deus: é muito monopolizador , poderiam vir a sê-lo. Disto nascia seu incrivel ze-
demasiadamente "alienante", mas quando o amor do ho lo em ajudar todos os seus irmãos, seja para encon-
mem corresponde assim ao amor de Deus, a amizade c ~ tr ar Deus, seja para progredir em seu amor. Ele lhes
leste nasce e vive. A caridade, em seu sentido ple= quer ia primeiramente esse bem divino, o único está-
no, e, com efeito, uma amizade e não um amofl. int e- vel, o único eterno, o único absoluto; ele lhes de-
11.Uhado, po11.que pela ca11.idade amamo-0 a Veu-0 poll. amo11. sej ava também todos os outros bens necessários ou
dele mehmo ... Sim, e-0ta amizade e uma ve11.dadei11.a a - útei s à nossa vida neste mundo. Havia discutido com
mizade, po11.que e 11.ecip11.oca, poi-0 Veu-0 amou ete11.n a - Beze sobre a necessidade das obras: não defendia a-
mente todo aquele que o tem amado, o ama ou am a11.ã pe nas um dogma, defendia uma prática de vida, os
tempo11.aimente . .. e, ne-0~a amizade, ehtamoh em pell. p~ co stumes cristãos.
tt1.a comunicação com ele, poi-0 não cu-0a de 6ala11. ao-Z
no-0-00-0 co11.açÕe-0 peiah in-0pi11.açoe-0, at11.ativo-0 e mov i Foi ainda Madre Chantal quem melhor o viu nes-
mento-0 -0a911.ado-0 . ... E quanto a nÔh, -0emp11.e que no";.; ses exercicio da santa caridade: "Ele não se poupa-
ap11.az podemo-0 a ~oda-0 a-0 ho11.a-0 p11.ocu.11.a11. a -0ua amá- va em nada para isso; abundava de dileção, poi-0 noi
vel companhia pela 011.ação (Tratado, I I, 22). Vemos, do ag11.ado de Veuh to11.na11. a-0-0im meu cofl.ação, dizia
po i s, que o fim da Vida devota e o principio do Til.a ele ; eu que11.o amafl. ~an~o e-0-0e pob11.e p11.Ôximo, eu o
tado estão de acordo e se identificam. Filotéia dá a qu e11.o amafl. tanto; pa11.ece-me, ent11.etanto, que nao a-
mao a Teótimo. mo de nof[.ma alguma -0enão a Veu-0, e todah a-0 ai ma-0 pa
11.a Veu-0, e que o que não i Veu-0 ou pa11.a Veu-0 não ~
Ora, n ã o se pode dizer o preço desse amor: é nada pall.a mim. Ele via o próximo no peito sagradodo
ele q ue constitui o va l or de nossos ato~. A carida- Salvador. Oh! quem O olha nofl.a daI, C0'1.'1.e O pell.igo
d e pode, pois, embe l ezar aos olhos de Deus a vida de não o amafl. nem pu.11.a, nem con-0tante, nem igualmen-
mais humilde e aparentemente - a mais rústica, a mais te. Ma-0 aI, quem não o ama11.ia?" (Chantal, II, 126-
corriqueira: Não ~ pela 911.andeza de no-0-0a-0 acõeh, e~ 127 ). t à luz destes principias que devemos consi-
sinava São Francisco de Sales, que ag11.adamoh a VeM . . . der ar sua vida amorosa e, sobretudo, a imcomparãvel
ma-0 pelo amofl. com que a-0 nazemu-0; é o amor que con- di leção que teve para com a própria santa: nada de
fere a pe11.6eicão e o uaio11. ~-0 no-0-0ah ob11.a-0. Parado- ma is terno, nada de mais forte e nada de mais puro.
xalmente, ele acrescentava - mas aqui o paradoxo s ~ De onde, também, a contãncia e a igualdade de- sua
lienta a idéia: Vigo-vo-0 muito maih: -0e uma peh -0oa car idade: ele testemunhava tanta afeição respeito-
-00611.e o ma11.tZ11.io poll. Veu-0 com pouco amofl., eia me11.e - sa e delicada para com a mais nobre senhora do mun-
ce muito, poih não pode11.Zamo-0 da11. mai-0 do qu e a vi- do. Em Paris, em 1609, fez uma princesa da corte es
da; ma-0 he ou.til.a pe-0-0oa 11.ecebe11. apenah um cutu cão Perá-lo aproximadamente meia hora enquanto escutava
com um pouco mai-0 de amofl., te11.a muito ma~-0 me11. e ci - uma pobrezinha: admirou-se muito esse amor ... e es-
mento, po11.que a ca11.idade e o amofl. e que dão vaiofl. a sa coragem! Reprovavam-lhe a perda de seu tempo com
tudo (VI, 429 ) . Foi o segredo da san t idade de pequ~ ess as humildes mulheres do povo; respondia que a-0
nez que constituiu a glória de uma Teresa de Lisieux,
eoneha-0 enam tão pneeio-0a-0 pana ele quanto a-0 peno- buído aos seus pobres urna renda de seu castelão;
la-0 da-0 nobne-0 -0enhona-0. recebeu urna memorável repreensão e o pobre santo bis-
po ficou todo contrito, porque o ecônomo o acusava
de tirar as coisas de casa para alimentar os seus
Esse amor era tão efetivo quanto afetivo: ele pobres. Esta caridade esteve na origem da Vi-0itacão.
visitava pessoalmente os pobres e os doentes, dava-
lhes tudo, mesmo o que não tinha, que tornava ernpres Nao apenas lamentava-se por causa da decadên-
tado; despojava-se, por eles, de suas roupas; tinha cia dos mosteiros, mas também tinha pena das rnulhe
urna lista de seus pobres e fez amizades a fim de que res humildes e pobres, viúvas ou solteiras, enfer=
o ajudassem a socorrê-los; amava os prisioneiros e mas, corcundas, caolhas, raquíticas, que desejavam
levava-lhes gulodices; hospedava os religiosos e os consagrar-se a Deus e não podiam 6azê-lo 6aeilmente
padres pobres que vinham à cidade em diversas oca- n o mundo. Para elas, concebeu o plano de urna cornun!
siões; tinha extrema preocupação para que essas pes dade sem votos solenes em que, sob urna regra branda,
soas fossem "bem tratadas e servidas honrosamente~ ele as conduziria à perfeição do amor. Quis, primei
vendia suas jóias para dar dinheiro aos indigentes; te rarnente, urna escolha de pura e perfeita caridade
ve até um grande aborrecimento com seu ecônomo Disse um dia à Madre Chantal, mas "com um sentimen-
Rolland por ter, em sua ausência, recebido e distri to completamente extraordinário'': -0e uma pe-0-0oa lei
gam e pengunta-0-0e o meio de aleancan -0ua -0alvacao~
eu lhe ne-0pondenia: Hâ-0 de aleancã-la in6alivelmen-
te -0 e o b-0 ,:nvanu 0-0 mandamento-0 de Veu-0. Ma-0 a uma
neligio-0a eu dinia: Se Sone-0 eompletamente de Veu-0
-0em meia medida-0. O nei -0obenano quen tudo ou nada,
ele quen tudo pana neinan ou ab-0olutamente nada (Chan
t a 1 I I , 211 ) .
A ALMA E O AMOR
Q('\
te, de maneina a que, não ataque, e, allalt e, a !Lazao. dita mulh e.lL que, o excitava à voluptuo◊idade, ( foi seu
Contudo, a vontade, e tão lupe.niofL que, le quile.lL, po próprio caso em_P_ádua), não mani6e.◊iO~ t~IL na ~anta
de aniquila-lo, de.tLtLuban Ol le.ul p!Loje.tol e, tLe,p e, li~ de. uma e.une.ma a6ucao de, duagnado, contha.JU,a a paixao áo
-lo, não conle.ntido nal lual luge.ltÕe.l . .. Ê gnan de, p1tazen que, ã 601tca, lhe. 6azia ◊e.ntifL? Quan:lM vezu tfteme-
loucuna 6ican indi6e.ne.nte. em calol e.xtnaondi nâni ol ! moh nÕh de. hUhto noh lugatLe.h pe!Ligohoh a que noh conduz a von
A Igne.ja condenou a loucuna que, ce.ntol anacone.tal tade.? Quan:lM vezu dete.◊tcunM M volup.tu0◊idadu em que. hi
p!Le.lunçolol quile.!Lam intnoduzin, e, contna ol quail comp1taz o apetite, -0e.n◊ual, quando amamoh oh be.n◊ upi!Lituaih
a tlctLituna, mal lobne.tudo o gnande, Apoltolo (Rrn que. lhu hão contfLMiM? Nihto con◊ihte. a luta que. he.ntimoh
7,23), clamam, dizendo que, te.mal uma lei em no l l ol to doh Oh diM e.ntne, o u pZILito e, a catLne. (T. I , 5) •
conpol que, !te.pugna a lei do no-0lo e.-0p~IL~to ... O qu e,
nÕl outtLol pe.cadotLe.l nao pode.mal 6aze.n, po!Lque, lo- Corno vemos, Francisco de Sales sabia muito bem
61Le.mol ellel movime.ntol de.l!Le.gnadol contna o nollo que era um homem como oh outtLoh; ele é nosso irmão
de.◊e.jo, e, com gnande, pne.juZzo do bom e,◊tado e, tnan- e n ão escreve para anjos! Mas a vontade pode domi-
qUilidade, da◊ no-0l a◊ alma◊ (T. I, 3)... Al potê.n- nar as paixões pelo poder do amor. O amor está nela
cial da pante. le.n◊itiva, que, ◊ão ou devem ◊eft M leh como a alma de sua força. Este amor radical é a p!Li
va◊ do e.◊pZnito, pedem, p!Locunam e, tomam o que, 6oZ me.ifLa complacência que, te.moh pelo bem. Ele precede
ne.culado pela nazão e, ◊em con-0e.ntime.nto de.la, e.mp e, o deleite, a esperança, o ódio, pois só nos alegra-
nham-le. em 6aze.tL a-0 ◊Ua◊ uniõe.-0 abje.ta-0 e, le.fLvifL◊, mos com aquilo que amamos, só esperamos aquilo que
de.◊onnando, como Gie.zi, a pu!Le.za da intenção de, leu amamos, só odiamos aquilo que se opõe ao bem que a-
amo, que, ê o e.◊plnito; e à medida que, a alma le. in- mamos. Des ' :a forma, a vontade só fica radicalmente
clina pana ta~-0 uniõe.◊ gfLO◊le.~!La◊ e ◊e.n◊uai◊, a6a◊ afetada pelo amor do bem, que é seu primeiro móvel
ta-◊e, da união delicada, intelectual e condial (T. e s ua primeira afeição, mas a vontade pode fraque-
I, 10).
ja r, corromper-se: a vontade reta escolhe o amor
bom, o amor do verdadeiro bem; a vontade má, o amor
Nem por isso Francisco de Sales é dualista; não mau, o amor do falso bem. A origem de tudo encontra
admite uma bipolaridade real; o êxtase sensual é u- -se , pois, na liberdade que pode escolher entre o
ma tendência de regressão, uma decadência e um fra- bom e o mau amor. Esta convicção a~ha-se na base de
casso; a dinâmica rüal dirige-se para o Absoluto, qualquer esforço moral e espiritual. Embora a vonta
para Deus.
. de seja necessariamente amor, nunca é necessariamen
te amor bom ou amor mau: ela é que conduz o amofL. o
O PONTO CRÍTICO cri tério, aqui, depende da razão.
q.q
dade ê inninitamente mai-6 penneita que tudo quanto da do an. E-6te encontno ê agnadável e de-6ejado, e
pudê-6-6emo-6 de-6ejan ou imaginan . .. Não podendo, poi-6, mal -6e podia di-6cutin quem tem maion pnazen, -6e o
em ab-6oluto, de-6ejan cou-6a alguma pana Veul, nonma- qu e dâ, -6e o que necebe; -6e No-6-60 Senhon não tive-6-
mo-6 de-6ejo-6 imaginánio-6 e condicionai-6 . .. J.Je ne-6olvido a que-6tão, dizendo: "Ê mai-6 neliz o que
dâ do que o que necebe" (At. 20,35).
E-6te de-6ejo ... pode à-6 veze-6 -6en utilmente pna
ticado em oca-6iÕe-6 de gnande-6 -6entimento-6, de piedo Ona, onde há mai-6 nelicidade, hã mai-6 -6ati-6na-
-60-6 nenvone-6. Viz--6e que Santo Ago-6tinho o pnatica~ cão ; pontanto, a divina Bondade tem mai-6 pnazen em
va muita-6 veze-6 -6oltando no lmpeto do -6eu amon e-6- dan a-6 -6ua-6 gnaca-6 do que nÕ-6 em necebê-la-6 (T. I,
tal palavna-6: Ah! Senhon, eu -6ou Ago-6tinho, e "vÕ-6 1 5) •
-6oi-6 Deu-6, todavia, -6e aquilo que não pode -6en pu-
de-6-6e -6en, e que eu no-6-6e Veul e vÕ-6 no-6-6ei-6 Ago-6ti A atração divina se rea l iza por uma comunica
nho, eu quenenia ... tonnan-me Ago-6tinho pana que vã~ ção d e vida, por uma união vital de Deus e de nós~
no-6-6ei-6 Veu-6" (T. v, 6). seus filhos, no Cristo, e depois por uma subida ima
nente desta vida para Deus, seu princípio.
Este amor de benevolência é, pois, a alma da
pregação evangélica e da liturgia. Longe de pôr em A vinha é o símbolo joanino dessa união vital
contraposição a vida interior pessoal, a vida litúr do Cristo e de seus membros. Corresponde ao símbolo
gica, a ação coletiva, Francisco de Sales, como dis do Corpo místico preferido por São Paulo, que empre
semos, sublinha sua necessária ligação. ga também a imagem do enxerto. Esta comunicação da
vida divina e esta atração da vida humana em Deus
se re alizam graças à "aderência", termo beruliano,
A CONVERGÊNCIA ou à " inesão", termo salesiano. Esta "inesão", esta
solda , por sua vez, realiza-se pela fé viva, na agu
Neste conhecimento delicioso e amoroso da con deza do espírito. Também aqui o papel essencial da
templação, a alma descobre sua relação com o Deus luz!
vivo e a lei de atração que a eleva para a infinita
Bondade. A atração divina se exerce em nós em razão Quando Veu-6 no-6 dâ a nê, entna na alma e nala
de uma correspondência Única entre Deus e o homem ao e-6plnito, não pon di-6cun-6o-6, ma-6 pon in-6pinacão,
para a perfeita realização de todas a s coisas. pnop ondo com tanto agnado o que -6e deve cnen, que
excita o entendimento a con-6entin e a aquie-6cen ã
Ê cento que Veu-6 não p~de neceben penneicão al vend ade, -6em he-6itacão nem de-6connianca. Veu-6 apne-
guma do homem, ma-6 como homem não pode -6en apenneI -6enta o-6 mi-6tênio-6 da nê ã alma entne ob-6cunidade-6
coado -6enão pela divina Bondade, também a divinaBon e t neva-6, de nonma que não vemo-6 a-6 vendadu, ma-6 -6Õ
dade não pode, -6ob cento ponto de vi-6ta, exencen m~ a-6 entnevemo-6; como acontece quando a tenna e-6tá co
lhon a -6Ua penneicão, nona de -6i, do q~e -6oconnendo benta de nevoeino. Entao não podemo-6 de-6continan o
-no-6. -6o l, ma-6 -6Õ vemo-6 um ~ouco mai-6 de clanidade do la-
do em que ele utã ... Ê i-6to que chamamo-6 entneven.
O homem tem gnande nalta e ê capaz de neceben E, to da via, uta o b-6 cuna clanidade da nê entnando no
o bem, e Veu-6 ê nico e ê inclinado a dan. Nada mai-6 e~plnito, não pela nonca do di-6cun-6o, nem pela apa-
a pnopÕ-6ito pana um pobne do que encontnan um nico nencia do-6 angumento-6 ma-6 -6Õ pela -6uavidade da -6ua
libenal, nem há nada que cau-6e mai-6 pnazen ao libe- pne-6enca, -6ubjuga e domina o entendimento com tanta
nal do que depanan uma milênia pana -6oconnen. A in- aut onidade, que a conviccão que no-6 dâ da vendade
digência então de-6apanece, como o vácuo pela entna- -6ob nepuja toda-6 a-6 outna-6 conviccõu do mundo, e -6ub
mete a tal ponto o e-0plnito e todo-0 0-0 -0eu-0 nacio- O CONHECIMENTO E O AMOR
cinio-0 que já nenhuma innluência exencem companati-
v ame nt e ( T. II, 1 4) . Todos aqueles que passaram das trevas destem~
d o para a admirável luz do Cristo conheceram, cada
Vemos, pois, o papel determinante do conheci- qual à sua maneira, essa primavera da graça, quando
mento: a fé viva suscita o movimento. É o próprio 0 amor celeste, sol da alma, vai inundando-a c_om -0ua
Deus quem cria no entendimento a firme persuasão da c_ lanidade, e não ce-0-0a enquanto não a cobnin total-
fé ao se revelar à alma como o Deus vivo e real, co mente com o e-0plendon de -0ua pne~ença. O céu dos dl
mo o Deus que vem a nós, que nos ama e que age em vinos mistérios é então conhecido como real, e te-
nós: assim, ele provoca uma resposta existencial do mo s consciência de nele estarmos engajados. Até mes
homem; uma resposta que compromete não apenas a ade mo este mundo material nos aparece com novo aspecto:
são do intelecto, mas o impulso de toda a pessoa se ele atinge seu sentido definitivo em sua relação trans
gundo toda sua existência: é o devotamento a Deus~ cendente com Deus; a vida terrestre se reveste de
também, o movimento para a vida eterna que Deus quer seu caráter episódico, mas também assume seu valor
nos comunicar em sua plenitude, inicialmente neste inf inito diante da eternidade, seu valor durável.
mundo, de maneira perfeita r.o reino celeste. Deste
ponto de partida, vemos também que a esperança e a A vendade ê o objeto da no-0-0a inteligência e,
caridade não podem contradizer-se nem excluir-se. pontanto, toda a -0ua -0ati~nação ê de-0cobnin e conhe
e en a vendade e~tudando e aplicando-~e ã medida qui
A-0-0im como expondo-no-0 ao meio-dia ao-0 naio-0 en contna mai-0 penneiçõe-0 ne~ta-0 vendade-0 ... E que
do -0ol logo que vem~-0 a luz, no me-0mo in-0tante -0en- alegnia não ~ ente o no-0-0 o u plnito quando, guiado pe
timo-0 o calon; tambem logo que a nê ilumina o enten la nevelação divina, começa a ven a-0 -0agnada~ venda
dimento, no me-0mo in-0tante a vontade -0ente o -0anto de-0 da nê?! ... A nê ê uma contemplação da nace me~~
calon do amon cele-0te. A nê naz-no-0 conhecen com u- ma de -0ua gnandeza divina que não vemo~ em todo o
ma centeza innalivel que Veu-0 exi-0te, que ê innini- bnilho da glÔnia, ma-0 a divi-0amo~ eom o ~ol ao pni-
to em bondade, que pode e quen comunican--0e a nÕ-0, meino alvonecen do dia ... u quão delcio-0a ê a -0anta
poi-0 que pon uma bondade inenâvel no-0 pnepanou to- lu z da nê, pela qual -0abemo-0 com uma incompanãvel
do-0 0-0 meio-0 nece-0-0ãnio-0 pana alcançanmo-0 a nelici- eenteza não -0Õ a hi-0tÕnia da onigem da~ cniatuna~ e
dade da glÕnia etenna. de -0eu vendadeino u-00, ma~ também a do na~cimento
• etenno do gnande e -0obenano Venbo divino, ao qual
Temo-0 uma inclinação natunal pana o -0umo bem, e pelo qual tudo noi neito, e que com o Pai e o E-0-
e pon i-0-00 o conação -0ente ~m Intimo andon e uma plnito Santo ê um -0Õ Veu-0, ~nico, adonado e louvado
continua inquietação, que lhe não penmite ten -00-0-0e pelo-0 ~ êculo-0 do-0 -0 êculo-0 ! (T. III, 9) .
go, nem deixan de mo-0tnan que lhe nalta a -0ua -0atil
nação completa e o -0 eu -0 Õlido contentamento. MM quan O conhecimento gera o amor, mas o amor aviva
do a -0antI-0-0ima nê nepne-0enta ao no-0-00 e-0plnito e-0~ o d esejo de conhecer o Senhor, de onde renasce um
-0e belo objeto de -0ua inclinação natunal, õ Senhon fer vor incrementado pela caridade.
Veu-0, que contentamento, que pnazen, que delicio-0a
com~ção da alma! A qual, comq -0unpneendida e enleva Dizei-me Teôtimo, quem tem mai-0 nonça: o amon
da a vi-0ta de-0-0a nonmo-0una, exclama cheia de amonT Pana contemplan o Bem-Amado, ou a vi-0ta pana o na-
U como -0oi-0 belo, meu bem amado, Õ como -0oi-0 belo! zen aman?
(Ct 1,15) ... Enc.ontnei en6im, diz a alma a-0-0 ,ém mo-
vida (Ct 3,4), encontnei o que de-0ejava ... O conhecimento ê e-0~encial pana a pnodução do
amon, vi-0to nunca podenmo-0 aman o que não conhece-
◄ '"'
mo6; ã me di da que aum e nta o conhecimento atento do O êxt.a,óe chama- 6 e a1t1tebatamento, quando polt meio
bem, mai6 c1te6ce o amolt, contanto que não haja nele del e Ve u6 no6 at1tai e eleva ate 6i; e o a1t1tebatamen
nada que ponha ob6táculo ao óeu de6envolvimento. S~ to tem o nome de êxta6e logo que 6lcamo6 601ta e acI
cede po1tem, muita6 veze6 , que o conhecimento, tendo ma de noó me6mo6, pa1ta no6 uni1trno6 a Veu6. o~ encai
p1tod uzido o amolt divino, e não ~ e detendo o amolt no6 to6 que no6 athaem da pa1tte de Veu~ 6ão adm[1tavet~
li mite6 do conhecimento que e6ta no entendimento, ment e doce6, 6uave6 e delicio6o6. A beieza e bonda-
pa66a alem e avança muito pa1ta longe dele, de 601tte de divi na, palta at1tai1t a no16a atenção e aplicaç_ãodo
que ne6ta vida mo1ttal podemoó telt mai6 amolt do que e6pl1tito, tem tal 601tç_a que, não 60 no6 eleva, ma~
conhecimento de Veu6. no6 a1t1tebata e t1tan6po1tta. Polt out1to lado, em 1tazão
do con6 entimento da vontade e a1tdente movimento pe-
Ê o que a66egu1ta o g1tande Santo Tomá~ dizendo lo qual a alma a1t1tebatada co1t1te ap o~ noMM atti.ativ 06
(2 a 2, ae, q. 82, a. 3, 3m): que muita~ veze6 "06 divin o6, paltece que não 6obe apena6 e 6e eleva , ma6
mai~ 6implu e a6 mulhe1te6 abundam em devo cão"; 01t- 6e lanç_a e p1tojeta pa1ta 601ta de 6i na p!top~ia Vivin
dina1tiamente 6ão mai~ capazeó do amolt divino que 06 dade (T. VII, 4) .
mai6 hábei6 e e1tudito6 6ábio6 (T. VI, 4). O de6ejo
de obtelt o amolt divino 6az-no6 medita1t, e o amolt ob O1ta, e6te a1t1teba,tamento de amolt opelta-6 e na von
tido 6az-no6 contempla!t; po1tque o amolt 6az-no6 a~ tade da ~ eg LLinte manei1ta: pelo6 at1tativ 06 da 6ua 6ua
cha1t uma 6uavidade tão g1tata no objeto amado que 06 vidad e, Veu6 implte66iona-a e logo, como a agulha a~
no660ó e6pl1tito6 não6e 6aciam de o velt e de o con~i t1talda pelo Imã óe move e volta palta o polo, e6que-
de1ta1t (T. VI, 3). c endo a 6ua condiç_ão de in6en~Ivel, a66im a vontade,
t ocada pelo amo1t cele6te, di1tige-~e e eleva-6e pa1ta
A contemplação torna-se, então, fonte constante Deu~ e, deixando toda~ a6 6ua6 inclinacÕe6 te~1tena~,
de amor, de movimento e de ação. ent1ta num a1t1tebatamento qu e não e de conhecimento
ma6 d e gozo, não de admi1taç_ão ma6 de a6eto, não de
ciência ma6 de expe1tiência, não de vi6ta ma6 de 6u-
O ÊXTASE VE AÇÃO bümado g o6 to (T • VI I , 5 ) •
A admiração de Deus e dos mistérios do Cristo, Esta forte união com Deus, longe de ser incom-
sob a influência do Espírito, pode ir a t é o arrebata pat ível com a ação, é, ao contrário, causa de pulto
mento e até o êxta6e, que não é aqui senão o ultra= e ab6oluto devotamento a Deus e aos homens: é o "êx
passamento de si mesmo; uma .~aida de no6 me~mo6 prQ ta s e de ação".
vocada por uma contemplação intensa da beleza do ob-
j eto. Para descrever o êxtase, São Francisco de Sa- Alem do6 mandamento6 divino6, há in-0piltaç_Õe6 ce-
les tem sob os olhos, ao que parece, a imagem de Ma- l eóte~ palta cuja execução não ~ô e p1tecióo que Veuó
dame Acarie. Ele distingue três espécies de êxtases: no ó exalte além daó nOóóaó 601tç_a6, maó que também
o de contemplação, o de afeição e o de ação; é no de no ó at1taia acima do~ inótinto~ e inclinaç_Õeó da no~
ação que vê não apenas o ápice do movimento extático, óa natu1teza. Tanto maió que, ainda que e6óaó in6pi~
mas também o critério dos outros dois. Por sua des - lta ç_Õe~ não ~ejam cont1tá1tiaó ã 1tazão humana, excedem
crição do êxtase de ação, aliás, ele normaliza esse -na, todavia, ult!tapa~~am-na e eótão óUpe1tio1teó a
ultrapassamento heróico de si no devotamento à cau sa ela; de modo que, neó6e ca~o, não vivemoó óÔ uma vi
de Deus e dos homens: ele vê ai uma união tão for- da civil, honeóta e c1ti6tã, ma~ uma vida óOb~e-humi
t e com Deus que a alma pode, então, sustentar todos na , devota e extática, i6to e, uma vida de todo ~
os combates da caridade pela causa do Senhor; seu i- Po nto óUpe1tio1t ã n0~óa condição natu1tal.
ideal aqui, sem dúvida, é São Paulo.
Não 1touba.1t , não me..ntiJt, não .6 e.Jt luxu1tio.60, o- tic a. é, pois, o termo normal e desejável do cris-
Jtalt a Ve..u.6, não Ju1ta1t e..m vão, amalt e. hon1ta1t pai e. tão perfeito. É aqui que aparece o caráter cristo-
mãe., não matah , ê vive.Jt con601tme.. a. Jtazão natu.1tal do cêntrico do movimento da vida espiritual e todo o
home..m. Po1tê.m, de.i xa.Jt todo.ó 0-0 no.6.60.6 be..n.6, amalt a po sen tido do movimento cósmico, pois o homem é o ápi-
b1te..za., p1tocu1tá- la e. con.6ide..1tã-la como di1te..t1tiz de..lI ce e a pe..1t6e..ição do mundo.
cio.6a, .6upo1tta.1t op1tâb1tio.6, de...6p1te..zo.6, obje..çÕe...6, pe..i
.6e..guiçÕe...6, maht~Jtio.6, e..m ve.z de. 6e..licidade...6 e. con~
te..ntame..nto.6; eo nt e..1t-.6e.. no.ó te..Jtmo.6 da mai.6 ab.óoluta A TEOS FERA
ca.6tidade.., e. e.m ~uma. vive.Jt e..m me.ia do mundo e. de...6ta
vida moJttal contt a toda.ó a.6 opiniÕe...6 e. mãxima.6 mun- Se não tornarmos cuidado, poderemos condenar São
dana.ó e. contJta. a ma1tê. do Jtio da vida, polt me.ia de. Francisco de Sales por nos ter legado urna doutrina
1te...6ignaçÕe...6 c ontZnua..6, Jte..n~ncia.6 e. abne..gaçÕe...6 de..n~ individualista sobre o amor divino, embora, sem dú-
p1t6p1tio.6, i.6to nao ê, vive.Jt hu.maname..nte.., ê. uma vida vida , muito bela e muito bela e muito profunda.Não
.6 o b1te..- humana.; não ê viv e.Jt e..m nÔ.6, ma.ó alê.m de. nÔ.6, e. podemos negar que a união com Deus, princípio e fim
e..m plano .6upe..h~O h à no.6.6a na~uJte..za.. E como polt e...6te.. da religião cristã, seja urna realidade individual.
p1toce...6.60 ningu~m pode. .6ai1t de. .6i, .6e..m que. o Pai e..- Não poderíamos conceber urna vida unitiva de um âng~
te..Jtno o at1taia, e..6ta. e...6pê.cie.. de. vida de..ve.. .6e..Jt um aJt lo puramente coletivo; a salvação é, fundarnentalrne~
1te..batame..nto c ontZnuo e. um pe..1t pê.tuo êxta.6e.. de. ação e te, urna aventura pessoal, mas esta salvação realiza
de. ope..Jtação (T . VII, 6). -se, no entanto, na Igreja, e o aspecto social do
drama não poderia ser nem omitido nem diminuído. Fran
São Francisco de Sales distingue, pois, dois es cisco de Sales teve clara consciência disso: ele nos
tados de vida n a Igreja: a vida civil, hone...6ta e. c1ti"7.; ensina, precisamente, este amor que nos incorpora
tã, e a vida e.. .6 pi1ti tual, devota, qualificada corno todos e cada um ao Cristo, a fim de formar o mundo
.6ob1te..-humana e. e.xtática.. A vida extática, no senti- invi sível, escondido na glória de Deus, mas a par-
do definido, esta ria reservada a alguma elite, ou se tir do mundo visível.
encontraria aber t a a todos e constituiria o termo
mais desejáve l Pa ra todos? O pensamento do doutor é Tal é, com efeito, o termo, a partir deste rnun
claro. Paulo a ss i m escreve a todos os cristão de Co do, do êxtase de obra, de vida ou de ação: o EspírI
lossos: Mo1t1te...6 t e..6 e. a. vo.6.6a. vida e...6tã e...6condida. coi to de Deus nos transpõe no Cristo e, embora perrnan~
C1ti.6to e..m Ve..u .6 (Cl 3,3). Francisco de S~les vê, nes cendo ainda neste mundo, e trabalhando para o bem
te texto, a própr ia definição da vida extática do deste mundo, não somos no entanto de...6te.. mundo (Jo
cristão. 17,14) , mas do mundo celeste. O Cristo vive e reina
agora no centro deste mundo invisível, em Deus, e é
A moJtte.. 6az co m que. a alma já não e..xi.6ta. no pito ao Cristo que estão unidos todos os espíritos de to
p1tio coltpo, nem no .6 e. u invÕlu.cJto. O que. .6igni6ica.~ da a criação que vivem da graça de Deus; e porque
Te..Õtimo, aque..l a. pa.la.vJta do apÕ.6tolo: Mo1t1te...6te...6? Ê co sua união com Deus, no Cristo e por Ele, tende, por
mo .6e. di.6.6e...6.6 e. : Já não vive.i-0 e..m vÔ.6 me..6mo.6, ne..m no uma energia divina, a tornar-se tão semelhante quan
invÕlucJt~_da_ vo.6 .6 a pnâp1tia. condição na.tu1ta.l; a vo.6- to possível à sua, que é hipostática, e perfeitarnen
.6a. alma Ja na.o viv e .6e..gunda e.la me...6ma., ma..6 a.cima te sobrenatural, podemos dizer que o amor que os le
de. .6i me...6ma. (T . VII, 6). E ainda: Fina.lme..nte.. ap1te..- va a essa união é essencialmente extático, porque
.6e..ntou São Pa ulo o mai.6 601tte.., o mai.6 e...6maga.do1t e. o ele os leva em Deus não apenas além de si mesmos,
ma.i.6 admi1tãve..l a.tgume.. nto que. jama.i.6 6oi ouvido,CJiuo mas além de qualquer aspiração possível à natureza
e..u, pa.Jta. no.ó l e..V QJt a todo.ó a.o êxta..6e.. e. ao a.1t1te..bat~- Criada. Corno a união do Verbo e da natureza humana
me..nto da vida e. da.ó ob1ta..6 (T. VII, 8). A vida e..xta.- em Jesus Cristo é de perfeição infinita, o rnovirnen-
1n~
to extático dos espíritos tende, pois, sem nunca po t una~. A~~im como exi~te etennamente uma comunica-
der atingi-lo, para esse supremo grau de amor que ção Zntima em Deu~, pela qual o Pai comunica toda a
constitui a unidade do Homem-Deus e que permite a j ua divindade ao Filho, que dele pnocede, o Pai e o
Jesus dizer: Eu e o Pai ~amo~ um (Jo 10,30). E nos- Filho, cniando juntamente o E~pZnito Santo, comuni-
sa união com Deus é tão forte que faz São Paulo di- cam-lhe igualmente a ~ua pnôpnia e Única divindade;
zer, no sentido de uma analogia: Eu vivo, ma~ jã não do me~mo modo, e~te ~obenano bem 6oi comunicado 60-
~ou eu que vivo, pai~ ê Cni~to que vive em mim (Gl na de ~i tão pen6eitamente a uma cniatuna, que a na
2,20). tuneza cniada e a divindade, con~envando cada uma
aj ~ua~ pnopniedade~, 6onam contudo pontal 6onma u
Efetivamente, é sua união com o Pai que Jesus nida~ que não 6izenam ~enão uma me~ma pe~~oa (T. IL
nos deu como modelo e como termo ideal da nossa: Co 4) •
mo tu, Pai, e~tã~ em mim e eu em ti, que ele~ e~te~
jam em nô~ (Jo 17,21). Esta união, a mais perfeita É, pois, pela encarnação do Verbo, já presen-
possível, do Criador e da criatura, é o fim último te no mundo 6eito poh Ele (Jo 1 ,3), que se realiza
da vontade divina no Verbo encarnado: ela é o termo a c onvergência, a perfeita união da criatura e do
imutável do eterno conselho para o qual se dirigem Cri ador. Eis de que maneira:
todos os espíritos que não recusaram a graça da gló
ria. Este desígnio de Deus, segundo São Francisco Ona, entne toda~ a~ cniatuna~ que e~ta ~upne
de Sales, que se apóia, conforme seu modo de pensa 4 ma onipotência podia ~nian, 6oi do ~eu agnado e~co~
sobre a melhor interpretação da Escritura e dos Pa- lh en a me~ma humanidade que maú, tcULde. ~e uniu ã Pu
dres, é desejado por ele antes mesmo de qualquerque jo a de Deu~ Filho, ã qual 6oi de~tinada e~ta honna
da e de qualquer pecado: para ele foram elevados os inc ompanãvel da união pe~~oal ã ~ua divina maje~ta-
anjos que não pecaram. Assim, pois, abre-se à fé o de, pana que etennamente goza~~e pon excel..ênua do~
plano da teosfera, invisível aos olhos da carne, a- te~ouno~ da ~ua in6inita glônia. Tendo a~~im pne6e-
penas visível aos olho~ iluminado~ do ~onacão: to- nid o pana e~ta 6elicidade a ~agnada humanidade do
dos os espíritos criados de todos os mundos possí- no ~jo Salvadon, a ~upnema Pnovidência di~pô~ não li
veis, dos mundos terrestres ou dos mundos angélicos, mitan a ~ua bondade na Pe~~oa de~te amado Filho, maJ
só foram destinados para se unir, no Verbo encarna- e~ tendê-la em ~eu 6avon a vãnia~ outna~ cniatuna~,
do e com um puro amor, à divina Trindade: em toda e entne a inumenãvel quantidade de cou~a~ que podia
criação há uma atração do Espírito Santo para essa pn oduzin, e~~olheu cnian o~ homen~ e o~ anjo~, pana
união. Tal é o campo imenso onde se move nosso amor. 6a zenem companhia a ~eu Filho, panticipanem dM ~uM
Para captar o sentido desse amor, não podemos igno- gna ca~ e da ~ua glônia, adoná-lo e louvã-lo etenna-
rar o mundo espiritual no qual estamos engajados: to mente (T. II, 4) •
do o Tratado salesiano é esclarecido por essa visão.
Criados para o amor infinito, os anjos e os h~
Deu~, de~de toda etennidade, ~onheceu que po- men s dev~am gozar de sua inteira liberdade, mesmo
dia cnian uma quantidade inumenãvel de ~ene~ de di- em presença de Deus, visto que o amor é essencial-
ven~a~ pen6eicõe~ e qualidade~, ao~ quai~ ~e pode- men te um ato livre. O Criador previu o abuso dessa
nia comunican. E, como dentne todM M maneinM de ~e comuni- liberdade, os pecados de uns e de outros e as jus-
can, não havia nenhuma mw pen6eita que a da união a algu- tas conseqüências dessa revolta voluntária, mas te
ma natuneza cniada , de 6onma que a cniatuna 6o~~e, ve piedade da natuneza humana, tomando dela uma pa~
pana M~im diz en, enxentada e encnavada na divindade, t e bem-aventunada para uni-la à sua divindade. Õ
pana com ela 6azen uma ~ô pe~~oa, a ~ua in6inita bo!! Cri sto, Deus Salvador, tornou-se então Deus Reden-
dad~ que de ~i me~ma e pon ~i me~ma tende a comuni- to r, pois Deus, ao desejar que a ~uavidade da ~ua
can-~e,ne~olveu e detenminou 0azen uma de~ta~ c~ia-
mi6e.hic6hdia 6o66e. ohnada com a be.le.za da 6ua ju6ti noss a morte mística no Cristo que passanos para ele,
ça, d e.li be. hou 6alvah O home.m poh uma higoho6a he.de.n para pertencermos a ele e não mais a nós mesmos. Ib~
ção. Pois Deus amou tanto o mundo que entregou o seu trina toda pau l ina que Francisco de Sales coloca no
Filho único (Jo 3,16) e de.te.hmi nou que. e.le. he.6gata- centro da sua, apoiando-se neste texto : Poi6 a ~ahi
hia 06 home.n6, não 66 poh uma da6 6ua6 açÕe.6 amoho- dad e. de. Chi~to no6 compe te. , quando con6ide.hamo6 qui
6a6, qu e. te.hia 6ido mai6 que. 6 u6icie.nte. paha he.6ga- um 66 mohhe.u poli.. todo6 e. que, µoh con6e.guinte., to-
tah mil milhõ e.6 de. mundo6, ma6 ainda poh todo6 06 do6 moh~ eham. Oha, ele. mohheu poh todo6 a 6im de.que.
6 o 6hime.nto6 doloho6 06 qu e. e.le. 6 upohtahia, atê_ a moh aqu e.le.6 que. v-i.ve.m não v,i.vam mai6 paiw 6 ,i., ma6 µaha
te. e. moht e. d e. ChUZ (Fl 2,8), ã qual e.le. o d e.6 tinou, aque.le. que. moh!i..e.Ll e. 11-e.,Htv:.citou poh e.le.6 (2Cor 5,14
que.he.ndo que. de.6te. modo 6e. 6ize.66e. o companhe.ihodM - 15). Tal é o sentido profundo, normal e sublime do
no66a6 mi6ê.hia6, paha de.poi6 no6 6aze.h companhe.iho6 ê xtas e salesiano .
da 6ua gl6hia; de.6cobhindo a6 hique.za6 de. 6ua banda
de. (Rm 2,4), poh uta copio6a he.de.nção (Sl 130, 7)~
abundante., 6upe.habundante., magnl6ica e. e.xce.Miva, que. O AMOR PURO E A PRESENÇA NO MUNDO
no6 adquihiu e., paha a66im dize.h, no6 he.adquihiu t o
do6 06 me.io6 ne.ce.66âhio6 paha alcançahmo6 a gl6hia~ Es s a mística do êxtase e do ultrapassamentonão
de. mane.iha que. ninguê_m pude.66e. jamai6 que.ixah-6e. de. s eria, afinal, uma mística de fug a e de evasão? Es-
que. a mi6e.hic6hdia di vi na 6altava a alguê_m (T. II, se desejo do amor que nos trasnporta ao céu não nos
4) • to rnaria indiferentes à sorte dos homens deste mun
do ?
Assim, todo o plano do amor divino é dominado
pela beleza, pela bondade, pela mansidão e pela do- Francisco de Sales, como sabemos, levou muito
çura do Cristo; Ele. ê_ a image.m do Ve.u6 invi61ve.l, o longe a teoria da indiferença. Diríamos que, essen
Phimogé:nito de. toda chiatuha, pohque. ne.le. 6oham chia- cia lmente, uma só coisa importa: o puro amorde Deus;,
da6 toda6 a6 coi6a6, no6 cê.u6 e. na te.hha, a6 vi61- além disto, o que mais importa? Esta simplif icação é um
ve.i6 e. a6 invi61ve.i6 ... ; tudo 6oi chiado poh Ele. e. es boço de sua doutrina.
paha Ele.. Ele. ê_ ante.6 de. tudo e. tudo ne.le. 6ub6i6te..
Ele. ê_ a Cabe.ça da Ighe.ja, que. ê_ o 6e.u Cohpo. Ele. ê_ A conformidade com o beneplácito divino, termo
o PhincZpio, o Phimogé:nito do6 mohto6, (te.ndo e.m tu sub lime do amor de Jesus para com seu Pai, é feita
do a phimazia), poi6 ne.le. aphouve. a Ve.u ~ 6aze.h habI ou pela he6ignação ou pela 6anta indi6e.he.nça. Are-
tah toda a Plenitude. e. he.conciliah poh Ele. e. paha signação prefere a vontade de Deus a todas as coi-
Ele. todo6 06 6e.he.6, 06 da te.nha e. 06 do6 cê.u6, he.a- sas , mas não deixa de amar muito as outras coisas
lizando a paz pe.lo 6angue. da 6ua chuz (Cl 1, 15-20). além da vontade de Deus. E a atitude dos bons cris-
tão s. A indiferença se acha bem acima da resignação,
Este texto de Paulo aos Colossenses, citadopor poi s ela nada ama 6e.não pe.lo amoh da vontade. de. Ve.U6
São Francisco de Sales (T. II, 5), dá ao seu Thata - (T. IV, 3, 4). Toda a doutrina da indiferença deve
do do amoh de. Ve.u6 sua dimensão grandiosa, com o a- ser tirada do rigor desta definição. Assim, o cris-
póstolo, ele compreendeu que "a Encarnação, coroada tão pode ficar indiferente a tudo o que não ame na
pela Ressurreição, colocou a natureza humana do Cris Von tade de Deus, mas pode amar tudo nessa vontade,
to à frente, não apenas de toda a raça humana, mas e e le quer tudo amar nela. Se tudo o que está fora
ainda de todo o universo criado, interessado na sal des sa vontade lhe for indiferente, tudo o que está
vação como o foi na falta" (P. BenoI~ Cl 1, 19, g.i nes sa vontade se tornará para ele muito querido e
Esta visão traça também o caminho do nosso amor ele se rá fortemente amado. Ora, a vontade divina é o pró
deve passar pela cruz para chegar à glória; é pela Pr io Amor infinito que quer todo o bem possível na
criação, todo o bern \ possivel em mim, para mim e pa- Poh que. ama~oj ~ De.uh, Teôti~o? A cau6a poh que
ra meus irmãos; colocar-me neste ponto de vista é amamo6 a. Veu6, d,{_z Sao Be.hiw.,-~du, e. Dcu. ,s me.6mo; que.
amar, querer e fazer o bem em sua amplidão mais ele ê como 6e. di66e.66e que amamo~ a Deu.~ poh se.h a 6o-
vada e mais vasta, em toda sua univer sa lidade po8sI behanl66ima e in6initZj6[ma bonduJe. Poh que ê que
vel ao meu amor identificado com o de Deus. Tal e no6 amamo6 a nÕ 6 me./6 mo ,S r til caticdcui c..? I ndu.bitav e..l'.me.n
te, po11. 6 e.hmo6 a {,tnag em e a 6 e.mc.lhanca de. De.uh. E v í.__J
a caridade de um Paulo e dos Santos que o imitam.
to que. todo6 oi home.n6 t~m e66a me.6ma dignidade., a~
A indi6e.he.nca deve phaticah-6e. e.m tudo o que. ê mamo-lo6 tambêm como a nÓ6 me6mo6, ü)to ê, na quali
he.lativo ã vida natuhal, como 6e.ja a 6aÚde e. a doe.n dade. de 6ant16hima6 e. viva6 image.n6 da divindade.. I
ca, a beleza e, a lealdade., a 6haque.za e. a 6ohca; na-X ne.66a qual~dade. que. nÔ6 pe.hte.nce.mo6 a De.uh, com tão
coi6a6 da vida civil, como 6ão a6 diãtincÕe.6, hon- Uthe.ita alLanca e tão e.6t.ünéiv e.l de.pendência, que. não
ha6 e, hiqu e.z a6; e, na e.xte.n6a e.6cala da vida e6pihi- tem di6iculdade. em 6e dize.h no6,6o Po_i e chanrnh-no6
tual, como ê a tibieza e, a6 con6olacÕ e.6 , a de.ãola- 6e. u6 6ilho6; ê ne.66a qualidade. que. te.moh a capacida
cão e. a ale.ghia. Ve.ve.mo6 6e.h indi6e.he.nte6 no6 ato l, de. d e. noh unihmo6 ã ãua divina e.66ência, pelo gozo
no6 6o6hime.nto6 e., e.n6im, em toda a 6o hte. de. e.ve.n- da 6ua 6obe.hana bondade. e 6e.licidade.; ê ne.66a quali
tualidade.6 ... O ghande. apÔ6tolo phe.gava uma indi6e. - dade. qu e. hece.be.mo6 a 6ua ghaç_a e no66o e.6pl11.ito 6e
he.nca ge.hal paha no6 tohnahmo6 ve.hdad e.iho6 6ehvo 6 a66ocia ao 6e.u 6aze.ndo~no6 pa11.ticipah, poh a66im di
de. Ve.u6: muita paciência na6 thibulacÕe.6, na6 ne.ce.6 ze.h, da 6ua natuhe.za d,í.__v ,í.__nct (2Pd 1 ,4), como diz São
6idade.6, na6 angÚ6tia6, na6 e.n6e.hmidade.6, na phi6 ã~ Leão. ~ a66im que. a me.6ma cahidade. que. phoduz 06 a-
na6 6e.dicõe.6, no6 thabalho6 ,na6 vigllia6 e. no6 je.- tol de. amoh de. Ve.u6, phoduz igualmente. 06 do amoh do
jun6 (2Cor 6,4ss) . . . . Con6ide.ha, Te.Õtimo, como e.ha p4Õximo. fo h i66o Jacô comphe.e.nde. u que. aquela e.ãca-
athibulada a vida do6 apÔ6tolo6: paha o cohpo tive.- da, que. âabia da te.hha ao cêu, tanto 6ehvia paha oh
ham 6e.hida6, paha o cohacão angÚ6tia6, e. o mundode.u anjo6 d e.6 ce.he.m como paha 6ubihe. m 06 home.n6. Tambêm,
-lhe.6 e.m he.thibuicão a de.lanha e. e.nce.hhou-06 e.m phi nÔ6 6abe.mo6 que. a me.6ma dite. cã o abhange. o amoh de.
6Õe.6. E em me.ia de. tanta6 amahguha6, ô Se.nhoh, que Veu6 e o do phÔximo, levantando o no660 e.6plhito ã
indi6e.henca a de.le.6! A 6ua thi6te.za e.ha ale.ghe., a união com Ve.u6 e. he.conduzindo-o ã amo11.éive.l 6ocie. da-
pobhe.za hica, a mohte. de.6e.nthanhava-6e. e.m vida, e. a d e. do ph Ôximo (T. X, 11).
de.lanha e.nobhe.cia-06. Que.h dize.h: 06 apÔ6tolo6 ach a
vam phaze.h na thi6te.za, ale.ghia na indigência, ale.n E este amor deve ser real: não confudarno s o mo
to no6 pe.higo6 e, atê na mohte., e, glÔh~a no de.6phe.zo tiva e o objeto do amor; por causa do motivo , nã~
do mundo, pohque. todo6 e.M, e.6 tohme.nto6 e.ham da vonta nos esqueçamos do objeto. t pelo amor de meu Deus
d e, d e, V e, U6 (T . I X, 5) . que amo meu irmão e, portanto, é meu irmão q ue eu
amo, mas com um amor que eu não teria se não amasse
Em suma, importa sermos indiferentes a tudo o meu Deus. Devo, pois, amá-lo como Deus o ama e com
que poder i a con t entar nosso individualismo, para me o mesmo amor que levava São Paulo a dizer : Ele me.
l hor nos doarmos e nos devotarmos ao bem universal amou e 6e e.nt11.e.gou a li me.6 mo poh mim (Gl 2,20) · D~
segundo o Cristo e no Cristo, e para realizarmos o vemos, pois, amar nossos irmãos, os homens , de qua!
desígnio de Deus no mundo. Assim jorra em toda sua quer cor, de qualquer classe, de qualquer raça, com
luz a idéia de urna fraternidade universal que foi toda a e.xte.nãão de. no66o cohacão e não no6 co nte.~-
tão tão cara ao santo bispo de Genebra. Ele quises tahmoh com améi-lo6 como a nÔ6 me.6mo6 ... mal · · · ma,<_6
crever sobre este importante asssunto um Philad e.l~ do que. a nÔ6 me.6mo6, paha ob6e.hvah 06 mandame. nto6
phe.; só pôde nos dar um principio dele, sobre o qual da pe.hne.icão e. vangêlica ... a66im co~o ~0 66 º Se.nhoh
devemos meditar. 6e.mphe. phe.6e.hiu a nÔ6 do que. a hi p11.opJ1.,<_0 • · ~ Eãte
amoh cohdial deve 6eh acompanhado poh dual V,{,11.tudeã:
1 1 ')
a a 0ab~lidade, que dinunde c.enta -0uavidade no-0 negQ nial para se revestir no termo do Tempo de um corpo
c.io-0 e c.omunic.acõe-0 -0enia-0 ... e a boa c.onven-0acão, espiritual, pneuma, conseguido por intermédio do
que no-0 tonna gnac.io-00-0 e agnadâv ei-0 no-0 ne c.neio-0 e Cristo morto e ressuscitado por nós. O último e mais
c.onven-0a-0 meno-0 -0ê,nia-0 (T. IV,). desejável efeito da caridade perfeita é, pois, amo~
te de amor. Os eleitos morrem, ao menos, no amon; os
O bom santo não era inimigo do humor, mas sua mais fervorosos morrem no exenc.Ic.io do amon; os he-
bonomia era encantadora: ele se retrata nesta des- róis da caridade morrem de amon, tais como, segundo
crição caridade fraterna. E como sentimos suas en nosso autor, São Francisco de Assis, Santa Madalena,
tranhas se comoverem na presença dos homens, ima= são Basílio, Santa Teresa, São José e, sobretudo, Nos
gens de Deus: Ah! meu e.ano Teôtimo ... não devenia- sa Senhora. Tal é, pois, o último cume da vida para
mo-0 dizen un-0 pana 0-0 outno-0: Repanai pana uta c.nia onde nos leva o dinamismo do amor puro: mon-0 beata!
tuna, e.orno ela -0e panec.e c.om o no-0-0O Cniadon? E de~ Este efeito foi lento e retardado nos outros santos,
vZamo-0 abnacâ-la c.om e.aninho, nodeâ-fa da-6 no-0-0a-0 a ponê,m, na Vingem SantI-0-0ima, tudo óavonec.ia e -0ec.u~
tencõe-0 e c.honan de amon pon ela. Por amor dela?Não dava o c.un-0O do amon c.ele-0te, openando--0e nela au-
sabemos sabemos se é digna de amor por si mesma.Mas mento-0 e pnogne-0-0O-0 na penóeicão inc.ompanavelmente
pelo amor de Deus, a quem e-0-0a c.niatuna pentenc.e, pa mai one-0 que em todo o ne-0to da-0 c.niatuna-0; e, toda-
na quem ê,, pon quem exi-0te, em quem vive e c.om quei via, e-0-0e-0 pnogne-0-00-0 enam inóinitamente doc.e-0, ame
-0e a-0-0emelha (T. X, 11). no-0 e pac.Ióic.0-0. Não, ela não de-06alec.eu de amon nem
de compaixão junto~ c.nuz de -0eu Fi .tho, po-0to que
Mas tal amor não poderá ser eletivo? Sem negar -0enti-0 -0e ne-0-0e momento o mai-0 inten-00 e dolono-00 a-
a predileção, o doutor da caridade queria realmente c.u -00 · de amon que pode c.onc.eben--0e; pon extnemo que
que fosse universal, pois em todo homem, mesmo o a- óo-0-0e e-0-0e ac.e-0-00, ena igualmente inten-00 e doe. e ,
parentemente mais degradado, ele via em sua natune- -0imultaneamente podeno-00 e tnanqailo, ativo e pac.i-
za a imagem de seu Deus e a possibilidade do bem di óic.o, mi-0to de pungente e de -0uave (T. VII, 14).
vino. Deus está em todo homem pelo menos como causa
de seu ser e como agente de sua salvação: "Deus Foi aí, no entanto, que ela recebeu o golpe
quer salvar todos os homens". A fraternidade univer de espada de dor que ocasionou sua morte: vivendo
sal tem seu fundamento na "filantropia" de Deus. Es da vida de seu Filho, ela só poderia morrer da mor-
tamos, aqui, no âmago do espírito salesiano. Qual a te da qual Ele morreu e reviver da vida da qual Ele
finalidade desse amor? • vive: assim, a Virgem resume e recapitula o destino
da humanidade de antes da Parusia.
A MORTE DE AMOR Ona, -0e e-0ta Mãe viveu da vida de -0eu Filho,
tamb ê,m monneu da -0ua monte: tal vida, tal monte, ...
O amon ê,tão óonte e.orno a monte, gostava de re- Algun-0 -0agnado-0 amante-0 pne-0enc.ianam a monte do Saf
petir São Francisco de Sales. E acrescentava: O a- vaâ on; entne ele-0, 0-0 que mai-0 o amavam maion don
mon ê, mai-0 óonte do que a monte, pois triunfa sobre -t.entinam . ... Ma-ti a doe.e Mania, que o amava ac..ima de
ela. O amor é forte como a morte porque ele faz pon tod o-0, mai-t. do que nenhum óoi atnave-0-t.ada pela don
aóeicão o que a morte faz pon eóeito: ele -6epana a qu e, qual aguda e-t.pada, lhe tne-0pa-t.-0ou o c.onacão de
alma do amante de -0eu c.onpo e de toda-0 a-0 c.oi-0a-0 do Mã e. Tanto mai-t. que e-ti-0e c.onacão pul-0ava junto e i-
mundo, a fim de uni-la eternamente a Deus, no que de ntióic.ado c.om o de -0eu Filho, numa união tão pen-
triunfa sobre a morte. A morte aparece então, aqui, óeita que não ena po-0-0Ivel óenin um -0em atingin o
como uma "metamorfose" na qual a "realidade-espíri- outno em c.heio. Ona, e-0te peito motenno, a-0-0im óeni
to", a alma imortal, se despoja de um corpo mate- do de amon, qui-0 c.on-0envan a óenida, não lhe bu-0c.ou
11A
afZvio; phe6ehiu a doh a todo o con6ohto, con!:,ehvan
do cahinho1:,amente todo1:, 01:, ve1:,tlgio1:, dela, poh amo~
de quem lhe1:, imphimiha no cohação, de1:,ejando conti-
nuamente mohheh, jâ que 1:, eu Filho mohheha. . . . Fi-
nou-!:, e enthe a1:, chama!:, da cahidade, hofocau1:,to peh-
6eito poh to do1:, 01:, pecado1:, do mundo (T. VII, 1 3) .
Assim como o ímã atrai o ferro com uma atração
cada vez mais forte, caso nenhuma impureza o impeça,
assim também a Virgem, não tendo em 1:,i nada que 061:,
ta1:,1:,e a opehação do divino amoh do 1:,eu Filho, unia~
-!:,e a Efe numa união incompahâvef, em doce1:,, 1:,uave1:,
e natuhai1:, êxta1:,e1:,. Ne1:,te1:, a pahte 1:,en1:,Zvel não dei
xava de teh o 1:,eu quinhão, 1:,em contudo phejudicah a
união do e1:,plhito ... Foi, poi1:,, a mo~te da Vihgem
a mai1:, doce que pode imaginah-!:,e. Ela se abismou a-
moho1:,amente, no 1:,eio da bondade de 1:,eu Filho;
deixou seu corpo 1:,em cu1:,to, como a casta Judite se
despojou de suas vestes de luto para se revestircom
novo!:, hâbito1:, nupciai1:,. O amor dera a Maria junto
da cruz a!:, -6 uphema1:, dohU da mohte; j u1:,to eha que no
6im da 1:,ua exi1:,tência lhe concede1:,1:,e a1:, 1:,obehanM de-
fZcia1:, do amoh (T. VII, 14).Tal é a morte com a qual
o santo bispo sonhava morrer, se não morreu de amo 4
morreu, pelo menos, no exercício do amor .
A GLORIFICAÇÃO
1 Ar\
ür as explosões da n a tureza, perdi um pouco do meus às vi s itand i nas reconstruir suas casas na França, com
1au humor" 3 9 • E sua ma nsidão, fina.lmente, t ornou-se a condi ção de que criassem obras de utilidade públi
:al que era comparada com a de São Francis c o de Sa- ca: mui t as s e d edicaram à educação de moças; pude=
Les. ram, desta forma, ma nt er a co r ren t e da v i da r e li-
giosa e sua infl u ênc ia s e f ez s e ntir um pouco p or
A partir dessa conversão ao amor complacente e t oda parte, sej a n o s meios d a j uve n tude , se j a na
;ondescendente, São Vicente vai encontrar de cidida criação de tantas institu ições relig iosas q ue f l o -
1ente seu caminho providencial. Bremond diss e muitÕ r esceram por vo l ta d e 1830. Fo i d e st ac ado o pa re n-
)em: "Não foi o amor dos homens que o conduzi u à san t esco espiritua l de Sa nta Tere sa de Lisi e ux com São
:idade; foi, antes, a santidade que o tornou verd a= Francisco de Sal e s: a Madre Inês, su a "mã e zinha", ha
leira e eficazmente caridoso; não foram os pob r e s vi a efetivamente recebido s ua f o rma ç ão sal e siana na
1ue o deram a Deus , mas Deus pelo contrário, que o Vis itação de Mans. Um estudo minucios o do impul so re
leu aos pobres" (Bremond, III, 246). Também a q ui a li gioso do século pa s s ado n o s r e vel ar ia mu i tas in=
Lnfluência de São Francisco de Sales parece evid e n- fl uências semelhantes 41 : a graça dos santos não mor
te. Vicente de Paulo tomou conhecimento da prime ira r e e sua fecundidade é admirável. Nós aind a a encon
Lntenção de seu amigo sobre a Visitação e de s eus tr amos na renov ação das instituições religiosas mo=
io i~ 6in~ p11.in~ipai~ : proporcionar o bem da vida de rnas.
religiosa a "frágeis mulheres e visitar os pobr es
= os doentes; em circunstâncias providenciais, d i an- Francisco d e Sales, como vimos, f racassou em
te da imensa miséria da França, ele adotou esse p r o seu propósito de formar uma sociedade de padres ani
?Ósito, mas adaptou-o às necessidades e aos recur= mada por seu espírito: esta graça só lhe foi conce=
3Os de um grande pals 4 0 • <li da após sua morte. M. Banal (1600-1653), um Rouer
gat de Villefranche, instituiu a "Sociedade dos Pa=
Como superior da Visitação, como diretor espi- dres da Visitação e de São Francisco de Sales" . Ela
Litual da Madre Chantal, bebendo sem cessar nas fon não s obreviveu à Revolução, mas, em 1838, D. Rey, bis
tes salesianas, deu, naturalmente, dessa água viva po d e Annecy, deu a investidura aos "Missionários de
is suas "Filhas da Caridade", que chamavam Francis- São Franc isco de Sales", fundados à sombra da Visi-
co de Sales, como ele próprio aliás, de "nosso Pa i ". tação, pelo padre Mermier, que realizou, deste modo,
rodos os dias elas liam um capitulo da Int11.oducão, o sonh o do santo de ir levar às índias e à Inglater
e São Vicente constatou, em 1641, que essa • prática ra a fé católica: seus filhos erigiram no Orient~
lhes era "de grande proveito''. Todo o grande mov~- o vasto e próspero vicariato de Vizagapatan 4 2 •
mento caridoso do século XVII nasçia, pois, da ami-
zade desses dois santos e de uma concepção idênti-
ca do amor efetivo.
4 1 • Esta influ~ncia é notável em Santa Te.resa dv Me
nino Jesus e em Santa Emília de Rodat. É sur=
AS FAMÍLIAS SALESIANAS pre e n dente também na vida da Madre Conduché, fun
dado ra das dominicanas d o Rosário, formada pelas
A influência salesiana da Visitação não foi e~ Filhas d e Nossa Senhora, e estas, por sua vez,
tinta pela Revolução. Napoleão, em 1806, permiti u formada s, depois da Revoíução, pelas visitandi-
nas. Tais casos não são raros. Cf. Lajeuni e , La
39. Coste, 1. c., torno I, p. 1 38. Prieu re de Bor, Monteils ( Ave ~ ron)
40. Coste, 1. c., p. 108, n. 1•
42. Ver J. Rey , Lu mi~ ~i oncú11. u de. ~ai nt F11.ancoi~
de. Sa.tu, 1 9 s 6.
Os "Oblatas de São Francisco de Sales", funda- O espírito salesiano anima ainda numerosas con
perto da Visitaçãode Troyes pelo padre Brisson gregações ou associações, modestas, discretas, mas
~17-1908), foram animados pelo mesmo espírito de tão ativas quanto as abelhas e muito caras ao san-
~idade conquistadora em seu apostolado na África, to: as "Irmãs de São José'', em numerosas dioceses;
Equador, no Brasil e no Oriente Médio. as "Irmãs da Caridade", de Santa Joana Antide Thou-
ret; os "Filhos de São Francisco de Sales", funda-
O padre Brisson, sábio, matemático, inventor, dos também por M. Chaumont; as "Filhas de São Fran-
Lido teólogo, era animado por grande espírito de cisco de Sales", criadas pela Madame Carré de Mal-
ridade social: fundou, para as jovens, as primei- berg; as "Confrarias de São Francisco de Sales~• Não
3 oficinas de caridade na França e, para estas o- podemos citar tudo, mas esta fecundidade prova quan
:::inas, juntamente com Léonie Aviat, a "Congrega- to o doutor do amor permanece vivo entre nós: sua
J das Oblatas de São Francisco de Sales" 43 •
Ele considera essa pessoa aberta, na sooiedade A partir dessa transparência, o amor do Deus
ristã, em sua relação com Deus, com o Cristo, com de verdade se torna possível: não se pode, não se
Igreja e na sociedade civil, profissional, fami- quer mentir, nem mentir a Deus, nem mentir aos ho-
iar. Todas as relações do homem são objeto de uma mens, e nessa limpidez aparece a imensa relação de
ultura intlectual e moral: elas devem ser eleva- amor que nos une a todos, em potência e em direito,
as à forma da virtude, sendo a virtude no homem u- no Corpo místico do Cristo. O realismo do amor é,
a energia espiritual qualificada, estável, sólida, dessa maneira, justificado em São Francisco de Sa-
ecunda e sempre livre; o hábito pessoal é exatamen les. Sua fé viva o faz ver que entre Jesus e nós rei
e o contrário de uma rotina. Francisco de Salesrea na o Espírito Santo, que é um e que preenche todas
e, poderosamente, aqui, contra a mecanização da vi as coisas; que esse Espírito cria a continuidade, a
a religiosa e civil e contra a prevalência da jurI relação real, necessária à eficácia entre meu espí-
icidade sobre o evangelismo: todas as relações pes rito e o espírito do Salvador:eu oro ao Cristo, eu
oais, ensina ele, estão dominadas, regidas, anima= amo o Cristo e meu ato é transmitido pelo Espírito
as, sublimadas pela relação de amor, pela caridade, e, pelo próprio Espírito, o Cristo me responde pela
uja abertura e amplidão são infinitas. E isto ca- graça,por meio de inspirações que só são freqüentes,
·acteriza, precisamente, o cristocentrismo salesiano.
O OT IMI SMO SALESIANO [ O PESSIMISMO MODERNO
irceptíveis e vivificantes desde que lhes sej'amos
.éis até na ação, como o santo nos ensina. Francisco de Sales coloca , além disso, o pro-
blema do humanismo em beu se ntido dramático; ele o
O realismo de seu amor tem, no entanto, ainda resolve pela transcendência. Mas, fora da transcen-
.tra fonte e outra causa: Francisco de Sales se vê dência, que é pois o hom,-rn l~m sua natureza fechada?
vê seu próximo no Corpo místico do Senhor, na i- Sensações, trabalho, aç~o, obras fora de si mais du
:ntidade moral da pessoa mística que todos juntos ráveis do que ele, no entanto perecíveis, mas qu~
,rmamos em Jesus Cristo. Nesta visão de sua fé vi- nele próprio são, finalmente, sonhos, risos, lágri-
., Deus é igual a Jesus; Jesus é igual ao Homem,~ mas , fracasso, revolta e desespero , choro também e
, Homem, por causa de sua caridade, é igual a este a imensa tristeza da noite que se aproxirr.a... "Se
,mem, meu próximo e, preferencialmente, a este ho- minha alma pudesse encontrar apoio, dizia Montaigne,
:m que precisa de mim, este pobre despido, ou er- eu não me experimentaria, eu me resolveria." A fé
_nte, ou caído, ou prestes a cair: O que tive~de-0 nos ajuda a nos resolvermos para não nos dissolver
.ito a um de-0te-0 pequeno-0, 6oi a mim que o 6ize-0- mos. É onde Francisco de Sales ainda nos ajuda.
-0. Neste homem, seu próximo, Francisco de Sales
seu Deus, seu Salvador, seu Bem-amado: ele ore- Seu otimismo não somente serve de contrapeso ao
:be como Jesus e o ama e o serve exatamente como pessimismo ateu, mas dá-lhe uma saída válida para
,sus, e seu amor desabrocha e sua alegria é plena. um espírito contemporâneo. Fornece uma resposta à
.1 é a lição, tal o exemplo que o bispo de Genebra dúvida que nasce da contradição aparentemente irre-
,s dá: devemos confessar que nos é, de fato, neces dutível entre nossa existência rea l e nossa aspira-
.ria. ção ideal. A alma, que v ive em um corpo corruptí-
vel, aspira, no entanto, a vencer a morte. Será que
Podemos então dizer com Luís Lavelle que, "de o pode? A solução milag rosa que o crist ian ismo dá a
dos os santos, nenhum houve que fosse mais compro esta questão parece "exógena", vinda de fora: seria
tido com o mundo e, por conseguinte, mais próximo válida para o humanismo? O humanismo repe le tudo o
nós"; que nunca houve nenhum, tampouco, "que se que não é apenas do homem e somente para o homem:
.sinuasse tão profundamente nos recônditos secre- "Na luz, diz Camus, o mundo permanece nosso primei-
s de nosso coração, de tal forma que, sempre que ro e nosso Último amor". Francisco de Sales observa
acuramos o que queremos por detrás do que parece- ao humanista que em nosso amor fundamental acha-se
s querer, ele nos revela o que somos" 45 • El ~ nos inscrito o desejo de um ultrapassamento do mundo,
sina, assim, a respeitar a pessoa humana não ape- a aspiração à transcendência. Nosso coração, que é
s no outro, mas em nós mesmos, e · nos dá o meio de indivisivelmente razão, vontade, desejo, busca, tras
zê-lo: inspirando-nos a amar aquele que devemos em si mesmo esse apetite insaciável de bem, essa ne
speitar, mesmo quando ele nos parece muito pouco cessidade infinita de amor puro numa necessidade 1=
spei tável. Seu personalismo é augusto porque é san limitada de verdade universal, que constituem preci
neste tempo de desumanidade tão cruel, essa li= sarnente o homem. Nossa natureza choca-se com a por=
o nos é, de fato, necessária . ta do Absoluto sem poder abri-la por si mesma, mas
Aquele que nos espera no Absoluto a abre: iríamos
recusar entrar só porque é ele quem nos abre? Seria
mos considerados possuidores de louco orgulho. Fran
cisco de Sales nos previne contra essa loucura e~
além disso, nos mostra que se a graça é gratuita
Cf. Lavelle, Quat~e -0aint-0, 1951, pags. 177 ,
esse "gratuito" que o humanismo detesta - ela é, no
1 82.
1,10
intanto, harmoniosa: não corresponde estritamente a ta mais interior à Igreja. Destaquemos alguns pon-
lma exigência sem dúvida, mas, ao contrário, a uma tos, partindo do seu caminho de transcendência.
ixpectativa: entre a imanência e a transcendência e
iste a convergência. Este caminho não é o da evasão, nem tampouco
um atalho para mergulharmos no mundo: ele nos ensi-
Realmente, o amor que nos leva a transpor o li- na a estar no mundo e ao mundo sem ser do mundo. A-
1iar da morte vem de Deus: ele foi colocado em nos- centua vigorosamente a harmonia de nossas aspira-
os corações pelo Espírito; neste sentido, é um dom ções naturais sadias e de nossa vocação cristã so-
ratuito; no entanto, ele se insere nessa nina pan- bre--humana: admite a natureza, mas a integra à graça
a onde nosso desejo natural tende para o Infinito; e nos faz evitar o naturalismo em que o laxismo caiu.
graça toma a natureza pela mão e a conduz para on- Este perigo em nossos dias não é uma sombra vã: um
e ela não pode ir, para onde ela deseja se dirigi 4 salesiano o evitará. Francisco de Sales, por outro
egundo estas magníficas palavras que definem nosso lado, nos preserva de um misticismo sossegado, que
estino: Tu me. agahha~te. pela mão dihe.ita; tu me. con nos encerraria numa interioridade fechada. Nem mes-
uze.~ com teu con~e.lho e. com tua giÕhia me. athaihâZ sianismo temporal, nem pietismo alhienado, mas um
S1 73, 24). misticismo da ação que só se eleva ao céu se traba-
lharmos plenamente neste mundo, fazendo todos os de
Por meio da graça há inovação em nõs, e na ino veres a serviço de Deus e dos homens.
ação há continuidade, harmonia: a natureza espiri=
ual da alma é uma pedra de espera para a imortali- O salesianismo nos mostra também a harmonia da
ade gloriosa, e quem vai até o fim de si mesmo en- religião e da vida cotidiana: todas as atividades,
ontra a passagem aberta por Deus para sua beatitu- as mais humildes, as aparentemente mais desprezí-
e inesperada e, no entanto, desejada. A transcen- veis, ordenam-se sob a caridade, que lhes confere
ência, gratuita, não é, pois, artificial, e pores valor infinito, e é a possibilidade para uma "alma
e estratagema Francisco de Sales pode ajudar o hu= pequena" alcançar uma grande "santidade de humilda-
anismo contemporãneo a sair do impasse onde esbar- de"; mas a mesma unidade no amor divino permanece
a na revolta e no desespero. Sua preocupação, com possível ao homem que desempenha pesadas tarefas:
feito, é mostrar-nos como, em nós, a espontaneida- a santidade não é incompatível com a função dos reis
e sempre corresponde à gratuidade; como a infatibi e dos nobres. Francisco de Sales diz a cada um de
idade divina respeita a liberdade humana, e . a ne= nós: ~ e.de. aquilo que. ~oi~. O que formos na idéia que
essidade respeita a contingência, a predestinação Deus tem de nós é o que nos dá nossa verdadeira di-
ada impõe ao homem! Deus e o homem, pela graç~cons mensão e nossa exata grandeza, não em nós mesmos,
iram juntos naquilo que há de mais livre no céu e mas no Cristo. Francisco de Sales abre-nos, assim,
este mundo: o Amor. o verdadeiro campo para a nossa ambição, que é a
santidade e não essas miseráveis honras cuja fumaça,
mesmo na Igreja, obscurece freqüentemente nossa trans
ESPÍRITO VE SÍNTESE parência. Ele ensina aos príncipes, aos bispos, aos
prelados, a permanecer humildes e mansos sem deixar
Francisco de Sales viveu numa época de crise de ser firmes e fortes. Com esse espírito, ele nos
de renovação: ele conheceu o trabalho próprio a ensina a conciliar grandeza e humildade, autoridade
ais momentos, a tensão dos extremos que se opõem e e mansidão, paternidade e fraternidade, governo e
e separam. Vivemos num período semelhante, e sua honestidade, prudência e lealdade. Assim foi ele: que
abedoria, seu exemplo, sua coragem lúcida e pruden maravilha!
e podem ainda aqui nos ajudar, de um ponto de vis=
i cn
O ESPÍRITO DE CONCILIAÇÃO
e no culto que lhe devemos? Ele o precisa com pala-
Num plano mais elevado, nós o vemos preocupado vras que constituem a distinção de um mundo: Seu Fi
com a pura e elevada doutrina, embora atento em com lho ê no~~o advogado; ela ê no~~a advogada, ma~ d~
parar a tese e a síntese e em buscar a ligação por um modo bem diveh~o, como j~ di~~e v~hia~ veze~. O
onde os elementos da verdade de cada opinião pode- Salvadoh ê advogado de ju~tiça, pohque pleiteia poh
riam sê conciliar: preocupado com a tradição e com nô~, alegando o diheito e hazão de no~~a cau~a; e~e
o progresso. Assim procedeu com o tomismo e com o aphe~enta no~~o~ ahgumento~ ju~tinicativo~ que não
molinismo que seguravam, mas não com a mesma mão, ~ão outho~ ~enão ~ua hedenção, ~eu ~angue, ~ua chuz;
os dois extremos da cadeia. No conflito das duas fi- ele conne~~a ao Pai que ~orno~ devedohe~, ma~ demon~
losofias, a antiga e a nova, percebeu que não se po tha qu e pagou poh nô~. Ma~ a Vihg em e o~ Santo~ ~ão
deria condenar verdades evidentes en nome de dog= advogado~ de ghaça: ~uplicam poh nô~ paha que ~eja-
mas caducos: não rejeitou, assim, toda a escolásti- mo~ pehdoado~, e tudo pela Paixão do Salvadoh; nada
ca. Na disputa dos dois poderes, que foi tão perigo têm a aphe~entah paha no~ ju~tinicah, ma~ eonniam
saem 1612, pela conciliação dos espíritos, foi fa= no Salvadoh; em ~uma, ele~ não unem ~ua ohação ã in
varável à solução imparcial. Em teologia, procura tehce~~ão do Salvadoh, pohque ela~ não ~ão de me~ma
sempre o caminho do verdadeiro equilíbrio. Reconhe qualidade, ma~ ã~ no~~a~. Se Je~u~ Chi~to ~uplica
cer, por exemplo, a possibilidade e a realidade da ao céu, ~uplica em ~ua vihtude; ma~ a Vihgem ~upli-
graça infalivelmente eficaz por si mesma, mas somen ca como nô~ na vihtude de ~eu Filho, emboha com m~
te em alguns predestinados: na Virgem, em São João c~edito e navoh. Não vede~ como tudo i~to conthi-
Batista, em São Paulo; este não é, no entanto, oca bui paha a honha de ~eu Filho e enghandece ~ua glÕ-
minho normal de Deus, e a graça comum que o Senhor hia? (VII, 459).
oferece de maneira superabundante a todos pode ser
recusada, sem deixar de ser eficaz quando for aco- Toda sua doutrina está marcada por esse cuida-
lhida. A contrição perfeita, ensina ainda, é neces- do de unir os extremos pelo justo meio. No século
sária para uma verdadeira conversão, mas a atribui- XVIII, Muratori, que já reagia contra uma devoção
ção nem por isso é menos boa e necessária no começo mal dirigida à Virgem Maria, cita a favor de de sua
da penitência, quando o pecador não pode fazer me- tendência São Francisco de Sales, com São Carlos Bor-
lhor: o erro do confessor seria manter o penitente romeu, Antônio Bodeau e Peteau. Da mesma forma,Pier
nesse estado. Se Saint-Cyran tivesse seguido exata- Francesco Foggini o opõe aos extremistas do janse-
mente o caminho salesiano, Richelieu, talvez, não nismo (Appolis, Le Tieh~ Pahti, Paris, 1960, p. 333,
teria podido encarcerá-lo. Este santo doutor afir- 183). Ele nos guia sempre pelo caminho real de uma
ma ainda a primazia do papa, sua infalibilidade, sua religião ponderada, aberta e a caminho, inimiga dos
sua pastoral universal; mas nem por isso deixa de extremos e, no entanto, elevada.
manter a colegialidade da Igreja.