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são FRANCISCO

DE SDLES
1

É.-M. Lajeu·n\ ie
i

\
\ y •

APRESENTAÓÃO
ANCISCO DJ SALES é
~:.
v,:,;: são FRINCISCO
grandes mestres da
tualidade e um verda-
humani sta ~o século
Sua grande preocupa-
fazer os homens che- /
~')'
.
DE SBLES
Deus pelos ' caminhos
<ladeiro amo\r. Lendo
bras - mais de 21DOO
/
E.-M. Lajeunie
, 4000 serm'Õ es, dois
s livros: Introdução
Devota e Tr atado do
e Deus - s$ntiremos
veu com um tinico ob-
VIVER J ESUS. Ele
resenta uma espiri-
ade aberta,~dinâmica
.Espiritua1 · dade es-
nos faz a ingir o
to Amor. Dit .ele,que
fo "pelos c àminhos do
nor nos libJrtaremos
J amor próprio que
iis é do qu~ um amor
i." Ainda f 1ala ele:
:iso disciplinar o
) e não o corpo. Pa-
rcitar-se n~ste ca-
~ preciso muita man-
~ simplicidade" .

~itor, ao ler esta 'r /


y,
;entirâ que a verda-
Eé nos leva a contem- ,,,,.; .
face amorosa de Deus. /t; -- /~ -
r a contemplação uma ., .
:onstante de amor, de .~
1ção e de ação. O au -
1tou apresentar a es- ~/
tlidade salesiana ba-
•Se n~s próprios es-
de Sao Francisco de
Toda espiritualida-
' levar os homens a
ifunda união com Deus
próximo. União es-
deve levar-nos adi-
1 São Paulo: "Eu vi- ✓_; ·
i jâ_não sou eu que '
t Cristo que vive em -:;-
'l 2,20). Ele era um . ':_;-
ho vivo.

E A ESPIRITUALIDADE SALESIANA
ramos que estas pa-
~ssam animá-lo na
encia cristã.
Oblatas de São '\ J)
Francisco de Sale~
são FRIINCISCO
FICHA CATALOGRÁFICA
DE SIILES
LAJEUNIE, E-M.
São Francisco de Sales e a espiritua-
lidade salesiana, Porto Alegre, RS,
Associação dos Amigos de São Francis-
co de Sales. 1983.

CDU: 276 (Franc.deSales)


235.3
235.3:92
Do orignal em língua francesa:
St François de Sales et l ' e sprit salési en

© by ~ditions du Seuil, 1962


Collection Maitres spirituels

S UMÁR I O
Paris, França

Tradução brasileira: Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

I . A VOCAÇÃO PESSOAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Associação dos Amigos de São Francisco de Sales O meio salesiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Vila Santa Isabel, Caixa Postal 1361 14
CEP 90000 - Porto Alegre, RS - Paris (1578-1588) o humanista . . . . . . . . . . .
A crise de desepero . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
Fone: ( O51 2) 3 6 • 3 O. 6 4 O "anjo da escola" . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Pádua (1588-1592) ••..•.•.......••....... 27
O homem e a graça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
O otimismo heróico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
Diante do puro amor . . . . . . . . . . . . . . . ..... . 32
Dulce vivere, dulce mori . . . . . . . . . . . .... . 34

II. A MISSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . · · • . 37
O grande desígnio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
O pioneiro do catolicismo no Chablais .. . 39
o diálogo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
As visitas a Beze e a conferência malogr~
da . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
Genebra, Roma e Paris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
Pela união pacifica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50

III. UMA PRIMAVERA ESPIRITUAL . . . . . . . . . . . . . . . . 55


Francisco de Sales e Henrique IV . . . . . . . . 55
O Circulo Acarie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
A reforma católica na Sabóia . . . . . . . . . . . . 60
A instrução do povo e o apelo aos leigos. 62
A pregação evangélica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
Pela direção espiritual . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
A devoção no mundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
O caminho do amor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
1983 A Visitação e os pobres . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
O limiar místico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
IV. O DINAMISMO DO AMOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . 85
A alma e o amor . . . . . . . . . . . . . . . . . • • . • • • • • 85
o duplo êxtase e sua dupla atração ..... . 87
O ponto critico ······~·· . . . . . . . . . . . . . . . . 90
A preveniente inspiraçao de Deus . . . . . . . . 92
O pecador e a graça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
Da complacência à benevolência . . . . . . . . . . 98
A convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
o conhecimento e o amor . . . . . . . . . . . . . . . . . 103 AP RE S E NT A C Ã O
O ~ x t ase de ação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
A teosfera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107
o amor puro e a presença no mundo . . . . . . . 1 11
A morte d e amor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • .. • • 11 4
A idéia do salesianismo p o de resumir-se nesta
V. O ESPÍRITO SALESIANO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 9 propos ição do doutor do amor: O home.m ê a pe.n 0e.icão
A glorificação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 9 do unive.n~o. O upinLto ê a pe.i1.. 0e.icão do home.m. O
O espir i to sacerdotal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122 amon ê a p e.nó e.icão do e.~ plnito. E a c__anidade., a pe.n-
O espírito evangélico e a reforma da pre- 6e.icão do amon.
gaçao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • • • • • • 128
o cristocentrismo salesiano . . . . . . . . . . . . . 133 O amor é o dinamismo da vontade que busca o bem
O puro amor e a esperança . . . . . . . . . . . . . . . 136 e que o faz para agradar ao Amado. Mas o benepláci-
Na irradiação da Visitação . . . . . . . . . . . . . . 138 cito de Deus é, precisamente, o próprio bem do ho-
As familias salesianas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 142 mem , perfeição do universo, embora a caridade seja
O personalismo salesiano e nós . . . . . . . . . . 146 um circuito de amor: este vem de Deus, passa por
O otimismo salesiano e o pessimismo mode~ n osso coração e transporta nosso ser até a Eterni-
no . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • • • • • • • • • • • • · · · · · · 149 d ade de onde procedemos pela criação. Ora, este mo-
O espírito de síntese . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 150 vimento não provém casualmente de um instinto afe-
O espírito de conciliação . . . . . . . . . . . . . . . 152 t i v o: sua ordem, sua beleza, sua força e sua fecun-
A síntese pessoal . . . . . . . . . . . . . . . . . ~ .... . 153 d i d ade resultam da razão. O amor nasce, cresce e se
e leva na luz, em sabedoria. Como é voluntário, o a-
mor se ordena e se decide; e como é racional, ele se
r egula, submete-se a uma lei. Isto parece estranho
mas , no entanto, na prática, vemos que o amor mais
verdadeiro, mais terno, mais vivo e mais feliz é sá-
bio e corajoso, é voluntário e, portanto, livre.

O amor é agradável ao coração, visto que é seu


bem ; mas é exigente, pois o amigo nada pode recusar
a o s eu Amado. Assim, Francisco de Sales alia coisas
que parecem incompatíveis: a liberdade e a mansidão
no rigor. Porém, isto é compreensível: o amor é en-
treg a total e, ao tudo dar, a pessoa permanece li-
vre em relação a tudo. A liberdade da entrega total
torna a pessoa feliz e lhe é agradável amar.ta ma- ·dade fundamental, não seria buscar decididame nte
. 0 de tal amor entre o homem e Deus,
. entre o
11
xima de Agostinho que aparece em toda parte: Ama 0 rein -
et quod vi~ 6ac (ama e faze o que quiseres). E a as- e O homem entre o homem e toda a criaçao que
home m -m? Quantos ' dramas entre nos
- so- porque nao- re~•
cese salesiana caracteriza-se, essencialmente, por o c on t e . mor puro que Jesus revelou ao muno.
d , Gos-
esse espírito de liberdade. Desconhecê-lo seria um na es Se a . · d
contrasenso radical. taria· mui· to que este_ pequeno livro pudesse aJu ar
a 1 gu
n s de meus irmaos a- encontrar
-
ou a reencontrar
·
Esse mestre nos legou numerosas e precisas re- esse amor, cuja 6oJtç_a e tao ~uave e cuJa suavi· d a d e
gras para que progridamos no caminho do amor. Oca- é fecu nda.
sionalmente, tais regras podem nos parecer complica
das, mas devemos utilizá-las com seu espírito de 1 i=
herdade para permanecermos livres. Ele enfatizou sua
regra fundamental a Santa Chantal: Tudo poJt amoJt e na
da poJt 6oJtç_a. Depois de haver dado todas as suas re=
gras e conselhos, acrescenta: Veixo-vo~ o e~plJtit o
de libeJtdade .. . , uma gJtande man~idão de e~plJtito, u-
ma gJtande ~uavidade e conde~cend~ncia paJta com tudo
o que não ê pecado ou peJtigo de pecado; e~~a di~po-
~icão do e~plJtito ê ~uavement e 6l e x1v el ã~ aç_ Õe~ de
quafqueJt viJttude e caJtidade. Dizia ainda: Não deve-
mo~ amaJt poJt temoJt, ma~ temeJt poJt amoJt. São inver-
sões deste tipo que revolucionam. Sua fórmula não
foi compreendida pelo jansenisrno, o que ocasionou
dramas. O laxismo separou seu rigor de sua mansidão
e assistimos a catástrofes. O salesianismo é um to-
do: sua ünidade procede no único arror, que é sua alma.
Francisco de Sales encontrava em si mesmo a
primeira fonte desse amor, nesse in~aciâv el ap et i t e
de bem, que só pode ser saciado por Deus e que o pró
prio Deus colocou no fundo do nosso c ~ração. Donde
sua idéia de que o amor, em sua essência, é divino
e de que só pode ser profanado pela corrupção. O ad
mirável é que Henrique Bergson parece ter tido o mes
mo sentimento a respeito desse amor. Para ele, a a=
mizade de São Francisco de Sales por Santa Joana de
Chantal não era "um amor humano perfeitamente puro
e sublimado pelo divino", corno lhe propunha Jean
Guitton, mas urna amizade "numa ordem absolutame nte
ã parte": o que seriam "essas santas amizades dos
místicos completos" senão o amor puro, restabeleci-
do em sua ordem e em sua beleza por urna graça ple-
namente participada? 1 E o problema essencial, na re~

1. Jean Guitton, La Voca;t,,i_o n de BeJtg~on, 1960, p. 165.

n
I. A VoeAeAo P E S S OA L

O MEIO SALESIANO

Francisco de Sales nasceu no dia 21 de agosto


de 1567 em Thorens, Genebra. A casa em que nasceu
er a "suntuosa e espaçosa". Com seus três blocos de
morad i a, suas seis torres e seus três torreões,cer-
cada por c2leiros, "estábulos com dependências" e
gal inheiros, dava a impressão de uma pequena cida-
de p a ra quem por ali passasse. Nada mais resta de
seu esp lendor: foi destruída pelos soldados de Luís
XIII, que se vingou da resistência que Luís de Sa-
les, o irmão do santo, lhe opusera no castelo de
Anne cy, em 1630. Mas permanece a admirável paisa-
gem.

For a construída sobre uma pequena planície, no


sopê de altos penhascos, na entrada de um vale es-
treito, o vale de Usillon, de onde escoam, "num lei
to de p álidos cascalhos" e em direção ao Fier e ao
Ródano , as águas cinzentas do Filiere. Um pouco ma.is
abaixo, ao alcance de um tiro de trabuco, erguiam-
se as t orres do castelo de Thorens, tambêm arruina-
do pel o exêrcito de Richelieu, depois reconstruído
e, no sêculo passado, reformado segundo um estilo
mode rno: aí ê que se recolheram as lembranças do Se
nhor d e Genebra. o lugar pertence à região do anti=
go ducado da Sabóia, à "meia-montanha", onde predo-
m~nam os vales, dominados por fêrteis planaltos. A
vila de Thorens acha-se encrustrada numa concha de
Ve~dor durante o verão e num circo glacial durante
0 inverno: lugar de silêncio, de trabalho e de paz,
onde a natureza e a religião modelaram uma popula- Ernmanue l -Phillibert, em Bruxelas, quando se tramava
ção séria, honesta e educada. Das alturas que a do- oc ultamente seu casamento: preso pela pela polícia
minam, descortinam-se imensos horizontes, os Alpes, imperial, pagou sua cortesia com dois anos de pri-
o Jura, o bosque de Sabóia do lado de Annecy, com são em Ripemonde. Quando Francisco veio ao mundo, fa
suas colinas arredondadas, coroadas de arvoredos, l av a-se. pois , o mais puro francês.
alegradas por vergéis, sulcadas por córregos arbo-
rizados. Estes horizontes enlevaram a alma poética A familia dos Sales era, além disso, firme men
de Francisco e o exaltaram: ele amou essas monta- te católica. Calv ino quis converter o Senhor de Boi
nhas. s y - nome que se dava ao pai de Francisco depoi s de
seu casamento. Ele permaneceu firme em seu catoli-
O meio que o acolheu foi de antiga nobreza ca~ ci smo e a sua frase, a de que não poderia ligar-se
ponesa. Em tempos remotos, os Sales administravam a a "uma religião doze anos mais jovem do que el e ",
baixa justiça senhorial; eles eram infeudados aos tornou-se provérbio entre a nobreza. Ele não era en
barões de Thorens. A partir de 1559, fazendo econo- tão um "devoto", mas dava o exemplo de uma prática
mia e pela boa administração de seus bens, consegui leal de sua religião. Leal em tudo, aliás: fiel ao
ram comprar esse vasto domínio. Nada expressa me= papa, que dizia ser "a primeira majestade do mu n-
lhor sua vontade de grandeza. Quando Francisco nas- do" ; leal ao seu príncipe; leal à sua esposa: d e le
ceu, seu pai era dono de várias terras e da região n ão se conhece nenhum bastardo, como de seu irmão;
de Boisy, bem perto, em Groisy, que sua esposa,Fra~ sua divisa era "em boa fé". Leal e também humano:
cisca de Sionnas, lhe trouxera como dote por contra e st imava os camponeses, prestava-lhes auxílio, a con
to de casamento, em 1560. A criança que r.ascia era~ se lhava-os e emprestava-lhes grãos e sementes sem e
pois, "filho de famí l ia", e seu direito de primoge- x ig ir juros. Mas foi sobretudo de sua mãe q ue Fran=
nitura impunha-lhe também o dever de um dia suceder c isco herdou esse caráter de terna piedade , fort e e
ao seu pai: por causa disto, estava ligado à sua ter prática, que marcará toda sua vida.
ra. A conquista da sua vocação pessoal exiqirá dele
violentos combates. A Senhora de Boisy era profunda e inte li g en te -
mente "devota". A Madre de Chantal traçou-nos um p e r
A família na qual vai crescer era totalmente fi l esplendoroso dela: "Era uma senhora das mais
francesa de espírito e de cultura. A terra de Gene- re speitáveis que conheci naquela época; possuía uma
b ra , doada aos f i lhos mais novos de Sabá-ia, era en- alma generosa e nobre, pura, inocente e simples; ver
tão governada pelo famoso Tiago de Nemours, a "pé- dadei ra mãe e provedora dos pobres; era mode s ta, hu=
rola da cavalaria francesa", · cantado por Brantôme. milde e complacente para com todos, muito sere na em
O avô materno de Francisco, Melchior de Sionnas, e- sua c asa; administrava sabiamente sua família, com
ra um oficial desse príncipe e vivia na França com a preocupação de fazê-la viver no temor d e Deus;
sua esposa, a Senhora de Chevron-Villette. Seu tio, freqüe ntava amiúde os divinos sacramentos" (Chan-
Luís de Sales, e também seu pai, passaram sua juven tal, I II, 98) . Francisco despertou na irradiação des
tude na corte de Francisco I e de Henrique II, a sa gr aça materna: sua primeira frase, a fr a se q ue
serviço dos viscondes de Luxembourgs-Martigues, que costuma mos nos lembrar, foi: Me.u. Ve.u.-6 e. m1 1rlw 1ã e.
se tornaram barões de Thorens. Estavam ligados a Pa go -6tam muito de. mim. Ele correspondeu cari n ho s ilne n-
ris pela amizade que tinha com seu compatriota, o te a es s e a mor: Minha bon..Z-6-6ima e. c.aJi..Z-6-6ima n1á ,, , e ra
poeta Claude de Buttet, secretário de Margarida de como cos tumav a chamá-la. O ve l ho cavalheiro (e] e e-
Valois, futura duquesa de Sabóia, amiga das letras ra trinta anos mais idoso do q u e sua esposa) ac hava
e protetora da Plêiade. Foi Luís de Sales quem le- que o amor e ra p or demais ter no e a educação 0ema-
vou secretamente o retrato da princesa para o duque
siadarnente sentimental, contra o que reagiu. Muito recente trégua, a vida renascia, a abundância a-
cedo quis que seu filho montasse a cavalo e manejas fluía . Nas menores cidades, diz o embaixador de Ve-
se a espada; com a idade de 6 anos, colocou-no na neza, há "superabundância de pão, de carne, de pei-
escola. xe, de trigo, de feno; nos menores vilarejos, pelo
menos um terço da população se dedicava ao comércio
Francisco começou seus estudos no colégio de da boca : taverneiros, padeiros, hoteleiros, churras
La Roche, depois foi transferido para o colégio ca- queiras , fruteiros, revendedores; um povo que sa=
puchinho de Annecy. Tinha urna inteligência excepcio be viver; homens corajosos e altivos, e que se so-
nal e era de exemplar aplicação: rapidamente ultra= bressaem por sua franquez~ e magnanimidade; que não
passou seus colegas de escola e, em cinco anos, de toleram ser governados pelas mulheres, embora as mu
1573 a 1578, ficou sabendo tudo o que a Sabóia po- lheres saibam conduzi-los; tão prontos para conqui~
dia ensinar-lhe. Sua piedade crescia juntamente com tar quanto para perder suas conquistas, e que se-
seu estudo. Quando o bispo Giustiniani o confirmou riam os donos do mundo se tivessem tanta tenacidade
em 1575, na igreja de São Domingos de Annecy, admi- em prosseguir quanto ardor em começar ; altivos, or-
rou a beleza e a candura de seu rosto e predisse que gulhoso s, para não dizer bárbaros; intrépidos na a-
ele seria uma "grande luz". Aos dominicanos, que cui ção, insolentes no sucesso, preocupados com suas co
daram de sua primeira formação religiosa, deixou a medidade s, sempre imersos em negócios , mas despreo=
lembrança de um "menino que nunca mentia". Desde cupados com os do próximo ; até mesmo ingratos e pou
seus doze anos quis ser da Igreja, pediu para ser co fiéis; finalmente , convém ser seu amigo, masnun
clérigo e conseguiu sua primeira vitória sobre seu ca seu vizinho; além disso, indomáveis contra o in=
pai, fazendo-o voltar atrás em sua recusa. Recebeu vasor, tar.to que o embaixador de Veneza respondeu a
a tonsura no dia 20 de setembro de 1578. Partiu irne Sua Majest ade britânica, que lhe mostrava a porta
diatamente para Paris 2 , onde o Senhor de Boisy pre= pela qual os ingleses haviam entrado em Paris: "E
tendeu colocá-lo no colégio de Navarro. Mas, temen- por qual eles saírarn?'' 3 Assim são os franceses,vis
do perder-se aí, o menino obteve permissão para fi- tos pelo veneziano, e os quais Francisco de Sales
car com os jesuítas: foi sua segunda vitória. aprendeu a amar.

No colégio de Clerrnont, atual liceu LuísoGran


PARIS (1578-1588) O HUMANISTA de, nest a Paris galicana e partidária da Liga, ele
• entra na fortaleza do ultramontanismo. Os jesuítas
Nesse final de setembro .de 1578, Franciscoviu, ensinam que a autoridade do papa tem primazia sobre
pois, essa França com que tanto sonhava. Durante a a dos concílios; que a Santa Sé não pode ser julga-
viagem, entristeceu-se com os estragos que as guer- da por ninguém; que o papa pode restringir a juris-
ras religiosas haviam feito nas igrejas: em Lião, dição dos bispos, que se deve obedecer às bulas.
Nossa Senhora de Fourvieres demolida; em Bourge& os Francisco vai ficar impregnado por esse espírito.
santos retirados de seus nichos; em Orléans, o ad- Mas os padres são acusados de insinuar idéias mais
mirável coro da catedral arrebentado. Mas, com a subversivas: o direito de o papa dispor das coroas,
0 direi to dos povos, até mesmo dos particulares, de

2. Ch. A. de Sales, seu historiador, o diz expressamente. Mi-


chel Favre, confessor do santo, soube por Déage que o me-
nino, aos 12 anos, estudava em Paris. Outras provas con- 3 • "Relation du secrétaire de Lippomano", ed. Tornrnaseo, pags.
firmam essa data. 488-489, tradução original do italiano.
matar o tirano 4 • Henrique III queixou-se disso ao c ês e o bispo de Genebra sõ escreverá em latim ao
general Aquaviva e pediu a pronta execução das me- papa.
didas necessárias a fim de modificar os espíritos,
pois, em certos momentos perturbadores, o colégio Em Paris, Francisco viu melhor que a 6o nt e do
vai "parecer transformado num clube de agitadoresfa humanismo cristão não se encontrava nem em Aristóte
náticos" 5 • Tal é o meio incandescente, aparentemen= le s, nem em Platão, nem em Plutarco ou em Sêneca~
te pacífico, no qual Francisco vai continuar seuses ma s nas Escrituras e nos Padres. O grande Maldonado
tudos. teve poderosa influência em sua formação. Este teó-
logo, helenista, hebraísta, discípulo de Domingos
Em dez anos, aprendeu as belas-letras, o latim So to em Salamanca, que por sua vez havia sido dis-
a fundo, o grego e o hebraico, as artes de nobreza, cípulo de Vitória, amigo de Erasmo no começo do sé-
a equitação, a esgrima (que começava a ser moda), a culo XVI, em Paris, renovava a ciência religiosa pe
dança, a filosofia de Aristóteles, os princípios da la exegese, pela história, pelo recurso a uma cultu
teologia. Finalmente, ele se comprazia num lat~m e- ra universal, embora orientada para os princípios da
rudito, pretensioso, sutil e precioso, que rapida- fé . Ele não ensinava mais no colégio Clermont desde
mente abandonou em favor de uma linguagem de Igre- 157 6, mas, por seus numerosos e entusiastas discí-
ja clara e límpida. Teve por professores, em humani pu los, por suas anotações de aulas, que estavam em
dades, o sábio latinista Jacques Sirmond, que Balu= todas as mãos, continuava ensinando. Franciscoocha
ze qualificou de a glória da Igreja galicana, e Ber mava de ~eu me~t~e: conheceu-o em 1579, por ocasião
nardino Castori (de Siena), que deve ter-lhe exalta de uma vifita que o ilustre teólogo fez ao colégio.
do Catarina Benincasa; em filosofia, Fran cisco Sua= No e ntanto, o homem que mais o marcou foi, sem dúvi
rez de Âvila, mais moço do que o grande Suarez de da , Gilbert Genebrard, professor de hebraico no co=
Granada, com quem foi confundido durante muito tem- légio real. Comentava, em 1584, o Cântico do~ Cân-
po: este mestre apresentou-lhe a Madre Tereza, que t ico~. O jovem estudante pôde assistir ao seu cur-
faleceu em 1582. so: ficou deslumbrado. A história do mundo pareceu-
lhe uma história de amor. Esta primeira impressã~
Com tais professores, e preocupado com apure- con f e ssou, nunca mais se apagou de sua lembrança. A
za cristã, com o gosto pela elegância, tendo horror té que enfim ele respirava!
ao pedantismo, reagiu vivamente contra a mania de
erudição profana, da qual os próprios ~~~ai~ de Mon No mundo universitário em que vivia, só flores
taigne estavam repletos. Dedicava-se, sobretudo, ao eia a " religião de Píndaro, de Anacreonte, de Tíbu=
estudo da língua francesa, cuja importância com- lo", com o culto a Baco e a Vênus. Embora apaixo-
preendeu às vésperas de seu definitivo triunfo so- nado pe la beleza dos antigos, rejeitava seu espíri-
bre o latim abandonado às ciências obscuras. O exem to: non lenocinia ~heto~um ~ed ve~itate~ pi~cato-
plo de Calvino era para ele um incentivo. Amyot e ~um , dirá mais tarde: não as mentiras dos retóri-
Montaigne davam o exemplo. Depois virá Pascal: do- cos, mas as verdades dos pescadores; não o amor a
ravante, a teologia poderá ser ministrada em fran- Vênus , mas a Maria; não Apolo, mas Jesus Cristo.De-
testa , por exemplo, os aromas demasiadamente ine-
briantes de~~e in6ame Rabelai~; e se lê Montaigne,
- cujos E~~ai~ começam a aparecer em 1580, não se dei
4. Dupont-Ferrier, le College Clvunon;t, 1921, torno I, pags. xa e nganar pelo seu ceticismo: compara-o às a~anhal
14-18. que caçam, ao pulgão (XII, 304-305; XIV, 377; XXVI,
5. Dupont-Ferrier, 1. e. págs. 14-17; Fouqueray, H~to,Úte 154) . No Cântico, o único livro da Bíblia que Eras
de la Compagnie de JÚM, 1913, torno II, p. 126. mo não queria colocar as mãos dos jovens, encontra~
aos 16 anos, seu alimento deleitável e puro: este Qual foi a causa desse tormento? Os temíveis
fato é significativo. problemas da predestinação, que se alastravam pelas
escolas, não teriam perturbado suas idéias, e suas
Essa revelação do amor divino lançou-o em gran idéias sua imaginação, e sua imaginação sua sensib.!.
de fervor, embora ~en~ivel. Foi uma , exaltação subli lidade bastante viva e terna? Henri Brernond acha
me de seus mais ternos sentimentos. Pois ele é ter~ que sim . Duas teologias se confrontavam: a teologia
no, amoroso, já que é, ante~ de mai~ nada, um homem: pessimi sta de Lutero, de Calvino,_de Baius e ateo-
Eu ~ou, dirá ele, o mai~ aóetivo do mundo. Temos uma logia otimista do humanismo cristao, a de Erasmo,
prova dessa paixão nos clamores que sua desolação de Mal donado e, em breve, de Molina. E Tomás de A-
vai arrancar-lhe em breve. Condenado, ficará pniva- quino, e~~e mehtne do~ me~tne~, o que diz? O jovem
do da g~aca daquele que lhe fez pnovan tão ~uave men estudante aprende dele, segundo Bremond, "o que tal
te ~ua~ docuna~: ô amon, ô canidade, ô beleza ... Não vez jã temesse confusamente: aprende que certas al=
gozanei mai~ de vo~~a~ delicia~! Sua alma embnia- mas são criadas com a única finalidade de fazer bri
gou-~e com a divina abundância, ~aciou-~e na tonnen lhar infalivelmente a justiça divina por uma eternI
te da celeste volúpia; enamorou-se pela Virgem Ma= dade de sofrimentos; sistema sempre aterrador - pe=
ria, agnadâvel entne a~ 6ilha~ de Sião: não verá lo meno s assim penso - mas duas vezes mais para es-
nunca no paraíso essa mãe de delicia~? Como, nesse sa inteligência de cunho concreto e realista, para
meio de humanismo devoto pôde ele cair no abismo essa alma escrupulosa, atormentada pelas tentaçõ es
de uma terrível tentação de desespero? comuns a essa idade ... Ele se viu perdido. Viu-se
condenado, em conseqüência da vontade de São Tomás
atribu i a Deus de mostrar assim sua justiça''. Final
mente, no paroxismo da dor, entra na igreja de Saint
A CRISE VE DESESPERO Étienne de Gres, ajoelha-se diante da Virgem, diz o
Lembnai-vo~, submete-se ao beneplácito divino e,su-
"Ele caiu, diz Santa Chantal, em grandes ten- bitarne nte, "caem as nuvens, o horizonte se ilumina,
tações e em extremas angústias de espírito. Parecia a obsessão se aplaca"; "uma súbita certeza abre-lhe
lhe que estava absolutamente condenado ... o que o fa os olhos"; esses decretos aterradores "são apenas
zia tremer, sobretudo à lembrança da incapacidade uma pobre invenção humana"; "ninguém, assim, está
em que os condenados se encontram de amar a Deus e predestinado a glorificar apenas a justiça divina";
de ver a Santíssima Virgem." 6 "Tenta ç ão contra a es "urna voz celeste o eleva, promete-lhe o céu: Vi~to
perança de sua salvação, precisa a presidenta Ama= que qui~ e~te, de bom g~ado, ~envin pana 6azen 6ul-
lot, violenta imaginação q4e não lhe dava trégua al gunan minha~ pen6eic~e~, ~acni6icando-te a ti me ~mo
guma, e o horror que tinha, mais de ter que ser e= ~e pneci~o 6o~~e, ... eu te con~tituinei numa eten-
ternamente inimigo de Deus do que nos tormentos do ~a 6elicidade, a 6im de que cante~ meu~ louvone~,
inferno, alteraram de tal forma seu interior que e- unica glÕnia que me~ cana ... Preciosa relíquia, me
le pensou que ia ficar doente." 7 "Este sofrimento, nos ofegante, menos apaixonante do que o amuleto de
continua Santa Chantal, permaneceu .... com tal vio- Pascal mas de riqueza doutrinal bem superior ... Quem
lência que ele perdeu praticamente toda vontade de rompe com o tomismo - bem entendido, no ponto preci
comer e de dormir, tornando-se magro e amarelo como so de que tratamos - fica obrigado a passar para o
cera." outro lado. Orientado para a doutrina dos jesuítas
Pela resposta da Virgem negra, Francisco de Sales a
ela se converteu definitivamente"ª.
6. Chantal, P I, 4.
7. Amelot, P. 3 9. 8. Bremmond, I, págs. 88-91.

rn
-~·~~·"•,' Era necessário lembrar essa página eloqüente de
...
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·.
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.
....._
>$. Bremond, que determinou a opinião sobre esse drama
mo ral. Infelizmente, não houve em Paris resposta da
vi rgem negra: a voz que nos fazem ouvir aqui é a que
Fra ncisco empresta a Deus numa crise completamente
dif erente da que sentiu em Pádua, em 1591, cinco a-
nos mais tarde! Em Paris, aliás, ele não se conver-
'; teu do tomismo para o "molinismo", como se diz; ele
era " molinista", como se entende o molinismo, desde
sua i n f ância, antes de Molina, que só publicou sua
Con~ Õ~dia em 1588. Com efeito, desde sua infância
Francis co meditava sobre esse mistério da pred~sti-
nação e seu bom senso de pequeno cristão levava~o
a dizer que Deus nos predestina à glória em vista
}_...,,.~
de noss os méritos, e ao inferno em vista de nossos
desmer ecimentos. Ele havai prosseguido suas pesqui-
sas s obre esse ponto e tudo o havia confirmado em
seu sentimento: é o que nos confia em uma nota pre-
ciosa de 15 de dezembro de 1590, em Pádua (XXIII,
46-4 7 ) . A crise de Paris não foi, pois, de ordemdog
mática , m~s de ordem moral e, sem diivida, mística.-

o que defende então, nesse combate, esse estu-


•-~ dante que se encontra em dezembro de 1586 e janeiro
de 158 7, na metade de seu vigésimo ano? A integrida
de de sua vida cristã! Irá ele optar, como seus com
panheiros, e como quase todo o mundo, por uma vida
dupla ? Ele não o quer, mas é tentado a isso. Comovi
mos, el e é, ante-ó de mai-6 nada, um homem; e não te~
'1 mo-6 um ~o~ação humano e uma natu~eza -6en-6I.vel? (XIV,
264). E é bom para nós que essa l uta transcorra des
sa manei ra! Ora, em meio a essa juventud e do u r a da
da corte, que ele deve freqüentar em certos dias,
náo vê naturalmente triunfar o dualismo que teme?
Esses cavalheiros, essas belas "senhoritas" só acre
ditam no amor mundano. Todos aceitam, como o rei
e_seu s favoritos, essa livre efervescência das pai-
xoes e uma prática religiosa exterior, sem conseqüên-
cia sobre a vida. Dentro de alguns decênios, seu
Primo Bussy-Rabutin, que cometia monstruosos peca-
A Vir ge m Negra d e Sa int -É t ienne de Gres dos, não se preocupará com renunciar a eles, mas so
hoje com as i r mãs d e São Tomás de Ville m~nt~ com encontrar palavras para acusá-los em con=
neuve, em Neu ll y. fiss ao. Eis a situação em que o jovem estudante não
que ria ingressar: pecar, confessar-se, pecar de no-

'Jn
vo, sem o heróico amor necessário para alcançar a mo imen-00; vÕ-0, que -0oi-0 um ju-0to juiz e um Pai m,l-
vitória! Saint-Cyran será preso por causa disso. Mas h ehic.ohdi o-00, eu vo-0 amahei, Senhoh, pelo meno-0 ne-0
Montaigne, no entanto, diz a Francisco que apenas ta vida, -0e não me 6oh c.onc.edido amah-V0-0 na ete~na
duas coisas são certas: o prazer e a dor. Nesta vi- (XII , 19-20).
da, deve-se buscar o primeiro e fugir da segunda; as
certezas da fé dizem respeito a um outro mundo. Se- Vamos acompanhá-lo nesse drama. Ele não inven-
jamos religiosos, usemos a água benta, vamos ã pro- ta uma -0upo-0icão impo-0-0Zvel; pensa estar verdadeir~
cissão de Sua Majestade com capuzes ã cabeça, arma- mente condenado, não por capricho divino, mas por-
dos de chicotes, e saboreamos, em seguida, os fes- que merece. Aqui estão suas palavras_q~e foram ~r~-
tins preparados para consolar nossos sofrimento s! auzi das em sentido oposto: Se meu-0 meh,lt0-0 o ex,{_,g,{_,-
Tal é a vida, a vida natural, a vida de todos; are ~em - -0i mei-0 exigentibu-0 mehiti-0 - maldito enthe
ligião não pode mudar isso, aliás não é essa a suã o-0 maldito-0, devo -0eh daquele-0 que jamai-0 vehão vo-0
finaiidade. E você, quem é? No fundo, apesar de sua ~o doe.e -0emblante; ao meno-0, dai-me não -0eh daque~
devoção, você não é como eles? Você aspira aos seu s le-0 que amaldicoahão vo-0-00 -0anto nome (XXII, 19-20).
prazeres, à sua liberdade: estes lhe fazem falta! Vo os edi tores traduziram: "Se, porque eu o mereço ne-
cê é um deles não se separe deles. cessariamente", o que dá um caráter de predestina-
ção a o seu pensamento. E ele está muito longe do
Esta devoção não é imaginária. Nos jantares da quieti smo: em seu desespero ele ainda tem esperança.
rainha, que freqüenta, ele procura, ao tocar em sua E o amor puro nasceu: sem esperar pelo céu, ele ama
veste "com reverência", uma influência pura jun to rã a Deus neste mundo como se soubesse estar predes
dessa mulher tida como muito casta; raz e, mesmo com tinado ã bem-aventurança. -
outras personagens de mesma reputação (C. A, I, 12).
Em sua crise, todos os gemidos do homem tentado vêm
do fundo do seu coração atê seus lábios: a iniqUida
de e-0tâ aZ, phe-0ente, ela não vai emboha. Ele doh~ O "AN JO VA ESCOLA"
miu muito pehtuhbado. Sente-se atolado numa lama pho
6unda e -0em c.on-0i-0tênc.ia. Vê-se atacado pelo inimi = Segundo nos dizem, foi o título que ele tomou
go muito violentamente, e-0pezinhado, e como que ar- de São Tomás de Aquino, e esta palavra o situa. Sua
rastado para a beira de um abi-0mo, prestes a cair . irrad~ação no meio da juventude universitária foi
muito grande. Ele não ficava encerrado em sua inte-
Crise moral, crise relgiosa. A salvação so s e riori dade; já místico, não se perdia em sua oração;
encontra em Deus; é-lhe necessária umà graça poder o seu r etiro interior não era senão a volta à fontedi
sa: Sou indigente e pobhe: õ Veu-0, ajudai-me! või vina para seu enriquecimento pessoal; além disso~
-0oi-0 meu auxZlio e meu libihtadoh! Finalmente, esta distribuía a todos o tesouro do seu coração manso,
idéia: submeter-se a tudo incondicionalmente: Seh â del icado, serviçal, comovido por qualquer miséria
que minha alma não 6ic.aha ~ubmi-0-0a a Veu-0? (XXII , humana, dando de sua bolsa aos pobres, porque gran-
14-18). Submissão total e mansa, dirá Pascal em cri de era a miséria destes e imenso o seu número, se-
se semelhante. E eis o ato de sua submissão vibran= gu ndo nos informa L'Estoile.
te de amor e trêmula: Aconteça o que ac.ontec.eh, Se-
nhoh, VÕ-0, que tendu em vo-0-0a-0 mão-0 toda-0 a-0 c.oi- Cortês, sempre impecável em sua apresentação ,
-0a-0, VÕ-0, c.ujo-0 c.aminho-0 -0ao ju-0tica e vehdade; -0e- c asto, suscita a admiração dos "artesãos", das mães
ja o que 6oh que tivehde-0 dec.hetado -0obhe meu de-0ti d e familia, das vendedoras de alimentos da época,
no no etehno -0 eghedo de vo~-0 a phedutinacã o e de vo7i nestas ruas cheias de gente e de pregões do bairro
-0a hephovacão; vÕ-0, c.ujo-0 julgamento-0 -0ão um abi-0~ Mouffetard, da rua Coupegueule. Modesto, seu olhar

22 23
nada tem de atrevido, mas tudo observa, tudo ve, t u ma de seu tempo, a sociedade de sua epoca e a nece~
do ouve, experimenta a vida do povo em plena carne sidade que esta tem de uma religião de mansidão e
e sangue. Seus companheiros querem arrastá-lo par a de paz. Através do Jo~nal de L'Estoile, ficamos sa-
os prostíbulos, para esses botequins que equivale m bendo o que ele viu e sentiu. A sociedade ainda es-
às adegas de Saint-Germain: neles não põe os pés , t á dominada pela violência. Uma espécie de selvage-
mas sabe o que lá se passa. Se é otimista, não fun - ri a ferve no sangue com um gosto veemente de feroci
da sua confiança no homem numa visão superficial de dade. Os castigos são atrozes, as repressões terri=
seus costumes, mas numa visão profunda dessa nature veis. Enforca-se, queima-se, esquarteja-se com uma
za humana que só se agita em seus vícios por igno= espécie de alivio. O hoteleiro da Bergerie, em 1584,
rância desse repouso que o verdadeiro amor propor- foi queimado vivo na praça Maubert porque "engravi
ciona, ao qual, no entanto, ele sempre aspira. Fran dou duas de suas sobrinhas". Um jovem, que também
cisco, em seu curso, ~eu muita importância a esta e ngravidou a filha do presidente Bailly, foi conde-
frase de Agostinho: "Tu me fizeste para ti, Senhor ~• nado, em 1582, a ser enforcado na praça de Grªve.
E ele sabe que todos os seus companheiros, que ce - seu s amigos, armados com espadas, punhais e pisto-
dem ao in6ame êxta~e ~en~ual, têm, nas horas de lu - las, inici aram uma pequena rebelião e, ajudados pe-
cidez, o gosto, a necessidade, o desejo do êxta~ e la multidão, conseguiram tirá-lo da corda. Ainda em
e~pi~itual. Ele sabe o que lhes falta, o que possu i 15 82, Salcedo, somente porque projetou a morte do
atualmente, o que deve e quer lhes dar. duque de Alençon, foi esquartejado por quatro cava-
l os: o rei e as rainhas quiseram ver o espetáculo, e
Sua vocação se delineia e já se exerce: ini- deliciar-se com a vingança, de uma janela do Hotel
cialmente, foi membro da "Confraria de Maria", de - da Cidade, "especialmente arrumada e adornada para
pois assistente e, finalmente, seu prefeito. É, pois , ele s". Luta-se, mata-se por um nada. É o reinado da
a elite dos estudantes, cerca de quatrocentos, que v endetta nas ruas,nas praças públicas: as injúrias
se encontra sob o calor de sua ação. Desta elite sur pe ssoais ou familiares são resolvidas com tiros de
girão bispos, abades, vigários, magistrados: ele os pi stola ou com punhaladas. Até o prazer é brutal. Em
marcaria com seu sinal. Alguns lhe deverão sua voca 1583, na terça-feira de Carnaval, Henrique III e seus
ção, com Étienne Binet, seu admirador e amigo e, mais f avoritos ,mascarados,cometem "mil insolências'' em
tarde, seu colaborador. Jean Séguier estava entre Paris; quando anoitece, fazem a ronda de casa em ca
seus condiscípulos. Relacionava-se com essa podero- s a, com intenções hostis. Em 1584,essa brincadeira
sa familia, certamente com a mãe de B~r ulle, com o t orna-se mais exagerada. O rei e seu irmão d' Alen
jovem Pedro e com Bárbara Acarie, que entrava em çon, com seus favoritos, mascarados, disfarçados de co
seus primeiros êxtases. Certamente admirou e imitou merciantes, de padres, de advogados e "de qualquer ou-=
o exemplo que o "Sr. Roussel" dava aos estudantes, tr a espécie de profissão", correm a cavalo pelas ruas,
considerado um santo na paróquia de Saint-Étienne e d errubam algumas pessoas, em outras dão pauladas e
que ficava o dia inteiro rezando ou confessando os cometem "infinitas insolências" na feira Saint-Ger-
estudantes e "várias senhoras devotas": já havia, ma in, Festins e balés coroam esses festejos, enquan
pois, um ambiente de devoção, aberto para o futuro au- t o que os pobres morrem de fome. Estes são vistos~
tor de Filotéia 9 • c erta vez, saindo em bandos para ir comer o trigo
Nesse contato com o povo mais atuante do mundo, nos campos. Quando Henrique III e seus favoritos
aprende,principalmente, a conhecer a França, o dra- s aem em procissão, encapuçados, com chicotes de fan
t asia e o terço de "caveiras" na cintura, o escânda
10 atinge seu ápice. Os pregadores vociferam, mas
~eus clamores adquirem caráter político: a monarquia
9. Ver Boucher, Madame Ac_a~ie, 1854, tomo I, págs.
e desprezada, a Liga atinge o seu ponto alto.
26-27.
O "tripartismo" francês já assume forma e fig~ PÃVUA (1 588 -1 5 92):
ra: à direita, os partidários da Liga; à esquerda,
os huguenotes da oposição; no centro, os políticos.
A decapitação de Maria Stuart, no dia 18 de fevere! Fra nci sco f e z muit as amizades em Pa ris: q ua t ro
rode 1587, agita subitamente os partidos,opõe vio- jovens fidalgos quiseram a comp anhá-lo até Lião, e m
lentamente os partidários da Liga, animados pelos j ulho de 1588. Em Sales, o nde era grande a felicid~
Guise, e os hugenotes, partidários da rainha Elisa- de por r e vê-lo tão belo, t ão perfeito, sua mãe t e -
beth. tpoca trágica! vê-se, pelas notícias recebi- ria p a ssado os dias e as no ites a escutá-lo. Ele te
das de Londres, delinear-se a figura dessa "pobre vede partir novamente para Pádua, onde s e u pai que
rainha" inclinando sua cabeça para receber o golpe, r ia que fizesse o curso de direito. A partir de no=
cabeça que se tornara, pelos desgostos sofridos, "com- vembro, é matriculado na Un iversidade: F!Lanci ~cu~
Sale~iu~, Sabaudu~ Gallu~.
pletamente branca e desfeita". Estremece-se de cóle
ra e de horror. Todos os habitantes de Lorena ves=
tem-se de luto: o conde de Soissons, os duques de Curioso pela vida, p e las coisas e pelas p e s-
so as, suas viagens através da França e da Itália e -
Mercoeur e d'Elbeuf, os cardeais de Vendôme,de Gui-
ram viagens de estudo: ficou deslumbrado ao ent ra r
se, de Joyeuse, Anne d' Este, duquesa de Nemours e seus
filhos, Maria de Luxemburgo. Francisco de Sales par e m Pádua. Era a cidade do Sa nto e da famosa basíl i -
ca. Esta c on tinuava a ser e mbel e zada. Giotto havia
ticipa desse luto, e também a "Corte do Parlamento, decorado a cape la de Santa Maria da A!Le na; Pao lo
a Câmara das Contas, a Corte dos Generais, o Chaste Uccello e Fra Filippo Lippi a enriqueceram com o-
let, os Esleus e o Prévot des Marchans, Eschevins e bras-primas. O grande Donatello, sobretudo, havia
outros oficiais da cidade". A alma da Liga se con- er guido a estátua eqüestre de Gattamelata e o altar
cretiza e na quinta-feira, 12 de maio de 1588,no mo de Santo Antônio, obras admiráveis, inspiradoras de
mento em que Francisco opõe fim aos seus trabalhos~ idéias e de formas novas na arte veneziana. Com Man
ocorrem as barricadas: "Todos pegam em armas"; "o t egna (1431-1506), a escola paduana alcançava seu
artesão deixa seus instrumentos, o mercador seu co- ma is belo esplendor. Fora em Donatello que vira rea
mércio, a Universidade os livros, os procurados suas li zado o ideal de verdade e de beleza que buscavaco
bolsas, os advogados seus barretes, até os presiden mo a um sonho. Nele encontrara unidos a observação
tese os conselheiros empunham alabardas" 1 º. Ardor amorosa e livre da natureza e o culto da arte clá s -
revolucionário: o povo está contra o r ~ i e fiel, a sica, a invenção e a tradição.
favor de um herege, ao princípio de legitimidade.
Mas o que falta a esse · povo? Sem dúvida,a uni - Cidade de arte, Pádua era ainda mais urna cida-
dade social e a unidade política, mas, mais profun- de ciência. De Valle havia construido o belo palá-
damente ainda, a unidade do coração, a unidade d e cio da Universidade com sua "loggia" em arquitrave,
amor.O amor divino não é o senhor das almas; as oai André Vésale (1514-1564) introduzira, em 1540, o mé
xões da carne não estão submissas à realeza do Es= todo experimental em medicina: a anatomia era suces
pírito; a prática religiosa está artificialmente co- so e os estudantes, desenterradores de cadáveres, -
locada sobre uma vida muito mundana, sem influência fr eqüentemente ocasionavam novos mortos matando os
profunda sobre os costumes. E francisco acha que é guardiães de seus túmulos: sabemos que, para evitar
necessário revelar novamente o Amor aos homens, es - Pel o menos urna vez essas matanças, Francisco, pen-
se puro amor que agora triunfa em sua alma. sando que ia morrer, doou seu corpo aos médicos,
G~ ido Panciroli (1523-1599) ensinava, então, a ju-
r i sprudência. Durante esses três anos, nosso estu-
dan te se impregnou com o direito justiniano: um irn-
10. L'Estoile, JoufLnal, 1876, t omo III, pá g s. 11.14, 139 . Pe rador, um papa, uma religião, o direito de espo-
liar e de banir os hereges! Concordou com todos e s- O HO MEM E A GRAÇA
ses principias que anotou em seus cadernos d e cur -
sos, antes de enfrentar seu exame de doutorado, no Ao chegar a Pádua, resolveu estudar teologia
dia 5 de setembro de 1591. Ainda não estamos no t em quatro horas por dia e, assim, colocou-se sob adi-
poda tolerância. - re çào de Antônio Possevin (1534-1611). Este célebre
jesuita, humanista, educ~do~ e teólogo, compunha _e~
Em outro plano, as idéias que enfrenta são be m tão sua grande obra, a B~b l ~ot e ca ~elect a de nat~o -
diferentes. Pomponazzi valorizara em Pádua os méto - ne ~tudi onum (1593). Ele fortaleceu Francisco em sua
dos criticas. Trabalhando em textos autênticos, in - res olução de pertencer à Igreja e deve tê-lo acons~
terpretava Aristóteles como os árabes, não como Sa n lhado em seus estudos de teologia, cujo tema cen-
to Tomás. Em seu Tnatado da alma (1516) e em seu Tna tral foi o da graça. Os cadernos do estudante, in-
tado do de~tino (1520) chegava a um naturalismo qu e feli zmente, se perderam, mas conhecemos seus prin-
fazia franzir as sombrancelhas do inquisidor. Cremo cipai s assuntos: a gnaca e ~eu~ ~oconno~, a gnaca e
ni (1550-1631), com o mesmo espirita, iniciou seus a pnede~tinac~o, a pnede~tinac~o e a nepnovac~ o . O
cursos em 1591 e ensinava um aristotelismo puro: t o tema de suas meditaçoes infantis era agora aborda-
da forma é inseparável de sua matéria; é, pois, im= do d e modo cientifico. Ele se chocava com o agosti-
possivel que a alma exista sem o corpo. Ma s Vi ves nismo e com o tomismo tais como podia c o nhecê-los.
(1492-1550), amigo de Erasmo, havia pr e cis a mente se
parado, em seu De anima et vi ta (Bru ges, 1538), o pon Baius (1513-1589), depois de Lutero, havia en-
to de vista psicológico do ponto de vista fisico, e dure cido e desviado as posições agostinianas e a rea-
havia buscado menos o que é a alma do que seu modo ção contrã o agostianismo, no campo dos libertistas,
perceptivel de agir. Ao descrever fatos de consci ên foi d as mais veementes! Maldonado, principalmente,
eia - precursor da fenomenologia - não conheceria me= não hesitara em criticar Santa Agostinho diretamente:
lhor a natureza da alma por sua destinação moral do se o homem sem a graça, dizia, não pode mais fazer
que por sua função biológica? É por esse caminho q~ o bem, assim como não pode voar sem asas, se Deus
Cremonini, impelido pela Inquisição, parecia abri r só d á aos predestinados essa graça indispensável,
passagem para o pensamento cristão. Encontrãvamos os rep rovados não têm mais liberdade "de agir bem
assim o caminho de são Tomás e o 6eci~ t e no~ ad te ou ma l , assim como não têm o poder de voar", comopo
Domine, e tanto mais pelo fato de o pJ.atonismo fi ei dem então ser punidos aqueles que pecam? 11 Nesta l i
niano ter suscitado na Itália o movimento mistico do nha de raciocinio, havia um sofisma. Se o homem não
amon divino, que em Roma era encarnado pelo flore n- pode a gir bem para a vida eterna sem a graça, ele
tino Filipe Neri (1515-1595). Francisco, como sabe- pode a gir mal sem ela e contra ela. A autoridade ful
mos, possuia uma coletãnea manuscrita sobre o esp i- guran t e de Maldonado arrastava os espiritos e Fran~
rita desse santo. É nesse movimento do amor que e- cisco de Sales, ~ertamente, o seguiu.
le experimentava, se assim pode mos dizer, a reali da
de psicológica da imortalidade da alma, pois ela A reação contra Tomás de Aquino era mais com-
era capaz, sem ilusão possível de um amor eterno: du plexa e mais discreta. Os jesuitas deviam ensinar
vidar disso seria pôr em dúvida a e x periência dos sua d outrina, e trabalharam muito para ampliar sua
santos. Constituia para ele um argumento vital. Foi influência na Escola, fora dos circules dominicanos.
assim que, atacad o para n e nd en- ~e ã hene~ i a, sendo Sobre a predestinação, o Angélico tinha uma posição
obrigado a ler tantos li vno~ qu e connompi am, ele pª
de escapar às seduções do racionalismo paduano.
11. Maldonado, Opena vani a, 1677, torno III, Disput.
IIa, q. IV. f~ 119.
sabil idade ! Podemos merecer o ceu , podemos rrerecer o
alta de teologia pura. A idéia, perguntava-s e ele inferno: nosso mérit~ é terrível. Maldonado traba-
de um mundo que termina no céu ou no inferno seri~ lhav a por sua salvaçao ~0~ temor! ~o~so otimismo p~
compatível com a idéia de um Deus bom? Sua res posta de te r medo: Se, metUi me r~..{_t o.6 o ex.{_ 9..(_Jtem, devo .6e!L
é tão forte quanto sutil, mas sua própria sutileza - , mal dito ent/te o.6 mcd'..d,[to.6 . .. Após cinco anos de or9-:.
mal captada, tornava sua força perigosa. Ate os ção, de med itação e de es~udo, Franc~s~o se abando-
mais doutos tomistas não estavam de acordo. Domin- na, friame nte, por reflexao, nesta hipotese : Se eu
gos Soto, o teólogo do Imperador no Concílio de Tren .6ou.b e.6.6 e uta.Jt c.ondenado (que a..66im nêio J.ieja., Senho!t
to, que fora o mestre de Maldonado em Salamanca , a: Je.6u..6 ! ) po!t eJ.ita. vontade que o.6 tomiJ.i ta..6 c.oloc.a.m em
firmava que o homem, sem merecer a primeira graça, veu. .6 a. 6im de que J.iua. j u.ttica. J.ie ma.ni6e.6te, e.6ponta.
pode livremente recusá-la ou aceitá-la e, assim, de neam ente, eJtgu.endo o.6 olho.ó em meu e.6 tu.po !L pa.Jta o
cidir negativamente seu destino. Contra o que Luís Juiz Su.p!temo, diJtia. eom o p!to6eta.: Minha alma nêio
de Catene, também dominicano, sustentava que, se - e6taJtã nem um pau.e.o .6ubmi.6.6a a. Veu.6? Sim , Pai, poi.6
gundo São Tomás, Deus provê a alma com duas espé- tal 6oi teu beneplác.ito; que tua. vontade J.ieja 6eita.!
cies de graça: uma suficiente, à qual ela pode re-
sistir, a outra eficaz, à qual não pode resistir; Ma..6 i.6to, na am a.Jtgu.Jta. de minha. alma. , eu diJtia.
se todos os homens não se convertem, é porque não atê qu e Veu.6, mudando minha. vida e .6ua. .6entenca, me
estão todos providos eficazmente 1 2 • Assim se coloca Jte.6p onde.6 .6e: Tenha. c.on6ianca., meu. 6ilho ; nêio que!Lo
va a famosa questão de Auxili.6 que, desde então, dÍ a moJtte do pec.ado!t, ma..6 que ele .6e c.onveJtta. e viva.
vidia a Escola. Penso que Domingos Soto era um bom 0.6 moJtto.6 nêio me louva.Jtêio, nem a.quele.6 que vêio pa!ta
tomista e que havia transmitido o espírito a Maldo- o in 6eJtno. Como toda..6 a.6 c.o i.6a.6 , eu te 6iz pa!ta mim;
nado. Francisco de Sales atribuía aos tomistas, e atê o.6 p!tÕp!tio.6 Zmpio.6, de.6tinado.6 po!t .6eu pec.ado
não a São Tomás, como disse Bremond, uma opinião que ao dia. da. de.69Jtaca., ta.mbêm ele.6 eu o.6 6iz pa!ta mim.
não era a de Soto, mas a de Luís de Catene. Mas dei
xemos estas questões para os sábios! Na realidade ~ Não tenho ou.tJta v o ntade a não .6e!L tua .6anti6i-
Francisco de Sales sabia que se opunha a Santo Agos c.acão ; minha. alma. nada. odeia. do que 6ez . Po!L que,
tinha e a São Tomás, e não foi como fanfarrão da entã o , tua. alma eJ.itâ tJti.6te, po!t ~ue J.ie pe!ttu.Jtba?
"teologia moderna", como se disse leviamente, que E.6pe!L a em Veu.6 po!t que tu o lou.vaJta.6 a.inda., Ele, a
ele deixou de acatar esses dois doutores tão ama- .6~lvacão de tua frac.e, Ele, teu Veu.6. Tu não de de-
dos, mas c om "te mor e t remor", pronto ,, aliás, a dar Jta.6, tu .6u.biJtã.6 a montanha. do Senho!t, ã tenda. de
s u a ca beça e s ua dout r ina se a Igreja viesse a jul- Veu.6, do Veu.6 de ]a.e.Ó.
gar de f orma d i f e rente que .e l e.
_N ão eJ.itâ.6 moJtto : doJtm e.6 . Nêio, tu.a en&e!tmida.de
na.o e pa!ta a. moJtte, ma.6 pa.Jta qu e , c.onveJttido, Jten-
O OTIMISMO HERUICO da.6 9l6Jtia a. teu Deu~. CoJta.gem, meu pequeno J.ieJtvo
bem ~ndigno mai.6 6iel. PoJtque pu.6e.6t.e tua. e.6pe!tanca.
A predestinação não impõe nada ao homem, ensi- em m.{_m, e tua c.on6ianca em m~nha bondade, e po!tqu. e
nava São Tomás; a graça o deixa inteiramente livr e ; m~ 6o.6te_6iel em pau.e.a c.oi.6a, p!tonta. a .6o6Jte!L po !t
ele pode recusar a primeira graça; ele pode, tendo - m..{_nha gloJtia. e atê a c.ond en a.cão .6e tal 6o.6.6e do meu.
-a recebido, a ela se subtrair; que terrível respoE agJtad o, eu te eJ.ita.belec.eJtei J.iobJte muito.ó ben.6.
Sim, po!tqu.e tu qui.6ute 9l0Jti6ic.a.Jt meu nome po!t
12. Ver Sarpi, Hi.6toi!t du c.onc.ile de T!t ente (Histi Ut e .6 o 6Jtimento, .6 e p!tec.i.6 o 60.6.6 e - e mboJta. .6eja bem
ria do Concílio de Trento), traduçio de Amelot pequ ena. e.6.6a. 9l0Jti6ic.acêio e e.6.6a. exalta.cão de meu.
de la Houssaye, 1713, p. 192.
nome.. que.. nao ~e..ja paJta c.onde..naJt 1 j , ma~ paJta ~ a tvaJt_ do O ponto de vista do beneplácito do Pai. Tal é a
poJt tua beatitude.. e..te..Jtna tu me.. be..ndi1tâ~: é c.6ta a atit ude ~undarnen~al de Jesus Cristo: tal deve ser_a
g1tande.. gló1tia de.. me..u nom e.. ! ... do cristao; tal e a do doutor do amor, e desde Pa-
dua.
E que.. de..ve..Jtia e..u dize..Jt e..nt ão, ~e.não c.01110 an-t c.J :
Sim, Pai, pai~ tal áoi te..u be..ne.. piác.ito (XXII, 65-6 6 ). AÍ, logo que foi publicado, em 1 589, um teatino
lhe enviou um opúsculo que será seu código de via-
Tal é o clamor de São Fran c isco de Sales dian te gem: o Combate.. e..~pi~itual, de Dom Lorenzo Scupoli.
de um Deus justo e que pode jus t amente condená-lo, ma s 0 q ue encontra nele? Sua finalidade precisamente d~
cujo nome é Jesus. Este otimismo não repousa sobr e a fini da e seu caminho exatamente determinado. Scupo-
bondade natural do homem, que p ode tão facilmente me li procede, em armas espirituais, corno um mestre de
recer o inferno, mas sobre a bo ndade divina que po: esgrima, no estilo inaciano, mas com uma inspiração
de, neste mundo fazer um eleito de um condenado! Por própria e nova. Todo o movimento parte do princi-
tanto, podemos orar sem cessar, pedir a Deus ainda e pio do amor puro - móvel intencional - para chegar
sempre essa vida eterna que, por nosso pecado, perde à p o sse perfeita desse puro amor - finalidade real
mos, e Deus não pode então nos recusar a salvação: õ ou existencial.
poder da oração é infinito. Esta é urna convicção fun
damental no jovem Francisco de Sales. Eis a finalidade. A perfeição não consiste nas
práticas exteriores, na religião formal, mas "em to
tal desapropriação de nossa vontade e resignação ã
DIANTE VO PURO AMOR de Deus, submetendo-nos não apenas a Ele, mas a to-
da cr iatura por seu amor e isto unicamente para seu
O otimismo heróico culmina na submissão absolu- beneplácito, porque Ele assim o quer e porque Ele
ta ao beneplácito divino, qualquer que seja. Ele de- merece ser servido e amado" (Ch. I). Eis o meio es-
fine o ponto essencial do encontro do cristão e do senc ial, ao qual todos os outros se reduzem: "Quan-
Cristo: este ponto se encontra na agonia de Jesus, do se apresentar urna coisa querida por Deus, não in
no momento em que o Filho do homem diz ao Pai, dian- clina tua vontade a desejá-la sem antes ter elevado
te da morte mais atroz que existe: "Sim, Pai, não a tua inteligência até Deus para ver que tal é, de fa
minha vontade, mas a tua". A espiritualidade salesia to, sua vontade, e sem querer essa coisa pelo mesmo
na não é elíptica, não omite o termo t ndi~pe..n~âv c.t: motivo que Ele a quer e somente para agradá-lo" (Ch.
não vai do Tabor da alegria cristã ao triunfo da Pá~ V): o objetivo do amor é agradar a Deus por uma sub
coa sem passar pelo Calvário: Francisco de Sales sa- mis são absol uta de amor; tal é a regra de ouro da
be que Deus nos espera a todos no momento da agonia san tidade salesiana.
e é ai que nos defrontamos com o Absoluto e que nos-
so destino eterno é decidido. Todo caminho espiri- Estamos nos antípodas do homem revoltado. o be
tual deve nos levar, conscientes e confiantes, a es- nepl ácito de Deus nos aparece no ac.onte..c.ime..nto em
se confronto, no qual o beneplácito de Deus tomará que nossa razão fica impotente e nada vê: Jesus dian
para nós o semblante da morte. Estaremos prontos se te d a cruz, "loucura" para o grego, "escândalo" pa::-
cada dia, calmamente, pacientemente, adotarmos em tu ra o judeu! A opção está entre a revolta contra o ir
raci onal aparente ou a submissão confiante a uma sa
bed oria invisível. Submissão confiante, pois a von=
tade de Deus outra coisa não é senão o soberano bem,
13. D'Aubigné, em .te~ TJtagique..~, livro VII, v. 752, e se u beneplácito é a flor e o fruto desse amor sem
em "condarnneurs". limites. A revolta de Ivan Karamazov não pode, pois,
oeu s. Déage o viu ai durante aproximadamente rneiahQ
aparecer ao santo senão nos termos de um irraciona l ra, fulgurante de amor e de graça. Mil bandido~ que
infinitamente mais terrível do que aquele do acont e devastavam a praia de Ancona barraram-lhe o caminho
cimento que nossa razão não compreende, e contra Õ par a Roma. A volta por mar foi penosa: apô~ have4
qual ela se revolta acusando Deus de injustiça. Não pag o ca4o o p4eco da v{agem, diz ele, de~emba4camo~
se pode apelar pela justiça contra Deus: fazê-lo se no dia 5 de novemb4o, a noitinha, junto da~ coluna~
ria abrir ao ponto critico, corno diz Alberto Carnus: da gn.ande p4aca de São Ma4co~, em Veneza. Ele só to!:_
"os abismos mais desnorteadores sob os passos do re nou a sair de Pádua no fim de janeiro de 1592, e na
voltado"; o gênio de são Francisco de Sales abre: via gem de volta visitou Verona, Mântu, Pávia, Milão,
no mesmo ponto critico, a área infinita da liberda- Turim, etapas radiosas nessas cidades célebres, aber
de ao homem submisso; a submissão ao beneplácito di tur a também para o mundo, para a religião e para
vino unicamente liberta; a revolta nos une ao nosso as artes. Essa viagem tornou-lhe quase todo mês de f~
tormento. Aqui começam o céu e o inferno. vere iro. Finalmente, transposta a garganta do Monte
ceni s e atravessada a Maurienne, ele revê sua Sa-
bóia . Sua bonl~~ima e ca4Z~~ima mãe o esperava no
DULCE VIVERE, DULCE MORI catelo de La Thille, no extremo do lago azul com sua
pais agem tão bela de montanhas. No dia 2 de março
Sua teoria do puro amor foi posta à prova. A ele visitou seu bispo, o santo homem Claude de Gra-
"peste" - alguma gripe maligna - grassou em Pádua nie r14. A virtude do estudante já era célebre na al
em 1590: Francisco chegou às portas da morte. Viram deia de Annecy, um grande vilarejo com três ou qua=
-no então sereno e submisso, e suas palavras o def i tro mil habitantes, cercada e cingida em seus muros,
nem: é-me doce viver, é-me doce morrer, dulce, vive à sombra do castelo dos Nernours, irrigada por ca-
4e, dulce mo4i. Ele não mais se pertence, é todo de nais corno uma "pobre Veneza". As comadres cochicha-
Deu s. Supera, finalmente, o perigo e, portanto, é- vam que esse encantador fidalgo não beijava as jo-
lhe doce viver. vens na boca, "à moda da Sabóia", e Dom Granier não
pre cisava ser profeta para prever que ele seria "um
Seu ideal é submeter-se a toda criatura por grande servo de Deus, prelado raro e seu sucessor".
amor de seu Deus e, desde então, concebe a devoção
civil e a prática. Conhece os perigos deste mundo. Na realidade, Francisco teve de armar-se de to
Urna noite, seus companheiros querem pôr à prova a da s ua coragem para obter sua terceira vitória so=
virilidade desse devoto: ele pensa esta r sendo ata- bre seu pai. Ele, no entanto, a obteve e, abandonan
cado de verdade, puxa a espada e o bando recua com do a advocacia, renunciando ao amor da bela Suchet~
medo. Essa famosa castidade que admiram e invejam promovido a preboste no Capi t.ulo de Genebra, foi con
nele seria, pois, invencível? Francisco sai-se bem sagrado sacerdote de Deus no dia 18 de dezembro de
da brincadeira dessa ''famosa jovem" - 6amo~a puell a 159 3. O bispo chorava de emoção - E por que Vossa
- nos braços de quem quiseram jogá-lo. Para ele foi Exc elência está chorando? perguntaram-lhe. - Ah! a
mais difícil acabar com a perseguição de urna jovem aurora dá o orvalho, respondeu. O sol da Sabóia se
princesa, que estava apaixonada por esse belo fidal lev antava, sol que seria também o da França.
go. Sua virtude mostrou-se fulgurante em toda Pádua
e, em seu elogio do doutorado, Panciroli a celebrou.
Francisco, com 24 anos, era todo de Deus e só que- 14 . Ele não teve tempo, pois, de tornar a fazer a
ria viver para Ele. peregrinação fracassada a Roma, e tudo o que se
pôde narrar sobre o encontro de São Francisco
No dia 19 de outubro de 159 1 ele foi ao santuá de Sales com São Felipe Neri é lenda. Ch. A. de
rio d e Loreto cons agrar seu corpo e seu coração ã Sales, ao misturar seus documentos, fez seu tio
seguir, em 1591, o itinerário de 1598.
'l A
-
II. A MI S S A O

O GRANDE DESÍGNIO

A igreja de são Francisco de Assis, em Annecy,


que servia de catedral ao bispo exilado de Genebra,
vê , em 1593, Francisco de Sales tomar posse de sua
estala*. Francisco fez, então, seu discurso-progra-
ma.

Esse jovem padre é um místico, mas não fica per


dido num sonho interior: Paris, França, Pádua, Alta
Itá lia lhe revelaram o estado do mundo por seus con
tato s com a juventude estudante das nações. Na Fran
ça, os combates da Liga entusiasmam os católicos ar
doro sos, atiçam as cóleras dos hugenotes e fazem o
rei d e Navarra refletir, que compreende que não se-
rá re i de França se não fôr à missa. No momento em
que Francisco se prepara para seu combate, rumores
de e ntendimento entre Mayenne e o Béarnais se espa-
lham em Paris. Os pregadores se dividem: há os que
ousam dizer que agora se deve "reconhecer o rei"
pois ele é católico. Não vai ele realizar a união,
con forme declarou aos deputados das Igrejas em Man-
tes ? "Nada mais desejo do que ver uma boa união e
concórdia entre todos os meus súditos, tanto católi

(* ) Eltala: cadeira de madeira de espaldar elevado,


colocada nos dois lados do coro da Igreja e des
tinada aos membros do clero. (Nota do revisor.)
b res es l ogo os expulsou; não se combate as idéi as
cos corno da Religião." Beze daria tudo para que es- com a pont a das alabardas! É preciso conquistar os
sa unidade se fizesse por um concilio nacional, es- espíritos, converter os corações. É nisto que Fran-
teja o erro de seu lado, ou dos católicos. A politi cis co de Sales pensa, e é também o que seu duque co
ca de Henrique IV cria, no entanto, urna situação arn meç a a compreender. Para reconquistar o território
bigua: o extremistas de ambos os lados repelem tan= do Chabl~is p a ra a Igreja romana, é preciso conver-
to seu espírito de tolerância quanto sua religião tê- lo.
flutuante. Entretanto, não teria chegado a hora de
tentar se convencer mutuamente e por métodos irêni-
cos? É nesta hora que Francisco de Sales eleva a voz. O PI ONEIRO DO CATOLICISMO NO CHABLAIS
Ele conhece a importância de Genebra: todas as O Chablais, essa terra fértil que se estende
igrejas da França a ela se referem; ela possui mi- no sul do Lernano até as montanhas do Faucigny, ti-
nistros em grande número e dos mais eruditos; pos- nha por capital Thonon. Os canhões do forte dos Alli~
sui "belas e magnificas imprensas" que espalham seus ges mantinha submissa essa população pacifica,mas e~
livros em toda a Europa; nelas se publica um "enor- pez inhada, que só aspirava à traqüilidade e ainda
me exercício de pregações, de leituras, de conferê~ i ncerta quanto ao seu futuro. Do ponto de vista re-
cias, de disputas". Enfim, "suplantar" Genebra se- ligioso , urnas cinqüenta paróquias dependiam do dec~
ria privar os protestantes de sua Roma herege 15 • Re nato do s Allinges. O recente tratado de Nyon só rnan
cuperar essa sede do bispado é precisamente o obje= t inha ai três ministros e o duque havia recuperado
tivo a que o jovem preboste se propõe. Com que ar- o dire ito de nela restabe lecer a religião católica.
mas? Eu não vo~ phoponho, diz ele aos sels cõnegos, Es te tratado, rej ei tado pela assembléia de Berna,
nem o nehhO, nem a pôlvoha, nem o enxÔnhe; ê pela ea continuava sendo para o duque sua regra de ação, pois
hidade que devehemo~ abalah os muros da cidade, pe~ os acordos precedentes de Lausanne e de Nyon (1564)
la eahidade que temo~ de invadi-la, pela eahidade haviam sido violados pela invasão. O direito, no en
que devehemo~ heeupehá-la (VII, 107). Abaixo pois t anto, permanecia confuso e discutido. A Igreja re=
a guerra, e~~a hohhlvel e pavoho~a megeha, e~~a hul fo rmada de Berna pretendia recuperar suas igrejas
na eomum da~ hepübliea~, e~~a pe~te do E~tado (VII~ e restabelecer seus pastores.
159). Ele pensa corno Henrique IV, e também corno o
papa Clemente VIII: somente a paz, e as armas espi- Toda a população, por ou tro lado, aspirava pe-
rituais podem contribuir para a reforma • católica la paz, pelo trabalho. Com aproximadamente vinte e
e para fazer triunfar sua causa. cinco mil almas, ela era ou protestante ou sem reli
gi ão: quando muito, uns cem católicos poderiam aí
Não é a lição dos fatos? O jovem duque de Sa- se r contados . A opinião dependia sobretudo dos bur-
bóia, Carlos Emanuel I (1562-1630), tinha outras annas . gue ses de Thonon, comandados por um grupo compacto
Quis reconquistar Berna e Genebra pelo fogo de seus de calvinistas letrados, apoiados pelo ministro Luis
arcabuzes. Corno a recente guerra terminou com a paz Vi ret: eles tinham em seu poder o consulado da cida
de Nyon ( 1 589) e lhe deixou em mãos o Chablais, ele de . O planejamento da missão consistia em susteres
imediatamente colocou cinqüenta párocos nessas cin- sa fortaleza moral, cuja hostilidade religiosa vi~
qüenta paróquias: urna represália ofensiva dos gene- nha reforçada por urna hostilidade política. Senho-
res de Thonon eram por Genebra e Suíça: todos os
se us interesses os ligavam ao norte pelo lago, laço
15. Mémoire de Chérubin, in Obras de Francisco de Sa Vivo dessa região. Ora, Francisco de Sales vinha a
les, XXII, 316-318. eles a mandado do duque maldito e do bispo detesta-
do.
-::ia
'Hl
Partiu no dia 14 de setembro de 1594, com seu
primo Luis de Sales, sua Biblia e seu Belarmino.Va i eh tamo-6 no caminho cento, escreve então Francisco
apresentar ao barãode Hermance, um amigo, gover n a- de Sales (XI, 160).
dor do Chablais e chefe da guarnição dos Allinges,
a carta ducal que lhe confiava a missão dessa pro- O ano seguinte é assinalado pela renúncia de
vincia. O barão o conduz ao terraço da fortalez a , Avul ly à sua doutrina. Antes de fazê-la, ele quis
de onde se tem grande visão da planicie e do lago. submeter suas razões à crítica dos ministros. Antô-
No ar irisado, para além desse vasto espelho de e s- nio de La Faye, o sucessor presumido de Beze, que
tanho, são confusamente distinguidas as belas cida- estava envelhecendo, prometue corresponder. A dis-
des outrora da Sabóia, agora de Berna: Lausanne na cuss ão se faz em sua residência: sua incapacidade,
frente, Vevey à direita, Nyon à esquerda, e, atrás bastante conhecida pelos historiadores de Genebra,
desse promontório, a prestiogiosa Genebra; bem per- proporciona-lhe a derrota. Avully renuncia à sua do~
to, perfilam-se no tabuleiro dos campos e dos pra- trin a no mês de agosto, em Turim. Clemente VIII o
dos as aldeias: Mesinges, Margencel, Armoy e, às mar feli cita, Be ze o censura: sua conversão divide o bl~
gens do lago, Thonon, a capital. Mas que lástima! Por co p rotestante de Thonon e, em dezembro de 1596,
toda parte na estrada os dois missionários só viram Francisco de Sales conta com oitenta católicos (X,
igrejas em ruinas, ou cruzes derrubadas e uma popu- 219- 220). Se ne enguenmo-6 pnontamente a igneja de Tho
lação desconfiada. O barão aconselha a prudência aos non e de alg u n-6 outno-6 luga~e-6, escreve ele ao du=
dois missionários, propõe-lhes uma escolta que eles que, ganant o a Vo-6-6 a Alte za iue e.m pouco◊ mu e.-6 a
recusam,proibe-lhes de celebrar a missa em Thonon: mai onia do paI-6 1.>e conventena (XI, 189). Cerca de
só poderão pregar na igreja de Santo Hipólito, que dez a doze paróquias vieram pedir-lhe o culto católico.
não era mais considerada um bem de utilidade pública. Para reerguer as paróquias, são precisos fun-
O primeiro choque, efetivamente,é bastante dura dos: os cavalheiros de São Maurício e de São Lázaro
insultos, ameaças, pedras que voam, tumultos, carrponeses os de têm, e para recuperá-los Francisco foi a Turim
aterrorizados só com a aproximação desse "bruxo", des em out ubro de 1596. Volta com belas promessas, mas
se "diabo", desse "papista". Verdadeiro terror, pois a-: sem um escudo em mãos. Tem, no entanto, a permissão
credita-se no lobisomen nessa região. No sermão, ape verbal de doravante celebrar a missa em Thonon. Mas,
nas sete ou oito católicos ouvem o preboste juntada para a í levantar um altar, terá de enfrentar os pro
cátedra e alguns huguenotes nas portas ou nas janelas; curado res. No Natal (1596), tem a felicidade de ce=
depois,o consistório faz com que jurem ~ue não ouv~ lebrar em Santo Hipólito a missa da meia-noite; a
rão de modo algum esse papista. E o preboste continua, igreja está repleta de católicos convertidos, de sim
Aos seus dois ou três ouvintes cultos,ele prega se~ patizan tes, de curiosos. A conversão do procurador
mões sólidos, baseados na Eséritura e nos Padres:c~ Fournie r ocasiona um novo movimento de voltas e a
da pregação é como que o capitulo de um tratado cl~ nova paróquia de Thonon, em abril, toma consciência
ro,ordenado, lógico e, pela voz desses poucos amigos , de sua f orça. Um núcleo católico esclarecido - Pe-
sua palavra penetra na casa dos nobres. De seus ser- dro Poncet, d'Avully, Fournier - estã criado agora,
mões vai originar-se seu Memo~ial sobre a Igreja.En- :paz de sustentar o choque do partido protestante.
quanto isso, seus folhetos circulam; em breve, a par- al foi a apologética do santo?
tir de abril de 1595, o jurista Pedro Poncet fica con-
vencido; o presidente do Consistório, Antônio de Saint
-Michel, o Senhor de Avully, fica abalado. Conferência5
O VIÃLOG O
de paz com a França começam e os reformados de Thonon
propõem, no fim de um ano, em setembro de 1595, confro,!!_ n Esse diálogo do santo com os calvinistas de Th~
taras doutrinas em conferências familiares. O gelo on ficou, em parte, conservado em seu Memonial so-
foi quebrado, as pontes foram colocadas: Centamente

4íl
bre a Igreja 16 • Este escrito imperfeito mantémotom
da conferência vivida: seu interesse é fazer com que 1a . É uma nova? Como a ligam a Jesus Cristo? Vocês
assistamos a esse nobre combate. Não se trata, pois, di zem que a primitiva havia se obscurecido, altera-
de um livro de erudição, nem de biblioteca: as idéias, do, que vocês restituiram seu brilho? Mas Nosso Se-
os sentimentos em jogo se acham mais nessas cabeças nho r acendeu essa lâmpada pafl.a cobfl.i-la com u.m al-
e nesses corações do que nos livros, e o tom da po- qu e.l11.e.? Vocês ~etrucam afirmando que a verdadeira
lêmica muda, torna-se mais humano, amistoso. Fran- Igr eja é lnvi.õlve.l: e como todos os povos que devem
cisco de Sales diz Se.nhofl. Calvino; se algum dia lhe ne la entrar a encontrarão, já que não podem vê-la e
escapa e o chama de pu.nai-6 ( fedorento
11 11 )todos se
,
reconhecê-la? O que diz o seu cfl.e.do? Que ela é u.na:
surpreendem! Os insultos homéricos, então tão comuns mas a sua igreja é múltipla e se subdivide a cada
nesse gênero, são por ele banidos e até a ironia se dia . Que é -6anta: onde estãb seus milagres? Que é
suaviza num sorriso; o horror do erro se ameniza em catôlica: suas igrejas são particulares. Que é apo-6
bondade para com os homens. O apologista apresenta .:tÕlica: onde estão os seus apóstolos? Tal é a luz
suas razões com bom cofl.acão a esses l11.mão-6 .õe.pafl.a- de um bom senso otimista que percorre os textos ale
do-6, seus amigos: Nu.nca le.11.e.i-6 algu.m e.ó c11.l.:to qu.e. vo-6 gado s, os argumentos, as refutações. O apologista~
-6e.ja dado pofl. u.m home.m mal.ó a&e.lcoado a vo-6-60 .õe.11.vl com a Biblia, chamava em seu auxilio os antigos pa-
co e.-6pl11.ltu.al do qu.e. e.u. o .óou. (I, 5): Na disputa, e dres que eram reconhecidos por seus ouvintes. E con
urna revolução que se inicia. clu ia: vocês dizem que estão na Igreja; estão fora
O método é também excelente. Esses senhores são de la; vocês dizem que estão na verdadeira fé, mas
doutos, mas não eruditos: abafarão a luz sob um a- não observam suas regras.
montoado de citações. Utilizam-se apenas da pala- A fé é fundada na palavra. É o verdadeiro fun-
vra: 0-6 mlnl.õtfl.o-6 -6Ô qu.e.11.e.m combate.11. com a E.ócfl.itu.- damento, a verdadeira regra; mas esta regra deve ser
11.a, e. e.u. o qu.e.11.0 (I, 346). Vocês acham que ela é bas apl icada: é necessário o compasso e a mão de quemde
tante clara para espiritos comuns; o melhor texto les e serve. O seu uso tanto pode ser be.m como mal
não é o da Vulgata, que foi o texto oficial dessa ne.lto. Não basta saber que a palavra é a regra .óe. e.u
Igreja primitiva que v~cês reconhecem? Assim, esta- não -6 e.l q uai palav11.a ê.. de. Ve.u.-6 , onde. -6 e. e.nco n.:tfl.a,
mos de acordo, com a ressalva de que, nos lugares de que.ma de.ve. p11.opo11., aplicafl. e. de.clafl.alt. Com a regra
cisivos, poderemos recorrer às versões criticas, ao fu ndamental, a palavra de Deus, necessito da Igreja
grego e até ao hebreu. de Deus, Jte.gJta de. apllcacão e. de. e.xpücacão (I, 144-145).
Em seguida, o apologista se interpõe entre os Com efeito, a Escritura só pode ter um sentido
ministros e seus discipulos. Em nome de q uem lhes div ino, mas é sobre esse sentido que há desentendi-
falam esses ministros? Em venho da parte de meu bis mento. Certamente, não ê a Escritura qu.e. te.m ne.ce.-6-
po, que vem do papa, vigário d~ Pedro, que vem do .óld ade. de. Jte.gJta ne.m de luz e..õtJtanha, como Beze. acha
Cristo, que vem de Deus. E eles? Não vêm da Igreja qu.e. nÔ-6 acJte.dLtamo-6, .õâo no-6.óa-6 e.xplicacõu; não te
primitiva: separaram-se dela. Não vêm do povo: o po mos necessidade de um juiz e.n.:t11.e. Ve.u-6 e. nÔ-6, mas sim
vo não tem esse poder. Viriam de Deus, por missãoex ent re um homem tal corno Calvino e um outro tal como
traordinária? Onde estão seus milagres? E mesmo os Mor us. Não perguntamos se Deus entende melhor que
milagres não poderiam bastar: Paulo, suscitado pelo nõs sua palavra, mas se Calvino a entende melhor do
Senhor em pessoa, foi enviado pelos apóstolos. que Agostinho (I, 205-207). Quem vai nos esclare-
cer ? Algum outro homem? E o que tem ele a mais do
Essa Igreja na qual vocês pretendem estar,qual que Lutero ou de Cipriano? Qu.e. e.te. 6ale. tanto quan-
e, de onde vem? É a primitiva? Vocês se separarani. de- ta qu.e.ifl.a da analogia, da e.ntu.-6la-6ma, do Se.nho !t,
da E.õpl11.ito, mas se temos de nos aventurar, prefiro
minha barca. Meu Salvador teria me reduzido a essa
16. Constitui o volume atual das Conthoveh.óe-6, Obras, tomo I. Per igosa travessia? Teria me deixado sem qu.alqu.e.Jt
juiz ~upnemo na tenna? Não poderia ser: Eu a6inmo Francisco de Sales não convenceu todos os seus
que e~~e juiz não é outno ~enão a Igneja católi ca. ouvintes, mas criou neles o desejo da união. Vale
a pena citar aqui os sentimentos do procurador Clá~
Já que a igreja particular deve julgar entre d io Deprez; são de atualidade comovente: "Creio fi~
dois irmãos em desacordo, por que a Igreja univer- memente, escrevia ele aos ministros de Genebra em o~
sal não o poderia fazer entre todos os irmãos divi - tubro de 1598, que não há dificuldade de religião
didos? Paulo, aliás, nos diz que a Ign eja do Deu~ que n ão possa ser resolvida entre pessoas carido-
vivo e coluna e ~u~tentâculo da vendade (1Tm 3,15). sa s e isentas de quaisquer preocupações, mas apenas
Se o Senhor se encontra no meio de dois ou três di s des ej osas de buscar a verdade pela glória de Deus
cípulos reunidos em seu -nome (Mt 18,20), que dinã e pela salvação de sua Igreja; pois é infalível a
que a a~~embléia da Igneja univ en~ al d e todo~ o~ tem promes sa que Jesu~ Cristo fez_aos seus, a de que e~
po~ tenha ~ido abandonada ã men c ê do enno e da im= tar ia com eles ate a con~umaçao do mundo. Mas como
pie dad e? (I , 209-210; 74-77). aco nte cerá isto no meio de uma divisão? Busquemos,
poi s, e abracemos, em nome de Deus, esta união, sem
A Igreja, no entanto, não pode ficar sempre reu a q ual não podemos ser cristãos. O principal laço é
nida em concílio. A quem, pois, recorrer nessas di~ a c aridade: que ela, portanto, nos aqueça, a fim
ficuldades comuns que ~obnevêm dianiamente? O povo de que, não por meio de vãs disputas e discussões,
antigo dispunha de um tribunal e de um padne que se ma s p elo fio da verdade, possamos amortecer o fogo
mantinha à disposição pana o ~enviço de Iahweh (Dt da di ssensão que inflama todo mundo ... '' (XXIII, 254
17, 10-12), ao qual se devia obedecer sob pena de -2 55) . Estit carta reflete, sem dúvida alguma, o es-
morte. O novo povo ficaria sem um juiz supremo a ser pír ito s al8siano.
viço de Jesus Cristo, seu chefe? Pedro lhe foi da=
do: Ona, tudo i~~o não aconteceu apena~ com São Pe-
dno, ma~ também com ~eu~ ~uce~~one~ , pai~ penmane- AS VISI TAS A BtZE E A CONFERÊNCIA MALOGRAVA
eendo a cau~a penmanece o e6eito; a Igneja tem ~em-
pne nece~~idade de um con6inmadon in6allvel ao qual
po~~a dinigin-~e, de um 6undamento que a~ ponta~ do Fr ancisco de Sales tentou estender o diálogo
in6enno, e pnineipalmente o enno, não po~~am dennu- aos min istros: teve relacionamento com vários deles,
ban ( I , 3 O5 ) • sobretudo com Théodore de Beze. O grande ancião pas
sava por d u ra provação naquele momento. Adoentado
Permanecendo a causa, permanece o efeito. A cau desde o mê s de setembro de 1595, tivera de renunciar
sa e a necessidade de um palton univen~al e in6all~ ao ensino da teologia e não via ninguém à sua volta
vel; o efeito é a permanência desse pastor. Ao argu que o pudesse substituir: "Se Deus não nos estender
mento histórico da sucessão apostólica, o apologis= sua mão, e screvia a Grinée, acho humanamente impos-
ta dava como fundamento o fato essencial de uma fun sive l q u e esta escola se mantenha por muito tempo~
ção necessária. Mantinha, no entanto, o princípio A c rise da escola acrescentavam-se a divisão dos mi
de colegialidade da Igreja: o papa não é de tal for nis tro s e o declínio da fé: o povo abandonava apre
ma o bispo universal de quem o~ outno~ bi~po~ ~ãõ gaç ão para jogar "boliche" ou para ir às festas re=
apena~ vigânio~ e ~ ub~tituto~; o~ bi~ po~ ~ão, na nea gio nai s. Tais aborrecimentos fizeram pensar que Be-
tidade, pnlncipe~ e~pinituai~, che6e~ e bi~po~, não ze poderia ser abalado? Penso que uma outra razãode
vigânio~ do papa, e ~im de No~~o Senhon (I, 300). E~ Cid iu Francisco de Sales a tentar suas visitas: Be~
tas coisas difíceis eram ditas em um estilo claro , ze, e m uma carta pública a Henrique IV, exprimiu seu
arejado, vibrante, "não antiquado" e cujo vigor con for te desejo de unidade; não se poderia, dizia ele,
"b u sca-l
- a demasiadamente"; por ela ele daria "mil
ciso faz às vezes pensar em Pascal.
vidas" 17 • Clemente VIII, informado destas coisas,a- a p r ovav am. Este encon ~r o se revestia, pois de impo~
chou bom enviar Francisco de Sales ao encontro do tância única: Roma e Genebra, oficiosamente, iriam
chefe calvinista, a fim de tentar convencê-lo. ai conferenciar, embora isto tivesse de ser feito
apenas sob a responsabilidade do bispo. Mas a opos!
O preboste esteve com ele pelo menos por três ção à conferêncià prevalecia na Companhia: as nego-
vezes a partir de abril de 1597. A primeira conver- cia ções se prolongavam sem resultado.
sa foi sobre a salvação na Igreja romana. Beze concor
dou que era possível salvar-se nela, que não se po= Para sensibilizar os ministros, nossos missio-
dia negar que essa Igreja era a Igreja-mãe. Por que, nár ios decidiram celebrar as Quanenta Hona~ de An-
então, a reforma e tantas guerras? prosseguiu Fran- nema sse, às portas de Genebra. Nos dias 8 e 9 de se
cisco. A salvação, continuou Beze, é muito mais di- t embro de 1597, multidões consideráveis, aos milha=
fícil na Igreja católica por causa das obras que se res, acorreram dos arredores às indulgências. Dian-
julgam necessárias e que nela não se realizam.Assim, te d essas aglomerações, Chérubin intimou os minis-
cumulam-se as almas com grandes pecados; só a fé é tros a cumprir suas promessas e a sustentar o cho-
necessária à salvação; as obras são apenas de conve que d as razões católicas. La Faye respondeu com um
niência. O preboste voltou com muitos textos provan l ibelo sobre a idolatria da cruz 1 8 • Francisco de Sa
do essa necessidade das obras, mas Beze as lia numa les replicou com sua Ve6e~a do E~tandante da Santa
outra ótica; tudo se reduzia à única necessidade da Cnu z . O debate se desviou para uma polêmica inope-
fé: não houve entendimento. rante .

A terceira visita dá, no entanto, o que pensar: Entretanto, em novembro de 1597, Chérubin ha-
Francisco oferece uma honesta pensão a Beze, por par vi a s ubstituído, no cantão de Thonon, o preboste
te do papa, se ele se dispusesse a deixan Genebra ~ doe nte . Com sua poderosa voz, não cessava de desa-
Aqui não se trata mais de fé, mas de uma salda: pa- fi ar o s ministros. Um jovem mestre alemão, chama-
rece que o arquiministro tivera desgostos em Gene- do por Beze para substi tuÍ-lo, Hermann Dürrholz, Ug
bra e aborrecimentos com a república; o Estado não nani du~ em latim, aceitou o desafio. Veio inopida ~
era mais tão dócil à Igreja. Seja como for, é bem mente a Thonon, na véspera de Ramos, em 1598, leu
comovente pensar que São Francisco de Sales estimou uma s notas sobre a inautenticidade dos macabeus e
Beze e celebrou missa por ele. Sempre teve esperan- provou , assim, que era falsa uma religião que se a-
ça de sua volta~ Igreja e conservou cdntato com e- poi ava e m falsos fundamentos. A discu s são teria po-
le por meio de a migos: André de Sauzéa, especialmen dido du rar semanas sem chegar a nenhum resultado,
te, veio visitá-lo de sua pàrte, em 1603, mas sem= mas o p adre Chérubin, felizmente, havia feito seu
pre sem resultado. Be ze morreu em sua crença em 1605. adversário assinar o compromisso de continuar adis
put a at é sua conclusão. Ora, não lhe deram tempo de
Com Beze, e por ele, pretendia-se atingir toda di zer toda s as suas razões na tarde de domingo: Lig
a companhia dos ministros. Um projeto de conferên- nardiu s h a via partido repentinamente desde segu nda=
cia pública havia nascido de diversos contatos do -feira c edo , prometendo voltar, mas não o v i ram mais.
célebre padre Chérubin com os genebrenses. Dois mi- ~hérubi n mandou publicar sua promes s a e int i mou-o
nistros, Carlos Perrot e Simão Goulart, eram seus Jud icia lme nte a cumprir sua pa lavra .
partidários, e também o Conse l ho; Luís de Sales ha-
via negociado suas condições: o bispo e o núncio o
18. Bnieü Tnaitê de la Ventu de la Cnoix et de la
1 7. Manquu de l 't gli~e, 1592, f9 3, 12 - 13. maniene de l'hononen, Genebra, 1597.
A questão assumia repercussão pública. A paz nai s de todas as paróquias do Chablais. A maioria
de Vervins (2 de maio de 1598) reconciliava a Fran- dest es abjurantes eram chefes de fumilia: represen-
ça e a Espanha. O duque de Sabõia estava ai envolvi tav am, ao que parece, a maioria da população, que
do e Henrique IV pretendia incluir Genebra. Os ares, fr ancisco de Sales estimava em 25.000 almas. Aosob~
pois, eram favoráveis à causa católica e grandes fes tin ados, o duque não poupou suas exortações e suas
tas se preparavam em Thonon para dar um poderoso im "conferências". Uma "dezena de familias", diz Geor-
pulso às conversões: deveriam ser celebradas as Qua aes Rolland, não cedeu: o duque os exilou. Aos dele
henta Hoha-0 com uma solenidade excepcional no fim gado s de Berna, que pediam a manutenção de pelo me:-
de setembro e no começo de outubro; o legado ponti- nos três ministros, ele respondeu: Estou de acordo
fício, Alexandre de Médicis, negociador da paz, es- se você s aceitarem três de meus sacerdotes em sua
tava sendo esperado ai pelo duque. A conferência pú cidade. Não se tratava de uma brincadeira espiritu~
blica teria sido o torneio dessas festas, mas os mI sa.
nistros se obstinaram em sua recusa, e esta fuga foi
uma das principais causas do desabamento da Reforma
em Thonon. O sábio historiador da A~ademia de Calvi GENEB RA, ROMA E PARIS
no, Carlos Borgeaud, o reconheceu: "Desertar do cam
po onde o adversário havia lançado a luva do desa=- A conquista do Chablais não podia satisfazer
fio e estava aguardando era uma confissão de incap~ nem o duque, nem o bispo, nem seu preboste: Genebra
cidade" 19 • era o alvo principal. Havia dois meios para conver-
tê-la ao catolicismo: ou a guerra, ou a diplomacia
Pela pena de seu procurador, Cláudio Deprez,os e a penetração pacifica. O duque não recusava meio
calvinistas de Thonon reprovavam energicamente os mi algum, mas deixava o canhão como último argumento. O
nistros de Genebra por sua atitude de decepcionante. papa sabia que mexer com Genebra seria despertar a
Esta disputa, dizia Deprez, era "muito necessária guer ra na Europa; a Inglaterra e Flandres continua-
para fortificar os enfermos": "Vocês viram como a vam lutando contra a Espanha; bastaria ameaçar a ca
tempestade e a tormenta arruinaram nossas igrejas pital calvinista para acender todos os furores pro:-
sem que os marinheiros se tenham oposto". Houve pa- te stantes . Francisco de Sales pensava como o papa:
lavras ásperas: "Se os apóstolos tivessem se conten a gue rra deveria ser proscrita.
tado em ficar encerrados em quartos bem cômodos pa:-
ra ensinar o povo por meio de escritos ~ sem ousar Teri a ele tido conhecimento do Edito de Nantes,
sustentar sua doutrina de viva voz, não teriam pro- cuja publ icação o rei retardava por deferência ao
porcionado tão grande progrésso ao reino de Jesus cardeal legado? De qualquer forma, desde o dia 15
Cristo" (XXIII, 253). de junho de 1598 ele revelou a Riccardi um projeto
diplomático ousado. Ele era de opinião que Henrique
Não se pode, no entanto, dizer que a "redução" IV, a convite do papa, se quisesse mesmo dedicar-se
do Chablais foi um golpe de força do príncipe, mas a isso "com todas suas forças", poderia conseguir
o sucesso inesperado da missão permitiu-lhe proscre que Genebra abrissse suas portas ao culto católico
ver dai o culto protestante, sem violentar demais ã Por me io do Interim: Sehia, dizia ele candidamente,
grande maioria das consciências. Com efeito, em um eohtah o ~alvini-0mo pela haiz (XI, 339). No dia 17
mês pode-se registrar cerca de 3.000 renúncias nomi d~ junho, o bispo, Cláudio de Granier, enviava, sem
duv ida a pedido dele, uma súplica ao papa no mesmo
sent ido. Mas por vários motivos, essa carta ficoues
19. Ch. Borgeaud, Hi-0toihe de l'A~ademie de Calvin, que cida nas gavetas da secretaria de Estado. A San~
1900, p. 252. ta Sé ainda não tinha núncio em Paris. O Edito de
Nantes, sobretudo, tinha deixado o papa muito exal-
tado. Foram necessárias a paciência e a s áb ia diplo
macia do pabre d'Ossat para fazê-lo compreender que
a Igreja poderia tirar ótimo partido desse Edito e
que o rei não estava errado ao dizer que ele seria,
em suma, mais proveitoso para os católicos do que
para os protestantes. Foi então, em fins de dezem-
bro de 1598, que Francisco de Sales foi a Roma para
ai fazer seu exame de episcopado e advogar as cau-
sas de sua igreja de Genebra. Trouxeram à luz a sú-
plica de Granier e o preboste soube convencer Cle-
mente VIII: o resultado era imenso. Pedir a Henri -
que IV para introduzir a missa em Genebra por mei o
do Interim era reconhecer claramente o princípio da
tolerância, fundamento do Edito. Quando o novo nú n
cio, Gasparo Silingardi, portador da carta de Gra=
nier, apresentou-se à audiência real no dia 9 de ju
lho de 1599, Henrique IV louvou as vantagens de seu
Edito: era uma boa abertura. O núncio pediu-lhe, pois,
para querer "com todas as suas forças" introduzi r
a missa em Genebra; ele lhe prometeu Que o faria .
o princípio da tolerância triunfava em Paris, mas não
em Genebra. São conhecidas as trapaças suscitadas
pelo irrequieto e pérfido duque; suas duas políti-
cas, de paz e de guerra, conduzidas simultaneamente,
prejudicavam-se reciprocamente 20 • O golpe fracassa -
do da Escalada (1602) tornava impossível o Interim
em Genebra.
.
PELA UNIÃO PACÍFICA
Apesar dos fracassos, Francisco de Sales perm~
neceu sempre fiel à sua idéia de uma união pacífica
das Igrejas protestantes com a Igreja católica. Com
preendamos bem sua posição: ele reconhecia os erros '
da Igreja romana, sobretudo em suas instituiç6eshis
tóricas, humanas e sujeitas, portanto, à corrupção; 1~!
,.

20. A preciosa carta de Granier encontra-se no Vati


cano, N F, volume XLII, f9s 478; a audiência de
Silingardo é narrada em sua carta a Pietro Aldo Clemente VIII recebe Francisco de
brandino, N F, volume XLVII, F9s 29-33. Sales, em dezembro de 1598.
mas ele confessava na Igreja católica uma forma es e a he.n e.lia allume. canáte.n como algo do_Eltado; não
sencial, querida e criada pelo Cristo, a qual não be vi a mlnima e.lpe.nança de. lua conve.nlao;_al coi-
podia soçobrar. Seu diálogo com os protestantes o bab e.ltão tão adiantadal que. ol he.ne.ge.l nao le. le.~
havia persuadido de que o fundo do debate prendia- ;t em de. 6onma alguma inquie.tadol (XXII, 303-304). ~~
-se à Eclesiologia: era preciso convencer nossos ir ;tal palavnal pe.ne.tnanam de. tal 6onma e.m me.u conaçao,
mãos separados de que a Eclesiologia católica, em confessa Francisco de Sales, que. nunca mail me. 6oi
seus dados essenciais, era a verdadeira; tratava-s e, polbive.l tiná-lab de. me.u Zntimo. Mas qual o remédio
pois, de uma volta à antiga Igreja, mas ele queria para esse mal? Eis as idéias que ele submeteu a uma
que essa volta fosse pacifica, leal, fundada sobre per sonagem romana, q~e não_nos foi ~ossivel identi-
a convicção, inspirada pela caridade, como o escre- fic ar, a fim de propo-las a Santa Se em tempo opor-
via Depre z aos ministros de Genebra. Seu diálogo lhe tuno (XVII, 198).
havia feito ver também que, de ambos os lados, for- Buscava-se,desde o começo do século,formar uma
javam-se idéias falsas sobre o "adversário": somen- liga do papa para "exterminar" a heresia. Havia si-
te um confronto objetivo, sereno, modesto, em cari- do colocada sob o patrocínio de Nossa Senhora da Com
dade, poderia fazer cair esses preconceitos. A expe paixão, fundada inicialmente por Francisco de Sales
riência, no entanto, lhe provava que essas condi= e Chérubin para ajudar e acolher os protestantescon
ções de serenidade se revelavam então praticamente ve rtidos, mas cujo patrono era o duque de Sabóia. Um
impossíveis: as conferências, em geral, eram conten patrono de couraça e casco! Logo as ambições politi
das; ele próprio não concordou com elas, a não ser êas estavam perigosamente misturadas às intenções
que lhes fosse tirado esse caráter. Sua pregação pa re ligiosas. O Santo bispo, em 1616, volta a lançar
risiense, em 1602, lhe havia mostrado, po.: outro li ess a idéia de uma ação pela unidade, mas purifican-
do, que. que.m pne.ga com amon pne.ga contna ol he.ne.ge."Z, do-a de toda corrupção militar: é preciso convencer
mas é preciso entender bem esse amor: com a Bíblia tod ob oh pnZncipe.b catôlicob e. todab ab ne.p~blicab
ele admirava os padres, e é sua pregação ecumênica, não a toman ab anmab e.xte.nione.b, mab ah inte.nione.b
alimentada pelos padres, que esclarecia os espiri (XXII, 305). Deveriam, ao apelo do papa Paulo V, con
tos; concluia, pois, que. todol ol e.lcnitol dol pa~ voc ar um concilio nacional na França e na Alemanha~
dne.l e.nam apnopniadol pana a conve.nlão dol he.ne.ge.l entre delegados católicos e protestantes, sob a au-
(XIV, 96-97). Este foi o processo de Newman e é o to ridade não antecedente mas conseqüente da Santa
processo moderno. Sé. Isto é, esses concílios, sem comorometer a Igre
. ja, buscariam os meios pana ne.alizan-a ne.união. Suas
Uma outra observação sugeriu-lhe outras idéias. dec isões seriam, em seguida, sancionadas pela Sé
Na sagração do bispo de Siãó,Hildebrando Jost, em Apo stólica. O santo havia observado o enorme espaço
1614, ele pregara, segundo seu método, sobre a su- que ocupava no conflito o problema dos bens e das
cessão apostólica diante de um auditório parcialmen si tuações adquiridas: ele aconselhava, pois, medi-
te protestante: seus ouvintes ficaram muito admira= da s liberais para renunciar a esses bens e obter u-
dos. Um desses reformadores veio conversar com ele, ma situação honrosa para os ministros e mesmo para
depois o acompanhou até a fronteira. Não cessou de os clérigos ou sacerdotes apóstatas.Em sua opinião,
conversar com ele sobre esse doloroso problema: a an tes de qualquer discussão teológica, esse era o
cisão parecia definitiva. Qual o meio para trazer Pr imeiro passo necessário.
de volta à fé da Igreja romana tantas cidades e re- Quanto a Genebra, ele retomava sua velha idéia
públicas, onde os católicos nem ao menos podiam fa- d~ nela introduzir a missa por meio do Interim. Sem
zer-se ouvir? Poil, donavante., e.ntne. nÔl, luZçol, duvida,os tempos eram então pouco propícios para es
dizia ele, e. e.m toda a Ale.manha, at~ me.lmo e.m vá- s~ cruzada pacifica. Talvez, confessava, be.ja di6Z~
nial pante.l da Fnança, cidade.l inte.inal lãa he.ne.ge.l c~t agona unin ob conaçÕe.b dol pnZncipe.b catôlicob!
Infelizrnente,a divisão religiosa tinha corno primei- 111, UM A PRIMAVERA E S PI RITUAL
ra causa o escândalo dos católicos,rnas ele não per-
dia a esperança de obter um mifagfLe. pe.fa ofLaç_ão e_
pe.fa mão 6ag1Lada do Santo PadlLe. (XXII, 302-310). o
partido das armas triunfou mais wna vez. Para dar
graças aos céus por sua vitória sobre Concini, Luy-
nes tinha assumido o compromisso de arruinar os hu-
guenotes e "até lhe fazer a guerra caso encontrasse
ocasião": foi a descida de Luís XIII para o Sul.Se-
rão necessários séculos para que essa idéia salesia
na de uma reconciliação pacífica seja reconsideradã FRANCISCO VE SALES E HENRIQUE IV
sob nova forma.

TEXTO

O Tratado de Lião (1601) acaba com o conflito


Apenas pela Escritura da França com a Savóia e dava à França, contra o mar
ques ado de Saluces, com a Bresse, o território de
PofL 6upo6icão, 6acamo6 de. conta que. nunca hou- Gex e de Bugey. O território de Gex, protestantiza-
ve. IglLe.ja, ne.m Concllio, ne.m pa6to1Le.6, ne.m doutofLe. ~ do, dependia, do ponto de vista religioso, da dioce
de.6de. 06 apÔ6tofo6, e. que. a SaglLada E6c1Litu1La cont e. se d e Genebra, cujo bispo, Claude de Granier, resi=
nha ape.na6 06 fiv1Lo6 que. Cafvino, Beze. e. Ma1i,ty1i, 6~ dia e m Annecy. Francisco de Sales, designado seu
dignam ace.itafL, que. não e.xi6te. ILe.gfLa in6aflve.f palLa coadj utor, foi a Paris em 1602 para ai negociar o
be.m e.nte.ndê-fa, ma6 que. e.fa 6e. ache. ã me.lLcê da6 c on restabelecimento do culto católico. Ele chegou no
ce.pç_Õe.6 de. que.m qui6e.lL anilLmalL que. inte.lLplLe.ta a E6~ dia 2 2 de janeiro e só se retirou pelos fins de se-
c1Litu1La pe.fa E6c1Litu1La e. pe.fa anafogia da 6~, com o tembro: estes oito meses de estadia foram dos mais
6e. que.lL e.nte.nde.lL A1Li6tÔte.fe.6 polL AILi6tÔte.le.6 e. pe. fa fecu ndos tanto para ele como para a França.
anafogia da 6ifo6o6ia; digamo6 ape.na6 que. e.66a E6-
c1Litu1La é divina, e. e.u a6i1Lmo, diante. de. todo6 o~ Seus negócios o colocaram, primeiramente, em
juZze.6 impa1Lciai6, que., 6e.não todo6, ~e.fo me.no6 a - relacionamento com a corte e com o rei. Henrique IV
que.fe.6 de.ntfLe. você6 que. têm afgum conhe.cime.nto e. ca teve grandes sentimentos de admiração para esse "fê
pacidade. 6ão inde.6cufp~ve.i~, e. ndo pode.lLiam p1Lot e.~ nix d os bispos". Seu gênio compreendeu rapidamente
9e.1i, 6ua ILe.figião da fe.viandade. e. da te.me.lLidade.. E o par tido que poderia tirar dele. Para restabelecer
e.i6 a que. me. ILe.duzo. 06 mini6t1Lo6 6~ que.lLe.m comba - os negócios da França, ele queria, sobretudo, paci-
te.lL com a E6c1Litu~a, com o que. conco1Ldo; e.fe.6 não ficar os ânimos, unificar a religião e devolver a
que.lLe.m da E6c1Litu1i,q 6e.não a6 palLte.6 que. lhe.6 ag fLa- primazia ao catolicismo, base sólida da monarquia.
dam, o que. concedo; no 6inaf de. tudo i66o, e.u digo Quis , por esse motivo, retê-lo na França.
que. a c1Le.dibifidade. da IgfLe.ja cat5lica fe.va vanta-
gem 6ob1Le. tudo, que. e.fa di6pÕe. de. mai6 pa66age.n6 p~ Que esperava o rei de tal bispo? Que fosse um
ILa 6i do que. a opinião cont1Lâ1Lia, e. a6 paMage.n6 qu e. conci liador. Quis ouvi-lo em Fontainebleau, no do-
po66ui ~ão mai6 cfa1La6, pu1La6 e. 6imple.6, ma,i_6 ILa zo~ mingos após a Páscoa. Pregara uma boa peça em seus
ve.fme.nte. inte.1Lp1Le.tada6, mai6 concfude.nte.6 e. conv e. - amigo s protestantes, delegados de Genebra, levando-
nie.nte.6. Tenho tanta ce.1Lte.za di66o que. quafque.lL um -os ao sermão do bispo. Que pensavam eles de talpr~
o pode. 6abe.1i, e. conhe.ce.lL (I, 346-347). lado? Disse-lhes que não estariam "fora da Igreja"

C: A
se todos os bispos tivessem sido corno ele. O duque i grej a de Genebra e não queria passar nem por ambi-
de Bouillon e os genebrenses mostraram-se de acordo: cioso nem por ingra to para com sua pátria. Henrique
todos os seus concidadãos, garantia Francisco Cha- IV tentou, no entanto, prendª-lo a si por urna doa-
peau-rouge, "o consideravam corno um homem de bem ••• ". ç ão real de bons escudos. O fino filho da Sabóia es-
Que não ter.ia ele feito na França para pacificar pro capou de maneira maravilhosa: náo tendo então neces
testantes e católicos? - sidade dessa pensão, rogou a Sua Majestade para co=
l o cá-la sob a guarda de seu tesoureiro Sully; ele
Além disso, o rei apreciava muito sua devoção. r ecorreria a ela nos dias de penúria. Nunca, confes
Ouvira falar muito de sua quaresma do Louvre e ele sava o rei, havia recebido recusa "me lho r temperada~•
pr6prio ficara encantado com sua eloqüªncia: esta Apr eciou tanto esse filho da Savóia que tentou a-
doutrina elevada e bem esclarecida pelo bom senso cor tra i-lo para sua corte alguns anos mais tarde: so-
respondia ã mais profunda necessidade da França. A= nhava fazer dele um cardeal, talvez um papa. O san-
p6s um século de renascimento pagão, a ambição dos to homem estava pronto, por volta de 1608, para ir
primeiros humanistas cristãos não estava satisfeit a: à França se Paulo V assim o tivesse desejado (XIV,
"Oferecer ao Cristo um culto material, dizia Erasmo, 9-10 ). O rei, a rainha, a corte, os parisienses ha-
e atos materiais, ver nisto a mais alta religiã o, v iam sentido o quanto Francisco de Sales amava a Fran
cornprazer~se nessas práticas e tornar a liberdade de ça; no dia 15 de agosto de 1602, ele compôs para a
condenar o próximo" era, evidentemente, romper com França urna magnifica oração ã Virgem:
o Evangelho. Henrique IV não era devoto, mas era cren
te; colocava, segundo suas magníficas palavras em Ca V -0ac11.atl-0-0ima e. be.m-ave.ntu~ada Se.nho11.a, que.
naye, "sua consciªncia acima de seu reino"; ele via ut ai-0 no mai-0 alto do pa11.aZ-00 da 6e.licidade., te.n-
que um povo não pode ser moralizado sem verdadeir a de. piedade. de. nÕ-0 que., ~n6e.lizme.nte., e.-0tamo-0 no de.-
religião. Francisco seria o ap6stolo dessa religião -0e.11.t o da mi-0é11.ia; e.-0tai-0 na abundância da-0 de.lZcia-0,
ponderada e viva. Não tendo conseguido retê-lo, fe z e.-0tam o-0 num abi-0mo de. de.-0olaçÕe.-0; dai-no-0 6011.ça pa-
com que lhe escrevessem, por seu amigo comum De Hayes, 11.a -0upo11.ta11. toda-0 a-0 a6liçõu e. que. -0e.jamo-0 -0e.mp11.e.
"que ele via muitos de seus súditos viver com toda espé- apoiado-0 pe.lo vo-0-00 Be.m amado, unico -0u-0te.ntãculo
cie de liberdade, dizendo que a bondade e grandeza de. no-0-0a-0 upe.11.ança-0, Única 11.e.compe.n-0a de. no-6-00-0 til.a
de Deus não davam tanta importância ãs ações dos ho bal ho-0, Único 11.e.mêdio pa11.a no-0-00-0 male.-0. Oh! Vi11.ge.m
rnens, o que ele condenava totalmente, mas que el~ 9lo 11.io-0a, 11.ogai pe.la Ig11.e.ja de. vo-0-00 Filho; a-0-0i-0ti
condenava totalmente, mas que havia outros também com vo-0-00-0 6avo11.e.-0 todo-0 0-0 -0upe.11.io11.e.-0, o Santo Pa-
em grande número, que tinham urna opinião tão baixa d11. e. , 0-0 p11.e.lado-0 e. bi-0po-0, e.-0pe.cialme.nte. o de. vo-0-0a
de Deus que acreditavam que · Ele estivesse sempre cid ad e. de. Pa11.i-0. Se.de. pll.opZcia ao 11.e.i: vo-0-00 av& Da
pronto para surpreendª-los em qualquer falta leve a vi be.ne.6icou o 6ilho de. J&nata-0 e.m me.mô11.ia do-0 le.'1.~
f i m decondená- los eternamente, o que ele também não vico -0 e. onlcio-0 11.e.ce.bido-0 de. J&nata-0, e. e.-0te. 11.e.i ê
aprovava. E que ele desejaria que, entre esses dois ne.to de. um de. vo-0-00-0 mai-0 6iêi-0 e. de.voto-0 -0e.11.vo-0,
extremos, o servo de Deus ... instruísse seus súdi- o be. m-ave.ntu11.ado Sã.o Lul-0; nô-0 vo-0 11.ogamo-0 que. lhe.
tos e os afa s tasse desses extremos por suas prega- e onc e.dai-0 a vo-0-0a p11.ote.ção e.m nome. de.-0-0e. -0anto 11.e.i.
ções e confe r ªncias, e ainda pelos livros que rnand~ A 11.ainha, que. te.m a hon11.a de. t11.aze.11. o vo-0 .60 nome.,
ri a i mpr i mi r" (Des Hayes, p. 51) . Nada exprime me- e.-0t e.ja -0e.mp11.e. -0ob o ab11.igo de. vo-0-00-0 -0anto-0 6avo-
lhor a n ec e s s idade que a França tinha, e ntão, de um '1. e.-0. D lZ.11.io ce.le.-0te., 11.e.gai 0-0 li11.io-0 da vo-0-0a F11.an
tal h omem . ca. c om vo-0-0a-0 -0anta.-0 bê.nção-0, a 6im de. que. -0e.ja.m b11.a.n
C~-0 e. pull.0-0 na unida.de. da. ve.11.dade.i11.a nê e. 11.e.ligião~
O r ei mandou buscá- lo em 16 0 2 , pelo d u que d'É- Vo-0, que. -0oi-0 um ma11., conce.de.i a-0 onda.-0 de. vo-0-0a-0
pernon, mas Francisco d e sculpou-se : e s tava ligado à 9'1.a. ça.-0 a. e.-0te. jove.m e.n6im; vÕ-0 que. -0oi-0 e.-0t11.e.la do
mah, -0ede 6avohâvel ao navio de Pahi-0, a 6im de que partidário decidido da espiritualidade teresiana;
ele po-0-0a apohtah no -0anto pohto da gl5hia, paha aI pe rmanecerá por toda sua vida com desconfiança da
louvah o Pai, o Filho e o E-0 plhito Santo, pelo-0 -0~- "v ida supereminente".. Que papel ele desempenha, en-
culo-0 do-0 -0éculo. Am ~m (VII, 461-46 2 ). tão, nesse foco onde se acende a chama da renovação
Urna tal oração, dita com esse coração e essa espiritual na França?
fé, dava ao mundo a sensação de que a Igreja é um
universo de espíritos, abrangendo e ao mesmo tempo Segundo Brernond, o jovem prelado ainda está
ultrapassando o espaço e o tempo, na qual os pere- se buscando: "Ele se cala, observa, admira, critica,
grinos deste mundo estão ligados pela fé, pela ora- ob serva-se, aplica-se, está à escuta"; "pretende gra
ção e pelo amor aos cidadãos do céu, no seio da di- dua r-se" nessa academia de santidade (Brernond, I;
vindade bem-aventurada. É sob essa luz que devemos 93- 94): Mas quais são os fatos? Bárbara Acarie, des
ver o impulso espiritual que esse santo vai suscitar . de sua chegada, o torna corno confessor, e ele lhe en
sin a a se confessar, pois ela não o sabe, acusando=
-se de imperfeições que não são matéria de perdão
O CIRCULO ACARIE (IV , 434). Ele observa, julga, analisa muito lucida
mente seu êxtase e o aprova. Numa conferência deci=
A permanência em Paris, sobretudo, colocou Fran siva, no palacete Acarie, contra a opinião comum,
cisco de Sales em íntimo contato com o "circulo Aca faz com que se decidam pela fundação próxima do car
rie". Em volta da célebre extática havia um grupo melo reformado e pelo projeto de fundar o Oratório
de personagens religiosas das mais eminentes. El as na França 2 1 • Ele entra em contato com Maria de Beau
vão desempenhar papel decisivo na renovação espir i- vill iers, a reformadora de Mont.rnartre, "a abadessa
tual da França. Várias delas escrevem. Pedro de Bé- das abadessas": ele a aconselha sabiamente em seu di
rulle (1557-1629) acaba de publicar o Bheve da abn e fic il empreendimento. Esse pretenso "estudante" é um
gacão, adaptação do Re-0umo da peh6elcão de Isabel le mest re.
Bellinzaga, a famosa "senhora milanesa". Benoit de
Canfeld (1562-1610=, inglês de origem e capuchinho Sua ação sobre Bérulle foi igualmente profunda
em Paris, prepara sua edição francesa da Regha da e, t alvez, decisiva. Ele admira, ele ama esse homem
peh6eicão (1609), toda impregnada da mística nórd i- a quem Veu-0 deu muito e de quem é impo-0-0lvel aphoxi
ca: Brétigny acaba de traduzir as obras de Madre T~ ma~- -0e -0em ti~a~ g~ande p~oveito; ele é, diz, exata
resa (1601); Dom Beaucousin, vigário ~a Cartuxa de ment e como eu go-0ta~ia de -0eh (XII, 181). Reconhece,
Paris, publica sua tradução da Pêhola evangélica pois , seu valor, mas Bérulle, por sua vez, vê em Fran
(1602): estamos, pois, na confluência das correntes cisco de Sales um santo: abre seu interior a ele e
espirituais do Norte, da Itália e da Espanha. Neste toma a decisão de ir fazer um retiro com ele na Sa-
grupo predomina o espirita da mística romana de ten vóia . Em 1602, ele ainda parece incerto quanto ao
dência "abstrata", orientada para a "vida superem i: seu c aminho. Francisco lhe fala do Oratório filipi-
nente" de união direta com a essência divina, por no que viu, admirou, estimou em Roma, em 1599. Os
uma superação de todo conceito positivo e da pró- dois amigos decidiram introduzi-lo na França; este
pria humanidade do Cristo. A mística teresiana, ao Proj eto lhes é tão comum que, chegado o momento de
contrário, dá à humanidade de Jesus, às imagens, ãs estabelecer-lhe as bases, Bérulle tentará, desde 1608,
visões, o lugar que sabemos. Estas duas tendências, atrai r seu amigo a Paris a fim de tornar a iniciati-
no grupo, sutilrnente se arnalgaman e secretamente se va (XIV, 207, n. I; XV, 154-155).
repelem: breve vai resultar urna divisão. A posiç ão
de Francisco de Sales desde então é clara: ele é um
-
21 - Duval, P. 38; Sauzéa, P. 35.

58
A marca de Francisco é visivel também no sorta 50 a is, conseguirá fazer com que o espirita dessa r~
nista André Duval (1564-1638). Um dos três superio= fo rma penetre nos corações. Com muitas dificuldades,
res, com Bérulle e Gallemant, do Carmelo reformado , v ai primeiramente suscitar a devoção em sua diocese.
autor da primeira vida de Madame Acarie, um profes-
sor eminente, do qual dirá Vicente de Paulo: "Tudo Dedicou seus primeiros cuidados ao seu clero.
é santo em M. Duval". Jacques Gallemant, um dos pro seus padres, a seus olhos, formavam seu episcopal;
motores de nossa renascença religiosa, o apóstolode parti lhando de sua tarefa, estavam obrigados a pra-
Gisors, de Pontoise, de Rouen, de Paris, esteve tam ti car a mesmas virtudes, a ter a mesma perfeição que
bém sob a cativante influência do jovem prelado. A ele, como e.te dedicado-0 a Deu-0 como -0envo-0 e-0tigma-
própria duquesa de Longueville, entusiasmada por sua t izad o-0 pana -0eu penpêtuo -0envico, pon uma con-0agna
quaresma do Louvre, quis pedir a opinião do santo cão -0acnamenta.t e pon um canâten e-0pinitua.t que não
sobre a fundação do Carmelo. Afinal, ele conquistou po de -0en eliminado (V, 333~. Com estas palavras bem
toda a corte com essa quaresma. Ao sair de Paris, ponder adas, e le toma posiçao: o p adre diocesano pa~
em 1588, deixou ai muitos amigos; ao encontrá-los tici pa d o es t ado d e per f e i ção, com o bispo, antesdo
novamente, estes o reviam aureolado de glória; não simple s r e li gioso. Com efeito , os bons párocos não
acabara ele de trazer de volta para a Igreja uma pro sao menos ne c essários do que os bo n s bispos, ponque
vincia de vinte e cinco mil habitantes, onde encon: ele-0 -0ão 0-0 pa-0tone-0 imediato-0 que devem andan na
trara apenas cem católicos e onde não deixara ma is 6nente do nebanho (XXII, 400-401).
do que uma centena de protestantes? Para toda es s a
Paris devota Francisco de Sales foi um m0delo, um A primeira base dessa reforma sacerdotal foi a
amigo, um animador; se ele ai aprendeu muito, muito ins tru ção. A acusaçãode ignorância que os reforma-
mais ensinou. Em todo caso, um novo laço se estabe- dos fa ziam ao clero católico era uma das mais funda
lecera entre a França e ele: Fnanci-0cu-0 Sabaud u~ das e das ma i s dolorosas de todas. Para selecionar
Ga.t.tu-0; a irradiação do bispo de Genebra sobre a Fran padre s dignos, Francisco de Sales submeteu inexora-
ça não mais cessará de crescer. Não pensemos,por ou velmen te as paróquias e os beneficias ao "concurso",
tro lado, que a experiência de Madame Acarie viera segundo a regra de Trento: neste caso, nenhuma ami-
abrir-lhe o mundo mistico: nele já havia penetrado zade, nenhuma cólera o fizeram ceder. Para instruir
por sua própria experiência. Definitivamente, temos seus p adres, ele se transformou, no começo de seu
de eliminar a imagem de São Francisco de Sales fre- bispado , em pro f essor de teologia: três vezes por
qüentando aulas de espiritualidade em • Paris em 1602. semana dava suas aulas. Instituiu conferências men-
sai s o nde os leigos tinham acesso e voz. Nunca ces-
sou de exortar seus padres à ciência, e-0-0e oitavo
A REFORMA CATULICA NA SABUIA 6acnamento da hierarquia. Queria, sobretudo, que a
ciênc ia deles fosse santa, pois pode-se estudar, en
Francisco de Sales deixou a capital no fim de Si nar , pregar ou para salvar almas e glorificar a
setembro; nós o encontramos em Sales no dia 14 de o~ Deu s, ou por intene-0-0e, vã g.t5nia e ongu.tho.
tubro. Seu bispo, Claude de Granier, morreu e ele
se prepara para sua consagraçao, que ocorrerá dia 8 . O padre deve saber, em primeiro lugar, para e-
de dezembro. Logo se lança ao trabalho e sua prime~ d~6 i can--0e a -0i me-0mo, certo de assim poder, em se-
ra obra é continuar a reforma empreendida pelo emi- gu ida, edificar a Igreja (XXIII, 303-305).
nente prelado, cujo desaparecimento lamehta. A par-
tir do sinodo de 1603, coloca as bases estatutárias Depois disto queria pastores zelosos, mas de
dessa reforma. Por meio de suas visitas diocesanas, um zelo suave, paciente, complacente e misericordiQ
de suas pregações, de suas direções espirituais pe~ so . Coloca-se totalmente contna o zelo amango. So-
mover o melhor que pôde o ensino das letras nos co-
mo-6 po!L vezu tão au1.iteJL01.i em no1.i1.ia1.i c.oJtJteç_oe1.i, di - lé gios de Annecy, de Thonon, de Thônes , de La Roche,
zia, que no-6 mo1.itJtamo1.i e6etivamente mai-6 Jtep!Leen1.i Z- de Rumilly, de Évian; quis, sem o consegui r , colo -
vei1.i do que aquele1.i q~e admoe1.itamo1.i e.amo c.ulpado-6; a car os jesuítas nos colégios de Thonon e de Annec y ;
pedJta de toque de um pe!L6eito c.on6e1.i1.i0Jt e 1.iua pie da rec orreu, então, aos barnabitas de Milão, seguiu de
de. Ele mantém, no entanto, o meio termo e repro vã per to os programas, o espírito, os costumes. Parti-
essa compaixão que ap!Lel.ienta um tJtave1.i1.ieiJto pa!La o dár io de urna filosofia e de urna teologia modernis-
vZc.io; é preciso que nos coloquemos ao alc.anc.e de tas , apoiou o padre Redento Baranzano, que ensinava
e.ada um e que c.onc.edamo-6 indulgênc.ia não ã malZc.i a, uma doutrina atual: este padre partilhava, em físi-
ma-6 ã en6eJtmidade (XXIII, 297-298). ca, das idéias de Galileu, então em dificuldade em
Roma; Francisco de Sales aprovou suas Nova e o pini o
Para que esses novos costumes penetrem em s eu ne-6 phy1.i i c.a e e o apoiou contra seus superiores 22 • Pa
clero, confere à elite de seus padres, aos quais d á ra melhor armar essa elite saída dos colégios, ele
o nome de deãos, poderes reforçados. Eles cuidam d a fund ou, com Antônio Favre, a "Academia Florirnontana"
boa execução das ordenações sinodais e devem restau (160 7), cuja celebridade se espalhou por toda a Eu-
raras igrejas por toda parte, promover o culto, a= ropa , corno o prova urna carta de Favre. Foi urna espé
cabar com as discussões dos padres em volta dos c a i cie de universidade popular, urna "escola noturna"
xões por causa das velas, expulsar dos presbitérios aberta "a todos esses valorosos mestres das artes
as mulheres suspeitas, impor a residência aos pár o- honestas", pintores, escultores, marceneiros, arqui
cos, expulsá-los das tavernas e privá-los, se nec es tetos. Ai se davam aulas de teologia, de filosofia~
sário, de seus benefícios (XXIII, 262-272; 389-39 8i de retórica, de cosrnografia,d2 geometria, de aritrné
tic a. Tratava-se ai, num e1.itilo de 6ala!L ou de le~
de maneiJta 1.ieJtia, Jte6inada, plena, ma-6 1.iem pedanti1.i
A INSTRUÇÃO DO POVO E O APELO AOS LEIGOS mo, do oJtnamento da-6 lingua-6, 1.iobJtetudo da 6Jtanc.e1.ia
(XXI V] 244-245).
Com essa reforma pastoral, Francisco de Sales
tinha por finalidade instruir o povo, dar-lhe uma Francisco de Sales queria essa elite a serviço
religião verdadeira e viva. Sua visitas pastorai s, do povo. Era necessário, primeiramente, instrui-la.
até 1607, conferiram um impulso vigoroso ao espír i- Ele reavivou as dez escolas populares que existiam
to cristão na massa. Ele as fez com grande zelo. Fo i em sua diocese. Escreveu para a massa urna prática
a todas as paróquias e, coisa que jama is se tinha fác il de compreender e que todos os párocos deve-
feito, aos lugares mais altos e as mais pav oJto J.ia-6 riam ler no domingo; em pouco tempo, diz urna teste-
mo ntanha-6 . Dedicava seu tempo a pregar, confirmar, munha, todos esses homens ficaram conhecendo as prin
confessar, reconciliar, encorajar, corrigir os ab u- cipais verdades da religião e s e sentiram "e.amo que
sos, a dar o impulso para u m culto di g no e honesto.
Ele fazia "todos os ofícios de pároco": todos er am
confortados e somente ele se achava s e m ze lo. A his
tória que l he contaram, a de um camponês q ue c airã 22. XXIV, 200 n. 1. Galileu, aliás, tinha duas vezes
em um despenhadeiro em busca de sua vac a , fazi a-o razão, tanto em sua ciência quanto sobre a Bí-
suspirar: D Veu-6, o aJtdolL de1.i 1.ie c.amp onê-6 que p!L oc.u- blia; os autores sagrado~, afirmava ele, s6 fa-
Jtava 1.iua v ac.a eJta t ão quent e qu e o gelo não o e1.i- lavam da natureza "segundo as aparências"; era,
6Jtiou. E po!L qu e 1.iou tã o le Jtd o em bu1.i c. a de mi nha-6 assim, precursor de vários séculos de Leão XIII.
o v e l h a-6 ? ( XI I I , 1 9 9 ) . Ve r s u a b e 1 a c ar t a a o P . Cas t e 1 1 i , d e 2 1 d e d e z em
bro de 1613, em DTC, VI, 1060, artigo de E. Va~
Para instruir esse povo, ele recorreu a elite. candard sobre Galileu.
Teve, primeiramente, o cuidado de formá-la e de p r~
.6a-Zdo.6 da.ó t11,e,va.6 p'1.a a luz". Como a prática não bas, uenas corno nas grandes cátedras, contanto que pu-
tava, era necessário o catecismo . O santo bispo te, des s e ter igual prove~ to:.. Subia à <:á~edra com gra~
ve muita ~ificuldade ~ara_promovê - lo, ~ois não figu de humildade e dependencia do beneplacito de Deus ...
rava na lista das obrigaçoes cont rat u ais que liga: suscava puramente o provei to das almas e não o apla~
vamos párocos a seus benefícios, ordinariamente 0 50 •• • Pregava tanto por sua vida exemplar quanto por
único objeto de sua preocupação. Ele próprio teve~ sua d outrina ... corno um homem verdadeiramente apos-
dar o exemplo: seu sucesso foi estrondoso. Mas logo tól ico que tinha mais do que o humano" (Chantal, II,
ficou sobrecarregado e teve de recorrer aos seus cõ 17 9- 184).
negas e a outros padres, finalmente aos leigos, aoi
quais confiou a tarefa de instruir a infância den- Por onde passasse, pregava. Por toda parte on-
tro de uma "Confraria diocesana". Talvez tenha sido de pregava, convertia, avivava a chama, levava a a-
o criador do clero especializado ao nomear, em 1610 . mar essa religião vigorosa que renova a vida. Popu-
Claude Dumont como responsável pela catequese diocesa lari zava essa grande idéia da Igreja, corpo rnlstico
na. Organizou congressos diocesanos de catequese. - de Cr isto, na qual Deus nos dá a existência imortal
pela carne e pelo sangue de seu Fi!ho~ Lembrava se~
Francisco de Sales, como podemos constatar por pre a o p~vo que eomendo tod~.6 um ~o pao, .6omo.6 to-
esse esboço, fo i , pois,um bispo inovador: ele pres - do .ó um .60 eo'1.po (Rm 12,5): e, po'1. ,{,/.J/.Jo que .6omo.6 to-
sentiu nosso tempo. "Ele comandava, diz a Madre Chan- do.ó ,i,11,mão.6, po'1.que, pe.fo mumo eo'1.po e. pe.fo me..ómo .6an
tal, santa e muito cuidadosa e diligentemente sua gu e. .6omo.6 nut11,ido.6 pa'1.a a vida e.te.11,na; assim, noCris
diocese. Creio que existem poucas ou nenhuma dioce - to, na Igreja, somos todos eomo nlo'1.e..6 da me..6ma â11,~
se em que os ec l esiásticos vivem mais exemplar e de vo '1.e., eomo a.6 pe.d'1.a.6 p'1.eeio.6a.6 de. uma me..6ma eo'1.oa
votamente do que na de Genebra" (Chantal, II, 224) ~ (VII I, 1 3) . Em suma, por essa grande corrente de pre
gaç ão buscava construir a Igreja fazendo de todo cris
tão um perfeito vivente, um perfeito comungante do
A PREGAÇÃO EVANGtLICA Cris t o nosso chefe. Nesse sentido, pode-se dizer, a-
gor a, que sua ação foi única.
Foi sobretudo pela pregação evangélica que Fr~
cisco de Sales insuflou o espirita da reforma emsw Preocupou-se com comunicar esse zelo pela pala
diocese. Foi um pregador incansável. Pregar o Evan- vra ao s seus melhores padres. Ele havia, há muito tem
gelho era, a seu ver, o primeiro deve r de um bispo . po, fo rmado uma equipe de missionários para evange~
Mais depressa faria um sermão, confessava ele, do liz ar o Chablais. Como bispo, continuou esse traba-
que o tempo de dizer não: nunca recusava um convite lho. I a escutar seus pregadores, "nunca dormia du-
para pregar, e para atender a tantas solicitações ul - ran te o sermão", prestava atenção no que havia de
trapassava, freqüentemente, suas forças. Pregou em bom e d e mau, e depois, delicadamente, corro bom pai,
sua diocese várias quaresmas, em Annecy, em La Ro- dizi a a cada qual o que deveria suprimir, o que de-
che, na Savóia em Chambéry, no território de Gex, ver ia e poderia acrescentar: sua critica era sempre
Quando estava em casa, pregava o mais das vezes ao s construtiva. Mostrava-lhes corno não tornar obscuro
domingos e nas festas em qualquer igreja de AnnecY • se u di scurso: menos sentenças, mas mais claras, cheias
Pregava "de modo completamente apostólico", depõe a de men sagem, mais práticas. Ensinava-lhes a variar
Madre Chantal, "com um zelo e desejo sem igual de 0 t om, a falar sem ênfase, naturalmente. O padre de
conversão e proveito das almas: percebi claramente Bonevil le, seu biógrafo, lembrava-se com emoção de
que ele não tinha nenhuma pretensão al~rn desta em sua bondade sobre esse ponto.
s eus sermões; não pensava, de modo algum, em ser um
gr a nd e pre gador ... Pregava com igual afeição nas P~
Dava o acabamento a essa obra de e vangelizaç ão t os e todos os recursos das almas, e falava em ter-
pela cultura de uma elite popular por meio das Co n- mos tão precisos, tão oportunos e inteligiveis, que
frarias. Eram numerosas: Confrarias do "Rosário" , f azia com que se compreendesse com enorme facilida-
do "Santo Sacramento" , do "Santo Nome de Jesus". Fu n d e as coisas mais delicadas e nobres da vida espiri
dou a "Confraria da Santa Cruz" em Annecy, a de "Nos t ual ... Eu sei disso por uma certa experiência. Ele
sa Senhora da Compaixão" em Thonon: animava-as ou as af irmou a pessoas que lhe comunicavam suas necessi-
reanimava. Finalmente, por rnei6 da direção espiri- d ades e spirituais que via claramente seu coração c o
tual individual, criou um corpo de cristãos zelos os mo através de um cristal. A quantas almas disse ele:
que o ajudavam a renovar a religião. Vo~i n~o e~t~ 6alando tudo ... Ordinariamente, nada
se podia esconder dele ... Dizia freqüentemente aos
s eus penitentes o que desejavam dizer antes de que
PELA DIREÇÃO ESPIRITUAL o declarassem ... ". Era muito reservado sobre as "coi
sa s sobrenaturais": "Não as desprezava, mas também
Francisco de Sales, corno sabemos, foi um dire- não as exaltava. Só atribuia valor e levava em con-
tor espiritual incomparável, mas Santa Chantal o di s ta as verdadeiras virtudes ... Conheço almas que es-
se melhor do que todos: "Entre todos os dons de Deus tavam muito atribuladas e inquietas com várias per-
que nosso bern-avent~rado recebeu, o da direção esp i t urbações, as quais, pela graça de Deus , ele pac i fi
ritual foi dos mais eminentes ... ; por isso, reco r= cou (e sou uma delas), às vezes, com uma s ó palavra'~
ria-se a ele de diversos lugares para ser esclareci René Favre, o filho do pre s idente, veio um dia pro -
do ... Tive conhecimento de que vários prelados, pa= curá-lo, com a alma atribulada; ele "o levou par a
dres, religiosos, eclesiásticos, nobres e pessoa s se u escritório e deu-lhe a ler", sem· qualquer pala-
da justiça, principes, princesas e pessoas de tod a vra, um capitulo do Amo~ divino; nosso homem ficou
qualidade, ricos e pobres de diversas provincias, o ca lmo e completamente liberto da perturbação que o
procuraram para a direção espiritual. O número de af ligia interiormente. Várias pessoas foram pacifi-
almas que ele conduziu para o caminho da perfeiç ão c adas só por seu olhar (Chanta), II, 197-200).
cristã é incontável. Nunca ouvi dizer que alguma de
las tenha caido em qualquer engano, nem que tenha Esse vigoroso retrato de São Francisco de Sa-
se desviado do temor de Deus ... Quando ele passava le s como diretor espiritual põe por terra a imagem
por qualquer cidade, sabemos corno era bastante as se qu e dele se fazem os mundanos como um elegante bis-
diado; até mesmo os diretores espirit~ais mais expe po , cercado por belas senhoras e tagarelando sobre
rientes vinham consultá-lo e lhe enviavam seus di s= de voção. Ele foi um genial e firme diretor espiri-
cipulos a fim de que fosse esclarecidos por ele s~ tual. Seria uma vocação, um atrativo, um prazer? E-
bre as coisas mais dificeis da vida espiritual". O ra , antes de tudo, um dever. Foi criticado por per-
padre Coton, "personagem tão extraordinariamente de r seu tempo com essas condutas tão particulares,
marcada pela piedade, não teve sossego sobre urna al ma s ele as considerava como parte de seu dever. Per
ma conduzida por vias extraordinárias" (talvez Ma - t ence à missão de um bispo conduzir as almas até Deus,
ria de Valência) enquanto não pediu a opinião do sa._!2 pois ele sabe que , no rebanho, as boas ovelhas se
to bispo. O padre Suffren "aprendeu mais sobre a boa a grupam em volta do pastor e são necessárias para
conduta das alma em cerca de nove horas durante as c onduzir as outras: urna diocese precisa de santos,
quais tratou com ele sobre esse assunto, do que o e o bispo deve cuidar deles como chefe; ser-lhe-ia
fizera em toda a sua vida". Ele "possuia urna vi são Proibido fazê-lo em particular? Francisco de Sales
tão penetrante que quando alguém lhe falava ou es - achava que não.
crevia sobre seu intimo, discernia com urna delicad~
za e clareza sem igual as inclinações, os rnovirnen-
Desta maneira ele desperta para a vida ferv oro vo çao e ver que ela não e nem sombria, nem triste,
sa uma grande família de filhos e de filhas espir i: ne m aborrecida, mas, pelo contrário, é uma fonte de
tuais,de Filotéiase de Teótimos. Conhecemos as Fi lo alegria; pois a d e voção con~i~te, e,~~encialmente nu.m
téias, a baronesa de Chantal, a abadessa de Montmar am oJt acendJtado, ela no~ imp ele e, incita não ~omente
tre, Angélica Arnauld, Madame de Charmoisy e tant as a ob~e.JtvaJt o~ mandamento~ da lei de, Veu.~, pltonta,
outras; mas pensemos também aos Teótimos: tantos ativa e, diligentemente, ma~ também a p1tatica1t a~
prelados, abades, cônegos, padres e leigos aos quais bo a~ abJta~, qu.e_ ~ão apena~ con~elho~ ou. in~piJtaçÕe,~
o santo bispo comunicava sua chama: Revol, Ancina, pa1tticu.la1te_~ (V.D. I, 1), o que só pode nos tornar
Frémyot, Bérulle, Duval, Gallemant, Favre, Soulfourt , fel izes na alegria do amor. Com efeito, essa devo-
De Hayes, São Vicente de Paulo. Como as mulheres guar ção inte1tio1t toJtna tu.do ag1tadãvel, doce e, 6acil (V.
daram melhor suas cartas e estão em maior evidênci~ D. I, 2). Ela não está reservada aos monges, às mon
então pensamos que o santo só dirigiu mulheres. Nó s jas , aos padres, mas está ao alcance de todos: dos
nos esquecemos de que ele conquistou para a devoção cortesãos, dos soldados, dos comerciantes e arte-
até seus próprios cônegos! sãos . Seria uma he1tuia pensar o contrário. E o que
ela exige deles? Sem dúvida alguma, uma g1tande, Jte~o
A VEVOÇÃO NO MUNVO lu.ç ão de acabar com uma vida dupla e conquistar a
pur eza da vida: o amor divino exige gJtande, coJtagem.
No entanto, foi para suas Filotéias que e le es "O Reino dos céus sofre violência."
creveu sua I ntJtodu.ção a vida devota ( 1609). Este li=
vro teve um sucesso estrondoso: em dez anos for am A pur2za que Francisco de Sales pede ao cris-
publicadas mais de quarenta edições na França e l o - tão penetra nas profundezas. Como não se pode evi-
go foi traduzido em quase todas as línguas da Euro- tar todos os pecados veniais, é preciso pelo menos
pa, até em basco. Suscitou cóleras, mas sobretudo dete star-lhe o habito, pu.1tga1t-~e_ da a6eição â~ coi-
grandes admirações: atribuiu-se algo de Calvino ao Ja ~ inútei~ e, pe.Jtigo~a~, liberta-se até da~ mã~ in-
autor, mas P. de Villars, arcebispo d e Viena, e scr~ Q[inaçÕe_~, sobretudo por uma prática eficaz e fru-
via-lhe: "O livro que acabais de publicar me encan- tuos a da confissão freqüente, fundada sobre o prin-
ta, me aquece, me extasia" (XIV, 410). Este prel ado cipio do amor, âmago da contrição perfeita. Somente
via, sobretudo, o bem que a obra faria para atr air ness e clima de pureza é que a comunhão freqüente po
os protestantes para a Igreja romana; Antônio Ar- de d ar todos os seus frutos. Arnauld, nesse ponto~
nauld fará os mesmos elogios ao bispo . de Genebr a. esta rá de acordo com Francisco de Sales e se apoia-
rá nele. Para a comunhão cotidiana, o "suave santo"
O livro atendia melhor ainda as necessidades exi ge plte~ eJtvaJt-~ e da maioJtia da~ mã~ incünaçõ~ (V.
dos católicos. Estes estavam imersos numa atmosf era D. II, 20). Não estava sendo nisto jansenista, mas
de humanismo que dissociava, como dis s emos, a r eli- exato. É nestas condições que a missa se torna o sol
gião da vida. Relegava-se a fé para o ápice do espl dos exercícios espirituais, centro da religião cris
rito, prestavam-se a Deus os deveres d e cortesi a a~ tã o coJtação da devoção, a alma da piedade, (V.D. II~
sistindo à missa e fazendo a Páscoa, e depois l eva- 14) e que a comunhão produz todos os seus frutos de
va-se uma vida desenfreada pelo caminho dos praze - beleza, de bondade, e mesmo de pu.Jteza.
res. Reservava-se para o momento da morte o cuidado A vida sacramental e litúrgica encontra-se, pois,
de sua consciência; isto não era novidade, mas pen- na base da espiritualidade salesiana: para suscitar
sava-se que não podia ser de outro modo e assim é a devoção no povo fiel,é indispensável um culto vi-
que se ensinava. Francisco de Sales despertou os e ~ vo ; a liturgia deve normalmente criar um apetite de
piritas: ensinou aos homens de seu tempo queum cri~ d~vino e um clima de contemplação por uma celebra-
tão é um homem que ama a Deus; fê-los saborear a d~ Çao bela e inteligível do Mistério, mas cabe a cada
um penetrar nela e vivê-la pela ona çã o pe~~oal: or a vir encontrá-lo para adorá-lo , a má-lo, invocá-lo com
ção e liturgia atraem-se mutuamente e se completam~ secretas a~pinaçõu , onaçõu jaculatônia~ e bon~ pen
6 am e nt o~ (V. D. II , 1 2 -- 1 3 ) . -
são Francisco de Sales quer, pois, aclimatar a
oração no mundo, quer que a religião seja pessoal, Neste hábito do recolhimento ativo, o método
consciente: é esta sua novidade. A fim de realizar salesi ano da meditação não é mais um árido e arti-
isso, é preciso saber criar para si um espírito de ficial exe r cício como alguns ignorantes pensam; ele
solidão que esteja em perfeito acordo com a vida ci s e torn a uma necessidade da vida interior: se quise
vil e familiar, o que exige ainda uma grande resolu= r es con hecer o Deus de teu coração, busca sua pre=
ção. O devoto salesiano aceita os passatempos, os s ença , invoca sua l uz, escruta sua palavra, não pa
esportes, os jogos, até a dança, as recreações ne- r a conhecê-la curiosamente, mas para guardá-la e curo
cessárias ou convenientes ao espírito e ao corpo, p ri-la, compara tua vida com essa regra e toma-a c~
mas não gosta desses prazeres por eles mesmos: se- mo medida; uma palavra resume tua resolução, e se
ria amar uma finalidade sem finalidade; ele as re- Deus se torna sensível a teu coração, tu te abando-
duz à medida do bem divino; é um ponto delicado,mas na s à graça; se a aridez te torna seco, faça como o
essencial (V. D. 30-34). Para adquirir no meio de seu c amponês que lavr a seu campo deserto na esperança
trabalho e de seus deveres esse espírito de solidão, d a colheit a (V.D. II, 1-9). Este exercício pode ser
deve-se evitar as conversas vãs, as tagarelices re- l ongo ou breve, segundo teu tempo e tuas forças: bas
pugnantes, as leituras dissipantes, a fim de reser- t a que seja feito concientemente. Se a ele fores fiel,
var melhor toda sua atenção à sólida cultura compa- Teótimo, entrarás no caminho do amor.
tível com suas ocupações profissionais. O autor de
Filotéia, não podendo então recomendar a Bíblia por
falta de boas traduções, aconselha os livros espiri O CAMINHO DO AMOR
tuais mais ricos de doutrina evangélica, Ludolfo o
cartuxo, Grenade, os Salmos, sobretudo os de Despor Por esta ascese, Francisco de Sales nos intro-
tes, com os quais a Madre de Chantal se deliciava~ d uz no caminho do amor, pois é "em passos de amor",
Ele próprio possuía sua Bíblia e a citava freqüent~ di z Santo Agostinho, que vamos para Deus. O princí
mente de memória. Sem essa impregnação de leitura pio düste amor acha-se inserido em nossos corações
cristã, a vida de oração, principalmente no mundo, pelo Espírito: canita~ di66u~a; sem ela, não pode-
torna-se impossível, seca e ressecante : ríamos nos elevar até Deus. As pulsações dessa cari
dade nós as percebemos pelas in~pinaçõe~, ou seja~
Nesse clima de recolhimento e de cultura, o e- t odo~ o~ atnativo~, movimento~, admoe~taçõe~ e ne-
xercício essencial da vida fervorosa, o único indis- mo n~o~ intenione~, luze~ e conhecimento~ que Deu~ o-
pensável, torna-se possível. Em que consiste ele?No ~a em nó~. Para viver verdadeiramente de amor, te~
exercício da presença de Deus: onde quen que e~tej~ mo s de acolhê-los e consentir, ma~ com um con~enti-
mo~ encontnamo~ Deu~ pne~ente, mas não pensamos ni~ mento pleno, amono~o e con~tante. Não iríamos, en-
so; temos de pnovocan no~~a alma a uma atenta con~~ tão, cair nas mesquinharias ou no iluminismo? Filo-
denaç~o de~~a pne~ença. Deus não está somente pre- té ia tem bom senso. Para os atos simples, claros e
sente no lugan em que estás, Filotéia, mas ele se puros da vida cotidiana, este perigo não existe; quan
acha muito panticulanmente em teu conação; Ele ai do se trata de coisas impontantu ou ex;(Jw..ondina.JÚM-;
se encontra no âmago de tua alma; tua alma é o tem- de ve-se sempre consultar o diretor espiritual.
plo de Deu~; é neste templo que por meio de santos,
freqüentes, curtos, mas fervorosos recolhimentos,no Esta obediência às inspirações, para Franscis-
meio de teus trabalhos, penas e preocupações, deves co de Sales, era decisiva, pois, como ele ensinava,
as inspirações são para o bem o que as tentaçõe s são d o egoísmo. É bom amar-se a si mesmo, querer para si
para o mal: quem não dá seu consentimento ãs prime i mesmo, querer para si o bem que Deus nos quer, mas
ras, sucumbirá sob o impacto das segundas (V.D. II~ ~ traição amar-se sutilmente no amor e pelo preten-
18). Freqüentemente gememos sob o peso do pecado ou so amor do próximo. Devemos agir lealmente e o amor
da mediocridade porque nos recusamos nos deixar to- e pelo pretenso amor do próximo. Devemos agir leal-
mar e conduzir pelo Espírito Santo, pois é realme n- mente e o amor deve ser puro. Posso, pois, amar a
te por estes atnativo6 que Deus nos de.6pe.nta, no s mim mesmo e seria o amor de cobiça: existe, nos a-
e.xeita, nos impele. à6 6anta6 vintude.6, ao amor ce- fi rma nosso doutor, uma 6anta eobiç_a, não apenas r:er
leste, ãs boas ne6oluç_Õ e6, em 6uma, a tudo o qu e. no~ mi tida, mas necessária. Ao ficar isso bem claro,pos
e.neaminha pana no66o bem e.te.nno. Ê o que. o E6po6 o so e devo também amar meu pr6ximo querendo seu be~
ehama de. bate.n ã ponta (Ct. 5, 2) e 6al an ao eona - e, neste ato, não é o meu bem que eu quero, mas e de
ç_ão de. 6ua e.6po6a (Is. 40, 2), d e.6pe.ntâ -la quando e.la le. A hipocrisia do egoísmo seria buscar meu inte=
utã donmindo (Ct. 8, 5), ehamâ-la e ne.elamâ- la quan re sse no pretexto do amor do próximo. E da mesma for
do e.la utã au6e.nte. (Ct. 2, 10, 13), eonvidâ-la a ma para com Deus: Aman, poi6 a Ve.u6 e o pnôximo com
6eu mel e a eolhe.n maç_ã6 e 6lone6 em 6eu jandim (C~ am on de. can~dade. ... ê que.ne.n bem a Ve.u6 pana 6i me.6
5, 1; 6, 2) e a eantan e 6azen n e66oan 6ua doee. voz mo e ao pnôximo em Veu6 e pana o amon de. Ve.u6. Pode
a 6eu6 ouvido6 (Ct 2, 14). mo s querer a Deus duas espécies de bens: Aquele que
ele tem, pon complacência ne.gozijando-no6 com o qu e.
Vemos como desde 1609 o santo abre para Filo- ele ê ... e aquele. que. ele não tem, a saber, essa gló
téia os caminhos da mística: estas inspirações são ri a exterior que lhe prestam as criaturas: Se ama~
a parte de Deus; elas nos fazem caminhar entusias ti mo 6 ve.ndade,iname.nte. a Ve.u6, tnatamo6 de. naze.n-lhe. u
camente no caminho da caridade, esta virtude admi nã te. bem pon nÕ6 me6mo6, aplicando ã 6ua glônia todo
vel, explicava o bispo de Genebra a João Pedro ca= no 66o 6en e toda6 a6 no66a6 aç_Õu (Lc 1 ,46): este é
mus, que é me.ia e 6im ao me.6mo tempo, o eaminho e a o p uro amor divino.
6inalidade., e a via pana in a e.la me.6ma. E para a-
mar, o que temos de fazer? Não existe maion Mne.za ... Esta é a parte essencial da Intnoduç_ão, o obje
pana ehe.go.n a e.6te. amon 6 e.não aman, poi6 , eomo 6e a- tivo da vida de.vota: Filotéia, nao noi pon nenhum
pne.nde. a e.6tudan e.6tudan e.6tudando, a toean toea ndo, mo tivo de. inte.nu6e. que. Ve.u6 no6 cniou, poi6 nÔ6 lhe.
a danç_an, dançando ... a66im 6e apne.nde. a aman a Ve.u6 6om o6 ab6olutame.nte. inúte.,Ü; 6oi unicamente. pana no6
e o pnôximo amando-06. E aque.le.6 que. aJotam um ou- óa ze.n bem, em no6 6acultando, com 6ua gnaç_a, panti-
tno método 6e enganam. Mas ele acrescentava: O me.ia ei pan de. 6Ua glônia; e, noi pon i660, Filotêia, que.
ee.nto pana aman a Ve.u6 ê amá-lo eada vez mai6: bu6- el e te deu tudo o que. te.n6: o entendimento, pana o
ea 6e.mpne. 6Ua naee., dizia Vavi, e 6ê eon6tante. ne.6- co nhecene6 e adonane.6; a me.mônia, pana te. le.mbnane.6
6a bu6ea (Camus, I, 2o, 30). de le.; a vontade., pana o amane.6; a imaginação panate.
11..epne.he.ntane.6 06 6eu6 be.ne.áicio6; 06 olho6, pana ad-
E o curioso bispo de Bellay insistia: mas, af! minane.6 a6 6ua6 obna6; a l~ngua,pana o louvane.6 (V.
nal, o que é esse amor? E Francisco, sorridente, res D. I, 10). A arte de viver em graça consiste, pois,
pondia: O amon ~ a pnime.ina paixão de. no660 ap e.titI em elevar todas as nossas potências até a glória de
6en6itivo e a pnime.ina a6e.iç_ão do naeional, que. e De us,para que seu explendor apareça em nossos cora-
no66a vontade.; tanto a66im que. a vontade. outna eoi- çõe s,e por eles em seu Cristo e em sua Igreja. Oca
6a não ê 6e.não o amon do bem, e o amon ê que.ne.n o min ho do amor leva,assim,ao devotamento a Deus, ao
bem. Eis, portanto, o problema: é preciso, primei ra engajamento por Deus. t, ao mesmo tempo, o princí-
mente, subordinar a paixão â ane.iç_ão, e isto não e pio e o fim da vida de.vota, inscritos na pnote.6taç_ão
fácil; é então que a graça nos é tão necessária. É autêntica: E conve.nte.ndo-me. a meu Ve.u6 .. . , eu de6e-
preciso em seguida, tomar cuidado com os artifíci os
jo, pll.oponho, deiibe11.o e me 11.e-0oivo i11.11.evogaveiment e A VISITAÇÃO E OS POBRES
a -0e11.vi-io e amáio ago11.a e ete11.namente, con-0ag11.an -
do-me a ele pa11.a e-0t e nim, dedicando e con-0ag11.and o
meu upI11.ito com toda-0 a-0 -0ua-0 nacuidade-0, minha al - o amor de Deus e o amor de nos mesmos e do pr~
ma com toda-0 a-0 -0ua-0 pot~ncia-0, o meu co11.ação c om ximo são apenas um amor que tem um Único motivo, que
todo-0 0-0 -0eu.-0 aneto-0, O meu coll.pO com todo-0 0-0 -0eu.-0 é a bondade divina ou em Deus ou em nós. Francisco
-0entido-0 (V. D. I, 20). de Sales, realmente, amava Deus nos homens e os ho-
Poucos cristãos se comprometem assim com Deus ; me ns em Deus: é o que lhe tornava todos igualmente
consentimos em nos comprometer com a ação pall.a Ve uh, queridos, uns por serem de Deus, os outros porque
mas não com o próprio Deus: é muito monopolizador , poderiam vir a sê-lo. Disto nascia seu incrivel ze-
demasiadamente "alienante", mas quando o amor do ho lo em ajudar todos os seus irmãos, seja para encon-
mem corresponde assim ao amor de Deus, a amizade c ~ tr ar Deus, seja para progredir em seu amor. Ele lhes
leste nasce e vive. A caridade, em seu sentido ple= quer ia primeiramente esse bem divino, o único está-
no, e, com efeito, uma amizade e não um amofl. int e- vel, o único eterno, o único absoluto; ele lhes de-
11.Uhado, po11.que pela ca11.idade amamo-0 a Veu-0 poll. amo11. sej ava também todos os outros bens necessários ou
dele mehmo ... Sim, e-0ta amizade e uma ve11.dadei11.a a - útei s à nossa vida neste mundo. Havia discutido com
mizade, po11.que e 11.ecip11.oca, poi-0 Veu-0 amou ete11.n a - Beze sobre a necessidade das obras: não defendia a-
mente todo aquele que o tem amado, o ama ou am a11.ã pe nas um dogma, defendia uma prática de vida, os
tempo11.aimente . .. e, ne-0~a amizade, ehtamoh em pell. p~ co stumes cristãos.
tt1.a comunicação com ele, poi-0 não cu-0a de 6ala11. ao-Z
no-0-00-0 co11.açÕe-0 peiah in-0pi11.açoe-0, at11.ativo-0 e mov i Foi ainda Madre Chantal quem melhor o viu nes-
mento-0 -0a911.ado-0 . ... E quanto a nÔh, -0emp11.e que no";.; ses exercicio da santa caridade: "Ele não se poupa-
ap11.az podemo-0 a ~oda-0 a-0 ho11.a-0 p11.ocu.11.a11. a -0ua amá- va em nada para isso; abundava de dileção, poi-0 noi
vel companhia pela 011.ação (Tratado, I I, 22). Vemos, do ag11.ado de Veuh to11.na11. a-0-0im meu cofl.ação, dizia
po i s, que o fim da Vida devota e o principio do Til.a ele ; eu que11.o amafl. ~an~o e-0-0e pob11.e p11.Ôximo, eu o
tado estão de acordo e se identificam. Filotéia dá a qu e11.o amafl. tanto; pa11.ece-me, ent11.etanto, que nao a-
mao a Teótimo. mo de nof[.ma alguma -0enão a Veu-0, e todah a-0 ai ma-0 pa
11.a Veu-0, e que o que não i Veu-0 ou pa11.a Veu-0 não ~
Ora, n ã o se pode dizer o preço desse amor: é nada pall.a mim. Ele via o próximo no peito sagradodo
ele q ue constitui o va l or de nossos ato~. A carida- Salvador. Oh! quem O olha nofl.a daI, C0'1.'1.e O pell.igo
d e pode, pois, embe l ezar aos olhos de Deus a vida de não o amafl. nem pu.11.a, nem con-0tante, nem igualmen-
mais humilde e aparentemente - a mais rústica, a mais te. Ma-0 aI, quem não o ama11.ia?" (Chantal, II, 126-
corriqueira: Não ~ pela 911.andeza de no-0-0a-0 acõeh, e~ 127 ). t à luz destes principias que devemos consi-
sinava São Francisco de Sales, que ag11.adamoh a VeM . . . der ar sua vida amorosa e, sobretudo, a imcomparãvel
ma-0 pelo amofl. com que a-0 nazemu-0; é o amor que con- di leção que teve para com a própria santa: nada de
fere a pe11.6eicão e o uaio11. ~-0 no-0-0ah ob11.a-0. Parado- ma is terno, nada de mais forte e nada de mais puro.
xalmente, ele acrescentava - mas aqui o paradoxo s ~ De onde, também, a contãncia e a igualdade de- sua
lienta a idéia: Vigo-vo-0 muito maih: -0e uma peh -0oa car idade: ele testemunhava tanta afeição respeito-
-00611.e o ma11.tZ11.io poll. Veu-0 com pouco amofl., eia me11.e - sa e delicada para com a mais nobre senhora do mun-
ce muito, poih não pode11.Zamo-0 da11. mai-0 do qu e a vi- do. Em Paris, em 1609, fez uma princesa da corte es
da; ma-0 he ou.til.a pe-0-0oa 11.ecebe11. apenah um cutu cão Perá-lo aproximadamente meia hora enquanto escutava
com um pouco mai-0 de amofl., te11.a muito ma~-0 me11. e ci - uma pobrezinha: admirou-se muito esse amor ... e es-
mento, po11.que a ca11.idade e o amofl. e que dão vaiofl. a sa coragem! Reprovavam-lhe a perda de seu tempo com
tudo (VI, 429 ) . Foi o segredo da san t idade de pequ~ ess as humildes mulheres do povo; respondia que a-0
nez que constituiu a glória de uma Teresa de Lisieux,
eoneha-0 enam tão pneeio-0a-0 pana ele quanto a-0 peno- buído aos seus pobres urna renda de seu castelão;
la-0 da-0 nobne-0 -0enhona-0. recebeu urna memorável repreensão e o pobre santo bis-
po ficou todo contrito, porque o ecônomo o acusava
de tirar as coisas de casa para alimentar os seus
Esse amor era tão efetivo quanto afetivo: ele pobres. Esta caridade esteve na origem da Vi-0itacão.
visitava pessoalmente os pobres e os doentes, dava-
lhes tudo, mesmo o que não tinha, que tornava ernpres Nao apenas lamentava-se por causa da decadên-
tado; despojava-se, por eles, de suas roupas; tinha cia dos mosteiros, mas também tinha pena das rnulhe
urna lista de seus pobres e fez amizades a fim de que res humildes e pobres, viúvas ou solteiras, enfer=
o ajudassem a socorrê-los; amava os prisioneiros e mas, corcundas, caolhas, raquíticas, que desejavam
levava-lhes gulodices; hospedava os religiosos e os consagrar-se a Deus e não podiam 6azê-lo 6aeilmente
padres pobres que vinham à cidade em diversas oca- n o mundo. Para elas, concebeu o plano de urna cornun!
siões; tinha extrema preocupação para que essas pes dade sem votos solenes em que, sob urna regra branda,
soas fossem "bem tratadas e servidas honrosamente~ ele as conduziria à perfeição do amor. Quis, primei
vendia suas jóias para dar dinheiro aos indigentes; te rarnente, urna escolha de pura e perfeita caridade
ve até um grande aborrecimento com seu ecônomo Disse um dia à Madre Chantal, mas "com um sentimen-
Rolland por ter, em sua ausência, recebido e distri to completamente extraordinário'': -0e uma pe-0-0oa lei
gam e pengunta-0-0e o meio de aleancan -0ua -0alvacao~
eu lhe ne-0pondenia: Hâ-0 de aleancã-la in6alivelmen-
te -0 e o b-0 ,:nvanu 0-0 mandamento-0 de Veu-0. Ma-0 a uma
neligio-0a eu dinia: Se Sone-0 eompletamente de Veu-0
-0em meia medida-0. O nei -0obenano quen tudo ou nada,
ele quen tudo pana neinan ou ab-0olutamente nada (Chan
t a 1 I I , 211 ) .

O absoluto do amor, tal é, pois, sua finalida-


de na Visitação. Mas o amor tem dois braços: um a-
braça Deus, o outro o próximo; estes dois braços
e le os quer simul t aneamente para suas filhas. A vi-
• si ta aos pobres e aos doentes não é, pois, urna "prá
ti ca acessória" da Visitação prirni tiva, corno se pre
te ndeu; ela é, pelo contrário, um desses doi-0 pnin~
eipai-0 exeneieio-0 dessa congregação em seu primeiro
projeto (XXV, 214). Quando, por altas razões, o san
to fundador concordou com a clausura exigida J:X)r MoE_
se nhor de Marquernont, ele manterá firmemente seu
p rincípio: se as visitandinas não podem exercer a
c aridade com o próximo fora de sua casa, elas a e-
x ercerão dentro para com 0-0 pobne-0 de alma, rec~be~
Joana Francisca de do entre elas as mulheres que, no mundo, pnee~~::
Chantal (1572-1641). de um poueo de netino, ou p~na_-0e con-0~~an , 0 iu ;;4 a
Fundadora da Ordem -0e pnepanan pana 6azen con6~-0-0oe-0 g~na~~ 'ae sales
da Visitação de Sta. connigin -0ua vida (XXV, 220) • Franci7rcmºa-s de carida
Maria. concebeu, pois a primeira i. d eia
-· das i -
e das casas de retiro: este ponto é essencial.
O novo interesse de sua fundação é que a vida Longe de extinguir o espírito de oração, o ser
igiosa pode ser perfeita sem votos solenes, sem viço ao pobres, a contrário, o animou. A Madre
.usura absoluta, sem macerações extenuantes, pela de
Chaugy é uma boa testemunha disso. o cuidado de Ma-
.tica dos recursos da caridade total. A vida con~
tplativa, longe de ser alterada por um sábio exer
iio do amor ao próximo, deve, pelo contrário, lu=
tr com isso: normalmente, o amor ao próximo deve
.varo amor a Deus e fornecer-lhe todo seu realis
A experiência confirmou essas perspectivas.

As primeiras visitandinas, numa ordem bem regu-


ia, davam assistência aos doentes de Annecy, so-
::!tudo às mulheres, "não somente com consolo, mas
nbém com tudo de que necessitavam, "com víveres,
1pas, cobertores, travesseiros". A desgraça delas
i horrível. Essas mulheres se encontravam "em po-
=Za, miséria e sujeira extremas, cheias de para-
tas e com tão maus odores" que apenas um pouco de
Jr não era suficiente para dar assistência a elas.
via algumas "cheias de Úlceras" em quen elas fa-
am curativos, outras "repletas de piolhos" que e-
s "tosavam". Suas delicadas mão aliviavam os cor-
s doloroso, os limpavam, mudavam suas roupas, fa
am suas camas, davam palha às que estavam dieta=
s no chão duro. Este primeiro esboço de irmã de
ridade foi Francisco de Sales quem fina e firme-
nte desenhou.

Tais cuidados seriam prejudiciais à de v oção?


lo contrário. O ardor das visitandinas se renova-
' se inflamava. Essa "pobre boa gente" retribuía
n "amor e reconhecimento" e dava às suas visitado
s '"grandes lições": "Estávamos simplesmente mara=
lha-das, escrevia a Madre de Chantal, com as virtu
S qu•2 praticavam em suas misérias 11 ; 11 só se ouviam
lavra~s de bênçãos"; "seus exemplos eram de grande
oveito para nós e nos animavam mais do que pode-
amos di~er ao amor de Nosso Senhor, a sofrer e a
zer tudo o que lhe agradasse". Isto quanto à irra
ação inter.·ior. A Madre acrescentava: "Este exer=
cio de caridade proporcionou grande edificação e
tis fação à c:ci,dade I que admirava as virtudes des-
s queridas alnn.as" (XXV, 231, n. 1; 338, n. 2). Entrada de Joana de Chantal na Ordem da Visita-
ção de S a n t a Mar i a .
ire de Chantal, escreve ela, era "fundamentar bem O LIMIAR MÍSTICO
suas filhas na verdadeira vida interior e do espiri
to, para a qual todas tinham muito atrativo, de mo= Foi no dia 6 de junho de 1610 que Madre Chan-
jo que só buscassem mortificações, recolhimento, si tal, com "suas duas queridas primeiras filhas", Joa
lêncio e retiro em Deus, cuja imensa bondade grati= na Carlota de Bréchard e Jacqueline Favre, tomoupo~
ficava essas preciosas almas com favores sobrenatu- se da pequena casa da Galeria que Jacqueline Coste,
rais" (Chaugy, 166). a santa serva, havia preparado com todo cuidado. "A
proximadamente a sete ou oito horas da noite" elas
O espírito de São Francisco de Sales e sua ar- foram "ao encontro do Esposo e às santas núpcias d.e
te de conduzir as almas para Deus aparecem melhordo seu banquete evangélico", "com suas vestes nupciais
1ue nunca em sua fundação. Conhecemos seu principio: e as lâmpadas ardentes nas mãos" ( Chaugy, 137-1 38) .
~ preciso disciplinar o coração e não o corpo.Se en Em poucas semanas juntaram-se sete noviças a este
:hermos o burro de aveia, ele dará coices. O apeti= grupo, mulheres "de compleição muito pequena e en-
te imoderado dos prazeres impuros vem do coração: fermas" , com exceção de duas. O povo murmurou: O bis
toda regra visitandina tende, pois, a essa mortifi- pode Genebra está fundando um hospital. Mas ele res
:ação do coração em vista de um perfeito desabro- pondeu: O que quenem? Eu .óou pantidánio do.ó en6en~
:har da caridade. Ele sabe que nossas paixões têm mo.ó.
inícios fracos, e que é fácil extingui-los antes que
inflamem os desejos impuros: tudo é concebido na re Às suas filhas, três vezes por semana, quando
Jra para mortificar essas pequenas raízes da concu= pode, ensina os segredos do amor divino. Pedagogia
?iscência. O rigor, a força e a dureza de seu méto- luminosa, sorridente, fina e firme. Pedagogia dire-
io, poderíamos dizer, está em tudo que ele exige: ta que continua em diálogo e se traduz imediatamen-
=Xige uma pontualidade perfeita nos mínimos deta- te em ação. É uma incessante troca de pensamentos,
lhes; o tudo do amor depende do tudo dessa mortifi- avalanches de perguntas, uma efusão calma das res-
~ação do sentido próprio. Este trabalho nunca chega postas, cenas de um encanto todo franciscano.Na pri-
10 fim; por isso, para bem realizá-lo é preciso pra mavera vão para o jardim sob o parreiral: ai, as ir
ticá-lo com mansidão, pacientemente, pa.6.60 a pa.6.60~ mãs sentadas no chão em volta de seu Pai, defronte
aouc.o a pouc.o, sem se enervar, humildemente. Ele quer, do lago azul, sob o céu límpido, entre os cantos de
JOr outro lado, uma humildade magnânima que, não con passarinhos, o Evangelho renasce. O Evangelho eter-
tando consigo mesmo, apóia-se em Deus e pode tudo o no, com a beatitude· das lágrimas, pois Sua Excelên-
1ue Deus exige. Por esse motivo, quer que suas fi- cia é horrivelmente caluniado por uma insolente ju-
lhas ofereçam ao Senhor .óua alma · e .óeu c.onpo e o u- ventude que ele quer fazer voltar ao bom comporta-
~o de .óeu.6 ben.6, a 6,im de que tudo .óeja empnegado em mento; uma manhã, para espanto das boas devotas, o
~ua honna. Elas recitam num e.anta devoto o pequeno caminho do bispado até o convento estava injuriosa-
)ficio de Nossa Senhora e fazem duas horas de ora- mente "juncado". Mas a luz bnilha na.ó tneva.6. Can es
;ão; quanto ao resto, uma di.óc.iplina de tnabalho im sa luz o Senhor inunda a alma de seu servo: seus en
)Õe- lhes .óilênc.io, o b ediênc.ia, humildade du poja-: sinamentos, diz a Madre de Chantal, eram "conformes
nento extnemamente e.ótnito de pnopniedade, ainda que aos pensamentos que Deus lhe havia inspirado muitos
~m mo.óteino do mundo (XIV, 329-330). Por sua vez, anos antes" (Chantal, II, 210). O céu abençoou essa
3eu Pai não lhes impõe outra sujeição além da .óuave pequena terra e, dezessete anos após a fundação, a
,iolê_nc.ia do amon. Madre de Chantal poderá contar vinte e oito mostei-
ros, na Sabóia, na França, em Lorraine. Foi desteco
mércio espiritual que surgiu o Tnqtado do amon de
Deu.ó .
e os segredos da mistica, mas sempre como homem de
grande bom senso, sabedor das verdadeiras necessid~
des das almas que dirige, certamente como psicólogo,
mas também como teólogo.

Nega ser um inovador e esgota todas as fontes


da tradição cristã: a Biblia, interpretada pelos mo
dernos, Genebrard, Ribera, Tolet, Maldonado; os pa=
d res gregos, Basilio, Gregório, Nazianzeno, Grego-
rio de Nysse, João Crisóstomo, Dionisio, João Damas
ce no; entre os latinos, Ambrósio, sobretudo AgostI
nho, o mais freqüentemente citado (75 vezes), Jerô=
n imo e os doutores medievais, Bernardo, Tomás de A-
q ui no, Boaventura; muitos modernos, mas citados ape
n as uma ou duas vezes. A fonte principal é, incompa
r avelmente, a Sagrada Escritura e, nela, São Paulo
é citado 240 vezes! Francisco de Sales é paulino.
Será preciso acrescentar que ele é principalmente
"salesiano", pois tudo o que toma emprestado ele as
simila, tr;msforma em substância e lhe confere um cu
nho tão pe3soal que se torna bem dificil, e talvez
ar riscado, dizer quais as flores das quais extraiu
o seu mel, com exceção das citações explícitas.

À Escritura, à tradição e aos modernos é preci


A casa da Galeria, onde teve início a Ordem da so acrescentar a experiência: a experiência dos san
Visitação, em 1610.
t o s, sua experiência pessoal, a experiência das al=
ma s que dirige, a experiência, sobretudo, de suas
vis itandinas, pois o Espírito sopra fortemente nes-
A partir de 1607, Sua Excelência escr~ve, se- se pequeno convento.da Galeria. "Pela graça divina,
gundo suas palavras, a vida adminãvet de uma lanta, diz- nos a Madre de Chaugy, várias obtiveram em pou-
a santa caridade: ê, confessa ele à Madre de Chan- co tempo orações de quietude, de sono amoroso, de
tal, 'pana me di-0tnain e pana 6ian tão bem quanto tu un ião muito elevada; outras, luzes extraordinárias
meu 6u-00. Em 1610, ele tenta escrevê-la em -0eu cana do s mistérios divinos, em que ficavam santamente ab
cão tanto como o faz no papei. Sempre que pode, re= s ortas. Outras ainda, freqüentes êxtases e santos
serva 15 minutos entre suas obrigações e termina sua d espojamentos de si, a fim de ficarem todas, feli-
obra em 1616. Ele nos declarou sua intenção ao es- zes, detidas e tomadas por Deus" (Chaugy, 166) Foi
crevê-la: apne-0entan -0impte-0 e ingenuamente, -0em an p reciso pedir ao Senhor para pôr um limite a esses
te e mai-0 ainda -0em maquilagem, a hi-0tónia do na-0cI dons e fechar um pouco sua mão, pois esses exalta-
menta, do pnogne-0-00, da decadência, da-0 ppenacõe-0~ mentos "davam na vista". Os fundadores pediram, pois,
pnopniedade-0, vantagen-0 e excetência-0 do amon divi- p ara suas filhas, "um grande dom de vida interior,
no. Tais são os assuntos que consituem a matéria dos oculta e sofredora amorosamente com Jesus Cristo na
doze livros , escritos para as a l mas adiantada-0; ne- c ruz" (L. c. 167). E o santo submeteu esses fervo-
les aborda 0-0 -0entimento-0 mai6 deticado-0 da ditecão res à sábia análise de sua ciência e de sua crítica.
Foi assim que surgiu sua obra-prima, o T~at ado d o a IV, O D I N A M I S MO D O A MO R
mo ~ de Deu~: o limiar místico tinha sido transporto.

A ALMA E O AMOR

O dogma fundamental, de um ponto de vista exis


tên cial, é o da imortalidade ~ob~enatu~al da alma~
Se a razão pode provar sua imortalidade natu~al por
suas funções imateriais, nada pode dizer de válido
sobre o conteúdo dessa imortalidade. É pela encarna
ção d o Verbo e pela predestinação que Deus cria um
mundo novo e funda no Cristo um unive~~o e~pi~itual,
no qua l entramos pela fé: ai somos tornados por urna
energia divina que nos ''transfere", diz São Tomás,
para além dos limites de nossa natureza até a vida
ete rna: é o Reino dos céus revelado por Jesus Cris-
São F r a n cisco d e Sales to. A energia de translação, a graça, faz-nos pas-
sar, corno o Senhor, deste mundo para nosso Pai, e o
amor é a forma decisiva que torna em nós essa ener-
gia. O amor é, pois, a alavanca da alma que trans-
cende o espaço, o tempo e a morte. Todo o T~atado
do amo~ divino tem por finalidade descrever-nos es-
sa pa ssagem, essa ascensão pascal da alma em Deus.

A mística salesiana reveste-se pois, por este


motivo, de um caráter dinâmico de elevação espiri-
tual para a vida eterna. Ela supõe urna ontologia da
graça , mas a considera em ação na alma santificada
e dai deriva também seu carãter psicológico; mas,
para compreender bem essa psicologia, jamais deve-
mo~ perder de vista sua ontologia básica: age~e ~e-
qu~tu~ e~~e, ação está em função do ser; Francisco
de Sales não s e esque c e de ss e p rincip i o e, espanta-
neamente, nos diz o que ê a alma: sede, princípio te s e integrar, no cristão, na sabedoria da fé; , a
e teatro do Amor. ver dade é uma só e não pode se contradizer, e todas
as verdades da razão ou da reve lação devem servirao
Temos apenas uma alma indivisível, mas com di- di namismo do amor divino.
versos graus de perfeição, poil ela ê viva, lenlZ-
vel e naeional. A zona inferior é o domínio do in- Nosso doutor, nesta análise, acentua, com efei
consciente. A zona sensível é o domínio do apetite to, a importância da luz intelectual: a vontade lhe
lenlitivo e ai, pelo eonheeimento lenlitivo das coi ap arece como uma potência móvel sob a influênciades
sas concretas, somos levados a buscá-las ou delas sa l uz. Cada grau de razão, ao fornecer uma luz pro
fugir. Deste apetite nasce o amor lenlual: elle ape pri a, determina movimentos afetivos de mesmo grau~
tite bnutal não meneee o nome de amon; é por sua bus 0 p apel da consciência superior é harmonizar todos
ca deliberada e preferencial que o homem se anima= os movimentos da alma: seus desejos ou suas repul-
liza. Apenas a zona superior é o domínio da razão e sas ou suas buscas ou suas fugas.
da vontade: ela merece, por excelência, o nome de
alma; é ela que comumente se designa por essa pala- Um ponto essencial dessa dinâmica é a duplaten
vra. são de que a vontade padece: na base para os bens
l enllveil, no ápice para os bens espirituais e, fi-
Essa alma racional, por sua vez, se divide em nalmente, para Deus. Na alma una, essa dupla tensão
dual pantu: a inferior e a superior. A inferior d~ cri a a divisão do coração e seu dilaceramento. O a-
eonne e tina lual eonleqUêneial de acordo com o que amor , assim, pode ser duplo: o amor sensual e o a-
aprende e experimenta pelos sentidos. A razão, nes- mor r acional ou espiritual. E esses dois amores, fre
te grau, filtra, racionaliza, humaniza os dados dos qüen t e mente, se chocam: eles nos revelam, assim nos
sentidos: é o p~imeino gnau de nazão, o bom senso sa na ture za móvel e ferida e seu caráter fundamen=
que nos orienta em nossas atividades cotidianas. A tal, a insatisfação, a inquietação.
pante lupenion, a que comumente chamamos de elpZni-
to, dileonne e tina lual eonleqUêneial legundo o eo
nheeimento inteleetual, que não elta 6undamentado na O DUPL O ÊXTASE E SUA DUPLA ATRAÇÃO
experiência simples e direta dol lentidol, mas no
din~ennim0nto e no julgamento do elpZnito. Ora, es- A natureza humana, com efeito, é extâtiea. oêx
ta parte superior, por sua vez, compreende três graus tale é considerado por nosso autor em seu sentido e
de razão, um segundo a luz natural do intelecto, os timoló gico: é a laZda de li. Como o homem não é ser
dois outros segundo a luz sobrenatural da revelação. perfe i to, não pode contentar-se consigo mesmo, como
Cada grau tem suas linhas de força, seu plano pró- já constatamos com Santo Agostinho: ele quer pois
prio de atividade: a luz natural dá ciência, a filo se u l t rapassar, sair de si, ser arrebatado. Tem, pa
sofia, as artes, a ética, em uma palavra, o humanis ra e ss e ultrapassamento, duas saídas: uma por baixo,
mo; a luz sobrenatural dá a teologia, a contempla= a outra por cima. De onde dois extalel. A descrição
ção, a mística. Como a alma é una, e como a razão e desses dois êxtases e essencial para compreender o
a vontade também o são, essas diversas atividades po sale s ianismo.
dem e devem se harmonizar para dar ao homem sua ple
nitude, a fim de formar o homem total. Francisco de _ Ol anti~ol 6ilolo6ol neeonheeiam que havia duM
Sales viu muito bem a complexidade e, ao mesmo tem- elp eeiel de extale: um que nol elevava, outno que
po, a unidade fundamental da vida humana; propõe, as no l depneeiava; eomo le quilellem dizen que o homem
sim, o princípio da integração do humanismo: todas ena duma natuneza média entne ol anjol e ol animail,
as aquisições naturais do espírito devem finalmen- pantieipando da natuneza angêliea na lua pante inte
lec.tual e da natuJteza animal na lua paJtte lenliti- qualqu eJt obJteiJto in6inito que impJtimiu em mim elte
va. int eJtminavel duejo de labeJt e amaJt; im poJtta po~ que
eu me enc.aminhe e me diJtija paJta ele, paJta me uniJt
O homem, todavia, poJt um c.ontZnuo exeJtc.Zc.io e e ligaJt ã lua bondade". Tal e a c.onveniênc.ia que te
c.uidado lobJte li melmo, pode lubtJtaiJt-le e delalo- mo l e. o m V e Ul ( T. I , 1 5 ) .
jan-le della média c.ondicão; aplic.ando-le aol atol
intelec.tuail, tonna-le mail lemelhante aol anjol do Se o homem tende ele diJtige para Deus pores-
que o não ena aol animail; e entnegando-le ãl açÕe6 se desejo natural, ele o encon tra e o reconhece:
lenluail, dele.e de lua média c.ondicão e apnoxima-le
da dol animail. Como o êxtale não ê outna c.oila le- 0Jta, ainda que o eltado da natuJteza humana não
não a lalda que le 6az de li melmo, de qualquen la- leja agoJta dotado da peh6eicão oJtiginal . .. , c.ontudo
do que le laia, 6ic.a-le veJtdadeiJtamente em êxtale. a inc.linacão de amaJt a Veul c.onleJtvou-le em nÔl, e.o
Aquelel que movido~ pelo amoJt dol lentimentol no- mole c.onl ehv ou a luz da int eligênc.ia que nol diz
bnel ou de Veul deixam o leu c.onacão enlevaJt-le nel qu e Ele ê bom e amável lobJte todal al c.oulal. PoJt ~
tel a6etol, utão 6oJta de li melmol, entJtando num ii lo qu e , labendo pelal luzel natuJtail que Veul e tao
tado mail ~anta e elevado; lao igualmente anjol pe~ bom e tão digno de lefl amado, não hâ de lentiJt ~o
la openacão da lua alma, e.orno lão homenl pon lua na coJtação uma inc.linacão paJta aman quem e tão nollo a
tuneza, e devem len quali6ic.adol ou de anjol huma~ migo ? ( T. I , 1 6) .
nol ou de homenl angelic.ol. Ao c.ontnanio, ol que vi
vem engol6adol no lodaçal dol pnazeJtel lenluail deX A vontade prevenida! É o encontro da graça e o
e.em da lua média c.ondiçao a dol iJtnac.ionail, e meJte inicio do movimento espiritual para o perfeito amor.
e.em igualmente len c.hamadol animail poJt lual açÕel~
embona lejam homenl poJt natuneza: lão delgnacadol, EmboJta, pela limplel inc.linacão natuJtal não pM
ponque lÔ laem .6onam de li melmol pana e~Mem num lamol alc.ançaJt a 6elic.idade de amaJt a Veul, e.orno de
utado indigno da lua e.o ndicão (T. I, 1 O) . vem o6 , ê c.eJtto que., le tnabalhâllemol Melmente, Deu~
nol auxi liaJtia enol daJtia ol meiol de adiantaJtmol
Entre esses dois extremos, poderíamos conceber nelte amoJt; le c.oadjuvâllemol elte pJtimeiJto auxllio,
um meio termo: nem anjo, nem animal; mas a verdadei a pateJtnal bondade de Veul nol 6oJtnec.eJtia outJto au-
ra natureza do homem precisamente não o tolera quan xl,t; o maioJt, e vwl e.o nduziJtia de bem a melhoJt c.om to
do o homem está consciente de si próprio, •pois o a~ da a luavidade, atê ao lobeJtano amoJt a que nol impe
mon ê um ato de nolla vontade, cuja amplidão é tal le a nolla natuJtai, inc.linacão; poil ê c.eJtto que a
que somente o bem univeJtlal pod~ preenchª-la. Sua benignidad e divina não Jtec.ula nunc.a a lua alliltên-
tensão profunda é, pois, para o Absoluto, se não o c.ia aquele que~ 6iel nal c.aulal pequenal e 6az tu-
busca no sentido do Espírito, é tentada a procurá- do o que eltã em leu alc.anc.e (T. I, 18).
lo na matéria. Sua verdadeira tendªncia, no entanto,
é para Deus. A atração terrestre, no entanto, opõe-se a a-
tração celeste. O otimismo do santo não é ingªnuo;
A almw, c.onlideJtando que nada a c.ontenta poJt ele não ignora a força, o número e também a astúcia
c.ompleto, e que a lua c.apac.idade não pode leJt pJteen de nossas paixões; usa de ironia para com os estói-
c.hida poJt e.aula alguma que exilta no mundo vendo cos que pretendem se libertar completamente delas.
que o leu entendimento tende a labeJt lempJte mail, e
que a lua vontade ê inlac.iâvel de amoJt e de bem,tem _ Em luma, elte apetite lenlual ê na veJtdade um
Jtazão de exc.lamaJt: "Ah! não lou 6eita paJta elte mun ludito Jtebelde, ledic.iolo, inquieto; deve.mal c.on6u
do! Exilte qualqueJt bem lupJtemo de que dependo, e laJt que não podeJtemol nunc.a du 6azeJt-nol dele, de

Q('\
te, de maneina a que, não ataque, e, allalt e, a !Lazao. dita mulh e.lL que, o excitava à voluptuo◊idade, ( foi seu
Contudo, a vontade, e tão lupe.niofL que, le quile.lL, po próprio caso em_P_ádua), não mani6e.◊iO~ t~IL na ~anta
de aniquila-lo, de.tLtLuban Ol le.ul p!Loje.tol e, tLe,p e, li~ de. uma e.une.ma a6ucao de, duagnado, contha.JU,a a paixao áo
-lo, não conle.ntido nal lual luge.ltÕe.l . .. Ê gnan de, p1tazen que, ã 601tca, lhe. 6azia ◊e.ntifL? Quan:lM vezu tfteme-
loucuna 6ican indi6e.ne.nte. em calol e.xtnaondi nâni ol ! moh nÕh de. hUhto noh lugatLe.h pe!Ligohoh a que noh conduz a von
A Igne.ja condenou a loucuna que, ce.ntol anacone.tal tade.? Quan:lM vezu dete.◊tcunM M volup.tu0◊idadu em que. hi
p!Le.lunçolol quile.!Lam intnoduzin, e, contna ol quail comp1taz o apetite, -0e.n◊ual, quando amamoh oh be.n◊ upi!Lituaih
a tlctLituna, mal lobne.tudo o gnande, Apoltolo (Rrn que. lhu hão contfLMiM? Nihto con◊ihte. a luta que. he.ntimoh
7,23), clamam, dizendo que, te.mal uma lei em no l l ol to doh Oh diM e.ntne, o u pZILito e, a catLne. (T. I , 5) •
conpol que, !te.pugna a lei do no-0lo e.-0p~IL~to ... O qu e,
nÕl outtLol pe.cadotLe.l nao pode.mal 6aze.n, po!Lque, lo- Corno vemos, Francisco de Sales sabia muito bem
61Le.mol ellel movime.ntol de.l!Le.gnadol contna o nollo que era um homem como oh outtLoh; ele é nosso irmão
de.◊e.jo, e, com gnande, pne.juZzo do bom e,◊tado e, tnan- e n ão escreve para anjos! Mas a vontade pode domi-
qUilidade, da◊ no-0l a◊ alma◊ (T. I, 3)... Al potê.n- nar as paixões pelo poder do amor. O amor está nela
cial da pante. le.n◊itiva, que, ◊ão ou devem ◊eft M leh como a alma de sua força. Este amor radical é a p!Li
va◊ do e.◊pZnito, pedem, p!Locunam e, tomam o que, 6oZ me.ifLa complacência que, te.moh pelo bem. Ele precede
ne.culado pela nazão e, ◊em con-0e.ntime.nto de.la, e.mp e, o deleite, a esperança, o ódio, pois só nos alegra-
nham-le. em 6aze.tL a-0 ◊Ua◊ uniõe.-0 abje.ta-0 e, le.fLvifL◊,­ mos com aquilo que amamos, só esperamos aquilo que
de.◊onnando, como Gie.zi, a pu!Le.za da intenção de, leu amamos, só odiamos aquilo que se opõe ao bem que a-
amo, que, ê o e.◊plnito; e à medida que, a alma le. in- mamos. Des ' :a forma, a vontade só fica radicalmente
clina pana ta~-0 uniõe.◊ gfLO◊le.~!La◊ e ◊e.n◊uai◊, a6a◊­ afetada pelo amor do bem, que é seu primeiro móvel
ta-◊e, da união delicada, intelectual e condial (T. e s ua primeira afeição, mas a vontade pode fraque-
I, 10).
ja r, corromper-se: a vontade reta escolhe o amor
bom, o amor do verdadeiro bem; a vontade má, o amor
Nem por isso Francisco de Sales é dualista; não mau, o amor do falso bem. A origem de tudo encontra
admite uma bipolaridade real; o êxtase sensual é u- -se , pois, na liberdade que pode escolher entre o
ma tendência de regressão, uma decadência e um fra- bom e o mau amor. Esta convicção a~ha-se na base de
casso; a dinâmica rüal dirige-se para o Absoluto, qualquer esforço moral e espiritual. Embora a vonta
para Deus.
. de seja necessariamente amor, nunca é necessariamen
te amor bom ou amor mau: ela é que conduz o amofL. o
O PONTO CRÍTICO cri tério, aqui, depende da razão.

Ihto não ob◊ta a que. a vontade, po-0ha dominafL o


A vontade deve resolutamente optar entre essas amofL, tanto maih que, a vontade, hÕ ama quando que.lL a
duas atrações. Ela permanece livne e lobe.nana, se de matL, e, de, muitoh amo!Le.h que a e.la he. ap!Le.◊e.ntam, po
cididamente quiser se-lo. Na raiz das coisas, exige de, e.◊colhe.n o que, maih lhe, agnade.: doutna nonma nem
-se um esforço natural para garantir esse triunfo pode.nia have.lL amofL p!Loibido, nem amofL p!Le.ce.ituado. A
que a graça vai aperfeiçoar. Este combate, no entan vontade, domina pai◊ oh amo!Le.-0, como uma donzela do-
to, é duro e perigoso.
mina oh_p!Le.~e.nde.nte.h que, a ne.que.htam ... Outno tan-
to, panem nao lhe, ◊Uce.de, de.poih do cahame.nto, po!L-
Quanta~ veze-0 temo-0 nÕ-0 paixõe.-0 contnânia-0 ao-0 que, pende a hua libe.ndade., e, de. dominadona pahha a
a6e.to-0 que, -0e.ntimo-0 ao me.-0mo tempo na vontade,? Oman le.lL dominada pelo manido, nicando p!L e. 6a pon aquele.
cebo de que 6ala São Je.nônimo, contando a lZngua com me.lmo qu e. e.l a pne.nde.1ta. Do me.lmo modo, a vontade, que.
0-0 p!Lopnio-0 de.nte.-0, e, atinando-a à cana daquela mal e.lcolhe.u o amofL le.gundo o leu agnado, logo que o a-
aceitou, 6ica-lhe 6ujeita ... Há, pon~m, uma libenda
de na vontade que não 6e encontna na mulhen ca6ada;
e~ que a vontade pode nepelin o 6eu amon quando
quen aplicando o entendimento ã6 cau6a6 que podem
de6906tá-la, 6onmando a ne6olucão de mudan de obje-
to: ponque, pana 6azenmo6 viven e neinan o amon de
Deu6 em nÕ6 temo6 de de6tnuin o amon pnópnio; 6e o
não podemo6 aniquilan completamente, ~ pneci6o, ao
meno6, en6naquecê-lo, áe uonma que, 6e ele vive em
nÕ6, não neine; como tambem podemo6, ao contnãnio,
deixando o amon 6a9nado, aquie~cen ao da6 cniatuna6,
que i o in6ame adult~nio que o cele6te E6po6o tan-
ta6 vezu expnobna ao6 pecadone6 (T. I, 4).
Vemos que a aplicação do entendimento desempe
nha, neste debate, um papel essencial. -

O amor das criaturas aqui reprovado é evidente


mente o amor idolátrico que coloca seu fim último
neste mundo. Esta opção decisiva põe o hcmem, pois,
ou sob a atração divina, ou sob a atração terrestre:
a alma, assim, é orientada seja para o êxta6e e6pi-
nitual, seja para o êxta6e 6enbual.

A PREVENIENTE INSPIRAÇÃO DE DEUS

Eu te amei com um amon etenno, diz Deus à Vir-


gem de Israel (Jr 31 ,3). Francisco de Sales baseia-
-se neste texto para provar que essa eterna carida-
de moveu a divina Pnovidência a atnain-no6 a 6i; pon
que 6e o Pai no6 não tive66e c~amado, nunca no6 te~
ni'amo6 apnoximado do Filho no66o Salvadon, nem pon
con6eqfrência tenZamo6 podido alcancan 6alvacão (T.
II, 9) .

Deus nos atrai por sua in6pinacão. Ela nos e


mais do que nunca necessária no estado de queda em
que nos encontramos depois do drama do pecado. Nes- Francisco de Sales, padroeiro doses-
te estado, monnemo6 centamente, ma6 não duma monte critores católicos.
tão completa que no6 não 6ique algum movimento, e
com ele cento6 pequeno6 a6eto6 que no6 podem animan
a 6azen alguma6 tentativa6 de amon. Contudo, a no6-
6a 6naqueza ne6te ca6o ~ tão 9nande que jâ não pod~
mo,6 pon nÔ,6 me,émOj de,épnenden 0,6 Qonac5e,6 do pecado, A abertura à graça está em nosso poder, no sen-
nem netoman o vôo do amon divino. Com Santo Agosti tido de que podemos não lhe resistir, não pecar ao
nho, Francisco de Sales pensa que, pon Qento, mene~ recusá-la e, ao recebª-la, abrir-lhe mais ou menos
Qeniamo,6 ,éen abandonado pon um Veu,6 que tão de,éleat n osso coração.
mente o6endemo,6, mas sua caridade pTLOQuna netlnan~
-no,6 da de,égnaca, pon 6ua ,éantI,6,élma lnjplnacão, a Teôtlmo, ◊e apnoveltâ,6,éemo~ a,6 gnaça,6 dlvlna,6
qual, exQltando QOm doQe vlolênQla 0,6 Qonac5e,6 e e- Qomo em pouQo tempo 6aniamo◊ gnande,6 pnogne,6,é0,6 na
levando o,6 pen,éamento,6, impele o,6 n0,6,é0,6 a6eto,6 pa- ~antldade! Pon mal~ abundante que ~eja a 6onte, a~
~a a atmo,66ena do divino amon {T. II, 9). água~ não entnam no jandlm ~e.não ,ée,gundo a QapaQlda
de malon ou menon do ne~peQtlvo Qano. Também ainda
Nem todos, no entanto, sentem e,6,ée pnlmelno lm que o E~pinito Santo, QOmo uma 6onte de água viva,
pul,éo ou abalo que Deu,6 hã em no,6,60,6 Qonac5eJ a 6lm a 6lua pon todo◊ o~ lado~ ao nO◊,éO Qonacão, pana ·ne-
de lnQltâ-lo,6 ao bem: é porque nem todos vão até o le dennaman a ~ua gnaca, Qomo Ele não quen que ela
fim de si mesmos e, no estado de queda em que nos en e ntne em nô◊ ~enão pelo llvne QOn~entlmento da no~-
contrarnos, não fazem essas tentatlva,6 de amon de que ~a vontade, ~ô a de~namaná na medida da no~~ª pnÔ-
somos capazes. As preveniªncias do amor divino es- pnla dl~po~lcão e Qoopenacão, QOmo diz o SagnadoCon
tão condicionadas pelos esforços possíveis de nossa QZllo, o qual Qhama a neQepcão dela de neQepcão vo~
boa vontade. Somos responsáveis diante da graça que luntánla (T. II, 11).
nos predispõe e que nos é oferecida. Sob sua própria
O drama de nossa eternidade se desenrola, pois,
inspiração permanecemos livres e a repelimos mul-
to,6 v eze,6 e neQu,6 amo,6 aman a Veu,6 (T. II, 1 O) . Nes- no segredo de nosso coração, e não em outra parte:
te sentido, São Paulo no,6 exonta a não neQebenmo,6 a De us exige de nós um comprometimento pessoal. A ca-
gnaca de Deu,6 em vão (2 Cor 6, 1). Mistério do cora- d a um, São Francisco de Sales repete o que Santo A-
ção humano! Recusa da graça, recusa de cooperar com g ostinho dizia a Lúcifer:
a graça: de nossa parte, o problema da salvação re-
duz-se a esse ponto. A abertura de nosso coração con A gnaca não te 6altou, tu a tive~te ex.Qelente QO
diciona em nós a efusão da graça. mo exQe,lente entne toda~ 6oi a tua natuneza, ma~6a1
t a~te ã. gnaca; Deu~ não te havia pnlvado da ação áo
Qual ,6 enã pai✓~ a nazão pon que não ~tamo,6 tão ~eu amon, ma◊ pnlva~te o ~eu amon da tua Qoopenacão;
adlantado,6 no amon de Deu,6 QOmo um Santo 'Ago◊tlnho, Deu~ não te tenia nunQa nepelldo, ~e tu não tlve,6-
um São FnanQl,éQO de A,é◊l,6, uma Santa Catanlna de Gê ~ ~~ nepetido a ◊Ua dileção. u Deu~, ~umamente bom,
nova, ou uma Santa FnanQl,éQa R~mana? Ah! Teõtlmo, i vo~ nunQa abandonai~ ,ée,não o~ que vo~ abandonam; e
ponque Deu◊ no,6 não 6az uta gnaça. MM ponque ê, que jamai,6 no~ ~ubtnal◊ O◊ vo~~o~ don~, ~e.não quando o~
Deu,6 no,6 não 6az e,éta gnaca? E ponque nao Qonne◊pon e..xpul◊amo~ de nO,é◊O~ Qonac5e~ (T. II, 1 O).
demo,6, Qomo deviamo,6, cü ◊Ua◊ ln,éplnac5e,6. E ponque,
não Q044e,épondemo◊? Ponque, ,éendo nõ◊ llvne,6, abu◊a
mo,6 de◊te modo da no,6,éa llbendade. Ma,6 pon que abu~ O PECADOR E A GRAÇA
,éamo,6 da n0,6,éa llbendade? Teôtlmo, não ê ml,éten ln
mal◊ longe, pol,6, ~amo diz Santo Ago,étlnho, a depna
Devemos, pois, insistir nesse comprometimento pes
vação da vontade não p'Lovêrr: de nenhuma QaU◊a, mM áa soa l básico: nossa liberdade permanece completa; de
6naqueza da Qau,éa que pnoduz o peQado. E não deve- nossa escolha depende nossa salvação. O Todo-Pod~-
mo,6 pen,éan que ~e p0,6,éa dan nazão da 6alta que ◊e
r oso não nos arrasta corno escravos acorrentados~ nos
atnl~ui ao peQado, ponque a 6alta não ~e4ia peQado, podemos nos deixar prender por seus atnatlvo~ ou nos
,ée, nao nO,é◊e QOmetldo ,éem nazão {T. II. 11). libertar deles.
Quai6 6ão 06 atnativo6 ondinãnio6 com que Já que estes vinculo6 de humanidade são tão
a divina Pnovidência co6tuma anna6tan 06 no66o6
conaçÕe6 pana o 6eu amon? São aquele6 que ela suaves, tão pnoponcion~do~ e conveniente6, já
me6ma indica, de6cnevendo 06 meio6 de que u6ou que correspondem tão bem ã no s sa inclinação na-
pana annancan o povo de I6nael do Egito... Eu tural de amar a meus acima de todas as coisas,
06 atnainei, diz pela boca do pno 6 eta 06ÚM, com como é possível o pecado?
06 laço6 de humanidade, com laço6 de canidade
(Os 11,4) ... Sem dúvida, Teõtimo, nÕ6 não 6omo6 E6ta dt6gnaça de deixan a Veu6 pela cnia-
atnaido6 a Veu6 com cadeia6 de 6enno, como 6uce tuna dá-6 e do 6 eguinte modo: NÕJ.i amamo6 a Veu6
de com 06 boi6 e 06 bú6alo6, ma6 pon meio de do com intenmitência6, ~onque ne6ta vida montal a
ce6 a6ago6, de a6etuo6o6 impul6o6 e de tanta~ canidade ex.i,ste em nÕ6 6Õ ã maneina de. hâbéto, de
in6pinaçÕe6, que, em 6uma, 6ão 06 laco6 de Adão que u6amo6 quando 1106 apna.z, n,a,s nunca covivta von
e da humanidade; i6to ê, pnoponcionada6 e ade- tade.
quada6 ao conação humano a quem a libendade ê Quando, ~oiJ.,, não empnegamo6 o no66o e6pI
natunal . .. Vede como o Padne Etenno no6 chama:
lança no6 no66o6 conaçÕe6 delicia6 e pnazene6 n,i..to no6 exencicioh do amon de Veu6, antu o di~
e6pinituai6, como 6agnado6 engodo6, com que no6 tnaI6m o6 em outna6 ocupaçÕe6, ou vivemo6 ocio-
atnai 6 uavmente a neceben e a pnovan a doçuna da 606 e negligente6, então podemo6 6acilmente in-
da 6ua doutnina. clinah-nof., pana qualqu~n objeto mau e 6en 6un-
pneendido6 pon alguma tentação.
Ve6ta 6onma, canI66imo Teõtimo, o no66o
livne anbitnio de modo algum ê 6onçado nem vio- Se bem que o hábito da canidade e6tâ no
lentado pela gnaça ... A gnaça ê tão 6agueina e 6undo da no66a alma e 6az o 6eu o6Icio inclinan
pnende tão a6avelmente 06 no66o6 conaçÕe6 pana do-no ~ a nejeitan a6 6uge6tÕe6 do mal, a venda~
06 atnain, que em cou6a alguma pnejudica a li- de é que não no6 leva a ne6i6tin, 6enão na medi
bendade da vontade; apena6 utimula podenMa mM da em que o 6 ecundamo6. Pontanto, deixando- no~
delicadamente a6 enengia6 do e6plnito, e o li- livne6, acontece muita6 veze6 que o objeto mau
vne anbitnio não necebe com i66o violência algu lança na alma atnativo6, que no6 pnendem pon u-
ma. A gnaça di6pÕe de 6onça6, não pana abnigan~ ma complacência exe66iva da noJ.,6a pante, e, co-
ma6 pana cativan o conação; di6pÕe de uma 6anta mo 06 e6pinho6 de que &~la No6J.,o Senhon, f.,u6o -
violência, não pana violentan, ma6 pana apaixo- cam a 6 e.mente da gnaça e do amon ce..le6te (T. IV,
3) •
nan a libendade .. . ; inicita-no6, ma6 não opnime
a libendade, ponque nÕ6 ~odemo6 pela6 no66a6 6on
ça6 con6entin ou ne6i6tin ao6 6eu6 movimento6~ Os laços rompidos só podem ser reatados
6e a66im no6 apnaz. Ma6 o que ê tanto mai6 admi pela penitência. A este respeito, o século XVII
nãvel quanto vendadeino é que, quando a vontade vai se dividir entre laxistas e jansenistas.
connuponde ã gnaça, é tão livne como quando lhe Francisco de Sales admite a realidade e utilida
ne6i6te, embona a conne6pondência ao movimento de da penitência impen&eita, que é inspirada p~
divino dependa mai6 de Veu6 do que da vontade, lo temor do inferno, pela perda do paraíso, pe
e a nui6tência 6Õ é cau6ada pela vontade (T.II, la feiúra e malícia do pecado, pela degradação
12 ) . de nossa alma, pela beleza da virtude. Esta pe-
nitência é boa, mas permanece impen6eita: só é
Devemos também sublinhar aqui o papel da perfeita a que nos restitui a caridade e nos co
luz: o deleite de Deus provém da docuna de 6ua loca novamente sob a atração divina por causa
doutnina.
do amor. O princípio desta penitência vem de do b em perceptível à nossa razao. Assim, alcançamos
Deus, que jamais abandona o pobre pecador se e s a complacência divina por meio de um caminhar asce~
te detestar seu pecado. aente de nossas complacências humanas. Esta educa-
ção das c~rnplacênci~s deveria começar na rna~s ~e~ra
Te.Ótimo, no rne..io deu., aó,ticõu e.. arna11..gull..a.6 idade , pois se a criança se compraz em um so vicio,
de.. um vivo a11..11..e..pe..ndirne..nto Ve..u.6 põe.. muita.ó ve..z e...6 em uma só baixeza, para defender esse vicio recusa-
no 6undo do no.6.60 eo11..aç_ão o 6090 .6ag11..ado do .6 e..u rá todas as virtudes que a ele se opõem. Francisco
arnoll.. . .• A arnoll..o.6a eonJ.iide..11..aç_ão da arnáve..l e.. .6urna de Sa les, desde sua infância, aprendeu a se compra-
Bondade.. ult11..ajada pe..lo pe..eado p11..oduz a água da zer e m tudo o que é verdadeiro, belo e bom; por is-
.6anta pe..nitêneia ... Po11..que.. a pe..nitêneia não e so o vemos elevar-se facilmente para Deus por sua
compl acência para com Ele, pois a_eornplaeêneia a e
out11..a eoi.6a .6e..não urna Intima do11.. e.. um ve..11..dade..i -
11..0 pe...6 all.. e.. a11..11..e..pe..ndirne..n;to ( simbolizados pela á- gfl.and e.. e!ltU,~ do amo11.., eomo o amoll.. e.. a 911..ande.. eatU,a da
gua das lágrimas); penitência a11..de..nte.., po11..que.. eon eornpfa ee..ne,<,a.
tem a vi11..tude.. e.. p11..op11..ie..dade.. do arno11.., eorno de..11..i~
vada de.. urna eau.6a arnoll..o.6a, e.. poll.. e...6ta p11..op11..ie..da Ei.6 eomo e..J.ite.. rnovime..nto .6 e.. tíaz pa11..a Ve..u.6: a tí e
de.. dá a vida da 911..aç_a. Por esta razão, a peni= e..nJ.iin a-no.6 que.. a Vivindade.. eum abi.6mo ineomp11..e..e..n.6I
t ência per f eita tem este duplo efeito de nos se ve..l de.. toda a pe..11..óe..iç_ão, J.iumame..n;te.. in6ini;to e..rn e..xee
parar do pecado em virtude da de..;te..J.itaç_ão e de lêneia, intíinitame..nte.. J.iumo e..m bondade...
nos ligar a Ve..u.6 na qualidade.. de.. arnoll... Este Deus,
o arnoll.. irnpe..11..óe..ito o de..J.ie..ja e.. o .6oliei;ta, a pe..ni EJ.ita ve..11..dade.. que.. a tíe no.6 e..nJ.iina eonJ.iide..11..amo-la
têneia o p11..oeu11..a e.. o e..neont11..a, e.. o arnoll.. pe..11..óe..i~ ate..nt ame..n;te.. pe..la rne..ditaç_ão ... 011..a, quando eonJ.ie..11..va
to o p o.6 .6 ui (T • II , 2 O ) • mo.6 o no.6 .6 o e..nte..ndime..nto muito ate..nto ã 911..an.de..za doi
be..n1.i que.. e..xiJ.ite..m ne..J.i;te.. divino o b j e.to, e. ,<,mpoMive..l que..
a no.6 1.ia vontade.. não 1.ie..ja movida de.. eornplaeêneia pa-
VA COMPLACÊNCIA Ã BENEVOLÊNCIA 11..a e..J.i;te.. be..rn; e.. e..ntão u.6arno.6 da libe..11..dade.. e.. da au;to
11..i~ad e.. que.. te.mo.ó .6ob11..e.. no.ó me..J.irno.6 le..vando o no.6.6~
Para que a atração divina se exerça em um p11..op11..io eo11..aç_ão a tío11..tale..ee..11.. e.. a aume..ntall.. a J.iua pll..,<,
coração com bem-aventurada força, é necessário, m~~ll..a eomplaeêneia eorn a;to1.i de.. ap11..ovaç_ão e.. de.. 11..e..go~
pois, que a alma triunfe do pecado pela graça Z,<,jO •••
divina. A caridade se torna, então, . 11..ainha do
eoll..aç_ão e seu primeiro movimento é de cornplacên A.6.6im ••. tíaze..rno.6 um ato de.. amoll.. a que.. J.ie.. dâ o
eia. Com efeito, o que vem a ser o amor J.ie..não o nome.. d e.. eomplaeêneia, po11..que.. n.o.6 eomp11..aze..mo.6 no go-
rnovirne..nto do eoll..aç_ão pall..a eorn o be..rn poll.. rne..io da zo _di v~no intíini;tame..nte.. mai.6 do que.. no no.6.60 pll..o-
eornplaeêneia que.. ne..J.ite.. .6e.. te..rn? pll..,<,o. E e..J.ite.. o amoll.. que.. dava ;tanta J.ia;tiJ.itíacão ao.6.6an
to.6, quando na11..11..avam a.6 pe..11..tíe..iç_õe..1.i de.. J.ie..u Amado ~
Vemos, portanto, corno é importante, na pe lhe...6 6azia dize..11.. eom tanta J.iuavidade.. que.. Ve..u.6 e..11..a
dagogia do amor, colocar o bem em toda a sua luz V e.. U.6 (T • V , 1 ) •
e beleza, para com todas as coisas. Corno pode-
ria amar a beleza de Deus, que me é invisível, Nos so amor, da complacência em Deus, eleva-se
se não amasse essa beleza visível que ele derra a benevo lência para com Ele.
rnou em sua criação e que resplandece na verdade, Ve..u.6
na justiça, na bondade, na virtude? Para nos 011..a, e..J.ite.. amoll.. de.. be..ne..volêneia pall..a eom
comprazer finalmente em Deus, que é a bondade Pfl..atiea- .6e.. da J.ie..guinte.. 6011..ma: ve..11..dade..i11..ame..nte.., ne..-
viva, devemos primeiramente nos comprazer em to nenhum be..m pode..mol.i de...6e..ja11.. a Ve..u.6, po11..que.. a J.iua bo n

q.q
dade ê inninitamente mai-6 penneita que tudo quanto da do an. E-6te encontno ê agnadável e de-6ejado, e
pudê-6-6emo-6 de-6ejan ou imaginan . .. Não podendo, poi-6, mal -6e podia di-6cutin quem tem maion pnazen, -6e o
em ab-6oluto, de-6ejan cou-6a alguma pana Veul, nonma- qu e dâ, -6e o que necebe; -6e No-6-60 Senhon não tive-6-
mo-6 de-6ejo-6 imaginánio-6 e condicionai-6 . .. J.Je ne-6olvido a que-6tão, dizendo: "Ê mai-6 neliz o que
dâ do que o que necebe" (At. 20,35).
E-6te de-6ejo ... pode à-6 veze-6 -6en utilmente pna
ticado em oca-6iÕe-6 de gnande-6 -6entimento-6, de piedo Ona, onde há mai-6 nelicidade, hã mai-6 -6ati-6na-
-60-6 nenvone-6. Viz--6e que Santo Ago-6tinho o pnatica~ cão ; pontanto, a divina Bondade tem mai-6 pnazen em
va muita-6 veze-6 -6oltando no lmpeto do -6eu amon e-6- dan a-6 -6ua-6 gnaca-6 do que nÕ-6 em necebê-la-6 (T. I,
tal palavna-6: Ah! Senhon, eu -6ou Ago-6tinho, e "vÕ-6 1 5) •
-6oi-6 Deu-6, todavia, -6e aquilo que não pode -6en pu-
de-6-6e -6en, e que eu no-6-6e Veul e vÕ-6 no-6-6ei-6 Ago-6ti A atração divina se rea l iza por uma comunica
nho, eu quenenia ... tonnan-me Ago-6tinho pana que vã~ ção d e vida, por uma união vital de Deus e de nós~
no-6-6ei-6 Veu-6" (T. v, 6). seus filhos, no Cristo, e depois por uma subida ima
nente desta vida para Deus, seu princípio.
Este amor de benevolência é, pois, a alma da
pregação evangélica e da liturgia. Longe de pôr em A vinha é o símbolo joanino dessa união vital
contraposição a vida interior pessoal, a vida litúr do Cristo e de seus membros. Corresponde ao símbolo
gica, a ação coletiva, Francisco de Sales, como dis do Corpo místico preferido por São Paulo, que empre
semos, sublinha sua necessária ligação. ga também a imagem do enxerto. Esta comunicação da
vida divina e esta atração da vida humana em Deus
se re alizam graças à "aderência", termo beruliano,
A CONVERGÊNCIA ou à " inesão", termo salesiano. Esta "inesão", esta
solda , por sua vez, realiza-se pela fé viva, na agu
Neste conhecimento delicioso e amoroso da con deza do espírito. Também aqui o papel essencial da
templação, a alma descobre sua relação com o Deus luz!
vivo e a lei de atração que a eleva para a infinita
Bondade. A atração divina se exerce em nós em razão Quando Veu-6 no-6 dâ a nê, entna na alma e nala
de uma correspondência Única entre Deus e o homem ao e-6plnito, não pon di-6cun-6o-6, ma-6 pon in-6pinacão,
para a perfeita realização de todas a s coisas. pnop ondo com tanto agnado o que -6e deve cnen, que
excita o entendimento a con-6entin e a aquie-6cen ã
Ê cento que Veu-6 não p~de neceben penneicão al vend ade, -6em he-6itacão nem de-6connianca. Veu-6 apne-
guma do homem, ma-6 como homem não pode -6en apenneI -6enta o-6 mi-6tênio-6 da nê ã alma entne ob-6cunidade-6
coado -6enão pela divina Bondade, também a divinaBon e t neva-6, de nonma que não vemo-6 a-6 vendadu, ma-6 -6Õ
dade não pode, -6ob cento ponto de vi-6ta, exencen m~ a-6 entnevemo-6; como acontece quando a tenna e-6tá co
lhon a -6Ua penneicão, nona de -6i, do q~e -6oconnendo benta de nevoeino. Entao não podemo-6 de-6continan o
-no-6. -6o l, ma-6 -6Õ vemo-6 um ~ouco mai-6 de clanidade do la-
do em que ele utã ... Ê i-6to que chamamo-6 entneven.
O homem tem gnande nalta e ê capaz de neceben E, to da via, uta o b-6 cuna clanidade da nê entnando no
o bem, e Veu-6 ê nico e ê inclinado a dan. Nada mai-6 e~plnito, não pela nonca do di-6cun-6o, nem pela apa-
a pnopÕ-6ito pana um pobne do que encontnan um nico nencia do-6 angumento-6 ma-6 -6Õ pela -6uavidade da -6ua
libenal, nem há nada que cau-6e mai-6 pnazen ao libe- pne-6enca, -6ubjuga e domina o entendimento com tanta
nal do que depanan uma milênia pana -6oconnen. A in- aut onidade, que a conviccão que no-6 dâ da vendade
digência então de-6apanece, como o vácuo pela entna- -6ob nepuja toda-6 a-6 outna-6 conviccõu do mundo, e -6ub
mete a tal ponto o e-0plnito e todo-0 0-0 -0eu-0 nacio- O CONHECIMENTO E O AMOR
cinio-0 que já nenhuma innluência exencem companati-
v ame nt e ( T. II, 1 4) . Todos aqueles que passaram das trevas destem~
d o para a admirável luz do Cristo conheceram, cada
Vemos, pois, o papel determinante do conheci- qual à sua maneira, essa primavera da graça, quando
mento: a fé viva suscita o movimento. É o próprio 0 amor celeste, sol da alma, vai inundando-a c_om -0ua
Deus quem cria no entendimento a firme persuasão da c_ lanidade, e não ce-0-0a enquanto não a cobnin total-
fé ao se revelar à alma como o Deus vivo e real, co mente com o e-0plendon de -0ua pne~ença. O céu dos dl
mo o Deus que vem a nós, que nos ama e que age em vinos mistérios é então conhecido como real, e te-
nós: assim, ele provoca uma resposta existencial do mo s consciência de nele estarmos engajados. Até mes
homem; uma resposta que compromete não apenas a ade mo este mundo material nos aparece com novo aspecto:
são do intelecto, mas o impulso de toda a pessoa se ele atinge seu sentido definitivo em sua relação trans
gundo toda sua existência: é o devotamento a Deus~ cendente com Deus; a vida terrestre se reveste de
também, o movimento para a vida eterna que Deus quer seu caráter episódico, mas também assume seu valor
nos comunicar em sua plenitude, inicialmente neste inf inito diante da eternidade, seu valor durável.
mundo, de maneira perfeita r.o reino celeste. Deste
ponto de partida, vemos também que a esperança e a A vendade ê o objeto da no-0-0a inteligência e,
caridade não podem contradizer-se nem excluir-se. pontanto, toda a -0ua -0ati~nação ê de-0cobnin e conhe
e en a vendade e~tudando e aplicando-~e ã medida qui
A-0-0im como expondo-no-0 ao meio-dia ao-0 naio-0 en contna mai-0 penneiçõe-0 ne~ta-0 vendade-0 ... E que
do -0ol logo que vem~-0 a luz, no me-0mo in-0tante -0en- alegnia não ~ ente o no-0-0 o u plnito quando, guiado pe
timo-0 o calon; tambem logo que a nê ilumina o enten la nevelação divina, começa a ven a-0 -0agnada~ venda
dimento, no me-0mo in-0tante a vontade -0ente o -0anto de-0 da nê?! ... A nê ê uma contemplação da nace me~~
calon do amon cele-0te. A nê naz-no-0 conhecen com u- ma de -0ua gnandeza divina que não vemo~ em todo o
ma centeza innalivel que Veu-0 exi-0te, que ê innini- bnilho da glÔnia, ma-0 a divi-0amo~ eom o ~ol ao pni-
to em bondade, que pode e quen comunican--0e a nÕ-0, meino alvonecen do dia ... u quão delcio-0a ê a -0anta
poi-0 que pon uma bondade inenâvel no-0 pnepanou to- lu z da nê, pela qual -0abemo-0 com uma incompanãvel
do-0 0-0 meio-0 nece-0-0ãnio-0 pana alcançanmo-0 a nelici- eenteza não -0Õ a hi-0tÕnia da onigem da~ cniatuna~ e
dade da glÕnia etenna. de -0eu vendadeino u-00, ma~ também a do na~cimento
• etenno do gnande e -0obenano Venbo divino, ao qual
Temo-0 uma inclinação natunal pana o -0umo bem, e pelo qual tudo noi neito, e que com o Pai e o E-0-
e pon i-0-00 o conação -0ente ~m Intimo andon e uma plnito Santo ê um -0Õ Veu-0, ~nico, adonado e louvado
continua inquietação, que lhe não penmite ten -00-0-0e pelo-0 ~ êculo-0 do-0 -0 êculo-0 ! (T. III, 9) .
go, nem deixan de mo-0tnan que lhe nalta a -0ua -0atil
nação completa e o -0 eu -0 Õlido contentamento. MM quan O conhecimento gera o amor, mas o amor aviva
do a -0antI-0-0ima nê nepne-0enta ao no-0-00 e-0plnito e-0~ o d esejo de conhecer o Senhor, de onde renasce um
-0e belo objeto de -0ua inclinação natunal, õ Senhon fer vor incrementado pela caridade.
Veu-0, que contentamento, que pnazen, que delicio-0a
com~ção da alma! A qual, comq -0unpneendida e enleva Dizei-me Teôtimo, quem tem mai-0 nonça: o amon
da a vi-0ta de-0-0a nonmo-0una, exclama cheia de amonT Pana contemplan o Bem-Amado, ou a vi-0ta pana o na-
U como -0oi-0 belo, meu bem amado, Õ como -0oi-0 belo! zen aman?
(Ct 1,15) ... Enc.ontnei en6im, diz a alma a-0-0 ,ém mo-
vida (Ct 3,4), encontnei o que de-0ejava ... O conhecimento ê e-0~encial pana a pnodução do
amon, vi-0to nunca podenmo-0 aman o que não conhece-

◄ '"'
mo6; ã me di da que aum e nta o conhecimento atento do O êxt.a,óe chama- 6 e a1t1tebatamento, quando polt meio
bem, mai6 c1te6ce o amolt, contanto que não haja nele del e Ve u6 no6 at1tai e eleva ate 6i; e o a1t1tebatamen
nada que ponha ob6táculo ao óeu de6envolvimento. S~ to tem o nome de êxta6e logo que 6lcamo6 601ta e acI
cede po1tem, muita6 veze6 , que o conhecimento, tendo ma de noó me6mo6, pa1ta no6 uni1trno6 a Veu6. o~ encai
p1tod uzido o amolt divino, e não ~ e detendo o amolt no6 to6 que no6 athaem da pa1tte de Veu~ 6ão adm[1tavet~
li mite6 do conhecimento que e6ta no entendimento, ment e doce6, 6uave6 e delicio6o6. A beieza e bonda-
pa66a alem e avança muito pa1ta longe dele, de 601tte de divi na, palta at1tai1t a no16a atenção e aplicaç_ãodo
que ne6ta vida mo1ttal podemoó telt mai6 amolt do que e6pl1tito, tem tal 601tç_a que, não 60 no6 eleva, ma~
conhecimento de Veu6. no6 a1t1tebata e t1tan6po1tta. Polt out1to lado, em 1tazão
do con6 entimento da vontade e a1tdente movimento pe-
Ê o que a66egu1ta o g1tande Santo Tomá~ dizendo lo qual a alma a1t1tebatada co1t1te ap o~ noMM atti.ativ 06
(2 a 2, ae, q. 82, a. 3, 3m): que muita~ veze6 "06 divin o6, paltece que não 6obe apena6 e 6e eleva , ma6
mai~ 6implu e a6 mulhe1te6 abundam em devo cão"; 01t- 6e lanç_a e p1tojeta pa1ta 601ta de 6i na p!top~ia Vivin
dina1tiamente 6ão mai~ capazeó do amolt divino que 06 dade (T. VII, 4) .
mai6 hábei6 e e1tudito6 6ábio6 (T. VI, 4). O de6ejo
de obtelt o amolt divino 6az-no6 medita1t, e o amolt ob O1ta, e6te a1t1teba,tamento de amolt opelta-6 e na von
tido 6az-no6 contempla!t; po1tque o amolt 6az-no6 a~ tade da ~ eg LLinte manei1ta: pelo6 at1tativ 06 da 6ua 6ua
cha1t uma 6uavidade tão g1tata no objeto amado que 06 vidad e, Veu6 implte66iona-a e logo, como a agulha a~
no660ó e6pl1tito6 não6e 6aciam de o velt e de o con~i t1talda pelo Imã óe move e volta palta o polo, e6que-
de1ta1t (T. VI, 3). c endo a 6ua condiç_ão de in6en~Ivel, a66im a vontade,
t ocada pelo amo1t cele6te, di1tige-~e e eleva-6e pa1ta
A contemplação torna-se, então, fonte constante Deu~ e, deixando toda~ a6 6ua6 inclinacÕe6 te~1tena~,
de amor, de movimento e de ação. ent1ta num a1t1tebatamento qu e não e de conhecimento
ma6 d e gozo, não de admi1taç_ão ma6 de a6eto, não de
ciência ma6 de expe1tiência, não de vi6ta ma6 de 6u-
O ÊXTASE VE AÇÃO bümado g o6 to (T • VI I , 5 ) •

A admiração de Deus e dos mistérios do Cristo, Esta forte união com Deus, longe de ser incom-
sob a influência do Espírito, pode ir a t é o arrebata pat ível com a ação, é, ao contrário, causa de pulto
mento e até o êxta6e, que não é aqui senão o ultra= e ab6oluto devotamento a Deus e aos homens: é o "êx
passamento de si mesmo; uma .~aida de no6 me~mo6 prQ ta s e de ação".
vocada por uma contemplação intensa da beleza do ob-
j eto. Para descrever o êxtase, São Francisco de Sa- Alem do6 mandamento6 divino6, há in-0piltaç_Õe6 ce-
les tem sob os olhos, ao que parece, a imagem de Ma- l eóte~ palta cuja execução não ~ô e p1tecióo que Veuó
dame Acarie. Ele distingue três espécies de êxtases: no ó exalte além daó nOóóaó 601tç_a6, maó que também
o de contemplação, o de afeição e o de ação; é no de no ó at1taia acima do~ inótinto~ e inclinaç_Õeó da no~
ação que vê não apenas o ápice do movimento extático, óa natu1teza. Tanto maió que, ainda que e6óaó in6pi~
mas também o critério dos outros dois. Por sua des - lta ç_Õe~ não ~ejam cont1tá1tiaó ã 1tazão humana, excedem
crição do êxtase de ação, aliás, ele normaliza esse -na, todavia, ult!tapa~~am-na e eótão óUpe1tio1teó a
ultrapassamento heróico de si no devotamento à cau sa ela; de modo que, neó6e ca~o, não vivemoó óÔ uma vi
de Deus e dos homens: ele vê ai uma união tão for- da civil, honeóta e c1ti6tã, ma~ uma vida óOb~e-humi
t e com Deus que a alma pode, então, sustentar todos na , devota e extática, i6to e, uma vida de todo ~
os combates da caridade pela causa do Senhor; seu i- Po nto óUpe1tio1t ã n0~óa condição natu1tal.
ideal aqui, sem dúvida, é São Paulo.
Não 1touba.1t , não me..ntiJt, não .6 e.Jt luxu1tio.60, o- tic a. é, pois, o termo normal e desejável do cris-
Jtalt a Ve..u.6, não Ju1ta1t e..m vão, amalt e. hon1ta1t pai e. tão perfeito. É aqui que aparece o caráter cristo-
mãe., não matah , ê vive.Jt con601tme.. a. Jtazão natu.1tal do cêntrico do movimento da vida espiritual e todo o
home..m. Po1tê.m, de.i xa.Jt todo.ó 0-0 no.6.60.6 be..n.6, amalt a po sen tido do movimento cósmico, pois o homem é o ápi-
b1te..za., p1tocu1tá- la e. con.6ide..1tã-la como di1te..t1tiz de..lI ce e a pe..1t6e..ição do mundo.
cio.6a, .6upo1tta.1t op1tâb1tio.6, de...6p1te..zo.6, obje..çÕe...6, pe..i
.6e..guiçÕe...6, maht~Jtio.6, e..m ve.z de. 6e..licidade...6 e. con~
te..ntame..nto.6; eo nt e..1t-.6e.. no.ó te..Jtmo.6 da mai.6 ab.óoluta A TEOS FERA
ca.6tidade.., e. e.m ~uma. vive.Jt e..m me.ia do mundo e. de...6ta
vida moJttal contt a toda.ó a.6 opiniÕe...6 e. mãxima.6 mun- Se não tornarmos cuidado, poderemos condenar São
dana.ó e. contJta. a ma1tê. do Jtio da vida, polt me.ia de. Francisco de Sales por nos ter legado urna doutrina
1te...6ignaçÕe...6 c ontZnua..6, Jte..n~ncia.6 e. abne..gaçÕe...6 de..n~ individualista sobre o amor divino, embora, sem dú-
p1t6p1tio.6, i.6to nao ê, vive.Jt hu.maname..nte.., ê. uma vida vida , muito bela e muito bela e muito profunda.Não
.6 o b1te..- humana.; não ê viv e.Jt e..m nÔ.6, ma.ó alê.m de. nÔ.6, e. podemos negar que a união com Deus, princípio e fim
e..m plano .6upe..h~O h à no.6.6a na~uJte..za.. E como polt e...6te.. da religião cristã, seja urna realidade individual.
p1toce...6.60 ningu~m pode. .6ai1t de. .6i, .6e..m que. o Pai e..- Não poderíamos conceber urna vida unitiva de um âng~
te..Jtno o at1taia, e..6ta. e...6pê.cie.. de. vida de..ve.. .6e..Jt um aJt lo puramente coletivo; a salvação é, fundarnentalrne~
1te..batame..nto c ontZnuo e. um pe..1t pê.tuo êxta.6e.. de. ação e te, urna aventura pessoal, mas esta salvação realiza
de. ope..Jtação (T . VII, 6). -se, no entanto, na Igreja, e o aspecto social do
drama não poderia ser nem omitido nem diminuído. Fran
São Francisco de Sales distingue, pois, dois es cisco de Sales teve clara consciência disso: ele nos
tados de vida n a Igreja: a vida civil, hone...6ta e. c1ti"7.; ensina, precisamente, este amor que nos incorpora
tã, e a vida e.. .6 pi1ti tual, devota, qualificada corno todos e cada um ao Cristo, a fim de formar o mundo
.6ob1te..-humana e. e.xtática.. A vida extática, no senti- invi sível, escondido na glória de Deus, mas a par-
do definido, esta ria reservada a alguma elite, ou se tir do mundo visível.
encontraria aber t a a todos e constituiria o termo
mais desejáve l Pa ra todos? O pensamento do doutor é Tal é, com efeito, o termo, a partir deste rnun
claro. Paulo a ss i m escreve a todos os cristão de Co do, do êxtase de obra, de vida ou de ação: o EspírI
lossos: Mo1t1te...6 t e..6 e. a. vo.6.6a. vida e...6tã e...6condida. coi to de Deus nos transpõe no Cristo e, embora perrnan~
C1ti.6to e..m Ve..u .6 (Cl 3,3). Francisco de S~les vê, nes cendo ainda neste mundo, e trabalhando para o bem
te texto, a própr ia definição da vida extática do deste mundo, não somos no entanto de...6te.. mundo (Jo
cristão. 17,14) , mas do mundo celeste. O Cristo vive e reina
agora no centro deste mundo invisível, em Deus, e é
A moJtte.. 6az co m que. a alma já não e..xi.6ta. no pito ao Cristo que estão unidos todos os espíritos de to
p1tio coltpo, nem no .6 e. u invÕlu.cJto. O que. .6igni6ica.~ da a criação que vivem da graça de Deus; e porque
Te..Õtimo, aque..l a. pa.la.vJta do apÕ.6tolo: Mo1t1te...6te...6? Ê co sua união com Deus, no Cristo e por Ele, tende, por
mo .6e. di.6.6e...6.6 e. : Já não vive.i-0 e..m vÔ.6 me..6mo.6, ne..m no uma energia divina, a tornar-se tão semelhante quan
invÕlucJt~_da_ vo.6 .6 a pnâp1tia. condição na.tu1ta.l; a vo.6- to possível à sua, que é hipostática, e perfeitarnen
.6a. alma Ja na.o viv e .6e..gunda e.la me...6ma., ma..6 a.cima te sobrenatural, podemos dizer que o amor que os le
de. .6i me...6ma. (T . VII, 6). E ainda: Fina.lme..nte.. ap1te..- va a essa união é essencialmente extático, porque
.6e..ntou São Pa ulo o mai.6 601tte.., o mai.6 e...6maga.do1t e. o ele os leva em Deus não apenas além de si mesmos,
ma.i.6 admi1tãve..l a.tgume.. nto que. jama.i.6 6oi ouvido,CJiuo mas além de qualquer aspiração possível à natureza
e..u, pa.Jta. no.ó l e..V QJt a todo.ó a.o êxta..6e.. e. ao a.1t1te..bat~- Criada. Corno a união do Verbo e da natureza humana
me..nto da vida e. da.ó ob1ta..6 (T. VII, 8). A vida e..xta.- em Jesus Cristo é de perfeição infinita, o rnovirnen-

1n~
to extático dos espíritos tende, pois, sem nunca po t una~. A~~im como exi~te etennamente uma comunica-
der atingi-lo, para esse supremo grau de amor que ção Zntima em Deu~, pela qual o Pai comunica toda a
constitui a unidade do Homem-Deus e que permite a j ua divindade ao Filho, que dele pnocede, o Pai e o
Jesus dizer: Eu e o Pai ~amo~ um (Jo 10,30). E nos- Filho, cniando juntamente o E~pZnito Santo, comuni-
sa união com Deus é tão forte que faz São Paulo di- cam-lhe igualmente a ~ua pnôpnia e Única divindade;
zer, no sentido de uma analogia: Eu vivo, ma~ jã não do me~mo modo, e~te ~obenano bem 6oi comunicado 60-
~ou eu que vivo, pai~ ê Cni~to que vive em mim (Gl na de ~i tão pen6eitamente a uma cniatuna, que a na
2,20). tuneza cniada e a divindade, con~envando cada uma
aj ~ua~ pnopniedade~, 6onam contudo pontal 6onma u
Efetivamente, é sua união com o Pai que Jesus nida~ que não 6izenam ~enão uma me~ma pe~~oa (T. IL
nos deu como modelo e como termo ideal da nossa: Co 4) •
mo tu, Pai, e~tã~ em mim e eu em ti, que ele~ e~te~
jam em nô~ (Jo 17,21). Esta união, a mais perfeita É, pois, pela encarnação do Verbo, já presen-
possível, do Criador e da criatura, é o fim último te no mundo 6eito poh Ele (Jo 1 ,3), que se realiza
da vontade divina no Verbo encarnado: ela é o termo a c onvergência, a perfeita união da criatura e do
imutável do eterno conselho para o qual se dirigem Cri ador. Eis de que maneira:
todos os espíritos que não recusaram a graça da gló
ria. Este desígnio de Deus, segundo São Francisco Ona, entne toda~ a~ cniatuna~ que e~ta ~upne
de Sales, que se apóia, conforme seu modo de pensa 4 ma onipotência podia ~nian, 6oi do ~eu agnado e~co~
sobre a melhor interpretação da Escritura e dos Pa- lh en a me~ma humanidade que maú, tcULde. ~e uniu ã Pu
dres, é desejado por ele antes mesmo de qualquerque jo a de Deu~ Filho, ã qual 6oi de~tinada e~ta honna
da e de qualquer pecado: para ele foram elevados os inc ompanãvel da união pe~~oal ã ~ua divina maje~ta-
anjos que não pecaram. Assim, pois, abre-se à fé o de, pana que etennamente goza~~e pon excel..ênua do~
plano da teosfera, invisível aos olhos da carne, a- te~ouno~ da ~ua in6inita glônia. Tendo a~~im pne6e-
penas visível aos olho~ iluminado~ do ~onacão: to- nid o pana e~ta 6elicidade a ~agnada humanidade do
dos os espíritos criados de todos os mundos possí- no ~jo Salvadon, a ~upnema Pnovidência di~pô~ não li
veis, dos mundos terrestres ou dos mundos angélicos, mitan a ~ua bondade na Pe~~oa de~te amado Filho, maJ
só foram destinados para se unir, no Verbo encarna- e~ tendê-la em ~eu 6avon a vãnia~ outna~ cniatuna~,
do e com um puro amor, à divina Trindade: em toda e entne a inumenãvel quantidade de cou~a~ que podia
criação há uma atração do Espírito Santo para essa pn oduzin, e~~olheu cnian o~ homen~ e o~ anjo~, pana
união. Tal é o campo imenso onde se move nosso amor. 6a zenem companhia a ~eu Filho, panticipanem dM ~uM
Para captar o sentido desse amor, não podemos igno- gna ca~ e da ~ua glônia, adoná-lo e louvã-lo etenna-
rar o mundo espiritual no qual estamos engajados: to mente (T. II, 4) •
do o Tratado salesiano é esclarecido por essa visão.
Criados para o amor infinito, os anjos e os h~
Deu~, de~de toda etennidade, ~onheceu que po- men s dev~am gozar de sua inteira liberdade, mesmo
dia cnian uma quantidade inumenãvel de ~ene~ de di- em presença de Deus, visto que o amor é essencial-
ven~a~ pen6eicõe~ e qualidade~, ao~ quai~ ~e pode- men te um ato livre. O Criador previu o abuso dessa
nia comunican. E, como dentne todM M maneinM de ~e comuni- liberdade, os pecados de uns e de outros e as jus-
can, não havia nenhuma mw pen6eita que a da união a algu- tas conseqüências dessa revolta voluntária, mas te
ma natuneza cniada , de 6onma que a cniatuna 6o~~e, ve piedade da natuneza humana, tomando dela uma pa~
pana M~im diz en, enxentada e encnavada na divindade, t e bem-aventunada para uni-la à sua divindade. Õ
pana com ela 6azen uma ~ô pe~~oa, a ~ua in6inita bo!! Cri sto, Deus Salvador, tornou-se então Deus Reden-
dad~ que de ~i me~ma e pon ~i me~ma tende a comuni- to r, pois Deus, ao desejar que a ~uavidade da ~ua
can-~e,ne~olveu e detenminou 0azen uma de~ta~ c~ia-
mi6e.hic6hdia 6o66e. ohnada com a be.le.za da 6ua ju6ti noss a morte mística no Cristo que passanos para ele,
ça, d e.li be. hou 6alvah O home.m poh uma higoho6a he.de.n para pertencermos a ele e não mais a nós mesmos. Ib~
ção. Pois Deus amou tanto o mundo que entregou o seu trina toda pau l ina que Francisco de Sales coloca no
Filho único (Jo 3,16) e de.te.hmi nou que. e.le. he.6gata- centro da sua, apoiando-se neste texto : Poi6 a ~ahi
hia 06 home.n6, não 66 poh uma da6 6ua6 açÕe.6 amoho- dad e. de. Chi~to no6 compe te. , quando con6ide.hamo6 qui
6a6, qu e. te.hia 6ido mai6 que. 6 u6icie.nte. paha he.6ga- um 66 mohhe.u poli.. todo6 e. que, µoh con6e.guinte., to-
tah mil milhõ e.6 de. mundo6, ma6 ainda poh todo6 06 do6 moh~ eham. Oha, ele. mohheu poh todo6 a 6im de.que.
6 o 6hime.nto6 doloho6 06 qu e. e.le. 6 upohtahia, atê_ a moh aqu e.le.6 que. v-i.ve.m não v,i.vam mai6 paiw 6 ,i., ma6 µaha
te. e. moht e. d e. ChUZ (Fl 2,8), ã qual e.le. o d e.6 tinou, aque.le. que. moh!i..e.Ll e. 11-e.,Htv:.citou poh e.le.6 (2Cor 5,14
que.he.ndo que. de.6te. modo 6e. 6ize.66e. o companhe.ihodM - 15). Tal é o sentido profundo, normal e sublime do
no66a6 mi6ê.hia6, paha de.poi6 no6 6aze.h companhe.iho6 ê xtas e salesiano .
da 6ua gl6hia; de.6cobhindo a6 hique.za6 de. 6ua banda
de. (Rm 2,4), poh uta copio6a he.de.nção (Sl 130, 7)~
abundante., 6upe.habundante., magnl6ica e. e.xce.Miva, que. O AMOR PURO E A PRESENÇA NO MUNDO
no6 adquihiu e., paha a66im dize.h, no6 he.adquihiu t o
do6 06 me.io6 ne.ce.66âhio6 paha alcançahmo6 a gl6hia~ Es s a mística do êxtase e do ultrapassamentonão
de. mane.iha que. ninguê_m pude.66e. jamai6 que.ixah-6e. de. s eria, afinal, uma mística de fug a e de evasão? Es-
que. a mi6e.hic6hdia di vi na 6altava a alguê_m (T. II, se desejo do amor que nos trasnporta ao céu não nos
4) • to rnaria indiferentes à sorte dos homens deste mun
do ?
Assim, todo o plano do amor divino é dominado
pela beleza, pela bondade, pela mansidão e pela do- Francisco de Sales, como sabemos, levou muito
çura do Cristo; Ele. ê_ a image.m do Ve.u6 invi61ve.l, o longe a teoria da indiferença. Diríamos que, essen
Phimogé:nito de. toda chiatuha, pohque. ne.le. 6oham chia- cia lmente, uma só coisa importa: o puro amorde Deus;,
da6 toda6 a6 coi6a6, no6 cê.u6 e. na te.hha, a6 vi61- além disto, o que mais importa? Esta simplif icação é um
ve.i6 e. a6 invi61ve.i6 ... ; tudo 6oi chiado poh Ele. e. es boço de sua doutrina.
paha Ele.. Ele. ê_ ante.6 de. tudo e. tudo ne.le. 6ub6i6te..
Ele. ê_ a Cabe.ça da Ighe.ja, que. ê_ o 6e.u Cohpo. Ele. ê_ A conformidade com o beneplácito divino, termo
o PhincZpio, o Phimogé:nito do6 mohto6, (te.ndo e.m tu sub lime do amor de Jesus para com seu Pai, é feita
do a phimazia), poi6 ne.le. aphouve. a Ve.u ~ 6aze.h habI ou pela he6ignação ou pela 6anta indi6e.he.nça. Are-
tah toda a Plenitude. e. he.conciliah poh Ele. e. paha signação prefere a vontade de Deus a todas as coi-
Ele. todo6 06 6e.he.6, 06 da te.nha e. 06 do6 cê.u6, he.a- sas , mas não deixa de amar muito as outras coisas
lizando a paz pe.lo 6angue. da 6ua chuz (Cl 1, 15-20). além da vontade de Deus. E a atitude dos bons cris-
tão s. A indiferença se acha bem acima da resignação,
Este texto de Paulo aos Colossenses, citadopor poi s ela nada ama 6e.não pe.lo amoh da vontade. de. Ve.U6
São Francisco de Sales (T. II, 5), dá ao seu Thata - (T. IV, 3, 4). Toda a doutrina da indiferença deve
do do amoh de. Ve.u6 sua dimensão grandiosa, com o a- ser tirada do rigor desta definição. Assim, o cris-
póstolo, ele compreendeu que "a Encarnação, coroada tão pode ficar indiferente a tudo o que não ame na
pela Ressurreição, colocou a natureza humana do Cris Von tade de Deus, mas pode amar tudo nessa vontade,
to à frente, não apenas de toda a raça humana, mas e e le quer tudo amar nela. Se tudo o que está fora
ainda de todo o universo criado, interessado na sal des sa vontade lhe for indiferente, tudo o que está
vação como o foi na falta" (P. BenoI~ Cl 1, 19, g.i nes sa vontade se tornará para ele muito querido e
Esta visão traça também o caminho do nosso amor ele se rá fortemente amado. Ora, a vontade divina é o pró
deve passar pela cruz para chegar à glória; é pela Pr io Amor infinito que quer todo o bem possível na
criação, todo o bern \ possivel em mim, para mim e pa- Poh que. ama~oj ~ De.uh, Teôti~o? A cau6a poh que
ra meus irmãos; colocar-me neste ponto de vista é amamo6 a. Veu6, d,{_z Sao Be.hiw.,-~du, e. Dcu. ,s me.6mo; que.
amar, querer e fazer o bem em sua amplidão mais ele ê como 6e. di66e.66e que amamo~ a Deu.~ poh se.h a 6o-
vada e mais vasta, em toda sua univer sa lidade po8sI behanl66ima e in6initZj6[ma bonduJe. Poh que ê que
vel ao meu amor identificado com o de Deus. Tal e no6 amamo6 a nÕ 6 me./6 mo ,S r til caticdcui c..? I ndu.bitav e..l'.me.n
te, po11. 6 e.hmo6 a {,tnag em e a 6 e.mc.lhanca de. De.uh. E v í.__J
a caridade de um Paulo e dos Santos que o imitam.
to que. todo6 oi home.n6 t~m e66a me.6ma dignidade., a~
A indi6e.he.nca deve phaticah-6e. e.m tudo o que. ê mamo-lo6 tambêm como a nÓ6 me6mo6, ü)to ê, na quali
he.lativo ã vida natuhal, como 6e.ja a 6aÚde e. a doe.n dade. de 6ant16hima6 e. viva6 image.n6 da divindade.. I
ca, a beleza e, a lealdade., a 6haque.za e. a 6ohca; na-X ne.66a qual~dade. que. nÔ6 pe.hte.nce.mo6 a De.uh, com tão
coi6a6 da vida civil, como 6ão a6 diãtincÕe.6, hon- Uthe.ita alLanca e tão e.6t.ünéiv e.l de.pendência, que. não
ha6 e, hiqu e.z a6; e, na e.xte.n6a e.6cala da vida e6pihi- tem di6iculdade. em 6e dize.h no6,6o Po_i e chanrnh-no6
tual, como ê a tibieza e, a6 con6olacÕ e.6 , a de.ãola- 6e. u6 6ilho6; ê ne.66a qualidade. que. te.moh a capacida
cão e. a ale.ghia. Ve.ve.mo6 6e.h indi6e.he.nte6 no6 ato l, de. d e. noh unihmo6 ã ãua divina e.66ência, pelo gozo
no6 6o6hime.nto6 e., e.n6im, em toda a 6o hte. de. e.ve.n- da 6ua 6obe.hana bondade. e 6e.licidade.; ê ne.66a quali
tualidade.6 ... O ghande. apÔ6tolo phe.gava uma indi6e. - dade. qu e. hece.be.mo6 a 6ua ghaç_a e no66o e.6pl11.ito 6e
he.nca ge.hal paha no6 tohnahmo6 ve.hdad e.iho6 6ehvo 6 a66ocia ao 6e.u 6aze.ndo~no6 pa11.ticipah, poh a66im di
de. Ve.u6: muita paciência na6 thibulacÕe.6, na6 ne.ce.6 ze.h, da 6ua natuhe.za d,í.__v ,í.__nct (2Pd 1 ,4), como diz São
6idade.6, na6 angÚ6tia6, na6 e.n6e.hmidade.6, na phi6 ã~ Leão. ~ a66im que. a me.6ma cahidade. que. phoduz 06 a-
na6 6e.dicõe.6, no6 thabalho6 ,na6 vigllia6 e. no6 je.- tol de. amoh de. Ve.u6, phoduz igualmente. 06 do amoh do
jun6 (2Cor 6,4ss) . . . . Con6ide.ha, Te.Õtimo, como e.ha p4Õximo. fo h i66o Jacô comphe.e.nde. u que. aquela e.ãca-
athibulada a vida do6 apÔ6tolo6: paha o cohpo tive.- da, que. âabia da te.hha ao cêu, tanto 6ehvia paha oh
ham 6e.hida6, paha o cohacão angÚ6tia6, e. o mundode.u anjo6 d e.6 ce.he.m como paha 6ubihe. m 06 home.n6. Tambêm,
-lhe.6 e.m he.thibuicão a de.lanha e. e.nce.hhou-06 e.m phi nÔ6 6abe.mo6 que. a me.6ma dite. cã o abhange. o amoh de.
6Õe.6. E em me.ia de. tanta6 amahguha6, ô Se.nhoh, que Veu6 e o do phÔximo, levantando o no660 e.6plhito ã
indi6e.henca a de.le.6! A 6ua thi6te.za e.ha ale.ghe., a união com Ve.u6 e. he.conduzindo-o ã amo11.éive.l 6ocie. da-
pobhe.za hica, a mohte. de.6e.nthanhava-6e. e.m vida, e. a d e. do ph Ôximo (T. X, 11).
de.lanha e.nobhe.cia-06. Que.h dize.h: 06 apÔ6tolo6 ach a
vam phaze.h na thi6te.za, ale.ghia na indigência, ale.n E este amor deve ser real: não confudarno s o mo
to no6 pe.higo6 e, atê na mohte., e, glÔh~a no de.6phe.zo tiva e o objeto do amor; por causa do motivo , nã~
do mundo, pohque. todo6 e.M, e.6 tohme.nto6 e.ham da vonta nos esqueçamos do objeto. t pelo amor de meu Deus
d e, d e, V e, U6 (T . I X, 5) . que amo meu irmão e, portanto, é meu irmão q ue eu
amo, mas com um amor que eu não teria se não amasse
Em suma, importa sermos indiferentes a tudo o meu Deus. Devo, pois, amá-lo como Deus o ama e com
que poder i a con t entar nosso individualismo, para me o mesmo amor que levava São Paulo a dizer : Ele me.
l hor nos doarmos e nos devotarmos ao bem universal amou e 6e e.nt11.e.gou a li me.6 mo poh mim (Gl 2,20) · D~
segundo o Cristo e no Cristo, e para realizarmos o vemos, pois, amar nossos irmãos, os homens , de qua!
desígnio de Deus no mundo. Assim jorra em toda sua quer cor, de qualquer classe, de qualquer raça, com
luz a idéia de urna fraternidade universal que foi toda a e.xte.nãão de. no66o cohacão e não no6 co nte.~-
tão tão cara ao santo bispo de Genebra. Ele quises tahmoh com améi-lo6 como a nÔ6 me.6mo6 ... mal · · · ma,<_6
crever sobre este importante asssunto um Philad e.l~ do que. a nÔ6 me.6mo6, paha ob6e.hvah 06 mandame. nto6
phe.; só pôde nos dar um principio dele, sobre o qual da pe.hne.icão e. vangêlica ... a66im co~o ~0 66 º Se.nhoh
devemos meditar. 6e.mphe. phe.6e.hiu a nÔ6 do que. a hi p11.opJ1.,<_0 • · ~ Eãte
amoh cohdial deve 6eh acompanhado poh dual V,{,11.tudeã:

1 1 ')
a a 0ab~lidade, que dinunde c.enta -0uavidade no-0 negQ nial para se revestir no termo do Tempo de um corpo
c.io-0 e c.omunic.acõe-0 -0enia-0 ... e a boa c.onven-0acão, espiritual, pneuma, conseguido por intermédio do
que no-0 tonna gnac.io-00-0 e agnadâv ei-0 no-0 ne c.neio-0 e Cristo morto e ressuscitado por nós. O último e mais
c.onven-0a-0 meno-0 -0ê,nia-0 (T. IV,). desejável efeito da caridade perfeita é, pois, amo~
te de amor. Os eleitos morrem, ao menos, no amon; os
O bom santo não era inimigo do humor, mas sua mais fervorosos morrem no exenc.Ic.io do amon; os he-
bonomia era encantadora: ele se retrata nesta des- róis da caridade morrem de amon, tais como, segundo
crição caridade fraterna. E como sentimos suas en nosso autor, São Francisco de Assis, Santa Madalena,
tranhas se comoverem na presença dos homens, ima= são Basílio, Santa Teresa, São José e, sobretudo, Nos
gens de Deus: Ah! meu e.ano Teôtimo ... não devenia- sa Senhora. Tal é, pois, o último cume da vida para
mo-0 dizen un-0 pana 0-0 outno-0: Repanai pana uta c.nia onde nos leva o dinamismo do amor puro: mon-0 beata!
tuna, e.orno ela -0e panec.e c.om o no-0-0O Cniadon? E de~ Este efeito foi lento e retardado nos outros santos,
vZamo-0 abnacâ-la c.om e.aninho, nodeâ-fa da-6 no-0-0a-0 a ponê,m, na Vingem SantI-0-0ima, tudo óavonec.ia e -0ec.u~
tencõe-0 e c.honan de amon pon ela. Por amor dela?Não dava o c.un-0O do amon c.ele-0te, openando--0e nela au-
sabemos sabemos se é digna de amor por si mesma.Mas mento-0 e pnogne-0-0O-0 na penóeicão inc.ompanavelmente
pelo amor de Deus, a quem e-0-0a c.niatuna pentenc.e, pa mai one-0 que em todo o ne-0to da-0 c.niatuna-0; e, toda-
na quem ê,, pon quem exi-0te, em quem vive e c.om quei via, e-0-0e-0 pnogne-0-00-0 enam inóinitamente doc.e-0, ame
-0e a-0-0emelha (T. X, 11). no-0 e pac.Ióic.0-0. Não, ela não de-06alec.eu de amon nem
de compaixão junto~ c.nuz de -0eu Fi .tho, po-0to que
Mas tal amor não poderá ser eletivo? Sem negar -0enti-0 -0e ne-0-0e momento o mai-0 inten-00 e dolono-00 a-
a predileção, o doutor da caridade queria realmente c.u -00 · de amon que pode c.onc.eben--0e; pon extnemo que
que fosse universal, pois em todo homem, mesmo o a- óo-0-0e e-0-0e ac.e-0-00, ena igualmente inten-00 e doe. e ,
parentemente mais degradado, ele via em sua natune- -0imultaneamente podeno-00 e tnanqailo, ativo e pac.i-
za a imagem de seu Deus e a possibilidade do bem di óic.o, mi-0to de pungente e de -0uave (T. VII, 14).
vino. Deus está em todo homem pelo menos como causa
de seu ser e como agente de sua salvação: "Deus Foi aí, no entanto, que ela recebeu o golpe
quer salvar todos os homens". A fraternidade univer de espada de dor que ocasionou sua morte: vivendo
sal tem seu fundamento na "filantropia" de Deus. Es da vida de seu Filho, ela só poderia morrer da mor-
tamos, aqui, no âmago do espírito salesiano. Qual a te da qual Ele morreu e reviver da vida da qual Ele
finalidade desse amor? • vive: assim, a Virgem resume e recapitula o destino
da humanidade de antes da Parusia.

A MORTE DE AMOR Ona, -0e e-0ta Mãe viveu da vida de -0eu Filho,
tamb ê,m monneu da -0ua monte: tal vida, tal monte, ...
O amon ê,tão óonte e.orno a monte, gostava de re- Algun-0 -0agnado-0 amante-0 pne-0enc.ianam a monte do Saf
petir São Francisco de Sales. E acrescentava: O a- vaâ on; entne ele-0, 0-0 que mai-0 o amavam maion don
mon ê, mai-0 óonte do que a monte, pois triunfa sobre -t.entinam . ... Ma-ti a doe.e Mania, que o amava ac..ima de
ela. O amor é forte como a morte porque ele faz pon tod o-0, mai-t. do que nenhum óoi atnave-0-t.ada pela don
aóeicão o que a morte faz pon eóeito: ele -6epana a qu e, qual aguda e-t.pada, lhe tne-0pa-t.-0ou o c.onacão de
alma do amante de -0eu c.onpo e de toda-0 a-0 c.oi-0a-0 do Mã e. Tanto mai-t. que e-ti-0e c.onacão pul-0ava junto e i-
mundo, a fim de uni-la eternamente a Deus, no que de ntióic.ado c.om o de -0eu Filho, numa união tão pen-
triunfa sobre a morte. A morte aparece então, aqui, óeita que não ena po-0-0Ivel óenin um -0em atingin o
como uma "metamorfose" na qual a "realidade-espíri- outno em c.heio. Ona, e-0te peito motenno, a-0-0im óeni
to", a alma imortal, se despoja de um corpo mate- do de amon, qui-0 c.on-0envan a óenida, não lhe bu-0c.ou

11A
afZvio; phe6ehiu a doh a todo o con6ohto, con!:,ehvan
do cahinho1:,amente todo1:, 01:, ve1:,tlgio1:, dela, poh amo~
de quem lhe1:, imphimiha no cohação, de1:,ejando conti-
nuamente mohheh, jâ que 1:, eu Filho mohheha. . . . Fi-
nou-!:, e enthe a1:, chama!:, da cahidade, hofocau1:,to peh-
6eito poh to do1:, 01:, pecado1:, do mundo (T. VII, 1 3) .
Assim como o ímã atrai o ferro com uma atração
cada vez mais forte, caso nenhuma impureza o impeça,
assim também a Virgem, não tendo em 1:,i nada que 061:,
ta1:,1:,e a opehação do divino amoh do 1:,eu Filho, unia~
-!:,e a Efe numa união incompahâvef, em doce1:,, 1:,uave1:,
e natuhai1:, êxta1:,e1:,. Ne1:,te1:, a pahte 1:,en1:,Zvel não dei
xava de teh o 1:,eu quinhão, 1:,em contudo phejudicah a
união do e1:,plhito ... Foi, poi1:,, a mo~te da Vihgem
a mai1:, doce que pode imaginah-!:,e. Ela se abismou a-
moho1:,amente, no 1:,eio da bondade de 1:,eu Filho;
deixou seu corpo 1:,em cu1:,to, como a casta Judite se
despojou de suas vestes de luto para se revestircom
novo!:, hâbito1:, nupciai1:,. O amor dera a Maria junto
da cruz a!:, -6 uphema1:, dohU da mohte; j u1:,to eha que no
6im da 1:,ua exi1:,tência lhe concede1:,1:,e a1:, 1:,obehanM de-
fZcia1:, do amoh (T. VII, 14).Tal é a morte com a qual
o santo bispo sonhava morrer, se não morreu de amo 4
morreu, pelo menos, no exercício do amor .

Francisco de Sales com 51 anos (1618).


v. o ES P I RI TO S AL E S I ANO

A GLORIFICAÇÃO

A inf luência exercida por São Francisco de Sa-


l es é mais influênc ia de espírito e de vida do que
de doutrin a pura. A originalidade de seu pensame~
to se deve mais ao seu modo de expressão do que à no
v idade da doutrina. Ele fez o propósito de não ino=
v ar, mas não pod e impedir a si mesmo de ser origi-
n al, e de o ser num mundo que renasci a para a vida
c ristã. Sua sorridente e vig orosa figur a surg e, no
c omeço do grande século, na irradiação de uma luz e
manada das profunde z as de sua alma: ele vive, fala~
a ge , ele nos ama e, s e abrirmos qualquer uma de suas
obras, não é um autor que encontraremos, mas um ami
go que nos conhe c e profundamente e que nos diz, no
me smo instante, o que temos necessidade de saber. E

es ta palavra nos é suficiente para dar, agora, este
passo, ou para atravessar este túnel escuro em que
nos encontramos. Ele não é um autor para ler do prin
cip io ao fim sem interrupção e, em seguida, fechar
o livro para sempre: seu próprio livro se torna um
am igo nosso, um amigo ao qual voltamos quando neces
sár io. Corno aprender essa influência, como descre=
vê- la? Tentemos, primeiramente, ver o santo em sua
glorificação.

A publicação do T~atado, em 1616, torna-o céle


bre . São Vicente de Paulo considera essa obra como
urna obra "imortal". Sua Visitação se transforma tam
bérn numa ordem religiosa e, desde então, espalha-se
pel a França, Lorraine, Itália. Na França, sobretudo
não se admitirão religiosas que não sejam enclausu-
radas: foi por este motivo que e le cedeu a Marque (por volta de 1622), eu repetia a mim mesmo: Quão
mont. Sua reputação de orador, além disso, fez com que g rande é a bondade divina! Meu Deus, como sois bom!
recebesse convites de Lião, de Paris, de Bourges, em Meu Deus, como sois bom, pois Dom Francisco de Sa-
Orléans. Luís XII quer que ele participe do séqu ito l es, vossa criatura, está repleto de tanta bondade"
do cardeal da Sabóia que negociou, em 1618, o c as a- (p. 38).
mento de seu irmão com Cristina d e Fran ça . Uma mul -
tidão imensa, tal que homem algum tenha lembranç ade Por meio dessas confidências, compreendemos a
ter visto igual, vai ao encontro dos embaixadores, i rradiação do espírito salesiano em Paris, seu po-
no dia 6 de novembro: é o santo bispo que se obs er- d er de atração e de transformação. Nessa viagem à
va, o autor de Filotéia que se aponta com o dedo, França, a ação do santo foi de efeito incalculável
que se admira. No dia 11 de novembro o rei, a rainha sobre a corte, o clero e o mundo devoto. No caminho
e os nobres formam um auditório tão compacto na i- de volta, em setembro de 1619, acompanhou o rei a
greja do Oratório, onde vai pregar, que ele se vê Tours, viu Richelieu e a rainha Maria de Médicis.
obrigado a entrar por uma janela, por meio de uma Tentou fazer com que Monsenhor de Luçun deixasse a
escada. Ele se humilha, permanece ele mesmo e narr a po lítica e acreditou havê-lo conquistado para seu
a história de São Martinho de maneira tão franca e pahtido a nim de que não penjajje em mai◊ nada anão
num estilo tão simples que os amantes da grandil o- ◊ eh em Veuj e na jalvação daj alma◊ (XIX, 38). Con-
quência ficam decepcionados, mas os devoto ◊ encan ta q uistou a amizade do santo e austero cardeal de La
dos: ele não discursa, evangeliza. É por isso q ue Ro chefoucauld, que quis retê-lo na França. Mas ele
conquista os corações ávidos de vida cristã. Em bre de sejava retirar-se para a solidão, São Germano de
ve, todas as igrejas, todos os mosteiros de Paris Ta lloires, para essa montanha que domina o lago e
o requisitam: esgotado, já doente, jamais diz não de onde a vista é tão bela sobre essa cadeia de mon
e prega até três ou quatro vezes por dia para con- tanhas que o rodeia: ai, pens a va ele, as idéias lhe
tentar a todos. Sua residência, no antigo palácio ca iriam na alma, densas como as neves do inverno.
do marechal d'Ancre, é constantemente invadida: to- E poderia, assim, transmitir sua mensagem às almas.
da a Paris devota acorre a ele. Recebe visitas de Es tava em seus projetos um Calendâhio ejpihitual pa
Bérulle, de Vicente de Paulo, de Duval, da Madre An ra sua conduta,cotidiana,um Tratado de pregação pa=
gélica Arnauld e toda sua família, da Madame de Sain ra o jovem clero, um PWadelphe para reanimar o amor
te-Beuve, fundadora das Ursulinas, da Madame de ao próximo, uma grande obra sobre a H~tôhia teâ.ndhic.a,
Villeneuve, fundadora das Filhas da Cruz, de presi- bem como um ma nual de teologia bíblica para os lei-
dente de Lamoignon, que o considera "o homem mais gos cultos,tirado do Evangelho, dos At os dos Apósto
civil" do mundo, da condessa de Joigny, a primeira los, das Epistolas e dos Padres antigos. -
colaboradora de Vicente de Paulo. Não teria fim es- Vemos, assim, para onde tendiam as linhas de
ta citaçãode nomes ilustres e jamais acabaríamos de fo rça de seu espírito: para a renovação da Igreja,
narrar os sentimentos de admiração para com esse ho para a religião viva, para o amor divino que trans-
mem divino. fo rma os corações. Queria dedicar todas as suas for
ças a esse serviço de Deus, da Igreja, da cristanda
Vicente de Paulo, sobretudo, ficou profundame~ d e, dos príncipes e dos povos. Estava doente, esgo=
te impressionado pela doçura do bispo de Genebra: tado, mas, para obedecer ao papa, presidiu ao capi-
"Sua bondade era tão suave, diz ele, que as pessoas tulo dos frades Bernardes em 1622, em Pignerol: per
que tinham o privilégio de conversar com ele sentiam maneceu nas sessões a ponto de desmaiar. Como cape=
essa bondade penetrar suavemente em seus corações: l ão mór da duquesa de Sabóia, recusou instalar-se
experimentavam, então, intensa alegria. Partilhei de~ e m seu palácio, em Turim, para permanecer, hu-
sas delícias. Lembro-me de que, acamado pela doença mi lde e pobre, com os frades Bernardes, numa celain
cômod a . Acabou de e s gotar-se na viagem a Avinhão, ra, de toda consideração para com as diferentes c o n-
onde s eu duque desejava sua presença no encontrocom dições das pessoas, de todo julgamento injusto"; a-
Luís XIII, em 1622. Em Lião, de volta desta viagem, f astado "de toda avareza", "em nada precipitado em
foi a c ometido por um ataque de apoplexia, no di a 28 s eus julgamentos", nunca deu facilmente crédito ao
de de z embro. Antes de falecer, tinha escrito duas mal que lhe diaiarn contra alguém; jamais proporcio
cartas - Havia começado uma terc e ira, que não c h eg ou nou "ocasião de escândalo" 2 3 • -
a terminar: caiu com urna pena na mão, a serviço d os
homen s . Seu último ato foi de abandono: t bom hav en Como São Francisco de Sales conseguiu fazer a-
dep o~itado ~ua e~ penanca no Senha~ ... Deu~ eo S e- mar e penetrar no pais esse espírito sacerdotal? Ele
f oi o amigo, o diretor espiritual ou o inspirador
nhoJt: que El e di ~ponha de mi m como qui~ eft.
d e vários grandes prelados: de Frémyot, o irmão de
Sua morte foi um triunfo: sobre seu túmulo mi - Santa Chantal, de Revol, bispo de Dol, de Fenouillet,
lagre s floresceram, mortos ressuscitaram. Francisca b ispo de Montpellier, de Cospéan, bispo d'Aire. Ser
de La Pesse ficou três horas nas águas do Thiou, e v iu de exemplo e de modelo ao cardeal de La Roche=
Jerôn i mo Genin oito horas nas do Fier: iam enterrá- f oucauld, o grande reformador. Entusiasmou Pedro de
-lo, rnas cheirava tão mal que os padres não tiver am Villars, arcebispo de Viena. Antônio Godeau, bispo
corage m de entrar na granja onde haviam colocado seu d e Vnce, foi o líder.
cadáve r. Estes dois pro dígios aconteceram no fim de Exerceu sua influência, principalmente, entre
abril de 1623, quando haviam acabado de transport ar o s grandes reformadores do clero francês, os chama-
as re l íquias de Francisco de Sales; Deus glorific a- d os Padres da Igreja da França: Bérulle, Vicente de
va seu servo. Estas duas testemunhas de sua própr ia Paulo, Bourdoise, Olier.
ressuLreição depuseram no processo do santo, cuj a
causa a França assumira. Sabaudu~ Gal lu~! A santida É conhecida a amizade de São Francisco de Sa-
de de s se francês de Sabóia se espalhava: admiravam= l es por Bérulle, um do~ e~pZnito~ mai~ ela/to~ em~
-no, a mavam-no, sofria-se sua influência; seu espí - nZtido~ que jamais encontrara. A admiração de Bé-
rito Leanirnava a religião; ele se elevava como um r ulle pelo bispo de Genebra não era menor: aprecia-
sol s o bre essa Igreja que as guerras haviam obscure va sobretudo sua mansidão e sua igualdade de alm~ a
cido e coberto de sangue. Qual foi sua influência ? p ureza e a beleza de suas virtudes pastorais. Abriu
Escolhemos apenas algumas passagens nestas breves -s e a ele em 1602, como dissemos, e, em 1605, foi
páginas. Elas nos revelam seu espírito, ~eu reali s- procurá-lo na Sabóia: o projeto que os unia, como
mo sobrenatural, sua caridade, sua robusta mansidãq v imos, era a fundação do Oratório. Nada prova melhor
sua ma gnânima humildade. se u ideal sacerdotal comum. Eles desejavam, juntos,
uma sociedade de padres seculares na qual a devoção
O ESP f RITO SACERDOTAL do coração suprisse as austeridades corporais e os
são Francisco de Sales foi sacerdote no mais v otos; uma escola ou academia para educar os padres
Intimo de sua alma e na sinceridade de seu coração. n ão no "conhecimento obscuro" e "incerto" do Homem-
Encarnou plenamente o ideal do padre, tal como foi - Deus, mas "no amor e na posse alta e eminen-
descrito por São Policarpo: "cheio de caridade, de t e" de seu Salvador. Queriam padres que fos-
ternura e de compaixão para com todos", reconduz iu
ao caminho da salvação aqueles que se tinham desvi a-
do dele; visitou "todos os doentes''; não abandonou
"nem a viúva, nem o órfão, nem o pobre"; cuidou de
praticar "todas as espécies de boas obras diante d e 23. Cf. LetteJte aux Philippi e n~, tradução de Racine,
Deus e diante dos homens"; absteve-se "de toda cól e Oeu v Jt e~ di v en~ e~ , 1 9 s 4 , p • 6 8 3 •
sem os continuadores de Jesus Cristo, que é um Deus vo (L. c. XI, 40). Ele concordava aqui com o êxt aJ.i e
que fala e que fala de Deus, "e o assunto de que fa salesiano de ação. Estes dois gênios conspiravam for
la é o amor de Deus, que em Deus é Deus mesmo. E e= mar um clero santo e verdadeiramente apostólico, de
le fala de um amor de Deus tão elevado, tão exce- votado ao povo de Deus.
lente e tão divino em seus efeitos, que dá e comu-
nica um Deus ao mundo" 2 4 • Mas quem define esse ideal: Bourdoise, originário, como São Vicente, deu-
Bérulle ou Francisco de Sales? Tal é, pois, o espí- ma família camponesa, era muito diferente dela Pos
rito novo que esses dois grandes mestres insuflaram suía, enraizado no coração, o amor pela beleza do
no sacerdócio. E conhecemos o esplendor com que o culto. Tinha vocação de sacristão e dizia ser o "guar
Oratório ornou a Igreja e a ação renovadora dos Con dião universal das igrejas". Sentia-se impelido ~
dren, dos Bourgoing, de um Le J e une. e stabelecer comunidades sacerdotais nas paróquias,
a fim de que nelas reinasse a boa apresentação dos
Sabemos também como São Vicente de Paulo reno- p adres, a limpeza das igrejas, a perfeição dos ofí-
vou o sacerdócio pelas Conferências da Terça-feira. c ios. Este "guardião" se transformava, então, em ca
Os Gondi queriam atrair o bispo de Genebra para a p itão: declarava guerra contra os padres sem batina,
sede em maior evidência da França: que luz para to- contra os prelados que usavam rendas, contra os cô-
do o clero galicano! São Vicente fracassou, mas, pe n egos desocupados, contra as mulheres tagarelas, con
lo menos, inspirou-se com a doutrina e exemplos de tra os cãezinhos das duquesas. Era tão terrível que
seu amigo. Havia mandado colocar o retrato dele na enfrentava Richelieu. Ele queria homens para os be-
sala das Conferências da Terça-feira e, às vezes,o- l os ofícios, mas as mulheres o atrapalhavam: mulhe-
olhava-o como que para aspirar seu espírito; citava r es demais, homens, homens! Este é o motivo pelo
suas palavras, passagens de sua vida. Recomendava q ual Francisco de Sales lhe agradava, e o motivotam
cuidadosamente - studiose curavi - o Ttr_atado do a- bém pelo qual o bispo, por demais acolhedor, o irri
motr_ de Deu.ó aos seus filhos e ao "seminário de bis- t ava. Foi visitá-lo em 1619 e leu-lhe uma longa car
pos" da Conferência e, por suas palavras, por seu ta; era um diatribe: Vós perdeis tempo demais com
coração, o espírito salesiano passava para a alma v ossas devotas. Faríeis melhor se fundásseis uma so
dessa elite sacerdotal. São Vicente lhes ensinava 'a c iedade de padres em vez das Visitandinas. Quem es=
prática de nada pedir, de nada recusar", de se ape- c reveu essa carta? perguntou o santo. Eu, respondeu
g a r somente a Deus, de não querer "outra coisa se- Bourdoise. E Francisco de Sales tentou, suavement~
n ã o o que Ele que r e como Ele o quer" (Obras de São f azê-lo compreender que as mulheres eram, pelo me-
Vicente de Paulo, X, 273): era o resumo do salesia- no s, a metade do gênero humano, que ao formar boas
nismo. Ele lhes incutia também o amor pela oração: cristãs teríamos bons filhos, e que bons filhos pode
"Dai-me, dizia ele, um homem de oração e este será r iam ser bons padres. Como educar bons padres que
capaz de tudo" (L. c. XI, 83). Advertia-os sobre dois n ão tenham sido bons filhos? Dizia ainda que elepró
excessos opostos: o laxismo mundano e o rigorismo p rio não pudera formar, em dezessete anos, J.ienão um
jansenista. Ele lhes comunicava seu amor pelos ho- padtr_e e meio para ajudá-lo a reformar o clero de sua
mens : "Amemos a Deus, ponderava, mas que seja às d iocese. A França, no entanto, tinha mais recursos
nossas custas"; para ele, todas "as afeições e prát.!_ e ele encorajou muito Bourdoise a prosseguir com sua
cas interiores de um coração terno" são muito sus- o bra de São Nicolau do Chardonnet. Informou até o
peitas quando nãore atinge a prática do amor efeti- c ardeal de Retz sobre o destino dessa comunidadeque
e stava nascendo e lhe predisse que Deus tinha gran-

24. Gtr_andeutr_J.i de JêJ.iu.6 ("Grandezas deJeus"), IX, 1.


des desígnios para ela 25 . Com seu espírito e sua pa amor: "Amemos, amemos e nada temamos. O amor tudo a
lavra, deu um novo estilo de âniJn.o a essa paróqu ia; paga, tudo cede às suas sagradas invenções. O in=
participou das "Orações das Quarenta Horas" que ai fe rno não ousaria abordá-lo, o céu não poderia es-
se celebravam no Carnaval; ai pregou no dia do san- qu ivar- se dele; e seja qual for a ameaçd que nos f~
to padroeiro e levou todos esses padres para fora çam, seja qual for a justiça que nos mostrem, desa-
de si mesmos, qua-0i extna no-0 po-0iti in Qoeli-0 Q0n- fi o suas armas com o santo amor" 2 7 .
ven-0ati, disse o doutor Froger; fez, sobretud~ duas
conferências muito importantes para a renovação e- Essa influên c ia sal cs iana sobre o clero da Fran
clesiástica: a Igreja estava repleta de padres, de ça foi, na verdad e , compl ex a e diversa, mas sensí-=
abades, de religiosos, de párocos, de doutores; foi ve l em toda parte. O santo bispo unia em seu cará-
então que mostrou ao padre Bordoise quanto amava, te r e em sua doutrina a brandura e o rigor. Alguns
e desde o começo, sua sociedade sacerdotal. Ele fa- fo ram mais sensíveis à sua força; outros, à sua man
(ou, di z Georges Froger, de modo admirável, sobre a sidão. Sain t -Cyran, Arnauld , Bossuet se referem a~
dignidade, a santidade, a missão dos padres, e deu seu elevado e firme ideal; Fénelon ficou mais impres
o impulso ao movimento de sua reforma (p. 46). sionado c om sua benignidade e sua mística; o huma-=
ni smo devoto apoiou-se em seu liber a lismo; todo s f o
O padre Olier (1608-1657), quando estava com ram influenciados por sua santidade. O clero fran=
quatorze anos, conheceu São Francisco de Sales, em cê s, em sua assembléia de 1625, prestou-lhe este ma2
Lião, em 1622. Sua mãe o destinava ao sacerdócio e ní fico e significativo testemunho: "Ele viveu entre
quis levá-lo para que o santo bispo o abençoasse. nó s, e vimos brilhar nele todas as virtudes.. . É
Estava um tanto inquieta com esse filho traquinas e no sso irmão ... Nós o vimos refulgir em piedade, em
turbulento e desejava saber sua opinião a respeito man sidão, em santidade ... Bastava ouvi-lo para nos
de l e: Fique tnanq~ila, respondeu, o Qêu o e-0Qofheu sentirmos abrasados pelo divino amor; bastava vê-lo
pana a glÕnia e bem de -0ua Igneja. Desde então, Jean para sermos levados à virtude".
-Jacques Olier passou a chamar São Francisco de Sa-
les de Pai: "Se eu o chamo de meu Pai, diz no seu pa Depois do eclipse revolucionário, quando a I-
negirico, é porque tive a felicidade de receber sua greja francesa se reergueu de suas ruínas, o novo
bênção e de ter vestido a batina por suas orienta- c lero voltou às fontes e a tradição do grande sécu-
ções e conselhos" . Caindo doente e estando à morte, lo se reatou. São Francisco de Sales foi um dosgran
f e z promessa a esse santo e ficou curado. Fbi ao seu de s mestres dessa renovação. No Concílio do Vatica-=
tiimulo para agradecer-lhe e propôs-se a imitá-lo. no , o episcopado pediu, unanimamente sua promoção
Defendeu seus sentimentos e sua pessoa contra os i- ao doutorado, o que Pio IX fez em 1877. E mesmo em
novadores; celebrava o oficio na Visitação no dia no ssos dias, há muitos padres que haurem em sua fon
de aniversário de sua morte antes que fosse canoni- te a luz de sua doutrina, o ardor de seu zelo, a for
zado26. Não é de admirar, pois, que o espírito de ça de seu devotamento, a dignidade de sua vida, a
São Sulpicio esteja todo impregnado do espírito sal~ humilde e doce caridade que os leva ao serviço dos
siano. Para o padre Olier, como para Francisco de homens. Os "Padres de São Francisco de Sales", fun-
Sales, o méritb das obras, a vida, a força, o fer- dados pelo padre Chaumont, são, no clero diocesano,
vor e a alegria da alma sacerdotal têm sua fonte no uma grande familia entre nós, mas quantos religiosos
so s, como veremos, vivem ainda de sua chama! Eie con
2 5 • V e r F a i 1 1 o n , Vi e d e M. Oli en , 1 8 7 3 , t . I , p a g s . t inua sendo sempre o modelo dos bispos; o espírito
18, 38-41.
26 . Faillon, 1. e. tomo I, págs . 11-14, 36-37, 42-43,
194, 198; tomo II, pág . 216-217, 472, 475 - 478. 27 . Oeuvne-0 de M. Olien, Migue, 1856, Carta LXXI .
sacerdotal só lucra em vigor, em novidade, em pu re- inteligível que aquele que, em matéria de dis-
za e em ardor quando se retempera em sua fonte. Fe- curso, só apreciam aquilo que não entendem, queixa-
lizes os padres que aotam São Francisco de Sal es vam-se de sua demasiada facilidade, ousando chamá-
como doutor, como pai, como guia; permanecerão no -la de baixeza". Essa linguagem exata e comum torna
movimento sem cair no abismo. va nova a fisionomia dos mistérios: ele dizia, con=
tinua Vaugeles, "coisas inteiramente novas" que an-
tes "ninguém tinha lido nem ouvido dizer. Mas eram
O ESP1RITO EVANGtLGICO E A REFORMAVA PREGAÇÃO pensamentos perfeitamente judiciosos, e nunca extr~
v agantes, nem demasiadamente rebuscados, mas que t~
A influência de São Francisco de Sales se d i - cavam a alma e o entendimento e não apenas a imagi-
fundiu também no clero francês pela reforma da p re- n ação do ouvinte". A t onalidade dava o acabamento à
gação: ele foi seu primeiro e maior promotor do s é- a ção: "Ele não t olerava esse modo empolado de fala~
c u lo XVII. Os defeitos da pregação nessa época s ão q ue tantos ado tam h o j e"; most rava-se penalizado, em
conhecidos: Du Vair os descreveu 28 • A eloqfiênc i a sua fina ironia, com esses o radores trovejantes que
que então se admirava era recheada de erudição, d es " se esgotam demais a si próprios e movimentam os o~
figurada pela fábula, aviltada pela política. Pode= b ros" para voar bem alto, acima da cabeça de seu au
mos constatar na Estoile a que truculências se re- ditório. Variava sua voz naturalmente, elevava-a, a
baixavam os credores da Liga no tempo em que o pre- b aixava-a, dava-lhe o tom de um conversa elevada e
boste de Genebra elevava a palavra evangélica, em o caráter de um colóquio; tinha o gênio do diálogo
Chablais, ao nível de seu Memo~iaf. Em 1619, em Pa- e introduzia seu ouvinte em seu jogo, de tal forma
ris, ele estava em posse de sua arte e de seu poder que cada qual tomava para si "o que era dirigido a
oratório. Foi então que melhor trabalhou sobre o e~ t odo o auditório": é o que denominava "falar a seu
pírito da pregação. Devemos julgá-lo pela audiç ã o, h omem: affoqui hominem" (p. 29, 31).
não pela leitura de seus sermões que eram rápida e
imperfeitamente redigidos, geralmente simples r asc u Acompanhemos também São Vicente numa dessascon
nhos. v resas em que o "grande santo do grande século" se
t orna discípulo do bispo de Genebra. Qual é sua im-
p ressão? Estes dois homens, tão diferentes por sua
Entremos numa igreja em que ele está pregan- or igem, pela idade, pela cultura e função, compene-
do, aproximemo-nos de Vaugelas que está ou'Vindo e t ram-se, amam-se e estimam-se infinitamente. O futu
perguntemos sua opinião à saída do sermão: "Ele não ro fundador da Missão, que nessa época ainda tinha
disse uma só palavra que não tivesse utilidade. Sua "mau humor", hauria a doçura de seu amigo. "O fer-
linguagem era nítida, concisa e poderosa em persua-
são. Mas, sobretudo, era exímio na propriedade das v or do servo de Deus, diz-nos ele, brilhava em seus
palavras, das quais fazia uma escolha tão exataque c olóquios íntimos e familiares. Aqueles que o ou-
era o que o tornava tão lento e demorado para se v iam ficavam suspensos em seus lábios. Ele sabia a-
explicar". Ele se tornava "tão familiar e tão c omodar-se à capacidade de cada um, considerando-se
t ributário de todos"; "eu era inclinado a ver nele
o homem que melhor reproduziu o Filho de Deus vivo
na terra" (p. 27).

Cf. tloquen~e 6~ancai~e, edição crítica de Rene


São Vicente de Paulo admirava em seu amigo, prin
28. c ipalmente, o dom que possuía de comunicar aos seus
Radouant, e seu estudo sobre esse tratado, Pa-
ouvintes "a suavidade da fé'': "Explicava tão bem e
ris, s. d., in-89.
t ão claramente os mistérios mais sublimes e mais
obscuros que todos os seus ouvintes, convencidos, o que di6ic..ilmente podem -0en enc..ontnada-0, -0ão e-0c..ân-
escutavam com uma suave facilidade. O que, logo de dalo-0 e gnande-0 e-0c..ândalo-0. Vinão: ele-0 têm tempo
início, encantava os hereges, mesmo os mais obstina de -0obna, ele-0 -0e entnegam ao diventimento. Ide, di
dos ... ". Suas palavras eram como "flechas de fog~ poi-0 di-0to, pnegan a monti6ic..ação: c..açoanão do pne
que inflamavam", mas, na realidade, todas "as suas gadon ... A c..aça ê completamente pnoibida. O me-0mo
ações eram como sermões" (p. 24). Era, diz ainda, digo da-0 de-0pe-0a-0 -0upên6lua-0 c..om 6e-0ta-0, noupa-0, li
"um Evangelho vivo". vno-0; pana leigo-0 -0ão luxo, pana bi-0po-0 -0ão gnandeJ
pec..ado-0. Ele cita, para apoiá-lo, São Bernardo: "Os
De onde lhe provinha essa suave força? Francis pobres gritam para nós: é o nosso bem que estão des
co conta-lhe o segredo, confiando-lhe "que não po= perdiçando; cruéis, arrancam de nós aquilo que gas=
dia ler seus próprios escritos sem chorar, ao pen- tam futilmente'' 29 • Como inemo-0 nepneenden 0-0 luxo-0
sar que as páginas saídas de sua pena vinham não de do mundo -0e exibimo-0 0-0 no-0-00-0? Mas estar sem peca-
seu espírito, mas do Deus de toda bondade ... Notei, do, ser aparentemente irrepreensível, não basta: é
dizia ele de seus sermões, que, sem iniciativa pes- preciso ser santo interiormente: Nunc..~ -0e deve p~e-
soal, sem premeditação, pelo efeito de um impulso di ga~ -0em ten c..elebnado a mi-0-0a ou -0em ten a inten-
vino, ensino nas pregações verdades que ignoro com~ ção de c..elebnâ.-la. Não podemo-0 imaginan, diz São Cni-
pletamente" (p. 24). E isto nos faz compreender co- -0Ô-0tomo, quanto a boc..a que nec..ebeu o Santo Sac..na-
mo Francisco de Sales, ao reformar a pregação, re- mento ê honnZv el pana 0-0 demônio-0. . . Temo-0 muito mai-0
formava o clero e, pelo clero, o povo fiel. Era o -0egunança, 6envon e luz ... Pelo meno~ ê nec..e-0-0â.nio
espírito do Evangelho que passava em sua palavra, e ten -0e c..on1e-0-0ado, caso contrário Deus poderia nos
este espírito renovava a pregação ao renovar os pre dizer o que disse ao pecador: "Que te adianta nec..i-
gadores. - tan meu-0 pnec..eito-0 e ten minha aliança na boc..a, uma
vez que detuta-0 a di-0c..iplina? (S1 50,16). E são Pau
O padre, com efeito, antes de reformar sua p a- lo castigava seu corpo para não ser recriminado de~
lavra, deve reformar se coração, pois nada é ma is pois de haver pregado a lei aos outros (XII, 302-303).
sublime do que a missão do pregador do Evange- Palavras luminosas, palavras fortes, que tocavam os
lho: ele ocupa o lugar e continua o trabalho de espíritos e resistiam a grandes escândalos. A carta
um Deus que fala de Deus, para empregar a pal a- a Frémyot, que continha esses conselhos, teve gran-
vra de Bérulle; deve despertar nos cora ções e s- de repercussão.
se Amor que é o próprio Deus. Como o fará se e le
próprio não estiver enamorado rlele? t por es sa Esta lição, de fato, foi aprendida. O padre
perspectiva que o espírito salesiano se revelará Caussin, em sua Retônic..a, repete-a, toda a Compa-
mais inovador: Ninguém deve p~egan -0 e não t iven nhia de Jesus melhor do que nunca inspirou-se nela,
uma vida c..onneta, ensinava o santo, e por vida eo~ o Oratório seguiu por esse caminho, numerosos bis-
n eta entendia como São Paulo: Opontet epi-0c..opum eI pos a seguiram: tivemos São Vicente de Paulo, opa
-0~ innepnehen-0ibilem (1Tm 3,2). Ob-0env o que ê nec.. e~ dre Le Jeune, Lingendes, Bourdaloue, Bossuet. Fran=
-0anio que o bispo, que o pregador, não apenas não c~ cisco de Sales, ainda aqui, é o lider; o fim que e-
metam pecado mortal, ma-0 que também, além di-0-00, evi- le propõe ao clero do século XVII é 0azen o que No-0
tem c..ento-0 pec..ado-0 veniai-0 e atê me-0mo c..~nta-0 açõe-0 -00 Senhon veio 0azen ne-0te mundo: dar a vida e no=
que nªo -0ão pecado ... Um leigo pode jogan, c..açan, -la dar em abundância; o 6im do pnegadon, poi-0, ê
-0ain a noite pana in c..onven-0an, e nada di-0-00 ênepneen que 0-0 pec..adone-0, monto-0 na iniqllidade, vivam na
-0Zvel -0e 6eito pon di-0tnação, não ê pecado de 0onmã
a~guma. Ma-0 num bi-0po, num pnegadon, -0e e~ta-0 açõe-0
nao 6onem ju-0ti6ic..ada-0 pon e.em mil c..inc..un-0tânc..ia-0 29. De monibu-0 epi-0c..., II, 7.
jultica, e que ol jultol que tim a vida elpihituat O CRISTOCENTRISMO SALESIANO
a tenham ainda mail abundantemente (XII, 303-304).
Ao reformar a pregação, Francisco de Sales restabe- Quando penetrou no círculo Acarie, em 1602, po
lecia, pois, a santidade sacerdotal e, por meio de- d e distinguir aí, como vimos, duas tendências: uma
la, a verdadeira religião. Seu espírito de apostola "abstrata", orientada para a união divina pura, ul
do evangélico penetrou, de fato, no coração de uma tr a passando todo conceito, que era a tendência de
multidão de padres, sobretudo em São Vicente de Pau canfeld; e a tendência que se poderia denominar, em
lo, que extraiu de sua doutrina e de seu modo o fa= contraposição, de "concreta", a de Madre Teresa, p~
moso "pequeno método", praticado com tanto frutopor ra quem a humanidade de Jesus permaneceia no centro
Bossuet na missão de Metz. da devoção. Francisco de Sales era teresiano.Bérulle
pertencia,então, à tendência abstrata; em 1608, filiou-
Ele foi, principalmente, o mestre de Bourda- -se ao cristocentrismo e procuraram-se as causas des
loue, que via nele "o orãculo e o pregador da Fran- sa conversão. Penso que seu amigo não foi estranho a
ça", "o modelo dos prelados", "o defensor da verda- essa nova orientação que fez dele o fundador da es-
deira religião", "numa palavra, o ornamento do sécu colafrancesa. Em 1622, ao ler aos originais dos Vil
lo" e o santo "que instruiu todo o mundo cristão so QU.~lol do eltado e dal ghandezal de Jelul, que sõ
bre os deveres da verdadeira piedade" ( Oeu.vhU, 1878, foram publicados em 1623, o bispo de Genebra censu-
III, 387-388). rou discretamente o ardor combativo de Bérulle, mas
admirou muito leu. thabalho neltel Qomeçol e o apre-
Bossuet louva também essa feliz influência de ciou in6initamente (XX, 376-377). Sobre o cristocen
são Francisco de Sales sobre o espírito religioso trismo, pois, estavam plenamente de acordo e pode=
da França, por sua "ciência" como "doutor e prega- ríamos estabelecer um interessante "paralelo'', es-
dor", por sua "autoridade como bispo", por sua "co~ crevia Houssaye, entre o Thatado do amoh e o das
duta como diretor das almas": "Não podemos imagi- Ghandezal 30 • A que se deve esse cristocentrismo sa-
nar o número de ovelhas errantes que ele trouxe de lesiano, do qual se irradia o espírito que vai rea-
volta ao rebanho. Isto porque sua ciência, cheia de vivar a devoção do grande século e que renasce em
unção, só brilhava para aquecer. Dardos inflamados nossos dias?
saíam de sua boca e iam penetrar no fundo dos cora- Henri Bremond disse que Bérulle fez uma "revo-
ções. Ele sabia que o calor penetra muito ~ais pro- lução copérnica" ao trazer Jesus, o "sol de justiça",
fundamente do que a luz ... Era esse benéfico calor para o centro de formação. Não se pode, no entant~
que dava tão grande eficãcia às suas divinas prega- imaginar uma piedade autêntica que não tenha o Sal-
ções ... ". Ele fez renascer, por . meio dessas chamas, vador como objeto central; toda a teologia, toda a
o fervor cristão. Pode-se dizer que, antes dele, "o espiritualidade, toda a liturgia, desde as suas or~
espírito de devoção quase não era mais conhecido e~ gens, giram em torno do Cristo, mas o cristocentri~
tre as pessoas daquela época. A vida interior e es- mo pode assumir duas formas, dependendo de o Senhor
piritual era relegada aos claustros e era tida por ser considerado como modelo de nossa vida, ou depen
demasiado selvagem para aparecer na corte e na alta dendo de ser considerado como o phinQipio, por sua
sociedade. Francisco de Sales foi escolhido para ir pre sença e sua ação misteriosa em nossas almas na
buscã-la em seu retiro. Trouxe novamente a devoção Igreja. Temos, assim o cristocentrismo devoto, o da
para o meio do mundo" ( Oeu.vhel Ohat. , Édi t. Lebarcq,
III, 581).

30. Cf. Houssaye,Vie de Bê.hu.J.'..le_,tomo II,p.426, n. 2.


Imitacão, e o cristocentrisrno místico, que conside seu Mi6têttio de JeJ.iuJ.i, de urna Teresa Martin, de
ra o MiJ.itê.ttio profundamente. Segundo esta última vi Charles de Foucauld; também aqui, Francisco de Sa-
são, não estamos apenas em contato com Jesus, mas les é líder na França.
somos um com Ele, formamos com Ele, diz São Torná~
urna "só pessoa mística". Na realidade, foi o mais Ele já tinha ess a idéia desde 1602 . Se Maria
rigoros dos teólogos quem nos forneceu a fórmula morre da morte de Jesus, é porque primeiramente ela
desse cristocentri.smo místico. De acordo com São To vive de sua vida: No J.JJ.ia Senhotta tinha uma J.JÔ vida
más, que organizou o pensamento de São Paulo e dos com J.ieu Filho ... Ettam na vettd ade duaJ.i p~66oaJ.i ...
Padres, o Cristo e seus membros forma um único ser maJ.i em um cottacão, em uma alma, em um eJ.ipittito, em
espiritual, e de tal forma que "a justificação do uma vida. A Virgem é o protótipo dessa união unifi-
Cristo pertence a todos os fiéis corno aos seus mern cante; todos os cristãos e ram também apena~ um co-
bros" (3ª, q. 48, a. 2, ad 1m). Ora, é pela fé que ttacão e uma alma, em Jerusalém, em torno de Maria,
a vida do Cristo nos é comunicada. Realizar a fé Esta unidade é o resultado de urna misteriosa miJ.i-
viva é tornar consciência dessa comunhão de vida que tutrn e de um ttelacio namento doJ.i cottacõ u (VII, 443).
nos vem de Jesus e que nos anima a viver da própria Assim, pela geração do Pai no Espírito, nós somos
vida de Jesus na Igreja e pelos sacramentos da I- ittmãoJ.i utettinoJ.i do Cristo e, pela gettacão up~ual
greja. Esta vida de Jesus é a vida eterna do Pai realizada por Jesus, descendemos do sangue deste se
comunicada pela Encarnação ao mundo: urna vida que gundo Adão: assim, J.JomoJ.J todoJ.i membttoJ.i de um meJ.imo
nos eleva da terra ao céu, na glória onde nossoSal cottpo; J.iomoJ.i ittmãoJ.i; por tal motivo, não deve haver
vador foi preparar um lugar para nós, donde o dina em nÔJ.i todos J.ienão um J.JÔ cottacão e uma J.JÕ alma; des
mismo do Amor que vimos. O cristocentrisrno místico ta forma, Jesus nos está rnisticamente presente e nós
está, pois, integrado a um teocentrisrno poderoso: a Jesus, e eJ.ita ptteJ.ienca ê ttealizada pott acão do in
"Todo o teocentrisrno beruliano, foi dito, aí se en telecto e da memÕttia, animada pelo amor, pottque o
contra" 31 • É também todo o teocentrisrno salesiano-; amott pttoduz ~xtaJ.ie, J.iai de J.ii meJ.im~ ê tttanJ.ipotttado;
antes de Bérulle. Nesta concepção da vida cristã, o a alma J.ie enconttta maiJ.i onde ela ama do que onde a-
ponto preciso da obra espiritual consiste numa ade nima. Esta presença termina e se consuma na canunhão
J.ião vital a Jesus, que nos torna participantes do eucarística, porque Jesus entra em nós como entttou
que Ele noi e do que Ele ê. Realiza-se por rneiodes no Cenáculo, eJ.ipittitualmente, inviJ.ilvel, mas tteal-
sa ine~ão - termo salesiano - uma transmutação es= mente (VII, 443,281, 216s, 362-363, 295). O fato
piritual de vida, que leva São Paulo a diz~r o fa- de essa grande idéia datar dos primeiros anos do a-
moso vivo jam non ego, tão freq~enternente repeti- postolado salesiano é de singular importância em re
do por São Francisco de Sales. A idéia dessa comu- lação a Bérulle e a todos os seus seguidores. Deste
nhão dos santos no Verbo encarnado esclarece, pois, modo, o cristocentrisrno francês está ligado a São
a espiritualidade do cristocentrisrno místico; a prá Francisco de Sales.
tica dessa espiritualidade nos faz compreender a
psicologia dos cristãos que dela vivem: a psicolo Esta idéia esclarece, sobretudo, a psicologia,
gia de urna Teresa de Avila, de urna Francisco de Sa o comportamento, a inspiração do santo, sua direção
les, de um Bérulle, de um Condren, de um Pascal em e sua influência. SÓ podemos indicar aqui o princí
pio desse cristocentrisrno afetivo que unia Francis=
co de Sales a Jesus de um modo tão terno, tão forte,
tão eficaz e que o levava a abrir para os grandes
31. Huijben, La J.ipittitualitê nttancaiJ.ie au XVII e espiritualistas de sua época um caminho real para o
J.Jiecle, Vie spirituelle suppl. tomo XXVI, págs. coração do Cristo. Sua união com os mistérios da In
21-27. fância, com o zelo, com a agonia, com a cruz, com
os triunfos de Jesus tinha essa qualidade de p erfei <leal da caridade sobre a primeira forma, o bispo de
ta ine66ão: ele vivia esses mistérios e fazia Cambrai sobre a segunda, Francisco de Sales sobre.Um
com que o vivessem aqueles que o seguiam; propor texto capital de Bossuet esclarece o debate: "O que
cionou, deste modo, urna alma à espiritualidade é comum entre o amor profano e o sagrado, porque per
de seu tempo. E esta espiritualidade revive de mo tence à natureza do amor, é desejar a posse do que
do surpreendente em um Charles de Foucauld, mais os novos místicos excluem como estranho e interessa
ainda talvez do que numa Santa Teresa do Menino Je- do, e só abandonam sua comparação quando a consideram
sus e da Santa Face. O forte de sua doutrina não é correta" 3 2 • Bossuet acaba por compreender que esse 9-e
contemplar o Cristo, nem mesmo imitá-lo enquanto per sejo de posse pode ser purificado de todo amor-pro~
manecernos senhores de nós mesmos, mas deix ar que E= prio no perfeito amor: "É, pois, amar a Deus verda-
le reine em nós: Eu vi um dia, diz ele, uma imagem deiramente e, por sua bondade, amar essa soberana
devota; ena um Qonacão 6obne o qual o pequeno J e6u6 bondade no exercício que ela prefere, que é ode rea
e6tava 6entado. Este símbolo lhe agradou: pediu que lizar nossa salvação" 33 • E Fénelon, no fim, também
o colocassem no frontispício do seu Tnatado. Jesus admitiu, com Francisco de Sales, que a esperança e-
reinando em nosso coração, animando-o, elevando-o, xiste, sublimada, no ato do puro amor, já que num
transformando-o e imortalizando-o no Amor eterno do tal ato amamos a Deus pon 6ua bondade, que é boa t~
Pai, tal é o centro e o segredo de seu espírito, a to em si mesma como para nós: como eu deixaria de
lei de sua ação, a finalidade de seu zelo e,tarnbém, amar meu amigo, bom em si mesmo e bom também para
J objeto de seus desejos. Toda a espiritualidade mim? E como esse motivo poderia macular com um in-
~ristológica do século XVII está também ligada, pois, teresse sórdido meu amor para com ele? "Quando as
1 São Francisco de Sales. amantes perfeitas, precisa finalmente Fénelon, <lese
jam a beatitude por meio de atos de esperança que a
caridade comanda expressa e atualmente, estes moti-
vos não são seguidos como simplesmente virtuosos,
~ PURO AMOR E A ESPERANÇA mas como queridos, aceitos e estimados por Deus.
Estes atos virtuosos, segundo São Tomás 3 4 , adquirem
Francisco de Sales, em Paris, entrou no cami- a espécie e passam para a espécie da própria carida
1ho do puro amor pela porta do desespero; saiu da de. Dizem respeito atual e expressamente à glóriade
,ida deste mundo pela soleira da esperança. Deus em nossa beatitude, e não consideram nossa bea
• titude a não ser para a glória de Deus ... Nun~a di=
Essa questão do puro amor e da esperança oca- zemos que vamos a Lião, mas a Paris, quando só va-
3ionou mui tos escritos sobre o combate do quietismo, mos a Lião para ir a Paris ... Assim, na linguagem
nas o doutor da caridade é inocente neste caso. Foi de São Francisco de Sales, a beatitude é como Lião
1ele colocado por Fénelon (1651-1715), d~le saiu e a glória de Deus é como Paris" 3 5 • Desta forma, Fran-
iirninuído na opinião pública, que nem sempre é sen-
3ata. Esta polêmica de Bossuet e Fénelon revela, so
)retudo, dois espíritos, duas visões: Fénelon mais
3util, mais sensitivo; Bossuet mais racional, mais
:onceitual; Fénelon dá muita importância à experiên ê.tata6 d' onai6on, 16 9 7 ,
:ia dos "novos místicos", Bossuet suspeita deles. No 3 2. In6tnuQtion 6un le6
)lano teológico, os dois antagonistas partem de urna p. 168.
1oção diferente do amor. A psicologia moderna dis- 33. L. e., págs. 281-282.
:ingue duas formas de amar: o "amor captativo" e o 3 4 • Summa, 3a, q. 85, a. 2 ad Im; 2a 2ae, q.154, a.8.
'amor oblativo", o bispo de Meaux construía seu i- 35. Fénelon, Oeuvne.6, 1851, tomo III, págs. 385-386.
~isco de Sales, melhor compreendido pelos
tntagonistas, teria podido evitar esse drama dois
Só o fato de ser a "filha única" do d b'
:ismo, que anunciou a retirada dos místicos. do qui~ ·-
po Ja a co 1 ocava em singular
· g r an e is
relevo, mas seu -
- . e sua san t.ida d e con f eriam-lhe incom
seu genio va 1 or'
-
. . para-
O doutor do amor falava sobre o valor, a neces vel briho tanto aos olhos dos humildes como aos dos
;idade da "santa cobiça"; o eixo de seu pensamento grandes. Por toda parte, em suas numerosas viagens
!ncontrava-se nesse desejo de possuir a Deus, que é aquela que havia fundado sua instituição baseada n~
t própria alma do amor. Mas, na aventura da carida- "pequenês" e na "humildade", era recebida com hon-
te, o desejo da posse se transforma em um arrebata- ras que só a ela surpreendiam. Ora, em todas essas
1ento que nos faz encontrar a felicidade precisamen cidades, Lião (1613), Moulins (1616), Grenoble (1618),
:e na glória desse Deus que nos arrebata e nos bea= Bourges (também em 1618), Paris (1619), quais saté-
:ifica por esse próprio arrebatamento. Essa trans- lites em torno de um sol, os cristãos mais fervoro-
'ormação não suprime a esperança, mas a eleva ao ní sos giravam em torno dela. E essa mulher magnífica,
'el do puro amor, como percebeu finalmente Fénelon~ plena de lucidez, de retidão e de bondade cativante,
: o caro santo, na hora em que o seu amor estava no conquistava-os para a causa da devoção: as Memórias
Luge, avançou para a morte na mais confiante sereni de Madre Chaugy dão testemunho disto.
lade: Sem dúvida, -0empne e-0tou atento à EtennidadI
om muita man-0id~o. Poi-0, como podenia minha alma Depois da morte de São Francisco , ela era con
-0tenden -0eu conhecimento a e-0-0a in6inidade -0e não siderada como a verdadeira relíquia viva de sua dou
:ive-0-0e alguma e-0pêcie de hanmonia com ela? Ê -0em- trina e de seu espírito: de todos os lugares recor=
1ne nece-0-0ânio q~e_a 6aculdade_que_atinge um objeto ria-se a ela como à 6onte. Sua palavra, suas deci-
:enha alguma e-0pec~e de conven~enc~a com e-0te. Ma-0 sões, seus conselhos tinham sobre todo um mundo de
uando -0into que meu de-0ejo pen-0egue minha cogita- religiosas, de padres e de leigos, uma autoridade
ão -0obne e-0-0a me-0ma Etennidade, minha alma adquine quase inacreditável. São Vicente de Paulo, seu novo
m de-0envolvimento -0em igual, poi-0 -0ei que apena-0 diretor, a venerava, e Angélica Arnauld também; o
u ej amo-0 com du ej o v endadeino a-0 coi-0 a-0 po-0-0Zv ei-0. irmão do santo, e seu sucessor, João Francisco de
eu de-0ejo, pontanto, me ganante que po-0-00 po-0-0uin Sales, a considerava como o seu Moisés. Para com-
Etennidade. Que mai-0 me 6alta pana que a obtenha? preender a amplidão dessa influência, basta notar que
-0to me ê concedido pela in6inita bondade daquele a essas fundações acorriam os mais zelosos da nobre
ue não tenia cniado minha alma capaz de peni an e za e da burguesia: esse meio se mostrava receptivo~
e tenden pana a Etennidade -0e não tive-0-0e quenido freqflentemente desejoso de vida espiritual. Toda u-
he dan 0-0 meio-0 pana atingi-la (Á. Lhuillier,
5) •
P. ma clientela de gente humilde também inundava esse
ambiente. Ora, por ocasião da morte de Santa Chan-
tal, tanto na França como no estrangeiro tinham-se
fundado oitenta e sete focos de devoção salesiana,
A IRRADIAÇÃO DA VISITAÇÃO no fim do século XVIII, eles seriam cento e quaren-
ta e sete.
A ação renovadora de São Francisco de Sales so
re a religião de seu tempo estendeu-se ainda àFran A Visitação correspondia, pois, a uma grande
a e à Europa ocidental por intermédio da Visitação. necessidade de vida espiritual sob a nova forma con
urante a vida de seu Pai, e durante muito tempo à- cebida pelo bispo de Genebra. Bossuet tinha excep=
ós sua morte, Joana de Chantal (1572-1641) fez-se cional estima por ela: "A Congregação das Filhas de
ua apóstola por sua irradiação pessoal e por tan- Santa Maria, declarava-lhes ele, é a menor, a mais
as fundações que estabeleceu, principalmente, na humilde. No entanto, eu vos digo sinceramente, edi~
rança.
te de Deus, que, depois de ter lido e relido vossas
-.
!gras e Constituições, não encontrei em todas as se j a m as da santa di l eção" 37 • • • Quando a peste ir-
ttras nenhuma que contivesse práticas tão santas. rompe u furi osame n t e n a Sabóia, em 1 629, e a pe sa r da
lmirei a sabedoria de vosso santo fundador, que aí insistênci a dos pr íncipe s de Ca rign an, n ada c ons e-
>locou a mais sólida santidade. Tudo aí é tão guia fazê - la sair "dess e ar in f e cto", o q u e motivo u
.ncera, tão profunda, tão visível e tão santa seu bispo, João F r ancisco de Sales, a se d ec idi r "a
inte ordenado que se pode dizer que é um res~ e x pôr sua pessoa, sua v ida e seus meios para soco r -
, de toda a conduta espiritual. Esta é a obra des- rer e da assistência ao seu povo". A santa colocou
grande homem, a admiração de nosso tempo, desse a seu serviço os recursos da comunidade. Todos os
mem todo divino e cujo coração estava tão abrasa- dias, os auxiliares de Sua Excelência vinham buscar
, desse homem digno dos primeiros séculos, masque "as sopas e outras coisas" que ela "mandava prepa-
us reservou para este século corrompido a fim de rar para os pobres e para os doentes". As Visita-
e fosse a sua luz e o restabelecesse na discipli- ções de Paris, de Lião, seus amigos, enviaram di-
" (Ibid. VI, 274). Atingimos aqui a causa dessa nheiro para auxiliá-las. Corno o mosteiro es tava mui
radiação salesiana pela Visitação: o santo renova to desprovido de trigo, as irmãs começaram a comer
ai o espírito religioso pela ascese interior,que pão preto para poder continuar "a esmola cotidiana
z renascer e desenvolver a autêntica caridade;ele e geral". As ecônomas garantiram que, "meses a fio,
ansferia a necessária austeridade de fora para d~ o trigo foi milagrosamente multiplicado''. No entan-
o; castigai o coração e não o corpo, sempre repe- to, a Madre de Chantal dizia que esse pão preto, "co
a; e castigava-se o coração de verdade! mo era temperado com a caridade, tinha um gosto tão
saboroso que ela nunca provara outro melhor" 3 8 • Per
Ora, essas chamas eram comunicativas. Muitas cebemos, por meio dessas palavras, a atmosfera em
mílias religiosas solicitavam às visitandinas a que brotou a caridade da qual São Vicente foi o ge-
udá-las a reencontrar o fervor: "as religiosas de nial organizador.
ssa Senhora da Caridade de Caen, as bernardinasde
ermont, as ursulinas de Brives, as clarissas de Já falamos da profunda amizade desses dois san
rascon e de Avignon, as agostinianas de Toulouse, tos, mas não podemos omitir aqui uma passagem escla
irmãs da Providência de Montpellier, as religio recedora e muito pouco conhecida. Vicente de Paulo-;
s do Hôtel-Dieu de Blois" 36 • Para que as Damas de antes de 1619, sofria de mau hu mo~ ; a ve rdad e ira
~- Luís, encarregadas da Casa de Saint-Cyr, fossem caridade", representada "ao vivo" no bispo de Gene-
rrnadas na vida religiosa, Luís XIV e a Sra.de Main bra, o transtornou; via-se, repetia ele, a bondade
non recorreram às visitandinas . de Deus "sensivelmente através da sua'' (Oe.uv~ e.~, III,
493). A partir de então, ele se inspirou nos exem-
Foi sobretudo pela caridade efetiva que as vi- plos de seu santo amigo, sobretudo na bondade, con-
tandinas espalharam o espírito salesiano no mundo. descendência, afabilidade, mansidão, serviçalismo:
J Vicente pediu-lhes para dar apoio moral, formar "Enfim, eu me propus a me deixar ~odelar da maneira
1irigir as religiosas de Santa Maria Madalena do que nosso bem-aventurado Pai o faria" (L. c., I, 6 3) .
3po de Montry. A Madre de Chantal aquiesceu debom Enfrentou seu "humor seco e desagradável", orou "in
2do: "A mansidão de nossa Instituição, respondeu- sistentemente a Deus para lhe desse um espiritobran
1e ela, não pode suportar outras cadeias que não do e benigno" e, "pela graça de Nosso Senhor, diz e-=
le, com um pouco de sacrifício que fiz para repri-

. Joppin, Vi~i~a~ion, 1959, p. 50. 37 . e os t e , M. Vi n e. e. n~,


t o mo I I I , p. 24u s .
38. Chaugy, págs. 256-260.

1 Ar\
ür as explosões da n a tureza, perdi um pouco do meus às vi s itand i nas reconstruir suas casas na França, com
1au humor" 3 9 • E sua ma nsidão, fina.lmente, t ornou-se a condi ção de que criassem obras de utilidade públi
:al que era comparada com a de São Francis c o de Sa- ca: mui t as s e d edicaram à educação de moças; pude=
Les. ram, desta forma, ma nt er a co r ren t e da v i da r e li-
giosa e sua infl u ênc ia s e f ez s e ntir um pouco p or
A partir dessa conversão ao amor complacente e t oda parte, sej a n o s meios d a j uve n tude , se j a na
;ondescendente, São Vicente vai encontrar de cidida criação de tantas institu ições relig iosas q ue f l o -
1ente seu caminho providencial. Bremond diss e muitÕ r esceram por vo l ta d e 1830. Fo i d e st ac ado o pa re n-
)em: "Não foi o amor dos homens que o conduzi u à san t esco espiritua l de Sa nta Tere sa de Lisi e ux com São
:idade; foi, antes, a santidade que o tornou verd a= Francisco de Sal e s: a Madre Inês, su a "mã e zinha", ha
leira e eficazmente caridoso; não foram os pob r e s vi a efetivamente recebido s ua f o rma ç ão sal e siana na
1ue o deram a Deus , mas Deus pelo contrário, que o Vis itação de Mans. Um estudo minucios o do impul so re
leu aos pobres" (Bremond, III, 246). Também a q ui a li gioso do século pa s s ado n o s r e vel ar ia mu i tas in=
Lnfluência de São Francisco de Sales parece evid e n- fl uências semelhantes 41 : a graça dos santos não mor
te. Vicente de Paulo tomou conhecimento da prime ira r e e sua fecundidade é admirável. Nós aind a a encon
Lntenção de seu amigo sobre a Visitação e de s eus tr amos na renov ação das instituições religiosas mo=
io i~ 6in~ p11.in~ipai~ : proporcionar o bem da vida de rnas.
religiosa a "frágeis mulheres e visitar os pobr es
= os doentes; em circunstâncias providenciais, d i an- Francisco d e Sales, como vimos, f racassou em
te da imensa miséria da França, ele adotou esse p r o seu propósito de formar uma sociedade de padres ani
?Ósito, mas adaptou-o às necessidades e aos recur= mada por seu espírito: esta graça só lhe foi conce=
3Os de um grande pals 4 0 • <li da após sua morte. M. Banal (1600-1653), um Rouer
gat de Villefranche, instituiu a "Sociedade dos Pa=
Como superior da Visitação, como diretor espi- dres da Visitação e de São Francisco de Sales" . Ela
Litual da Madre Chantal, bebendo sem cessar nas fon não s obreviveu à Revolução, mas, em 1838, D. Rey, bis
tes salesianas, deu, naturalmente, dessa água viva po d e Annecy, deu a investidura aos "Missionários de
is suas "Filhas da Caridade", que chamavam Francis- São Franc isco de Sales", fundados à sombra da Visi-
co de Sales, como ele próprio aliás, de "nosso Pa i ". tação, pelo padre Mermier, que realizou, deste modo,
rodos os dias elas liam um capitulo da Int11.oducão, o sonh o do santo de ir levar às índias e à Inglater
e São Vicente constatou, em 1641, que essa • prática ra a fé católica: seus filhos erigiram no Orient~
lhes era "de grande proveito''. Todo o grande mov~- o vasto e próspero vicariato de Vizagapatan 4 2 •
mento caridoso do século XVII nasçia, pois, da ami-
zade desses dois santos e de uma concepção idênti-
ca do amor efetivo.
4 1 • Esta influ~ncia é notável em Santa Te.resa dv Me
nino Jesus e em Santa Emília de Rodat. É sur=
AS FAMÍLIAS SALESIANAS pre e n dente também na vida da Madre Conduché, fun
dado ra das dominicanas d o Rosário, formada pelas
A influência salesiana da Visitação não foi e~ Filhas d e Nossa Senhora, e estas, por sua vez,
tinta pela Revolução. Napoleão, em 1806, permiti u formada s, depois da Revoíução, pelas visitandi-
nas. Tais casos não são raros. Cf. Lajeuni e , La
39. Coste, 1. c., torno I, p. 1 38. Prieu re de Bor, Monteils ( Ave ~ ron)
40. Coste, 1. c., p. 108, n. 1•
42. Ver J. Rey , Lu mi~ ~i oncú11. u de. ~ai nt F11.ancoi~
de. Sa.tu, 1 9 s 6.
Os "Oblatas de São Francisco de Sales", funda- O espírito salesiano anima ainda numerosas con
perto da Visitaçãode Troyes pelo padre Brisson gregações ou associações, modestas, discretas, mas
~17-1908), foram animados pelo mesmo espírito de tão ativas quanto as abelhas e muito caras ao san-
~idade conquistadora em seu apostolado na África, to: as "Irmãs de São José'', em numerosas dioceses;
Equador, no Brasil e no Oriente Médio. as "Irmãs da Caridade", de Santa Joana Antide Thou-
ret; os "Filhos de São Francisco de Sales", funda-
O padre Brisson, sábio, matemático, inventor, dos também por M. Chaumont; as "Filhas de São Fran-
Lido teólogo, era animado por grande espírito de cisco de Sales", criadas pela Madame Carré de Mal-
ridade social: fundou, para as jovens, as primei- berg; as "Confrarias de São Francisco de Sales~• Não
3 oficinas de caridade na França e, para estas o- podemos citar tudo, mas esta fecundidade prova quan
:::inas, juntamente com Léonie Aviat, a "Congrega- to o doutor do amor permanece vivo entre nós: sua
J das Oblatas de São Francisco de Sales" 43 •

O padre Mermier havia também criado as "Irmãs


Cruz" de Chavanod, na Sabóia, a fim de auxiliar -~-
e!~ - .;.~~~~..,
~ .
apostolado de seus missionários. Renascia, assim,
mundo das mulheres, o ideal da primeira Visita- -«~~,,, , '
~ '"· -
-,;;, ;,,,- '"\
º·
A mais célebre dessas fundações é, sem dÜvida
guma, a dos "Salesianos e Salesianas de São João
sco" (1815-1888). Esta fami l ia abrange todas as
rmas modernas de apostolado: o ensino, a imprensa,
lares sociais, as casas de reeducação, as esco-
·,. .... ·-
~
~
---
)1,

s profissionais, a obra das vocações tardias, as


ssões na América, no Oriente, na África. Contacom
is de vinte mil religiosos e perto de quarenta mil
ligiosas. Violento por natureza, Dom Basco admira
a mansidão salesiana: esta mansidão, juntamente
,mo incansável amor do santo bispo, ele se e sfor-
,u por imitar. Adquiriu, deste modo, "o que pare-
a faltar mais ao seu temperamento robusto, dema-
ado consciente de sua força e de seu valor: o do-
_nio de si, a calma diante da injustiça, a igualda
! humor, o uso constante da bondade" 44 • Conhecemos
vigor com que soube transmitir esse espírito sale
.ano aos seus filhos.

l• Ver P . D u f ou r , Le. P. Lo U.--<..!.i BtLiJ.i J.i o n.; Pari s, 1 9 5 7 •


f. H. Ghéon, Sa..i..n.t. Je.an. B01.ic.o, 1935, págs. 148-149.
Cf. também A. Auffray, Un. gtLan.d êdu.c.at.e.u.tL, J.ia--<..n.t. Padre Luis Brisson (1817-1908)
Je.an. B01.ic.o, Lião, 1953; F. Veuillot, Sa..i..n.t. Je.an. Fundador dos Oblatas de São
B01.ic.o e.t. lu 1.ialê-6..i..e.n.1.i, Paris, 1943. Francisco de Sales.
tília espiritual na Igreja de hoje é, sem dúvida, Basta amar. Trata-se de amar, mas como ? Muit os
1ais numerosa de todas e uma das mais devotadas duvidam do realismo do amor cristão. Nã o sem razão:
serviço do Senhor. Não nos esqueçamos, finalmen- ele é muito raro em estado puro e fervoro s o: o vi-
, que, em seus 185 mosteiros espalhados pelo mun nho nov o não fermenta muito em odres novos. Não é
, as visitandinas continuam seu apostolado de ora normal? Deus é invisível, o Cristo está aus e nte, o
), fiéis à missão que o Senhor lhes confiou em Pa próximo não é amável. A realidade do amor c e l es t e;
r: a de estabelecer nos corações o reino de seu tão visível em São Francisco de Sales, não seria u-
)r. ma exceção, um efeito do temperamento, um sucesso
raro? Não sentimos esse amor do qual fala tão terna
mente. Seria culpa nossa? E essa doutrina do amor se
PERSONALISMO SALESIANO E NUS destinaria a todos nós, ou apenas a algumas belas
almas inflamadas?
Temos de chegar, finalmente, a nós mesmos: o
e nos pode oferecer esse bom santo do tempo anti- A resposta a estas perguntas exigiria um deli-
? A vitalidade das familias salesianas nos leva a cado e longo estudo, mas podemos dizer, resurnidarnen
er que podemos dar uma resposta a essa pergunta, e te, que a aventura da santidade exige realmente ~o~
sitiva. nagem e um comprometimento total, não apenas com a
O salesianismo é, sem dúvida alguma, um perso-
,[ ação para Deus, mas com o próprio Deus, em ve rdade
e sem mentira, em humildade e mansidão. Nossa auto-
lismo: nosso doutor tem Deus como objeto, mas seu suficiência e nosso orgulho sutil se interpõem aqui
jeito é o homem, a pessoa. Ele evita um primeiro corno um véu opaco entre nossa alma e Deus: a limpi-
,ntra-senso: a pessoa não é o individuo. Evita ain dez necessária fica suprimida. Nosso doutor, com to
. um erro de perspectiva: a pessoa em sua indivi= do seu pensamento, nos ensina, pois, essa humildade
talidade, em sua relação com seu indivi~Ivel, não que revoluciona e elimina o falso personalismo do
interessa; ele não faz a ontologia da pessoa fe- orgulho; ele nos torna, assim, clara e querida essa
tada; ele é mestre de vida pessoal numa sociedade transparência, essa "diafania'', que constitui a hu-
~ pessoas; a pessoa aberta, a pessoa em sua rela- mildade, indispensável ao homem que quer ser cris-
io com as outras, eis o seu sujeito. tão sem deixar de ser honesto.

Ele considera essa pessoa aberta, na sooiedade A partir dessa transparência, o amor do Deus
ristã, em sua relação com Deus, com o Cristo, com de verdade se torna possível: não se pode, não se
Igreja e na sociedade civil, profissional, fami- quer mentir, nem mentir a Deus, nem mentir aos ho-
iar. Todas as relações do homem são objeto de uma mens, e nessa limpidez aparece a imensa relação de
ultura intlectual e moral: elas devem ser eleva- amor que nos une a todos, em potência e em direito,
as à forma da virtude, sendo a virtude no homem u- no Corpo místico do Cristo. O realismo do amor é,
a energia espiritual qualificada, estável, sólida, dessa maneira, justificado em São Francisco de Sa-
ecunda e sempre livre; o hábito pessoal é exatamen les. Sua fé viva o faz ver que entre Jesus e nós rei
e o contrário de uma rotina. Francisco de Salesrea na o Espírito Santo, que é um e que preenche todas
e, poderosamente, aqui, contra a mecanização da vi as coisas; que esse Espírito cria a continuidade, a
a religiosa e civil e contra a prevalência da jurI relação real, necessária à eficácia entre meu espí-
icidade sobre o evangelismo: todas as relações pes rito e o espírito do Salvador:eu oro ao Cristo, eu
oais, ensina ele, estão dominadas, regidas, anima= amo o Cristo e meu ato é transmitido pelo Espírito
as, sublimadas pela relação de amor, pela caridade, e, pelo próprio Espírito, o Cristo me responde pela
uja abertura e amplidão são infinitas. E isto ca- graça,por meio de inspirações que só são freqüentes,
·acteriza, precisamente, o cristocentrismo salesiano.
O OT IMI SMO SALESIANO [ O PESSIMISMO MODERNO
irceptíveis e vivificantes desde que lhes sej'amos
.éis até na ação, como o santo nos ensina. Francisco de Sales coloca , além disso, o pro-
blema do humanismo em beu se ntido dramático; ele o
O realismo de seu amor tem, no entanto, ainda resolve pela transcendência. Mas, fora da transcen-
.tra fonte e outra causa: Francisco de Sales se vê dência, que é pois o hom,-rn l~m sua natureza fechada?
vê seu próximo no Corpo místico do Senhor, na i- Sensações, trabalho, aç~o, obras fora de si mais du
:ntidade moral da pessoa mística que todos juntos ráveis do que ele, no entanto perecíveis, mas qu~
,rmamos em Jesus Cristo. Nesta visão de sua fé vi- nele próprio são, finalmente, sonhos, risos, lágri-
., Deus é igual a Jesus; Jesus é igual ao Homem,~ mas , fracasso, revolta e desespero , choro também e
, Homem, por causa de sua caridade, é igual a este a imensa tristeza da noite que se aproxirr.a... "Se
,mem, meu próximo e, preferencialmente, a este ho- minha alma pudesse encontrar apoio, dizia Montaigne,
:m que precisa de mim, este pobre despido, ou er- eu não me experimentaria, eu me resolveria." A fé
_nte, ou caído, ou prestes a cair: O que tive~de-0 nos ajuda a nos resolvermos para não nos dissolver
.ito a um de-0te-0 pequeno-0, 6oi a mim que o 6ize-0- mos. É onde Francisco de Sales ainda nos ajuda.
-0. Neste homem, seu próximo, Francisco de Sales
seu Deus, seu Salvador, seu Bem-amado: ele ore- Seu otimismo não somente serve de contrapeso ao
:be como Jesus e o ama e o serve exatamente como pessimismo ateu, mas dá-lhe uma saída válida para
,sus, e seu amor desabrocha e sua alegria é plena. um espírito contemporâneo. Fornece uma resposta à
.1 é a lição, tal o exemplo que o bispo de Genebra dúvida que nasce da contradição aparentemente irre-
,s dá: devemos confessar que nos é, de fato, neces dutível entre nossa existência rea l e nossa aspira-
.ria. ção ideal. A alma, que v ive em um corpo corruptí-
vel, aspira, no entanto, a vencer a morte. Será que
Podemos então dizer com Luís Lavelle que, "de o pode? A solução milag rosa que o crist ian ismo dá a
dos os santos, nenhum houve que fosse mais compro esta questão parece "exógena", vinda de fora: seria
tido com o mundo e, por conseguinte, mais próximo válida para o humanismo? O humanismo repe le tudo o
nós"; que nunca houve nenhum, tampouco, "que se que não é apenas do homem e somente para o homem:
.sinuasse tão profundamente nos recônditos secre- "Na luz, diz Camus, o mundo permanece nosso primei-
s de nosso coração, de tal forma que, sempre que ro e nosso Último amor". Francisco de Sales observa
acuramos o que queremos por detrás do que parece- ao humanista que em nosso amor fundamental acha-se
s querer, ele nos revela o que somos" 45 • El ~ nos inscrito o desejo de um ultrapassamento do mundo,
sina, assim, a respeitar a pessoa humana não ape- a aspiração à transcendência. Nosso coração, que é
s no outro, mas em nós mesmos, e · nos dá o meio de indivisivelmente razão, vontade, desejo, busca, tras
zê-lo: inspirando-nos a amar aquele que devemos em si mesmo esse apetite insaciável de bem, essa ne
speitar, mesmo quando ele nos parece muito pouco cessidade infinita de amor puro numa necessidade 1=
spei tável. Seu personalismo é augusto porque é san limitada de verdade universal, que constituem preci
neste tempo de desumanidade tão cruel, essa li= sarnente o homem. Nossa natureza choca-se com a por=
o nos é, de fato, necessária . ta do Absoluto sem poder abri-la por si mesma, mas
Aquele que nos espera no Absoluto a abre: iríamos
recusar entrar só porque é ele quem nos abre? Seria
mos considerados possuidores de louco orgulho. Fran
cisco de Sales nos previne contra essa loucura e~
além disso, nos mostra que se a graça é gratuita
Cf. Lavelle, Quat~e -0aint-0, 1951, pags. 177 ,
esse "gratuito" que o humanismo detesta - ela é, no
1 82.

1,10
intanto, harmoniosa: não corresponde estritamente a ta mais interior à Igreja. Destaquemos alguns pon-
lma exigência sem dúvida, mas, ao contrário, a uma tos, partindo do seu caminho de transcendência.
ixpectativa: entre a imanência e a transcendência e
iste a convergência. Este caminho não é o da evasão, nem tampouco
um atalho para mergulharmos no mundo: ele nos ensi-
Realmente, o amor que nos leva a transpor o li- na a estar no mundo e ao mundo sem ser do mundo. A-
1iar da morte vem de Deus: ele foi colocado em nos- centua vigorosamente a harmonia de nossas aspira-
os corações pelo Espírito; neste sentido, é um dom ções naturais sadias e de nossa vocação cristã so-
ratuito; no entanto, ele se insere nessa nina pan- bre--humana: admite a natureza, mas a integra à graça
a onde nosso desejo natural tende para o Infinito; e nos faz evitar o naturalismo em que o laxismo caiu.
graça toma a natureza pela mão e a conduz para on- Este perigo em nossos dias não é uma sombra vã: um
e ela não pode ir, para onde ela deseja se dirigi 4 salesiano o evitará. Francisco de Sales, por outro
egundo estas magníficas palavras que definem nosso lado, nos preserva de um misticismo sossegado, que
estino: Tu me. agahha~te. pela mão dihe.ita; tu me. con nos encerraria numa interioridade fechada. Nem mes-
uze.~ com teu con~e.lho e. com tua giÕhia me. athaihâZ sianismo temporal, nem pietismo alhienado, mas um
S1 73, 24). misticismo da ação que só se eleva ao céu se traba-
lharmos plenamente neste mundo, fazendo todos os de
Por meio da graça há inovação em nõs, e na ino veres a serviço de Deus e dos homens.
ação há continuidade, harmonia: a natureza espiri=
ual da alma é uma pedra de espera para a imortali- O salesianismo nos mostra também a harmonia da
ade gloriosa, e quem vai até o fim de si mesmo en- religião e da vida cotidiana: todas as atividades,
ontra a passagem aberta por Deus para sua beatitu- as mais humildes, as aparentemente mais desprezí-
e inesperada e, no entanto, desejada. A transcen- veis, ordenam-se sob a caridade, que lhes confere
ência, gratuita, não é, pois, artificial, e pores valor infinito, e é a possibilidade para uma "alma
e estratagema Francisco de Sales pode ajudar o hu= pequena" alcançar uma grande "santidade de humilda-
anismo contemporãneo a sair do impasse onde esbar- de"; mas a mesma unidade no amor divino permanece
a na revolta e no desespero. Sua preocupação, com possível ao homem que desempenha pesadas tarefas:
feito, é mostrar-nos como, em nós, a espontaneida- a santidade não é incompatível com a função dos reis
e sempre corresponde à gratuidade; como a infatibi e dos nobres. Francisco de Sales diz a cada um de
idade divina respeita a liberdade humana, e . a ne= nós: ~ e.de. aquilo que. ~oi~. O que formos na idéia que
essidade respeita a contingência, a predestinação Deus tem de nós é o que nos dá nossa verdadeira di-
ada impõe ao homem! Deus e o homem, pela graç~cons mensão e nossa exata grandeza, não em nós mesmos,
iram juntos naquilo que há de mais livre no céu e mas no Cristo. Francisco de Sales abre-nos, assim,
este mundo: o Amor. o verdadeiro campo para a nossa ambição, que é a
santidade e não essas miseráveis honras cuja fumaça,
mesmo na Igreja, obscurece freqüentemente nossa trans
ESPÍRITO VE SÍNTESE parência. Ele ensina aos príncipes, aos bispos, aos
prelados, a permanecer humildes e mansos sem deixar
Francisco de Sales viveu numa época de crise de ser firmes e fortes. Com esse espírito, ele nos
de renovação: ele conheceu o trabalho próprio a ensina a conciliar grandeza e humildade, autoridade
ais momentos, a tensão dos extremos que se opõem e e mansidão, paternidade e fraternidade, governo e
e separam. Vivemos num período semelhante, e sua honestidade, prudência e lealdade. Assim foi ele: que
abedoria, seu exemplo, sua coragem lúcida e pruden maravilha!
e podem ainda aqui nos ajudar, de um ponto de vis=

i cn
O ESPÍRITO DE CONCILIAÇÃO
e no culto que lhe devemos? Ele o precisa com pala-
Num plano mais elevado, nós o vemos preocupado vras que constituem a distinção de um mundo: Seu Fi
com a pura e elevada doutrina, embora atento em com lho ê no~~o advogado; ela ê no~~a advogada, ma~ d~
parar a tese e a síntese e em buscar a ligação por um modo bem diveh~o, como j~ di~~e v~hia~ veze~. O
onde os elementos da verdade de cada opinião pode- Salvadoh ê advogado de ju~tiça, pohque pleiteia poh
riam sê conciliar: preocupado com a tradição e com nô~, alegando o diheito e hazão de no~~a cau~a; e~e
o progresso. Assim procedeu com o tomismo e com o aphe~enta no~~o~ ahgumento~ ju~tinicativo~ que não
molinismo que seguravam, mas não com a mesma mão, ~ão outho~ ~enão ~ua hedenção, ~eu ~angue, ~ua chuz;
os dois extremos da cadeia. No conflito das duas fi- ele conne~~a ao Pai que ~orno~ devedohe~, ma~ demon~
losofias, a antiga e a nova, percebeu que não se po tha qu e pagou poh nô~. Ma~ a Vihg em e o~ Santo~ ~ão
deria condenar verdades evidentes en nome de dog= advogado~ de ghaça: ~uplicam poh nô~ paha que ~eja-
mas caducos: não rejeitou, assim, toda a escolásti- mo~ pehdoado~, e tudo pela Paixão do Salvadoh; nada
ca. Na disputa dos dois poderes, que foi tão perigo têm a aphe~entah paha no~ ju~tinicah, ma~ eonniam
saem 1612, pela conciliação dos espíritos, foi fa= no Salvadoh; em ~uma, ele~ não unem ~ua ohação ã in
varável à solução imparcial. Em teologia, procura tehce~~ão do Salvadoh, pohque ela~ não ~ão de me~ma
sempre o caminho do verdadeiro equilíbrio. Reconhe qualidade, ma~ ã~ no~~a~. Se Je~u~ Chi~to ~uplica
cer, por exemplo, a possibilidade e a realidade da ao céu, ~uplica em ~ua vihtude; ma~ a Vihgem ~upli-
graça infalivelmente eficaz por si mesma, mas somen ca como nô~ na vihtude de ~eu Filho, emboha com m~
te em alguns predestinados: na Virgem, em São João c~edito e navoh. Não vede~ como tudo i~to conthi-
Batista, em São Paulo; este não é, no entanto, oca bui paha a honha de ~eu Filho e enghandece ~ua glÕ-
minho normal de Deus, e a graça comum que o Senhor hia? (VII, 459).
oferece de maneira superabundante a todos pode ser
recusada, sem deixar de ser eficaz quando for aco- Toda sua doutrina está marcada por esse cuida-
lhida. A contrição perfeita, ensina ainda, é neces- do de unir os extremos pelo justo meio. No século
sária para uma verdadeira conversão, mas a atribui- XVIII, Muratori, que já reagia contra uma devoção
ção nem por isso é menos boa e necessária no começo mal dirigida à Virgem Maria, cita a favor de de sua
da penitência, quando o pecador não pode fazer me- tendência São Francisco de Sales, com São Carlos Bor-
lhor: o erro do confessor seria manter o penitente romeu, Antônio Bodeau e Peteau. Da mesma forma,Pier
nesse estado. Se Saint-Cyran tivesse seguido exata- Francesco Foggini o opõe aos extremistas do janse-
mente o caminho salesiano, Richelieu, talvez, não nismo (Appolis, Le Tieh~ Pahti, Paris, 1960, p. 333,
teria podido encarcerá-lo. Este santo doutor afir- 183). Ele nos guia sempre pelo caminho real de uma
ma ainda a primazia do papa, sua infalibilidade, sua religião ponderada, aberta e a caminho, inimiga dos
sua pastoral universal; mas nem por isso deixa de extremos e, no entanto, elevada.
manter a colegialidade da Igreja.

Em espiritualidade, entre o "ascetismo" e o A SÍNTESE PESSOAL


quietismo, realiza um ascético-misticismo de sínte-
se, que substitui tanto a honestidade cristã, para Francisco de Sales nos ajuda, principalmente,
o conjunto dos fiéis, quanto a normal mas excepcio- a tomar consciência de nós mesmos, de nossos extre-
nal santidade para uma elite. Finalmente, quanto ao mos limites e de nossas oposições, para nos mostrar
delicadíssimo assunto sobre a devoção a Maria, sua como devemos realizar nossa própria síntese pessoal,
piedade não o faz exceder em doutrina e seu pensa- sob a atração do duplo êxtase. O inicio das tendên-
mento pode nos ajudar a sair de um debate atual: qual cias opostas em nós está no coração onde, geralmen-
é o lugar da Mãe de Jesus na economia da salvação te, desde o principio, a atração tanto dos sentidos
, do espírito é fina e delicada, fácil por conse do a to humano feito em caridade é um passo de amor,
tte de controlar; mas, às vezes, ela pode rapid~ uma aproximação de Deu~. O homem, ao amar assim, ob
:e adquirir a força de uma torrente na carne: e- serva Lavelle, "não cessa de cooperar com o próprio
!-se aqui, pois, um cuidado constante para orien ato da criação. E tal é a razão pela qual é-- a mesma
nosso desejo mais elevado para a verdade, para cois a amar a Deus, que é amor, e amar o próximo co-
!lo, para o bem, para o absoluto, para Deus. O mo a nós mesmos, isto é, com o mesmo amor pelo qual
~, observa nosso doutor, pode abranger todos os Deu s nos chama, a ele e a nós, à mesma e xi stênc ia"
3 em todos os graus de razão: sua espiritualida- (Qu atne ~aint~, 192). Do mesmo modo, podemos resu-
nostra-se ainda aqui sintética, sem deixar de ser, mir todo o pensamento de São Francisco de Sales com
2ntanto, eletiva; pois, quanto mais o amor se a~ estas palavras saídas de seu coração: Tudo pon amon
~, menos força tem a menos acerbado se torna. e nada ~oh óonca; ou aman ou monnen: monn en e aman .
este motivo, é necessário, para atingir o auge, O am on ê mai~ óonte do que a monte.
nir suas energias para a contemplação mística e
a o puro amor, meio pelo qual o homem se liberta
triste obsessão dos sentidos e se realiza em san
ade. A síntese humana deve ser feita pelo alto~
a realeza da Caridade, no Corpo místico do Cris

Assim, Francisco de Sales nos ajuda a desfazer


o de nossos complexos, que nos encerram em nós
mos, visto que nossa tendência para o Infinito
curva para o finito, onde estamos sempre procu-
,do o Infinito. O que nos desvia e nos enlaça es-
j
,nhamente nos meandros de nossas desesperantes pai
is. Fazemos da criatura um ídolo e o adoramos, fi
10s decepcionados e irritados com ele e nós o queT
10s para construir um outro ídolo tão vão e tão
:epcionante quanto o primeiro. É a busca sem. fim
Infinito finito, com esse amargo pensamento de
! o homem não passa de uma "paixão absurda". Cer-
aente Sartre tem razão, se Deus está morto. São
1ncisco de Sales nos ajuda a ver que Deus não mo~
1. Ele nos oferece, tanto em sua doutrina como em
:i. vida, a riqueza desse "misticismo completo" que
1duziu Henrique Bergson ao limiar da fé católica:
ta plenitude não mente!

Sua doutrina nos aparece, pois, como uma místi


não de quietismo, mas de movimento, não de apa=
a, mas de ação. Uma mística pascal que nos ensina
passar como Jesus deste mundo para o Pai "prati-
ndo o bem". Vamos para Deus "a passos de amor", di Ba sílica de São Francisco de Sales
a Santo Agostinho. Para São Francisco de Sales, tQ e Mo s t eiro da Visitação (Annecy).

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