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RESUMO: PRODUÇÃO TEXTUAL ANÁLISE E GÊNERO

LUCLÈCIA RESENDES SILVA.

O texto começa com uma pergunta “Quando se ensina português, o que se


ensina?". Que e enfatiza como autor, ver questão do ensino de língua portu-
guesa,--mds aqui se trata da língua e não apenas do português.

Neste sugere que o ensino, seja lá do que for, é sempre o ensino de uma visão do
objeto e de uma relação com ele. Isto vale para o nosso objeto: a língua; e
mais ainda para os fenômenos aos quais nos dedicamos aqui: o texto, os
gêneros e a compreensão.

Em primeiro lugar, isto é assim porque o trabalho com texto não tem um limite
superior ou inferior para exploração de qualquer tipo de problema linguístico,
desde que na categoria texto se incluam tanto os falados como os escritos.

Sabemos que um problema do ensino é o tratamento inadequado, para não


dizer desastroso, que o texto vem recebendo, não obstante as muitas alter nativas
e experimentações que estão sendo hoje tentadas. Com efeito, introduziu-se o
texto como motivação para o ensino sem mudar as formas de acesso, as
categorias de trabalho e as propostas analíticas.

Mas o problema não reside só nas formas de acesso ao texto e sim nas formas
de sua apresentação. Quanto a essa inadequação, sabe-se que os textos
escolares, sobretudo nas primeiras séries, padecem de problemas de organiza
ção linguística e informacional. Por vezes, eles carecem de coesão, formando

Hoje a cena já está bastante mudada em relação às últimas gerações de


manuais didáticos, tendo em vista o processo de avaliação por parte do MEC
no Programa Nacional de Avaliação do Livro Didático (PNLD). Já se cuida mais
da presença de uma maior diversidade de gêneros, de um tratamento mais
adequado da oralidade e da variação linguística, bem como de um tratamento
mais claro da compreensão. Mas é evidente, como se verá mais adian te, que
nem tudo ainda é como se gostaria que fosse'.

Considerando os objetivos básicos da escola no trato da língua, é oportuno


levantar a questão de se a escola deve trabalhar apenas o texto escrito ou
envolver-se também com o texto oral. Creio que ao se enfatizar o ensino da
escrita não se deve ignorar a fala, pois a escrita reproduz a seu modo e com
regras próprias, o processo interacional da conversação, da narrativa oral e do
monólogo, para citar alguns.

Os PCNs já trazem uma série de observações sorre a oralidade e os demais


temas. aqui necessária é a explicitação do que se pode ou deve entender com
a expressão "ensino de língua", pois como já lembrado, ao chegarem à
escola, a criança, o adolescente ou o adulto já sa bem a língua. Assim, vale a
pena refletir a esse respeito.

Assim, a resposta pode ser dada na medida em que se postula que a escola não
ensina língua, mas usos da língua e formas não corriqueiras de comunicação
escrita e oral. O núcleo do trabalho será com a língua no contexto da
compreensão, produção e análise textual.

Se alguém é falante de uma língua, ele domina as regras dessa língua. O


problema é que a língua não tem regras tão rígidas quanto imaginamos e pode
haver alguma variação, mas não livre nem ilimitada

O falante de urna língua deve fazer-se entender e não explicar o que está
fazendo com a língua.

A análise da língua se limita à sintaxe é reduzir a língua a algo muito


delimitado, pois os aspectos textuais e discursivos, bem como as questões
pragmáticas, sociais e cognitivas - . É claro que a gramática tem uma função
sociocognitiva relevante, desde que entendida como uma ferramenta que
permite uma melhor atuação comunicativa. O problema é fazer de uma
metalinguagem técnica e de uma análise formal o centro do trabalho com a
língua. Também não se deve reduzir a língua à ortografia e às regras
gramaticais. O falante de urna língua deve fazer-se entender e não ex plicar o
que está fazendo com a língua.

Embora não seja necessário, é sempre fundamental explicar com que noção
de língua se trabalha, quando se opera com categorias tais como texto ou
discurso, já que disto dependerão muitas das posições adotadas.

Em todos os casos, observa-se que discurso é visto como uma prática e não
como um objeto ou um artefato empírico. Parece que esta noção de prática é
o que permitirá levar em conta os fenômenos extralinguísticos para não cair no
subjetivismo.

A língua pode ser vista — e foi vista — de vários ângulos teóricos, mas nós
adotaremos uma posição bem definida para o trabalho com a produção textual
na perspectiva sociointerativa.

Assim, a postura geral aqui adotada pode ser caracterizada como textual-
discursiva na perspectiva sociointerativa, isto é, consideramos o texto em seu
aspecto tanto organizacional interno como seu funcionamento sob o ponto de
vista enunciativo.

Na realidade, nosso trabalho se dará na perspectiva (d), chamada textual-


interativa. Nesse caso, não se deixa de admitir que a língua seja um sistema
simbólico (ela é sistemática e constitui-se de um conjunto de símbolos orde-
nados), contudo ela é tomada como uma atividade sociointerativa desenvolvi da
em contextos comunicativos historicamente situados. Assim, a língua é vista
como urna atividade, isto é, uma prática sociointerativa de base cognitiva e
histórica. Podemos dizer, resumidamente, que a língua é um conjunto de prá -
ticas sociais e cognitivas historicamente situadas. Podemos dizer que as línguas
são objetivações históricas do que é falado.

Certamente, quando estudamos o texto, não podemos ignorar o funcionamento


do "sistema linguístico" com sua fonologia, morfologia, sintaxe, léxi co e
semântica; neste caso estamos apenas admitindo que a língua não é caó tica e
sim regida por um sistema de base. Mas ele não é predeterminado de modo
explícito e completo, nem é autossuficiente. Seu funcionamento vai ser integrado
a uma série de outros aspectos sensíveis a muitos fenômenos que nada têm a
ver com a forma diretamente.

Uma das tendências mais comuns na linguística do século XX, até recentemente
— típica do estruturalismo —, foi centrar-se no estudo do código, isto é, na
análise de propriedades imanentes ao sistema de signos da língua. Trata va-se
do que podemos chamar de uma linguística do significante. Assim, surgiram os
conhecidos níveis de análise linguística, tais como o fonológico

Análise de textos e discursos (em certo sentido, o plano da enunciação).


Isso tornará possível observar o que fazem os falantes com/na/da língua e,
principalmente, como se dão conta de que estão fazendo uma determinada
coisa com a língua. Também permite trabalhar as relações entre oralidade e
escrita 10

Portanto, vamos admitir que a língua é uma atividade interativa, social e mental
que estrutura nosso conhecimento e permite que nosso conhecimento seja
estruturado. Enquanto fenômeno empírico, a língua não é um sistema abstrato
e homogêneo.

Pode-se admitir, ainda, que a língua é uma atividade cognitiva. Pois ela não é
simplesmente um instrumento para reproduzir ou representar ideias (pois a
língua é muito mais do que um espelho da realidade). A língua é tam bém muito
mais do que um veículo de informações. A

Para muitos autores, a reflexão sobre o funcionamento da língua em sociedade


depende da noção de sujeito que temos. Assim, tudo indica que um dos pontos
centrais que distinguem as várias correntes de AD (e por extensão, qual quer teoria
linguística) passa pela noção de sujeito.

Seguramente, a concepção de sujeito aqui adotada não é a (1), que su põe um


sujeito humano em carne e osso, intencional, consciente e com uma linguagem
transparente que não lhe oferece resistência. Mas também não será a do
sujeito (2) nem (3) pura e simplesmerite, pois não se pode admitir um "sujeito
assujeitado" e que não tenha vontade, nem um sujeito que seja só inscrição na
história e no inconsciente. O sujeito de qu'e falamos aqui é aquele que ocupa
um lugar no discurso e que se determina na relação com o outro.
A língua tem um funcionamento que independe do falante, independe do indiví -
duo; é social [...] é um sistema autossuficiente. É por ser autossuficiente, não por
ser social, que independe do indivíduo. Por detrás dela não estão falantes,
motivações, etc., estão outras estruturas.

Para os marxistas, isto significava eliminar a história e os condicionamen tos


superestruturais e ao mesmo tempo eliminava a práxis. O problema do
estruturalismo é sua concepção de língua como externa ao sujeito que é seu
produto, sendo ela transparente e autônoma. O sujeito teria morrido nesse
caso e não seria um autor, tal como já postulavam Foucault ou Barthes. Como
autor, o sujeito é, no máximo, dono de uma "fala", mas esta não é o objeto da
linguística e é um exterior.

Em suma, pode-se dizer que o sujeito não é nem assujeitado nem totalmente
individual e consciente, mas produto de uma clivagem da relação entre linguagem
e história. Em não sendo totalmente livre, nem determinado por alguma
exterioridade, o sujeito se constitui na relação com o outro e, como lembra
Possenti, citado acima, o sujeito não é a única fonte do sentido, pois ele se
inscreve na história e na língua.

O texto pode ser tido como um tecido estruturado, uma entidade significa tiva, uma
entidade de comunicação e um artefato sociohistórico. De certo modo, pode-se
afirmar que o texto é uma (re)construção do mundo e não uma simples refração ou
reflexo

Sob um ponto de vista mais técnico, a LT pode ser definida como o estu do das
operações linguísticas, discursivas e cognitivas reguladoras e controladoras
da produção, construção e processamento de textos escritos ou orais em
contextos naturais de uso.

A questão à qual devemos responder é: como e onde situar o texto nos estudos
linguísticos, já que as definições de texto não fazem alusão a nenhum dos níveis
linguísticos de análise? O texto está no nível do sistema ou é simplesmente um
fenômeno do funcionamento do sistema? Aqui, as posições teóricas têm variado.

Segundo Ferdinand de Saussure [1916], por exemplo, a frase não é uma unidade
da langue e sim da parole (do uso, da fala); Noam Chomsky [1965] e [1986], por
sua vez, já tem na frase a unidade básica da língua (mas sua preocupação se
volta para a competência linguística ideal e abstrata e não para a frase em
uso). A Chomsky, como vimos, não interessa o desempenho.

Assim como a linguística teórica se dedica ao estudo do sistema virtual da língua, a


linguística de texto dedica-se ao estudo da atualização desse sistema em situações
concretas de uso

7 Em suma: o trabalho com a língua portuguesa,


0
,teria de se ocupar com algo mais do que o ensino e aprendizagem de regras ou
normas de boa formação de sequências linguísticas. Trata-se de um estudo em
que se privilegia a variada produção e suas contextualizações na vida diária.

É provável que certos aspectos formais da língua tenham influência na


sequenciação dos enunciados, assim como certas propriedades comunicativas
exercem pressões discursivas sobre o texto. Contudo, não há uma regra que diz
qual o conteúdo que deve necessariamente se seguir a outro determinado con-
teúdo numa sequência textual. O que determina a sequência é uma relação

Usando de uma imagem diria que, do ponto de vista sociointerativo, produzir um


texto assemelha-se a jogar um jogo. Antes de um jogo, temos um conjunto de
regras (que podem ser elásticas como no futebol ou rígidas como no xadrez), um
espaço de manobra (a quadra, o campo, o tabuleiro, a mesa) e uma série de
atores (os jogadores), cada qual com seus papéis e funções (que podem ser
bastante variáveis, se for um futebol, um basquete, um xadrez etc.).

Um dos problemas constatados nas redações escolares é precisamente este:


não se define com precisão a quem o aliNino se dirige. A cena textual não fica
clara. Ele não tem um outro (o auditório) bem determinado e assim tem
dificuldade de operar com a linguagem e escreve tudo para o mesmo
interlocutor que é o professor.

Esta avalanche de questões serve apenas para expressar a complexidade do


problema em foco. Não se deve ter a ilusão de que vamos responder a todas
as indagações.

Na operação com a língua, lidamos mais do que com um simples uso de regras,
sejam elas de sequenciação ou outras quaisquer. O que aqui está em ação é
um conjunto de sistemas ou subsistemas que permitem às pessoas
interagirem por escrito ou pela fala, escolhendo e especificando sentidos me -
diante a linguagem que usam. Uma das tendências atuais é a de não distinguir
de forma rígida entre texto e discurso, pois se trata de frisar mais as relações
entre ambos e considerá-los como aspectos complementares da atividade
enunciativa. Trata-se de "reiterar a articulação entre o plano discursivo e
textual".

Isso implica afirmar que os textos são, na realidade, os objetos empíricos aos
quais temos acesso direto como o "plano dos observáveis", na visão de Culioli.
Enquanto unidades empíricas, os textos seriam "produções linguísticas atestadas
que realizam uma função comunicativa e se inserem numa prática social".

A ideia da visão complementar é importante e tem como consequência o fato de


não frisar apenas um dos lados do funcionamento da língua no seu aspecto
genérico. Nesse sentido, Adam (1999: 40) considera que "a separação do
textual e do discursivo é essencialmente metodológica".

Na realidade, se observamos como agimos nas nossas decisões na vida


diária, dá-se o seguinte: qimeiramente, tenho uma atividade a ser
desenvolvida e para a qual cabe um dTscurso característico. Esse discurso
inicia com a escolha de um gênero que por sua vez condiciona uma
esquematização textual.

Parece claro que o contexto pode ser visto como uma rede de textos que
dialogam tanto de modo negociado como conflituoso. Contrato e conflito
fazem parte dos movimentos da produção de sentido.

As relações ditas cotextuais se dão entre os próprios elementos internos como


ocorre, por exemplo, com boa parte das anáforas, particularmente as
correferenciais. As relações cotextuais se manifestam também na concordância
verbo-nominal, na regência e em todos os aspectos sintáticos e morfológicos em
geral.

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