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Escola Estadual Doutor José Augusto

Geografia

Arthur Eduardo Fonseca Campos

Carlos Eduardo Knupp

Gabriela Gomes Valente

Isabella Lorena de Souza Hott

Ruan Daniel Gomes Gonçalves

Religião e sociedade

Entre Folhas

2021
1. O papel fundamental das religiões na formação das sociedades
humanas
Entende-se como religião a crença na existência de um poder ou princípio
superior, sobrenatural, do qual depende o destino do ser humano e ao qual se
deve respeito e obediência. Ao longo da formação das sociedades
contemporâneas, algumas dessas crenças foram definidas como religiões
universais, são elas: judaísmo, confucionismo, bramanismo, budismo,
cristianismo e islamismo. 
As religiões universais tiveram um importante papel na constituição das
sociedades humanas, criando uma espécie de poder integrador que
unificava as cidades-Estados sob um mesmo proposito, uma mesma fé.
Portanto, a universalização está associada à ideia de civilização e hegemonia
cultural.
Contudo, a universalização dessas religiões não é algo puramente
embasado na fé, mas em interesses políticos e econômicos das classes
dominantes. Isso explica uma série de acontecimentos históricos trágicos,
como as Cruzadas ou uma sociedade dividida em castas, como acontece na
Índia com o bramanismo. 

2. Religião como ferramenta do ódio


Nos estudos de cultura de Karl Marx (1818-1883), o filósofo cunhou o termo
“hegemonia cultural”. A Enciclopédia Columbia (5° edição, 1994, página 1215),
sintetiza o conceito de hegemonia cultural proposto por Marx:
 "Na teoria marxista, hegemonia cultural é o domínio de uma
sociedade culturalmente diversa pela classe dominante, que manipula
a cultura dessa sociedade, ou seja, as crenças, as explicações, as
percepções, os valores, os costumes, de modo que a visão de mundo
imposta dessa classe, se torne uma norma cultural, a ideologia
dominante e universalmente válida que justifica o status social,
político e econômico como natural e inevitável, perpétuo e benéfico a
todos, e não como uma construção social artificial que beneficia
apenas a classe dominante.”
Como uma das mais eficientes ferramentas de manipulação em massa,
senão a melhor de todas, a religião, quando usada como ferramenta de poder,
cria um sentimento reacionário nas sociedades, afinal, se as coisas estão como
estão, bem ou mal, feliz ou triste... é tudo a vontade de um deus, seja ele Deus,
Allah, Brahma, ou qualquer outra entidade sobrenatural.
Com isso, as classes dominantes, independente de qual nome ela assume
durante o período histórico estudado (aristocracia, burguesia, suseranos, reis,
brahman, nobreza...), sempre se apropriou dos preceitos religiosos, usando da
fé e boa vontade alheia para expropriar o homem em nome de um deus.
Ao longo da história das civilizações humanas, desde da Idade Antiga até os
dias atuais, diversas guerras sangrentas e conflitos diplomáticos foram
causados por interesses próprios, mas performados em nome de um deus e/ou
de uma fé, podemos citar:
 Cruzadas: A Igreja pregava que, em nome de Deus, a Terra
Santa (cidade de Jerusalém), precisava ser reconquistada com o
intuito de reunificar o mundo cristão. Na verdade, o real interesse
era no território ocupado pelos muçulmanos, nas posses que os
mesmos saquearam da Igreja e dos nobres, e ao mesmo tempo,
trazendo novos povos e regiões para o domínio da Igreja. Os
resultados, além do banho de sangue cujo as estimativas de
mortos são mais de 1 milhão dentre católicos e muçulmanos, foi a
reabertura do Mediterrâneo ao comércio internacional e o
desenvolvimento do comércio ocidental. Ou seja, 196 anos de
uma guerra em nome de um deus e um proposito santo, teve
como desfecho os interesses das elites comerciais.
 Guerra da Bósnia: No início da década de 1990, a Iugoslávia se
desintegrou diante de uma série de guerras civis. A Bósnia teve
seu referendo de independência, depois da Eslovênia e da
Croácia se separarem, o que levou a um conflito entre
muçulmanos, sérvios (cristãos ortodoxos) e croatas (católicos).
Os bósnios sérvios, com forte apoio do governo e de grupos
extremistas de Belgrado, estavam determinados a ficar no que
restava da Iugoslávia e ajudar a estabelecer uma grande Sérvia.
A guerra, apesar de ser alimentada por divisões étnicas,
performada por religiosos extremistas, foi um conflito plenamente
territorial que era de interesse das elites.
 Conflito israelo-palestino: Após o Holocausto, o brutal
genocídio étnico promovido pelos nazistas que dizimou 6 milhões
de judeus, a ONU (Organização das Nações Unidas), propôs um
plano de criação do Estado de Israel. O território escolhido para a
criação do novo Estado? Uma área que há séculos era de maioria
árabe, levando, quase que de imediato, a uma guerra. Apesar dos
conflitos reiniciados no século XX, o combate entre palestinos e
judeus remonta a Antiguidade, com a divisão de Israel, a invasão
dos povos assírios e a dominação do território pelos
mesopotâmicos. Novamente, um conflito que passa a ideia de ser
puramente religioso, tem suas raízes em interesses econômicos,
o território, rico em petróleo, é de interesse dos grandes
imperialistas.
Esses são apenas alguns dos inúmeros conflitos que, aparentemente, são
ideológicos. Mas, nas entrelinhas dessas brutais guerras, os interesses da
burguesia ditam o combate.

3. Religião como discurso de ódio na estrutura política da democracia


brasileira
Um dos momentos que antecederam o golpe civil-militar de 64, foi a icônica
“Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, a manifestação ocorreu na
cidade de São Paulo e contava com cerca de 500 mil pessoas. Após denúncias
sensacionalistas de uma “ameaça comunista” no Brasil, as alas conservadoras
foram prontamente as ruas, lutar contra o tal fantasma do comunismo que paira
sobre o país a mais de 100 anos. Assim como Vargas usou o comunismo para
dar um golpe 27 anos antes, os militares, com um forte apoio de muitos setores
da sociedade (principalmente os setores religiosos e conservadores), fizeram o
mesmo. Os 21 anos seguintes, foram marcados por uma brutal opressão,
censura à imprensa, restrição de direitos políticos e perseguição policial aos
opositores do governo. Com o sádico lema “Brasil ame-o ou deixe-o”, a
ditadura, que matou mais de 400 pessoas, torturou e perseguiu diversas
outras, tinha como suas bandeiras ideológicas: Deus, pátria e família.
Citando Karl Marx novamente, na abertura de O 18 de Brumário de Luís
Bonaparte (1852), temos a célebre frase: “A história se repete, a primeira vez
como tragédia e a segunda como farsa”. A ditadura civil-militar brasileira,
marcada por sangue e morte, hoje é classificada por muitos como os “bons e
velhos tempos” de um Brasil muito mais sério, justo e benéfico. O único general
julgado judicialmente pelos crimes cometidos por ele e seus subordinados
durante a ditadura, Carlos Alberto Brilhante Ustra, é exaltado de dentro de uma
das instituições fundamentais da democracia brasileira, o Congresso Nacional,
o então deputado federal, Jair Messias Bolsonaro, inicia sua campanha para a
presidência ali mesmo, sob o lema: “Brasil acima de tudo, Deus acima de
todos”. Combatendo o mesmo fantasma que pairava sobre Brasília em 1964 e
em 1937, Bolsonaro carrega as mesmas bandeiras ideológicas que seus
mártires: expurgação do comunismo no país, Deus, pátria e família.
Durante a campanha eleitoral, o então candidato, que logo mais seria eleito,
destacou-se por seus discursos que, ao mesmo tempo em que ia à “Marcha
para Jesus”, posando ao lado de líderes religiosos com extensos históricos de
acusações criminais, fala em “metralhar a petralhada”, repetindo gestos de
extermínio, ou seja, o sentimento higienista de purificação social e moral, nesta
ocasião, se apresenta sob a roupagem religiosa.
Os campos eleitorais religiosos sempre foram muito atrativos para os
políticos brasileiros, com a ascensão da extrema-direita em 2016, fruto da
eleição de figuras como Donald Trump (Estados Unidos) e Viktor Orbán
(Hungria), as pautas religiosas se tornaram cada vez mais importantes nos
âmbitos políticos. Neste contexto, a política adentrou as igrejas através de
fundamentalistas religiosos, de mercadores da fé, figuras monstruosas que
usavam, e ainda usam, o nome de Deus e a fé das pessoas como forma de
fazer política e buscar seus próprios interesses.
Usando disparos em massa nas redes sociais, todo tipo de mentira das mais
absurdas se espalham e ganham proporções gigantescas em um intervalo
muito curto de tempo. Por exemplo, a deputada estadual, Janaína Paschoal
(PSL-SP) (2020), católica, se deferiu na internet dizendo o seguinte: [...] muito
comum esquerdistas relativizarem sexo com menos de 14 anos [..]”. Cria-se um
inimigo, nesse caso o “esquerdista”, que vai contra a Deus e fere todo tipo de
conceito moral e leis judiciais, com isso, cria-se também a necessidade de
combater esse “inimigo”. Os discursos de ódios se espalham muito
rapidamente, atingindo pessoas de todas as idades, condições sociais e
posições religiosas ou políticas, criando uma espécie de teia de informações
falsas que pode e vai causar prejuízos.
Uma análise feita de forma ácida e lúcida pelo professor, artista e Drag
Queen Guilherme Terreri Lima Pereira, por meio de sua persona Rita von
Hunty, no vídeo intitulado “Religião como Discurso de Ódio” exprime-se que o
papel desempenhado por agentes que utilizam a religião como máscara, como
instrumental para aniquilar grupos que não se ajustam aos seus interesses e
perspectivas religiosas, como estruturas de dominação em massas, requer-se
que sejam enfrentadas à altura, também em dimensão política, social e jurídica.

4. Conclusão
Fazendo uma análise mais introspectiva, focando no contexto brasileiro e
colocando os já tradicionais conflitos do Oriente Médio (islamismo) de segundo
plano, estudando diversos estudos e debates relacionados ao tema,
observamos os impactos negativos que a religião, quando usada como
instrumento de ódio e repressão, pode causar nas frágeis estruturas
democráticas do Brasil.
O Art. 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em
1988, inciso VI, diz: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e a suas liturgias”, ou seja, a liberdade religiosa é
constitucional e estabelecida por lei, porém, o inciso VIII, também do Art.5°, diz:
“ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação
legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em
lei”, isto é, nenhum tipo de crime ou desobediência civil são toleráveis por esta
ou aquela crença religiosa.
Portanto, é necessário, com uma emergência descomunal, que políticos, ou
qualquer individuo que se arme com preceitos espirituais como utensílio do
ódio, sejam punidos nas esferas judiciais cabíveis. A importância disso se da
aos fatos que, esse tipo de discurso, coloca a vida de uma série de minorais
em risco, criando uma espécie de “nós” e “eles”. Além disso, essas pessoas
que propagam o ódio em nome de Deus, também afetam os cristãos que,
genuinamente, estão preocupados em levar o Evangelho de Cristo as pessoas.
Por fim, sociedades que toleram a intolerância acabam, em algum momento,
se tornando avessas à tolerância.
“A religião não é somente um sistema de ideias, ela é antes de tudo um
sistema de forças."

                                              - Émile
Durkheim

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