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INTRODUÇÃO

Após o final da Guerra Fria com a queda do muro de Berlim,


oficialmente, no dia 9 de novembro de 1989, surgiram preocupações do
Japão sobre como continuariam as relações nipo-americanas. Isso ocorreu
porque, em um mundo bipolar, um dos fatores que atribuíam
importância ao Japão pelos Estados Unidos da América (EUA) era a
parceria para conter o comunismo, mas, com o enfraquecimento dessa
ameaça, dada a desintegração da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) em 1991, a relação entre os países passou a ser
reavaliada, assim como o papel internacional do Japão.
Houve declarações de políticos japoneses nesse período imediato ao
final da Guerra Fria, que apontavam para a possibilidade de o Japão
assumir um papel mais proeminente nas relações internacionais, pois, dada
a sua posição de segunda maior economia mundial, atrás apenas dos EUA,
havia uma demanda internacional para que o governo de Tóquio passasse
também a dividir os custos de manutenção da ordem internacional.
Esse pleito estava relacionado ao fato de os países ocidentais,
principalmente os desenvolvidos, terem atuado intensamente para conter
a expansão do comunismo, enquanto o Japão era visto como um país que
se beneficiou dessas ações ao fazer crescer a sua economia, mas sem ter
contribuído proporcionalmente para a segurança internacional, uma vez
que esteve sob a proteção dos EUA. De fato, o Japão, ao longo da segunda
metade do século XX, saiu da II Guerra Mundial derrotado e com uma
economia muito enfraquecida, embora tenha alcançado a posição de
segunda maior economia global na década de 1980.
O governo japonês, contudo, justificou essa criticada participação,
isto é, considerada inferior à dos países ocidentais e aquém do que deveria
ser para o país com a segunda maior economia do mundo, alegando que
foi decorrente das restrições constitucionais.
A expressão “gigante econômico e anão político” era comumente
utilizada para designar o perfil do Japão nos anos imediatos ao pós-
Guerra Fria. Como uma resposta a essas pressões Kuriyama Takakazu –
vice-ministro de Negócios Exteriores –, em entrevista ao Los Angeles
Times, afirmou:
Primeiro, deixem me enfatizar que é amplamente reconhecido entre os
japoneses que nós (...) devemos desempenhar um papel econômico e
político mais ativo e responsável, em íntima cooperação com outras
democracias industriais (JAMESON, 1990 – tradução nossa).

Apesar dessa e de outras declarações de representantes do governo japonês afirmando a


disposição de ampliar o papel nipônico nas relações internacionais, desde o início da década de
1990 aos dias atuais, o papel do Japão no contexto internacional permanece em discussão. Portanto
são mais de 30 anos de debates em que ainda não se tem uma definição clara e consensual sobre um
novo ordenamento das relações internacionais, como foi a bipolaridade, tampouco sobre a inserção
internacional japonesa.
Entretanto é importante salientar o peso e a importância do Japão para as relações
internacionais tanto no âmbito regional como global, pois esse país é a terceira maior economia
mundial, atrás apenas da China e dos EUA. Essa posição deverá ser mantida durante algum tempo,
uma vez que a taxa de crescimento do produto interno bruto (PIB) da Alemanha, que ocupa a
quarta posição, não tem sido muito diferente da do Japão. Dessa forma as perspectivas do Fundo
Monetário Internacional (FMI) apontam que, pelo menos até o final desta década, as posições não
deverão mudar. O risco de perda da terceira posição é maior em relação à Índia, mas isso deve
ocorrer na próxima década.
Tabela 1 – Dez maiores PIB em 2020

país valor (US$ milhões)

EUA 20.932.750

China 14.722.837

Japão 5.048.688

Alemanha 3.803.014

Reino Unido 2.710.970

Índia 2.708.770

França 2.598.907

Itália 1.884.935

Canadá 1.643.408

Fonte: International Monetary Fund (2020)

Outro fator relevante para acompanhar as relações internacionais do Japão é a sua parceria
com os EUA, particularmente para a região da Ásia, bem como o interesse de Tóquio em renovar
e revitalizar o seu papel internacional. Se, no final do século passado, a ampliação da participação
japonesa era uma demanda que emergia de fora para dentro, nos últimos anos observa-se que o
governo japonês tem demonstrado buscar uma política externa mais ativa se comparada ao perfil
da sua diplomacia até a segunda metade do século XX, como será apresentado ao longo do trabalho.
Dessa forma, o objetivo geral da disciplina consiste em oferecer um panorama das relações
internacionais do Japão após o final da Guerra Fria até as primeiras duas décadas do século XXI.
Adicionalmente, os objetivos específicos incluem:
 identificar as mudanças que ocorreram internamente no país e os principais impactos na
política externa;
 relacionar como as transformações do cenário internacional tem apresentado desafios e
oportunidades à inserção internacional do Japão,
A fim de alcançar tais objetivos, a apostila será dividia em quatro módulos. No módulo 1,
Período pós-Guerra Fria e desafios ao Japão, será apresentada uma pequena retrospectiva das
relações internacionais do Japão a partir do final da Guerra Fria, apontando as transformações que
vieram ocorrendo no âmbito interno ao país, envolvendo aspectos econômicos, sociais e políticos.
Também serão destacados os fatos relevantes no âmbito externo de como as alterações de posições
relativas dos principais países tem repercutido na política externa japonesa.
No módulo 2, Transformações da política externa japonesa: atores, policy-making e
interesses, serão abordadas as mudanças institucionais no processo da elaboração da política
externa. Ao longo do período do pós Guerra Fria há uma busca de reestruturação das participações
na formulação dessa política, que tem como principais sujeitos a burocracia estatal, os políticos e o
setor privado. A compreensão do papel de cada um desses atores é importante para se analisar
também a formação dos interesses nacionais e o papel que o Japão procura desempenhar nas relações
internacionais do século XI.
Já no módulo 3, Geopolítica Asiática no Século XXI, veremos que o mundo tem sido
testemunha do crescimento da importância internacional da Ásia nas últimas décadas, com destaque
na área econômica com a sucessão de economias que vieram ganhando destaques pela sequência o
Japão, os tigres asiáticos (Coreia, Hong Kong, Singapura e Taiwan) e mais recentemente a China e
os países do sudeste asiático. No entanto, o século XXI tem sido também palco de preocupação
com a região, pois há cooperação, mas também há disputas de interesses, por isso a pergunta é:
prevalecerá a paz ou o conflito na Ásia?
Por fim, o módulo 4, Um novo Japão para um mundo novo? destina-se a discutir qual o
papel para o Japão no século XXI, como aponta o mestre e ex-ministro da Relações Exteriores,
“toda política exterior resulta de um esforço de compatibilizar necessidades internas com
possibilidades”. Feita as considerações sobre as transformações no âmbito interno e externo ao
Japão, neste módulo se analisará como o governo de Tóquio busca renovar a sua política externa
no mundo contemporâneo.
SUMÁRIO

MÓDULO I – PERÍODO PÓS-GUERRA FRIA E DESAFIOS AO JAPÃO ................................................. 9

RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO JAPÃO: EXPECTATIVAS E FRUSTRAÇÕES................................. 9


ECONOMIA JAPONESA: PROJEÇÃO E BARREIRA AO STATUS INTERNACIONAL ........................16
FRAGILIDADES IMPOSTAS PELA INSTABILIDADE POLÍTICA ........................................................21
DESAFIOS DO ENVELHECIMENTO DA SOCIEDADE ......................................................................25
CONCLUSÃO .....................................................................................................................................29

MÓDULO II – TRANSFORMAÇÕES DA POLÍTICA EXTERNA JAPONESA:


ATORES, POLICY-MAKING E INTERESSES......................................................................................... 31

REFORMAS NA ESTRUTURA DO GOVERNO ..................................................................................31


PAPEL DO PRIMEIRO-MINISTRO.....................................................................................................35
BUROCRACIA E POLÍTICA EXTERNA ...............................................................................................44
POLÍTICA EXTERNA SOB NOVOS PILARES .....................................................................................49
CONCLUSÃO .....................................................................................................................................55

MÓDULO III – GEOPOLÍTICA ASIÁTICA NO SÉCULO XXI ............................................................... 57

PAPEL DO JAPÃO NA “ASIANIZAÇÃO” DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS .................................57


Ajuda japonesa para o desenvolvimento .............................................................................58
Políticas de integração regional .............................................................................................61
INTEGRAÇÃO ECONÔMICA: COMÉRCIO E INVESTIMENTOS ......................................................63
PARCERIA COM OS EUA ...................................................................................................................68
JAPÃO E CHINA: COOPERAÇÃO E RIVALIDADES ...........................................................................71
CONCLUSÃO .....................................................................................................................................75

MÓDULO IV – UM NOVO JAPÃO PARA UM MUNDO NOVO? ........................................................ 77

QUAL É O PAPEL DO JAPÃO NO SÉCULO XXI? ..............................................................................77


Perspectiva cética ....................................................................................................................78
Perspectiva otimista ................................................................................................................80
NACIONALISMO................................................................................................................................84
JAPÃO E O PACIFISMO PROATIVO ..................................................................................................90
RELAÇÕES COM O BRASIL...............................................................................................................96
CONCLUSÃO ...................................................................................................................................100

BIBLIOGRAFIA ...............................................................................................................................102

PROFESSOR-AUTOR ......................................................................................................................114
MÓDULO I – PERÍODO PÓS-GUERRA FRIA E
DESAFIOS AO JAPÃO

Neste módulo, será apresentada uma pequena retrospectiva das relações internacionais do
Japão a partir do final da Guerra Fria, apresentando as transformações que influenciaram em um
primeiro momento a projeção e a ampliação da participação do Japão nas relações internacionais,
inclusive como um potencial substituto dos EUA na liderança. Além disso, serão destacados os
fatores do âmbito interno ao país repercutidos na política externa japonesa, envolvendo aspectos
econômicos, políticos e sociais.

Relações internacionais do Japão:


expectativas e frustrações
A queda do muro de Berlim foi um importante evento nas relações internacionais, pois foi
um marco do fim da chamada ordem internacional da Guerra Fria, portanto se passou a discutir
qual seria a nova configuração internacional. Mas o que seria essa ordem internacional? Segundo
Bull (2002, p. 7),

dizer que um conjunto de coisas demonstra uma ordem é, no sentido mais


simples e mais geral, afirmar que elas estão relacionadas entre si de acordo
com uma certa estrutura; que a sua relação recíproca não é fruto puramente
do acaso, mas contém algum princípio discernível.
Em outra passagem, Bull (2002, p. 3) complementa que a “ordem internacional” se refere a
um padrão de atividade que sustenta os objetivos elementares ou primários da sociedade dos
estados, ou sociedade internacional.
Portanto refletir sobre a ordem internacional não significa pensar em uma ausência de
divergências de interesses entre os países ou mesmo de conflitos, mas em uma racionalidade passível
de ser aplicada para o entendimento dos papéis e dos comportamentos dos Estados a partir do
momento em que os EUA, com a perda da capacidade de liderança internacional da ex-URSS no
final da década de 1980, passou ser a única superpotência.
Lafer (2018, p. 883), professor e ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil, apresenta bem
essa discussão, ao apontar o protagonismo dos EUA, mas ao mesmo tempo as expectativas sobre
outros países:

Neste contexto global que se deve examinar o papel que representarão os


Estados Unidos na “nova ordem” da qual desejam ser os inspiradores e
fiadores, mas para cuja função parece faltar-lhes os recursos materiais
indispensáveis para ser seu único organizador – ou seja, o hegemon. Os
EUA vivem o dilema de ter conseguido vencer a batalha ideológica, no
momento preciso em que os seguidores muitas vezes tardios desses mesmos
valores – democracia, mas sobretudo economia de mercado – se mostram
mais eficazes na sua implementação, embora se possa discutir até que
ponto é a mesma forma de economia de mercado que está em ação nos
EUA, na CEE ou no Japão.

De fato, o professor da Universidade de Tóquio, Takashi Inoguchi (1988) já propunha alguns


cenários mesmo antes da queda do muro de Berlim e da dissolução da ex-URSS formalizada em 8
de dezembro de 1991, pelo acordo assinado entre Rússia, Ucrânia e Bielorrússia, três das principais
repúblicas soviéticas.
A seguir, apontam-se os quatro cenários de ordem internacional propostos por Inoguchi
(1988), nos quais ele discute quais papéis o Japão poderia desempenhar em cada uma delas:
 Pax Americana – Fase II;
 Bigemony;
 Pax Nipponica e
 Pax Consortis.

Apresentando brevemente essas projeções, o cenário Pax Americana – Fase II consistiria no


fato de os EUA serem capazes de manter a sua hegemonia, a sua capacidade de manutenção da
estabilidade global e de controle dos rumos da economia mundial. No segundo cenário, Bigemony,
o Japão ampliaria a sua participação nas questões internacionais, refletindo a sua estatura de segunda

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economia mundial à época. Entretanto, enquanto no primeiro caso o papel japonês seria
basicamente de instrumentalizar o seu poder econômico para apoiar os EUA, neste segundo
panorama disporia também de um papel militar.
No terceiro cenário, Pax Consortis, os EUA manteriam uma posição de liderança global, mas
agora compartilhada com o Japão e a União Europeia. Seria uma forma de se distribuírem os custos
e as responsabilidades pela manutenção da estabilidade internacional. Nesse contexto, o papel do
Japão seria o de intermediar as relações entre os EUA e a Rússia – potências nucleares – na busca
de respostas não militares às questões globais.
O quarto cenário apresentado foi o que Inoguchi (1988) denominou de Pax Nipponica, em
que o Japão emergiria como o país hegemônico, reconstruindo uma ordem semelhante à da Pax
Britânica promovida pela Inglaterra no século XIX, bem como à Pax Americana, liderada pelos
EUA ao longo do século XX. Todavia esse autor ressalva que, pelo fato de o Japão não ser uma
potência nuclear, seria necessário que os demais países abdicassem dos seus arsenais nucleares.
Essa restrição é importante porque, com a derrota na II Guerra Mundial, a nova constituição
promulgada pelo imperador Hirohito em 3 de novembro de 1946 trouxe no seu art. 9º restrições à
atuação militar do Japão ao afirmar que “o povo japonês renuncia para sempre o uso da guerra
como direito soberano da nação ou a ameaça e uso da força como meio de se resolver disputas
internacionais” (CONSTITUIÇÃO DO JAPÃO, 1946).
Esses cenários que projetavam uma ampliação da participação nipônica nas questões
internacionais não eram somente de percepções japonesas, mas também de analistas ocidentais que
apontavam que os EUA tinham vencido a disputa ideológica da Guerra Fria contra a ex-União
Soviética, muito embora o vencedor da guerra econômica tenha sido o Japão (NESTER, 1993, p. 3).
Essa percepção de que o Japão se beneficiou ao longo do período da Guerra Fria fez com que
emergissem pressões internacionais para que o país ampliasse a sua atuação internacional, que chegou
até a ter uma denominação, burden sharing, que pode ser traduzida como “divisão de encargos”.
Essa cobrança ocorreu pelo fato de o Japão ser à época a segunda maior economia do mundo,
porém sem ter uma participação política internacional que fosse percebida como equivalente à sua
estatura econômica, passando, por essa razão, a ser denominado “gigante econômico e anão político”.
Os dados da evolução do PIB do Japão no período pós II Guerra Mundial são indicadores
do crescimento da importância japonesa em termos econômicos globais. Comparando-se os sete
países mais ricos entre 1960 e 1990, nota-se que o PIB do Japão foi multiplicado em mais de 70
vezes no período, possuindo de longe o maior crescimento desse grupo, que teve como segundo
melhor desempenho a Itália, que ficou 29 vezes maior, seguido de perto pela França, com 20 vezes.

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Tabela 2 – Evolução do PIB do G-7 (1960-1990)

variação
país 1960 1990
(1990/1960)

EUA 543,3 5.963,1 11,0

Japão 44,3 3.132,8 70,7

Alemanha* N/D 1.771,7 -

França 62,2 1.269,2 20,4

Itália 40,4 1.181,2 29,2

Reino Unido 73,2 1.093,2 14,9

Canadá 40,5 593,9 14,7

* No caso da Alemanha, não há dados disponíveis nesse ano para serem comparados.

Fonte: WORLD BANK. World Bank National accounts data and OECD national accounts data files.
Disponível em: <https://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.MKTP.CD?locations=JP&name_desc=false>.
Acesso em: 20 maio 2021.

Associada à pujança econômica japonesa, havia também nesse período a avaliação de que o
poder econômico se tornaria mais importante que o poderio militar para liderança internacional,
isso aumentava a expectativa sobre uma ascensão global japonesa. O primeiro-ministro Noboru
Takeshita, que exerceu mandato de 1987 a 1989, já afirmava nos seus discursos a disposição
japonesa para a maior participação internacional, para reduzir as responsabilidades norte-
americanas, afirmando haver um acordo com o presidente George Bush, que, em contrapartida,
reconheceria essa maior autonomia japonesa (EDSTRÖM, 1999, p. 139).
O seu sucessor, Toshiki Kaifu (1989-1991) discursou na 121ª Sessão na Dieta japonesa sobre
as suas respectivas políticas. As suas declarações apontam uma aspiração do governo de aumentar a
sua participação internacional.

Acredito que o povo japonês passou a aceitar a consciência comum de que


o Japão precisa contribuir ativamente para a paz mundial, não apenas em
termos financeiros e materiais, mas também em termos de pessoal. É claro
que devemos defender firmemente nosso ideal de paz baseado na contrição
de ações passadas, mas também devemos trabalhar para ver que esses ideais
sejam traduzidos em realidade, promovendo ainda mais a cooperação
humanitária internacional e tomando uma parte mais ativa e fazendo o que
pudermos nos esforços internacionais para criar uma ordem que preserve
a paz mundial (MOFA, 1991, tradução nossa).

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Além dessa motivação externa, aponta-se que existe também uma lógica própria do Japão pela
sua inserção internacional, que pode ser explicitada por uma busca de reconhecimento internacional.
Conforme aponta o ex-diplomata Kazuo Ogura (2015, p. 48) na sua obra Japan’s Asian Diplomacy,
identificou-se nos governantes japoneses a diplomacia do reconhecimento, que pode ser observada
como característica de cada novo regime na história japonesa (OGURA, 2015, p. 49, tradução nossa).
Esse objetivo, segundo o autor, não surgiu apenas no pós-Guerra Fria, mas é uma meta muito antiga, o
que exemplifica com a iniciativa do príncipe Shotoku do Japão no ano 600, que enviou representantes
à China, buscando o reconhecimento do imperador Sui.
Fazendo uma pequena digressão e analisando o histórico das relações internacionais do Japão que
se desenvolve a partir da segunda metade do século XIX, registra-se o restabelecimento do país às relações
internacionais com a abertura dos portos japoneses por imposição dos EUA liderada pelas forças navais
do comodoro Matthew C. Perry em 1853. Naquele momento, o governo percebeu a defasagem em que
o país estava em termos tecnológicos, demonstrada pela incapacidade de resistir às ameaças dos canhões
norte-americanos, já que o país ficou cerca de 250 anos sem armas de fogo.
Essa situação de inferioridade em relação aos EUA se refletiu também nos acordos que se
sucederam com outros países ocidentais, negociados a partir de 1858, conhecidos como “tratados
desvantajosos”, foram estabelecidos também com “Holanda, Rússia, Reino Unido e França, que não
consideravam o Japão como um país civilizado” (NINOMIYA, 1996, p. 247).
Essa situação foi modificada após a Restauração Meiji, quando o governo passou a enviar missões
ao exterior para buscar equalizar o Japão com as nações ocidentais, e a partir de então “o Japão
gradualmente cresceu em importância entre a família das nações, uma vez que abandonou a política de
reclusão e rapidamente passou a abraçar o caminho para a modernização rápida” (IOKIBE, 2008, p. v).
Como consequência dessas ações, o Japão já no final do século XIX apareceu ao mundo como uma
nova potência com as suas vitórias sobre a China (1895) e sobre a Rússia (1905), conforme apontam
Teramoto e Minohara (2017).
Retornando ao período do pós-Guerra Fria, percebe-se que a busca por reconhecimento e status
internacional não é inédita na política externa japonesa. Aliás, o teórico das relações internacionais Hans
Morgenthau (2003, p. 148) aponta que o reconhecimento, apesar de não ser um tema tão discutido, é
um grande objetivo dos atores internacionais, e isso não é diferente para o Japão. Esse fato foi ratificado
pelo primeiro-ministro Toshiki Kaifu em discurso de outubro de 1990 ao parlamento, ao apontar a
segurança, a sobrevivência e o reconhecimento como os três objetivos nacionais do país, destacando-se
este último item ao afirmar que o país deveria esforçar-se para alcançá-lo (EDSTRÖM, 1999, p. 143).
A ajuda externa para o desenvolvimento (AOD) pode ser vista como um dos elementos da política
externa japonesa que ilustra o destaque que o país vinha conquistando no final da década de 1980,
especialmente, em termos de elevação do seu status e do seu reconhecimento internacional. Além disso,
o próprio governo japonês ressaltava a sua importância: “a assistência oficial ao desenvolvimento é o
instrumento mais importante da política externa do Japão, determinado a promover a paz e seu
importante veículo de contribuição internacional” (MOFA, 1994).

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Coincidentemente, em 1989, ano da queda do muro de Berlim, de acordo com as estatísticas da
época, o Japão se tornaria o maior fornecedor de AOD no mundo.

Mesmo na década de 1980, a AOD do Japão continuou a se expandir em


paralelo com o forte desempenho econômico japonês. Em 1989, o Japão
ultrapassou os Estados Unidos da América para se tornar o maior doador
mundial, com a AOD líquida, atingindo US$ 8,97 bilhões (MOFA, 2014,
p. 3, tradução nossa).

Gráfico 1 – Tendências dos maiores AOD de países membros do DAC


(distribuição líquida – US$ milhões)

40 000
Estados Unidos Alemanha
35 000 Reino Unido França
Japão
30 000

25 000

20 000
Japão se torna maior
15 000
provedor de ODA.
10 000

5 000

2020 (p)
1990(a)
1992(a)
1980
1982
1984
1986
1988

1994
1996
1998
2000
2002
2004
2006
2008
2010
2012
2014
2016
2018

(a) incluindo perdão de dívidas de reivindicações não APD, exceto para DAC total
(p) dados preliminares

Fonte: OECD. Net ODA from DAC countries from 1950 to 2020.
Disponível em: <https://www.oecd.org/dac/financing-sustainable-development/development-finance-data/#>.
Acesso em: 9 jun. 2021.

Na década de 1990, o Japão, na situação de protagonista no fornecimento de AOD, “tornou-se


o principal doador em termos de quantidade, e a sua AOD passou a assumir maior visibilidade em
várias regiões do mundo” (MOFA, 2014, p. 4; ARAGUSUKU, 2011, p. 47). De acordo com o relatório
Japan’s ODA Annual Report (Summary) de 1998, o país se manteve como o maior doador mundial de
AOD por sete anos consecutivos.
Como se pode observar, no período imediato ao final da Guerra Fria, o Japão apresentava
potenciais para uma ampliação do seu papel internacional como segundo maior PIB, vontade política
declarada por políticos japoneses, além de ter ascendido à posição de maior fornecedor de ajuda
internacional. Aliado a esses fatores, o país ainda se destacava pelo volume de participação no comércio
e nos investimentos internacionais e avanços tecnológicos.

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No caso do comércio internacional, nota-se no gráfico a seguir que o superávit a favor do
Japão apresenta uma tendência de crescimento a partir de meados da década de 1970. Houve uma
queda nos anos de 1979 e 1980, impactados pelo “choque do petróleo”, mas a década de 1980 foi
de superávits, assim como a Alemanha, fato que vai dar subsídios aos cenários propostos por
Inoguchi (1988).

Gráfico 2 – Evolução dos saldos das balanças comerciais do G-7 (1960-1990)

100
US$ Bilhões

50

0
1960

1965

1970

1975

1976

1977

1978

1979

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990
-50

-100

-150
Canadá França Alemanha Itália
Japão Reino Unido Estados Unidos
-200

Fonte: WTO. Data. Disponível em: <https://data.wto.org>. Acesso em: 2 maio 2021.

Apesar desses destaques durante a década de 1990, as expectativas geradas após o final da
Guerra Fria de ampliação do papel do Japão não ocorreram. Analisando retrospectivamente, nota-
se uma prevalência do primeiro cenário, isto é, “na década de 90, os EUA surgiram como a única
superpotência capaz de atuar, simultaneamente, no campo estratégico-militar, no campo
econômico e no campo dos valores” (LAFER, 2018, p. 903).
Esse quadro persistiu nessas duas primeiras décadas do século XXI. Apesar da percepção de,
no período imediato ao pós-Guerra Fria, haver uma convergência de interesses norte-americanos
em reduzir os seus custos para a manutenção da estabilidade global aliada às manifestações do
interesse japonês em ampliar o seu papel internacional, foram frustradas as expectativas de liderança
internacional japonesa apontadas nos cenários do professor Inoguchi (1988). Além disso, o país
experimenta um longo período de baixo crescimento e redução relativa do seu peso internacional,
repercutindo as dificuldades econômicas a partir do início da década de 1990, com o estouro da
bolha econômica, conforme será abordado na próxima unidade.

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Economia japonesa: projeção e barreira ao
status internacional
O breve histórico apresentado na unidade anterior revela um fator que pode ser indicado
como relevante para as expectativas de ampliação da liderança internacional japonesa, isto é, o
crescimento econômico obtido após o término da II Guerra Mundial. No gráfico 3, a seguir, pode-
se observar que entre 1961 a 1969 o PIB japonês cresceu ao ritmo acima de 10% ao ano e, nas
décadas seguintes, de 1971 a 1990, apesar de haver uma redução no ritmo de crescimento do PIB,
a taxa média ficou acima dos 4,4%. Esses resultados, somados ao da balança comercial apresentados
acima no Gráfico 2, contribuíram para alavancar a posição internacional do Japão.

Gráfico 3 – Taxas de variação (%) do PIB do Japão (1961-2019)

12
10
8
6
4
2
0
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
2005
2007
2009
2011
2013
2015
2017
2019
-2
-4
-6

Fonte: WORLD BANK. World development indicators: GDP growth (annual %). Disponível em:
<https://databank.worldbank.org/source/world-development-indicators>. Acesso em: 25 maio 2021.

O país saiu da II Guerra em ruínas, as suas indústrias destruídas, mas, segundo aponta Ernani
Torres (1999, p. 234), “os japoneses se aproveitaram habilmente das oportunidades que lhes
surgiram, enquanto transitavam da situação de inimigos derrotados (1945) para a de segunda
potência industrial do mundo capitalista (1968)”. Os resultados da balança comercial apresentados
na unidade anterior, analisando a alta taxa de crescimento do PIB, fizeram com que houvesse um
fortalecimento também das empresas japonesas, que passaram a buscar novas oportunidades de
negócios no exterior, e, consequentemente, houvesse uma ampliação dos investimentos japoneses
no exterior.

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Com isso a pujança da economia japonesa passou a ser refletida e percebida também pelos
investimentos diretos estrangeiros (IDE) japoneses no mundo. É facilmente observável pelo gráfico 4
que, ao longo da década de 1970, os valores são crescentes, e, nos anos 1980, o país passou a ser o
segundo maior, atrás apenas dos EUA, chegando a ocupar a primeira posição nos anos de 1985 e 1988.

Entre abril de 1986 e março de 1991, o total de investimentos externos


japoneses somou US$ 227,2 bilhões e o Japão se tornou a maior nação
credora mundial. Foram criadas indústrias japonesas na América do Norte,
Europa e outras partes da Ásia. Os japoneses adquiriram propriedades
estrangeiras, companhias, participações e títulos governamentais,
particularmente do governo dos EUA, o qual tinha um crônico déficit no
orçamento e estava sendo financiado por recursos japoneses (SMITH, 1995,
p. 139).

Gráfico 4 – Evolução do investimento direto estrangeiros dos oito principais países de origem
em 1990 (US$ bilhões)

60,0 Japão Estados Unidos 58,77


Alemanha China
50,0
Países Baixos Canadá
40,0
Suiça França
31,27
30,0
19,09

20,0 17,30
12,78
10,0 5,79
5,75
0,0 4,00
1970 1975 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992
Fonte: WORLD BANK. World development indicators. Atualizado em: 25 maio 2021. Disponível em:
<https://data.worldbank.org/indicator/BM.KLT.DINV.CD.WD>. Acesso em: 20 jun. 2021.

Essa performance dos IDE se refletiu na presença internacional. De acordo com o levantamento
feito pela Fortune Global 500, entre as 500 maiores empresas do mundo em 1995, 149 companhias
eram multinacionais japonesas (HONG et al., 2017, p. 52). Além disso, analisando os registros de 1995,
entre as 10 maiores companhias do mundo, seis eram de nacionalidade japonesa, evidenciando o
aproveitamento dos benefícios proporcionados ao Japão após o final pós II Guerra Mundial, não só
para o crescimento da economia doméstica, mas também para a realização de negócios no exterior pelas
empresas. Esses fatos serviram de argumentos aos que demandavam maior participação do Japão nas
questões internacionais.

17
Quadro 1 – Perda de posição das multinacionais japonesas

1995 2000 2005 2010 2015 2020

Mitsubishi General Motors Wal-Mart Stores, Wal-Mart Stores,


Walmart Walmart
Corporation Corporation Inc. Inc.

Mitsui & Co., Wal-Mart Stores, Royal Dutch Shell Sinopec


BP p.l.c. Sinopec Group
Ltd. Inc. p.l.c. Group

Itochu Exxon Mobil Exxon Mobil Exxon Mobil Royal Dutch


State Grid
Corporation Corporation Corporation Corporation Shell

Royal China
Sumitomo Ford Motor China National
Dutch/Shell BP p.l.c. National
Corporation Company Petroleum
Group Petroleum

General Motors DaimlerChrysler General Motors Toyota Motor Royal Dutch


Exxon Mobil
Corporation A.G. Corporation Corporation Shell

Marubeni DaimlerChrysler Japan Post


Mitsui & Co., Ltd. BP Saudi Aramco
Corporation AG Holdings Co., Ltd.

China
Ford Motor Mitsubishi Toyota Motor
Petrochemical State Grid Volkswagen
Company Corporation Corporation
Corp.

State Grid
Exxon Toyota Motor Ford Motor
Corporation of Volkswagen BP
Corporation Corporation Company
China

Nissho Iwai General Electric General Electric


AXA Toyota Motor Amazon
Corporation Company Company

Royal China National


Itochu
Dutch/Shell Total S.A. Petroleum Glencore Toyota Motor
Corporation
Group Corporation

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Fortune Ranking. Global 500. Fortune Media. Vários anos. Disponível em:
<https://fortune.com/global500>. Acesso em: 11 jun. 2021.

Contudo também fica evidente que ao longo do tempo há uma perda das primeiras posições
pelas multinacionais japonesas. Analisando os 10 primeiros colocados, nota-se que em 2000 quatro
posições eram de empresas japonesas, depois é reduzido para uma em 2005, aumenta para duas em
2010 e cai novamente para apenas uma em 2015 e 2020.

18
O estudo de Paul C. Hong et al. (2017, p. 52) destaca ainda que não foi somente entre as 10
primeiras colocações que houve uma diminuição da presença japonesa, mas também entre o
conjunto das 500 maiores do Fortune Ranking. Em adição aos dados, acrescentam-se mais duas
colunas evidenciando que há uma tendência à diminuição de presença japonesa entre as 500
maiores até o ano de 2020, estabilizando-se um pouco acima das 50 empresas.

Tabela 3 – Número de empresa japoneses entre as 500 maiores do Fortune Ranking

ano 1995 2000 2005 2012 2013 2014 2015* 2020*

número de empresas 149 107 81 68 62 57 53 53

* Anos de 2015 e 2020, extraídos do Fortune Ranking. Global 500. Fortune Media. Vários anos.
Disponível em: <https://fortune.com/global500>. Acesso em: 11 jun. 2021.

Fonte: Elaborado pelo autor com base em HONG et al. (2017, p. 52).

Os dados evidenciam que, até os primeiros anos da década de 1990, havia fundamentos
econômicos como o crescimento do PIB, o comércio internacional, o IDE e a AOD, além da
presença de empresas do Japão no mundo que subsidiaram a projeção internacional desse país.
Paralelamente à internacionalização de produtos, houve também um crescimento global de
admiração pela cultura, pela tecnologia e pelas formas de administração japonesa. Desse modo,
juntamente com o ganho do mercado mundial e a popularização de marcas como Sony, Casio,
Toyota, houve um aumento do apreço à qualidade e à inovação tecnológica, técnicas de gestão da
administração japonesa como just-in-time e kanban que passaram a ser um modelo a seguir,
conforme aponta Celso Lafer (2018, p. 895):

O Japão, por sua vez, oferece dupla contribuição para o enriquecimento


das práticas capitalistas. Em primeiro lugar, inovou os modelos de gestão
e funcionamento dos processos produtivos. Substituiu o “fordismo” por
um novo conceito de produção integrada, com ênfase na inovação
tecnológica e na redução de custos. Em segundo lugar, tanto em nível
empresarial quanto de política governamental, o Japão incorporou a noção
de planejamento estratégico, que redimensionou sobretudo as atividades
de planejamento industrial, desenvolvidas de comum acordo entre o setor
público e o setor privado e, sempre, com ganhos significativos em termos
de competitividade. A ideia do planejamento industrial, com
aplicabilidade dentro de programas de médio e longo prazos, reforça
consideravelmente vantagens comparativas da economia japonesa em nível
internacional e a distingue em muitos aspectos do modelo
norte-americano.

19
Por extensão, houve uma grande expansão do interesse por elementos da cultura japonesa.
Esse encantamento do mundo pelo Japão foi apresentado pelo professor Joseph Nye, como poder
brando ou soft power, termo em inglês bastante difundido no ambiente das relações internacionais.
Entretanto, apesar de todos esses fatores positivos presentes no Japão até o imediato pós-
Guerra Fria que lhe concediam potencial para a ocupação de um papel de liderança global, esse fato
não se concretizou como esperado. O que levou à frustração dessa expectativa?
Um dos fatores apontados, que tiveram uma grande contribuição para esses resultados, foi o
estouro da bolha econômica em 1991, resultado, entre outros fatores, do período de constante
crescimento econômico que durou de novembro de 1986 a fevereiro de 1991, totalizando 51 meses.
Após esse período, houve piora dos resultados econômicos e, os indicadores ao longo da década de
1990 passaram a apresentar uma tendência de enfraquecimento, conforme pode ser observado, por
exemplo, no Gráfico 3, que mostra a taxa de variação do PIB.
Contudo os impactos não se resumiram a uma perda de dinamismo no crescimento
econômico, já que o estouro da bolha gerou impactos duradouros envolvendo deflação e perda de
riqueza, pois houve uma forte queda no valor de ativos imobiliários e nas ações da bolsa de Tóquio,
que ao se desvalorizarem afetaram tanto as empresas como também os consumidores japoneses que
tinham realizado investimentos nesses mercados. A economia, além de crescer menos, entrou em
estagnação, chegando a contrair nos anos de 1993, 1998 e 1999 (ver Gráfico 3).
Nas relações internacionais, não é raro observar que o enfraquecimento de fatores econômicos
afeta a atuação e a política externa dos países, mas no caso do Japão se destaca maior dependência
desse fator, porque, desde o final da II Guerra Mundial, o país optou por restringir muito da sua
participação internacional por meio de uma atuação econômica. Essa escolha foi fundamentada pela
restrição ao uso de recursos militares à sua atuação internacional imposta pela Constituição do Japão.
Autores como Donald K. Emmerson (1998) e Kim Sung-Han (1999) vão apontar ainda que,
além do enfraquecimento das suas ferramentas de atuação externa, viram-se também três outras
implicações desses problemas econômicos:
i. O governo de Tóquio perdeu a autoconfiança para o exercício de um papel internacional
mais amplo e afirmativo, revertendo a sinalização de disposição para uma maior atuação
global manifestada, inclusive, pelas falas dos seus primeiros-ministros.
ii. A crise econômica se tornou o foco da atenção do governo, que passou a concentrar os
seus esforços para resolver os problemas econômicos internos.
iii. Houve um enfraquecimento do status internacional do Japão, pois, se o crescimento e a
pujança econômica fortaleciam a imagem global japonesa, a crise afetou negativamente a
percepção do seu potencial de liderança.

Yasuhiro Nakasone (2001) ratifica que o estouro da bolha econômica no Japão produziu
impactos nas áreas econômica, política e social. Algumas das repercussões da perda de dinamismo
econômico já foram apontadas, sendo possível exemplificar ainda mais com o impacto no volume

20
de ajuda externa oferecida pelo Japão. O país chegou à liderança internacional como maior
fornecedor desse tipo de ajuda pela primeira vez em 1989 e manteve essa posição em boa parte da
década de 1990 até 2000. Entretanto, a partir de 2000, os EUA retomam a liderança e a mantêm
desde então. O Japão, por sua vez, manteve a segunda posição até 2005, depois passou a ocupar a
quinta posição na maior parte dos anos.
Já no campo da política, um impacto importante influenciado pela queda do dinamismo
econômico foi a instabilidade que se instaurou no país, refletindo em constantes trocas de primeiros-
ministros que exerceram curtos mandatos a partir da década de 1990, com exceção dos primeiros-
ministros Junichiro Koizumi e Shinzo Abe, tema que será abordado no próximo módulo.
A terceira área impactada pelos problemas econômicos ressaltados por Nakasone (2001) foi
na área social, que se expressa pelo aumento dos problemas entre a população, como aumento da
desigualdade social, criminalidade e prostituição juvenil.
Em síntese, a economia japonesa influenciou e impulsionou a criação de cenários para um
Japão como ator político internacional forte no pós-Guerra Fria. Contudo a percepção de relativo
enfraquecimento da economia resultou em uma barreira a esse cenário, pois houve uma clara falta
de disposição do governo de Tóquio, após o estouro da bolha econômica, em focar um aumento
da capacidade de projeção internacional.

Fragilidades impostas pela instabilidade


política
Analisando os mandatos dos primeiros-ministros do Japão a partir do final da Guerra Fria
em 1989, observa-se que, ao longo dos anos 1990 até 2001, quando Junichiro Koizumi foi eleito
primeiro-ministro do Japão, o país passou por um período de instabilidade política. Foram oito
políticos com mandatos que duraram em média, menos de dois anos, as exceções foram Toshiki
Kaifu (1989-1991) e Ryutaro Hashimoto (1996-1998), que também estiveram pouco mais de dois
anos no cargo.

21
Tabela 4 – Duração de mandatos dos primeiros-ministros do Japão (1989-2001)

primeiro-ministro início término total de dias

Toshiki Kaifu (PLD) 10/08/1989 28/02/1990 203

Toshiki Kaifu (PLD) 28/02/1990 05/11/1991 616

Kiichi Miyazawa (PLD) 05/11/1991 09/08/1993 644

Morihiro Hosokawa (Partido do Novo 09/08/1993 28/04/1994 263


Japão)

Tsutomu Hata (Partido da Renovação) 28/04/1994 30/06/1994 64

Tomiichi Murayama (Socialista) 30/06/1994 11/01/1996 561

Ryutaro Hashimoto (PLD) 11/01/1996 07/11/1996 302

Ryutaro Hashimoto (PLD) 07/11/1996 30/07/1998 631

Keizo Obuchi (PLD) 30/07/1998 05/04/2000 616

Yoshiro Mori (PLD) 05/04/2000 04/07/2000 91

Yoshiro Mori (PLD) 04/07/2000 26/04/2001 297

Fonte: PRIME MINISTER OF JAPAN AND HIS CABINET. Prime minister in history.
Disponível em: <https://japan.kantei.go.jp/cabinet/0061-pre_e.html>. Acesso em: 21 jun. 2021.

Considerando-se que a eleição para o cargo de primeiro-ministro no Japão é, oficialmente,


para uma permanência de quatro anos, sendo possível ser reeleito, esses curtos mandatos têm como
uma das causas, segundo Tomohito Shinoda (2000, p. 14) a disputa interna entre as facções do
Partido Liberal Democrático (PLD), que vinha governando o país desde a década de 1955, graças
à coalizão entre o Partidos Liberal e o Partido Democrático.
Além das disputas intrapartidárias nos anos iniciais da década de 1990, também havia a
insatisfação com as consequências do estouro da bolha de especulação financeira que impôs
dificuldades à economia japonesa, bem como havia acusações de corrupção contra o governo do
PLD. O partido, ao se manter durante décadas no poder, estabeleceu um sistema de relações do
governo com os membros dos conglomerados econômicos – conhecidos como keiretsu – como
bancos, empresas e as suas subcontratadas. Essas relações estavam sofrendo múltiplas acusações de
corrupção, que depois se tornaram escândalos e afetaram de maneira significativa a classe política e
as instituições. Essas denúncias de corrupção envolvendo pessoas do governo e do setor privado,

22
apesar de não serem exatamente uma novidade, trouxeram turbulências ao cenário político japonês,
pois quase todos os políticos bem-sucedidos do PLD, incluindo o ex-primeiro-ministro Hosokawa,
que saiu do partido para formar um novo em 1992, sofreram acusações de corrupção.
Portanto, no final da década de 1980 e nos primeiros anos da década de 1990, o Japão passou
por um período em que o PLD apresentou uma crise de liderança, conforme apontado por Ellis S.
Krauss e Robert J. Pekkanen (2011), depois da saída de Nakasone, já que o LDP voltou a um padrão
de tomada de decisão descentralizada e de relativa fraqueza na liderança. Já em 1989, aparecem os
sinais de enfraquecimento do PLD, quando o partido perdeu a maioria na Câmara Alta.
Em 1991, o fato de o Japão não ter conseguido atender às demandas feitas para participação
no enfrentamento dos problemas da Guerra do Golfo, causada pela invasão do Kuwait pelo Iraque,
também produziu questionamentos ao governo do PLD, aprofundando o abalo da sua imagem,
que já estava deteriorada com a crise econômica de 1991 causada pela explosão da bolha,
comprometendo ainda mais a liderança desse partido. Esse ambiente de escândalos e divergências
entre as facções no PLD levou a defecções de políticos como Morihiro Hosokawa em 1992, que
formou o partido do Novo Japão; e de Ichiro Ozawa e Tsutomo Hata em 1993, que fundaram o
Partido da Renovação do Japão.
Em 18 de junho de 1993, o então primeiro-ministro Kiichi Miyazawa do PLD sofreu um
voto de desconfiança, e houve a eleição de Hosokawa para primeiro-ministro, rompendo as décadas
de dominação do PDL. Entretanto, apesar de ser apontado como uma vitória da oposição, tanto
Morihiro Hosokawa como Tsutomo Hata, que sucederam Miyazawa, foram dissidentes do PLD
pouco antes de chegarem ao posto de primeiro-ministro.
Se já havia dificuldade do governo japonês liderado pelo PLD para responder às demandas
internacionais do pós-Guerra Fria, conforme declaravam os primeiros-ministros Takeshita e Kaifu,
a saída desse partido do governo e os curtos mandatos dos governos de oposição também
contribuíram para obstaculizar um maior compromisso e uma expansão da atuação internacional
do Japão. Como se pode observar na Tabela 4, depois da saída de Toshiki Kaifu, o primeiro-
ministro Miyazawa ficou menos de dois anos; o sucessor, Morihiro Hosokawa (Partido do Novo
Japão) permaneceu menos de um ano; o mandato de Tsutomu Hata (Partido da Renovação) foi de
apenas 64 dias e na sequência Tomiichi Murayama (Socialista) ficou cerca de um ano e meio.
Portanto, apesar das expectativas de grandes mudanças nas políticas, a saída do PLD do
governo fez com que surgissem incertezas sobre o futuro do Japão e dificultasse as projeções do final
da década de 1980, isto é, de que o país pudesse ameaçar a posição de liderança norte-americana,
uma vez que ficaram enfraquecidas, porque os governos de oposição que assumiram após Miyazawa
não tinham uma estrutura partidária que permitisse realizar uma gestão administrativa e diálogos
do governo com a burocracia de maneira eficiente. Isso dificultou não só as gestões das políticas
domésticas, mas também a elaboração de uma política externa que contribuísse para ampliar o status
internacional do Japão.

23
Com isso, fazendo-se uma análise retrospectiva, observa-se que a realidade das relações
internacionais ficou marcada até o final da década de 1990 por uma tendência de continuidade na
liderança global dos EUA e o Japão mantendo o papel de parceiro dos norte-americanos. Essa atuação
já era sinalizada no início dos anos 1990, pelo professor Yoichi Funabashi (1991-1992), ao sugerir
que o Japão desempenharia a função de auxiliador das políticas dos EUA como um “parceiro júnior”
– em inglês, junior partner – ou um “assistente da liderança” – em inglês, supportive leadership.
Reinhard Drifte (1990, p. 109) é outro autor que projetou um cenário semelhante, e
apontando duas razões básica para isso:
i. Faltava ao Japão elementos necessários para o status de um líder mundial no sentido
tradicional, como: grande população; território amplo e uma economia de maior porte.
ii. Faltava vontade política com apoio suficiente de forças internas, capazes de sustentar uma
atuação internacional ampla.

Essas avaliações se diferem das apresentadas por Takashi Inoguchi (1988), que sinalizava para
uma liderança de maior projeção e proativa. Ainda no início dos anos 1990, Shiro Saitô (1990)
também ressaltava que era necessário se fazer uma distinção entre uma “liderança de iniciativa” (termo
em inglês, leadership initiative) e uma “liderança pelo exemplo” (termo em inglês, leadership example).
Para o Japão o que foi projetado ao final dos anos 1980 era de uma “liderança pelo exemplo”, construída
pelo modelo de nação pacifista, de um invejável sucesso no crescimento econômico associado à abertura
de mercado, e pela sua cooperação internacional realizada pela AOD.
Esse perfil de liderança aproxima-se do uso do poder brando, pois exige habilidade para influenciar
outros com seus valores, diferentemente da liderança norte-americana, que se caracteriza por ser proativa,
na medida em que possui capacidade de fazer outros se submeterem a sua liderança, inclusive por meio de
imposição por força (SAITÔ, 1990, p. 186). Com os problemas na economia a capacidade de uso da
“liderança pelo exemplo” se enfraqueceu, mas, além disso, acrescenta Tanaka Akihiko (1999), mesmo o
poder econômico e militar sem uma firme vontade política não conduz à liderança, e o que se percebeu,
como apontou Drifte (1990) também a disposição política do Japão foi afetada.
Portanto, o Japão ingressa no século XX com uma situação internacional mais fragilizada,
pois a economia não poderia ser mais o fundamento da sua liderança global, uma vez que, depois
de uma década de baixo desempenho econômico, mesmo se mantendo como a segunda maior
economia do mundo, a posição do Japão como modelo econômico passou a ser questionada.
Nesta unidade, destaca-se que a situação política também não foi favorável devido à constante
troca de liderança. O primeiro-ministro com maior mandato na década de 1990 Ryutaro
Hashimoto, que permaneceu cerca de dois anos e meio – de 11 de janeiro de 1996 a 20 de julho
de 1998 –, mas os seus sucessores novamente tiveram mandatos curtos, tanto Keizo Obuchi como
Yoshiro Mori tiveram mandatos de menos de dois anos.

24
Diante desse cenário, abre-se uma nova discussão de inserção internacional japonesa, pois o
país surgiu como superpotência econômica nos anos 1980. Nos anos 1990 o seu desempenho nessa
área perdeu o brilho, mas, conforme aponta Lais Belini (2019, p. 23), “essa recessão faz com que se
crie um motor que estimula o mercado de entretenimento popular, isto é, o da cultura pop japonesa,
consolidando o país com uma superpotência cultural com influência global”, tema que será tratado
no próximo módulo.

Desafios do envelhecimento da sociedade


Quando se discute a inserção internacional de um país, há vários elementos que podem ser
listados para uma liderança mundial, conforme citado acima Reinhard Drifte (1990, p. 109), como:
grande população, território amplo, economia de maior porte e vontade política.
Nesta unidade, o tópico que será tratado está relacionado à evolução demográfica japonesa a
partir do final da Guerra Fria. A população do Japão atingiu o seu ápice em 2008 com 128,08
milhões de habitantes, mas desde então vem apresentando uma tendência de diminuição. Essa
redução reflete a queda no número de nascimentos no país ao longo das últimas décadas, ficando a
partir de 2006 inferior ao número de mortes.

Gráfico 5 – Histórico de nascimentos, mortes e população total do Japão (1988-2020)

Milhões Milhões
1,60 Total Mortes Nascimentos 129,0

1,40 128,0

127,0
1,20
126,0
1,00
125,0
0,80
124,0
0,60
123,0
0,40
122,0

0,20 121,0

0,00 120,0
1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

2008

2010

2012

2014

2016

2018

2020

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Time series tables: 1 total population (both sexes), 3 live births and 4 deaths.
Disponível em: <https://dashboard.e-stat.go.jp/en/timeSeries?fieldCode=02>. Acesso em: 20 maio 2021.

25
Apesar da diminuição de a população estar ocorrendo a partir da primeira década do século
XXI, a discussão sobre o perfil da sociedade japonesa vem-se aprofundando pelo menos desde o
começo da década de 1980, quando a preocupação com o envelhecimento da sociedade passou a ser
vista como um problema para o país. Em 1989, ano da queda do muro de Berlim, a quantidade de
idosos de 65 anos ou mais representava 11,6% da população japonesa (COULMAS, 2007, p. 4).
De acordo com Beatriz Kaori Lopes (2020), em 1985 o Japão se tornou o proporcionalmente
a nação mais velha no mundo e, em 2020, a parcela dessas pessoas com mais de 65 anos representava
28,5% do total da população japonesa, atingindo o número de 35,58 milhões pessoas, sendo que
“50% têm de 65 a 74 anos (idosos-jovens), 34% possuem 75 a 84 anos (idosos-velhos) e 16%
possuem 85 anos ou mais (idosos-mais-velhos)” (LOPES, 2020, p. 37).
Um dado positivo retirado dessas referências acima é que há alta expectativa de vida no país,
“no Japão a média é de 84 anos, uma das mais altas da OCDE, quatro anos mais alta que a média
da OCDE, que é de 80 anos. E a expectativa de vida das mulheres é de 87 anos, comparada a 81
anos para os homens” (OECD, [2020?]). Além disso, a melhoria das condições de vida e saúde
fizeram com que o país possuísse o maior percentual de idosos mundialmente e ocupasse o topo do
ranking de centenários, 0,048% da população total (LOPES, 2020, p. 60).
Com tudo isso, o Japão passou a ser classificado como uma sociedade superenvelhecida, de
acordo com os critérios apresentados por Florian Coulmas (2007, p. 5, tradução nossa):

i. Sociedade em envelhecimento – 7-14% da população têm 65 anos


ou mais.
ii. Sociedade idosa – 14-21% da população têm 65 anos ou mais.
iii. Sociedade superenvelhecida – 21% ou mais da população têm 65 anos
ou mais.

Bem, mas qual a relação desses dados demográficos com a inserção internacional do Japão?
Um primeiro ponto a ser considerado é o impacto econômico que essas transformações na sociedade
japonesa têm provocado, na composição do PIB japonês.
Com a diminuição da população ao longo do tempo, o potencial de crescimento da economia
japonesa baseada nesse fator também sofre redução. No Gráfico 6, pode-se observar que, desde o
final dos anos 1980, o crescimento das despesas de consumo final no Japão tem apresentado um
ritmo decrescente. Esse fato é relevante à medida que o mercado interno do Japão tem representado,
desde 2008, segundo os dados do Banco Mundial, mais de 75% do seu PIB.

26
Gráfico 6 – Variação (%) anual das despesas de consumo final no Japão

5,0

4,0

3,0

2,0

1,0

0,0

-1,0

Fonte: WORD BANK. Final consumption expenditure (annual % growth). Japan: Data. Disponível em:
<https://data.worldbank.org/indicator/NE.CON.TOTL.KD.ZG?end=2018&locations=JP&name_desc=false&start=1988>.
Acesso em: 19 jun. 2021.

Outra consequência importante que tem sido observado no país com a diminuição da
população e o seu envelhecimento é a diminuição da força de trabalho, o que gera um duplo efeito
negativo sobre a economia, pois o envelhecimento implica menor mercado interno, maiores gastos
com pensões, diminuição das receitas fiscais e consequentemente menos recursos para
investimentos governamentais, o que pode conduzir à contração do PIB e, por conseguinte, a um
papel cada vez menor do Japão no mundo.
Ainda não é possível afirmar taxativamente qual será o resultado dessas transformações. No
momento, acompanhando-se o histórico do mercado de trabalho no Japão, pelo menos desde o
final da década de 1980, nota-se que tem havido a necessidade de importações de mão de obra, e
essa situação tem-se mantido presente nas primeiras duas décadas do século XX.
Até o momento, não parece estar em curso uma solução fácil para esse problema, dado que a
população está diminuindo, e a taxa de natalidade no país, como já demonstrado no Gráfico 5, está
em decadência. Dois recursos têm sido utilizados para atender à escassez de trabalhadores japoneses:
a primeira é a importação de mão de obra, a segunda é a busca pela automatização e robotização de
algumas atividades.
Em relação à importação de mão de obra, pode-se salientar que essa necessidade teve reflexos
inclusive sobre as relações com o Brasil, pois, a partir de meados da década de 1980, começaram
fluxos de emigração brasileira ao Japão. Mas, contemporaneamente, esse tem sido um tópico
importante e não fácil de ser tratado pelo governo, pois se de um lado há clara percepção da
importância de trabalhadores estrangeiros para atender ao mercado de trabalho no país, de outro
há uma forte resistência política contra a abertura do país à imigração.

27
Apesar das resistências, tem havido mudanças na legislação para a entrada de estrangeiros.
Para o Brasil, a mais marcante foi a alteração ocorrida em 1989:

A grande mudança ocorreu em junho de 1989, com a reforma da Lei de


Controle da Imigração e do Reconhecimento de Refugiados (doravante
denominada simplesmente como Lei de Imigração) que entrou em vigor
no ano seguinte. Criou-se um novo status para os estrangeiros com
ascendência japonesa, denominado “Residente por Longo Período”, o que
possibilitou a ida em massa para o Japão de filhos e netos de japoneses,
bem como de seus cônjuges brasileiros não descendentes (NINOMIYA,
2008, p. 27).

Em decorrência dessa mudança, ocorreu um grande fluxo de imigrantes brasileiros ao Japão.


Outra alteração importante foi a implementação do “Programa de Treinamento de Estágio
Técnico” em 1993, que sob a justificativa de contribuir para a formação de profissionais dos países
em desenvolvimento, em particular os do Sudeste Asiático, permitiu-se que imigrantes temporários
viajassem ao Japão para trabalhar. Na prática, essa política autorizou que pequenas e médias
empresas conseguissem trabalhadores a baixo custo (KINGSTON, 2014, p. 196).
A partir de 1º de abril de 2019, uma nova legislação passou a permitir a extensão por cinco
anos da permanência no país, mas sem a companhia dos seus familiares, para trabalhar depois de
cumpridos os cinco anos de estágio (OBE, 2019; TOSHIHIRO, 2019). Esses casos são classificados
com o status de Trabalhador Especializado Especificado Categoria I, definido para 14 setores pré-
estabelecidos, incluindo agricultura, assistência aos idosos e construção, que costumavam ser
considerados “não qualificados” e “semiqualificados” em esquemas de migração anteriores.
Também ficou definida uma possibilidade de mudar para a Categoria II, que daria direito à
imigração permanente, sendo para isso necessária maior qualificação profissional.
Há ainda algumas análises que buscam dar uma visão mais otimista dos impactos que podem
resultar dessa transformação da sociedade japonesa, afirmando que a geração dos babies boomers que
estão para se aposentar possuem uma situação econômica que permitirá, com os gastos do dinheiro
das suas aposentadorias, contribuir para uma revitalização da economia do Japão. Isso ocorreu
porque, com esses recursos, há a demanda para um novo estilo de vida, elevando o consumo
doméstico a novos patamares, impulsionando o surgimento de novas indústrias e resultando em
novo crescimento econômico e tecnológico.

28
O Japão de fato tem investido no desenvolvimento de novas tecnologias que deem suporte às
lacunas de trabalhadores e as complementem. Um exemplo que chamou atenção inicialmente foi o
de recepcionistas robôs da rede Henn de hotéis,1 que no final de 2017 começou a instalação desse
serviço. Entretanto a relação do Japão com os robôs começou no final dos anos 1960, envolvendo
aplicações práticas na indústria japonesa já da década de 1970.
Já a partir de 1980, há o início da implementação dos robôs de alta tecnologia e a expansão
do mercado, que sofreu com a crise da década de 1990. Mas o século XXI tem sido marcado pela
recuperação gradativamente desse setor, internamente pelos motivos já mencionados, mas também
internacionalmente. Já no final de 2004, o Japão possuía 356.500 robôs industriais. Dessa forma,
o país passou a ser o maior possuidor de robôs em operação, seguido dos EUA com apenas 122.000
(JETRO, 2006).
O setor continua crescendo agora com os robôs para cuidados de pessoas, em particular dos
idosos. “Em 2015, o mercado de carebots quantificou em 16,7 bilhões de ienes (US$ 155 milhões),
com expectativa de chegar a 400 bilhões de ienes (US$ 3,72 bilhões) até 2035 e em eventualmente
1 bilhão em algumas décadas” (LOPES, 2020, p. 123).
Atualmente, o governo do Japão tem desenvolvido a política da Sociedade 5.0, e entre os
projetos apresentados há o tratamento cibernético, que é a incorporação de robôs que atendam aos
comandos do cérebro, o que permitirá pessoas deficientes recuperarem movimentos
(GOVERNMENT OF JAPAN, 2020).
Enfim, apesar desses avanços tecnológicos, a melhora da economia japonesa passa, como foi
apontado inicialmente, por um aumento da demanda doméstica, pois ela representa cerca de 75%
do PIB do país. No entanto, incrementá-la tem sido um desafio, pois a sociedade japonesa com
tendência de envelhecimento, aliada à baixa taxa de natalidade e à diminuição da população, tem
gerado uma demanda menor, que acaba resultando em deflação. Isso desestimula a busca pelo
consumo, pois os produtos tendem a ficar mais baratos no futuro, o que novamente prejudica a
economia. Esse é mais um dos desafios para o futuro do Japão.

Conclusão
Conclui-se este módulo com a constatação de que havia, ao final da Guerra Fria, uma
demanda e uma expectativa otimista para que o Japão ampliasse a sua participação internacional,
fundamentada principalmente pelo destaque que o país obteve na sua grande recuperação
econômica após o final da II Guerra Mundial.

1
World’s first robot-staffed hotels make business travel inroads. Japan in Video. Oct 23, 2018. Disponível em:
<https://www.nippon.com/en/guide-to-japan/gu900045>. Acesso em: 20 jan. 2021.

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O seu poder econômico de segunda economia mundial chamava atenção no comércio, nos
investimentos e, também, na cooperação internacional por meio da AOD, tornando-se o maior
fornecedor. Contudo, com a crise causada pelo estouro da bolha econômica em 1991, o governo
japonês voltou as suas atenções para a recuperação do país. Além disso, ao longo da década, o baixo
crescimento econômico foi erodindo o seu pilar de projeção internacional, que era baseado na sua
pujança econômica.
O envelhecimento da sociedade aparece com outro fator que gera preocupações sobre o
futuro do Japão, além de já ter impactado negativamente a economia do país.
Diante de todos esses fatores, as expectativas de um Japão como uma potência global que
rivalizaria com o poder dos EUA se viram frustradas.

30
MÓDULO II – TRANSFORMAÇÕES DA
POLÍTICA EXTERNA JAPONESA: ATORES,
POLICY-MAKING E INTERESSES

Este módulo discorrerá sobre as mudanças institucionais no processo de elaboração da política


externa japonesa. Ao longo do período do pós-Guerra Fria, houve uma busca de reestruturação das
participações da burocracia estatal, dos políticos e do setor privado na formulação dessa política. Diante
disso, a compreensão do papel de cada um desses atores é importante para se analisar também a formação
dos interesses nacionais e a conduta que o Japão procura desempenhar nas relações internacionais do século
XXI.

Reformas na estrutura do governo


A duração do processo de tomada de decisão é uma das queixas mais comuns entre os que negociam
com o governo ou com as organizações japonesas. Uma das razões para a demora é o processo de tomada
de decisão que tem as suas raízes no período feudal do Japão, quando uma grande proporção da população
japonesa vivia em vilas de cultivo de arroz, uma atividade exercida em uma escala pautada na ação coletiva,
e não individual. Nesse contexto, faz mais sentido se unirem em comunidades inteiras nos campos para
um trabalho de todos como um só grupo. Dessa forma, as decisões passaram a ser tomadas em conjunto,
tendo os anciãos da aldeia o papel de protagonismo.
Novamente, observando-se as tomadas de decisões dentro do âmbito da cultura japonesa, é comum
que no processo os negociadores recolham informações para serem discutidas coletivamente e, nesse
momento, um membro do grupo se sobressaia exatamente por ter uma experiência maior. Entretanto
deve-se ressaltar que o resultado da decisão não necessariamente é consensual, como algumas análises, às
vezes, costumam apontar em virtude do sucesso do crescimento econômico após a II Guerra Mundial,
principalmente nos anos de 1960 e 1970.
Contudo existem autores que vão refutar se a facilidade das decisões no Japão não foi
resultante do crescimento econômico desse período, e não o contrário. Shinkichi Eto (1976), por
exemplo, mesmo na década de 1970, questionou esse consenso:

Ou seja, o conceito ativo nem sempre é requerido e pode então haver casos
em que o governo e o setor privado não necessariamente configurem uma
frente única. Mais do que isso, há frequentes atritos entre eles e mesmo no
interior desses setores, entretanto, as decisões têm como premissa um
consenso passivo dentre os principais atores (PLD, líderes do setor privado
e a burocracia) do processo decisório (ETO, 1976, p. 124).

Ainda de acordo com esse autor, levanta a ideia da possibilidade de um conceito passivo de
consenso, em que os atores, embora possuindo o poder de veto e podendo impedir as medidas, não
o fazem mesmo quando a política apresentada não é inteiramente do seu interesse. Portanto
conclui-se que, na política japonesa, existem posições e interesses nem sempre convergentes:

a) Não existe uma única fonte de autoridade e, como resultado, não há


concentração de poder no sentido de um Estado absoluto;
b) Há um direito legítimo dos grupos políticos buscarem ou não
influenciar o Estado;
c) Esses grupos devem ser múltiplos, voluntários, competitivos, não
hierarquicamente ordenados e em categorias autodeterminadas
(ZHAO, 1993, p. 20 apud UEHARA, 2003, p. 30).

Retomando o início desta unidade, as ações no Japão não são decorrentes de um pensamento
homogêneo, mas existe a possibilidade de expressão de diferentes posições e, mais do que isso, a
manifestação é estimulada inclusive de baixo para cima, por isso o processo demanda tempo. É o
que aponta Naoki Kuriama (2020, p. 318) no seu artigo que discute como essas características de
busca de objetivos que atendam às demandas de forma coletiva se refletem também na
administração empresarial.

A harmonização requer a adaptação das perspectivas de bases individuais para


a realidade dos parceiros. Este processo de harmonização leva muito tempo
para ambas as partes e deve envolver comunicação e atividades interativas.

Por meio desse processo, ambos os lados esperam ações conciliatórias (de
baixo para cima) para preencher a lacuna nos requisitos das partes
interessadas; isso não é considerado um compromisso. Compromisso é
encontro do caminho do meio.

32
Essa cultura de tomada de decisão está presente no país há séculos. Enquanto o Japão
conseguia um crescimento econômico invejável, essa cultura era vista como positiva, pois garante
que todos sejam ouvidos, envolvidos e preparados para implementar uma decisão. Ademais, ao dar
oportunidade às pessoas poderem participar, o grupo se sente incluído, o que também é positivo.
Além disso, pela ampla variedade de perspectivas em decorrência do número de pessoas consultadas
para a tomada de decisão, gera-se a coleta e a análise de informações bastante completas, decisões
cuidadosas e bem pensadas. Esses fatores dão conforto aos tomadores de decisão, mesmo que sejam
demorados e complicados, pois existe uma busca na redução dos riscos.
No entanto, com o estouro da bolha econômica e as dificuldades decorrentes a partir dos
anos 1990, questionaram-se alguns aspectos do processo de tomada de decisão, assim propostas
foram apresentadas. Neste texto, o foco será o governo, primeiramente analisando o Executivo e,
em um segundo momento, a burocracia.
O voto de desconfiança contra o primeiro-ministro Miyazawa em 1993 fez com que se
rompesse a dominação de 38 anos do PLD, e assumisse um governo de “oposição”, colocado entre
aspas, porque, conforme já informado nas sessões anteriores, os dois sucessores, tanto Morihiro
Hosokawa quanto Tsutomu Hata, eram dissidentes do PLD. De qualquer forma, havia uma
promessa de que esse novo governo romperia com a tradicional relação entre políticos, burocratas
e empresas – sei-kan-gyo no yuchaku daha –, pois isso era apontado como uma questão urgente, que
tinha como pano de fundo os escândalos de corrupção envolvendo o governo e empresas à época.
Existe até um termo para designar um aspecto dessa relação triangular no Japão, que é
amakudari, cujo significado é descer do céu. Na prática, são as relações entre o setor público e o
privado, que fazem com que os burocratas japoneses de alto escalão, ao se aposentarem ou saírem
do serviço público, sejam incorporados em cargos executivos no setor privado ou mesmo, em alguns
casos, no próprio setor público.
No seu artigo, Rei Shiratori (1995) faz uma análise detalhada de escândalos que marcaram a
política japonesa. Podem ser citados:
a) Escândalo Lockheed – Em outubro de 1983, o ex-primeiro-ministro Kakuei Tanaka foi
condenado por ter aceitado US$ 2,1 milhões em subornos da empresa americana
Lockheed em meados da década de 1970.
b) Escândalo Recruit – No final de 1988, foi divulgado o esquema de propina envolvendo
membros do PLD e empresários da empresa Recruit, que levou à renúncia do primeiro-
ministro Takeshita Noburo.
c) Escândalo Sagawa – Em agosto de 1992, o vice-presidente do PLD, Shin Kanemaru, foi
acusado de receber uma contribuição política não declarada de 500 milhões de ienes do
empresário Hiroyasu Watanabe, presidente da Sagawa Transportes.

33
Esses sucessivos escândalos enfraqueceram o PLD e, em 1994, levaram a oposição, por meio
de uma coalizão, ao governo do Japão, sendo um dos temas importantes das suas políticas propostas
o da reforma administrativa. Segundo Koichi Nakano (1998, p. 292) o partido Sakigake, também
estabelecido com a participação de dissidentes do PLD, apesar de ser pequeno em face dos outros
da coalizão, foi importante para a definição da agenda reformista, levando para dentro do governo
essa pauta. E, continua esse autor, até pelo curto mandato da oposição, o PLD acabou assumindo
o discurso da reforma administrativa quando percebeu que havia apoio popular.
As reformas na política japonesa começaram a ser discutidas pelo primeiro-ministro Ryutaro
Hashimoto em 1996, via formação do Conselho sobre Reforma Administrativa, do qual ele era o
presidente. Hashimoto se concentrou na reforma do governo e, apesar das resistências de órgãos da
burocracia, conseguiu aprovar a lei básica para a reforma de ministérios e agências promulgada em
junho de 1998, dando os parâmetros para as reformas.
De acordo com Koichi Nakano (1998, p. 305), as resistências foram reduzidas porque a
redação do projeto foi deixada para burocratas, que estavam claramente determinados a tornar as
novas condições menos inconvenientes para eles próprios. Ao final, a proposta de reforma política
com Hashimoto se afastou da proposta inicial de “controle do governo” e, na responsabilização
democrática dos burocratas, a ênfase passou a ser dada no corte de gastos e na reforma da estrutura
organizacional, ou seja, o centro das mudanças passou a ser no “como governar”.
A lei da reforma basicamente previa a reorganização de ministérios e agências, medidas que
buscavam fortalecer a função do primeiro-ministro e do gabinete, além de princípios de
simplificação para a melhoria da eficiência do governo e a reorganização do gabinete para 12
organizações de nível ministerial. As reformas foram aprovadas em julho de 1999, já no mandato
do primeiro-ministro Keizō Ōbuchi, e passaram a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2001, com o
governo de Yoshiro Mori. Com isso, o gabinete seria reduzido de 23 organizações de nível
ministerial para 12, principalmente combinando antigas agências burocráticas, substituindo o
gabinete do primeiro-ministro por um novo gabinete.
Com isso, de fato, a reforma administrativa em 2001 foi um divisor de águas, uma vez que
foi a primeira revisão significativa da estrutura do governo central desde a promulgação da Lei da
Organização de Administração Nacional em 1948, e teve por objetivo transformar um Estado
burocrático tradicional em uma organização mais empresarial. A reforma contribuiu para a
transparência da administração com a divulgação de informações – programas de governo
eletrônico. Contudo faltou ao governo uma gestão mais centralizada da política relacionando os
resultados da avaliação à elaboração de orçamentos, além de análises de políticas e performance de
cada ministério.
Em termos políticos, de acordo com o material produzido por Yuko Kaneko (1999, p. 5) da
Agência de Gestão e Coordenação do governo do Japão, a reforma visou reforçar as funções de
gabinete e autoridade do primeiro-ministro, assegurando uma liderança na medida em que garantia
competência não apenas para coordenar, mas também para iniciar a formulação de políticas básicas.

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Nos ministérios, buscou reforçar a liderança política ao estabelecer um sistema de vice-ministros,
que deveriam ser políticos e nomeados para o gabinete e para cada ministério, posicionados entre o
ministro e o vice-ministro administrativo (membro da burocracia). Além disso, foi introduzido o
sistema de assessores políticos do ministro para participar da formulação de políticas, do
planejamento e de assuntos políticos. Com isso o número de assessores aumentou de 186 em 2000
para 648 em 2005 (MAKIHARA 2009, p. 56 apud ZAKOWSKI, 2018, p. 19).
A seguir, será analisado especificamente o papel do primeiro-ministro após essas reformas.

Papel do primeiro-ministro
No sistema político japonês, o primeiro-ministro é escolhido entre os políticos eleitos na
Câmara Baixa da Dieta, pelo voto da maioria. No período posterior à II Guerra Mundial, a política
japonesa foi dominada pelo PLD – criado pela fusão de dois pequenos partidos conservadores: o
Partido Democrático do Japão e o Partido Liberal do Japão em 1955 –, que se manteve
sucessivamente no governo até 1993. Essa predominância do PLD recebeu o nome de “Sistema
1955”, ano de criação do partido. As exceções de domínio do PLD foram em dois períodos 1993-
1994 e 2009-2011.
A história política do Japão mostra que a duração dos mandatos dos primeiros-ministros, via
de regra, tem duração de dois anos. Mesmo com o predomínio do LDP (1955-93), isso não
significou mandatos longos, e uma das razões para a explicação dessa realidade foi o fato de o cargo
de primeiro-ministro ter tido um número limitado de poderes formais. A ausência da clareza na
legislação também dificultou a percepção de qual seria a sua autonomia e o seu poder. Por exemplo,
o art. 66 da Constituição do Japão aponta inicialmente que primeiro-ministro será o líder do
gabinete, no entanto, finaliza afirmando que “o gabinete, em exercício do Poder Executivo, deverá
ser coletivamente responsável pela Dieta” (CONSTITUIÇÃO DO JAPÃO, 1946). No art. 72,
define-se que o primeiro-ministro é o representante do gabinete, portanto, pode-se questionar o
quanto ele é o líder e quanto é um simples representante do gabinete.
Tomohito Shinoda (2011, p. 51) menciona que a Lei do Gabinete claramente limita o poder do
primeiro-ministro no art. 3º, quando informa que a autoridade e a responsabilidade do Poder Executivo
são divididas entre os membros do gabinete. Além disso, no art. 5º, ao definir que ele representa o
gabinete, pois apresentará projetos de lei, orçamentos e outras propostas à Dieta, e apresentará um
relatório à Dieta sobre assuntos nacionais gerais e relações externas” (CABINET LAW, 1947, tradução
nossa). Em outras palavras, legalmente, a autoridade direta do primeiro-ministro está relacionada às
operações administrativas do gabinete e das agências diretamente subordinadas, como a Agência de
Serviços Financeiros e a Agência de Assuntos do Consumidor.
Essa fraqueza para iniciativas próprias é histórica, e isso se refletia em uma maior participação da
burocracia, que será tratada na próxima unidade. Essa situação levou a uma acomodação dos políticos,
pois, apesar de os ministérios serem tecnicamente subordinados ao gabinete do primeiro-ministro, os

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burocratas mantinham uma relação privilegiada como os ministros dentro dos respectivos ministérios.
Mas, como os mandatos eram curtos, os ministros geralmente tinham pouco tempo para desenvolver
conhecimento e ter autoridade para influenciar a tomada de decisões, com isso os burocratas
dominavam as suas áreas.
Nesse sistema em que o conhecimento técnico não era importante, pois isso era atribuição dos
burocratas, os políticos do partido no poder eram nomeados para o gabinete não pelas suas qualidades
e pelo seu domínio no setor do ministério, mas por negociações políticas internas ao partido. Esse fator
ao longo do tempo foi enfraquecendo ainda mais a influência do primeiro-ministro nas políticas de
governo, tendo grande dependência dos funcionários públicos dos ministérios.
Contudo houve algumas exceções de mandatos de maior duração que, de acordo com
Kingston (2014, p. 18), apresentaram um fato em comum entre os primeiros-ministros: todos eram
líderes ativos e orientados por uma agenda. No caso desses políticos, muitas vezes, atribui-se a
perenidade dos governos ao seu perfil pessoal, e não aos elementos legais formais. Essas
características dos primeiros-ministros geraram um poder adicional que é informal e depende de
cada um, podendo, por exemplo, representar em uma maior base de apoio no partido, ter um
melhor relacionamento com a burocracia governamental, dependendo do seu carisma, uma maior
popularidade, ou até mesmo, facilitar a negociação com os partidos de oposição.
No período pós-Guerra Fria, Junichiro Koizumi foi o maior exemplo de popularidade e
carisma, fator que contribui para o seu poder político. Com 85% de aprovação, Koizumi foi o
político que conseguiu a maior popularidade entre 1989 e 2012, de acordo com o levantamento
apresentado na Tabela 5, a seguir.

Tabela 5 – Taxa de aprovação dos primeiros-ministros (1989 a 2012)

maior taxa de menor taxa de


primeiros-ministros
aprovação (%) aprovação (%)

Uno 28 28

Kaifu 56 35

Miyazawa 54 20

Hosokawa 71 57

Hata 47 47

36
maior taxa de menor taxa de
primeiros-ministros
aprovação (%) aprovação (%)

Murayama 42 33

Hashimoto 53 31

Obuchi 49 23

Mori 39 7

Koizumi 85 39

Abe (primeiro mandato) 65 29

Fukuda 58 20

Aso 49 15

Hatoyama 72 21

Kan 65 16

Noda 60 20

Fonte: YAMAMURA, Eiji; SABATINI, Fabio. Superstars in politics: the role of the media in the rise and success of Junichiro
Koizumi. Cornell University, Quantitative Finance: Economics, 2014, p. 17. Disponível em:
<https://arxiv.org/ftp/arxiv/papers/1407/1407.1726.pdf>. Acesso em: 14 maio 2021.

Entretanto, ainda que apontado como um aspecto importante no caso do Japão, a aprovação
por si só não é suficiente, pois se tenta evitar que as decisões fossem percebidas como simples
imposição, mesmo que o governo tivesse maioria. Portanto esses elementos não institucionais de
poder, que variam de indivíduo para indivíduo, podem permitir maior influência do primeiro-
ministro e um mandato de maior duração, mas não são suficientes. Na Tabela 5, acima, nota-se
que Hatoyama registrou um índice de aprovação de 72%, segundo maior do período, mas o seu
mandato foi de apenas 266 dias.
Por isso Alisa Gaunder (2007) retomará novamente fatores não institucionais como
importantes para atingir o sucesso dos primeiros-ministros, que são: i) disposição para assumir
riscos; ii) visão para planejar e propor metas futuras; e iii) compromisso com as suas políticas e os
seus objetivos. De acordo com essa autora, essas características contribuíram favoravelmente para
os líderes políticos japoneses de sucesso.

37
Nota-se que, de maneira geral, ser ativo significa também a capacidade do primeiro-ministro
para construir e manter uma coesão no próprio partido para apoiá-lo. Dentro do PLD, por exemplo,
isso significa negociar com as suas diferentes facções e, assim, garantir a aprovação das propostas
apresentadas ao gabinete (SHINODA, 2013, p. 216). Sem tal apoio, a sua capacidade de
interferência na formulação de políticas fica muito reduzida.
A seguir, apresenta-se a lista dos cinco primeiros-ministros com mandatos de maior duração
desde o final da II Guerra, mas neste trabalho o foco será Junichiro Koizumi e Shinzo Abe, os
primeiros-ministros que assumiram mandatos depois do final da Guerra Fria.

Tabela 6 – Primeiros-ministros do Japão com os cinco maiores mandatos depois da II Guerra

primeiros-ministros anos duração em dias

Shinzo Abe (1) 2012-2020 2.799

Eisaku Satō 1964-1972 2.798

Shigeru Yoshida (2) 1948-1954 2.248

Junichirō Koizumi 2001-2006 1.980

Yasuhiro Nakasone 1982-1987 1.806

(1) Shinzo Abe teve outro mandato (2006-2007) com duração de 266 dias.
(2) Shigeru Yoshida teve outro mandato (1946-1947) com duração de 368 dias.

Fonte: PRIME MINISTER OF JAPAN AND HIS CABINET. Previous cabinets (since 1996).
Disponível em: <https://japan.kantei.go.jp/archives_e.html>. Acesso em: 20 jun. 2021.

Os casos das coalizões, que têm sido muito comuns no governo japonês do século XXI, são
importantes para estabelecer uma plataforma comum. Um exemplo da ausência dessa capacidade foi
Tsutomu Hata (28 de abril de 1994 a 30 de junho de 1994), sucessor de Hosokawa, que esteve no
cargo de primeiro-ministro por apenas 64 dias, pois lhe faltou força política, já que na coalizão de sete
partidos – Komeito; Novo Partido do Japão; Partido Comunista; Partido Renovador; Partido Social-
Democrata do Japão (PSDJ); Partido Socialista Democrático e Sakigake – foi difícil evitar as
divergências que enfraqueceram o governo (UEHARA, 2003, p. 143)
A falta de força política do primeiro-ministro é uma constatação que existe mesmo quando o
político é do PLD, pois, de acordo com a Constituição do Japão, o primeiro-ministro é o chefe do
gabinete, que possui o poder de nomear e destituir ministros de gabinete, além de ter o apoio do
secretariado de gabinete e o poder de dissolver a Câmara Baixa da Dieta e convocar novas eleições,
entretanto não especifica ou dá maiores detalhes de quais são os instrumentos para isso. Devido a
esse escopo limitado, o cargo de primeiro-ministro foi apontado como fraco no Japão, sendo,

38
portanto, uma liderança reativa que normalmente apenas procura atender aos itens presentes na
agenda política, sem propor iniciativas próprias. Restava ao chefe de governo japonês, mesmo
ocupando o cargo de liderança nacional, o papel de fazer barganhas nos bastidores, arrecadar dinheiro,
mas, não necessariamente, o exercício de uma liderança política.
Por isso a reforma política proposta por Ryutaro Hashimoto em 1998, conforme apontado
por Yuko Kaneko (1999), teve como finalidade também aumentar a influência política do cargo de
premiê do Japão, aumentando a estrutura legal de apoio ao exercício do cargo e de poder nas suas
decisões. Antes disso, no caso específico do PLD, o próprio partido criou uma estrutura de
formulação de políticas que dá suporte aos políticos do partido e ao primeiro-ministro para
formulação de políticas, chamada de “Conselho de Pesquisa para Assuntos Políticos”, o Policy
Affairs Research Council (Parc).
O lado positivo desse conselho é que durante muito tempo ele serviu de apoio para a
formulação de propostas de políticas e para a mediação das relações do Executivo com a burocracia.
Com isso essa própria estrutura inibia o papel do primeiro-ministro, fazendo com que ele
mantivesse um papel mínimo nas formulações de políticas. Essa situação acabava refletindo também
na política externa, pois, apesar de haver declarações políticas dos primeiros-ministros ao final da
Guerra Fria de disposição para ocupar maior espaço internacional, nem sempre houve uma
correspondência prática e coerente na política externa e em atitudes do governo.
As reformas, que passaram a ser institucionalizadas a partir da ascensão de Junichiro Koizumi
ao cargo em 2001, deram ao primeiro-ministro e ao gabinete uma ampliação de recursos internos
adicionais para redigir e propor uma nova legislação e, com isso, aumentar a capacidade de
influência política. O primeiro-ministro Koizumi ao assumir o cargo usou esses novos poderes,
propondo a legislação antiterrorismo em 2001 e a reforma postal em 2005, este último sob proposta
desenvolvida pelo Conselho de Políticas Econômicas e Fiscais, o Council on Economic and Fiscal
Policy (CEFP).
Nesse segundo caso, há também uma clara demonstração de poder, pelo fato de Koizumi
ter dissolvido a Câmara Baixa porque não havia conseguido aprovar a privatização dos correios.
Com a nova eleição, ele conseguiu reverter a posição de alguns do seu partido que eram contrários
à sua proposta, além de escolher postos-chave do governo, para políticos do PLD que eram
favoráveis à privatização.
É curioso notar que o mandato de Koizumi coincide com o mais longo período de
crescimento econômico contínuo do Japão do pós-guerra, que se estendeu por mais de 70 meses
consecutivos. Esse período inicia em fevereiro de 2002, durante o Gabinete Koizumi, e atravessa o
de Abe e chega até o Gabinete de Fukuda em 2008. Contudo, apesar de ser a recuperação
econômica mais longa do pós-guerra, e importante depois do estouro da bolha em 2001, os
resultados concretos não despertaram muita atenção, pois representaram um crescimento nominal
do PIB de apenas 2,5% em seis anos (KANTEI, 2018).

39
Outro político que se destacou neste século foi Shinzo Abe, que registrou o mais longo
mandato como primeiro-ministro, conforme a Tabela 6, foram 2.799 dias. Kraus e Pekkamen
(2011) chamam atenção para o fato de que ele foi escolhido como sucessor de Koizumi não pela
tradicional liderança de uma facção do PLD, mas porque era protegido de Koizumi e tinha
elementos carismáticos: era jovem, possuía uma boa imagem na mídia e tinha popularidade. Mesmo
assim, teve um primeiro mandato curto, de apenas um ano, entre 26 de setembro de 2006 e 26 de
setembro de 2007, já que esse foi marcado por uma queda rápida de apoio da opinião pública
decorrente da decisão de receber antigos dissidentes do partido, acusados de escândalos de
corrupção envolvendo o governo, mais acusações de que o governo não estava dando a devida
atenção aos problemas internos, bem como dificuldades para aprovar a continuidade do apoio do
Japão às ações internacionais no Afeganistão para combate ao terrorismo.
Após a sua saída, houve mais dois governos do PLD em 2009, há a entrada da oposição com
Yukio Hatoyama, mas tampouco conseguiram desenvolver mandatos longos.

Tabela 7 – Primeiros-ministros do Japão entre os dois mandatos de Shinzo Abe (2007-2012)

primeiro-ministro início fim duração em dias

Yasuo Fukuda (PLD) 26/09/2007 24/09/2008 365

Taro Aso (PLD) 24/09/2008 16/09/2009 358

Yukio Hatoyama (Partido


16/09/2009 08/06/2010 266
Democrático)

Naoto Kan (Partido Democrático) 08/06/2010 02/09/2011 452

Yoshihiko Noda 02/09/2011 26/12/2012 482

Fonte: PRIME MINISTER OF JAPAN AND HIS CABINET. Previous cabinets (since 1996).
Disponível em: <https://japan.kantei.go.jp/archives_e.html>. Acesso em: 20 jun. 2021.

Shinzo Abe retornou ao poder em 2012, após um período de governo do Partido


Democrático. Chegou ao governo sob grandes expectativas de mudanças, principalmente com o
primeiro-ministro Hatoyama que prometia recuperar a economia; combater o desemprego, que
tinha atingido níveis acima dos 5%, o que para o padrão japonês era muito alto; desenvolver
políticas de incentivo à recuperação do crescimento populacional; e ter maior independência em
relação aos EUA. Mas, oito meses após a sua eleição, veio a frustração com a sua renúncia,
principalmente porque não conseguiu retirar as bases americanas da ilha de Okinawa, uma das suas
promessas de campanha. Os seus sucessores também não conseguiram longevidade nos mandatos.

40
Em 2012, Shinzo Abe retornou ao posto de primeiro-ministro. O seu antecessor, Yoshihiro
Noda, do Partido Democrático, saiu enfraquecido pela má avaliação do governo no enfrentamento
das crises que afetaram o país, como a crise econômica internacional de 2008, iniciada pela quebra
da Lehman Brother nos EUA, e pelas políticas de gestão de enfrentamento dos problemas causados
pela tríplice catástrofe de 2011: terremoto, tsunami e acidente na usina nuclear de Fukushima, em
março de 2011.
Nesse segundo mandato de Abe, analisando-se retrospectivamente, houve resultados
impressionantes, começando pela vitória esmagadora nas eleições de dezembro de 2012 com o PLD
conseguindo 294 das 480 cadeiras na Câmara Baixa, e depois consolidando a sua liderança em uma
vitória repetida em dezembro de 2014, com o partido conquistando 291 cadeiras.
O primeiro-ministro Shinzo Abe após a vitória anunciou o ressurgimento também para o
Japão de uma política externa e de segurança mais assertiva, de maior atuação e de maior exposição
ao risco, mostrando as características mencionadas por Gaunder (2007), que são: disposição para
assumir riscos; visão e compromisso. Entretanto sem deixar de incluir a característica destacada por
Kingston (2014), que é a popularidade. Esta última característica aparece na plataforma das suas
políticas, nomeadas Abenomics, que tinha como símbolo metafórico três flechas, cada uma
representando uma das seguintes políticas: flexibilização monetária, reativação de gastos públicos e
reformas estruturais:
i. A flexibilização monetária tinha como objetivo o combate à deflação no país, que, como
foi apontado acima, vinha prejudicando a economia japonesa desde os anos 1990. Essa
seria promovida por meio do aumento do dinheiro em circulação na economia.
ii. O aumento dos gastos públicos em curto prazo foi apresentado como uma das metas para
poder elevar a inflação e desvalorizar o iene, contribuindo para superação do período de
deflação.
iii. As reformas estruturais, que incluem desregulamentações, visavam a abertura comercial e
regras mais flexíveis no mercado de trabalho, além de privatizações.

41
Tudo isso fez com que Abe aparecesse na capa da revista The Economist como uma figura que
remete ao Super-Homem.

Figura 1 – Primeiro-ministro Shinzo Abe na capa da revista (1993)

Fonte: THE ECONOMIST. Japan’s master plan. May 18th, 2013.

No mesmo ano, Abe concedeu uma entrevista para a Foreign Affairs, prestigiada publicação na
área de relações internacionais dos EUA, sob o título “O Japão está de volta”. Nota-se que esse
segundo mandato teve elementos que reforçaram os argumentos de que a personalidade faz uma
grande diferença nos resultados obtidos pelos primeiros-ministros, pois a estrutura formal do gabinete
não havia mudado em relação aos políticos que o antecederam no cargo ou em relação à sua própria
gestão prévia. Então o que mudou? De acordo com as suas próprias palavras na entrevista:

Quando eu servi como primeiro-ministro na última vez eu fracassei em


priorizar minha agenda. (...)
É natural que meu segundo governo priorize a eliminação da deflação e a
recuperação da economia japonesa (...)
Estabeleci as prioridades certas desta vez para refletir sobre as preocupações
das pessoas (...)

42
Também comecei a usar redes sociais como o Facebook. Muitas vezes, a mídia
legada apenas cita parcialmente os políticos. Isso impediu que o público
entendesse minhas verdadeiras intenções (TAPPERMAN, 2013, tradução
nossa).

Nesse trecho da entrevista, o primeiro-ministro sinalizou que assumiu o risco de priorizar a sua
agenda, apresentou a sua visão de combate à deflação e recuperação da economia, bem como o
compromisso com a população, ao afirmar o compromisso com as preocupações das pessoas, o que
remete também a um certo populismo, além da relação com a popularidade que ele buscou por meio da
comunicação direta com os eleitores, que ele afirmou buscar fazer nas redes sociais. Nesse momento da
entrevista, Abe estava com uma taxa de aprovação acima dos 70%.
Com esse perfil, o primeiro-ministro não conseguiu tudo o que apresentou como plano inicial. Por
exemplo, em relação às estratégias de recuperação econômica, o país teve algum crescimento, mas não foi
tão exuberante e sustentável. Em termos de reformas uma das suas metas era a revisão do art. 9 da
Constituição, que limita a atuação do Japão na arena internacional, que apesar da sua insistência não
obteve sucesso. Mas conseguiu criar o Conselho Nacional de Segurança e estabelecer a Estratégia Nacional
de Segurança em 2013, que institucionalizou as diretrizes e definiu os objetivos fundamentais da
Segurança Nacional Japonesa (DANTAS, 2017, p. 39).
O Conselho de Segurança fortaleceu o papel do primeiro-ministro na área de defesa e diplomacia,
e aproximou os Ministérios de Defesa e dos Negócios Estrangeiros permitindo que compartilhem
informações e coordenem ações de forma regular. Além disso, no seu discurso na 183ª Sessão da Dieta
Abe (2013), sinalizou o interesse de recuperar o status internacional do Japão:

A criação de um Conselho de Segurança Nacional, que servirá como centro de


controle para a política externa do Japão e da política de segurança nacional. Ao
mesmo tempo, dentro do que estabelece o Painel Consultivo para a
Reconstrução das Bases Legais da Política de Segurança pretendemos buscar
uma posição adequada para o Japão no contexto internacional do século 21.

Esse interesse de revitalizar a posição internacional do Japão ficou conhecido como Doutrina Abe,
que enfatiza que o status de grande potência do Japão pode ser restaurado agindo sobre uma série de
restrições que têm dificultado o país a desempenhar um papel mais proativo no mundo (DOBSON,
2017, p. 204). De fato, houve algumas realizações no âmbito internacional, que ganharam destaque como
a conclusão da Parceria Transpacífica (TPP) em 2016, negociada durante o governo de Barack Obama
nos EUA, considerada como uma das maiores realizações políticas na área da economia e comércio
internacional. Entretanto o presidente Donald Trump, ao assumir o governo norte-americano, anunciou
a retirada dos EUA do acordo. Para contornar tal situação, o primeiro-ministro Abe conseguiu uma
segunda realização no seu mandato ao conduzir com os demais países a ratificação do acordo mesmo sem
os EUA, constituindo o TPP-11.

43
Duas outras iniciativas de destaque ainda no governo Abe são a iniciativa do Diálogo
Quadrilateral de Segurança, formado por quatro países – EUA, Austrália, Índia e Japão –, surgido
após colaboração entre esses países após o tsunami do Oceano Índico de 2004. Outra proposta de
Abe foi o Free and Open Indo-Pacific (Foip), cuja ideia foi lançada por ele na Conferência
Internacional de Tóquio sobre o Desenvolvimento Africano – Tokyo International Conference of
African Development (Ticad) – realizada no Quênia em agosto de 2016. De acordo com a proposta
inicial, o objetivo é o crescimento econômico de todos os países da região conectados pelos oceanos
Índico e Pacífico.

Burocracia e política externa


Na unidade anterior, pode-se notar que, ainda que o Japão seja um país de instituições muito
fortes e tradições culturais muito arraigadas, o perfil pessoal do primeiro-ministro é um elemento
que cada vez mais impacta o desempenho do governo. Uma das razões para isso pode ser explicada
pelas mudanças no ambiente externo, mas é importante analisar também os fatores internos, entre
eles as transformações que vêm ocorrendo no papel da burocracia no Japão.

O Japão é um bom exemplo de um país cuja política externa foi fortemente


influenciada por fatores contextuais de nível doméstico. Sem dúvida, o
contorno geral do comportamento de Tóquio no cenário internacional foi
delineado por incentivos externos, como a natureza bipolar do sistema
internacional durante a Guerra Fria. A reaproximação sino-americana na
década de 1970, ou mudanças de poder após o colapso da União Soviética.
No entanto, essas pressões sistêmicas se traduziram em decisões concretas
nas políticas externas e de segurança do Japão somente depois de terem
sido filtradas as percepções tendenciosas de estadistas, clivagens ideológicas
e de facções dos partidos governantes, estruturas administrativas lideradas
pela burocracia ou restrições decorrentes do “pacifista” art. 9 da
Constituição japonesa (ZAKOWSKI; BOCHORODYCZ; SOCHA,
2018 p. 4).

Portanto as estruturas administrativas formadas pela burocracia são algo importante para se
pensar nas tomadas de decisão no Japão, pois elas construíram uma imagem muito positiva na
segunda metade do século XX ao serem identificas como uma das razões do sucesso da reconstrução
econômica do país. Chalmers Johnson (1982) aponta que a base do sucesso da recuperação
econômica do Japão depois da II Guerra Mundial foi a atuação da burocracia. Essa valorização é
dada porque, em razão do conhecimento especializado dos servidores de carreira do governo,

44
conhecedores das necessidades e das demandas do setor privado japonês, que serviam de apoio aos
políticos nas formulações de propostas de leis e projetos. Neste último caso, a importância se dava
nesse período porque muitos políticos experientes foram impedidos de continuar no governo pelas
forças de ocupação, por terem sido identificados como favoráveis ao militarismo japonês.
No imediato pós-guerra, a dependência era profunda, pois, sem a presença dos políticos
afastados, os líderes das forças de ocupação se sentiam incapazes de fazer a gestão do país, então
recorreram à estrutura burocrática governamental japonesa já existente, com as suas agências e as
suas instituições, para a elaboração das políticas que seriam implementadas no país.

Os parlamentares, na prática, deixaram a gestão econômica nas mãos da


burocracia, que negociava ou até mesmo impunha suas decisões aos
capitais nacionais. O partido do governo era, até o início da década de 70,
dominado por ex-burocratas do setor público, que possuíam ampla
penetração junto a seus pares, colocados em postos nos ministérios.
Garantia-se, assim, uma perfeita sintonia entre os interesses dos ministérios
e os atos legislativos (TORRES, 1999, p. 239).

Já na década de 1970, os políticos do PLD começaram a acumular conhecimento e a ganhar


autonomia em relação a essa burocracia, mas foi na década de 1980 que, segundo Peter Drucker
(1998), houve maior diminuição do status da burocracia no Japão, porque ela foi responsabilizada
pelos problemas econômicos enfrentados pelo país. Isso se deu porque, com a valorização do iene
diante do dólar promovido pelo acordo de Plaza de 1985, o governo resolveu intervir na economia,
temendo uma grande perda nas suas exportações.
Entretanto a decisão de fazer grandes investimentos para manter aquecida a economia teve
como consequências a ampliação do déficit público e especulações econômicas, gerando grandes
elevações de preços de ativos no Japão (DRUCKER, 1998, p. 31), inclusive no setor imobiliário,
por causa do aumento da procura por imóveis em Tóquio que, por fim, resultou na formação da
bolha econômica que estourou em 1991. O impacto desse acontecimento foi significativo na
redução da credibilidade da burocracia japonesa, pois foi criticada pela criação e incapacidade de
previsão do problema.
Associado à crítica do prognóstico incorreto, houve também a acusação de uma má gestão do
Ministério das Finanças (MOF), que teve um fraco controle sobre os empréstimos realizados pelas
instituições financeiras às empresas, que se tornaram grandes problemas com a explosão da bolha
no início da década de 1990. Esse enfraquecimento da burocracia na década de 1990, associado à
saída do partido PLD do governo, posição que mantinha desde 1955, acabou gerando um duplo
impacto negativo sobre a política externa japonesa.
A saída do PLD do poder em meados de 1993 prejudicou (...) o
desenvolvimento de uma política nacional de maior projeção do Japão (...).

45
A política externa foi muito influenciada por essa mudança, pois a saída
dos políticos do PLD afetou também o desempenho das instituições que
atuavam em seu desenvolvimento. A coalizão não tinha os mecanismos
desenvolvidos cuidadosamente pelo PLD, ao longo dos anos 1980, para
deliberar sobre a política externa (UEHARA, 2003, p. 44).

Nesse período, por exemplo, Tsutomu Hata, defensor de uma maior participação japonesa
nas questões internacionais, e igualmente o seu antecessor, Morihiro Hosokawa, tiveram pouco
tempo para buscar uma projeção externa do país. Já entre o PLD e a burocracia havia uma relação
de simbiose construída, pois de um lado os especialistas da burocracia formulavam as propostas de
projetos, mas necessitavam do apoio de políticos na Dieta para a aprovação legal das medidas. Além
disso, a relação também era forte por causa do mencionado Amakudari, pois era comum
funcionários da burocracia deixarem os seus cargos e se tornarem membros do PLD.
Essa situação de perda de poder e aumento das desconfianças sobre a burocracia nas últimas
décadas não se restringiu ao Japão. É um fenômeno que tem avançado entre os países capitalistas,
onde as reclamações contra a ineficiência das burocracias públicas têm sido crescentes. Portanto as
reformas no Japão tiveram uma influência forte dos escândalos de corrupção envolvendo o PLD, o
setor privado e a burocracia, mas também está dentro de um contexto global, que envolve um
conjunto de medidas para a reformulação da gestão pública. A ideia dessas reformas agradou tanto
aos líderes políticos como aos cidadãos porque sinalizava para uma redução do poder burocrático e
de gastos públicos.
Por isso a reforma do governo central implementada no Japão atendeu a dois objetivos:
forneceu mais poder para o primeiro-ministro, e ainda que isso possa ser relativizado como
discutido na unidade anterior, há um certo consenso entre os estudos que apontam um relativo
ganho de influência. Já o segundo ponto foi a redução no número de ministérios, importante
porque havia reclamações em relação aos problemas de coordenação de políticas entre eles. As
dificuldades emergiram do fato de existir na cultura japonesa uma relação de alto nível de fidelidade
aos seus grupos de trabalho que acabava resultando em uma competição entre os ministérios, em
que cada um buscava aumentar as suas influências e se autofortalecer, sem necessariamente trazer
benefícios à população.
Por causa dessa disputa interna na burocracia, o papel dos políticos cresceu, pois deveriam
atuar na superação desses conflitos: “chegou-se a afirmar que os burocratas se preocupam mais com
a defesa dos interesses dos ministérios a que pertenciam do que com a defesa dos interesses da nação”
(AHN, 1998, p. 43, tradução nossa).
A preocupação com a reforma da burocracia japonesa não era somente do PLD, o primeiro-
ministro Hatoyama, líder do governo de coalizão liderado pelo Partido Democrático (PDJ), de
características de centro-esquerda, ao assumir em 2009 afirmou que o seu governo teria como
princípio a “formulação de políticas lideradas por políticos”, quer dizer, no governo do seu partido
os políticos assumiriam, nas suas palavras, “total responsabilidade”.

46
Gregory Noble (2011, p. 258) afirma que o primeiro-ministro Koizumi herdou a burocracia
simplificada e um gabinete mais forte, mas a ação determinada a subordinar a burocracia ao gabinete
veio com Hatoyama. Em parte, a insistência do DPJ em exercer liderança política se refletiu no
interesse de reorientar o sistema político, fruto dos interesses desse novo partido que assumiu o
governo, junto dos seus apoiadores. Mas esse discurso também convergia em uma demanda da
população por maior transparência e controle dos gastos públicos, que eram criticados pelos
inúmeros escândalos envolvendo recursos do governo.
Na primeira década do século XXI, portanto, houve uma reestruturação importante da
burocracia no Japão, tendo entre outras ações a reforma do número de ministérios.

Como parte dos esforços de se fazer uma reforma visando ao aumento da


eficiência e efetividade das operações governamentais, em janeiro de 2001,
o Poder Executivo do governo submeteu-se a uma extensa reorganização
na qual o número de ministros e ministros comissionados existentes, que
era de 22 naquele ano, foi cortado quase pela metade. Além do recém-
criado Gabinete Oficial, o gabinete inclui 11 ministros, sendo que o cargo
11º foi criado em janeiro de 2007, quando a Agência de Defesa se tornou
Ministério da Defesa. Em 2011, cada ministro era chefiado por um
ministro de estado que era apontado pelo primeiro-ministro. Cada
ministro é assessorado por dois vice-ministros e por três secretários
parlamentares. Todos eles são geralmente membros da Dieta
(EMBAIXADA DO JAPÃO, s.d.).

Essas medidas de redução dos ministérios contribuíram para a política externa porque
diminuíram a sua fragmentação. Até a década de 1980, em que o Japão dispunha de pujança
econômica, havia situações em que os ministérios, dentro da lógica acima, buscavam desenvolver as
suas próprias relações internacionais por meio de políticas de cooperação com outros países.

47
Figura 2 – Reforma da estrutura do governo central

Fonte: Zakowski, Bochorodycz e Socha (2018, p. 15)

48
Além disso, com o crescimento da economia japonesa, os interesses também se diversificaram,
inclusive dentro dos diferentes ministérios, passando por pressão de diversos grupos e círculos
empresariais em setores como: agricultura, construção, comércio e indústria. Outra consequência
advinda da maior interdependência promovida pela globalização nas últimas décadas foi que os
interesses domésticos passaram a se chocar com eventuais ações diplomáticas do governo. De
qualquer forma, o principal ministério na formulação da política externa é o dos Negócios
Estrangeiros. No entanto, no início o protagonismo aconteceu pelo singelo fato de os burocratas
desse ministério terem maior domínio de língua estrangeira que os dos de outros ministérios.
Entretanto as dificuldades de harmonização da política externa mencionadas entre os
ministérios também são levantadas por Zakowski, Bochorodycz e Socha (2018, p. 6), ao afirmarem
que o Ministério de Negócios Exteriores também não é uma instituição homogênea, pois possui
escritórios regionais e divisões que buscam os seus próprios objetivos setoriais.
Todas essas ações por reformas na estrutura do governo envolvendo a burocracia, promovidas
desde o final da década de 1990, tiveram alguns efeitos, no entanto não são consideradas suficientes
para eliminar todos os problemas decorrentes dos múltiplos interesses e iniciativas dentro do
governo que produziram uma fragmentação da política externa japonesa, pois, além da burocracia,
o PLD, que retornou e permanece no poder desde 2012, mantém as suas inconsistências, pois os
parlamentares promovem múltiplas iniciativas que, por vezes, são contraditórias por causa das
vinculações dos políticos no partido com grupos de interesses, conhecidos como tribos – zoku, em
japonês –, ligados a diferentes setores econômicos japoneses.

Política externa sob novos pilares


Até a Guerra Fria, o poder militar era um fator central nas avaliações do status internacional
dos países, e isso ficou muito evidente quando se apontou para os EUA e para a ex-União Soviética
como as duas grandes superpotências da bipolaridade. Um diferencial dessas duas potências era a
capacidade nuclear de destruição. De acordo com levantamento de Robert S. Norris e Hans M.
Kristensen (2010, p. 78), foram mais de 128.000 ogivas nucleares construídas desde 1945, sendo
os EUA (55%) e a ex-União Soviética (43%) os dois principais responsáveis por esses números.
O crescimento do número de armas nucleares ocorreu como uma forma de demonstração
mútua de poder e servia como elemento de dissuasão contra a ação do outro, pois o grande poder
de destruição em um contra-ataque de retaliação acabava inibindo a iniciativa de ambos. Mesmo
assim, esses dois países rivalizavam para terem uma posição de superioridade de atuação em relação
ao rival, em um primeiro momento pela quantidade de armamentos que cada um possuía, mas
também pela capacidade tecnológica.
Com o final da bipolaridade em 1989 e a diminuição das tensões nas relações entre as duas
superpotências, houve uma tendência de redução constante na quantidade total desses artefatos.

49
Após atingir o pico em 1986, os níveis globais de armas nucleares
diminuíram [e] desde o fim da Guerra Fria, mais e mais ogivas nos estoques
dos EUA e da Rússia foram movidas do status operacional para várias
categorias de reserva, inativas ou de contingência (NORRIS,
KRISTENSEN, 2010, p. 78).

Gráfico 7 – Inventário global de armas nucleares (1945-2010)

75.000,00
69.368
65.000,00

55.000,00

45.000,00 45000

35.000,00
31.255

25.000,00

15.000,00

5.000,00
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
2005
2008
-5.000,00

Estados Unidos Rússia TOTAL

Fonte: Norris e Kristensen (2010, p. 81-82)

A diminuição da importância relativa das forças militares nas relações internacionais após o
fim da Guerra Fria teve como um dos impactos a redução de armas nucleares. Também as discussões
sobre um novo ordenamento internacional passaram a analisar outros fatores que pudessem ser
relevantes para entender e prever as possíveis configurações de poder entre os países. Uma
abordagem que ficou muito popular entre os analistas de relações internacionais foi a do poder
brando – soft power – apresentada por Joseph Nye no seu livro Bound to lead: the changing nature
of American power, publicado em 1990, em que divide o poder em três categorias gerais para atingir
os seus interesses:
i. coagir com ameaças;
ii. aliciar com pagamentos e
iii. atrair e cooptar.

50
Dentro desse novo cenário sem a bipolaridade, o Japão se destacou globalmente, em um
primeiro momento, pelo seu sucesso econômico e tecnológico. A admiração pelos resultados
positivos fez com que a influência japonesa no mundo crescesse, e chama atenção o fato de que o
temor não era pelas armas, até porque, o Japão tinha restrições constitucionais em relação ao uso
de forças militares, mas pelo poder e pela concorrência na área econômica.
O poder econômico por si só, entretanto, não se mostrou suficiente. Um episódio que
demonstra essa realidade foi a Guerra do Golfo de 1990, quando o Iraque governado por Saddan
Hussein invadiu o Kuwait sob o argumento de defesa dos interesses econômicos iraquianos. Essa
atitude foi repudiada pela comunidade internacional, e os EUA, liderando forças aliadas, reverteram
a invasão. Nesse episódio, o Japão foi demandado a aumentar a sua participação internacional e
assumir encargos pela manutenção da paz e estabilidade internacional. Esses pedidos convergiam com
as declarações japonesas do pós-Guerra Fria, quando políticos japoneses afirmaram que havia chegado
o tempo de o país contribuir para a paz mundial à proporção do seu status econômico e tecnológico.
Porém a participação de Tóquio nesse conflito ficou basicamente restrita à contribuição
financeira, cerca de US$ 13 bilhões, destinada a arcar com os custos das ações militares. Esse
montante, apesar de significativo, não foi suficiente para apaziguar as insatisfações dos aliados, que
consideraram a participação japonesa inadequada, pequena e tardia. A expectativa era que houvesse a
presença de soldados japoneses no conflito, algo além da “diplomacia do talão de cheque”. Isto é, o
poder econômico que permitiu, provavelmente, a maior contribuição financeira entre os países aliados
não foi suficiente para garantir um reconhecimento positivo à participação japonesa nesse episódio.
Ao longo dos anos 1990, mesmo a atuação japonesa na área econômica se fragilizou. Uma
das justificativas para a tímida atuação internacional foi a crise na economia do Japão influenciada
pelo estouro da bolha econômica e pela instabilidade política, já mencionadas. Esses problemas
reverteram as declarações dos primeiros-ministros do final da Guerra Fria, que declaravam o
interesse do país em ampliar a sua atuação internacional. Um exemplo da menor disposição do
governo pelo envolvimento em questões externas ocorreu em 1998, em um momento que os países
do Sudeste Asiático esperavam uma colaboração do Japão para a recuperação da crise econômica de
1997, o primeiro-ministro Hashimoto declarou que “o Japão precisa se preocupar com os seus
próprios interesses. Certamente não somos arrogantes o suficiente para pensar que podemos assumir
o papel de locomotiva para a Ásia” (HALLORAN, 1998, p. 66, tradução nossa).
Avançando para o início do século XXI, um evento marcante para o mundo foi o ataque de
11 de setembro às Torres Gêmeas, dois edifícios do complexo World Trade Center em Nova
Iorque, que significou a internalização dos conflitos internacionais nos EUA. Por outro lado, as
repercussões atingiram de maneira profunda as relações internacionais, pois colocaram o terrorismo
na agenda central de segurança dos países.
No caso específico do Japão, esse episódio coincidiu com o ano da ascensão de Koizumi ao
cargo de primeiro-ministro, um político que já identificado nas unidades anteriores com um perfil
de maior iniciativa. Com isso, o enfrentamento das questões decorrentes dos ataques terroristas nos

51
EUA poderia ter sido um grande problema e desafio, mas Koizumi, grande defensor da aliança do
seu país com os EUA, conseguiu rapidamente aprovação de lei permitindo ao Japão enviar tropas
ao Afeganistão em apoio às operações militares norte-americanos.
Ainda que os soldados japoneses não pudessem participar de combates, podendo somente
apoiar no transporte suprimentos, em missões de resgate e apoio médico, essa agilidade de reposta
e o envio de soldados foram ações totalmente diferentes da realizada pelo governo japonês na Guerra
do Golfo. Isso fez com Koizumi conquistasse a simpatia do presidente dos EUA, George W. Bush.
Zakowski et al. (p. 39) ressaltam que esse resultado foi decorrente de compromissos e convicções
pessoais de Koizumi, não de pressões dos EUA – gaiatsu – pressões externas.
Há uma clara demonstração de mudança de postura, pois nos anos 1980, ao final da Guerra
Fria, a ampliação da participação do papel do Japão estava sendo discutida pelas claras pressões
internacionais, agora a iniciativa pela foi japonesa. Além disso, enfatizou-se que as Forças de
Autodefesa (FAD) do Japão participariam dos esforços de cooperação como membro da
comunidade internacional, uma postura claramente diversa daquela adotada na Guerra do Golfo
de 1990, em que a principal contribuição foi financeira.
Outra iniciativa mais afirmativa do governo Koizumi ocorreu em 2003, quando o Japão,
mesmo sem a aprovação da ONU para a ação dos EUA, apoiou o ataque ao Iraque ordenado pelo
presidente George W. Bush com suporte do primeiro-ministro do Reino Unido, Tony Blair. Além
disso, mesmo sofrendo oposição da opinião pública japonesa, Koizumi conseguiu aprovação na
Dieta para o envio de soldados japoneses para o Iraque, sob justificativa de que era para apoio à
reconstrução do país.
Essas ações na área militar não acontecem por acaso. Analisando-se os gráficos a seguir é
possível perceber que o Japão tem pouca margem de manobra nos seus recursos para recuperar o
seu status internacional, conforme o Gráfico 8 – Comparação das classificações das dimensões da
China e do Japão para os anos de 1990 e 2016 (escala logarítmica):

Percebe-se que nas dimensões População, Recursos Materiais e Poder


Econômico a possibilidade de o Japão sobrepujar a China, na prática,
inexiste, pois respectivamente a taxa de fecundidade é negativa, o país é
pobre em recursos materiais e a taxa de crescimento econômico é inferior
ao chinês. No caso do Poder Militar e Poder Nuclear, ainda que as
expansões possam encontrar limites econômicos, neste momento, elas
dependem substancialmente de decisões políticas (UEHARA, 2018,
p. 88).

52
Gráfico 8 – Comparação das classificações das dimensões da China e do Japão para os anos de
1990 e 2016 (escala logarítmica)

Fonte: Uehara (2018, p. 84)

Com esses resultados, o Japão, que em 1990 tinha três dimensões


superiores às da China (poder econômico, poder militar e legitimidade),
teve duas delas superadas em 2016. Além disso, houve um aumento da
distância nas dimensões população e recursos materiais e, com isso, o
resultado foi que as dimensões de projeção do Japão praticamente ficaram
contidas no interior da área da China em 2016 (UEHARA, p. 2018).

53
Além dessas dimensões que foram comparadas, o governo do Japão também buscou
revitalizar a sua imagem internacional no início do século XXI pelo poder brando, o soft power.
Agora, não mais fundamentado na admiração pelo sucesso e poder econômico conquistados a partir
da segunda metade do século XX, mas pelos elementos da cultura japonesa que poderiam ser
sintetizados em um primeiro momento pela “expressão cool Japan para se referir aos mangás (história
em quadrinhos), animes (desenho animado), jogos de videogame, moda e estilos de roupas, entre
outros elementos da cultura pop” (BELINI, 2019, p. 23).
Lais Belini (2019, p. 26) complementa que os desenvolvimentos chinês, sul-coreano e
indiano enfraqueceram a imagem do Japão como única nação asiática economicamente avançada e
tornaram os investimentos em políticas de diplomacia cultural como indispensáveis para a projeção
internacional do país. No entanto, Otmazgin (2007, p. 97) aponta que esse instrumento teve um
impacto no mercado cultural da região, mas em termos de política externa os resultados foram
limitados, particularmente no Leste Asiático, pois não melhorou de maneira significava a esfera de
influência do Estado japonês na região.
Toshiya Nakamura aponta no seu artigo que as suas análises de documento oficiais, discursos
de líderes japoneses e entrevistas com diplomatas revelam que o Japão, na busca de desenvolver
políticas que conduzam o país a um papel de maior liderança na comunidade internacional, tem
feito do poder brando um dos seus instrumentos para alcançar esse objetivo.

O Gaikō Fōramu (Fórum Diplomático), a revista mensal sobre diplomacia


publicada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão (Mofa),
apresentou artigos sobre os tópicos da cultura pop e diplomacia cultural em
várias edições (Gaikō Fōramu, 1994; 2003). Depois que a revista foi
renomeada para Gaikō (Diplomacia), ela publicou uma edição especial
com foco no tema do soft power japonês e da diplomacia cultural (Gaikō,
2010). E adicionalmente, a Fundação Japão, que trabalha em estreita
colaboração com o Mofa, conduziu uma pesquisa abrangente sobre várias
organizações e programas de intercâmbio cultural nos países ocidentais
(Japan Foundation 2003), as reformas estruturais do Mofa de 2004
incluíram o estabelecimento do Departamento de Diplomacia Pública,
com o objetivo de aumentar a internacionalização do Japão imagem
usando temas culturais populares japoneses prevalecentes como recursos
de soft power. Esses sinais iniciais de evolução da política voltada para o
aumento do emprego do PD para impulsionar o poder brando do Japão
atraiu a atenção de vários observadores nacionais e internacionais,
concordando ou não com a ideia (NAKAMURA, 2013, p. 1 e 2).

54
No entanto, os resultados dessa estratégia têm sido modestos. Uma das razões para isso são
as ações que tiveram efeitos opostos, ou seja, se os elementos culturais são empregados para construir
uma imagem mais positiva e confiável do Japão, a agenda mais nacionalista e revisionista do
primeiro-ministro Abe, no poder de 2012 a 2020, com políticas de maior engajamento em relação
às questões de segurança global, tiveram efeito contrário. Os seus críticos apontam que as suas
iniciativas para eliminar as restrições do pós-guerra sobre o poder militar japonês, como a reforma
da Constituição do país, em particular ao art. 9º, geraram insegurança e desconfianças na região e
pioraram as relações com a China e a Coreia do Sul, e acrescenta Christopher Hughes (2015, p. 5):

embora a ascensão do “Abe Doutrina” esteja, sem dúvida, gerando uma


política externa japonesa mais proativa e alcançou alguns “ganhos rápidos”
em termos de aumento do perfil e da influência internacionais; a médio e
longo prazo, a política é estrategicamente míope, difícil de sustentar e, em
última análise, contraproducente para o Japão interesses nacionais.

Como se podem avaliar as críticas mencionada por Hughes (2015) às ações do governo Abe,
dado que as análises dos que acompanham a política externa do Japão constatam que a busca por um
fortalecimento da sua posição internacional é um objetivo concreto das ações do governo desse país?
Retomando as reflexões sobre as dimensões que o governo do Japão tem, neste momento,
para recuperar e ampliar o seu status internacional, parece que o seu poder e a sua capacidade de
atuação militar são as que ele tem maior possiblidade de gestão, ainda que, como foi apontado por
Hughes (2015), não seja consensual nem deixe de ter efeitos colaterais no relacionamento com os
países do Leste Asiático.

Conclusão
O Japão tem-se empenhado em revitalizar e reafirmar o seu status como potência no século
XXI buscando fortalecer diferenciais que o distingam dos demais países asiáticos. Uma ação tem
sido relacionada ao poder brando, que inclusive tinha nas Olimpíadas de Tóquio grande expectativa
para que pudesse servir para um “relançamento” de divulgação de elementos desse poder, como a
cultura pop, a ultramodernidade tecnológica nominada pelo governo de Sociedade 5.0, aliando tudo
isso com a ideia de sustentabilidade.
Entretanto Nakamura (2013, p. 17) argumenta que os novos programas de diplomacia
pública por si só não são suficientes para ampliar o poder brando do Japão em toda a sua
potencialidade, especialmente se acreditarem que o entusiasmo internacional pela cultura pop do
Japão é capaz de substituir as memórias da agressão passada da nação. As questões históricas das
relações com os países e os vizinhos, particularmente com a China e a Coreia do Sul, ainda não
foram resolvidas e limitam a eficácia do poder brando.

55
Outra ação está relacionada à mudança de status do Japão à condição de “Estado normal”,
isto é, reformar a Constituição para que o país possa exercer também um papel político e militar
em semelhança de condições dos demais países. Portanto não se pode descartar que, apesar da saída
do primeiro-ministro Abe, esse tema se mantenha em discussão pelos políticos japoneses que
argumentam estarem visando contribuir para a segurança internacional e fortalecer o seu papel no
acordo bilateral de segurança nipo-americano.

56
MÓDULO III – GEOPOLÍTICA ASIÁTICA NO
SÉCULO XXI

Aponta-se o século XXI será o do continente asiático, pois desde o final da Segunda Guerra
Mundial vários de seus países tem se destacado pelo alto crescimento econômico. O primeiro a
ganhar notoriedade foi o Japão, que foi seguido pelos tigres asiáticos (Coreia dos Sul, Hong Kong,
Singapura e Taiwan). E mais recentemente, no século XXI a China e a Índia, mas não se deve deixar
de considerar também os países membros da ASEAN (Associação do Sudeste Asiático). Contudo,
o crescimento econômico desses países gera também preocupações, pois se de um lado há uma
interdependência e cooperação econômica, de outro há disputas de interesses. Por isso, a análise
abordará tanto os aspectos de fortalecimento da importância econômica asiática no século XXI
como também algumas das preocupações com a segurança e estabilidade na região?

Papel do Japão na “asianização” das


relações internacionais
O século XXI está sendo marcado pela discussão sobre a “asianização” da economia mundial.
A região conhecida como Ásia-Pacífico tem chamado a atenção do mundo desde o final do século
XX, graças à sua performance econômica e, em 2020, segundo estatísticas do FMI, essa região
ocupou a primeira posição com o maior PIB regional, à frente da América do Norte, onde estão os
EUA e o Canadá, bem como à frente da Europa, em que se localizam os demais países membros
do G-7: Alemanha, Reino Unido, França e Itália.
Tabela 8 – PIB (bilhões US$)

região 1980 1990 2000 2010 2020

Ásia-Pacífico 2.332,04 5.513,09 9.327,01 20.225,25 31.633,71

América do Norte 3.376,40 6.880,22 11.766,59 17.765,58 23.748,17

Europa 4.007,29 8.844,64 9.737,64 20.013,00 20.812,84

América Latina e Caribe 862,79 1.161,52 2.224,74 5.107,35 4.315,98

Oriente Médio e Ásia Central 555,41 1.117,46 1.231,63 3.091,97 3.682,82

Fonte: INTERNATIONAL MONETARY FUND. IMF data mapper: GDP, current prices. Disponível em:
<https://www.imf.org/external/datamapper/NGDP_RPCH@WEO/OEMDC/ADVEC/WEOWORLD>. Aceso em: 26 jun. 2021.

É possível constatar, por meio da Tabela 8, a evolução do crescimento da importância das


economias da região Ásia-Pacífico a partir do ano de 1980, quando estava em terceiro lugar, atrás
da Europa e da América do Norte, mas chegando à primeira posição em 2010. Em termos relativos,
a Ásia-Pacífico representava cerca de 69,1% do PIB da América do Norte e 58,2% da Europa em
1980. Em 2020, inverteram-se as posições, pois o PIB da Ásia-Pacífico passou a ser 29,3% maior
que o da América do Norte e 46,5% maior que o da Europa.
São resultados surpreendentes, portanto, esta unidade trará uma breve retrospectiva das
contribuições do Japão para que esses resultados acontecessem, fato que não é muito conhecido
atualmente. Os temas que serão destacados nas relações do Japão com os países que contribuíram
para o desenvolvimento econômico e a interdependência entre os países da região Ásia-Pacífico são:
a ajuda internacional concedida para o desenvolvimento e as políticas de integração.

Ajuda japonesa para o desenvolvimento


As contribuições do Japão na forma de ajuda internacional se iniciaram na década de 1950,
pois, após a derrota na II Guerra Mundial, o país passou a se utilizar da cooperação internacional
como forma de indenização aos países pelos danos causados durante os conflitos e, dessa forma,
participar da reconstrução regional.
Nesse primeiro momento, os volumes de recursos dedicados pelo governo de Tóquio para
essas políticas eram baixos, pois a própria economia japonesa ainda estava em recuperação. No
entanto, essa ajuda era considerada como importante para a estabilidade política, econômica e social
na região asiática, tendo em vista que fazia uma contraposição às ameaças de avanços comunistas,
uma preocupação dos EUA na região à época.

58
Ao final da II Guerra Mundial, o objetivo dos norte-americanos era enfraquecer o Japão,
restringindo a sua atuação internacional e, inclusive, limitando constitucionalmente a sua atuação
militar, pelo já mencionado art. 9º da Constituição, entretanto essa atuação apresentou uma
guinada de 180º graus sobre o perfil da participação do Japão no âmbito da política externa dos
EUA para região.
A política dos EUA, que tinha por objetivo criar uma estabilidade regional na Ásia sustentada
pela parceria com uma China unificada, democrática e aliada, mudou a partir de 1949, quando
Chiang Kai-Shek, o líder chinês apoiado pelos americanos para realizar a reunificação da China, foi
superado pelas forças comunistas. Essa vitória comunista na China conduziu uma reformulação da
estratégica política dos EUA, colocando o Japão como um parceiro de importância central para o
apoio da sua política na Ásia.
Por isso a política de ajuda japonesa não era apenas uma política de boa vizinhança, mas
estava inserida em uma lógica geoestratégica mais ampla. Os primeiros países a receberem as ajudas
foram justamente aqueles invadidos pelo exército japonês durante a II Guerra Mundial, como
Mianmar (antiga Burma), Filipinas, Indonésia e Vietnã.
Apesar dessas orientações geopolíticas, havia elementos nesses relacionamentos que podem
ser identificados como de interdependência, característica das relações econômicas do Japão com
outros países da região, que se multiplicaram na segunda metade do século XX. Isso ocorreu porque,
de um lado, a ajuda japonesa contribuía com as nações receptoras, mas, ao mesmo tempo, havia o
interesse japonês em garantir um bom relacionamento que lhe assegurasse o fornecimento de
matérias-primas de que o país necessitava, além de dar a possibilidade de abrir o seu mercado às
exportações das indústrias japonesas. Havia a oportunidade de potencializar mercados aos produtos
do Japão porque o Ministério da Indústria e Comércio Internacional – Miti, renomeado para Meti
na reforma tratada na unidade anterior – influenciava a formulação das políticas de ajuda externa
“condicionando os empréstimos e as doações ao consumo de produtos e serviços de origem
japonesa” (ARAGUSUKU, 2011, p. 59).
A partir do final da década de 1950, o Japão passou a fornecer a Ajuda Oficial de
Desenvolvimento, ou seja, a assistência passou a ser oferecida sob condições especiais pelo governo,
com objetivo de contribuir com o país de destino. Um dos primeiros países a receber esse tipo de
ajuda foi a Índia em 1958. Mas, no contexto regional, os países mais próximos ao Leste Asiático
que receberam esses recursos foram Coreia do Sul e Taiwan. Nesse período, o Japão colaborou
também para a criação do Banco de Desenvolvimento da Ásia (AsDB).
As ajudas japonesas contribuíram com o desenvolvimento de muitas nações asiáticas também
pelo significativo crescimento do orçamento destinado pelo governo japonês à cooperação a partir da
década de 1980, conforme discutido no módulo I. Além do volume de recursos, outra característica
da ajuda japonesa apresentada na Carta da Ajuda Oficial para o Desenvolvimento do Japão é que a
cooperação enfatiza áreas de recursos humanos e a construção de infraestrutura econômica e social,
fatores que contribuem para o desenvolvimento dos países recebedores (MOFA, 2003), quer dizer,
houve reciprocidade e mútuo esforço na cooperação e na ajuda financeira entre os países.

59
Essa caraterística é presente na AOD do Japão, pelo menos, desde a década de 1980, ou seja,
prioriza-se uma política de direcionamento da ajuda japonesa que não seja simplesmente
assistencialista:

O conflito entre o norte e o sul está se intensificando e o Japão deve iniciar


ativamente um diálogo que avance na compreensão de questões nas
relações Norte-Sul. Além disso, esses esforços devem ser acompanhados
por melhorias na cooperação econômica. Ajuda econômica somente será
efetiva se for suportada por sacrifícios e esforços para o desenvolvimento
nos países que recebem ajuda. O Japão deve enfatizar cooperação
econômica nas áreas e setores em que a ajuda estimulará esforços locais
para o desenvolvimento (OKITA, 1981, p. 274-275, tradução nossa).

Os países asiáticos foram também os mais beneficiados pela cooperação internacional


japonesa, tendo em vista que o histórico da distribuição regional desses recursos mostrou que mais
de 50% dos valores foram destinados a esses países, chegando a picos como em 1972, em que 97,7%
da AOD foram direcionados para a Ásia.
Já na década de 1970, o Japão passou a ser mais uma vez um parceiro importante dos EUA
na geopolítica asiática, pois lhe foi solicitado que compensasse a perda do relativo poder norte-
americano na região, por causa da derrota sofrida no Vietnã e da sua saída da península da
Indochina em 1975. Essa maior participação ficou evidente pelo aumento de recursos destinados
para os países do Sudeste Asiático, em particular para os países membros da Associação de Nações
do Sudeste Asiático – Association of Southeast Asian Nations (Asean), em inglês.
Essa concentração de recursos para os países vizinhos se manteve mesmo depois do final da
Guerra Fria, sendo curioso notar que um dos países que mais receberam recursos da AOD do Japão
no final do século XX e início do século XXI foi a China, país para o qual, até 2007, o Japão figurava
entre os maiores fornecedores de AOD (MOFA, 2011), destinados à infraestrutura e à cooperação
técnica. Na última década, outros países passaram a ocupar a liderança entre os maiores recebedores
de recursos do Japão, como a Índia em 2018.

60
Gráfico 9 – Dez maiores recebedores de AOD do Japão em 2018 (US$ milhões)

Tailândia 270,82
Egito 294,58
Mianmar 536,90
Iraque 555,01
Filipinas 562,50
Indonésia 637,77
Vietnã 673,85
Bangladesh 1.297,71
India 2.231,91

0,0 500,0 1.000,0 1.500,0 2.000,0 2.500,0

Fonte: MOFA. White paper on development cooperation 2019. List of charts presented in the white paper.
Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/policy/oda/page24_000075.html>. Acesso em: 25 jun. 2021.

Políticas de integração regional


De acordo com os dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento (Unctad), em 2021 o comércio intrarregional na Ásia é de praticamente 60%, o
segundo maior no mundo, perdendo somente para a Europa, em que o volume de transações
comerciais dentro do próprio bloco chega a 68%. Existe, portanto, uma grande interdependência
entre as economias das nações asiáticas e, também, um importante processo de integração regional
que se iniciou na segunda metade do século passado e ainda continua se desenvolvendo, tendo o
Japão desempenhado um papel importante nas discussões conceituais e de políticas de integração.

61
Gráfico 10 – Exportações intrarregional e extrarregional (%)

Europa 68,0 32,0

Ásia 59,6 40,4

América do Norte 30,1 69,9

America do Sul 16,1 83,9

África 15,5 84,5

América Latina e Caribe 14,6 85,4

Oceania 6,4 93,6

0,0 20,0 40,0 60,0 80,0 100,0


Intra-regional Extra-regional

Fonte: UNCTAD. Intra-trade and extra-trade of countries group by product annual. Disponível em:
<https://unctadstat.unctad.org/wds/TableViewer/tableView.aspx>. Acesso em: 25 jun. 2021.

As concepções para esse processo de integração e adensamento das relações econômicas


começaram a ser formalizadas a partir da década de 1960, por ação do economista japonês Saburo
Okita, que apresentou um estudo sobre a viabilidade de criação de um organismo de cooperação
econômica para a região em 1961.
Novamente, há que se recordar da importância estratégica do Japão nos planos geopolíticos
dos EUA, já que o desenvolvimento econômico dos países da região era uma meta considerada
importante para conter o comunismo. Com isso, em um primeiro momento, as iniciativas de
discussões pelo aumento da integração na área do Pacífico eram identificadas principalmente como
uma preocupação japonesa.
Uma mudança nesse quadro vai ocorrer a partir da segunda metade da década de 1960,
quando o governo da Austrália passou a demonstrar preocupação com o processo de integração da
Comunidade Econômica Europeia e a percepção de adesão do Reino Unido ao bloco. Com a
preocupação de buscar alternativas de relacionamentos econômicos e de não deixar que as discussões
de integração das nações do Pacífico ficassem apenas sob as definições do Japão, o governo de
Canberra, a partir da Conferência sobre Comércio e Desenvolvimento do Pacífico – Pacific Trade
and Development Conference (Pactad) – realizada em Tóquio em 1968, passou a se envolver e
contribuir com as discussões de integração na região.

62
Essas discussões culminaram no estabelecimento do Fórum de Cooperação Econômica da
Ásia-Pacífico – Asia-Pacific Economic Cooperation (Apec) – no evento realizado nos dias 6 e 7 de
novembro de 1989, na cidade de Camberra, Austrália. O objetivo era estabelecer discussões que
promovessem o aprofundamento da integração e aumentassem o dinamismo econômico entre os
países membros.
Mais recentemente, já no século XXI, dois novos acordos regionais com a presença do Japão
foram estabelecidos visando à integração econômica. O primeiro foi o Tratado Integral e
Progressista de Associação Transpacífico, que havia sido firmado em 2016, envolvendo 12 países:
cinco da Ásia (Japão, Brunei, Malásia, Cingapura e Vietnã), dois da Oceania (Austrália e Nova
Zelândia), três da América do Norte (EUA, Canadá e México) e dois da América do Sul (Peru e
Chile). Entretanto o presidente norte-americano Donald Trump, em um dos seus primeiros atos,
retirou os EUA do acordo. Com isso, chegou-se a questionar se estaria fadado ao fracasso, contudo,
entrou em vigor em março de 2018, sob a liderança importante do Japão e sem os EUA, bem como
foi renomeado para Acordo Abrangente e Progressivo para a Parceria Transpacífica –
Comprehensive and Progressive Agreement for Trans-Pacific Partnership (CPTPP) ou TPP-11.
Já o segundo acordo, mais recente e chamado de Parceria Econômica Regional Abrangente –
Regional Comprehensive Economic Partnership (RCEP) –, incorporou 10 países membros da
Asean (Brunei, Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas, Singapura, Tailândia e
Vietnã) e cinco parceiros Asean FTA (Austrália, República Popular da China, Japão, República da
Coreia e Nova Zelândia). Para se ter uma ideia da sua importância, os países membros desse acordo
representam uma população de 2,27 bilhões de pessoas, relações comerciais da ordem de US$ 12,5
trilhões e um PIB total de US$ 25,9 trilhões.
Pode-se considerar, portanto, que o arcabouço institucional para a busca de liberalização
comercial continua em desenvolvimento, e o Japão continua a ser um ator importante nesse processo.

Integração econômica: comércio e


investimentos
Com o final da Guerra Fria, o mundo passou a experimentar um processo de integração
econômica em que as barreiras das divisões ideológicas do mundo capitalista ou comunista
transpassaram para um segundo plano. As empresas passaram a buscar maior otimização das suas
atividades, tanto para a redução de custos, buscando insumos mais baratos – matéria-prima e mão
de obra – como para a ampliação dos seus mercados.
Em outras palavras, pode-se afirmar que o final da Guerra Fria potencializou o uso da Cadeia
Global de Valor (CGV) – conjunto de atividades desenvolvidas no mundo dos negócios, que
abrange da concepção de um produto até o seu descarte final. Anteriormente ao período desse

63
aprofundamento da interdependência econômica associada à globalização, a produção e o consumo
eram majoritariamente feitos nos próprios países em decorrência dos altos custos de transportes e
dificuldades logísticas.
A partir do final do século XX, as empresas no mundo todo passaram a buscar mais
intensamente as chamadas vantagens comparativas e as economias de escala, passando a intensificar
o comércio internacional. No entanto, na Ásia essa integração aconteceu mais cedo liderada pelo
desenvolvimento econômico do Japão, que, durante as décadas de 1950 e 1960, conseguiu realizar
altas taxas de crescimento e, na década de 1970, passou a terceirizar partes do processo produtivo
aos países vizinhos.
Essa política de terceirização de partes gerou uma cadeia produtiva asiática que impulsionou
o crescimento econômico em sequência dos países na região, que ficou conhecido como o “voo dos
gansos”. Essa estratégia de transferência da produção ocorreu porque, com o desenvolvimento da
economia japonesa, os custos da produção no Japão também se elevaram, por isso, para manter a
competitividade dos seus produtos, as empresas passaram a levar partes da produção que eram de
maior intensidade de uso de mão de obra para países com salários mais baixos.
Entretanto era necessário também que, apesar de utilizarem mão de obra mais barata,
houvesse a manutenção dos padrões de qualidade dos produtos, pois defeitos nas partes ou nos
componentes impactariam diretamente a imagem das mercadorias exportados pelas empresas
japonesas. Por esse motivo, a estruturação dessa cadeia produtiva foi acompanhada da transferência
de tecnologia de empresas japonesas aos parceiros, isto é, aos países vizinhos. Os primeiros a
receberem esses investimentos foram Coreia do Sul, Taiwan, Hong Kong e Singapura, que se
tornaram os “novos países industrializados” (NPIs) asiáticos e ficaram conhecidos como Tigres
Asiáticos pela agressividade econômica que apresentavam.
Esses países NPIs estabeleceram um segundo nível tecnológico de produção e, com o
crescimento econômico, também tiveram os custos da mão de obra encarecidos. À medida que isso
ia ocorrendo, ou seja, recepção de novas tecnologias e aumento dos custos salariais, os NPIs
repassavam as produções mais intensivas em mão de obra e com tecnologias mais velhas para
terceiros países, que seriam os países membros da Asean e, posteriormente, a China.
Portanto a ideia de cadeia global de valor é algo implementado na Ásia já há algumas décadas.
A construção dessa cadeia produtiva liderada pelo Japão permitiu o envolvimento e o crescimento
em sequência das economias da região, pois envolvia investimento japoneses para a produção, que
depois era importado pelas empresas japonesas para a confecção do produto final. Essa rede de
relações se refletirá no nível de 60% de comércio intrarregional, apresentado no Gráfico 10.
Ao longo do século XXI, o aprofundamento da interdependência produtiva se amplia e os
países asiáticos passam a protagonizar as chamadas “cadeias globais de valor”. No caso do Japão,
com objetivo de se manter na liderança dessa cadeia, a estratégia visa a transferência de tecnologia
e tipos de produção menos interessantes, abrindo oportunidades na economia japonesa para novos
empreendimentos mais avançados em termos tecnológicos e com valor agregado.

64
Tabela 9 – Participação do Japão como origem e destino do comércio do Nordeste Asiático
e países da Asean

participação participação
país posição como destino posição como origem
(exportações) (importações)

Nordeste da Ásia

Coreia do Sul 5 5,2 3 9,5

China 3 5,9 2 8,5

Taiwan 4 6,5 2 16,2

Membros da Asean

Brunei Darussalam 1 31,4 8 4,6

Camboja 2 8,5 5 4,2

Filipinas 2 15,1 2 9,6

Indonésia 3 9,5 3 9,4

Laos PDR 4 1,6 4 2,0

Malásia 5 6,0 4 7,5

Mianmar 3 7,9 7 2,7

Singapura 6 5,4 4 4,5

Tailândia 3 9.9 2 14,0

Vietnã 3 7,7 3 7,7

Fonte: WORLD TRADE ORGANIZATION. Members and observers. Disponível em:


<https://www.wto.org/english/thewto_e/whatis_e/tif_e/org6_e.htm>.
Acesso em: 25 maio 2021.
World integrated trade solution. Disponível em:
<https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/SGP/Year/2019/TradeFlow/EXPIMP>.
Acesso em: 25 maio 2021.

65
Esse processo de desenvolvimento econômico integrado na Ásia fez do Japão um importante
parceiro comercial no Nordeste Asiático, e dos países membros da Asean, estando entre os cinco
principais parceiros comerciais, importação ou exportação. Apesar dessa participação de destaque
nas relações com os países vizinhos, a situação do Japão não é tão confortável, pois, nos últimos
anos, após ajudar na construção do desenvolvimento dos seus parceiros, passou a enfrentar a
concorrência desses países.
Setores em que o Japão obtinha grande destaque na segunda metade do século XX, como o
automotivo e o eletroeletrônico, por exemplo, atualmente sofrem forte concorrência no mercado
mundial de marcas coreanas, taiwanesas e, mais recentemente, chinesas. Portanto, como se diz,
chegar à primeira posição não é fácil, mas se manter nela é muito mais difícil.
Com se tem discutido, o governo do Japão tem buscado recuperar as suas posições perdidas
no âmbito internacional. A liderança nas relações econômicas na Ásia pode ser apontada como uma
delas, mas não é uma tarefa fácil, pois, como já foi apontado, o Japão tem questões estruturais,
como envelhecimento e diminuição da população, baixo consumo e raso crescimento econômico,
que precisam ser enfrentadas e superadas, sem as quais a liderança continuará a ser ameaçada.
Essa liderança econômica se apresenta comprometida principalmente pela China, que já
assumiu a posição de segunda maior economia global em 2010, além de ocupar importante posição
no comércio dos países da região. Além disso, também está entre os cinco maiores parceiros
comerciais, tanto nas importações como nas exportações dos países asiáticos.
De acordo com o professor Nobuhiro Aizawa (FODALE, 2020), da Universidade de Kyushu,
a partir do final do século XX, a China passou a ganhar cada vez mais importância como parceiro
comercial dos países da região e tem buscado construir no Sudeste Asiático uma estrutura
econômica sinocêntrica. Países como Camboja, Laos e Mianmar, que possuem menores conexões
com o mercado global, têm sido atraídos pela influência chinesa. Por outro lado, Tailândia,
Indonésia, Cingapura e Filipinas, que são mais integradas aos negócios internacionais, têm-se
aproximado do Japão, tonando-se um contraponto à China.
A crise de abastecimento durante a pandemia, em que vários países tiveram falta de máscaras,
respiradores, componentes, entre outros produtos causada pela paralização das empresas na China,
fez acender a luz amarela para muitas economias globalmente, inclusive as asiáticas, sobre os riscos
de ter alta dependência de fornecedores chineses. Por isso, o primeiro-ministro Yoshihide Suga tem
defendido a Iniciativa para uma Cadeia de Abastecimento Resiliente – SCRI, em inglês.
Inicialmente, a proposta apresentada em meados de 2020 tinha a Índia e a Austrália como parceiros
do Japão, mas, em 2021, em viajem ao Vietnã, o primeiro-ministro Suga já sinalizou a expectativa
de envolvimento de países da Asean.
A proposta do Japão é dar incentivos para que as empresas japonesas retornem ao país e que
empresas estrangeiras transfiram as suas produções também para o Japão. Em termos de
suprimentos, o plano é que as empresas japonesas passem a buscar fornecedores em outros países
asiáticos além da China.

66
Os incentivos aos investimentos estrangeiros no Japão são uma iniciativa em busca da
recuperação e da manutenção do seu status quo por meio do aumento da competitividade da sua
economia. Já no início do século XXI, o governo do primeiro-ministro Koizumi passou a incentivar
a atração de empresas estrangeiras para que investissem no desenvolvimento de inovações no país
pela política que foi nominada Invest in Japan.
Muitas vezes, houve o argumento de que o ingresso de novas empresas aumentaria a
concorrência, levaria melhoria às empresas e, consequentemente, produziria uma recuperação da
economia japonesa. Recentemente, contudo, o consultor e estrategista Jesper Koll (2020) publicou
um artigo afirmando que o Japão não precisa de mais competição, mas de competitividade.
Comparando a concorrência nos mercados do Japão e dos EUA, ele constatou que, no primeiro, o
market share das quatro maiores empresas representa cerca de 11% do total das receitas do seu setor,
já no caso dos EUA, seria de 35%. Conclui, então, que o mercado japonês é pelo menos três vezes
mais disputado que o norte-americano. Também defende que isso não é positivo, porque:
a) mais competição significa menor possibilidade de atuação sobre os preços, e isso impacta
a lucratividade. Para piorar a situação, o Japão tem apresentado momentos de deflação,
prejudicando ainda mais as empresas;
b) competição excessiva resulta em menor lucratividade e baixo retorno do investimento;
c) altos níveis de competição doméstica desincentivam investimentos estrangeiros diretos,
apesar das iniciativas governamentais, como as de Koizumi;
d) acomoda a mão de obra, pois, em um ambiente de estagnação, os trabalhadores não se
sentem motivados a buscar maior capacitação, pois as empresas concorrentes não
oferecem nenhuma vantagem significativa.

Como se pode perceber nas duas primeiras unidades deste módulo, o Japão teve papel
importante no desenvolvimento econômico dos países da região. Protagonizou a liderança em
termos de ajuda, comércio e investimentos ao longo da segunda metade do século XX. Contudo,
desde a década de 1990, em razão das suas dificuldades econômicas, vem perdendo posições
relativas no mundo e na Ásia.
Com relação aos últimos anos, o Japão tem buscado revitalizar as suas relações e o seu
protagonismo na Ásia. Politicamente, os avanços nos acordos de cooperação e integração econômica
podem ser avaliados com resultados positivos.

67
Parceria com os EUA
Em 2020, o Acordo de Cooperação e Segurança Mútua entre o Japão e os Estados Unidos
completou 60 anos. Essa é uma data importante, pois o relacionamento com os EUA é fundamental
para pensar as relações internacionais do Japão, não só desse acordo para cá, mas desde o final do
século XIX, quando o comodoro Perry se impôs com os seus canhões, conforme apontado no
módulo I.
Além disso, até a primeira metade do século XX, houve dois momentos opostos, um de
parceria, que vai até a I Guerra Mundial, quando os dois aliados lutaram contra a Alemanha.
Entretanto, terminado esse conflito, ambos os países se fortaleceram, e os interesses americanos e
japoneses passaram a ser concorrentes, ao ponto de na II Guerra Mundial se tornarem inimigos.
Já após a II Guerra, os dois países se aproximaram e se tornaram importantes aliados, tendo
o Japão apoiado a política externa dos EUA e atuado como um dos pilares da política externa
daquele país na região asiática a partir de 1947 (Ver unidade 1 deste módulo).
Ao final do século XX, surgiram tensões causadas pela ascensão e pela competividade
econômica japonesa. Na década de 1980, os déficits comerciais dos EUA com o Japão eram motivo
de muitas objeções por parte do governo de Washington. Mas, diferentemente da primeira metade
do século XX, quando o governo de Tóquio rivalizou com os EUA, nos anos 1980, o Japão buscou
acomodar as pressões e os descontentamentos dos americanos. Um exemplo disso foi o Acordo de
Plaza, mencionado no módulo II, em que o país aceitou valorizar a sua moeda – o iene – em face
do dólar, para contribuir com a tentativa de redução do saldo negativo na balança comercial
americana.
Já na década de 1990, apesar da valorização do iene, os déficits com os japoneses continuaram,
por isso esses anos ainda foram marcados por tensões comerciais e reclamações dos EUA. “A década
de 1985 a 1995 foi um momento de elevação nos esforços americanos para aumentar o acesso ao
mercado japonês, em que era comum o crescente número de negociações comerciais e altas pressões
norte-americanas sobre o Japão” (LINCOLN, 1999, p. 2).
No entanto, apesar de o déficit dos EUA ter continuado, o cenário do Japão como
superpotência que substituiria os EUA não se concretizou. Além disso, as dificuldades após o
estouro da bolha em 1991, o baixo crescimento econômico e muitas trocas de ministros no Japão
fizeram com que o antagonismo americano, que ficou conhecido como Japan Bashing, desaparecesse
na segunda metade dos anos 1990.
Por outro lado, a partir da segunda metade dos anos 1990, as atenções e as preocupações
norte-americanas passaram a priorizar as relações com a emergente China. O Gráfico 11, a seguir,
mostra claramente que nesse período os déficits americanos nas relações comerciais com a China
cresceram de maneira significativa. Em 2003, o déficit com a China chegou a US$ 124,1 bilhões,
praticamente o dobro do déficit com o Japão, que foi de US$ 66,0 bilhões.

68
Gráfico 11 – Saldo comercial dos EUA com Japão e China

1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
2005
2007
2009
2011
2013
2015
2017
2019
0,0
-50.000,0
-100.000,0
-55.742,9
-150.000,0
-200.000,0
-250.000,0
-310.263,6
-300.000,0
-350.000,0
-400.000,0
-450.000,0 -418.233,0
Japão - Saldo China - Saldo

Fonte: UNITED STATES CENSUS BUREAU. Foreign trade. Disponível em:


<https://www.census.gov/foreign-trade/balance/c5880.html#1985>. Acesso em: 30 jun. 2021.

As preocupações mudaram de país, pois não era mais o Japão a ameaça à posição americana,
mas a China, que apresentou taxas de crescimento elevadas, além do incômodo e crescente superávit
na balança comercial com os EUA.
O século XXI inicia, portanto, sem essas tensões comerciais com o Japão e com uma condição
mais favorável a uma restruturação das relações nipo-americanas. Contribui para isso também a
eleição de Junichiro Koizumi ao cargo de primeiro-ministro do Japão, em 2001. Ele foi um político
que demonstrou já no seu primeiro discurso à imprensa o desejo de fortalecer tanto a participação
do Japão nas questões internacionais como nas relações com os EUA.

Para que o Japão nunca mais faça guerra, é da maior importância que o país
nunca mais se isole da cooperação internacional e da comunidade
internacional. Dessa perspectiva, considero a sustentação para o futuro da
diplomacia do Japão o funcionamento amigável da relação Japão-Estados
Unidos, que até agora tem sido a base mais importante a partir da qual o
Japão opera. Embora nunca esqueça essa base da diplomacia do Japão, estou
convencido de que, por meio de uma cooperação amigável e próxima entre
o Japão e os Estados Unidos, podemos criar uma estrutura cooperativa com
os outros países do mundo (KOIZUMI, 2001, tradução nossa).

69
Além disso, o atentado de 11 de setembro ao World Trade Center serviu de oportunidade
para que o primeiro-ministro Koizumi demonstrasse o seu compromisso com o que havia declarado,
pela rápida resposta e pelo alinhamento do Japão às ações norte-americanas. Peter Lindgreen (2012)
exemplifica bem essa rapidez:

Koizumi e o seu gabinete responderam rapidamente aos ataques terroristas


nos EUA. Apenas 45 minutos após os ataques ao World Trade Center,
uma força-tarefa de emergência foi estabelecida pelo kantei (gabinete do
primeiro-ministro). Depois de uma semana, em 19 de setembro, o
gabinete de Koizumi propôs o envio de aviões e navios SDF para ajudar os
Estados Unidos, fortalecer a proteção das bases dos EUA no Japão e enviar
auxílio econômico de emergência ao Paquistão e à Índia para garantir o
seu apoio (LINDGREEN, 2012, p. 79, tradução nossa).

Outra iniciativa do primeiro-ministro Koizumi para reforçar a posição do Japão nas relações
internacionais foi a demanda por um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações
Unidas. Esse pleito ocorreu em conjunto com Brasil, Alemanha e Índia, que formaram o Grupo
dos Quatro (G-4) e colocaram muito esforço para aumentar a participação em questões
internacionais; no entanto, houve resistências de diversos países, entre eles a China, que não aceitava
a elevação de status do Japão a membro permanente do Conselho.
O sucessor escolhido por Koizumi para o cargo de primeiro-ministro foi Shinzo Abe, que
também estivera por duas vezes no cargo e se manteve posicionado ativamente nos temas de
segurança. Já no primeiro mandato aprovou, em abril de 2007, a renomeação da Agência de Defesa
para Ministério de Defesa. No segundo mandato, o primeiro-ministro Abe criou a Estratégia
Nacional de Segurança e o Conselho de Segurança do Japão em 2013.
A Estratégia Nacional de Segurança fundamenta o conceito de pacifismo proativo, que busca
dar contribuição à manutenção da ordem internacional baseada em regras e valores universais, tais
como liberdade, democracia, respeito pelos direitos humanos fundamentais e Estado de direito. O
Conselho de Segurança do Japão centraliza as discussões da política externa e de segurança do país,
integrando informações entre as principais agências de segurança para evitar ações fragmentadas
entre os ministérios (HUGHES, 2015, p. 29).
Além dessas ações, a meta mais ambiciosa do primeiro-ministro Abe era a reforma da
Constituição envolvendo o art. 9º, para dar ao Japão novamente a condição de Estado normal,
como outros países, entretanto, ele renunciou em 2020 sem conseguir realizar esse objetivo. Apesar
de essa alteração não ter sido concretizada, o governo do Japão continua o seu processo de
reinterpretação da Constituição para poder ampliar a sua atuação internacional e ao mesmo tempo
atender às pressões do governo norte-americano para que tenha uma performance mais ativa,
inclusive militarmente.

70
É nessa linha que aparece o relatório do Painel Consultivo de 2014, que estabelece as
condições para o exercício da autodefesa coletiva:
a) O Estado atacado tem laços estreitos com o Japão.
b) Caso um ataque não seja resolvido, haveria impacto significativo na própria segurança do
Japão.
c) O país com quem o Japão tem laços estreitos faz uma chamada específica por assistência.
d) O primeiro-ministro analisa a situação com o Conselho Nacional de Segurança e recebe
a aprovação da Dieta Nacional.

De qualquer forma, para apaziguar os mais receosos em relação ao Japão passar a participar
indiscriminadamente de operações militares lideradas pelos EUA, o Conselho aponta que a
autodefesa coletiva é um direito, e não uma obrigação, por isso a sua execução estará sujeita ao
julgamento político nacional.

Japão e China: cooperação e rivalidades


Para entender as relações no contexto asiático é importante salientar as relações de
interdependência entre os países, como foi exemplificado pela integração econômica, cerca de 60%
do comércio desses países ocorrem internamente na região. Casos como a tríplice tragédia de 2011,
em Fukushima, e da pandemia da Covid-19 na China em 2020, mostraram que os problemas de
produção em um país repercutem nas economias dos parceiros.
Há, portanto, como define Bull (2002) um sistema asiático:

Mas quando os Estados mantêm contato regular entre si, e quando além
disso a sua interação é suficiente para fazer com que o comportamento de
cada um deles seja um fator necessário aos cálculos dos outros, podemos
dizer que eles formam um sistema. A interação dos Estados pode ser direta
(quando são vizinhos, parceiros ou competem pelo mesmo fim) ou indireta
(em consequência do relacionamento de cada um com um terceiro), ou
simplesmente pelo impacto deles sobre o sistema (BULL, 2002, p. 15).

Nesse sistema, as interações econômicas são apenas uma das vertentes, pois existem
intercâmbios em várias áreas que produzem interdependências e aproximações, mas também atritos.
Por isso é possível observar que são múltiplos e intercruzados os laços de cooperação e os pontos de
atrito, como apontado por Bull (2002), os quais podem ser de interação direta ou indireta, tornando
o entendimento das relações internacionais nesse continente interessante e complexo.

71
Com relação à região do Nordeste e do Sudeste Asiático em particular, os países ao mesmo
tempo que compartilham histórias milenares e possuem culturas ricas e diversas, nem sempre
possuem interesses convergentes. Ademais, apesar da longa história, ao se analisarem os países como
Estados-nação, muitos dessa região ainda são bastante recentes, como são os casos dos membros da
Asean, que se tornaram independentes somente depois da II Guerra Mundial.
Além de casos interessantes como o da China, que tem cultura e história milenares, mas que
passou a ter representação no mundo contemporâneo após a Resolução nº 2.758 pela Assembleia
Geral da ONU, em 25 de outubro de 1971, substituindo Taiwan (Formosa) pela República Popular
da China, bem como Timor Leste, que obteve reconhecimento da sua independência política da
Indonésia somente a partir em 20 de maio de 2002, portanto, um país com apenas 19 anos.
Dentro desse complexo contexto asiático, há os países que apresentam ações de busca de
afirmação das suas posições internacionais, como a China de Xi Jinping e o Japão do século XXI,
como vem sendo discutido; mas também há os países que buscam fortalecer as suas posições como
jovens países independentes. É interessante trazer as cinco premissas apresentadas por John
Mearsheimer na sua obra The tragedy of great power politics (2001, p. 30), que permitem uma
abordagem analítica dos comportamentos dos países dessa região:
a) O sistema internacional é anárquico, com Estados soberanos que competem por
segurança.
b) Todos os Estados possuem alguma capacidade militar ofensiva, com possiblidade de
causar danos ou destruir outro.
c) Estados não podem ter certeza sobre as intenções dos outros Estados, pois existem muitas
possibilidades de agressão, e não é possível saber se o outro está disposto a realizar.
d) A sobrevivência é o principal objetivo dos Estados, em particular manter a sua integridade
territorial e a sua autonomia.
e) Estados são conscientes do seu ambiente externo e pensam estrategicamente nele mesmo
para sobreviver.

Esses tópicos levantados por Mearsheimer (2001) são bastante aplicáveis à reflexão das
relações entre os países asiáticos, em particular, em relação ao Japão e aos seus vizinhos. Percebe-se
nesse momento, por exemplo, em relação ao sistema anárquico, que as questões de segurança estão
nas prioridades das agendas dos governos, que se refletem nos investimentos chineses na área de
defesa, nos testes de mísseis e nos artefatos nucleares da Coreia do Norte, nas tensões no Mar do
Sul da China envolvendo os países dessa área.
No caso do Japão, os governos dos primeiros-ministros Koizumi e Abe evidenciaram a clara
preocupação com o tema da segurança, mas também nos partidos de oposição houve a presença de
políticos que defendessem a necessidade de o país investir mais na área de defesa.

72
Como resultado disso, o tópico sobre a capacidade militar dos países aparece em sequência,
pois com as preocupações e desconfianças crescentes entre os atores e não tendo certeza de quais
serão as intenções (tópico três) dos demais, cada um procura ampliar a sua capacidade de defesa.
Este é o ambiente que vem sendo construído na região, com os governos procurando manter
segurança, independência e integridade territorial (tópico quatro), conscientes das políticas dos
vizinhos e receosos de possíveis vulnerabilidades (tópico cinco), assim, adotam medidas de
precaução que retroalimentam os temores dos outros países.
Portanto a análise das relações na região tem duas abordagens que podem ser constatadas:
uma que passa pelas crescentes interdependência e cooperação, que foram construídas e
aprofundadas desde a segunda metade do século XX; e outra que é a rivalidade, resultado da
concorrência econômica que se estabelece a partir do momento em que as nações começam a não
mais se enquadrar no modelo do voo dos gansos.
Esse modelo funcionou enquanto havia uma aceitação e uma realidade em que os países de
fatos tinham patamares de desenvolvimento econômico e tecnológico em diferentes níveis, cenário
que se desfez com os avanços dos países asiáticos, demonstrando uma grande diferença entre a
metáfora sobre as aves e os países, já que entre as primeiras, o intercâmbio na posição de liderança
é aceito e desejável. Já entre os países, há desconfianças sobre a liderança e também o interesse
humano de reconhecimento e status, que desfazem o raciocínio e a arquitetura do voo dos gansos.
Voltando à análise dos países, tem ficado evidente ao longo deste trabalho que o Japão não
está satisfeito com a perda de status internacional sofrida desde o final do século XX, e que o governo
de Tóquio tem buscado, restaurá-lo totalmente ou, pelo menos, fortalecer a sua posição
internacional. Um exemplo claro dessa iniciativa é a demanda do país por um assento permanente
no Conselho de Segurança da ONU.
Aqui, identifica-se um dos paradoxos nas relações Japão com os seus parceiros regionais. A
China, apesar de ter recebido grandes volumes de recursos em ajuda para o desenvolvimento (ODA)
e de investimentos diretos de empresas japonesas, bem como ter o Japão como o segundo maior
destino das exportações e maior fornecedor das suas importações, tem resistido a aceitar a concessão
de uma vaga de membro permanente no Conselho de Segurança ao Japão.
Outros focos de tensão na região são as disputas territoriais. Como foi apontado por
Mearsheimer (2001), a manutenção da integridade territorial é um dos objetivos dos países. A
região do Nordeste e do Sudeste Asiático ainda possui muitas disputas por territórios envolvendo
diferentes nações.
No caso específico do Japão, há disputas com a China em relação às ilhas denominadas pelos
japoneses como Senkaku, ou Diaoyu, pelos chineses. Elas ficam em uma área entre os dois países,
conhecida como Mar da China Oriental. Embora desabitadas, há interesse dos dois países pelas suas
posições estratégicas e possíveis reservas de petróleo. Em 2013, houve uma crise diplomática nas
relações sino-japonesas porque o governo de Tóquio comprou parte das ilhas Senkaku de um
proprietário particular.

73
Além disso, os livros japoneses de história também geram muita tensão entre Japão e China,
visto que os chineses os acusam de não relatar a realidade das ações dos militares japoneses durante
a II Guerra Mundial. Divergências se refletem também entre a população: em 2005, houve
manifestações em diversas localidades da China, como Xangai e Hong Kong contra a decisão do
governo japonês de promover uma revisão dos livros didáticos de história para amenizar as
atrocidades cometidas pelo Japão durante a ocupação da China (1931-1945).
Em 2005, as manifestações antijaponesas da população chinesa tiveram uma grande escala e
ocorreram em praticamente todos os fins de semana durante o período de primavera. Nessas
ocasiões, houve também manifestações de oposição ao Japão se tornar um membro permanente do
Conselho de Segurança das Nações Unidas. Esses acontecimentos envolvendo a população chinesa
passaram a preocupar ainda mais o governo do Japão pelo fato de já terem resultado em retaliações
contra empresas, carros e restaurantes japoneses em 2012 (MCCURRY, 2012).
Ainda com relação à história da II Guerra Mundial, a China tem feito manifestações contrárias
às visitas de primeiros-ministros ao templo de Yasukuni. Nesse, segundo Tonooka (2020),

O governo japonês decidiu consagrar todos aqueles que morreram nas


lutas para a restauração do regime imperial (Restauração Meiji) [e] sob
administração dos militares desde a sua criação, o Templo Yasukuni passou
a ser utilizado crescentemente como um símbolo de patriotismo a partir
dos anos 1930.

Nesse templo estão também os restos mortais de soldados considerados criminosos de guerra
e, por isso, chineses e coreanos protestam contra visitas a ele, contudo tanto o primeiro-ministro
Koizumi como o primeiro-ministro Abe fizeram visitas durante os seus mandatos, defendendo que
são decisões de foro pessoal e apolíticas.
Esses temas são de importante impacto nas relações bilaterais, mas, como apontou Bull (2002),
as disputas podem ocorrer também de forma indireta. No caso do Japão e da China, o espaço do
Sudeste Asiático é uma área em que se identifica essa concorrência. Pelo lado chinês, há o projeto que
teve grande repercussão internacional, conhecido como a Nova Rota da Seda – designada como
iniciativa One Belt and One Road (Obor), apresentada pelo presidente chinês Xi Jinping em 2013. O
projeto contempla a construção de infraestrutura de ligação entre os países do Pacífico Asiático, mas
também em direção à Europa e à África, visando à maior cooperação com a China.
Porém, sobre essa mesma região do Leste Asiático, o ministro das Relações do Negócios
Estrangeiros do Japão, Taro Aso, anunciou, em novembro de 2006, o Arco da Liberdade e
Prosperidade. No seu discurso, ele afirmou que essa era uma nova diplomacia orientada para os
valores da democracia, da liberdade, dos direitos humanos, do Estado de direito e da economia de
mercado, enfatizando a importância do alinhamento das democracias emergentes na orla externa
do continente euroasiático (TOGO, 2010, p. 418). Portanto observa-se que há uma sobreposição
geográfica dos projetos.

74
Mais recentemente, o governo japonês tornou público o plano de investimentos em
corredores econômicos para melhorar a conectividade no Sudeste da Ásia (MOFA, 2017). Essa
iniciativa envolve infraestruturas de transporte como estradas e pontes, mas também cooperação
técnica que permite a transmissão da tecnologia japonesa para a implantação de sistemas
alfandegários, fortalecendo as capacidades de manutenção de estradas.

Figura 2 – Iniciativas de conectividade do Japão

Fonte: MOFA. Japan’s international cooperation. White paper on development cooperation 2017.
Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/files/000406627.pdf>. Acesso em: 20 maio 2021.

Conclusão
O Japão deu uma grande contribuição para o desenvolvimento econômico das nações do
Leste Asiático, chegando a liderar econômica e tecnologicamente os países da região, no que ficou
conhecido como modelo do voo dos gansos. Nesse processo, foram formadas cadeias de produção
e suprimentos que adensaram as relações intrarregionais e aprofundaram a interdependência
econômica do Japão com os seus vizinhos.
Esse intercâmbio de interesse mútuo e ganhos coletivos permitiu que as divergências políticas
e de outros interesses fossem suprimidas pelo menos até o final do século XX. Mas as relações entre
os países dessa região depois da Guerra Fria e, em particular no século XXI, passaram por grandes
transformações.

75
As posições econômicas relativas se alteraram, a China supera o Japão com a segunda maior
economia mundial, e o setor privado do Japão passa a sofrer concorrências de um número cada vez
maior de países. A liderança japonesa é abalada e, com isso, o governo de Tóquio passa a buscar
iniciativas que recuperem posições da sua liderança internacional. Para isso, conta com o apoio dos
EUA, que tem interesse em conter a ascensão chinesa.
Com isso, o que se observa, passadas as duas primeiras décadas do século XXI, é um
acirramento pela concorrência econômica, política e estratégica na Ásia, em que Xi Jinping anuncia
o desejo de recolocar a China no seu devido lugar de destaque global. Já ao Japão, há o esforço em
recuperar a sua posição de liderança, pelo menos na ordem regional e, por último, com relação aos
EUA, que, apesar de não ser asiático, vê também a sua posição global sob risco e procura fortalecer
o seu parceiro estratégico, o Japão, contra a ameaça chinesa.
Em resumo, o mundo assiste a relações paradoxais entre países que se relacionam tanto como
parceiros (econômicos) quanto como rivais (políticos), e o futuro será condicionado pelas
performances econômicas e nacionalismos de cada um.

76
MÓDULO IV – UM NOVO JAPÃO PARA UM
MUNDO NOVO?

Este último módulo será destinado a discutir o papel do Japão nas relações internacionais do
século XXI, considerando as transformações que vieram ocorrendo desde o final da Guerra Fria
tanto no âmbito interno como externo ao Japão. As mudanças sociais, econômicas e políticas no
país resultaram em incertezas sobre quais impactos poderão trazer ao país e como elas influenciarão
a política externas japonesa. De qualquer forma, nota-se que há demandas, necessidades e sinais de
renovação na forma da inserção internacional japonesa no mundo contemporâneo.

Qual é o papel do Japão no século XXI?


O Japão é um país marcado pela combinação entre o tradicional e o moderno, é onde se pode
experimentar uma milenar cerimônia do chá com saborosos docinhos e, logo em seguida, ser
atendido por um robô dinossauro recepcionista. Talvez isso seja a razão da curiosa situação do país
no século XXI.
Em relação à economia, há análises que são pessimistas e céticas no que se refere ao
crescimento futuro do Japão, embasadas nas décadas de baixo crescimento e nos problemas atuais.
Por outro lado, há aqueles que fazem uma avaliação positiva. Esses enxergam o potencial do país e
acreditam no poder de recuperação já demonstrado no passado, uma vez que o Japão é a terceira
maior economia mundial que tem buscado renovação. Desse modo, serão apresentados nesta
unidade alguns dos elementos que impactam a economia e influenciam cada uma dessas posições.
Perspectiva cética
Após quatro décadas de rápido crescimento, a economia japonesa tropeçou na década de
1990, mas o que aconteceu com os fatores que transformaram o Japão em um país rico e na fronteira
tecnológica mundial? Onde estão as instituições econômicas do país que eram admiradas pelo
sucesso, na segunda metade do século XX, e que foram projetadas para promover a competitividade
e o rápido desenvolvimento do país? Será o Japão capaz de se adaptar ao novo ambiente econômico
do século XXI? Aparentemente, a remodelagem das instituições públicas e privadas do Japão está
ocorrendo muito lentamente para enfrentar a realidade do envelhecimento da população, das
rápidas mudanças tecnológicas e da crescente competição global.
Entre os vários tópicos que poderiam ser elencados abaixo, citam-se alguns que foram
abordados anteriormente, e adicionam-se outros que têm gerado maiores preocupações, como
fatores de impactos negativos sobre o status e a inserção internacional do Japão.
Uma das preocupações que mais chamam atenção é o baixo desempenho do PIB que o país
vem apresentando há décadas, relacionado ao baixo consumo interno e à redução da competividade
no mercado internacional. O resultado desses fatores se vê refletido na diminuição da presença de
empresas japonesas entre as maiores multinacionais no mundo (ver Tabela 3).
O envelhecimento da sociedade e a falta de mão de obra (ver módulo I) são também elementos
apontados como comprometedores. Além disso, há preocupação com os jovens no Japão, aqueles
com menos de 24 anos de idade, pois o desemprego nessa faixa etária é mais de 50% superior à média
nacional. Outro dado curioso é que, apesar da falta de mão de obra, que tem sido suprida com
trabalhadores estrangeiros, o total de horas trabalhadas no Japão tem caído desde 1970, ano em que
se deu início à medição. Do final da Guerra Fria, em 1989, a 2020, a quantidade de horas trabalhadas
passou de 2.070 horas por ano para 1.598 horas por ano, representado uma queda de 22%.
Outra área de preocupação é o endividamento público, pois atualmente o Japão possui uma
relação dívida/PIB de 234%. Entre os países da OCDE, esse índice é inferior somente ao da Grécia,
de 236%. A elevação do endividamento fez com que o governo elevasse o imposto de consumo já
três vezes, em 1997, quando a alíquota passou de 3% para 5%, depois novamente em 2014, quando
elevou para 8% e, em 2019 foi majorado para 10%. Embora seja positivo para combater o
crescimento da dívida, impacta negativamente o consumo, porque torna os produtos mais caros.
Outra participação do setor público na economia que tem chamado a atenção são as compras
de fundos indexados às ações pelo Banco Central do Japão (BOJ), pois essa política se tornou a
grande “baleia” no mercado. O BOJ é atualmente o detentor de uma grande fatia das ações listadas
no mercado de ações de Tóquio, por exemplo, em abril de 2020, estimava-se que mais de 80% das
Exchange Traded Fund (ETFs). Como consequência, o desempenho dos preços desses ativos acabou
sendo muito influenciado pelas aquisições diárias do BOJ, e não necessariamente pelos
fundamentos das empresas.

78
Uma dificuldade econômica crescente relacionada ao envelhecimento e à diminuição da
população é a sustentabilidade do sistema público de pensões, pois há cada vez menos trabalhadores
contribuindo para sustentar as aposentadorias. Em 2000, o quociente entre a população total de 15
a 64 anos de idade sobre os que possuem 65 ou mais era de 3,8; isso significava que há quase quatro
pessoas contribuindo para cada aposentado, embora em 2020 essa relação tenha melhorado e
passado a ser de duas pessoas por aposentado.
Por fim, não é possível desconsiderar os impactos da concorrência da China no campo da
produção e da comercialização de manufaturados em geral, já que os produtos chineses avançam
pelo mundo. Com isso a China substitui o Japão como principal parceiro de comércio exterior em
várias economias no mundo e, em particular, nas asiáticas. Isso conduziu a uma perda de
participação do Japão nas exportações totais do comércio internacional.

Gráfico 12 – Evolução da participação (%) dos sete maiores exportadores de manufaturados

25,0%
China Alemanha Estados Unidos
Japão Hong Kong Paises Baixos
20,0% Coreia do Sul 18,2%

15,0%

10,2%
10,0% 12,5% 8,1%
4,8%
5,0% 3,9%
3,8
0,0% 3,7%
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019

Fonte: WORLD TRADE ORGANIZATION. Merchandise exports by product group: annual (million US dollar).
Disponível em: <https://data.wto.org>. Acesso em: 29 maio 2021.

No entanto, a concorrência não se resume só a isso. Como já foi apontado, o desenvolvimento


econômico dos vizinhos do Japão fortaleceu não só a qualidade dos seus produtos, mas a sua
capacidade de investimentos em áreas tecnológicas. Em 2015, o governo de Pequim divulgou o
plano Made in China 2025, em que anunciou que investiria bilhões de dólares para transformar o
país em uma potência industrial e tecnológica. Foram destacados 10 segmentos industriais de alta
tecnologia com o objetivo de, até 2025, tornar o país autossuficiente nessas indústrias e, até 2049,
ocupar uma posição dominante nos mercados globais envolvendo veículos de energia renovável,
tecnologia da informação (TI), bem como telecomunicações de última geração, como a robótica
avançada e a inteligência artificial (MCBRIDE; CHATZKY, 2019).

79
Para os céticos, a preocupação agora é se o Japão conseguirá manter uma posição de destaque
diante da concorrência internacional e dos países vizinhos, que está chegando às mesmas áreas que
o país elegera para se manter na liderança, isto é, de produtos de alto valor agregado e de tecnologia.

Perspectiva otimista
O Japão do século XX chegou à condição de potência global apoiado no seu crescimento e
no seu poder econômico, fator que lhe deu a possibilidade de desenvolver uma liderança no campo
tecnológico e gerar uma admiração mundial a partir dos anos 1960. As Olímpiadas de 1964,
realizadas em Tóquio, serviram para mostrar ao mundo o novo Japão e os seus avanços econômicos
e tecnológicos.

Quando a capital japonesa recebeu os Jogos Olímpicos pela primeira vez.


Naquela época, o Japão se recuperava dos danos da Segunda Guerra
Mundial, e um grande evento multiesportivo acabou sendo uma
oportunidade para o país se reerguer e exibir uma identidade renovada para
o mundo (JAPAN HOUSE, 2021).

As transmissões por satélite dos jogos ao vivo para outros continentes, como para a América
do Norte e a Europa, serviram para comunicar ao mundo a nova realidade japonesa. A edição das
Olimpíadas de Tóquio, de 1964, foi a primeira a usar computadores para calcular as estatísticas dos
jogos e apresentar os atletas em câmera lenta. Entre as construções que encantaram o mundo
estavam a Tokyo Tower (Torre de Tóquio) e o trem-bala.
Qual é o Japão do século XXI? Para as Olimpíadas de Tóquio 2021, foram preparadas
novamente algumas novidades que já estão sendo aplicadas no país. Há um pano de fundo
novamente de mostrar a revitalização do Japão ou, como está sendo apresentado oficialmente, são
as “Olímpiadas da Recuperação” (RECONSTRUCTION AGENCY, s.d.). A inspiração para esse
nome foi a Tríplice Tragédia de Fukushima, ocorrida em 11 de março de 2011, em que mais de 18
mil pessoas foram mortas, e mais de 160 pessoas tiveram de deixar as suas casas na região.
Justifica-se utilizar a cidade de Fukushima porque esta reflete a grande capacidade de
resiliência e de soerguimento do povo japonês. Mesmo assim, a recuperação não é espontânea, pois
exige iniciativa e planejamento. No caso do Japão, depois do estouro da bolha econômica, mais de
duas décadas de baixo crescimento e perda de posições na arena internacional em diversas áreas,
como a econômica, a política, a tecnológica e a inovação, para citar algumas.
As áreas de ciência e tecnologia têm sido um foco de atenção, identificado e apontado no
relatório A vision for Japan in 21th Century (2006, p. 3), apresentado pelo Institute for International
Policies Studies e, fundado, pelo ex-primeiro-ministro Yasuhiro Nakasone, que já apontava, entre
nove tópicos importantes para a visão nacional japonesa, a necessidade investimentos estratégicos
em ciência e tecnologia para a garantia da segurança e da prosperidade do país.

80
Nesse mesmo ano de 2006, o primeiro-ministro Abe solicitou um trabalho de formulação de
iniciativas estratégicas de longo prazo para o Japão, chamado de Inovação 25, que tinha como meta
integrar e promover “inovação em ciência e tecnologia”, “inovação em sistemas sociais” e “inovação
em recursos humanos” até o ano de 2025 (KANTEI, 2007). Outra iniciativa são os planos
quinquenais de ciência e tecnologia. Atualmente, está em desenvolvimento o 5º Plano Básico de
Ciência e Tecnologia (5th Science and Technology Basic Plan), lançado em 2016 e que será finalizado
até 2021.
Como resultados concretos, de acordo com a Organização Mundial de Propriedade
Intelectual, estima-se que, dos 14,9 milhões de patentes que estavam em vigor em todo o mundo
em 2019, os EUA eram responsáveis por 3,1 milhões, seguido da China com 2,7 milhões e, em
terceiro, o Japão com 2,1 milhões de patentes (WIPO, 2020, p. 9).
Também no 5º Plano Básico de Ciência e Tecnologia, lançado no mesmo ano que a discussão
da Indústria 4.0 ganhou o mundo após a apresentação de Klaus Schwab, criador do Fórum Econômico
Mundial, sobre a Quarta Revolução Industrial, o Japão lançou a proposta da Sociedade 5.0:

Uma sociedade centrada no ser humano que equilibra o avanço econômico


com a resolução de problemas sociais por um sistema que integra o
ciberespaço e o espaço físico, (...) sucessora das sociedades de caça
(Sociedade 1.0), agrícola (Sociedade 2.0), industrial (Sociedade 3.0) e da
informação (Sociedade 4.0) (KANTEI, 2016, tradução nossa).

O 6º Plano Básico de Ciência e Tecnologia já está disponível no site do gabinete do primeiro-


ministro, o qual informa que estão garantidos pelo governo cerca de 30 trilhões de ienes – cerca de
US$ 273,0 bilhões – em investimentos em pesquisa e desenvolvimento para os próximos cinco
anos. Ademais, os setores público e privado também investirão conjuntamente cerca de 120 trilhões
de ienes – cerca de US$ 1.092,0 bilhões – em pesquisa e desenvolvimento.
Há expectativa de que esses investimentos recentes gerem novas oportunidades de
desenvolvimento econômico no Japão.

O governo aposta que a Sociedade 5.0 oferecerá ao Japão os meios para


superar sua estagnação econômica crônica. As empresas japonesas reagiram
ao encolhimento do mercado interno adquirindo empresas no exterior
para “comprar tempo e trabalho”. Como resultado disso, os investimentos
estão deixando o Japão, esvaziando a base industrial do país. Mesmo que
até agora não tenha assumido a liderança nas indústrias digitais, o país
pode ser capaz de aproveitar suas forças tradicionais em engenharia
mecânica e de materiais para desenvolver sistemas ciberfísicos avançados.
Ao introduzir ativamente a IA nos locais de trabalho, espera-se que o

81
despovoamento e o envelhecimento deixem de representar desvantagens
em uma economia baseada menos no trabalho intensivo (UNESCO,
2021, p. 11).

Entre os avanços nessa integração da tecnologia com os seres humanos, há as pesquisas


relacionadas ao uso de robôs que possam ser comandados por sinais neurais. A menção a esse sistema
de exoesqueleto motorizado, conhecido por Robot Suit HAL2 (Hybrid Assistive Limb) e
desenvolvido pelo professor Yoshiyuki Sankai, da Universidade de Tsukuba, foi colocada em uso
em ambientes médicos e de bem-estar social para melhorar, ajudar e ampliar o funcionamento físico
das pessoas, segundo relatório do Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia
(MEXT, 2016, p. 104).
Esses investimentos em inovação, em particular na área de robótica, são uma das esferas em
que o Japão tem promovido iniciativas, mas há um interesse mais amplo: o país se empenha em
atrair pesquisadores de todo o mundo e, para isso, em 2019, o governo lançou o programa
Moonshot, que visa apoiar a pesquisa e o desenvolvimento (P&D) sem que tenham garantia de
sucesso, mas que tenham características de alto impacto em caso de sucesso na indústria e na
sociedade. É, portanto, voltado ao desenvolvimento de tecnologias disruptivas.
Isso pode ser um indicador de que haja um aumento na percepção da necessidade e da
disposição ao risco, algo que é apontado como contrário à cultura japonesa. Avanços nessa área
passam necessariamente pela mudança na formação dos profissionais japoneses e na cultura das
empresas, onde aparecem também sinalizações nesse sentido:

As universidades desenvolveram laços mais estreitos com o setor privado,


o que se reflete no número crescente de startups universitárias ao longo de
2013-2018. Esse avanço segue os esforços, em curso desde 2004, para
reformar o sistema de ensino superior, que levaram à semiprivatização das
universidades nacionais (UNESCO, 2021, p. 43).

Atualmente, as startups têm sido um elemento importante na contribuição de inovações em


vários países, portanto apresentam vantagens sobre as grandes empresas por terem comunicação
mais ágil, maior flexibilidade e cultura de negócios menos rígida, fatores que têm contribuído para
impulsionar o desenvolvimento de novas tecnologias. Avalia-se que o Japão ainda tem um potencial
muito grande a ser explorado nessa área, pois, em julho de 2021, o país estava em apenas 11ª posição
como origem das unicórnios, que são startups privadas avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

82
Tabela 10 – Classificação dos 11 países com maior número de unicórnios

país número de unicórnios

1 EUA 378

2 China 155

3 Índia 34

4 Reino Unido 31

5 Israel 17

6 França 16

7 Alemanha 16

8 Brasil 12

9 Canadá 12

10 Coreia do Sul 10

11 Japão 6

Fonte: CBINSIGHTS. The complete list of unicorn companies.


Disponível em: <https://www.cbinsights.com/research-unicorn-companies>.
Acesso em: 1º jul. 2021.

Essa mudança na cultura dos negócios é almejada em outras áreas de gestão, portanto a
destituição de Osamu Nagayama, presidente do conselho da Toshiba Corp, em junho de 2021,
pode ser um sinal nesse sentido. A decisão foi tomada após contestações sobre a governança da
empresa pela sua maior acionista, a Effissimo Capital Management Pte, e a investigação
independente de 139 páginas, que indicou um suposto conluio da administração da Toshiba com
altos funcionários do governo para influenciar a seleção do conselho de 2020.
Avaliado como uma possível indicação de que os líderes japoneses estão dispostos a limpar as
práticas de negócios fossilizadas que emperram a economia, como o Amakudari. Essa prática foi
avaliada como algo positivo no passado, mas, atualmente, é tido como um dos fatores de lentidão
para a renovação da competividade das empresas. Em outras palavras, em um momento em que a
rapidez do progresso tecnológico faz com que os ciclos de vida de produtos sejam radicalmente
encurtados, e oportunidades de negócios emerjam e desapareçam rapidamente, os tradicionais e
demorados processos de tomada de decisão das empresas japonesas parecem não ser mais
adequados, pois as impedem de acompanhar o que está acontecendo no mercado.

83
Portanto mudanças que indiquem decisões de investimento em inovação, maior disposição
ao risco e mudanças na gestão que permitam as empresas japonesas tomarem decisões no ritmo
exigido pelos mercados, são vistas, eventualmente, contra a cultura japonesa, mas são sinais de
mudanças importantes e necessárias à prosperidade das empresas e da própria economia do país.
No relatório do The Global Competitiveness Report Special Edition (2020, p. 40) do World
Economic Forum, é comparada a disposição ao risco de empresários de sete países. Os empresários
do Japão foram os que apresentaram menor disposição ao risco, que pela ordem da maior disposição
para menor foram: EAU, China, Alemanha, Índia, França, Rússia e Japão.

Nacionalismo
Com o fim da Guerra Fria, projetou-se uma transformação do papel do Japão no mundo,
mas o colapso da “bolha” econômica e as dificuldades que se sucederam produziram um sentimento
de mal-estar. Isso ocorreu porque, na década de 1980, o país foi daquele que se projetava uma
liderança global para uma situação, na década de 1990, de estagnação econômica, instabilidade
política e de não fortalecimento ou ascensão de status internacional.
Ainda que muitas vezes nas relações internacionais as referências sejam feitas aos interesses de
países, deve-se recordar que as nações são entes políticos, constituídas de sociedades, quer dizer,
pessoas que possuem emoções e vontades que serão expressas nas políticas dos governos. Portanto,
as resoluções de alguma forma tendem a refletir os interesses comuns ou predominantes. Por isso,
ao analisar a política externa de um país é possível buscar uma compreensão relacionada ao conjunto
das vontades particulares.
O autor Axel Honneth (2010, p. 140) vai além, afirmando que os políticos não podem agir
à revelia da população:

Esses atores não podem cumprir a função a eles atribuída, de


autoafirmação do Estado através da política externa, sem levar
permanentemente em consideração se o modo de cumprimento dessa
função está em consonância com as prováveis expectativas da população; o
modo como a segurança política, o volume de poder e o bem-estar
econômico do respectivo Estado são protegidos em relação ao exterior
precisa ser submetido à esperada concordância dos afetados já devido à
demonstração de sua capacidade funcional.

No caso do Japão, a situação de um certo viés de nacionalismo entre os políticos no pós-


Guerra Fria, poderia ser vinculada, conforme mencionado ao longo do trabalho, à perda de posições
internacionais, pois:

84
Pelo fato de que os representantes políticos, por causa da busca por
legitimidade, precisam agir sempre como intérpretes das experiências e
desejos de sua própria população, todos os encontros e relações entre
Estados já ocorrem sob a pressão moral de um conflito por
reconhecimento: questões desse tipo – a necessidade de uma autoimagem
na esfera pública mundial, o afastamento de uma vergonha ou humilhação,
o desejo de reparar uma injustiça estatal – determinam a perseguição dos
interesses na política externa de tal modo, que deles não podem mais ser
analiticamente separados (HONNETH, 2010, p. 143).

O nacionalismo japonês, portanto, volta a ser identificado, expresso em vários políticos no


pós-Guerra Fria e, no caso dos primeiros-ministros, tanto em Koizumi como em Abe, que foram
destaques nesse período também possuem características nacionalistas.
Contudo Ernani Oda (2000) aponta que já havia manifestações nacionalistas antes dos
problemas do final século XX: denominados de revisionistas, eles afirmam que “apesar do notável
crescimento econômico alcançado pelo Japão após a guerra, culturalmente haveria ainda uma
suposta falta de autoestima na sociedade japonesa que impediria a plena realização de seu potencial”.
Além disso, contestam o art. 9º da Constituição, que prevê a renúncia à guerra, e defendem
a importância e a liberdade de visitas ao Templo Yasukuni. Durante a Guerra Fria, ações e políticos
moderados prevaleciam porque havia pressões para que o Japão, a China e a Coreia do Sul evitassem
uma escalada de conflitos e se concentrassem na ameaça comum: a ex-URSS (ODA, 2000).
Com o final da Guerra Fria e o aumento de demandas por uma maior participação nos
assuntos internacionais, políticos nacionalistas passaram a defender a necessidade de recolocar o
Japão na situação de “país normal”. Isso significava reformar a Constituição para eliminar as
restrições do art. 9º, pois sem isso não seria possível atender às exigências internacionais por maior
autonomia e autoridade nas questões globais.
Um político importante nesse debate foi Ozawa Ichiro, que, desde a década de 1990, pelo
menos, defende a volta do Japão à condição de um “Estado normal”, sem restrições à atuação
militar requerendo, para isso, a inclusão de uma cláusula adicionada ao art. 9º da Constituição,
que permite às forças militares japonesas participar de operações de manutenção da paz da ONU
(DESMOND, p. 131).
Fora da Dieta, na década de 1990, identifica-se também na sociedade uma reorganização
da direita nacionalista a partir de meados da década de 1990, já que surge um novo eleitorado de
massas defensores das causas nacionalistas entre professores, alunos e na classe média em geral.
São formados, entre 1995 e 1996, o Grupo de Estudo da Visão Liberal da História e a Sociedade
para a Fabricação de Novos Livros Escolares de História, com o objetivo de fazer campanha para
inculcar um sentimento de orgulho na história do Japão e, particularmente, para eliminar todas
as referências às “mulheres de conforto” dos textos de história do ensino médio
(MACCORMACK, 2000, p. 251).

85
Oda (1998, p. 16) reforça o argumento de que os problemas internos vividos pelo Japão e a
trajetória da perda de status internacional contribuíam para o nacionalismo japonês:

A estagnação da economia, o aumento no nível de desemprego e a


instabilidade política decorrente da crise teriam ajudado a difundir na
população uma condição de insegurança, e o discurso inflamado do
nacionalismo, ao pregar a retomada de prestígio do Japão, seria um meio
de obter certo conforto emocional. O nacionalismo funcionaria no fundo
como um mecanismo de compensação diante do relativo declínio da
sociedade japonesa.

Paralelamente a essas situações que já vinham acontecendo, o foguete norte-coreano


Taepodong-1, que sobrevoou o território japonês em agosto de 1998, contribuiu para influenciar
as mudanças de percepção de segurança pela população e as reações do Japão. Um exemplo foi:

Em março de 1999, as Forças de Autodefesa Marítima (MSDF)


engajaram-se pela primeira vez em sua história no exercício unilateral de
força em nome do Estado japonês – contra os chamados fushinsen, os
intrusos “navios misteriosos” que cruzaram as águas japonesas e
desapareceram na direção da Coreia do Norte. Embora a ação constituísse
uma aparente violação da lei, denunciando quando tal força poderia ser
legitimamente usada, mais de 80% da população aprovaram
(MACCORMACK, 2000, p. 256, tradução nossa).

Outra decisão marcada por simbolismos foi a aprovação, em 1999, da lei que estabeleceu o
Hinomaru e Kimigayo como bandeira e hino nacional. Essa decisão pode parecer algo simples, mas
foi controversa e questionada pelos países vizinhos ao Japão, porque são associados ao imperialismo,
à guerra e às agressões japonesas da II Guerra Mundial.
Essas atitudes apontam para uma preocupação direta ou indireta com as ações e a imagem do
país enquanto comunidade política, relacionando tanto a capacidade militar como o prestígio
internacional, a organização do seu sistema educacional, bem como o comportamento dos seus
chefes de governo (ODA, 2018, p. 14).
A decisão do primeiro-ministro Koizumi de visitar o Templo Yasukuni durante o seu
mandato, mesmo sob a manifestação de reprovação de nações vizinhas como Coreia do Sul e China,
foi simbólica, nesse ambiente de comportamento nacionalista, agora já no século XXI.
Além disso, em dezembro de 2001, mesmo ano da posse de Koizumi, houve um confronto
entre a guarda costeira do Japão e um navio apontado como espião norte-coreano que acabou sendo
afundado (CNN, 2001), contribuindo ainda mais para a percepção de ameaça à segurança do país.

86
Mais do que esse episódio, o que passa a fazer parte de maior preocupação do Japão são ataques
com mísseis norte-coreanos, ao ponto de, em meados de fevereiro de 2003, o ministro da Defesa
Shigueru Shiba declarar que o Japão poderia fazer uso de um ataque preventivo (MATHEWS,
2001, p. 75).
Os aspectos da segurança são atualmente os que têm chamado deveras atenção, mas David
Unger (1994), já em meados da década de 1990, elencou alguns fatores que poderiam contribuir
para um nacionalismo no Japão:

 ameaça aos recursos naturais que são essenciais à economia japonesa e


precisam ser importadas, como o petróleo;
 ameaça às facilidades de produção ao Japão, as quais se expandiram ao
longo do Sudeste Asiático na década passada em consequência da
vertiginosa valorização do iene;
 desordenada e conflituosa sucessão da China;
 disputa com a China pela hegemonia regional;
 corrida armamentista, em particular na península coreana;
 processo de unificação desordenado das Coreias;
 colapso do controle político e militar russo no leste da Sibéria, ou uma
tentativa forçada pelos russos nacionalistas de reafirmar tal controle, e
 vácuo estratégico decorrente da escolha americana por se manter fora
de conflitos militares na Ásia (UNGER, 1994, p. 40, tradução nossa).

Desses fatores, pelo menos quatro devem ser considerados no momento: as ameaças ao acesso
aos recursos naturais e às facilidades de produção; a disputa com a China pela hegemonia regional;
e, na península coreana, as preocupações com a Coreia do Norte.
Como tem sido mostrado neste trabalho, o crescimento econômico da China aumentou as
suas relações com os países do Sudeste Asiático, substituindo o Japão como principal parceiro dessas
economias. Portanto a disputa com a China está vinculada aos receios sobre eventuais impactos
negativos que possam ser causados, como o acesso aos recursos naturais e às facilidades de produção
integradas pelo projeto da Nova Rota da Seda e, também, pela política de construção das ilhas
artificias no Mar do Sul da China. Nesse caso, há preocupação com as restrições que a política
chinesa possa infligir à navegação na região, impondo, dessa forma, significativos impactos
logísticos ao Japão.
Com relação à Coreia do Norte, a situação é mais complexa. Existem questões históricas com
o Japão ainda não resolvidas, como o período de ocupação da península pelos japoneses e o
sequestro de cidadãos japoneses pelos norte-coreanos que tensionam as relações bilaterais. Contudo
há também a rivalidade entre Pyongyang e Washington, que cresceu principalmente depois que
Kim Jong-Un assumiu a liderança política no país em 2012.

87
De acordo com David Maxwell (2005), esse foi um dos fatores da aceleração dos
investimentos em mísseis e armas nucleares, mas, ao fazer isso, também aumentaram a percepção
de ameaça pelos japoneses.

Entende-se que a República Democrática Popular da Coreia busca


fortalecer-se acreditando que precisava ter armas nucleares para usar como
dissuasão contra os EUA. No mínimo, uma ameaça de capacidade nuclear
é uma ferramenta útil para forçar a comunidade internacional para obter
concessões políticas e econômicas, o que acompanha bem a ideologia do
regime. A República Democrática Popular da Coreia diz ao seu povo que os
alimentos que estão recebendo da comunidade internacional são um
“tributo” ao Regime da Família Kim porque as suas capacidades militares
são muito temidas, o que ajusta perfeitamente à sua política “militar
primeiro” (MAXWELL, 2005, p. 66, tradução nossa).

Em relação à segurança do Japão, o desenvolvimento da capacidade militar da Coreia do


Norte é uma preocupação real, ao ponto de o secretário-chefe do gabinete, Yassuo Fukuda, em
meados de 2002, afirmar publicamente que a constituição não impediria o Japão de adquirir armas
nucleares (MATHEWS, 2004, p. 53). Caso o governo japonês venha buscar ampliar a sua
capacidade de defesa por meio dessas armas, não seria a primeira vez que a constituição seria
“reinterpretada”.
Percebe-se que o país se mantém tímido nas questões militares pelas resistências do governo
e da população sobre as suas ações militares, mantendo-se fiel ao que ficou conhecido como
Doutrina Yoshida, porém esses receios estão enfraquecendo. Além da leitura dos políticos, também
a população e a opinião têm variado.
De acordo com o levantamento do jornal de grande circulação Asahi Shinbum, feito desde o
segundo mandato do primeiro-ministro Abe, em 2012, as posições contrárias à reforma da
Constituição subiram até 2016, mas desde então têm reduzido, enquanto as favoráveis à reforma
crescem. Ainda assim, na pesquisa de maio de 2021, os favoráveis à reforma, com 45% dos votos,
superaram os contrários à revisão do art. 9º da Constituição, com 44% dos votos (ISOBE, 2021).
Já uma outra pesquisa feita pela agência Kyodo News, em maio de 2021, apontou um número ainda
maior de apoio à alteração: 51% dos entrevistados foram favoráveis e 45% se posicionaram contra.
Com isso, o artigo sinaliza a possibilidade de a Dieta aprovar, ainda em 2021, a mudança
constitucional (KYODO NEWS, 2021).
Percebe-se que mudanças vêm ocorrendo no Japão, até porque os indivíduos que sofreram as
tristes experiências da II Guerra Mundial estão diminuindo. Por exemplo, Abe foi o primeiro
premiê nascido depois da II Guerra Mundial.

88
Essas movimentações geram preocupações, como a manifestada por Gavan McCormack
(2000) nas conclusões do seu artigo.

Os processos do final do século no Japão tratados neste artigo são


complexos, mas é difícil resistir à conclusão de que os problemas
permanecem sem solução no país desde o início do novo século, e que as
medidas que estão sendo adotadas para enfrentá-los são revanchistas, no
sentido de reviver acriticamente as fórmulas do Estado japonês imperial
anterior, e contraditório, no sentido de fundir o status de dependente nas
relações internacionais com a reafirmação dos símbolos e mitos de um
Japão orgulhoso, puro e autônomo (MCCORMACK, 2000, p. 263,
tradução nossa).

Contudo entende-se que existem ainda laços importantes do Japão com os países da região,
incluindo a China e que, portanto, ainda que os sentimentos de insegurança na população e os desejos
dos políticos de revitalizar a posição do país no mundo gerem sinais que se aproximam de um
nacionalismo, 2/3 da população defendem mais cooperação econômica e menos gastos com defesa.

Talvez o mais importante, o povo japonês continua a acreditar que o


relacionamento com a China é importante e vale a pena mantê-lo. Muitos
japoneses afirmam que o seu país não tem escolha a não ser encontrar uma
maneira de trabalhar com o seu vizinho gigante e parceiro econômico,
apesar dos riscos genuínos que as ações chinesas representam. A última
pesquisa da Genron NPO sobre as atitudes japonesas e chinesas mostra que,
apesar de quase 90% dos japoneses relatarem atitudes negativas sobre a
China, mais de 2/3 dos japoneses veem a cooperação econômica com a
China como importante para o futuro do seu país. Outras pesquisas
encontraram pouco apoio para maiores gastos com defesa ou para um
papel mais expansivo para as Forças de Autodefesa do Japão (HARRIS,
2021, tradução nossa).

De fato, neste momento em que ainda há muitas incertezas sobre os resultados da


concorrência sino-americana, fica difícil ao Japão prescindir da parceria com a China, grande
mercado para os produtos japoneses que, nos últimos anos, tornou-se também importante para o
setor de turismo do Japão, superando qualquer outro país, pelo menos desde 2015.

89
Tabela 11 – Cinco principais países de origem de turistas ao Japão (2020)

país de origem 2020 %

China 1.069.256 26,0%

Taiwan 694.476 16,9%

Coreia do Sul 487.939 11,9%

Hong Kong 345.801 8,4%

Tailândia 219.830 5,3%

total 4.115.828 100,0%

Fonte: JAPAN TOURISM. Japan tourism statistics. Breakdown by country/area,


Disponível em: <https://statistics.jnto.go.jp/en/graph/#graph--inbound--travelers—transition>.
Acesso em: 29 maio 2021 (elaboração nossa)

Portanto observa-se que os esforços do Japão vão no sentido de se tornar um país “normal”,
eventualmente estabelecendo uma relação de parceria menos assimétrica e menos seguidora dos
EUA no século XXI. São objetivos diversos do nacionalismo do período da primeira metade do
século XX, pois ao Japão interessa um ambiente pacífico, que abra oportunidades para a
revitalização da sua economia.
Além disso, a população de cidadãos chineses representa mais de 25% dos estrangeiros no Japão
e respondem por quase 40% de todos os estudantes provenientes do exterior. Curiosamente, todas
essas tendências se aceleraram com o primeiro-ministro Abe, que, embora identificado como
nacionalista, abriu a possibilidade de intensificação dessas relações, antes protegida (HARRIS, 2021).

Japão e o pacifismo proativo


Com o fim da Guerra Fria, a estratégia diplomática do Japão se transformou, passando a
promover valores universais como uma forma de responder às demandas para a ampliação do seu
papel no sistema internacional e assim também justificar a sua aliança com os EUA (ZAKOWSKI,
et al., 2018, p. 119). Isso ocorreu porque a época do “voo dos gansos” já havia ficado para trás, e o
país já não tinha mais a folgada e isolada liderança econômica e tecnológica na Ásia, além disso, as
políticas baseadas em valores poderiam ter uma abrangência global (SOEYA, 2013).

90
Democracia e direitos humanos passaram a ter lugar central na política externa japonesa, em
particular na orientação dos fluxos de AOD. Uma política baseada no princípio de valores era a base
para um possível caminho de maior atuação internacional, já que a grande ameaça ideológica deixou de
existir com a ausência da ex-União Soviética. Recordando, o Japão não tinha facilidade para atuação
militar em razão das restrições constitucionais.
Todavia, Fumitaka Furuoka (2002, p. 69) aponta que essa estratégia diplomática encontrou
resistências entre os vizinhos do Japão, dessa forma, ao país foi exigido encontrar um equilíbrio entre as
suas relações com o mundo ocidental e o mundo asiático. Isso porque, as democracias ocidentais têm
como "valores universais", por exemplo, os direitos humanos, democracia, liberdade e economia de
mercado; mas líderes asiáticos defendem a existência de um conjunto de "valores asiáticos", resultantes
de sua própria história, cultura e tradições. Com isso, não necessariamente os valores ocidentais são
aplicáveis à Ásia, um dos temas ressaltados pelos asiáticos é o princípio da não interferência.
Foi identificado que, no Japão dos anos 1990, os valores asiáticos tinham simpatia de parte
significativa da sua população e eram defendidos por políticos conservadores, como Ichiro Ozawa e
Shintaro Ishihara. Mas, na prática, a política externa do governo de Tóquio apresentou maior
proximidade aos “valores universais” das potências ocidentais, que eram as que mais pressionavam por
uma ampliação da participação japonesa nas questões globais.
Essa discussão é importante porque o Japão tenta trabalhar essa dualidade das relações, pois dada
a sua localização, tem na região da Ásia-Pacífico o seu principal ambiente geopolítico; mas, ao mesmo
tempo, as suas relações com o mundo ocidental são fundamentais, tanto em termos econômicos como
políticos. A própria ideia de pacifismo está intrinsecamente atrelada às relações nipo-americanas, pois,
apesar das críticas aos “valores universais”, identificados como mais norte-americanos que japoneses, os
países asiáticos temem que um afastamento dos EUA da região levaria o Japão a buscar um
fortalecimento da sua área de defesa.
De qualquer forma, na década de 1990, apesar de haver essa discussão de reorientação da
diplomacia japonesa orientada aos valores, concretamente houve poucos avanços em razão de o foco do
governo de Tóquio ter-se voltado à busca de soluções para os problemas japoneses. Foi apenas com a
posse dos primeiros-ministros Koizumi e Abe que o Japão volta a desenvolver uma política externa de
busca por maior projeção. Ademais, foi no governo do primeiro-ministro Abe que a política orientada
por valores ganha contornos mais concretos.
Em 30 de novembro de 2006, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Aso Taro, anunciou como
pilar da política externa japonesa a diplomacia orientada por “valores universais”, ou seja, “democracia,
liberdade, direitos humanos, estado de direito e economia de mercado” (ASO, 2006). O objetivo
declarado dessa política seria construir relações mais estreitas com países com ideias semelhantes.
Concretizando essa nova orientação, anunciou também o projeto do Arco da Liberdade e Prosperidade
– Arc of Freedom and Prosperity –, que serviria para fortalecer as relações com vários parceiros de uma
extensa área ao longo da orla do continente eurasiano, incluindo países da Asean, da Ásia Central e do
Sul, do Oriente Médio, da Região do Mar Negro e da Europa Central e Oriental.

91
Nota-se a presença de uma política externa do Japão coerente com o seu perfil de atuação não
necessariamente militar, mais atuante na busca de desenvolver ações de aproximação com outros
países, como aponta Silva (2017, p. 39):

O pacifismo proativo surge então como um contraponto à noção de


pacificidade e busca reforçar a habilidade japonesa como uma potência
pacífica que preza pelo compromisso da manutenção da paz, mas que é
capaz de articular respostas que garantam sua soberania sem,
necessariamente, se tornar uma nação militarista.

Christopher Hughes (2015) segue nessa mesma linha de raciocínio afirmando que a política
do primeiro-ministro Abe foi elaborada para romper as “restrições políticas e diplomáticas
domésticas que parecem terem sufocado a própria identidade nacional do Japão e sua vitalidade
como ator internacional” (HUGHES, 2015, p. 23).
Dando continuidade às políticas de engajamento do Japão em questões internacionais, o
primeiro-ministro Abe anunciou, em maio de 2007, em uma reunião ministerial no Fórum
Regional da Asean em Manila, o Diálogo Quadrilateral de Segurança (Quad), cuja finalidade
anunciada era defender a democracia e promover prosperidade na região do Indo-Pacífico, tendo
como membros os EUA, a Índia, a Austrália e o Japão.

Com o apoio dos Estados Unidos, Abe propôs a ideia de desenvolver um


Diálogo Quadrilateral de Segurança oficial entre as quatro democracias do
Indo-Pacífico. Valores como liberdade, democracia, direitos humanos e
respeito pelo estado de direito formaram a base para a aliança Quad. A
cooperação entre Estados com ideias semelhantes foi mencionada na
declaração conjunta sobre a transformação da aliança de segurança feita
pelos EUA (ZAKOWSKI et al. 2018, p. 128).

Diplomatas seniores japoneses e americanos identificaram a iniciativa como parte de um


projeto para promover a formação de novas alianças na Ásia, tendo por objetivo contrabalançar o
poder da China, apontado como ameaça pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Aso Taro, em
uma entrevista ao canal de televisão Fuji, em 2006 (THE NEW YORK TIMES, 2006).
Em agosto de 2007, o primeiro-ministro Abe em um discurso no parlamento da Índia,
intitulado Confluência dos Dois Mares, fez referência ao Arco da Liberdade e Prosperidade e
anuncia outra iniciativa dentro dessa diplomacia orientada por valores:

92
Esta parceria é uma associação em que partilhamos valores fundamentais
como a liberdade, a democracia e o respeito pelos direitos humanos
básicos, bem como pelos interesses estratégicos. (...)

Com a união do Japão e da Índia dessa forma, essa "Ásia mais ampla"
evoluirá para uma imensa rede que abrange todo o Oceano Pacífico,
incorporando os Estados Unidos da América e a Austrália. Aberta e
transparente, essa rede permitirá que pessoas, bens, capitais e
conhecimentos fluam livremente (ABE, 2006, tradução nossa).

Essa ideia, apresentada pelo primeiro-ministro Abe em 2007, tornou-se mais concreta na
política chamada de Indo-Pacífico Livre e Aberto – Free and Open Indo–Pacific (Foip) –, conforme
foi anunciado durante a 6ª Conferência Internacional de Tóquio sobre o Desenvolvimento da
África – Ticad VI, sigla em inglês –, realizada no Quênia em 2016. A base da proposta era a defesa
do dinamismo criado pela combinação de dois continentes, a Ásia e a África, que têm os dois
oceanos, Pacífico e Índico, como elemento fundamental de ligação. De acordo com o relatório do
governo japonês, os três pilares da proposta são:

i. A promoção e o estabelecimento do Estado de direito, liberdade de


navegação e livre comércio;
ii. A busca da prosperidade econômica por meio da melhoria da
conectividade, inclusive por meio de “infraestrutura de qualidade”
com desenvolvimento de acordo com padrões internacionais;
iii. Iniciativas para garantir a paz e a estabilidade, como incluir assistência
para capacitação em direito marítimo, fiscalização antipirataria e
redução do risco de desastres (MOFA, 2017, p. 2, tradução nossa).

Percebe-se, com essas iniciativas realizadas nas duas primeiras décadas do século XXI, maior
proatividade que no período da década de 1990, após o final a Guerra Fria, quando havia altas
expectativas e demanda por maior participação do Japão. Ademais, pelos discursos são identificadas
duas linhas de atuação: uma vinculada à segurança e outra à defesa dos interesses econômicos do país.
As estratégias denominadas Indo-Pacífico Livre e Aberto e o Quad estão no topo das
prioridades, porque nos últimos anos a China tem promovido ações de construção de ilhas artificiais
e controle do tráfego nessa região. Isso preocupa por haver áreas ainda em disputa com o Japão,
como as ilhas Senkaku/Daioyu, mas esse caso é apenas um exemplo da preocupação do país.
Welington Amorim (2018, p. 175) compara alguns números e mostra que para o Japão é
fundamental a garantia dos seus direitos territoriais marítimos:

93
A comparação usual entre os territórios do Japão e da China é uma das
mais assimétricas entre potências consideradas rivais. Segundo o Banco
Mundial (2017), os dois territórios seriam os seguintes (em km2):
 China – 9,388 milhões;
 Japão – 0,367 milhões.
De acordo com estes números , a China seria mais de 25 vezes
superior ao Japão em tamanho. No entanto, caso acrescentemos a Zona
Econômica Exclusiva (ZEE) e a plataforma continental (PC) (...) a
situação de assimetria se altera consideravelmente. Conforme dados das
ZEE e PC do Sea Around Us Project (2017), pode-se obter o seguinte:
 China – 9,388 + 2,288 (ZEE) +1,014 (PC) = 12,690 milhões km2;
 Japão – 0,367 + 4,469 (ZEE) + 0,427 (PC) = 5,263 milhões km2.
Logo, a assimetria antes mencionada de mais de 25 vezes maior, reduz-se
a quase duas vezes e meia.

No âmbito da economia, fica claro que a defesa dos interesses do Japão não está limitada a
uma atuação estritamente no seu território, “pois mais de 90% do seu comércio depende de
transportes marítimos, incluindo as suas exportações e o suprimento de petróleo e gás importados
do Oriente Médio” (SAHASHI, 2019, tradução nossa). Portanto, a segurança do livre tráfego das
rotas marítimas é essencial aos interesses japoneses.
Paralelamente à garantia da trafegabilidade para liberdade de comércio, observa-se também
uma ativa diplomacia pacífica proativa na defesa dos interesses do Japão para aumentar a cooperação
com outros países. Além do Foip e do Quad, destacaram-se também os acordos de integração que
foram firmados a partir dos anos 2000, pois até esse ano, o país não possuía nenhum acordo de
integração econômica, mas, só em 2021, já possuem 18 acordos.
Entre esses, destacam-se dois mais recentes: o TPP-11 e a Parceria Econômica Regional
Abrangente – Regional Comprehensive Economic Partnership (RCEP) –, já que eles tiveram
importante e clara demonstração de proatividade do Japão.

94
Gráfico 13 – Evolução do número de acordos de cooperação econômica estabelecidos pelo Japão

20
18
18 17 17
16
16 15 15
14
14 13 13 13
12
12 11 11
10 9
8
6 5
4 3
2
2 1 1 1
0 0
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
2021
Fonte: WTO. Japan: evolution of RTAs (1948-2021).
Regional trade agreements information system (RTA-IS). Acesso em: 29 jun. 2021.

Com relação ao primeiro acordo, o TPP-11, foi estabelecido com 12 países, mas o presidente
Trump retirou os EUA. Mesmo assim, o governo japonês conseguiu fazer com que o acordo fosse
confirmado com os demais membros. Já o RCEP foi firmado em 15 de novembro de 2020,
envolvendo os 10 Estados membros da Asean (Brunei, Camboja, Indonésia, Laos, Malásia,
Mianmar, Filipinas, Cingapura, Tailândia e Vietnã) e mais Austrália, China, Japão, Coreia do Sul
e Nova Zelândia.
Para se ter uma dimensão da importância do RCEP, esse acordo representa quase 1/3 da
economia global. Segundo os dados do FMI de 2020, comparando-se ao USMCA, acordo
comercial que tem como membros os EUA, o México e o Canadá e envolve 496,9 milhões de
pessoas, US$ 23,4 trilhões de PIB e de US$ 7,8 trilhões de comércio total. Já o RCEP, de partida,
representa uma população total de 2,27 bilhões de pessoas, PIB total de US$ 25,9 trilhões e US$
12,5 trilhões de comercial total.
Portanto, ao longo da unidade, fica evidente que o pacifismo proativo significa a busca do
Japão por um papel mais ativo e por reconhecimento nas relações internacionais. Contudo,
olhando-se para os tamanhos das economias dos EUA e da China em 2021, entende-se que a
possibilidade de a economia japonesa voltar à segunda posição é muito difícil. Diante desse
entendimento, Yoshihide Soeya (2019) traz uma proposta de abordagem que pode ser mais
aplicável ao Japão neste momento, que é de uma diplomacia de potência média.
Isso significaria o reconhecimento do Japão como um país influente economicamente e até
mesmo em certos aspectos estratégicos, mas que não tenderia a rivalizar, neste momento, em termos
de capacidades de hard power com as duas principais nações, quer dizer, os EUA e a China. Isso

95
exigiria uma redefinição das ambições japonesas em termos de política internacional, que talvez não
sejam suficientes para as correntes de políticos conservadores e nacionalistas japoneses que se
reorganizaram nos últimos anos.

Relações com o Brasil


As relações Brasil-Japão são mais que centenárias, tendo como marco inicial o Tratado de
Amizade, Comércio e Navegação entre o Brasil e o Japão, celebrado em Paris no dia 5 de novembro
de 1895. Desde o início, as relações bilaterais se apresentaram complementares e, ao longo do
tempo, aprofundaram-se e se ampliaram nas áreas de interação.
Nesta unidade, porém, serão destacados apenas três aspectos: a imigração, as relações
econômicas e a cooperação bilateral. As relações nipo-brasileiras foram marcadas, inicialmente, pelas
imigrações de japoneses ao Brasil ocorridas na primeira metade do século XX. Com a crise
econômica brasileira dos anos 1980, inverteu-se o fluxo de imigração, agora são os trabalhadores
brasileiros descendentes de japoneses que passaram a buscar oportunidades no Japão.
O período pós-Guerra Fria foi marcado por um crescente número de imigrantes brasileiros
no Japão, chegando ao seu auge em 2007. Esse fluxo de pessoas ficou conhecido como fenômeno
decasségui – termo em japonês utilizado para se referir ao ato de sair (de casa) para trabalhar, no caso
imigrar – e foi apresentado pelo professor Naoto Higuchi (2006), da Universidade de Tokushima,
como possuidor de cinco diferentes fases ao longo do tempo:
 fase I (1980 a 1984) – retorno invisível à migração da primeira geração;
 fase II (1985 a 1989) – formação de redes de recrutamento;
 fase III (1990 a 1992) – influência da lei de imigração revisada;
 fase IV (1993 a 1997) – recessão e transformação do mercado de trabalho e
 fase V (1998 ao presente) – consequências da mudança de geração.

Brevemente, a primeira fase é marcada pelo fluxo de imigrantes japoneses que vieram ao
Brasil, mas, em razão da crise econômica, retornaram ao Japão em busca de trabalho. A segunda
fase é quando as empresas japonesas “descobrem” o Brasil e passam a institucionalizar o
recrutamento diretamente no país, promovendo uma expansão da ida de pessoas ao Japão, agora
não só dos imigrantes, mas também de descendentes de japoneses. Em 1990, começa a terceira fase,
com a reforma da lei da imigração:

A grande mudança ocorreu em junho de 1989, com a reforma da Lei de


Controle da Imigração e do Reconhecimento de Refugiados (doravante
denominada simplesmente como Lei de Imigração) que entrou em vigor
no ano seguinte. Criou-se um status para os estrangeiros com ascendência

96
japonesa, denominado Residente por Longo Período, o que possibilitou a
ida em massa para o Japão de filhos e netos de japoneses, bem como de
seus cônjuges brasileiros não descendentes (NINOMIYA, 2008, p. 27).

A quarta fase é decorrente do estouro da bolha econômica japonesa em 1991, a partir da qual
o crescimento econômico do país reduz e, consequentemente a demanda por mão de obra também,
fazendo com que fluxo de imigrantes brasileiros ao Japão continue, mas em um ritmo menor.
Já a quinta fase é marcada pela mudança do perfil dos brasileiros descendentes de japoneses
que imigram ao Japão, pois nela vão prevalecer os da terceira geração, e isso vai ter um impacto
importante, pois, por serem mais jovens, ao levarem consigo os filhos em idade escolar, sofrem para
se adaptar ao país, e com isso mais da metade das crianças com 15 anos deixaram de frequentar o
ensino médio por causa do baixo desempenho escolar, por não adaptação ou ainda por decisões dos
pais (HIGUCHI, 2006, p. 6).
Como o artigo de Naoto Higuchi foi publicado em 2006, antes da crise econômica mundial
de 2008 – que teve como um dos ícones a quebra da Lehman Brothers – e dos impactos sobre a
economia japonesa, que refletiu no desemprego de muitos brasileiros, pode-se acrescer uma nova
fase: o regresso dos decasségui ao Brasil. Esse fato pode ser observado no Gráfico 14, pela redução
do número total de brasileiros no Japão a partir de 2008, entretanto, depois de 2015, houve uma
retomada do fluxo migratório e, segundo o Japan Statistical Yearbook 2020, a população de
brasileiros em solo nipônico atingiu 201.865 em 2018.

Gráfico 14 – Total de brasileiros no Japão de 1989 a 2015 e total de brasileiros na jurisdição do


Consulado-Geral em Tóquio

Fonte: Consulado-Geral do Brasil em Tóquio (2018)

97
Por causa desse grande número de cidadãos brasileiros no Japão, há que se acompanhar quais
serão as repercussões que poderão ter nas relações bilaterais e qual tipo de cooperação poderá ser
possível ou necessária, tópicos que deverão gerar novas discussões ao longo do século XXI.
Um segundo tópico importante nas relações nipo-brasileiras é o econômico, pois, durante o
século XX, o Japão foi o principal parceiro do Brasil na Ásia. Os investimentos japoneses,
principalmente na década de 1970, uma fase em que o governo brasileiro enfatizou a
industrialização e muitas empresas japonesas se instalaram no país.
De acordo com o levantamento da publicação Toyo Keizai, em 2020, havia 466 empresas
japonesas no Brasil. Esses investimentos foram uma importante contribuição para a industrialização
do país, tendo como marcos:
 Toyota, que chegou em 1962, e hoje tem três plantas fabris no estado
de São Paulo, além de diversas concessionárias, empregando
aproximadamente 5.400 colaboradores.
 Panasonic, que chegou em 1967, hoje com três plantas fabris no Brasil,
com aproximadamente 2.000 colaboradores.
 Hitachi foi instalada no Brasil em 1940, hoje com diversas plantas, e
com cerca de 1.400 colaboradores.
 Honda, que iniciou sua história em 1971, hoje com suas plantas e
concessionárias, e apenas na sua fábrica de automóveis na Amazônia
tem 5.500 colaboradores.
 Nissan instalou sua fábrica em 2000, e tem 180 concessionárias no
Brasil, com cerca de 2.400 colaboradores.
 Bridgestone/Firestone chegou em 1923, e em suas quatro fábricas
empregam 4.000 colaboradores (GÓES, ASSUMPÇÃO, SANCHEZ,
2020, p. 7).

Outro tópico relevante nas relações bilaterais nipo-brasileiras é a cooperação internacional.


Um dos projetos de grande resultado é o Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o
Desenvolvimento Agrícola dos Cerrados (Prodecer), que, iniciado em 1979, “desenvolveu uma área
de 345 mil hectares (1,5 vezes o tamanho de Tóquio) e representou investimentos de 68,4 bilhões
de ienes (US$ 684 milhões) até seu encerramento em março de 2001” (JICA, 2009, p. 4). Como
resultado dessa cooperação, o Brasil se tornou o principal exportador mundial de soja, concorrendo
diretamente com os EUA.
Outra cooperação de destaque entre os dois países foi a decisão brasileira, em 2006, pela
adoção do sistema de TV Digital japonês que, além de trazer a nova tecnologia para Brasil, abriu
oportunidade para a Cooperação Triangular Internacional. Dessa forma, com a implantação dessa
tecnologia, os dois países passaram a promover laços colaborativos com outras nações da América
do Sul e da África (DANTAS, 2019, p. 177). E pelas iniciativas dos dois países para a disseminação

98
do padrão Nipo-Brasileiro de TV Digital ISDB-T (Integrated Services Digital Broadcasting –
Terrestrial), ele foi adotado em quase toda a América do Sul e em alguns países da América Central
(Costa Rica, Guatemala e Honduras) e África (Botswana) (MOFA, 2014, p. 7).
Os projetos triangulares ocorrem por meio do Programa de Parceria para a Cooperação Sul-
Sul – Japan Brazil Partnership Program (JBPP) –, assinado em 2000, que apoia os países mais
pobres, particularmente, os de língua portuguesa.
A cooperação nipo-brasileira tem ocorrido também por meio de diálogos em fóruns
internacionais, como a ONU, com o objetivo de aprofundar a comunicação em busca de interesses
convergentes. Um tema que ganhou importância na relação bilateral foi a reforma e ampliação do
Conselho de Segurança das Nações Unidas, em que, para fortalecer as suas reivindicações por um
assento permanente, Alemanha, Brasil, Índia e Japão estabeleceram o G-4 em 2004.
Apesar disso, houve poucos avanços nessa discussão, mesmo com a criação da Negociação
Intergovernamental sobre Reforma da Segurança na organização em 2008. Entre as razões para isso
está a resistência dos atuais países com assentos permanentes:

Os problemas e obstáculos à reforma são bem conhecidos e não se


resumem a interesses contrários de determinados países ou grupos. A
inércia institucional também joga um papel, tendo em vista que uma
emenda à Carta nessa matéria, pelo artigo 108, exigiria uma maioria de
dois terços dos atuais 193 Estados membros, o que equivale a 129 votos.
Há quem mencione ainda a proposição absurda de que somente uma
Terceira Guerra Mundial teria o condão de desencadear uma
reestruturação do Conselho com a profundidade necessária (GARCIA,
2013, p. 126).

Apesar dessas dificuldades, o Brasil e o Japão permanecem atuando pela reforma desse fórum,
conforme pode ser averiguado no documento Fortalecendo a Parceria Estratégica e Global: a
política do Japão para o Brasil:

O Japão e o Brasil cooperam, como no âmbito do G4 (Japão, Brasil,


Alemanha e Índia), em prol da ampliação do número de assentos
permanentes e não permanentes do Conselho de Segurança da ONU, de
modo que o órgão passe a melhor refletir a realidade da comunidade
internacional do século 21. Doravante, ambos os países irão estreitar essa
cooperação (EMBAIXADA DO JAPÃO NO BRASIL, 2017, p. 5).

99
Em agosto de 2014, durante a visita oficial do primeiro-ministro Abe ao Brasil, houve o
estabelecimento da Parceria Estratégico e Global que, segundo o embaixador André Corrêa do
Lago, tem resultado em apoios mútuos em órgão internacionais:

Brasil e Japão tenham se apoiado reciprocamente no lançamento de


candidaturas aos mais diversos órgãos do sistema internacional, ora
intercambiando votos, ora referendando candidatos e posições movidos
pelo simples entendimento de que a presença do país, ou de seu
representante, nesses órgãos e instâncias seria mutuamente interessante
(LAGO, 2018, p. 3).

O documento Fortalecendo a Parceria Estratégica e Global: a política do Japão para o Brasil


(2017), apresentado pela Embaixada do Japão no Brasil, aponta diversos temas possíveis de
cooperação global como na área da segurança das rotas marítimas, segurança cibernética e
terrorismo internacional, mediados pelos acordos bilaterais. No entanto, não deixa claro quais são
as prioridades e o ponto de partida, e isso dificulta o entendimento dos rumos futuros.
O ex-ministro Celso Lafer (2018, p. 846) aponta que o Brasil, pela sua escala e pela sua
complexidade, é um país que tem interesses globais e precisa estabelecer uma escala de
prioridades e parcerias operacionais. Ainda acrescenta que algumas relações “podem ganhar um
novo sentido estratégico, como é o caso do Japão, em função do papel que tende a desempenhar
no sistema internacional com base no seu hoje incontestável poderio econômico-financeiro”
(LAFER, 2018, p. 847).
Em síntese, tanto o Brasil como o Japão são países que possuem potencial para desempenhar
papéis maiores nas relações internacionais, sendo útil para isso a ampliação de diálogos bilaterais,
visando encontrar as possibilidades de aprofundamento para cooperação. Talvez, um dos primeiros
caminhos a seguir seria a aceleração das negociações para o estabelecimento de um acordo de
integração econômica, dado que nos últimos anos as relações nessa área têm ficado estagnadas.

Conclusão
Uma constatação óbvia é que as relações nipo-brasileiras apresentaram a complementaridade
de interesses como uma característica presente nos momentos de intensificação dos intercâmbios.
Por exemplo, a vinda dos pioneiros imigrantes japoneses ao Brasil ocorreu porque no Japão havia
uma grande crise econômica no início do século XX, e as fazendas brasileiras de café necessitavam
de mão de obra para manter a produção.

100
Em outro momento, já depois da II Guerra Mundial, o Japão apresentou a partir dos anos
1950 necessidades de recursos naturais, e o Brasil apareceu como um importante parceiro.
Paralelamente, com a implementação de políticas de industrialização com o Plano de Metas do
governo de Juscelino Kubitschek, investimentos significativos de empresas japonesas vieram ao País.
Na década de 1980, foi o Brasil que passou por uma crise econômica que estimulou muitos
trabalhadores descendentes de japoneses a buscar oportunidades de trabalho no Japão, que à época
apresentava um alto crescimento econômico e necessitava de mão de obra para as suas empresas.
Esses exemplos mostram que, identificadas as complementaridades, houve intensificação das
relações. No entanto, apesar de alguns avanços nessas primeiras décadas do século XXI, as relações
bilaterais estão aquém das expectativas para esses dois países que fazem parte das 10 maiores
economias mundiais.

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PROFESSOR-AUTOR
Alexandre Uehara

Formação Acadêmica
 Doutor em Ciência Política pela Universidade
de São Paulo – USP (2001), onde também
obteve o título de mestre (1995).

Experiência Profissional
 Pesquisador visitante no Japão pela
Universidade Keio (1993) e pela Universidade
Sophia (1999-2000).
 Coordenador acadêmico do Centro Brasileiro de Estudos de Negócios Internacionais &
Diplomacia Corporativa (CBENI & DiC) da ESPM.
 Membro do Núcleo de Estudos e Negócios Asiáticos e professor no Curso de Relações
Internacionais da ESPM.
 Membro do corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Língua, Literatura e
Cultura Japonesa (FFLCH) da USP.
 Membro do Grupo de Análise da Conjuntura Internacional da USP.
 Pesquisador sênior do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais, onde coordena o
Grupo de Estudos sobre Ásia (Geasia).
 Pesquisador de questões asiáticas envolvendo temas de integração econômica e
relacionamentos regionais, particularmente sobre o Japão, a China, a península Coreana
e Taiwan.
 Associado da Consultoria Empresarial Nova Investe.
 Segundo vice-presidente da Associação Cristã de Moços (ACM) de São Paulo.
 Analista político-econômico da Japan External Trade Organization (Jetro), órgão
governamental vinculado ao Ministério da Economia, Comércio Exterior e Industria
(Meti) do Japão (2000 a 2007).

Publicações
 Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4627496138739063.
 ID Lattes: 4627496138739063.

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