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Arq Bras Cardiol Oliveira

Artigo Fº e cols
Original
2002; 79: 233-8. Reabilitação não supervisionada

Reabilitação não Supervisionada: Efeitos de Treinamento


Ambulatorial a Longo Prazo
Japy Angelini Oliveira Filho, Ana Cristina Leal, Valter Correia Lima,
Dirceu Vieira Santos Filho, Bráulio Luna Filho

São Paulo, SP

Objetivo - Avaliar a segurança e eficácia da reabili- A reabilitação cardíaca é procedimento hoje de rotina
tação não supervisionada (RNS), a longo prazo, em paci- no tratamento da doença coronariana aterosclerótica. Pode
entes coronários de baixo risco. ser realizada em clínicas especializadas (reabilitação super-
visionada), em domicílios ou logradouros públicos com su-
Métodos - Estudaram-se, retrospectivamente, 30 pa- pervisão à distância (reabilitação não-supervisionada) 1.
cientes em: grupo I, RNS (GI, n=15), de clínica privada; Infelizmente, os benefícios da reabilitação supervisionada
grupo II, controle (GII, n=15), seguidos em ambulatório, atingem poucos pacientes, mesmo em países desenvolvi-
pareados por idade, sexo e quadro clínico. GI foi estimula- dos, devido tanto às dificuldades logísticas quanto aos al-
do à prática de exercícios sob supervisão indireta (cami- tos custos operacionais 2. A reabilitação não-supervisiona-
nhadas, esteira e esportes). da tem como objetivo principal exercitar pacientes sob su-
pervisão indireta, estendendo a prática de exercícios a maior
Resultados - GI apresentou, respectivamente, valores número de pacientes considerados de baixo risco isquê-
pré e pós: VO2 pico (ml/kg/min), 24±5 e 31±9; VO2 pico/FC mico para a prática de esforço físico 3. Nesta conjuntura, a
pico: 0,18±0,05 e 0,28±0,13; DP pico: 26.800±7.000 e reabilitação não-supervisionada tem sido considerada pro-
29.000± 6.500; %FC pico/FCmax predita, e 89,5±9 e cedimento seguro 4.
89,3±9. Em GII, os valores pré e pós foram: VO2 pico (ml/ O número de publicações referentes à reabilitação
kg/min), 27±7 e 28±5; VO 2 pico/FC pico 0,2±0,06 e não-supervisionada é reduzido na literatura médica. As pri-
0,2±0,05; DP pico: 24.900±8.000 e 25.600±8.000, e
meiras diretrizes da reabilitação não-supervisionada foram
%FCpico/FCmax predita: 91,3±9 e 91,1±11. Foram signi-
publicadas por Williams e cols. em 1980 5. Desde o primeiro
ficativas : VO2 pico pré-observação vs VO2 pico pós-obser-
relato 6 até a atualidade registraram-se 13 artigos originais e
vação no GI (p=0,006); VO2 pico pós-observação GI vs
um resumo, perfazendo-se um total de 1.230 pacientes
VO2 pico pós-observação GII (p=0,004); VO2 pico/FC
coronarianos exercitados em protocolos de 4 a 24 semanas
pico pós-observação GI vs VO2 pico/FC pico pós-observa-
ção GII (p=0,0000). O seguimento de GI e GII foi de, res- após evento coronariano agudo 7-18. No Brasil, as diretrizes
pectivamente 41,33±20,19 meses e 20,60±8,16 meses da reabilitação não-supervisionada e as primeiras experiên-
(p<0,05). Não houve diferenças entre os grupos nos fato- cias só foram publicadas recentemente 19-21.
res de risco, terapêutica e evolução da isquemia. Não Os pacientes com antecedentes coronarianos apre-
houve eventos secundários a RNS em 620 pacientes meses. sentam restrição espontânea da atividade física, indepen-
dente da orientação médica. Este comportamento defensivo
Conclusão - RNS foi segura e eficaz em pacientes interfere nas atividades laborativas, recreacionais, pessoais
coronários de baixo risco, com benefícios em nível periférico. e, inclusive, no relacionamento sexual. Vários trabalhos têm
demonstrado a importância do treinamento físico nesses
Palavras-chaves: doença coronariana aterosclerótica, tes- pacientes, com melhora do estado de saúde e do perfil psi-
te ergométrico, reabilitação não-super- cológico 1-4,19. O objetivo deste estudo foi: 1) avaliar o de-
visionada sempenho de pacientes com doença coronariana ateroscle-
rótica, em fase estável, de baixo risco isquêmico para a práti-
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina
Correspondência: Japy Angelini Oliveira Filho - Rua Tapejara, 109 - 05594-050 ca de exercício 5 em protocolo de reabilitação não-supervi-
São Paulo, SP - E-mail: japyoliveira@uol.com.br sionada, a longo prazo e 2) verificar em nosso meio a eficácia,
Recebido para publicação em 2/1/01 a exeqüibilidade e a segurança da reabilitação não-supervi-
Aceito em 5/12/01
sionada orientada em consultório médico.

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Métodos e laboratoriais, para a estratificação do risco do exercício 5.


Em seguida, eram estimulados para a prática de atividade fí-
O desenho do protocolo desta pesquisa foi estudo de sica, segundo suas próprias preferências e disponibilida-
caso-controle 22. Em levantamento retrospectivo dos pron- des, após amplo esclarecimento sobre os fundamentos do
tuários de clínica privada, foram selecionados 20 pacientes condicionamento físico. Houve reavaliações ambulatoriais
consecutivos com doença coronariana aterosclerótica em periódicas e os pacientes eram instruídos a suspender a prá-
fase estável, comprovada por coronariografia, e considera- tica dos exercícios e procurar atendimento médico em caso
dos de baixo risco ao exercício, segundo critérios modifica- de intercorrências. O protocolo constou de três a cinco ses-
dos de Williams e cols. 5 (quadro I: critérios 2, 3 e 4). Esses sões semanais, de 30 a 60min em até 70 a 80% da capacidade
pacientes se submeteram regularmente a programa de reabi- funcional útil (nível máximo de exercício em ausência de sin-
litação não-supervisionada durante período superior a 12 tomas e ou sinais clínicos e ou eletrocardiográficos) 23. O
meses, entre 1982 e 1996. Desse grupo, selecionaram-se 15 treinamento físico incluiu caminhadas (n=12), exercícios em
pacientes que constituíram o grupo I (GI), submetidos à re- esteira rolante (n=2), natação (n=2), tênis (n=1) e futebol
abilitação não-supervisionada. Excluíram-se quatro pacien- (n=1). Os praticantes de natação, futebol e tênis eram anti-
tes por apresentarem informações insuficientes no prontu- gos desportistas das respectivas modalidades. O paciente
ário e um por impossibilidade de obtenção de paridade no praticante de futebol, apesar de inúmeras recomendações
grupo controle. O GI foi comparado com o grupo controle no sentido de que seu exercício era inadequado e mesmo
(GII), constituído por 15 pacientes provenientes do ambula- arriscado, manteve-se em prática regular da modalidade 24.
tório de doença coronariana da disciplina de cardiologia da No GII, os pacientes foram submetidos a tratamento
Escola Paulista de Medicina (UNIFESP-EPM), seleciona- ambulatorial de rotina que incluiu medidas higieno-dietéti-
dos em levantamento retrospectivo de prontuário médico, e cas e tratamento clínico usuais.
pareados por idade, sexo, quadro clínico e seguimento am- No início e término do período de observação, os paci-
bulatorial superior a 12 meses, no mesmo período. Em cada entes de ambos os grupos realizaram teste ergométrico con-
grupo havia 13 homens e 2 mulheres portadores de angina vencional em uso da medicação habitual. Na avaliação ini-
de peito (n=8), infarto do miocárdio prévio (n=8), com ante- cial, utilizaram-se os seguintes protocolos: no GI – Bruce
cedentes de angioplastia coronariana (n=2) e com cirurgia (n=5), Ellestad clássico (n=5) e Ellestad atenuado (n=1), e
de revascularização (n=6). As idades dos GI e GII foram de Astrand (n=4); 2); no GII – Bruce (n=12) e Naughton modifi-
64±10 e 63±10 anos, respectivamente. A distribuição dos cado (n=3). Na avaliação final, empregaram-se os seguintes
principais fatores de risco coronariano foi semelhante em protocolos: 1) GI – Bruce (n=5), Ellestad clássico (n=8) e
ambos os grupos. GI vs GII: tabagismo (6 vs 5 casos), hiper- Astrand (n=2); 2) GII – Bruce (n=15). Fez-se a estimativa do
tensão arterial (9 vs 11 casos), hipercolesterolemia (9 vs 10 VO2 pico, segundo as fórmulas e nomogramas próprios dos
casos) e diabetes mellitus (4 vs 5 casos). protocolos utilizados, conforme contido nos relatórios dos
De acordo com o protocolo, os pacientes do GI foram in- testes. Para fins de padronização, os testes ergométricos
formados sobre os riscos e benefícios do treinamento físico. foram reavaliados segundo os critérios estabelecidos pelo
Todos foram submetidos inicialmente a avaliações clínicas Consenso Nacional de Ergometria 25. Os cálculos de estima-
tiva do VO2 pico foram refeitos, a seguir, segundo recente pa-
dronização 26, para os testes de Bruce 27, Ellestad 28 e Naugh-
ton 29 e aplicados fatores de correção para testes em cicloer-
Quadro I – Critérios de seleção de pacientes para reabilitação
não-supervisionada segundo Williams e cols. 5
gômetros 30.
A análise estatística foi feita pelo teste t de Student
1. Treinamento prévio supervisionado durante seis meses. (bi-caudal), sendo considerado significativos os valores de
2. Ausência dos seguintes sintomas, sinais, e ou antecedentes:
2.1. VO2 pico < 6METS;
p<0,05.
2.2. Angina ou sinais de isquemia miocárdica no teste ergométrico, em
ausência do uso de medicação, em VO2 < 6METS ou em FC < 120bpm; Resultados
2.3. Disfunção ventricular acentuada – presença de terceira bulha,
cardiomegalia e ou fração de ejeção de VE inferior a 0,35 em repouso
ou exercício; O período de observação dos GI e GII foi de, respecti-
2.4. Resposta hemodinâmica anormal durante teste ergométrico - res- vamente, 41,3±20,2 e 20,6±8,2 meses (p<0,05). No GI, os pa-
posta anormal de pressão arterial, queda de fração de ejeção de VÊ
acima de 10%;
cientes foram seguidos por período variável de 19 a 79 me-
2.5. Arritmias ventriculares complexas; ses (mediana de 31 meses), perfazendo 620 pacientes/me-
2.6. Intervalo QT corrigido > 440mseg; ses de observação sem acidentes cardiovasculares secun-
2.7. Antecedentes de fibrilação ventricular em ausência de infarto agu-
do do miocárdio.
dários ao programa.
3. Incapacidade de realizar auto-monitorização, manter-se dentro dos As figuras 1, 2, 3 e 4 sumarizam os resultados, utilizan-
limites da prescrição do exercício e de apresentar aderência ao pro- do os valores de VO2 pico contidos nos prontuários. O GI
grama.
4. Conhecimento dos princípios básicos do treinamento aeróbio.
apresentou os seguintes valores pré e pós-observação, res-
pectivamente: VO2 pico (ml/kg/min), 24±5 e 31±9; VO2 pico/
TE- teste ergométrico; MET- unidade metabólica (1MET=3,5ml/kg/min); FC pico: 0,18±0,05 e 0,28±0,13; DP pico: 26.800±7.000 e
C- freqüência cardíaca; VE- ventrículo esquerdo.
29.000±6.500 e %FC pico/FCmax predita de 89,5±9 e 89,3±9 e

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Fig. 1 - VO2 pico pré e pós-observação nos grupos I (experimental) e II (controle pareado). Fig. 3 - Duplo produto pico pré e pós-observação nos grupos I (experimental) e II
(controle pareado).

Fig. 2 – Relação VO2 pico/FC pico pré e pós-observação nos grupos I (experimental) Fig. 4 - Relação FC pico/FC máxima predita* em percentual (pré e pós-observação)
e II (controle pareado). nos grupos I (experimental) e II (controle pareado). * FC máxima predita = 220 – idade.

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no GII, VO2 pico (ml/kg/min), 27±7 e 28±5; VO2 pico/FC pico em clínicas especializadas. Como ocorreu nesta pesquisa,
0,2±0,06 e 0,2±0,05; DP pico: 24.900±8.000 e 25.600±8.000, e este período poderia ser substituído em muitos casos por
%FCpico/FCmax predita: 91,3±9 e 91,1±11. palestras e instruções teórico-práticas.
A análise estatística mostrou as seguintes diferenças, Neste estudo, iniciado em 1982, utilizaram-se os critéri-
estatisticamente significantes: VO2 pico pré versus VO2 pico os de seleção de pacientes propostos por Williams e cols. 5.
pós no GI (p=0,006); VO2 pico pós GI versus VO2 pico pós Deve-se salientar que a reabilitação não-supervisionada é
GII (p=0,004), e VO2 pico/FC pico pós GI versus VO2 pico/ destinada a pacientes coronarianos de baixo risco. Os crité-
FC pico pós GII (p=0,0001). rios de definição dos pacientes de baixo risco são bastante
A evolução do padrão de isquemia miocárdica durante semelhantes, com pequenas diferenças 4,5,19. Os pacientes
o teste ergométrico foi semelhante nos GI e GII (tab. I). Em estavam em fase crônica estável, e não haviam sido subme-
ambos os grupos, não ocorreram procedimentos de revas- tidos a repouso devido a evento coronariano recente. Ape-
cularização miocárdica durante o período de observação. sar disso, o incremento de VO2 pico atingiu em média 29%,
durante treinamento acima de 12 meses, demonstrando o
Discussão benefício do exercício a longo prazo. Após o treinamento
físico, o VO2 pico (ml/kg/min) variou no GI de 24±5 a 31±9.
Os resultados deste estudo constituem a primeira pu- Estes dados corresponderam à elevação média de 2 METS,
blicação sobre reabilitação não-supervisionada, a longo capazes de incrementar significativamente a classe funcio-
prazo, referida na literatura especializada 20,21. nal dos pacientes e de interferir nas atividades laborativas,
Na atualidade, estima-se que apenas 25% dos pacien- recreacionais, pessoais e, inclusive, no relacionamento se-
tes coronarianos têm acesso a clínicas de reabilitação su- xual 36. Na fase inicial, ambos os grupos apresentavam valo-
pervisionada 2. Dificuldades de ordem logística, financeira e res semelhantes de VO2 pico. No GII não houve variação
social impedem a ampla utilização da reabilitação supervi- significativa do VO2 pico, demonstrando-se que os valores
sionada nessa população. Em nosso meio existe carência de finais registrados no GI deveram-se ao treinamento físico.
clínicas especializadas em reabilitação supervisionada. Em se tratando de estudo retrospectivo, não foi possí-
Nesse contexto a reabilitação não-supervisionada permiti- vel a uniformização dos protocolos de teste ergométrico.
ria a prática de exercícios em pacientes considerados de bai- No entanto, em 85% dos testes ergométricos foram empre-
xo risco isquêmico em logradouros públicos e mesmo em re- gados os protocolos de Bruce e Ellestad, os quais apresen-
sidência. Em realidade, a denominação reabilitação não-su- tam alta correlação em análises de regressão, não se detec-
pervisionada, já consagrada pelo uso, não é apropriada, tando diferenças significativas na aferição do VO2 pico, fre-
visto o paciente manter-se em contato periódico com o mé- qüência cardíaca de pico e pressão arterial de pico 37. Em
dico. Embora seja aconselhado a atuação de equipes multi- 10% dos testes ergométricos, utilizou-se o protocolo de
profissionais na reabilitação não-supervisionada, é res- Astrand em cicloergômetro. Demonstrou-se que a média do
ponsabilidade exclusiva do médico assistente a admissão, a VO2 pico em bicicleta variou de 89 a 95% dos valores encon-
prescrição, a avaliação das repercussões clínicas e a alta do trados em esteira rolante, tendo-se considerado que acrés-
treinamento em curso 31. Em nossa opinião, seria mais ade- cimos de 10% nos valores obtidos em cicloergômetro cor-
quada a denominação reabilitação semi-supervisionada 32. responderiam aos valores aferidos em esteira 30. Dessa for-
No presente estudo, os pacientes foram instruídos ma, todos os cálculos e análises estatísticas referentes à
durante as consultas médicas habituais. Isto se mostrou estimativa do VO2 pico foram refeitas, incluindo-se esta
factível e, considerando a importância da relação médico- correção 30, segundo recente padronização 26. Mesmo assim, a
paciente, poderia constituir uma vantagem na maior aceita- análise estatística, também, mostrou resultados semelhantes.
ção do programa. Várias têm sido as diretrizes publicadas Os resultados desta pesquisa são concordantes com a
sobre reabilitação não-supervisionada 5,19,32-35. De acordo literatura 6-18 que demonstra maior potência aeróbia nos gru-
com a maioria dessas diretrizes, a reabilitação não-supervi- pos treinados em relação aos não treinados. Entretanto, ao
sionada deveria se iniciar com breve período de treinamento contrário da amostra desta pesquisa, que selecionou paci-
entes em fase crônica estável, os estudos carecem dos valo-
res da potência aeróbia pré-condicionamento, uma vez que
Tabela I – Evolução do padrão de isquemia miocárdica nos testes tiveram início após convalescença de evento coronariano
ergométricos realizados nos GI e GII pré e pós-observação
agudo. Em geral, descrevem-se elevações do VO2 pico de
Evolução Grupo I Grupo II 23% em período de condicionamento variável entre um e seis
meses 6,8,9,10,12,17 e do limiar anaeróbio médio de 19% 8,10,11.
TE pré - a TE pós - 7 casos 10 casos
TE pré + a TE pós + 2 casos 3 casos Após quatro semanas de treinamento, detectaram-se eleva-
TE pré - a TE pós + 3 casos 1 caso ções significativas da potência aeróbia máxima em 14% e do
TE pré + a TE pós - 3 casos 1 caso limiar de lactato de 2mmol em 19% 18.
TE pré - teste ergométrico pré-observação não isquêmico; TE pré + - teste A freqüência cardíaca máxima atingida durante teste
ergométrico pré-observação isquêmico; TE pós - teste ergométrico pós- ergométrico pode ser predita através de equações e serve
observação não isquêmico; TE pós+ - teste ergométrico pós-observação para avaliar se o esforço realizado foi suficiente. Em geral
isquêmico.
nos pacientes coronarianos, a freqüência cardíaca máxima

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é avaliada pela freqüência aferida no pico do esforço, deno- Não há dados definitivos sobre o risco da reabilitação
minada freqüência cardíaca pico. A freqüência cardíaca má- não-supervisionada. Em se tratando de pesquisa retrospec-
xima diminui com a idade. Desta forma, para a avaliação a tiva, não foi possível aferir pelos prontuários médicos a
longo prazo de pacientes de diferentes idades é mais ade- aderência dos pacientes ao programa de exercícios. No en-
quado o uso do percentual atingido pela freqüência cardía- tanto, não ocorreram acidentes em 620 pacientes meses de
ca de pico, a qual é função linear do porcentual exercitado observação.
do VO2 pico 38. Nos GI e GII, o porcentual da freqüência car- A aderência registrada por outros autores tem sido
díaca máxima predita atingida durante os testes, foi de 89% satisfatória nos protocolos prospectivos de reabilitação
e 91%, respectivamente (p>0,05). Dessa forma, excluíram-se não-supervisionada. Na literatura, registram-se aderências
possíveis vieses de aferição do VO2 pico e validaram-se o de 89 e 72%, respectivamente, até 11 e 26 semanas de condi-
grau de qualidade dos testes ergométricos realizados. cionamento 6 e de 91 e 83%, respectivamente, ao final de 4 e
A relação VO2 pico/FC pico não tem sido analisada 24 semanas de treinamento 9. Considerando-se aderência
nas publicações anteriores. Neste trabalho, no GI ocorreu a eventual de 70% e treinamento em média de três sessões se-
elevação significativa da relação VO2 pico/FC pico pré e manais, não se teriam registrados acidentes em cerca de
pós-condicionamento, revelando maior eficácia do trabalho 5.200 pacientes/horas de treinamento.
miocárdico e comprovando o benefício do exercício a longo O risco de parada cardiocirculatória na reabilitação su-
prazo. Entretanto, a manutenção dos níveis de duplo-pro- pervisionada, nos anos 70, era de 1/6.000 pacientes-horas,
duto que, em geral, traduziriam o consumo miocárdico de O2, atingindo a 1/120.000 nos anos 90. Recentemente, publica-
refletiriam uma ação predominantemente periférica do exer- ram-se dados com risco de parada cardiocirculatória de 1/
cício físico. 98.717 pacientes-horas (reabilitação supervisionada) e de 1/
Na reabilitação não-supervisionada, os dados da lite- 70.000 pacientes-horas (reabilitação não-supervisionada) 4.
ratura são controversos a respeito das repercussões do trei- Segundo esses achados, ocorreria cerca de uma parada car-
namento na função ventricular. Descreveu-se discreta ele- diocirculatória a cada grupo de 100 pacientes, que se exerci-
vação da fração de ejeção em repouso, após seis meses de tassem ininterruptamente durante cinco anos, em regime de
exercício, apenas nos pacientes com função ventricular re- três sessões semanais. A locação de equipamentos de emer-
duzida 11. Em protocolo para deficientes físicos, ocorreram gência em logradouros públicos utilizados para reabilitação
elevações significantes da fração de ejeção e do porcentual não-supervisionada poderia ser de grande utilidade 39,40.
de encurtamento sistólico no pico do esforço, mantendo-se Assim, nossa amostra de pacientes, que envolveu 5.200
inalterados os valores de repouso 14. Entretanto, relataram- pacientes/horas de treinamento, apesar de relativamente
se elevações do volume sistólico de repouso e exercício, pequena, não apresentou eventos coronarianos relaciona-
sem alterações da fração de ejeção, em pacientes submeti- dos ao treinamento, comportando-se de acordo com a litera-
dos a exercício de alta intensidade, permanecendo inaltera- tura especializada.
dos esses valores no subgrupo exercitado com baixa inten- Dadas às limitações deste estudo, tornam-se necessári-
sidade 17. as novas pesquisas que incluam grandes amostras, subdivi-
Nessa pesquisa, o padrão de evolução da isquemia didas em grupos específicos de pacientes com doença coro-
miocárdica verificada durante o teste ergométrico, não mos- nariana aterosclerótica, avaliados prospectivamente. É pos-
trou alterações significativas, sendo similar nos grupos es- sível também que estes resultados se devam em parte ao en-
tudados. Em estudo pioneiro, Miller e cols. relataram testes tusiasmo pelo exercício dos pacientes selecionados. Estudos
isquêmicos em 42% e 35% dos pacientes, respectivamente, subseqüentes com a utilização de questionários apropriados
no início e final do protocolo 6. poderiam comprovar a melhoria de qualidade de vida.

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