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RESUMO: O presente artigo tem como objetivos a análise literária das obras O
Operário em Construção e Construção, de Vinicius de Moraes e Chico Buarque,
respectivamente, e a partir de então a reflexão acerca dos aspectos intrínsecos às
relações de trabalho na sociedade contemporânea, tendo como foco a dialética entre
liberdade e submissão, presentes na poesia e na canção enquanto um dos elementos
cruciais para a análise literária.
1. INTRODUÇÃO
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elemento que desempenha um certo papel na constituição da estrutura,
tornando-se, portanto, interno.
2. POESIA, CANÇÃO E SOCIEDADE EM CHICO E VINÍCIUS
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Outro elemento importante é a repetição da palavra “última” nos dois primeiros
versos e na sequencia, em uma referencia ao desfecho trágico do operário, o uso de
outras palavras que cumprem o papel de adjetivos e desenham as ações do personagem
e as emoções sentidas por ele no decorrer de seu dia. Além disso, a utilização da
conjunção “e” no inicio dos versos mantém a noção de movimento e auxilia na
marcação de mudança das ações, ao passo que durante a leitura, visualiza-se o
personagem agindo nas cenas descritas por Chico.
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Além disso, no verso, “E flutuou no ar como se fosse um pássaro”, a
representação da ilusória liberdade desfrutada pelo operário está representada pela
figura do “pássaro”, a partir do segmento “como se fosse” que se repete ao longo da
canção.
Ao final do trecho acima, o operário morre e esse acontecimento se dá de
maneira incomoda às outras pessoas que passam pela construção. O personagem morre
“atrapalhando o tráfego”.
No decorrer da canção, Chico mantém a mesma estrutura dos versos e os repete
trocando apenas os adjetivos finais.
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alguns dos acontecimentos do contexto político, social e econômico do Brasil da
ditadura militar. Nesse sentido, a população brasileira pouco ou quase nenhum recurso
possuía para que seus direitos enquanto cidadãos fossem assegurados. Essa conjuntura
exigiu da arte uma responsabilidade singular, e ao mesmo tempo escancarou as
dificuldades enfrentadas pelos artistas. Acerca disso Candido (1977, p.13) disserta:
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os indivíduos se veem impelidos dessa ação para a manutenção da existência. O
operário de Chico é livre e submisso.
Vinícius de Moraes, o “poetinha”, em O operário em construção, de maneira
semelhante à Chico Buarque, “serenamente” revela a desigualdade social brasileira e a
exploração do trabalho humano. A primeira estrofe inicia com:
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A seguir, na segunda estrofe, o poeta apresenta elementos da realidade dos
setores mais pauperizados da sociedade brasileira da década de 1950, através do jogo de
palavras entre “tijolo” e “pão”. Nesse momento, as desigualdades sociais demarcam as
distintas posições ocupadas por patrão e trabalhador; enquanto um lucra com a exaustão
diária do operário, o outro trabalha para garantir o acúmulo de riquezas do patrão:
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Segundo Engels (1876, p.8), há na sociedade fundada a partir da acumulação de
riquezas, origina amplos setores sociais desprivilegiados economicamente e que se
situam à margem das grandes cidades. Isso é relatado através dos jogos de palavras e
figuras de linguagem, em O operário em construção (1959), no qual o personagem
central da trama vivencia a ausência de direitos que asseguram a dignidade humana.
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E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela (...).”(MORAES, 1959, p. 47)
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Eram as rodas do patrão,
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão,
Que sua imensa fadiga
Era a amiga do patrão (...).”(MORAES, 1959, p. 47-48)
O operário passa a enxergar sua condição social sob a ótica da exaltação das suas
capacidades produtivas, dos seus talentos, e encontra na poesia a possibilidade de
exercer seus direitos e extravasar suas descobertas. Esse momento é compartilhado entre
ele e seus pares, os outros trabalhadores da construção. A partir da poesia o personagem
grita silenciosamente seu sofrimento, suas conquistas, e compreende aos poucos a
liberdade e a prisão de sua vida.
No verso, “E foi assim que o operário/ Do edifício em construção/ Que sempre
dizia sim/ Começa a dizer não”, o operário parte da atitude passiva para a ativa,
posicionando-se frente à exploração cotidiana. Antes dizia sim, e agora diz não. A partir
daí, novas descobertas impõem-se, como o distanciamento entre a “marmita” e o “prato
do patrão”, a “cerveja preta” e o “uísque”, o “macacão” e o “terno”, os “pés” e as
“rodas”, e a “dureza do seu dia” e “a noite do patrão”.
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O trecho acima relata a repressão e os enfrentamentos entre os operários na
medida em que o personagem central assume uma atitude ativa frente à exploração de
seu trabalho. Em seguida, na oitava estrofe, Vinicius de Moraes utiliza o segmento
“Dia seguinte” para dar dinâmica aos acontecimentos e marcar com destaque as
agressões sofridas pelo operário, como o “braço quebrado” e o “rosto cuspido”.
A décima estrofe marca outro acontecimento importante: frente à irredutível
postura do operário, seu patrão utiliza outra tática, a de silenciar não pela violência, mas
pela extorsão. Vinicius de Moraes usa a intertextualidade, a partir de um trecho da bíblia
cristã, em que Jesus é confrontado pelo Diabo para que abandone seu criador, e em
troca receberia todas as riquezas do mundo. Esse momento é sinalizado pelo diálogo,
símbolo do enfrentamento entre explorado e explorador.
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Os próximos versos marcam o conflito psicológico do operário diante da
tentativa do patrão de suborna-lo. Em seguida a sequencia, “Um silêncio de martírios/
Um silêncio de prisão./ Um silêncio povoado/ De pedidos de perdão” materializa os
confrontos internos vivenciados pelo personagem na medida em que consolida sua
postura austera.
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REFERÊNCIAS
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