Dificuldade do ensino das novas tecnologias nas áreas rurais
Donária Silva de Assis¹
RESUMO: O cenário escolar apresenta grandes desafios no século atual. A
capacidade de oferecer distintas tecnologias para o exercício do processo de ensino e aprendizagem é em muitas ocasiões questionada por educadores de todo o país. No cotidiano da sala de aula, são muitas as dificuldades encontradas por docentes e coordenadores pedagógicos para aplicar as novas tecnologias no ensino escolar, especificamente nas escolas localizadas nas zonas rurais.
O uso das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem requer
grande investimento e múltiplos esforços de todos os integrantes do sistema educacional. Tanto nas cidades quanto nas regiões rurais, a implementação dos inúmeros recursos tecnológicos disponíveis na atualidade enriquecem o processo de ensino e facilitam o cotidiano de alunos e professores. É preciso, portanto, compreender a prática escolar como um aglomerado de aspectos que juntos concretizam o processo educacional. A utilização dos meios de comunicação e demais recursos disponíveis fomentam a criação de conhecimento e a descoberta de novas possibilidades de ensino. Esse aspecto representa parte fundamental da ação Ensinar- Aprender, pois permite que os sujeitos se tornem ativos e responsáveis pelo conhecimento que circula em sala de aula. Diversos estudos têm sido elaborados com o objetivo de mensurar o acesso às tecnologias em escolas por todo o país e isso tem auxiliado no avanço qualitativo das capacidades de ensino. Esses estudos se mostram ainda mais ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 2
fundamentais nos cenários sociais em que a qualidade do ensino é conhecida
por ser insuficiente ou ineficaz, em decorrência de diversos fatores, dentre eles, a dificuldade de acessibilidade, a falta de investimentos governamentais, baixa formação dos profissionais da educação, dentre outros. Diante desses elementos, e da importância do tema em questão, o presente artigo tem por objetivos centrais debater o papel das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem no cotidiano escolar, especialmente nas zonas rurais, apresentar um estudo realizado em escolas do país acerca da implementação de tecnologias, e discutir a relação que se estabelece entre os docentes e a utilização de novos meios tecnológicos e quais os impactos no exercício da profissão.
2. A IMPORTÂNCIA DAS TECNOLOGIAS NO AMBIENTE ESCOLAR
A atualidade é cercada por inovações tecnológicas que são parte
indissociável da vida dos indivíduos. Das tarefas mais simples do cotidiano até as mais complexas, vislumbramos a presença das tecnologias, como por exemplo a utilização dos modernos smartphones para enviar mensagens ou compartilhar mídias, enviar ou receber e-mails, acessar as redes sociais, trocar informações, etc. Nesse cenário de grandes avanços no que se refere aos meios de comunicação e demais tecnologias, o ambiente escolar na maioria das vezes, encontra-se alheio às novidades desenvolvidas por todo o mundo. Isso dificulta o desenvolvimento do processo de ensino, visto que em um mundo globalizado e conectado, a utilização dos recursos e métodos provenientes das tecnologias auxilia na formação cognitiva e social dos indivíduos. Permite que discentes e docentes tenham uma visão ampliada do mundo que os cerca. Na sociedade atual, a escola deixa de ser o único espaço detentor do conhecimento, já que ele circula pelos diversos meios de comunicação existentes, e passa a necessitar de constantes transformações para que possa acompanhar o desenvolvimento da atual e das futuras gerações de jovens.
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Morin (2002, p.84), afirma que “é preciso aprender a enfrentar a incerteza,
já que vivemos em uma época de mudanças em que os valores são ambivalentes, em que tudo é ligado e é por isso que a educação do futuro deve se voltar para as incertezas ligadas ao conhecimento.” De acordo com o autor, o papel das escolas é, de fato, se voltar para os questionamentos e incertezas provenientes dos avanços tecnológicos de forma geral. Assim como as tecnologias estão em constante transformação, de acordo com a discussão supracitada, o processo de ensino e aprendizagem também constitui-se como um sistema que requer constantes inovações e reflexões. Isso se justifica pelos próprios objetivos da educação, dentre eles, a formação dos indivíduos em seus mais variados aspectos, intelectual, social, emocional, etc. É papel da escola oferecer aos alunos todas as possibilidades no que se refere aos métodos de ensino e as ferramentas fundamentais que facilitam esse processo. A interação entre as pessoas e o incentivo ao diálogo em todas as instancias da vida são elementos essenciais na formação dos seres humanos. Segundo Porto (2009, p.38) a escola é um ambiente de:
socialização de encontros, convivência, colaboração e embates
entre os sujeitos, mediada ou não por tecnologias. Escola onde se vive processos de comunicação e interatividade entre os participantes da educação, comprometidos com a historicidade do conhecimento e com a colaboração na produção de saberes/conhecimentos. Escola cujos sujeitos são autores de sua prática e de seu espaço/tempo de produção, construindo e vivendo relações, saberes, desafios e perspectivas de ser professor.
Na citação acima, é possível enxergar a educação como um espaço de
promoção da interação humana e da produção de conhecimento. A escola precisa ser um ambiente de ativa participação dos sujeitos na sua descoberta do mundo e na construção de conceitos acerca do outro e de si mesmo.
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Diante disso, ao se falar de uso das tecnologias em sala de aula, não é
possível ficar restrito às modernas inovações tecnológicas. Utilizar os meios de comunicação e demais tecnológicas significa, dentre outras coisas, aproveitar, os recursos disponíveis no cotidiano para fomentar a aprendizagem. Acerca disso, Kenski (2003, p.19) afirma que:
utensílios, livros, giz e o apagador, papel, canetas, lápis,
sabonete, talheres (...)- são formas diferenciadas de ferramentas tecnológicas. Quando falamos da maneira como utilizamos cada ferramenta para realizar determinada ação, referimo-nos à técnica. A tecnologia é o conjunto de tudo isso: as ferramentas e as técnicas que correspondem aos usos que lhes destinamos, em cada época.
É possível, portanto, pensar no uso das tecnologias em diversos
âmbitos, desde as ferramentas mais modernas até aquelas conhecidas por discentes e docentes e que diariamente não são reconhecidas como parte importante do cotidiano escolar. Contudo, se o foco de análise for a utilização de meios tecnológicos menos acessíveis e se a implementação deles ocorre em cenários educacionais desprovidos de investimentos governamentais e recursos econômicos, como é o caso das regiões rurais do Brasil. A realidade da educação brasileira proporciona fatos alarmantes no que tange a disponibilidade de recursos básicos para a prática do ensino. Ferramentas como giz, lápis, caneta, papel, dentre outras, não são encontradas em todas as escolas do país e esse cenário conduz a alguns questionamentos, dentre eles: Diante dos inúmeros problemas vivenciados pela educação brasileira, quais são os desafios para a utilização de novas tecnologias no cotidiano escolar, especialmente nas regiões rurais?
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3. REALIDADES E DESAFIOS DAS ESCOLAS EM REGIÕES RURAIS
De acordo com o Ministério da Educação (MEC, 2012), a garantia de um
ensino de qualidade voltado para as especificidades da população do campo é tarefa fundamentalmente dos órgãos responsáveis como o próprio Ministério da Educação. A partir disso, faz-se necessário compreender o sentido em torno da Educacão no Campo para que se possa determinar os desafios e tarefas relacionados ao cenário social, econômico e político das regiões rurais. De acordo com o MEC (2012, p.7 e 8):
A educação do campo, tratada como educação rural na
legislação brasileira, tem um significado que incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura, mas os ultrapassa ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. O campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não-urbano, é um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos 8 com a própria produção das condições da existência social e com as realizações da sociedade humana.
A definição apresentada pelo MEC (2012) acerca das potencialidades de
desenvolvimento humano nas regiões rurais constitui-se como central para iniciar o estudo acerca das realidades sociais encontradas no campo e as características da educação ofertada aos indivíduos provenientes dessa região. Primeiramente, é fundamental atentar para um debate prestigiado por todo o meio acadêmico direcionado para a área educacional se refere às diferenças de conceito entre Educação no Campo e Educação Rural. Uma primeira diferenciação encontrada nas literaturas da área está desenvolvida por Melo (2011, p.34), através de artigo publicado pela UNESP- Universidade Estadual Paulista:
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Assim como há uma diferenciação entre campo e rural, (...),
também entendemos que há uma distinção entre educação rural - responsável por formar o aluno em um agricultor voltado para um modo de ser - e educação no campo ou educação no meio rural13 - responsável por levar ensino, recursos e/ou técnicas ao campo que não sejam necessariamente rurais -, sendo necessário descobrir ao longo da análise qual tipo de educação a escola oferece e em que medida isso influencia na produção do espaço, ou seja, na atual configuração do campo. Pode-se afirmar, que todas as escolas agrícolas educam no campo, ou pelo menos tentam, mas nem todas praticam uma educação rural.
A partir da distinção proposta por Melo (2011) é possível compreender
os distintos papéis que cada conceito ocupa dentro do meio educacional. Ao se falar, por exemplo, em implementação de novas tecnologias na Educação no Campo, entende-se que se trata de um espaço responsável pela educação da população que vive em zona rural, ou seja, um ambiente propício à inserção de novas técnicas e métodos de ensino. O contexto rural, como debatido anteriormente, apresenta grandes desafios para a utilização de novas técnicas de ensino. Isso ocorre por diversos fatores, dentre eles, a falta de acesso aos recursos necessários para ampliar a qualidade da educação ofertada para a população. Em meio a todo o avanço tecnológico vivenciado pela sociedade atual, o ambiente escolar precisa acompanhar essas transformações. As escolas urbanas experimentam o advento tecnológico de forma mais intensa e ampla, ao passo que para as escolas rurais, em sua maioria, a utilização de novas tecnologias esbarra em desafios ainda primários como a ausência de transporte público para a ida dos alunos à escola, ausência de material escolar, de estrutura física do ambiente educacional, etc. Esses desafios dificultam a construção de planos pedagógicos que de fato promovam a inserção da população rural na modernidade tecnológica, visto que ela pode ser uma ferramenta importante para o processo de aprendizagem. A partir de exemplos extraídos da realidade rural, a Universidade Federal de Pelotas- Rio Grande do Sul realizou uma pesquisa, no ano de 2011, ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 7
em uma escola localizada na região rural da cidade, com o objetivo de
compreender de forma geral quais as dificuldades enfrentadas pelos docentes para a utilização das tecnologias no ambiente educacional. De acordo com Mattos (2011), responsável pelo estudo, a finalidade da pesquisa se justifica pela necessidade de inserção das escolas em regiões rurais na realidade vivenciada atualmente, repleta de grandes e valiosos avanços tecnológicos. A pesquisa consistiu em apreender as reflexões e percepções dos 14 professores entrevistados, e a partir daí, a pesquisadora pôde traçar suas conclusões:
Mesmo reconhecendo que as tecnologias eram importantes
para a prática pedagógica, os professores deixaram evidente que o uso dos computadores, neste caso, o Laboratório Multimídia, não era prioridade naquele momento para a escola, pois, dos quatorze professores entrevistados, oito responderam que a prioridade para a escola era a construção de uma cozinha, pois o espaço era precário; quatro responderam que a escola deveria adquirir uma caixa de som com microfone e dois responderam que deveria melhorar os espaços escolares. Os dados revelaram que, dos quatorzes sujeitos entrevistados treze tem computador em casa, nove tem acesso à internet e cinco acessam a internet na Lanhouse. Também revelaram a finalidade que utilizavam o computador conectado a internet: cinco responderam que utilizavam para realização do planejamento das aulas; seis revelaram que apenas digitavam provas e trabalhos e que o acesso a internet servia para outras finalidades e três responderam que utilizavam computador conectado a internet para estudos particulares. (MATTOS, p. 341 e 342)
A constatação da pesquisadora reforça um cenário anteriormente
mencionado e constantemente debatido entre estudiosos por todo o país: a ausência de recursos primários destinados à educação. E no que se refere à educação nas regiões rurais, os desafios se amplificam. Outra constacacão importante refere-se à capacitação dos docentes para a utilização dos meios tecnológicos que, apesar de precários e insuficientes, são disponibilizados em algumas escolas. O papel dos professores no processo de inserção das novas tecnologias é, portanto, ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 8
fundamental e requer a construção de um plano de formação continuada,
voltada para o letramento digital.
4. A PRÁTICA DOCENTE NA EDUCACÃO NO CAMPO
O trabalho docente enquanto prática educacional compreende uma
gama de elementos responsáveis pela construção do ambiente escolar. A inserção de novas tecnologias no cotidiano escolar reflete os desafios encontrados pelos docentes no processo de inovar a educação através de novas ferramentas educacionais, que fomentem o ensino e desenvolva as potencialidades dos indivíduos. Em relação à educação no campo, a formação de professores é considerada recente de acordo com estudiosos da área. Segundo Jesus (2010), a conquista de uma formação adequada só foi possível devido às lutas dos movimentos sociais pelo direito à educação, organizações que possuem fundamental importância para a conquista de direitos nas zonas rurais. Algumas pesquisas realizadas por educadores e especialistas relacionadas ao trabalho docente nas escolas do campo apontam para “Professores com pouca formação escolar, com baixa ou nenhuma remuneração, escolas precárias, falta de material, altos índices de evasão, baixo aproveitamento pedagógico por parte dos alunos, dentre outros.” (MARTINS, 1974; CALAZANS, 1979; MAIA, 1982; CENAFOR, 1985; TURFFI, 1985; apud ANTUNES-ROCHA, 2004, p. 76). Além de todos os problemas apresentados pelos autores, há ainda as dificuldades circunstanciais enfrentadas pelas escolas no que se refere ao currículo, que na prática não está suficientemente adaptado à realidade do campo. Esse fato impede o desenvolvimento escolar de professores e alunos e faz com que o ensino ofertado nas escolas do campo não seja suficiente para efetivar de maneira qualitativa o processo de ensino e aprendizagem. As questões anteriormente mencionadas estão diretamente relacionadas à ausência de políticas públicas direcionadas ao campo e a insuficiência de ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 9
recursos para o ensino da população rural. Segundo Arroyo, “a falta de
políticas de formação de educadores e educadoras tem por base a ausência de uma política pública específica de educação ou o não reconhecimento do direito à educação básica da infância, adolescência e juventude do campo.” (ARROYO, 2007, p. 170). Isso se justifica pela negligência do Estado ao não reconhecer a importância das regiões rurais, fato motivado pela concepção capitalista de que com a evolução da sociedade, o percurso “natural” é de desaparecimento das comunidades rurais.
Em função do financiamento prioritário do Estado de
determinadas áreas de pesquisa, as Universidades e demais centros de pesquisa acabam também concentrando a sua atenção nas mesmas áreas e deixando de lado áreas que, embora importantes para a sociedade, são marginais aos interesses do Estado. (DAMASCENO; BESERRA, 2004, p.78)
De acordo com Marques (2014, p.3):
Daí não termos muitas pesquisas que tratem da educação no
campo (comparando-se com as que discutem a educação urbana) e menos ainda que tratem da formação de seus educadores porque essa formação não existia, o que em geral existia era a ausência de uma preparação específica ou, como alguns documentos apontam, o que existia/existe, em muitas regiões do país, ainda é uma “formação inadequada”.
Ainda sobre as políticas públicas voltadas para a educação no campo:
É claro que as pesquisas que temos realizado têm apontado
outros fatores relevantes para a oferta ainda precária de educação no campo: pouco investimento na infraestrutura das escolas no contexto rural (a escola no campo é, na maior parte das vezes, uma escola isolada, de difícil acesso, composta por uma única sala de aula. Até os dias atuais, parte das escolas rurais não possui prédio construído para a finalidade educativa, ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 10
operando nas casas dos professores ou em espaços
adaptados em instalações agrícolas desativadas das fazendas, barracões, estábulos e até currais. Em 89% delas, segundo dados do Censo Escolar 2011, não há bibliotecas; mais de 81% não contam com laboratórios de informática; em 99% das escolas no campo não existem laboratórios de ciências e, mais grave ainda, 15 % das escolas localizadas no meio rural sequer têm energia elétrica); pouco investimento pedagógico (as escolas localizadas no campo raramente contam com coordenação pedagógica e material didático apropriado. Assim, predominam nas escolas com as especificidades do campo currículos, concepções, conhecimentos e valores urbanos, o que cria dissociação entre a escola e a realidade do campo); historicamente, foram poucas as políticas públicas de educação do campo (...)” (MARQUES, 2014, p.4)
Outro problema que se destaca é a deficiência relacionada à formação
acadêmica ofertada aos professores das escolas no campo. No Brasil, os cursos superiores destinados à formação de docentes proporcionam aos futuros profissionais da educação uma instrução mais generalizada e ampla. Ou seja, os professores saem das universidades despreparados para enxergar os variados contextos escolares como diversos, entendendo que existem múltiplas realidades sociais. Diante disso, Arroyo ressalta que:
Em nome de formar um profissional único de educação, um
sistema único, com currículos e materiais únicos, orientados por políticas únicas, os direitos dos coletivos nas suas diferenças continuam não garantidos. Os piores índices de escolarização continuam nos “outros”, nos coletivos do campo, indígenas, pobres trabalhadores, negros. Essa perversa realidade, tão constante quanto excludente, interroga a tradição de políticas e normas generalistas, pretensamente universalistas. (ARROYO, 2007, p.62)
Por isso, ao concluírem seus cursos de licenciatura, os professores
estão treinados para enxergar a realidade do campo não como um contexto com suas próprias especificidades, mas sim como uma coisa só, sem distinguir as caraterísticas distintas entre, por exemplo, as escolas das regiões urbanas e as das regiões rurais.
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Esse fato resulta em um grave problema para o ensino cotidiano, pois
faz com que os docentes estejam despreparados para os problemas que enfrentarão nas salas de aula. As consequência disso são diversas: falta de motivação para lecionar, ausência de experimentação de novas técnicas e métodos de ensino adequados à realidade do campo, dificuldade na interação entre alunos e professores, dentre outros.
Há características específicas no exercício do magistério, na
administração e no fundamento das escolas multi-idades, agrupamentos por idades, por experiências de vida e trabalho, unidocência, docência por coletivos de idade... Na 5ª a 8ª séries da educação fundamental e na educação média e de EJA, o exercício do magistério ultrapassa os recortes das licenciaturas por disciplinas e avança para a formação por áreas e, se possível, em mais de uma área do conhecimento. Um modelo que já é normal em muitos sistemas de ensino e que parte de uma concepção e de um trato mais totalizante e transdisciplinar da produção e transmissão do conhecimento. (ARROYO, 2007, p. 168).
De acordo com Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo, de 2002:
Art. 13. Os sistemas de ensino, além dos princípios e diretrizes
que orientam a Educação Básica no país, observarão, no processo de normatização complementar da formação de professores para o exercício da docência nas escolas do campo, os seguintes componentes: I - estudos a respeito da diversidade e o efetivo protagonismo das crianças, dos jovens e dos adultos do campo na construção da qualidade social da vida individual e coletiva, da região, do país e do mundo; II - propostas pedagógicas que valorizem, na organização do ensino, a diversidade cultural e os processos de interação e transformação do campo, a gestão democrática, o acesso ao avanço científico e tecnológico e respectivas contribuições para a melhoria das condições de vida e a fidelidade aos princípios éticos que norteiam a convivência solidária e colaborativa nas sociedades democráticas. (BRASIL, 2002)
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É fundamental, portanto, compreender que a formação docente exige o
conhecimento da educação no campo de forma a dar atenção às suas especificidades e entender a importância de refletir acerca dos métodos e técnicas voltadas para o ensino da população no campo.
5. A PRÁTICA DOCENTE E O USO DE NOVAS TECNOLOGIAS NAS
ESCOLAS NO CAMPO
Apesar das inúmeras conquistas, os professores das escolas rurais ainda
enfrentam grandes problemáticas no que se refere à utilização de novas técnicas e métodos de ensino. De acordo com Fagundes (1999, p.25), a utilização de novos meios tecnológicos perpassa outros desafios para os docentes:
Conseguir alguns computadores é só o começo. Depois é
preciso conectá-los à internet e desencadear um movimento interno de buscas e outro, de trocas. Cabe ao professor, no entanto, acreditar que se aprende fazendo e saindo da passividade da espera por cursos e por iniciativas da hierarquia administrativa.
Cabe ao professor, portanto, reivindicar a formação adequada para o
uso das ferramentas disponíveis, e motivação suficiente para transcender os limites da educação tradicional. Esse movimento ainda representa grande desconforto para muitos professores por não estar habituados com a prática tecnológica. Assim sendo, o emprego de novas tecnologias no ambiente escolar requer, além de todos os fatores contextuais, a disponibilização de formação contínua e específica dos professores, dando-os acesso aos novos métodos de ensino tendo a tecnologia como uma das ferramentas de seu trabalho.
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Essa realidade que se expressa nas escolas de todo o país, se torna
ainda mais expressiva nas regiões mais carentes de recursos econômicos e de acesso à educação, como é o caso das escolas em zonas rurais. Nesse ambiente, a oferta de formação continuada e específica praticamente ausente, e com isso, o trabalho docente é permeado por grandes dificuldades. Portanto, a ausência de formação continuada visando a atenção às especificidades do ensino no campo, resulta, em muitos casos, no desenvolvimento de uma educação retrógrada, isenta de inovações. O ensino, a partir disso, se torna carente de novas tecnologias e recursos, fato que torna a educação insuficiente para as realidades do campo.
CONSIDERACÕES FINAIS
O processo de ensino e aprendizagem requer grandes esforços para a
construção de um ensino baseado no desenvolvimento intelectual, social e político dos indivíduos. Esses esforços se ampliam ao se tratar de cenários em que os desafios do contexto escolar são mais complexos, como é o caso das escolas no campo. Isso resulta em grandes desafios para as partes responsáveis pela educação. O Estado, as Universidades, os professores e coordenadores pedagógicos têm responsabilidades no cotidiano escolar, tanto em relação às políticas públicas voltadas para as escolas no campo, quanto para a elaboração de formação adequada para que os professores consigam enfrentas as múltiplas realidades do contexto rural. A utilização de novas tecnologias de ensino nas escolas localizadas nas regiões rurais representa grandes desafios ao se levar em consideração os fatores internos e externos à educação. É preciso refletir, portanto, acerca das problemáticas em torno das inovações necessárias para o pleno desenvolvimento da educação no campo, ¹ Pós-graduanda Lato Sensu em Docência do Ensino Superior e professora de matemática do Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com 14
e exigir dos órgãos responsáveis políticas públicas voltadas para atender às
necessidades específicas da zona rural, com o intuito de ofertar um ensino consistente, respeitando as diferenças e incentivando-as.
REFERÊNCIAS
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Ensino Fundamental. Orientador: Prof. Me. Mario Marcos Lopes. E-mail: donariaassis35@hotmail.com