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DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
MARIA GUIOMAR DE MELO - Antropóloga
CARLOS BORGES - Antropólogo
ALCIR GURSEN DE MIRANDA - Coordenador do Grupo de Trabalho Estadual do Estado de
Roraima
SUMÁRIO: Debate sobre demarcação da área contínua da Reserva Indígena Raposa Serra do
Sol, no Estado de Roraima.
OBSERVAÇÕES
Houve exibição de imagens.
Há expressões ininteligíveis.
Há intervenção inaudível.
Há oradores não identificados.
Grafia não confirmada: Luiz Sberni.
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINAL
Comissão Externa - Reserva Indígena Raposa Serra do Sol
Número: 0136/04 Data: 10/03/04
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Os índios necessitam de toda essa terra para que possam manter a sua
qualidade de vida e suas tradições. A relação do macuxi, dos pemons e dos outros
índios de lá com a terra é bem diferente da nossa. Eles encaram a terra como um
sujeito, como um outro. Lá é que está o mundo. Lá é que está o mundo do Mário de
Andrade quando fala em Macunaíma. E esse mundo deles está vinculado à terra, à
cosmologia da região.
O que é essa cosmologia? Não dá para separar, em certos momentos, o índio
da terra. Para eles, a terra é impossível de ser vendida, de ser cercada. Por isso,
onde tinha uma cuieira, que era a marca da aldeia, os índios abandonavam a terra
com os plantios e iam para outra área. Se chegasse um de nós e pedisse um lugar
para morar, eles diziam: “Você pode morar lá na cuieira velha”. Para os índios, era
impossível que aquela pessoa se apropriaria daquela área para depois negociá-la.
Em 1984, na região de Maloquinha, cheguei a conhecer uma pessoa casada com a
irmã do Gilberto Macuxi, que me disse que sairia da área — ele era não-índio. Para
isso, bastava eu lhe pagar o valor da área e dos 250 caboclos que trabalhavam para
ele. Quando ouvi isso, pensei: Onde estou vivendo? As pessoas pediam aos índios
um lugar para morar e depois se apropriavam de sua terra, de seu trabalho e se
sentiam donos dos próprios índios.
Essa situação foi mudando porque os índios usaram dos nossos meios para
reconquistar aquela terra. Foi uma reconquista que obtiveram em processo que
começou, só de regularização fundiária, em 1977, mas que é histórico. Se
pensarmos em Lobo D’Almada, em Joaquim Nabuco, no Marechal Cândido Rondon
e em todos os historiadores daquela região, veremos que os índios macuxis,
pemons, ingaricós, taurepangs ocupavam aquela região. Na verdade, existem
pemon e kapon como autodenominação, e nós demos vários nomes. Na verdade, se
observarmos, são só 2 grupos.
Eles sempre ocuparam aquela região. Quando definimos os limites da nossa
terra com a Inglaterra — Joaquim Nabuco foi nosso grande defensor —, o que
garantiu os limites e aquela terra foi a ocupação indígena. Isso está nos anais da
história deste País, mostrando que os índios sempre ocuparam a área e sempre
estiveram do nosso lado.
O mesmo acontecerá se formos ao Mato Grosso do Sul e pesquisarmos a
Guerra do Paraguai — que tem toda uma história, com várias interpretações.
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Sr. Relator, Sra. Maria Guiomar, não existe um membro nesta Comissão que
não tenha interesse em preservar a comunidade indígena, sua cultura e suas
tradições. Todos temos esse interesse. Tanto que nós, na condição de Constituintes,
trabalhamos por aqueles capítulos destinados aos índios — o art. 231, seus
parágrafos e incisos, e o art. 232. Mas, lamentavelmente, senhora antropóloga, há
um desvirtuamento na conceituação de posse permanente indígena. O art. 231
reconhece aos índios sua organização social, seus costumes, suas línguas, suas
tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.
Vejam, o verbo está no presente, portanto, que ocupam no momento da
promulgação da Constituição.
Ninguém, em absoluto, quer tirar o direito dos índios, mas é preciso que seja
analisado o caput do artigo, que fala em terras tradicionalmente ocupadas, e seu §
1º, que define quais são essas terras: as por eles habitadas em caráter permanente;
as utilizadas para suas atividades produtivas; as imprescindíveis à preservação dos
recursos ambientais necessários ao seu bem-estar; as necessárias a sua
reprodução física e cultural, segundo seus usos, seus costumes e suas tradições —
estou cansado de repetir isso.
Partindo desse princípio, Sra. Maria Guiomar, quantos laudos antropológicos
foram realizados na área Raposa Serra do Sol, em que anos foram feitos e quais as
áreas de cada levantamento? Qual foi a população indígena encontrada em cada
levantamento? Quantas aldeias existiam em cada levantamento? A senhora disse
que percorreu quase toda a área. Qual é o tamanho atual da área? Quanto tempo a
senhora levou para percorrê-la? Quais os meios usados para fazê-lo?
A senhora nos informou de que o laudo foi produzido com base na ocupação
pelos índios, mas causa-me estranheza que exista sede de um Município dentro
dessa área. A ocupação tem que ser permanente e atual. Ora, se naquele momento
os índios não ocupavam aquela área, ela não atende ao requisito constitucional, a
não ser que existisse uma diferenciação na Constituição entre índios e não-índios.
Mas não existe.
O princípio geral é que todos são iguais perante a lei. Tanto nós, que não
somos índios, como os índios temos os mesmos direitos e as mesmas obrigações —
no que diz respeito a eles, essas obrigações são pretensamente tuteladas pela
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Aproveito para falar sobre como foi elaborado o relatório que levou à
demarcação da Raposa Serra do Sol. Vivo há 6 anos naquele Estado. Apaixonei-me
por ele e procurei conhecê-lo não só na sua aparência, mas também nos seus
interstícios, nas suas fissuras. Talvez essa forma de me inteirar com a realidade do
Estado tenha-me permitido ter algumas opiniões e idéias que nem sempre agradam
aos que militam pela causa indígena, pessoas dignas, por quem tenho grande
reconhecimento, e a alguns antropólogos que lá estiveram, muitos talvez com a
impossibilidade de conhecer profundamente a realidade do Estado porque
permaneceram lá 2, 3 dias, dada a circunstância, tendo de se locomover do campo
para o hotel.
Para sentir a realidade de Roraima é preciso viver entre os índios, não em 1
ou 2 malocas. É preciso conhecer profundamente a realidade, o contexto social, a
vida de cada comunidade indígena. Para conhecer o que possibilitou a realização de
uma aliança ou, se preferirem, de uma aproximação com os não-índios, é preciso
viver com eles, procurar compreender que muitos e muitos deles desbravaram
aquela região do Norte do Brasil e que sem eles talvez o Brasil não possuísse
aquela terra. Muitos dos antepassados dessas pessoas estão lá sepultados.
Roraima tem de ser vista como um caminho de 2 vias.
Por que se chegou a uma dimensão de mais de 1 milhão e 600 mil hectares
para a área Raposa Serra do Sol, sendo que, em muitos locais, basta compulsar
informações históricas para verificar que, no início do século passado, antes mesmo
de Joaquim Nabuco arbitrar a disputa entre Brasil e Inglaterra, os índios estavam
mais na Guiana do que no Brasil? Em nenhum momento vi os laudos antropológicos
da FUNAI apresentarem esse tipo de informação.
Por que os índios preferiam viver na Guiana a viver no Brasil? Temos um
mapa de 1902, de Stradelli, que viveu um tempo em Manaus e lá morreu. Nele se
verifica grande grupo de brasileiros vivendo na Guiana. Naquela época, muitos
brasileiros viviam na Guiana e apenas 1 escocês, que formou grande família
naquela região, através do casamento interétnico. É preciso saber por que os índios
estavam na Guiana, e não no Brasil, naquela época. A partir daí se pode
compreender a mobilização migratória que os levou da Guiana para o Brasil.
Em 1969, aconteceu um levante na Guiana, que indispôs os fazendeiros,
descendentes da família encontrada por Stradelli, em 1902. Se fosse feita uma
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análise séria, seria possível saber por que os índios estavam na Guiana. Os
fazendeiros empregavam os índios, que recebiam salários, pois aprenderam na
Guiana o labor com o gado. O levante aconteceu pelo fato de a Venezuela
reivindicar toda a parte do Essequibo. Atualmente, toda a região do Essequibo é
incluída na zona en reclamación. A Venezuela financiou uma revolta que durou
apenas 1 dia e foi absolutamente desastrosa para o Rupununi, porque deixou de
existir o que fazia com que os índios permanecerem na região. Quando se deu o
levante, parte desses índios migraram para a Venezuela.
Inicialmente, o Governo venezuelano cedeu para eles um conjunto residencial
inteiro. Não conseguindo sobreviver na realidade urbana, os índios migraram para
outra terra venezuelana, próxima a Santa Helena. Posteriormente, um grupo desses
índios retornou e passou a viver próximo da Raposa, formando a Raposa II.
Por que essas informações não aparecem nos laudos antropológicos? Por
omissão, dificuldade de se entender realidade que parece objetiva e clara? Por que
omitir que parte dos índios que vivem hoje no lavrado entre as serras e os Rios Maú
e Tacutu são índios que vieram do processo de migração, em conseqüência da
revolta no Rupununi?
Os mais velhos ainda falam inglês. E isso não aparece nos laudos. Aquela
região passou a ser ocupada sistematicamente no final do século XIX, inicialmente
para garimpo e depois para o gado das fazendas nacionais que haviam fracassado
em seus objetivos de tornar o Vale do Rio Branco área de criação de gado. Os
fazendeiros passaram a criar gado e não tiveram inicialmente — temos de
reconhecer — relação amistosa com os índios. Mas em que lugar no Brasil houve
relação amistosa com os índios?
Demarcar terra para os indígenas nada mais é do que pagar uma dívida do
passado. Se bem que, na minha opinião, há dívida impossível de se pagar com os
negros, que foram transladados de suas terras, trazidos para cá e feitos escravos.
Os fazendeiros que se estabeleceram usando mão-de-obra indígena
beneficiaram-se de um sistema de parentesco, chamado de cunhadismo por Darcy
Ribeiro. Com certeza, as relações não eram amistosas.
Como disse anteriormente, tudo muda, e a história de Roraima é dinâmica,
como em qualquer outra parte do Brasil. A realidade que se vê hoje na Raposa
Serra do Sol não é a mesma daquele tempo. É preciso ter muita cautela, para que
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de cada eixo da rodovia eram da União. Em Roraima, ainda temos esse problema, o
que agrava a situação fundiária. E o pior é que, com a transformação do território de
Roraima em Estado, a União não repassou ao novo Estado as terras. Hoje até o
Palácio do Governo de Roraima pertence à União, e nada é do Estado.
Além disso, temos de ver o perfil ambiental e a atividade agrária em Roraima.
Temos em Roraima 9 Unidades de Conservação, com mais de 6 milhões de
hectares, das quais mais de 6,5 milhões estão em área indígena. Além disso, estão
sendo criadas mais 4 Unidades de Conservação, com mais de 700 mil hectares.
Fazendo um levantamento de todas essas áreas institucionais, indígenas,
ambientais e do Exército, sobram para Roraima apenas 7,1% do seu território para
produzir. Roraima é tradicionalmente um Estado pecuarista, e o arroz irrigado
torna-se uma esperança. A produção primária ainda é incipiente, mas já representa
23% do PIB do Estado. Roraima precisa de área para produzir nesses 2 vieses: o
agronegócio e a agricultura familiar e indígena, que o Estado apóia plenamente.
Temos em Roraima hoje, por exemplo, o feijão Flexal, que é produzido na maloca.
Não podemos deixar de observar o potencial de exportação de Roraima, já
que estamos próximos aos portos do Caribe. Para se ter uma idéia, a distância entre
Boa Vista e São Paulo é a mesma que entre Boa Vista e Miami. Estão ali a Guiana,
a Venezuela e o Caribe. Há tudo para exportar, depende apenas de oportunidade.
De maneira geral, o perfil indígena de Roraima nos traz 32 áreas indígenas.
Todas essas áreas, sem exceção, sofreram ampliações. A ianomâmi sofreu várias
ampliações. Wai-wai, Trombeta/Mapuera e, especialmente no caso de que nós
estamos falando aqui, a área indígena Raposa Serra do Sol.
O Ministro Nelson Jobim registrou no seu laudo que não houve nenhum
fundamento antropológico, ou qualquer outro fundamento para ampliar a área
indígena Raposa Serra do Sol. Não houve fundamento nenhum. Ampliaram porque
acharam que tinham de ampliar.
Existe uma contradição muito grande nessas ampliações, porque foram feitas
sem fundamento. E — o que é sério — mais de 500 pessoas em Roraima já foram
retiradas de suas áreas para criação de áreas indígenas, e nenhuma foi indenizada
pelo Governo Federal. O que este fará agora? Será que só na Raposa Serra do Sol
haverá indenização? Vão arranjar outra área para os produtores rurais se assentar?
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na região de Maturuca, a que teve menor porcentagem a favor, 86%. Houve maloca
que votou 100% a favor do Município. Na maloca do Flexal, com 145 índios, 144
votaram a favor. Isso quer dizer que os índios estão dizendo “sim” ao Município.
Essa é a verdade dos índios, e não das pessoas que vão passear em Roraima e
desconhecem a realidade de cidades e vilas, da sua infra-estrutura, das benfeitorias
e histórias.
Fato marcante a esse respeito ocorreu quando o então Ministro Nelson Jobim
esteve na área. O Júlio Gaiger — que Deus o tenha no céu —, então Presidente da
FUNAI, disse que essas vilas e cidades eram corruptelas de garimpo, não havia
nada lá. O Ministro Nelson Jobim foi à área e quando viu o que tinha em Socó
proibiu o Júlio Gaiger de subir no avião, porque tinha mentido. E quem for a Roraima
vai constatar isso. Dessas vilas, a mais nova foi fundada em 1940. Surumu foi
fundada em 1905, Socó em 1908, Uiramutã em 1911, e as pessoas desconhecem
isso.
Outro fator importante são os recursos naturais e seu aproveitamento na
região. Já dissemos que há pecuária tradicional nessa região, que já teve mais de
80 mil cabeças de gado e hoje tem arroz irrigado, uma esperança para a economia
do Estado, um potencial turístico muito grande, recursos hídricos, até mesmo para
construção de usina hidrelétrica no Cotingo. Lamentavelmente, não sei por que
razão, Roraima importa energia da Venezuela, quando a região de Cotingo pode
produzir energia suficiente para atender ao Estado.
Outro ponto importante a ser considerado é a água. Essas áreas indígenas
estão nas nascentes dos rios. O mais interessante são os recursos minerais do
Estado de Roraima. E há outra coincidência: essas áreas indígenas são criadas nas
reservas de minerais.
Analisando juridicamente a questão, observamos que o Ministro Nelson Jobim
tem razão nos comentários que fez. E é dele a observação de que devem ser
preservados os ajuntamentos urbanos, as vilas, as cidades, devem ser excluídas as
rodovias, os imóveis titulados pelo INCRA e as áreas com rede de energia elétrica. E
diz ainda o Ministro Nelson Jobim que deve ser considerada a posse indígena,
observada a Constituição de 1934.
Em 1934, foi consagrada constitucionalmente no Brasil terra ou área indígena
— antes não havia consagração constitucional. De acordo com os estudos
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vestígios da presença física dos povos macuxis naquela região. Como era uma área
imensa, evidentemente havia membro dessa mesma etnia no lado da Guiana.
Posteriormente, por causa do tratado, houve a separação entre o Brasil e a Guiana.
O mesmo aconteceu na África, com povos similares, que foram separados
artificialmente pela demarcação coronelista dos países europeus.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Nós temos um ritual que
quero apresentar até mesmo para os Deputados que não fazem parte da Comissão,
mas que têm também toda a liberdade de fazer suas indagações. Como eu também
tenho algumas perguntas a fazer à antropóloga e aos companheiros, pediria ao
Deputado Eduardo Valverde que, enquanto isso, tomasse meu lugar na Presidência.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Valverde) - Com a palavra o
Deputado Moacir Micheletto.
O SR. DEPUTADO MOACIR MICHELETTO - Sr. Presidente, Sras. e Srs.
Deputados, ilustres palestrantes, estou aqui também na qualidade de membro da
Comissão que participou de todas as audiências públicas. E muito mais, porque
também fui ao Estado de Roraima ver o que se passa lá.
A audiência de hoje é de suma importância porque toda a discussão aqui se
dá em função do produto com o qual V.Sa. trabalha, que originou a possibilidade de
se delimitar a área em discussão. Farei algumas perguntas. Se a senhora não puder
respondê-las agora, posso entregá-las por escrito. Quero ser sincero e dizer que não
me aprofundei no seu relatório. Apenas pude lê-lo rapidamente para ter uma noção.
Como não sou técnico em tudo o que ele apresenta, procurei ouvir outras pessoas.
Eu tenho 6 perguntas para fazer a V.Sa.
1ª- Quantos dias a senhora ficou no Estado de Roraima, inclusive para emitir
o seu laudo?
2ª - No processo de identificação ou de delimitação da área, consta o laudo
etno-ambiental, com a identificação de etnias lá existentes? A senhora foi no local,
conversou com as pessoas, visitou todas? Qual é a responsabilidade de V.Sa. ao
emitir um laudo dessa natureza, que está trazendo tantas conseqüências? Faço
essas perguntas para poder ter mais tranqüilidade.
3ª- O laudo antropológico, que instruiu o processo de delimitação e
demarcação da área Raposa Terra do Sol, preenche as exigências do Decreto nº
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1.775/96, aquele que tem sido apontado pelo Ministro Jobim, que teve a lucidez de ir
verificar in loco a situação indígena no Estado de Roraima?
4ª- O processo de demarcação da área Raposa Serra do Sol atende às
exigências da Portaria nº 14/96 da FUNAI, que a senhora bem conhece?
5ª- O seu laudo informa que havia sobre a área 181 localidades. A senhora foi
a declarante, efetuou o trabalho de campo identificando tais localidades? Essa
notificação é da senhora ou não? Quem fez esses levantamentos?
6ª- No ano de 1992, quando foi realizado o laudo, a FUNAI forneceu
condições materiais para que fosse realizado um levantamento seguro, sério e
preciso para área com tamanha extensão, ou esse levantamento padeceu de
melhores condições, cuja falta poderia ter influído na sua qualidade?
Gostaria que a senhora fosse sincera sobre essa questão, ou seja, se teve
realmente todos os instrumentos necessários para exercer seu trabalho, porque
estamos aqui tratando de assunto muito sério para o Brasil. O Congresso Nacional,
neste exato momento, está tentando encontrar uma saída pacífica para a situação, e
o seu relatório pode de fato ajudar muito. A senhora tinha condições de realizar
relatório de natureza a que possa ser entregue à sociedade brasileira para que o
submetamos à aprovação?
Partindo do princípio de que as informações dos demais laudos são
divergentes das constantes no laudo apresentado por V.Sa., pode-se afirmar que os
demais laudos estão errados?
Nesse processo, tivemos 5 subgrupos de trabalhos, todos com proposta
diferente de seu grupo. V.Sa. pode afirmar que são necessários, de fato, os 1 milhão
e 700 mil hectares? E os 4 laudos que não foram aprovados por V.Sa.? Peço a
V.Sa. esclarecimentos a respeito dessas informações, visto que está em debate,
neste exato momento, seu laudo antropológico.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Valverde) - Convido novamente o
Deputado Moacir Micheletto para reassumir os trabalhos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Feito isso, vamos dar
início aos debates. Pergunto aos demais palestrantes presentes se desejam
responder aos questionamentos dos nobres pares ou se preferem ouvir, primeiro,
todos os Srs. Deputados.
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do meu relatório de 1988. O trabalho foi feito por uma equipe multidisciplinar. Não foi
baseado apenas no meu trabalho. Eu fiz uma parte, comentando a história. O Paulo
Santilho fez outra parte, complementando os dados. Tivemos advogados na equipe,
como a Ana Paulo Souto e outros, que elaboraram uma peça jurídica sobre a área.
Foi feito um levantamento por terra, todo ele coordenado. Havia um técnico da
FUNAI, um técnico ambiental da Secretaria de Meio Ambiente e líderes indígenas. O
Donaldo de Souza Marcolino fez parte desse grupo. Cada região daquelas, Raposa
Serra do Sol, Xununuetamu, Surumu e Baixo Contingo, não foram somente
indicadas pelo CIR. Houve endosso do CIR, mas eles indicaram as pessoas que
deveriam fazer o levantamento.
Fui à área, verifiquei que era necessário completar os dados e informei ao
Secretário que iria colher as peças que faltavam e posteriormente as enviaria.
Levamos um ano para fazer isso. O pessoal dirigiu-se para a área, onde
permaneceu de 6 a 8 meses nesse trabalho. Enquanto isso, foram editadas 4
portarias, com a média de 3 meses cada uma. Coordenei o trabalho. Fiz um resumo
do relatório anterior para mandar a essa Comissão Especial de Análise. Ia
submetendo periodicamente os dados que tinha e o que a equipe de campo me
enviava. Eu ia fazendo um resumo de tudo e apresentava à Comissão Especial de
Análise mensalmente. Dessa forma, fomos fazendo o trabalho, e levou um ano para
ficar pronto.
Concluído o levantamento, resumi o trabalho, que foi entregue à Comissão
Especial de Análise. O Dr. Arthur Nobre Mendes, à época, Presidente da FUNAI,
servidor daquela Casa e antropólogo, fez um resumo e encaminhou ao Ministro da
Justiça. Havia prazo para entregar o relatório. Nessa época, o decreto que
regulamentava esse trabalho era o Decreto nº 22. Mais tarde, passou para o Decreto
nº 1.775, depois a Portaria nº 14.
Peguei o último relatório que fiz baseado na Portaria nº 14. O meu relatório é
muito próximo das exigências da Portaria nº 14. Falta o relatório etno-ambiental.
Hoje, a Portaria nº 14 determina que para identificar uma área preciso desse
relatório. No entanto, a Raposa Serra do Sol não começou a ser demarcada hoje.
Ela foi demarcada anteriormente. Hoje ela está sendo homologada. O Brasil gosta
de fazer leis; não as cumpre, mas gosta. É uma verdade. Há leis que não acabam
mais. Hoje, eu colocaria como necessário um relatório etno-ambiental para as
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terra, o que não significa que não será mais terra indígena. Estou seguindo o que diz
um jurista e não um antropólogo. Nada disso. Essa jurisprudência da 5ª Região da
Justiça Federal diz que, se eu tiver uma posse anterior, um registro em cartório de
escritura pública anterior a 1934, e se identifico aquela área como indígena, tenho
de indenizar a terra, porque, nos processos indenizatórios da FUNAI, o valor da terra
não está incluso. No entanto, nunca se reclamou das indenizações da FUNAI, que
até indeniza muito bem, é verdade.
O SR. DEPUTADO ASDRUBAL BENTES - Em Roraima, há processos de
mais de 10 anos que ainda não foram pagos. (Risos.)
A SRA. MARIA GUIOMAR DE MELO - Mas há pessoas em Roraima que
receberam indenização e que continuam em área indígena. Os Uai-Uai são assim.
Nesse ponto, vem a questão de um funcionário público, e por isso passo a
usar o art. 327 do Código Penal. Vou usar a lei chamando-o de funcionário público e
não de servidor. O que ele fez? O Coordenador Renato Leoni foi àquelas pessoas
que tinham sido indenizadas pelos Uai-Uai e lhes disse para permanecerem ali.
Depois, não sei se essas pessoas continuaram, porque não acompanhei essa
questão dos Uai-Uai. Ele lhes disse para continuarem na terra; agiu como
funcionário público, e tinha a responsabilidade de ir até lá. Se não estou de acordo
com isso, como servidora que sou, tenho de me afastar, mas não posso ir contra
uma decisão do Estado. Lá dentro há muitos jogos políticos, o que também ocorreu
em Roraima. Espero ter respondido sua pergunta.
Falei sobre a questão dos dias, da demarcação, do decreto, da portaria e da
localidade. Volto às perguntas de V.Sa. e sigo em frente. Se não respondi tudo,
depois V.Sa. me questione novamente.
Quanto à posse permanente do índio, estou me referindo a uma posse
jurídica e não apenas uma questão antropológica. A Constituição anterior a 1988 diz
que é terra imemorial. Temos aí uma questão muito presa, a da imemorabilidade,
que continua em vigor, mas fomos ampliando os conceitos tanto jurídicos quanto
antropológicos. Então, temos hoje essa questão da forma tradicional como o índio
ocupa a terra, que é diferente da nossa.
Um módulo rural em Brasília é de 2 hectares, como reza a Fundação
Zoobotânica de Brasília. Um japonês com 2 hectares em Brasília tira mais do que
qualquer fazendola em Roraima, porque ali está investido muito capital. Cada
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pedacinho é aproveitado. Basta seguir a Estrada Parque de Taguatinga para ver que
a terra é extremamente explorada. Essa é a forma de eles ocuparem a terra. Eu não
posso chegar junto aos índios e querer marcar o local da roça, ver onde eles caçam
e saber sua relação com as outras aldeias e os outros povos.
Por exemplo, disse que o Ingaricó era um povo isolado, o que foi confirmado
pelo colega e pelo Gestor de Estado. Quando fui fazer esse levantamento em 1984,
só pude ir de avião até a Maloquinha. Da Maloquinha a Serra do Sol, não havia pista
de pouso. Só havia pista de pouso na região de Monte Roraima. Fiz um
levantamento de toda essa região por sobrevôo, com um engenheiro cartógrafo que
me acompanhou, e plotamos todas as aldeias porque não havia como pousar.
Assim, o contato dos Ingaricó com a sociedade é muito recente, embora
sempre tenham participado das assembléias dos tuxauas que acontecem todo ano
— era no mês de janeiro e agora estão prorrogando. Acredito que seja em janeiro.
Em Brasília, ainda não voltou a funcionar. Eles chamam muita gente de fora para
participar. Todos eles participam, e pode haver divergências, que ocorrem em toda
sociedade, inclusive dentro dos partidos políticos que não conseguem ter unidade.
Da mesma forma, há diversas formas de pensar no mundo indígena.
Hoje, uma pessoa me escreveu dizendo querer a demarcação de Raposa
Serra do Sol. Ele foi o primeiro candidato do PT, junto com David Yanomami, a
Deputado em Roraima, o Sr. Gilberto Pedrosa Lima. Em 1986, ele encaminhou um
documento à FUNAI pedindo a demarcação da terra Raposa Serra do Sol como
área única. Ele batalhou para sair; saiu e foi até a portaria. Posteriormente, ele saiu
do PT e mudou de lado. Isso tudo a gente tem de trabalhar ao longo dos anos.
Euclides Pereira pediu a demarcação, em 20/9/1993, junto com Clóvis e
Valdir Tobias. Agora, o Euclides disse que pensa de outra forma. Quer dizer, as
pessoas mudam também. Antes, ele tinha a cobertura da COIAB e, quando houve
desvio na coordenação e a entidade indígena exigiu um posicionamento sobre a
probidade administrativa, porque ele recebia dinheiro público que a COIAB recebia
do convênio de saúde, ele mudou de lado. Portanto, temos de analisar cada índio,
pois hoje eles estão inseridos no processo, junto com o Estado, sendo parceiros do
Estado.
O CIR é parceiro do Estado no convênio com a FUNASA. Se há erro, não é o
CIR que erra, não é a entidade que erra, não é a FUNAI que erra. Quem erra,
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quando é feito um levantamento, sou eu: Maria Guiomar de Melo. Não foi a FUNAI
quem demarcou errado, foi o indivíduo. É isso que tem de ser observado.
Assim, temos de olhar esses índios que estão passando a ter várias posições,
saber da sua probidade administrativa, porque alguns estão envolvidos no
escândalo dos gafanhotos. Não é verdade? Então, temos de verificar a história
desses índios e fazer um levantamento. Todos podemos utilizar a ABIN para ver sua
situação.
Não é possível que, depois de um longo processo, de tanto trabalho para
chegarmos às áreas indígenas, eles fiquem enviando documentos para a FUNAI
sem parar, cobrando um posicionamento e, no dia em que tomamos esse
posicionamento, eles dizem que não é mais daquela forma. Tudo isso tem de ser
pensado, visto e analisado. O que está causando tudo isso? Por isso, o Estado
precisa de uma ABIN, precisa de um setor de informação. Assim, ele pode fazer
esse levantamento.
Tudo isso tem de ser observado quando se trata de demarcação. Hoje há
posicionamentos do tipo: tem índio desse lado, tem índio daquele lado. Sempre
houve divergências. Eles tiveram divergências. Nesse ponto, vou incluir uma
questão histórica da organização dos índios.
O primeiro grande líder dos índios Macuxi foi o Tuxaua Gabriel, que lutou na 2ª
Guerra Mundial. Ele foi como um expedicionário, voltou e começou a pensar num
processo de demarcação de terra indígena. Naquela época não se falava no
processo como um todo. Ele vai mostrar e comprar as posses dos não-índios que
estavam próximos à Aldeia da Raposa, comprando-os com farinha.
O SR. DEPUTADO ASDRUBAL BENTES - Permite-me? Seguindo esse
raciocínio: quer dizer que, na II Guerra Mundial, o índio Gabriel foi à guerra e na
volta já queria comprar posses de pessoas que estavam naquela área?
A SRA. MARIA GUIOMAR DE MELO - Exatamente. Ele foi para a Europa e...
O SR. DEPUTADO ASDRUBAL BENTES - Então, a senhora só está
robustecendo o meu ponto de vista.
A SRA. MARIA GUIOMAR DE MELO - Não, deixe-me falar. Nunca neguei a
existência da ocupação, assim como nunca neguei que toda aquela terra era
indígena, porque havia um espaço maior ocupado pelos índios. Pode-se pegar uma
área mais ampla ocupada pelos wapixanas, que são aruaques. Trata-se de uma
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área que adentrava a Fazenda São Marcos e ocupava uma área maior. Os macuxis
ocupavam uma vasta região e havia relações entre eles. Naquela época, as
fronteiras ainda não estavam muito bem definidas, tanto da Guiana, quanto da
Venezuela e do Brasil. Havia um intercâmbio comercial entre eles mesmos, com o
comércio de artesanato, em que o ralo waiwaí era o mais valorizado. O ralo
maiongong na área yanomami era o mais valorizado. Era a moeda. Eles tinham
intercâmbio entre eles e também com o mundo dos brancos.
Com o tempo, os macuxis também se foram expandindo sobre o território
wapixana. Todos eram índios, não havia brancos ainda. Houve, então, uma guerra
histórica entre wapixanas e macuxis, e estes ocuparam uma área maior. Isso é
comum em todas as áreas, não na área de Raposa Serra do Sol. Por exemplo, os
grupos caiapós — e chamamos de caiapós os gorotirés —,têm uma disputa
intertribal e vão ocupando território. O próprio território yanomami era uma área mais
restrita. E quando falo em território, não quero menosprezar o território nacional,
mas destacar uma área de uma etnia, de um povo. Os aruaques e caribes ocuparam
a fronteira que hoje é a região de Aricó, Boas Novas. Os yanomamis têm 5 línguas,
que vêm muito do caribe. Então, os primeiros lingüistas que estudaram os
yanomamis estudaram os yanans ou ninans . Eles falavam a língua caribe, porque
muitas palavras entraram nessa língua, e eles foram expandindo o seu território.
Isso é uma coisa natural, não é um processo. Não é somente a nossa sociedade
que se expande, as outras sociedades também.
Aquela região sempre foi uma área indígena, apenas ao longo do tempo é
que se começou a ter posse. Quem foram os primeiros posseiros da região
indígena? A Transbrasília de Roraima.
O SR. DEPUTADO ASDRUBAL BENTES - Acho que já estamos divagando
historicamente. Fiz perguntas e não obtive respostas. Estou confirmando meu
convencimento com base no que ela acabou de afirmar, inclusive, já de décadas
atrás. Está tudo sendo gravado, não é?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Está sendo gravado, Sr.
Deputado, e anotado pelo Sr. Relator.
O SR. DEPUTADO ASDRUBAL BENTES - Seria muito importante, já que
esta demarcação está concluída, embora não homologada — e ela só é perfeita e
acabada como ato jurídico quando o Presidente homologá-la —, que esta Comissão
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mas quero repetir essa pergunta. Ou V.Sa. atendeu a uma proposta feita pelo CIR e
pelos tuxauas?
No seu laudo, há uma informação de que a demarcação afetará crucialmente
61 ocupantes da área — consta do seu laudo. A senhora alegou também que não
existia nenhuma infra-estrutura naquela área indígena que demandasse indenização
substancial. Eu lhe pergunto: esse laudo, datado de 1984, não incluiu o Vale do
Arroz?
No seu laudo, há informações de que existiam posses particulares de colo nos
civis sobre terras que pertenciam ao Estado. Quando a senhora disse “Estado”,
referia-se à União, ao Estado de Roraima ou, ainda, ao antigo Estado do Amazonas,
quando ainda pertencíamos ao Estado do Amazonas? Essas posses civis são
anteriores ao laudo arbitral de 1901, que definiu os limites das nossas fronteiras com
a antiga Guiana inglesa?
Consta também do seu laudo a afirmação de que cada aldeia necessita de
aproximadamente 3 a 40 hectares para cultivo e que esses índios precisam desses
3 a 40 hectares no período de 3 a 5 anos, porque o cultivo se esgota nesse período,
e eles, então, teriam que ser removidos para outra área. A senhora poderia
confirmar se essa é a área de que cada uma das aldeias necessita, porque, no seu
laudo, consta que o número de aldeias, de malocas, era de 83, habitadas por 10 mil,
87 índios. E qual foi o meio utilizado para essa constatação, de que havia 10 mil, 87
índios nessas 83 malocas?
O laudo diz, ainda, que a equipe que realizou o trabalho para a identificação
foi constituída pela FUNAI, composta de quatro membros do CIR, uma organização
não-governamental, por uma advogada e um assessor jurídico da Diocese de
Roraima, também instituições privadas.
A senhora disse também que 61 propriedades seriam afetadas, mas que
havia nessa área 140 fazendas cuja ocupação dataria do início do século XX. Como
se chegou a essa informação de que só 61 propriedades seriam afetadas, mas que
havia 140 fazendas, cuja propriedade datava do início do século XX?
Por último, consta no processo que o engenheiro José Jaime Mancin elaborou
memorial descritivo de identificação dessa área Raposa Serra do Sol, mas não
participou do trabalho de campo. Ele declara que não participou do trabalho de
campo, ele faz essa declaração no processo.
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da demarcação. Deixo uma interrogação: quem está a favor dos índios? Estamos
todos pensando no bem-estar dos índios e creio que eles devem ser ouvidos. A
palavra deles deve ser creditada neste relatório, que, com certeza, subsidiará o
Presidente Lula.
Em relação ao laudo antropológico, na maioria das vezes, quando se fala em
número de habitantes, em população, se diz: cerca de, aproximadamente etc. Os
próprios índios têm chamado a atenção para isso quando se fala em realizar um
plebiscito ou mesmo um censo, porque não se tem o número exato da população
naquela região, nem indígena, nem branca. Faz-se cogitação, e creio que não
podemos mais aceitar isso. O resultado de uma resposta pautada em cima de
cogitação, normalmente não sai a contento. V.Sa. já explanou os critérios adotados
e como foram estabelecidos para se chegar a um resultado. Sabemos que os
costumes e tradições dos índios foram mudados pelo homem branco — produtores,
agricultores, fazendeiros — e pelos próprios missionários que ali chegaram.
Graves denúncias são feitas pelos próprios índios, e não pelos brancos. A
Justiça deve investigá-las. Quanto à venda de ouro, existem documentos passados
pelos próprios índios de depósito de organizações em conta no exterior. Não sei até
que ponto isso é verídico, mas existe cópia de um documento de depósito cujo valor,
segundo informações, corresponde ao ouro extraído pelos índios, passado a
determinadas organizações e depositado no exterior. Não tenho como provar isso,
mas os próprios índios que aqui virão representar algumas organizações poderão
apresentar algumas denúncias. Essas denúncias devem ser investigadas.
Queremos ver os resultados.
Quero também saber o sentido da palavra corruptela, citada aqui, porque para
nós, da Região Norte, é um termo pejorativo que pode designar até mesmo uma
zona de prostíbulo.
O que me preocupa em relação à posse da terra, no caso da homologação da
Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, é como ficarão aqueles índios, que estão
aculturados, acostumados a plantar, a levar seu produto para ser vendido nos
Municípios e na Capital. Os meios de transportes que passam por ali servem para
locomovê-los. Com a homologação aqueles índios ficarão abandonados, a exemplo
do que ocorreu com outros índios, em outras regiões demarcadas?
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também o plantio. Não sei quão corajoso seria desligar as bombas e ver murchar as
hastes do nosso arroz, a alavanca econômica do nosso Estado.
Quanto à população indígena, registro nos Anais que, no Mato Grosso, houve
um índio candidato a Deputado Federal. Apesar da campanha bem alicerçada em
cima das comunidades indígenas, ele não conseguiu mais do que 2 mil e 800 votos.
Então, não é possível que haja 15, 30, 50 mil índios, como apregoam diversas
organizações internacionais. Restrinjo-me aos dados do IBGE, independentemente
de serem ou não adequados. É um órgão oficial.
A perambulação não existe mais no meu Estado; aliás, não existe mais no
Brasil. O índio perambulou no passado, realmente saiu do Caribe e quase chegou à
Patagônia. Hoje, o índio está restrito a uma área muito pequena, não vai mais do
que 1 ou 2 quilômetros além da sua aldeia. Realmente, na busca pela assistência
social que a FUNAI não dá, ele se fixa principalmente próximo às sedes municipais,
perto de pelotões do Exército. Não existe mais perambulação, não temos mais
índios nômades e muito menos na Raposa Serra do Sol, cuja área não tem caça.
Naquela área, o índio depende de açougue e de energia para ter sua geladeira.
São estas as minhas considerações. Agradeço a oportunidade e aguardo as
respostas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Obrigado, Sr. Deputado.
Passo a palavra ao Deputado Fernando Gabeira.
O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA - Obrigado, Sr. Presidente. Uma
das desvantagens de não pertencer à Comissão é sempre ficar por último, mas
também é uma vantagem.
Existem alguns temas aqui na Câmara dos Deputados que vão atravessando
o tempo. Às vezes, quando vemos esses temas, fugimos, porque percebemos que
estamos ficando velhos. Lembro-me da discussão sobre a Raposa Serra do Sol em
1994, quando o ex-Deputado Jobim esteve lá. Depois, criamos uma Comissão do
Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, presidida, à época, pelo Senador Sarney
e relatada pelo Gilney, se não me engano. Agora foi criada outra Comissão, mas o
debate continua o mesmo.
Não sou um conhecedor dos relatórios. Estive lá em duas ou três
circunstâncias, uma por causa dos incêndios, outra com os militares. Tenho a
impressão de que esse problema não vai ser resolvido tecnicamente. Não adianta
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dizer que são 61 ou 50 mil, ou querer analisar o mapa do Stradelli, porque pode
aparecer teoricamente outro mapa da época que contenha algo diferente. Então, o
ideal seria fazermos uma reflexão política.
Penso que é importante demarcar aquela área. Repito: é importante, vamos
demarcá-la. Agora, ao demarcarmos aquela terra, com o consentimento da
população abrangente, teremos de pagar um preço. Vamos ter de pagar um preço
àquela população que se sente prejudicada ou atingida.
Talvez possamos avançar mais se tentarmos levantar os últimos
acontecimentos que tenho seguido, observando que, da parte do Governo de
Roraima e da sociedade, existe uma tendência à negociação. Se examinarmos ao
longo do tempo, tenho a impressão de que hoje as concessões feitas já são maiores
do que antes. Os senhores que estão há mais tempo na negociação talvez tenham
percebido isso também.
Quem sabe, a Comissão não possa orientar seu trabalho no sentido de
buscar essa solução política e oferecê-la para o Governo? Confesso que sou um
pouco cético a respeito de o Governo aceitar sugestão. O Governo não conversa
muito. Às vezes são governos muito iluminados que não querem saber de nada.
Temos visto, pelo desenvolvimento deles, como são iluminados. Só fazem coisas
corretas, só vão no ponto certo. Mas como essa questão é complexa, quem sabe?
Vamos esperar que nos ouçam. Acho que, ouvindo, podemos iniciar um processo
político, sem desmerecer os laudos, para buscar um entendimento sobre qual terra
seria demarcada e para saber se a população e os índios ficariam satisfeitos.
Vivemos muito isso aqui. Houve vários processos longos, como o da Mata
Atlântica, o do Código Florestal, que vamos levar adiante. Quem sabe não podemos
avançar um pouco?
Da minha parte, posso fazer um trabalho muito grande — todos sabem minha
posição — no sentido de que as resistências sejam menores. Mas é necessário que
os senhores também façam a sua parte. Por exemplo, reconheço que há grande
ignorância sobre a Amazônia e que se deve atacar esse “achismo” sobre aquela
região.
Por outro lado, não podemos responder à ignorância sobre a Amazônia com
ignorância sobre o mundo. Não podemos nos referir às organizações não-
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governamentais como “as tais das ONGs”. Essas organizações são o que há de
mais importante no processo político moderno.
Se examinarmos as últimas apresentações do Brasil no exterior, desde a
reunião de Beijing, passando pela reunião da Dinamarca sobre pobreza e pela
reunião de Johannesburgo sobre meio ambiente, o Brasil já não é mais
representado somente pelo Governo, mas também pelas organizações não-
governamentais, que são um instrumento da sociedade. Evidentemente que
algumas vêm de fora, mas podem contribuir, ou não, de acordo com a maneira como
encaminhamos.
A outra questão é que, no caso de Roraima, não se pode afirmar que o
desenvolvimento daquele Estado foi determinado só por essas circunstâncias,
quando sabemos que há outras, como a dos gafanhotos, que é importante, porque
mostra a prática predatória das classes dominantes. Predatória no sentido de não
canalizar o dinheiro para a população e no sentido de desviar da população um
dinheiro que, às vezes, vem do País como um conjunto.
Não é a essa situação unicamente que podemos atribuir o não-
desenvolvimento de Roraima. É também a um problema que deve ser examinado no
contexto das classes dirigentes de Roraima, que ofereceram ao Brasil um
espetáculo bastante deprimente nos últimos anos. Lamentei que isso tivesse
acontecido agora, porque também enfraqueceu muito o debate sobre a questão.
Mas podemos e devemos buscar um caminho. Se o problema é contínuo ou
não, podemos sentar e pensar. Se o problema são os arrozais irrigados, podemos
pensar nisso. Será que os índios, com a terra demarcada, teriam alguma coisa
contra os arrozais irrigados? Se demarcada a terra dos índios, será que os
produtores de arroz não poderiam pagar a esses índios pela utilização da terra?
Quem sabe não achamos uma saída que não seja esse jogo de um brigar com outro
constantemente, sem acharmos uma solução?
Toda vez que os canadenses vêm aqui falar da maneira como resolveram
suas questões indígenas, ficamos entusiasmados, porque conseguiram solucionar
questões até mais complexas.
Quem sabe, dessa vez, quando existe a real possibilidade de homologar, não
podemos pensar uma saída para essa questão das áreas contínuos ou não? O que
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fazer com as benfeitorias que estão lá? Podemos pensar nisso e oferecer ao
Governo uma saída.
A minha experiência diz que o Governo não entra em bola dividida. Em todas
as questões do Brasil, o Governo sempre nos manda na frente para discutir. Quando
queriam legalizar ou não as drogas me chamaram e disseram: “Nunca nos metemos
nesse assunto, mas você, que é um liberal, e o Deputado Elias Murad, que é um
proibicionista, vão discutir e sentir o que a sociedade pensa”. Então, o Governo nos
usa, o que é razoável, para tentarmos abrir caminhos.
Quando encontrarmos uma situação que não seja de bola tão dividida, o
Governo homologa. A nossa tarefa neste momento não é mais de definir a questão,
de precisar tantos detalhes, mas de oferecer ao Governo a solução política para
essa questão. Confio que a Comissão possa oferecer essa solução e me coloco à
disposição para contribuir com isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Obrigado, Deputado
Fernando Gabeira. A participação de V.Exa. é de suma importância, dado o
conhecimento que tem do assunto e por ter participado dele no passado. Posso
antecipar ao Deputado que está havendo clima de entendimento, uma conversação
oficiosa da Comissão com o Governo, com a participação ativa da bancada de
Roraima, que tem desprendimento extraordinário.
Ontem o Governador esteve aqui por mais de 2 horas e meia para fazer uma
explanação. Com V.Exa. nos ajudando, tenho certeza de que vamos achar uma
solução nesse sentido. Se é contínuo ou não, o que pode ser feito? Há proposta de
entendimento do lado dos índios e do lado do Governo.
Acredito que nosso Relator será sábio quanto a isso. Tem sido de uma
riqueza extraordinária as audiências públicas. Temos produtos extraordinários em
cima disso. Tenho a absoluta certeza de que vamos encontrar uma solução para o
Estado de Roraima nesse conflito, que é de suma importância para sua economia.
Pergunto se os Deputados de Roraima e o Senador querem fazer uso da
palavra. Estamos concedendo a palavra por 3 minutos para depois finalizar com o
Relator.
(Não identificado) - Quero fazer apenas uma correção nas palavras do
Deputado Fernando Gabeira, a quem admiro muito, quando disse que toda a classe
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índia, casada com um cearense, estava em pânico. O que fazer? Há uma situação
constituída hoje ali em decorrência de um processo histórico.
A diferença também, Deputado Gabeira, que senti muito, em relação à área
Ianomâmi, é de quem vem de fora. Diziam que são tribos primitivas, mata fechada,
que são nômades, saem atrás de caça e pesca. Não é o caso. Com a minha
ignorância, vi que há um grau acentuado de sedentarismo. São fixos, muito
integrados. Apresento a minha visão, porque sei que falo para entidades com as
quais teremos oportunidade de discutir. Queremos negociar isso. Temos como
celebrar um acordo para retirar algo em torno de apenas 7% dessa área total,
mantendo-a em área contínua. A tendência, se não assinar agora, é que os conflitos
se agravem. Mais à frente, não sai nada, porque a situação vai se agravar. Vai haver
dificuldade até para a ocupação se desenvolver. Na proposta do Governo do Estado,
chega a 15%...
(Não identificado) - São 10%.
O SR. DEPUTADO LINDBERG FARIAS - Não, chega a um pouco mais do
que isso, porque se coloca ali Igaipó. E o Monte Roraima é uma preocupação que
tenho também. Como preservá-lo? Na verdade, essa não é a fonte do conflito que
gera esse negócio todo.
A fonte do conflito é que está ali a única atividade produtiva, numa área não
tão grande, que é na ponta, na parte de baixo, Deputado Gabeira. E há aquele
Município.
Acho que se conseguíssemos amadurecer a questão, para tentar estabelecer
um acordo como esse... O Presidente Lula dizia isso. É preciso minimamente... Não
sei se as pessoas têm essa noção também, na política, de relação de forças. A
política é feita disso. Mas se o Presidente da República assina algo contra todos os
Deputados Estaduais, Vereadores, Deputados Federais, tudo assim no Estado, sem
uma margem de manobra... Acho que nós, aqui, teríamos condições de estabelecer
esse acordo.
Minha manifestação aproveita a intervenção do Deputado Fernando Gabeira.
Não são 15 dias. Deputado Gabeira, tenho conversado sobre isso com o Deputado
Valverde, que é outro que pode ajudar muito. Tenho essa sensação nas minhas
conversas. Ou sai de uma coisa assim ou o negócio enrola; faz-se uma revisão toda
e daqui a pouco vai ter de atualizar o laudo antropológico. Daqui a pouco vai entrar
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Boa-noite.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Obrigado, Carlos
Borges.
Passo a palavra ao Dr. Alcir.
O SR. ALCIR GURSEN DE MIRANDA - Obrigado, Sr. Presidente.
Quero registrar neste fecho a minha origem. Muitas vezes, as pessoas
pensam que nascemos Juiz de Direito, professor universitário; eu nasci lá na central
do Marajó. Eu sou caboclo marajoara; tenho maior orgulho disso. Agora, claro,
minha mãe, quando foi para a cidade grande, com 7 curumins, nos levou para
estudar. Entendemos que essa é a aspiração natural do ser humano: querer algo
sempre mais, estudar e aprender. Assim também os índios; não com aquela
segregação natural, como diz o tuxaua Jonas Marcolino, fazer zoológico de seres
humanos. Não é por isso que lutamos. Estou aqui hoje falando para os senhores
porque não abro mão da minha origem cabocla.
Quero registrar um fato. O laudo antropológico foi elaborado de acordo com o
Decreto nº 22/91 e hoje não tem validade alguma; é nulo de pleno direito.
Outra coisa que quero dizer, que me espanta bastante, são as informações
históricas do laudo antropológico. Dizer que Marari é uma área mitológica e que os
macuxis permitem que outros índios cacem na região é um equívoco histórico
tremendo, porque nativos da região são os wapixana. Os macuxis chegaram à
região depois de destruir, em guerra interétnica, de brigar com os wapixanas, boa
parte dos wapixanas. Então, na região, os nativos são os wapixanas, não são os
macuxis. Eles chegaram depois de mil e novecentos e uns trocados. Essas
informações me preocupam bastante; são dados históricos.
E tenho outra preocupação também. Não sei por que os dados antropológicos
não citam Theodor Koch-Grünberg, que mostra, em estudo feito em 1911, muito
bem onde estavam os índios. E mais ainda: quando o rei da Itália definiu o
arbitramento, o Brasil perdeu 19.000 quilômetros quadrados — o Rio Maú e o Rio
Tacutu — exatamente porque ali estavam os índios macuxis.
Estas as observações que queria fazer no final.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moacir Micheletto) - Obrigado, Dr. Alcir.
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Número: 0136/04 Data: 10/03/04
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