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FICHA DE AVALIAÇÃO FORMATIVA 2

NOME: _____________________________________ N.º: ______ TURMA: _________ DATA: _________

GRUPO I

Leia o seguinte excerto do Capítulo VIII de Viagens na minha terra, de Almeida Garrett.

Eram dadas cinco da tarde, a calma declinava, montámos a cavalo, e cortámos por entre os viçosos
pâmpanos1 que são a glória e a beleza do Cartaxo; as mulinhas tinham refrescado e tomado ânimo; breve,
nos achámos em plena charneca2.
Bela e vasta planície! Desafogada dos raios do Sol, como ela se desenha aí no horizonte tão suavemente!
5 que delicioso aroma selvagem que exalam estas plantas, acres e tenazes de vida, que a cobrem, e que
resistem verdes e viçosas a um sol português de julho!
A doçura que mete na alma a vista refrigerante de uma jovem seara do Ribatejo nos primeiros dias de
abril, ondulando lascivamente com a brisa temperada da primavera, — a amenidade bucólica de um campo
minhoto de milho, à hora da rega, por meados de agosto, a ver-se-lhe pular os caules com a água que lhe
10 anda por pé, e à roda as carvalheiras classicamente desposadas com a vide coberta de racimos 3 pretos —
são ambos esses quadros de uma poesia tão graciosa e cheia de mimo, que nunca a dei por bem traduzida
nos melhores versos de Teócrito ou de Virgílio, nas melhores prosas de Gessner ou de Rodrigues Lobo4.
A majestade sombria e solene de um bosque antigo e copado, o silêncio e escuridão de suas moitas
mais fechadas, o abrigo solitário de suas clareiras, tudo é grandioso, sublime, inspirador de elevados
15 pensa-mentos. Medita-se ali por força; isola-se a alma dos sentidos pelo suave adormecimento em que eles
caem… e Deus, a eternidade — as primitivas e inatas ideias do homem — ficam únicas no seu
pensamento…
É assim. Mas um rochedo em que me eu sente ao pôr do Sol na gandra erma e selvagem, vestida
apenas de pastio bravo, baixo e tosquiado rente pela boca do gado — diz-me coisas da terra e do céu que
20 nenhum outro espetáculo me diz na natureza. Há um vago, um indeciso, um vaporoso naquele quadro que
não tem nenhum outro.
Não é o sublime da montanha, nem o augusto do bosque, nem o ameno do vale. Não há aí nada que
se determine bem, que se possa definir positivamente. Há a solidão que é uma ideia negativa…
Eu amo a charneca.
25 E não sou romanesco. Romântico, Deus me livre de o ser — ao menos, o que na algaravia 5 de hoje se
entende por essa palavra.
Ora a charneca dentre Cartaxo e Santarém, àquela hora que a passamos, começava a ter esse tom, e a
achar-lhe eu esse encanto indefinível.
Sentia-me disposto a fazer versos… a quê? Não sei.
30 Felizmente que não estava só; e escapei de mais essa caturrice. Mas foi como se os fizesse, os versos,
como se os estivesse fazendo, porque me deixei cair num verdadeiro estado poético de distração, de
mudez — cessou-me a vida toda de relação, e não sentia existir senão por dentro.

ALMEIDA GARRETT, Viagens na minha terra,


ed. crítica de Ofélia Paiva Monteiro, Lisboa, IN-CM, 2010 [1846].

(1) pâmpanos: ramos de videira.


(2) charneca: terreno inculto, onde há apenas vegetação rasteira.
(3) racimos: cachos de uvas.
(4) Teócrito, Virgílio, Gessner e Rodrigues Lobo: nomes de escritores. Teócrito — poeta grego (século III a. C.);
Virgílio — poeta romano (século ia. C.); Gressner — poeta e pintor suíço (século XVIII); Rodrigues Lobo — poeta
português (século XVI), considerado discípulo de Camões.
(5) algaravia: linguagem confusa e difícil de perceber.

Apresente, de forma clara e bem estruturada, as suas respostas aos itens que se seguem.

ENTRE NÓS E AS PALAVRAS • Português • 11.º ano • Material fotocopiável • © Santillana


1. Retire do primeiro parágrafo do texto expressões que permitam justificar o título Viagens na
minha terra.

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2. Mostre, a partir do excerto, que o narrador apresenta uma visão subjetiva da natureza, na qual
esta surge personificada. Justifique com duas transcrições textuais.

3. Demonstre a presença, no texto, de uma reflexão sobre a literatura, aliada a um tom coloquial.

Leia a cantiga de D. Dinis.

Que soidade1 de mia senhor hei


quando me nembra2 dela qual a vi,
e que me nembra que ben’a oí3
falar; e por quanto bem dela sei,
5 rog’eu a Deus que end’há o poder,4
que mi a leixe,5 se lhi prouguer,6 veer

Cedo; ca, pero mi nunca fez bem,7


se a nom vir, nom me posso guardar
d’ensandecer8 ou morrer com pesar;
10 e porque ela tod’em poder tem,9
rog’eu a Deus que end’há o poder,
que mi a leixe, se lhi prouguer, veer

Cedo; ca tal a fez Nostro Senhor,


de quantas outras no mundo som
15 nom lhi fez par,10 a la minha fé,11 nom;
e poila fez das melhores melhor,
rog’eu a Deus que end’há o poder,
que mi a leixe, se lhi prouguer, veer

Cedo; ca tal a quiso Deus fazer12


que, se a nom vir, nom posso viver.

D. Dinis

IN MARIA EMA TARRACHA FERREIRA, Antologia


literária comentada — Idade Média, 4.ª ed., Lisboa, Ulisseia, s/d, p.
75.

(1) soidade: saudade.


(2) nembra: lembra.
(3) oí: ouvi.
(4) que end’há o poder: que tem o poder de fazer isso.
(5) leixe: deixe.
(6) se lhi prouguer: se lhe agradar.
(7) pero mi nunca fez bem: embora nunca me tenha feito bem.
(8) ensandecer: enlouquecer.
(9) tod’em poder tem: tem todo o poder.
(10) nom lhi fez par: não lhe deu par (Nosso Senhor fê-la de tal modo que não há outra igual).
(11) a la minha fé: segundo creio; por minha fé.
(12) tal a quiso Deus fazer: Deus quis fazê-la assim.

Apresente, de forma clara e bem estruturada, as suas respostas aos itens que se seguem.

1. Explique o desejo do sujeito poético e indique as consequências que poderão surgir caso ele não
se concretize.

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2. Indique três características temáticas das cantigas de amor evidenciadas na composição poética
de D. Dinis. Justifique a sua resposta com transcrições textuais.

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GRUPO II

Leia o texto seguinte. Em caso de necessidade, consulte as notas apresentadas.

A Europa da segunda metade, e especialmente dos últimos decénios, do século XVIII é uma Europa mais
do que nunca contraditória. Estas contradições revelam-se a vários níveis. Por exemplo, a nível político:
países de governo liberal como Inglaterra, paralelamente à aristocracia ditatorial russa, à monarquia absoluta
francesa, ao despotismo1 esclarecido português, prussiano ou austríaco. A nível económico e social: uma
5 Europa onde predomina, a oeste, o grande comércio da burguesia citadina e, a leste, uma nobreza ainda
totalmente feudal. Por outro lado, uma nova Europa se anunciava, a América do Norte, terra prometida dos
emigrantes ingleses e outros, essa América do Norte que soube, entre outras coisas, conciliar a ideologia
iluminista com o puritanismo. Enfim, a influência cultural de países orientais que a Europa parecia dominar,
como a China, torna-se importante, começando a formar-se em vários domínios uma certa mitologia do
10 Oriente, mitologia que o Romantismo vai cultivar, prolongando o seu fulgor decadentista até princípios do
nosso século.
Acrescente-se que a viagem, inclusive a viagem pelo Oriente, desde Montesquieu2, não é já um capricho
de grão-senhor, nem tão-pouco peregrina vagabundagem de intelectual marginalizado ou de aventureiro,
mas sim aprendizagem sistemática de usos e costumes, complemento da educação. Com os românticos,
15 a viagem tornar-se-á uma iniciação total, uma procura do «eu». Note-se ainda que, precisamente neste
sentido de viagem como iniciação e de fascinação do Oriente, o próprio Goethe 3 deu uma grande lição de
romantismo com o seu West-östlicher Diwan (1815-1819).
Todas estas contradições levaram, no domínio da criação estética sobretudo, a uma consciência da
incompletude que reflete, no fundo, a consciência de que a história do Ocidente não podia ser apenas a
20 história do racionalismo grego e cartesiano. Consciência, afinal, da incompletude, ou mesmo da inutilidade,
de toda a história considerada como evolução civilizacional linear. Como diz Paul Hazard: «Tudo o que as
épocas sucessivas deixam atrás de si são estaleiros abandonados; cada uma se deforma antes mesmo de
haver alcançado o termo da sua formação; […] e acaba por desaparecer deixando atrás de si, em vez da
ordem que sonhara, um caos maior ainda.»

ÁLVARO MANUEL MACHADO, As origens do Romantismo em Portugal,


Instituto de Cultura Portuguesa, 1979, pp. 16-17.

(1) Despotismo: forma de governo em que o poder é exercido de forma absoluta e arbitrária.
(2) Montesquieu: filósofo francês (século XVIII).
(3) Goethe: escritor alemão (séculos XVIII-XIX).

1. Para responder a cada um dos itens, de 1.1 a 1.7, selecione a opção correta. Escreva, na folha de
respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção escolhida.

1.1. O advérbio «paralelamente» (linha 3)


(A) reforça a ideia de uma Europa politicamente muito semelhante no fim do século XVIII.
(B) reforça a tese de uma Europa politicamente muito diferente no fim do século XVIII.
(C) enfatiza as assimetrias sociais e económicas existentes na Europa do fim do século XVIII.
(D) enfatiza a hegemonia russa no fim do século XVIII.
1.2. No fim do século XVIII, a Europa
(A) uniformiza-se do ponto de vista social e económico.
(B) começa a influenciar a cultura dos países orientais.
(C) começa a receber a influência da cultura dos países orientais.
(D) começa a criar a sua própria mitologia, a qual irá influenciar o Oriente.
1.3. A partir do Romantismo, a viagem
(A) torna-se uma experiência comum, mas apenas entre as classes privilegiadas.
(B) torna-se uma experiência simbólica, permitindo alcançar o conhecimento individual.
(C) passa a simbolizar a existência do intelectual marginalizado.
(D) passa a ser considerada a única forma de educação.

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1.4. A referência a Goethe permite
(A) comprovar a influência da Europa sobre a cultura oriental.
(B) demonstrar que o Romantismo recebeu a influência do Oriente.
(C) demonstrar que o Romantismo influenciou a cultura oriental.
(D) mostrar que, para o escritor romântico, o Oriente é culturalmente inferior.
1.5. Relativamente ao pensamento grego e cartesiano, o Romantismo é
(A) uma perspetiva que também faz a apologia da razão.
(B) uma perspetiva oposta.
(C) uma perspetiva diferente.
(D) uma visão que crê numa evolução civilizacional linear.
1.6. A expressão «estaleiros abandonados» (linha 22) é uma
(A) hipérbole.
(B) sinédoque.
(C) metáfora.
(D) hipálage.
1.7. No contexto em que surge, o vocábulo «domínio» (linha 18) significa
(A) «poder».
(B) «âmbito».
(C) «influência».
(D) «limite».

2. Identifique o tipo de coesão textual assegurada:

a) pela repetição do vocábulo «Europa» no primeiro parágrafo.


b) pelo determinante «seu» (linha 10).

3. Classifique a oração «que a Europa parecia dominar» (l. 8).

4. Indique três vocábulos que façam parte do campo lexical de «viagem».

GRUPO III

Viajar! Perder países!


Ser outro constantemente,
Por a alma não ter raízes
De viver de ver somente!

FERNANDO PESSOA

Escreva um texto de opinião em que se refira à importância que as viagens podem ter na aquisição de
conhecimento e a nível do enriquecimento pessoal. Apresente dois argumentos que comprovem a
validade da sua perspetiva.
Construa um texto bem estruturado, com introdução, desenvolvimento e conclusão, com um mínimo de
duzentas (200) e um máximo de trezentas (300) palavras.

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