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O caso julgado (cj) consiste no efeito atribuído pela ordem jurídica às decisões finais

proferidas por determinado órgão jurisdicional em determinado processo que, porque se


encontra já ultrapassado o prazo para das mesmas recorrer para um Tribunal superior,
passam a ter-se por juridicamente consolidadas, ou seja, inalteráveis no que respeita à
definição jurídica da situação sobre a qual versaram.[1]

Importará, por outro lado, distinguir o cj material do cj formal.

Figura homóloga (mas distinta), importada do direito processual civil para o direito
administrativo, consiste no designado caso decidido ou caso resolvido. O Principio do
Caso Julgado decorre do Principio da Segurança jurídica.

Em outras palavras, "Caso julgado", previsto na LINDB, é a característica de


imutabilidade encontrada em alguma decisão proferida. Quando se forma a 'coisa
julgada' ou 'caso julgado', a decisão proferida não é passível de revisão, ou seja, não
mais cabe recurso a tal sentença. Vale ressaltar que, em casos especiais, cabe a ação
rescisória, isto é, mecanismo pelo qual a 'coisa julgada' poderá ser revista.

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça


Processo: 1871/11.0SLSB.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: ISABEL PAIS MARTINS
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
NOVOS FACTOS
NOVOS MEIOS DE PROVA
CASO JULGADO
DEVER DE LEALDADE
CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
CARTA DE CONDUÇÃO
MINISTÉRIO PÚBLICO
ARGUIDO
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
AUSÊNCIA

Data do Acordão: 29/04/2015


Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: RECURSO PENAL


Decisão: PROVIDO
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL PENAL - PROVA / MEIOS DE PROVA /
PROVA DOCUMENTAL - RECURSOS / RECURSOS
EXTRAORDINÁRIOS.
Doutrina:
- Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I volume, Coimbra
Editora, Limitada, 1974, p. 44.
- M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, “Código de Processo Penal”
Anotado, II volume, 2.ª edição, Editora Rei dos Livros, pp. 1042, 1043.
- Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal,
2.ª edição, Universidade Católica Editora, anotação 12. ao artigo 449.º.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 165.º, N.º1, 449.º,
N.º1, AL. D), 457.º, N.º2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO
29.º, N.º6.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 11/07/2013, PROCESSO N.º 364/04.7PTLRS-A.S1.

Sumário :

I - As causas do recurso de revisão elencadas no n.º 1 do


art. 449.º do CPP são taxativas.
II - Para os efeitos da al. d) desse normativo, «factos ou
meios de prova novos» serão aqueles que eram ignorados
pelo tribunal e pelo requerente ao tempo do julgamento e,
por isso, não puderam, então, ser apresentados e
produzidos, de modo a serem apreciados e valorados na
decisão. Com efeito, só esta interpretação observa a
natureza excepcional do recurso de revisão e os princípios
constitucionais da segurança jurídica, da lealdade
processual e da protecção do caso julgado.
III -Para além de os factos ou meios de prova deverem ser
novos, no sentido apontado, é, ainda, necessário que eles,
por si ou em conjugação com os já apreciados no
processo, sejam de molde a criar dúvidas fundadas sobre
a justiça da condenação.
IV -No caso em apreço, o documento que, posteriormente
ao trânsito em julgado da decisão condenatória, chegou
ao processo, comprovando que o arguido, à data da
prática dos factos por que foi julgado autor de um crime
de condução sem habilitação legal, era, afinal, titular de
documento que o habilitava a conduzir, constitui tanto
para o tribunal como para o MP, requerente da revisão,
«meios de prova novo» de um facto desconhecido e,
nesse sentido, «novo», com a virtualidade de pôr
inquestionavelmente em causa a justiça da condenação do
arguido.
V - É certo que o arguido não podia ignorar que era titular
de carta de condução. Mas não é ele o requerente da
revisão, por forma a que o conhecimento que ele tem do
facto o descaracterize como «facto novo». Por outro lado,
não tendo contestado, nem comparecido no julgamento, o
arguido deixou que fossem ultrapassados os momentos
próprios para dar conhecimento ao tribunal de que era
titular de carta de condução, por forma a que esse facto
pudesse ser atendido na sentença. E, por isso, não teria
qualquer viabilidade a interposição de recurso ordinário
da sentença com base no facto de o arguido ser titular de
carta de condução.
VI - Deve, pois, ser autorizada a revisão.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de
Justiça

            1. No processo comum, com intervenção do


tribunal singular, n.º 1871/11.0SILSB, da Comarca da
Grande Lisboa-Noroeste, foi o arguido AA, filho de --- e
de ---, nascido a ---, natural de ---, residente na Rua ---,
condenado, por sentença de 03/04/2014, pela prática de
um crime de um crime de condução sem habilitação legal,
p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3
de Janeiro, na pena de 3 meses de prisão.

            Fundamenta-se essa condenação, além do mais,


no facto, dado por provado, de, no dia 3 de Dezembro de
2011, pelas 00h00, na Rua ---, o arguido conduzir o
veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ----LH----,
sem possuir carta de condução ou outro documento legal
que o habilitasse à condução do veículo na via pública.

2. Vindo a apurar-se que o arguido se encontrava detido


pelo SEF, no âmbito do processo de expulsão n.º
265/2013DRLVTA, foi emitido mandado judicial de
condução do arguido ao estabelecimento prisional para
cumprimento da pena de 3 meses de prisão em que se
encontrava condenado, vindo esse mandado a ser
cumprido no dia 24/02/2015, data de entrada do arguido
no Estabelecimento Prisional de Lisboa.

3. Posteriormente, veio o arguido aos autos informar que


possuía carta de condução de ---, emitida em 11/07/2002,
juntando cópia certificada da mesma e informando que
esse facto já fora comprovado noutros processos,
nomeadamente, no processo n.º 336/11.5.PAAMD, da
Comarca de Lisboa Oeste, conforme cópia da sentença
que juntou.

Pediu, a final, que o Ministério Público requeresse a


revisão da sentença, com fundamento no disposto no
artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo
Penal[1].
Dos elementos juntos, com o requerimento, verifica-se o
seguinte:

– a carta de condução, com o n.º S-26748, autoriza o


arguido a conduzir veículos da categoria B, desde
11/07/2002 e tem prazo de validade até 26/06/2047;

– no processo n.º 336/11.5PAAMD, da Comarca de


Lisboa Oeste, na sequência de interposição de recurso de
revisão, que autorizou a revisão, procedeu-se a novo
julgamento do arguido, nos termos do artigo 457.º, n.º 1,
do CPP, vindo o arguido, por sentença de 16/12/2014, a
ser absolvido da prática de dois crimes de condução de
veículo sem habilitação legal, por cuja prática, em
28/04/2011 e 27/08/2011, tinha, antes, sido condenado,
por se ter provado que o arguido é titular de carta de
condução emitida pela República de ---, que o habilita a
conduzir veículos da categoria B, desde 11/07/2002.

4. O Exm.º Juiz determinou a instrução do processo com


certidão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de
08/05/2013, que autorizou a revisão da sentença em qua o
arguido AA havia sido condenado no referido processo
n.º 336/11.5PAAMD, e outros elementos.

5. Veio, então, o Ministério Público interpor recurso de


revisão da sentença proferida nos autos, com fundamento
na alínea d) do n.º 1 do artigo 459.º do CPP, em vista,
afinal, de o arguido se encontrar, à data dos factos por que
foi condenado, habilitado a conduzir o veículo em causa.

6. Na informação a que se refere o artigo 454.º do CPP, o


Exm.º Juiz pronunciou-se no sentido de existir
fundamento para a revisão uma vez que dos documentos
juntos aos autos resulta que, à data dos factos, o arguido
possuía habilitação legal para conduzir o veículo em
causa.

            8. Neste Tribunal, tendo-lhe ido os autos com


vista, pronunciou-se o Ministério Público pela
autorização da pretendida revisão, requerendo, ainda, a
suspensão da execução da pena, ao abrigo da norma do
artigo 457.º, n.º 2, do CPP.
9. Colhidos os vistos, com projecto de acórdão, realizou-
se a conferência.

            Da mesma procede o presente acórdão.

II

            1. Para além dos elementos já recenseados,


interessam à decisão ainda os seguintes:

            – o arguido, embora regularmente notificado, não


compareceu na audiência de julgamento, nem comunicou
ao tribunal qualquer impossibilidade de estar presente,
vindo a ser julgado na ausência;

            – foi representado por defensora oficiosa, a quem


foi notificada a sentença na data da sua prolação;

            – o arguido foi pessoalmente notificado da


sentença em 18/01/2015;

            – a mesma transitou em julgado em 17/02/2015;

            – antes do trânsito em julgado da sentença, o


arguido não reagiu à decisão condenatória por qualquer
forma.

            2. O artigo 29.º, n.º 6, da Constituição da


República, estatui que «os cidadãos injustamente
condenados têm direito, nas condições que a lei
prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos
danos sofridos».

            Na concretização desse princípio, o Código de


Processo Penal, entre os recursos extraordinários,
consagra o de revisão, nos artigos 449.º e ss., que “se
apresenta como um ensaio legislativo com vista ao
estabelecimento do equilíbrio entre a imutabilidade da
sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de
respeito pela verdade material”[2].

            O recurso de revisão, prevendo a quebra do caso


julgado, contém na sua própria razão de ser um atentado
frontal ao valor da segurança jurídica inerente ao Estado
de Direito, em nome das exigências do verdadeiro fim do
processo penal que é a descoberta da verdade e a
realização da justiça.

            Com efeito, se se erigisse a segurança em fim


ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal, “ele
entraria, então, constantemente em conflitos frontais e
inescapáveis com a justiça; e prevalecendo sempre ou
sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma
segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos
têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente
e ser só, no fundo, a força da tirania” [3].

            “Entre o interesse de dotar de firmeza e segurança


o acto jurisdicional e o interesse contraposto de que não
prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente
a verdade e, através dela, a justiça, o legislador escolheu
uma solução de compromisso que se revê no postulado de
que deve consagrar-se a possibilidade – limitada – de
rever as sentenças penais.”[4]

            Todavia, o recurso de revisão, dada a sua natureza


excepcional, ditada pelos princípios da segurança
jurídica, da lealdade processual e do caso julgado, não é
um sucedâneo das instâncias de recurso ordinário.

            Só circunstâncias substantivas e imperiosas


devem permitir a quebra do caso julgado, de modo a que
o recurso extraordinário de revisão se não transforme em
uma “apelação disfarçada”[5].

            3. Daí que sejam taxativas as causas da revisão


elencadas no n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo
Penal.

Interessando, ao caso, o fundamento da alínea d) do n.º 1


do artigo 449.º – a revisão da sentença transitada em
julgado é admissível quando «se descobrirem novos
factos ou meios de prova que, de per si ou combinados
com os que foram apreciados no processo, suscitem
graves dúvidas sobre a justiça da condenação».

            Deve interpretar-se a expressão “factos ou meios


de prova novos” no sentido de serem aqueles que eram
ignorados pelo tribunal e pelo requerente ao tempo do
julgamento e, por isso, não puderam, então, ser
apresentados e produzidos, de modo a serem apreciados e
valorados na decisão. Com efeito, só esta interpretação
observa a natureza excepcional do recurso de revisão e os
princípios constitucionais da segurança jurídica, da
lealdade processual e da protecção do caso julgado [6].

            Para além de os factos ou meios de prova deverem


ser novos, no sentido apontado, é, ainda, necessário que
eles, por si ou em conjugação com os já apreciados no
processo, sejam de molde a criar dúvidas fundadas sobre
a justiça da condenação.

            4. Como já decorre do exposto, em caso paralelo,


envolvendo o mesmo arguido, por acórdão de
08/05/2013, proferido no processo 336/11.5PAAMD-
A.S1, já o Supremo Tribunal de Justiça autorizou a
revisão.

            Aí se ponderando:

            «(…)

«Seja como for, o recorrente é, no caso, o Mº Pº, que


afirma desconhecer que à data do julgamento, e
obviamente também antes dele, o arguido era detentor de
título válido de condução. Não podemos pôr em causa
esta afirmação, e daí que tenhamos que concluir que
estamos perante facto novo para efeitos de admissão do
presente recurso.

«Esse facto novo, ou seja a detenção de título válido de


condução em Portugal por parte do arguido, se tivesse
sido conhecido do tribunal da condenação, teria levado à
absolvição do arguido pelos dois crimes de condução sem
habilitação legal, do art. 3.º, n.os  1 e 2, do DL  2/98, de 3
de Janeiro, e, pelos quais, foi condenado na pena de 4
meses de prisão, cada um. Está pois em causa
irremediavelmente a justiça da condenação por estes dois
crimes. Só por isso será de conceder a revisão.»

            5. Também no caso, não é de pôr em causa que o


Ministério Público, ao tempo da acusação e do
julgamento, ignorasse que o arguido era titular de
documento que o habilitava a conduzir o veículo em
causa.

            A condenação do arguido resultou de o tribunal


ter tido como assente que o arguido não era, à data
considerada, titular de documento que o habilitasse a
conduzir o veículo em causa.

            O documento que, posteriormente ao trânsito em


julgado da decisão condenatória, chegou ao processo,
comprovando que o arguido, à data da prática dos factos
por que foi julgado autor de um crime de condução sem
habilitação legal, era, afinal, titular de documento que o
habilitava a conduzir, constitui tanto para o tribunal como
para o Ministério Público, requerente da revisão, “meios
de prova novo” de um facto desconhecido e, nesse
sentido, “novo”, com a virtualidade de pôr
inquestionavelmente em causa a justiça da condenação do
arguido[7].

            6. É certo que o arguido não podia ignorar que era


titular de carta de condução.

            Mas não é ele o requerente da revisão, por forma a


que o conhecimento que ele tem do facto o descaracterize
como “facto novo”.

            Por outro lado, não tendo contestado, nem


comparecido no julgamento, o arguido deixou que fossem
ultrapassados os momentos próprios para dar
conhecimento ao tribunal de que era titular de carta de
condução, por forma a que esse facto pudesse ser
atendido na sentença.

            E, por isso, não teria qualquer viabilidade a


interposição de recurso ordinário da sentença com base
no facto de o arguido ser titular de carta de condução.

            E tudo isto porque a prova documental só pode ser


junta até ao encerramento da audiência (artigo 165.º, n.º
1, do CPP).

            7. Deve, pois, ser autorizada a revisão.

            Estando documentalmente comprovado que o


arguido é titular de carta de condução, o que confere ao
caso mais do que uma grave dúvida sobre a justiça da
condenação uma imagem de fortíssima probabilidade de
injustiça da condenação, entende-se, nos termos do n.º 2
do artigo 457.º, que se impõe a imediata suspensão da
execução da pena de 3 meses de prisão que o arguido se
encontra a cumprir.

            Não se determina, no contexto dado, a sujeição do


arguido a qualquer medida de coacção, além do termo de
identidade e residência (n.º 3 do artigo 457.º do CPP).

III

            Nos termos expostos, acorda-se em autorizar a


revisão, reenviando-se o processo, para novo julgamento,
nos termos dos artigos 457.º e 459.º e ss. do Código de
Processo Penal.

***

            Nos termos do n.º 2 do artigo 457.º, determina-se


a imediata suspensão da execução da pena de 3 meses de
prisão que o arguido se encontra a cumprir.

            Uma vez que na 1.ª instância foi organizado


traslado com vista ao acompanhamento do cumprimento
da pena e dos autos resulta que o arguido, quando foi
colocado em cumprimento de pena, se encontrava detido
à ordem do SEF, informe imediatamente a 1.ª instância,
com cópia do acórdão, para que seja a 1.ª instância a dar
execução à ordem de suspensão imediata da execução da
pena, libertando o arguido ou, se dever ser esse o caso,
desligando-o deste processo para ficar detido à ordem de
outro.

            Sem custas, por não serem devidas.

Supremo Tribunal de Justiça, 29/04/2015

Isabel Pais Martins (Relatora)


Helena Moniz

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[1] Daqui em diante abreviadamente designado pelas iniciais CPP.

[2] M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, Código de Processo Penal


Anotado, II volume, 2.ª edição, Editora Rei dos Livros, p. 1042.
[3] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I volume, Coimbra
Editora, Limitada, 1974, p. 44.
[4] M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, ob. cit., p. 1043.
[5] Neste sentido, também Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do
Código de Processo Penal, 2.ª edição, Universidade Católica Editora,
anotação 12. ao artigo 449.º

[6] Ibidem.
[7] Como já sustentámos no acórdão de 11/07/2013, no processo n.º
364/04.7ptlrs-A.S1.

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça


Processo: 4867/06.0TBVLG.P1.S1

Nº Convencional: 7ª SECÇÃO

Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA

Descritores: RECURSO DE AGRAVO


INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA
CONHECIMENTO OFICIOSO
CASO JULGADO FORMAL
SIMULAÇÃO
REQUISITOS
CONTRATO DE COMPRA E VENDA
AQUISIÇÃO DERIVADA
DIREITO DE PROPRIEDADE

Data do Acordão: 20/03/2014

Votação: UNANIMIDADE

Texto Integral: S

Privacidade: 1

Meio Processual: REVISTA


Decisão: NEGADA A REVISTA

Área Temática: DIREITO PROCESSUAL CIVIL / CASO JULGADO FORMAL / VÍCIOS DA


VONTADE / SIMULAÇÃO

Legislação Nacional: CPC: ART.S 625.º, N.º 2, 645.º, N.º 1, 675.º, 733.º;
CÓDIGO CIVIL: ARTS. 221.º, N.º 1, 240.º, 342.º.º, N.º 2, 351.º, 383.º, N.º 1,
393.º, N.º 1, 394.º, N.º 1 E 875.º;

Jurisprudência Nacional: - AC. STJ DE 25-03-2010, PROC. N.º 983/06.7TBBRG.G1.S1;


- AC. STJ 16-03-2011, PROC. N.º 279/2002.E1.S1;
- AC. STJ DE 11-05-2011, PROC. N.º 06B1501;
- AC. STJ DE 16-10-2012, PROC. N.º 649/04.2

Sumário :

I - Tendo a ré requerido, em sede de audiência de


julgamento, a inquirição de duas testemunhas, tendo
esse requerimento – susceptível de recurso de agravo –
sido indeferido e não tendo desse mesmo despacho sido
interposto recurso, é de considerar que o mesmo
transitou em julgado, adquirindo assim força de caso
julgado formal.
II - Para haver simulação é necessário que a divergência
entre a declaração e a vontade das partes resulte de um
acordo entre elas e que tenha como objectivo enganar
terceiros, sendo para tal necessário demonstrar o
conluio concreto e a intenção de enganar pessoas
concretamente determinadas.
III - Na falta de prova sobre os factos constitutivos da
simulação, não pode o tribunal deixar de julgar, a final,
como se a mesma não tivesse ocorrido, retirando as
devidas consequências da validade do contrato.

O presente recurso O presente recurso de revista tem por objeto o acórdão


de revista tem por proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa
objeto o acórdão no âmbito dos presentes autos que, revogando a decisão
proferido pelo proferida em 1.ª instância, julgou procedente o recurso
Venerando Tribunal interposto pela ora Recorrida quanto à decisão que julgou
da Relação de o despedimento ilícito, em sede de audiência preliminar,
Lisboa no âmbito revogando-a para declarar excluída a ilicitude do
dos presentes autos despedimento coletivo, por aceitação do mesmo pelos ora
que, revogando a Recorrentes.
decisão proferida 2. O objeto do presente recurso de revista, em face das
em 1.ª instância, conclusões apresentadas pelos ora Recorrentes, versa
julgou procedente o somente sobre a análise e interpretação da presunção
recurso interposto ínsita no artigo 401º nº 4 do Código do Trabalho na
pela ora Recorrida redação aos autos aplicável.
quanto à decisão 3. A cessação dos contratos de trabalho que ligavam a
que julgou o Recorrida a cada um dos Recorrentes teve lugar em
despedimento 31/01/2009 - data em que o despedimento coletivo
ilícito, em sede de produziu os seus efeitos, tendo a Recorrida procedido ao
audiência depósito das quantias devidas a título de compensação
preliminar, pelo despedimento coletivo nessa mesma data.
revogando-a para 4. As comunicações enviadas pelos Recorrentes não são o
declarar excluída a meio legítimo para arguir a ilicitude do despedimento
ilicitude do coletivo, donde a Recorrida não podia deixar de
despedimento disponibilizar as quantias devidas a título de
coletivo, por compensação pelo despedimento coletivo na data da
aceitação do mesmo cessação dos seus contratos de trabalho, o que fez.
pelos ora 5. Os Recorrentes teriam, necessária e impreterivelmente,
Recorrentes. de ilidir a presunção constante do artigo 401.º, n.º 4, do
2. O objeto do Código do Trabalho na redacção imposta pela Lei n.º
presente recurso de 99/2003, de 27 de Agosto, para poder arguir
revista, em face das judicialmente a ilicitude do despedimento coletivo.
conclusões 6. Os montantes pagos pela Recorrida a título de
apresentadas pelos compensação pelo despedimento coletivo obedecem ao
ora Recorrentes, disposto no artigo 401.º do Código do Trabalho na
versa somente sobre redacção aplicável aos autos.
a análise e 7. O n.º 4 do artigo 401.º do Código do Trabalho na
interpretação da redacção imposta pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto
presunção ínsita no contém uma presunção nos termos da qual o recebimento
artigo 401º nº 4 do da compensação determina a aceitação da licitude do
Código do Trabalho despedimento por parte do trabalhador.
na redação aos 8. Os interesses e princípios subjacentes à presunção
autos aplicável. legalmente estabelecida no n.º 4 do artigo 401.º do
3. A cessação dos Código do Trabalho não se compadece com uma
contratos de teoria ou interpretação que aceite como válida a
trabalho que possibilidade de os Recorrentes poderem, mais de 4
ligavam a Recorrida anos volvidos, devolver, agora, as quantias por si
a cada um dos recebidas a título de compensação pelo despedimento
Recorrentes teve coletivo e, dessa forma, ilidir o funcionamento da
lugar em presunção e a consequente aceitação, por si, da
31/01/2009 - data licitude do despedimento coletivo operado pela
em que o Recorrida.
despedimento  9. Pretendendo arguir a ilicitude do despedimento
coletivo produziu os coletivo, os Recorrentes teriam de ter devolvido a
seus efeitos, tendo a compensação recebida num prazo, pelo menos,
Recorrida consentâneo com a diligência de um homem médio. O
procedido ao que não se verificou.
depósito das 10. Os Recorrentes nada declararam à Recorrida depois
quantias devidas a de terem recebido a compensação, tendo-lhe criado a
título de legítima expetativa - merecedora da tutela do Direito - e
compensação pelo atento o tempo decorrido, de que aceitaram a licitude do
despedimento despedimento.
coletivo nessa 11. Apesar de terem manifestado a sua discordância com
mesma data. o despedimento coletivo e a sua intenção de o
4. As comunicações impugnarem judicialmente, os ora Recorrentes nunca
enviadas pelos manifestaram a intenção de restituírem ou devolverem a
Recorrentes não são quantia recebida a título de compensação.
o meio legítimo 12. "A devolução dos quantitativos recebidos surge aqui
para arguir a como elemento relevante da demonstração de que não
ilicitude do houve aceitação do despedimento, sendo consagrada no
despedimento âmbito do Código do Trabalho de 2009, como um dos
coletivo, donde a elementos essenciais para que essa elisão ocorra. Mas o
Recorrida não podia facto de essa devolução não estar expressamente
deixar de consagrada no Código do Trabalho de 2003 não permite
disponibilizar as excluir a devolução da compensação como elemento
quantias devidas a estruturante da elisão da aceitação do despedimento, no
título de âmbito daquele diploma."- vide Acórdão do Supremo
compensação pelo Tribunal de Justiça de 03/04/2013, disponível para
despedimento consulta em www.dgsi.pt.
coletivo na data da 13. "A retenção da compensação por porte do trabalhador
cessação dos seus quando não concorde com o despedimento coletivo de
contratos de que é objecto seria manifestamente contrária ao princípio
trabalho, o que fez. da boa fé, decorrente daquela norma como princípio
5. Os Recorrentes geral. Na verdade, a disponibilização da compensação
teriam, necessária e não visa antecipar o pagamento de quaisquer
impreterivelmente, indemnizações a que o trabalhador se sinta com direito
de ilidir a presunção decorrente de uma eventual ilicitude do despedimento, ou
constante do artigo resolver os problemas sociais derivados do despedimento,
401.º, n.º 4, do conforme acima se referiu, não conferindo o sistema
Código do Trabalho jurídico qualquer direito sobre esse quantitativo ao
na redacção imposta trabalhador despedido que pretenda impugnar o
pela Lei n.º despedimento e não concorde com o mesmo" - idem.
99/2003, de 27 de 14. A presunção da aceitação da licitude do despedimento
Agosto, para poder coletivo produziu os seus efeitos quando os Recorrentes
arguir judicialmente receberam as quantias depositadas pela Recorrida a título
a ilicitude do de compensação pelo despedimento coletivo.
despedimento 15. A elisão da presunção estabelecida no nº 4 do artigo
coletivo. 401.º do Código do Trabalho na redação aqui aplicável
6. Os montantes não resulta prejudicada pelo facto de o recebimento
pagos pela destas quantias pelos Recorrentes ter tido origem num ato
Recorrida a título unilateral da Recorrida, consubstanciado no pagamento
de compensação da quantia através de transferência bancária porquanto tal
pelo despedimento era a forma de pagamento usual e, através dessa
coletivo obedecem transferência, os Recorrentes receberam as quantias em
ao disposto no causa, passando a ter sobre elas total disponibilidade,
artigo 401.º do nada obstando a que as tivessem devolvido.
Código do Trabalho 16. Os Recorrentes receberam a compensação, resultando
na redacção provada a base da presunção ínsita no artigo 401.º, n.º 4,
aplicável aos autos. do Código do Trabalho na redacção dada pela Lei n.º
7. O n.º 4 do artigo 99/2003, de 27 de Agosto, pelo que deverá tal presunção
401.º do Código do funcionar, concluindo-se, desta forma, pela verificação do
Trabalho na facto desconhecido que é, precisamente, a aceitação da
redacção imposta licitude despedimento.
pela Lei n.º 17. A aceitação da compensação pelos Recorrentes
99/2003, de 27 de afigura-se, em si mesma, como um facto impeditivo da
Agosto contém uma ilicitude do despedimento coletivo sub judice pelo que,
presunção nos demonstrado que está o funcionamento da presunção,
termos da qual o deverá manter-se na íntegra o douto Acórdão recorrido e,
recebimento da nessa medida, revogar-se a decisão do tribunal da 1.ª
compensação instância que declarou ilícito o despedimento coletivo,
determina a com todas as legais consequências.
aceitação da licitude 18. A presunção da aceitação da licitude do despedimento
do despedimento coletivo fundada no recebimento da compensação pelos
por parte do Recorrentes, preclude o direito de estes o impugnarem
trabalhador. judicialmente, ficando o conhecimento do cumprimento
8. Os interesses e ou não das formalidades legais prejudicado - sendo certo
princípios que o despedimento coletivo sub judice observou todas as
subjacentes à formalidades legais, sendo válido e regular à luz da
presunção legislação então em vigor.
legalmente 19. Pelo que deve ser o presente recurso julgado
estabelecida no n.º totalmente improcedente, por não provado, mantendo-se
4 do artigo 401.º o Acórdão recorrido e, por essa via, revogando-se a
do Código do decisão proferida em 1.ª instância que julgou ilícito o
Trabalho não se despedimento colectivo, por aceitação do mesmo pelos
compadece com ora Recorrentes.
uma teoria ou
interpretação que
aceite como válida
a possibilidade de
os Recorrentes
poderem, mais de
4 anos volvidos,
devolver, agora, as
quantias por si
recebidas a título
de compensação
pelo despedimento
coletivo e, dessa
forma, ilidir o
funcionamento da
presunção e a
consequente
aceitação, por si,
da licitude do
despedimento
coletivo operado
pela Recorrida.
 9. Pretendendo
arguir a ilicitude do
despedimento
coletivo, os
Recorrentes teriam
de ter devolvido a
compensação
recebida num prazo,
pelo menos,
consentâneo com a
diligência de um
homem médio. O
que não se
verificou.
10. Os Recorrentes
nada declararam à
Recorrida depois de
terem recebido a
compensação,
tendo-lhe criado a
legítima expetativa
- merecedora da
tutela do Direito - e
atento o tempo
decorrido, de que
aceitaram a licitude
do despedimento.
11. Apesar de terem
manifestado a sua
discordância com o
despedimento
coletivo e a sua
intenção de o
impugnarem
judicialmente, os
ora Recorrentes
nunca manifestaram
a intenção de
restituírem ou
devolverem a
quantia recebida a
título de
compensação.
12. "A devolução
dos quantitativos
recebidos surge
aqui como elemento
relevante da
demonstração de
que não houve
aceitação do
despedimento,
sendo consagrada
no âmbito do
Código do Trabalho
de 2009, como um
dos elementos
essenciais para que
essa elisão ocorra.
Mas o facto de essa
devolução não estar
expressamente
consagrada no
Código do Trabalho
de 2003 não
permite excluir a
devolução da
compensação como
elemento
estruturante da
elisão da aceitação
do despedimento,
no âmbito daquele
diploma."- vide
Acórdão do
Supremo Tribunal
de Justiça de
03/04/2013,
disponível para
consulta em
www.dgsi.pt.
13. "A retenção da
compensação por
porte do trabalhador
quando não
concorde com o
despedimento
coletivo de que é
objecto seria
manifestamente
contrária ao
princípio da boa fé,
decorrente daquela
norma como
princípio geral. Na
verdade, a
disponibilização da
compensação não
visa antecipar o
pagamento de
quaisquer
indemnizações a
que o trabalhador se
sinta com direito
decorrente de uma
eventual ilicitude do
despedimento, ou
resolver os
problemas sociais
derivados do
despedimento,
conforme acima se
referiu, não
conferindo o
sistema jurídico
qualquer direito
sobre esse
quantitativo ao
trabalhador
despedido que
pretenda impugnar
o despedimento e
não concorde com o
mesmo" - idem.
14. A presunção da
aceitação da licitude
do despedimento
coletivo produziu os
seus efeitos quando
os Recorrentes
receberam as
quantias
depositadas pela
Recorrida a título
de compensação
pelo despedimento
coletivo.
15. A elisão da
presunção
estabelecida no nº 4
do artigo 401.º do
Código do Trabalho
na redação aqui
aplicável não
resulta prejudicada
pelo facto de o
recebimento destas
quantias pelos
Recorrentes ter tido
origem num ato
unilateral da
Recorrida,
consubstanciado no
pagamento da
quantia através de
transferência
bancária porquanto
tal era a forma de
pagamento usual e,
através dessa
transferência, os
Recorrentes
receberam as
quantias em causa,
passando a ter sobre
elas total
disponibilidade,
nada obstando a que
as tivessem
devolvido.
16. Os Recorrentes
receberam a
compensação,
resultando provada
a base da presunção
ínsita no artigo
401.º, n.º 4, do
Código do Trabalho
na redacção dada
pela Lei n.º
99/2003, de 27 de
Agosto, pelo que
deverá tal
presunção
funcionar,
concluindo-se, desta
forma, pela
verificação do facto
desconhecido que é,
precisamente, a
aceitação da licitude
despedimento.
17. A aceitação da
compensação pelos
Recorrentes afigura-
se, em si mesma,
como um facto
impeditivo da
ilicitude do
despedimento
coletivo sub judice
pelo que,
demonstrado que
está o
funcionamento da
presunção, deverá
manter-se na íntegra
o douto Acórdão
recorrido e, nessa
medida, revogar-se
a decisão do
tribunal da 1.ª
instância que
declarou ilícito o
despedimento
coletivo, com todas
as legais
consequências.
18. A presunção da
aceitação da licitude
do despedimento
coletivo fundada no
recebimento da
compensação pelos
Recorrentes,
preclude o direito
de estes o
impugnarem
judicialmente,
ficando o
conhecimento do
cumprimento ou
não das
formalidades legais
prejudicado - sendo
certo que o
despedimento
coletivo sub judice
observou todas as
formalidades legais,
sendo válido e
regular à luz da
legislação então em
vigor.
19. Pelo que deve
ser o presente
recurso julgado
totalmente
improcedente, por
não provado,
mantendo-se o
Acórdão recorrido
e, por essa via,
revogando-se a
decisão proferida
em 1.ª instância que
julgou ilícito o
despedimento
colectivo, por
aceitação do mesmo
pelos ora
Recorrentes.

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