Você está na página 1de 6

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

Gabriel de Oliveira Azevedo; Gustavo Alves Luz.

Primavera Árabe: As diferenças de efeito que tiveram as manifestações no Egito e na


Arábia Saudita.

SOBRE A PRIMAVERA ÁRABE;

A Primavera Árabe foi motivada por uma frustração advinda de uma população que
sofria muitos problemas econômicos, especialmente, o desemprego no Oriente Médio. A
coesão social era agravada pelo modo de governar dos líderes que eram autocráticos e
corruptos, os quais não se atentavam aos problemas que afetavam o seu povo. Em contraste a
isso, a riqueza de líderes das nações do Oriente Médio, como Egito, Tunísia, Arábia Saudita,
por exemplo, só estava aumentando – fato que dificilmente conseguia ser ignorado por suas
populações (STILES, 2007).
Diante disso, houve uma onda de protestos, organizados, de modo especial, pelas
redes sociais, para romper com tais governos que estavam aquém dos anseios da população
que visavam à resolução da crise econômica que afetava, sobretudo, a empregabilidade dos
jovens árabes. Por fim, vários regimes foram derrubados, como no Egito, porém outros não,
como na Arábia Saudita. (STILES, 2007).
Com base nesse contexto, alguns questionamentos podem surgir, como, por exemplo,
o motivo pelo qual alguns países não terem alterado seus regimes por causa da Primavera
Árabe, ou seja, mais especificamente, por que as manifestações na Arábia Saudita não
acarretaram os mesmos efeitos das que ocorreram no Egito?
A compreensão da problemática proposta perpassa dois temas: o da tenacidade executiva,
algo extremamente presente e amplificado na Arábia Saudita, em comparação ao Egito, como
também o nível de cooptação dos protestos que ocorriam em solo saudita, motivados pela
situação econômica, política e social. Contudo, vale lembrar que esse cooptação não fora
incondicional, mas permeada por várias intimidações do governo para que a situação se
tornasse incontornável, como foi a do Egito.
FORÇAS SOCIAIS E ELEMENTOS ESTRUTURAIS;
‘ In general, the concept "social forces" is used as a special case
within the broader notion of social causation [...] To the social
worker and the social reformer, the social forces have been the
persons, institutions, and groups which they have felt it necessary
to take into account, either as ob- stacles to be circumvented or as
resources to be mobilized in con- nection with their particular and
concrete problems [...] To the historian, the expression "social
forces" is likely to mean the main lines of change which he thinks
he can distinguish in the history of a particular state, continent, or
region, through a given period in which he may be interested.’
(HOUSE, 1925, p.147,148)

A partir do fragmento exposto, consideramos forças sociais como uma organização,


grupo, indivíduo ou nação que tenha algum grau de influência, persuasão ou capacidade de
mobilização. Enquanto os elementos estruturais são aqueles inerentes ao contexto e que se
mudarem podem causar grandes mudanças.
São forças sociais e/ou elementos estruturais: regimes políticos árabes, Estados,
sociedade civil, militantes islamistas, mídias sociais, internet e o islamismo político. Todos
esses elementos se fundamentam como essenciais dentro do contexto da primavera árabe,
sendo eles essenciais para que o evento se desencadeie. É importante notar que todos eles
interagem entre si e são potencializados pelas mídias sociais e internet. Esses dois elementos
potencializadores ampliam a capacidade de comunicação e interação entre atores.

ATORES, SEUS INTERESSES, CAPACIDADES E RECURSOS;


Fonte: Elaboração própria
CENÁRIOS E TENDÊNCIAS;

Como dito anteriormente, houve uma mesclagem de intimidações com certas


concessões por parte do governo. Conforme ratifica o jornal OpenDemocracy, houve
períodos de maior abertura às questões protestadas, algo observado durante a Primavera
Árabe, seguindo por um caminho de resolução de algumas pautas de pessoas descontentes
com a realidade que se apresentava. Dessa forma, o governo saudita ampliou seus
investimentos na área econômica, como a criação de um pacote de benefícios, os quais
incluíam não só as áreas econômicas e sociais, mas também as de saúde e educação. O
movimento foi uma resposta para reverter a frustração da população com a ausência de
moradias, empregos, locais de saúde, como também os serviços que abarcavam a assistência
social. Tais investimentos foram mais de US $70 bilhões para contornar o descontentamento
populacional.
Houve também a sobressaliência de pautas que objetivavam uma maior igualdade de
gênero dentro do regime, haja vista o interesse das mulheres não só em ter o poder de voto,
mas também se candidatarem a eleições municipais. O Estado respondeu à mobilização das
mulheres com a cooptação. O Rei se colocou como o grande promotor do direito do público
feminino, criando promessas que envolviam não só as incluir em eleições municipais, mas
também no Conselho Consultivo, segundo o OpenDemocracy. Vale lembrar que toda essa
mobilização simbólica estatal em prol dessas pautas cidadãs tinham como objetivo uma
legitimidade internacional, haja vista o período da Primavera Árabe que clamava por
participação democrática.
Diante desse cenário, os efeitos de abertura do regime às pautas da população
poderiam promover uma maior sensibilidade às questões de minorias étnicas, como a xiita,
pois há também um interesse em transmitir uma imagem mais democrática no cenário
internacional neste período da Primavera Árabe. Porém, é importante salientar que países
cujo o governo é orientado por líderes xiitas, como é o caso do Irã, com uma maior força da
voz xiita em solo sunita, podem perceber uma maior influência sobre a estabilidade do
regime, haja vista os pedidos ativistas relacionados à Monarquia Constitucional em
manifestações.
Outrossim, além de tal tópico, as questões de gênero iriam aumentar os
questionamentos do cerceamento da participação da mulher em manifestações, como foram
as que ocorreram, as chamadas “Procissões Zaynabivat”, às quais eram procissões noturnas
de mulheres que apoiavam presos políticos xiitas, de acordo com o jornal OpenDemocracy.
Portanto, os efeitos esperados em um cenário de menor repressão seriam a perpetuação da
pautadas de igualdade de gênero, um aumento da qualidade de vida das pessoas, bem como
uma provável crescente atuação xiita frente a um governo sunita.
Entretanto, tais iniciativas estão distantes de minar o autoritarismo da nação, servindo
apenas para mascarar os contínuos abusos relativos à igualdade de gênero e aos direitos
humanos. Afinal, como dito anteriormente, o governo atendeu a algumas pautas, porém não
abriu mão da repressão.

MAIOR REPRESSÃO POR PARTE DO GOVERNO;

Com uma maior abertura às questões democráticas e sociais, de alguma forma, alterar
o status quo do modo de governar do regime saudita seria uma realidade. Isto era o grande
receio da Arábia Saudita, devido ser algo que ocorreu no Egito, então, ampliar a repressão de
um governo que já é autoritário foi um caminho adotado também. , Conforme confirma o
jornal OpenDemocracy, isso pode ser exemplificado pela extrema repressão às manifestações
que ocorreram na província xiita oriental aos correligionários no país vizinho (Bahrein), a
qual teve como resultado a morte de quatro jovens. Além disso, outra manifestação contra a
atuação do governo foi marcada para um dia que foi conhecido como o “Dia da Raiva”, não
só foi reprimida, mas também incentivou o governo a publicar uma nova lei antiterrorismo, a
qual tinha o poder de criminalizar qualquer crítica aberta direcionada à Monarquia da Arábia
Saudita.
Logo, a materialidade da repressão se orientou pela expansão da militarização das
cidades para reforçar a segurança e impor um ambiente de intimidação contra esses
movimentos que queriam uma mudança no status quo da Arábia Saudita. Além disso,
funcionários do governo, caso participassem dessas atividades, poderiam ser demitidos, pois
o regime já os proíbe de estarem envolvidos com atividades políticas, por exemplo: assinar
uma petição.
Assim, a tenacidade executiva da Arábia Saudita trouxe maior repressão
governamental e ela poderia ser ampliada, caso a Monarquia julgasse necessário. Em um
primeiro momento, uma inclinação substancial a uma frequente opressão acarretaria não só a
contração das pautas democráticas e dos anseios populares de forma incontornável, como
também de temas como a participação da mulher na arena pública estariam longe até do
simbólico. Afinal, quaisquer manifestações seriam, como foram, consideradas como uma
conspiração xiita.
Por conseguinte, com a menor atenção às pautas populares e xiitas e às questões de
igualdade de gênero papel da mulher, o resultado é um olhar mais atento da Organização das
Nações Unidas às questões humanitárias no país, visto que o modo como a monarquia sunita
lida com essas questões populares é mediante a promoção do medo e da intimidação.
Em suma, como o regime conseguiu manter-se por meio da cooptação e repressão,
caso a última fosse ampliada, as prováveis consequências seriam o descontentamento
internacional, apesar do apoio norte-americano ao Estado Saudita; a maior probabilidade de
aumentar a opressão contra a sua população e seus anseios.
Dessa forma, a dinâmica ocorrida no processo da Primavera Árabe e os cenários de
maior e menor repressão, evidenciam que os esforços do governo são direcionados em prol
da manutenção do status quo. Por fim, o investimento da Arábia Saudita na “tenacidade
executiva” foi crucial para não ter o mesmo caminho que o regime no Egito.

INTERAÇÃO ENTRE AS ESTRATÉGIAS DOS ATORES: COOPERAÇÃO,


COMPETIÇÃO E CONFLITO;

A Sociedade civil, em suas diferentes camadas, se mostraram cooperando entre si no


sentido de manifestar suas insatisfações e seu desejo de derrubar regimes vigentes em seus
países. Pode-se destacar os movimentos ocorridos na Tunísia, Líbia, Egito, Argélia, Síria,
Bahrein, Marrocos, Iêmen, Jordânia e Omã. Os eventos ocorreram em momentos distintos,
porém cada um deles funcionou como motor para que outros desencadeassem.
Os governos tiveram o desafio imposto pelas mídias sociais e internet, que
proporcionaram comunicação em tempo real e disseminação de informações para todo o
mundo. Nesse sentido, houve ainda tentativas por parte dos mesmos em suprimir redes de
comunicação.
Cada governante em cada Estado reagiu de forma diferente diante das ações
proferidas pela sociedade civil. Houve a utilização do monopólio da violência através das
forças policiais, se mostrando de grande importância visto que o resultado buscado nesses
casos era a supressão dos movimentos revoltosos, ou seja, havia competição entre Estado e
sociedade civil.
Outros governantes, ao verem a escalada dos protestos, decidiram por vontade própria
instituir eleições para que o povo escolhessem seus líderes, ou ainda decidiram por renunciar
a seus cargos imediatamente. Nesses casos, não houve competição pelo monopólio do poder.

Fonte: Elaboração própria.

CONCLUSÃO;

A partir do exposto, pode-se concluir que o uso de força militar pelos Estados foi a
chave para que ocorressem diferentes efeitos, mesmo que o contexto em que os atores
estavam inseridos fossem parecidos, que foi o caso do Egito e da Árabia Saudita. Caso
utilizem o aparato militar, o governo tem mais chances de manter o seu status-quo (através da
repressão). Por outro lado, há o risco de opressão pela parte sunita do governo. Por fim, há o
enfraquecimento dos direitos humanos universais e o silenciamento de minorias civis.

REFERÊNCIAS

AL-RASHEED, Madawi. 2011. The Saudi response to the ‘Arab spring’: containment and
co-option. Open Democracy, 10 jan. 2011. Disponível em:
[https://www.opendemocracy.net/5050/madawi-al-rasheed/saudi-response-
to-%E2%80%98arab-spring%E2%80%99-containment-and-co-option/]. Acesso em: 16 de
janeiro de 2021.

The Concept “Social Forces” in American Sociology. Section I. Introduction on JSTOR.


Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/2764465?seq=3#metadata_info_tab_contents>.
Acesso em: 28 jan. 2022.

Você também pode gostar