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GEOPOLÍTICA E DINÂMICA TECNOLÓGICA DAS INDÚSTRIAS

ENERGÉTICAS

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empre-


sários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação
e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade ofere-
cendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a partici-
pação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação
contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos
e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber atra-
vés do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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Sumário
GEOPOLÍTICA E DINÂMICA TECNOLÓGICA DAS INDÚSTRIAS
ENERGÉTICAS.................................................................................................. 1

NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 4

AS FONTES DE ENERGIA DE ORIGEM FÓSSIL .................................. 7

Petróleo .......................................................................................................... 8

Economia e indústria do petróleo ................................................................. 11

Geopolítica mundial do petróleo (1860-2003) ............................................... 21

INDÚSTRIAS ENÉRGETICAS .............................................................. 31

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ...................................................... 49

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INTRODUÇÃO

As fontes de energia, pelo papel que desempenham para a humanidade


e pela importância estratégica para se fazer a guerra, têm estado na origem de
conflitos e focos de tensões ao redor do mundo em épocas tão remotas quanto
a Pré-história. Àquela época, o fogo tornou-se a primeira fonte de energia impor-
tante para as tribos primitivas. Na modernidade, o domínio das reservas estraté-
gicas de combustíveis, além da capacidade para processá-los e estocá-los, tor-
nou-se central para a segurança de todas as nações, sem exceção. Por trás
desta geopolítica, está o esforço pela garantia da autossuficiência ou pela dis-
ponibilidade segura de energia.
O petróleo é o caso mais lembrado quando se fala, desde as primeiras
décadas do século XX, em conflitos geopolíticos cujo objeto de disputa é a ener-
gia. Mas ele não é o único. O fato é que todas as fontes energéticas, umas mais,
outras menos, são importantes para as nações, tornando seus estudos relevan-
tes para se entender muitos dos focos de tensões e conflitos contemporâneos.
A geopolítica de energia nasce quando se constata que, por um capricho da
natureza, as fontes naturais destas matérias-primas se distribuem geografica-
mente de forma desigual pela superfície da Terra.
A magnitude dos conflitos oriundos da luta pela posse destas fontes será
tão maior quanto for a sua importância estratégica, e tão mais preocupante
quanto mais desigual for a sua distribuição geográfica no planeta. O acesso a
combustíveis fora dos domínios territoriais dos países que deles mais necessi-
tam fez surgir uma geopolítica energética de natureza complexa e, em muitos
casos, preocupante, pela capacidade que esta geopolítica tem de levar a focos
de tensões que podem, facilmente, se transformar em conflitos armados. O con-
ceito de geopolítica energética se relaciona com o objetivo (possível ou real) das
nações de controlar os meios de produção de energia para gerar mais valor e
auferir poder, em função, especificamente, da distribuição geográfica desigual
dos recursos naturais do planeta. O petróleo, enquanto matéria-prima central
para a prosperidade das nações, desde o início do século XX, tem sido um fator
fundamental desse ramo da Geopolítica.

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Em linhas gerais, os países que dependem de recursos energéticos im-
portados têm dois objetivos principais: primeiro, adotar políticas destinadas a as-
segurar o acesso ao suprimento externo adicional que é essencial para as suas
necessidades nacionais; segundo, reduzir a dependência dos suprimentos ex-
ternos, a partir de políticas nacionais que incentivem a racionalização do uso dos
recursos energéticos utilizados e o desenvolvimento de combustíveis alternati-
vos capazes de diminuir a dependência internacional. Com relação ao primeiro
objetivo, ou seja, o acesso aos recursos energéticos estrangeiros, Conant e Gold
(1978) descrevem as três metas a serem perseguidas: a) O suprimento de ener-
gia importada deve ser suficiente. Existe um nível de importações abaixo do qual
a segurança nacional é colocada em risco. b) O suprimento de energia importada
deve ser contínuo. Interrupções ou cortes no suprimento podem ter sérias reper-
cussões políticas e econômicas para os países que dele dependem. Natural-
mente, é esta vulnerabilidade a interrupções do suprimento que dá aos Estados
fornecedores uma poderosa arma contra os países que dependem de energia
importada. Isso ocorreu, de forma dramática, por ocasião da primeira crise do
petróleo, quando algumas nações ocidentais ficaram impedidas de comprar pe-
tróleo da Arábia Saudita e de outros países da OPEP durante meses. c) A ener-
gia importada deve ser obtida a preços razoáveis. Esta é a meta mais difícil de
atingir, pois as variáveis que interferem na precificação são muitas: o preço pago
deve ter relação direta com as formas alternativas de energia; deve refletir o fato
de que as fontes atuais não são renováveis e estão se exaurindo; e deve consi-
derar também uma “capacidade de pagar” por parte dos importadores. Essas
três metas ― suprimento suficiente, contínuo e a preços razoáveis ― constituem
um trio indissolúvel de interesses energéticos e os principais pilares da geopolí-
tica de energia de muitos países. O não cumprimento de qualquer uma dessas
três metas pode ter consequências desastrosas para o bem-estar econômico, a
estabilidade política e a segurança nacional do país consumidor, com reflexos ime-
diatos na geopolítica internacional. Num horizonte de longo prazo, o petróleo tende a
perder importância gradativamente, uma vez que será substituído por outros combustí-
veis com o passar dos anos. Isso fica claro quando se analisam os níveis de investi-
mentos contemporâneos em biocombustíveis, não somente porque estes são, hoje, os
melhores substitutos para alguns derivados importantes de petróleo, mas porque vive-
mos num momento em que nações do mundo todo têm unido esforços para diminuir a

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emissão de gases nocivos ao meio ambiente, dos quais o principal vilão é o dióxido de
carbono (CO²). Esta conjunção de fatores, aliada à perspectiva de se ampliar a produ-
ção de etanol e biodiesel no médio prazo, permite se antever um forte ritmo de cresci-
mento na demanda pelos biocombustíveis nos próximos anos.
Vivemos hoje um momento de transição entre uma matriz global, majori-
tariamente finita e poluente, para uma limpa e renovável; sem dúvida, uma mu-
dança de paradigma energético. Em 2007, por exemplo, o etanol ficou no centro
dos atritos políticos entre Brasil, Venezuela, Cuba e Argentina, fomentando certo
mal-estar diplomático entre os chefes de Estado destas nações.
Pode-se afirmar que períodos de transição são períodos de insegurança
e incerteza. A matriz mundial de energia, baseada na queima de combustíveis
fósseis, foi consolidada ao longo de muitos anos: o carvão mineral, responsável,
ainda, por 24% desta matriz, já conta mais de dois séculos de uso intensivo e
ininterrupto; o uso do petróleo, que responde por 39%, data de um século e meio;
e o uso do gás natural, com 24% da matriz mundial, caminha para mais de meio
século de uso constante (PINTO JUNIOR, 2007).
Sem dúvida, muitos interesses dos setores privados e estatais ligados a
esse modelo se veem ameaçados nos dias de hoje, com o avanço das energias
alternativas. A geopolítica mundial, portanto, sofrerá profunda transformação
com o avanço das fontes renováveis, em detrimentos das fósseis.
Traz-nos satisfação verificar que o Brasil está no centro desta trans-
formação, podendo beneficiar-se da mudança de paradigma energético de forma
significativa nas próximas décadas.
A história demonstra que períodos de crise podem se transformar em mo-
mentos de oportunidade para nações que se encontram em situação menos priv-
ilegiada no cenário internacional. São exemplos a transformação da França na
principal potência europeia após a Revolução Francesa de 1789; a ascensão da
União Soviética ao status de superpotência, após a Revolução Russa de 1917 e
a Segunda Guerra Mundial; e o surgimento dos Estados Unidos como a nação
mais poderosa do mundo, a partir de 1945.
A combinação simultânea de mudança de paradigma ambiental e ener-
gético que vivenciamos hoje tem potencial para alçar o Brasil a um outro patamar
nas relações internacionais. Possuidor de recursos naturais, ambientais e bio-
lógicos sem paralelo no mundo, o país tem tudo para convertê-los em recursos

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de energia e, por que não dizer, de poder, que o projete como um protagonista
importante deste novo mundo que se configura no século XXI.
Compreender um pouco mais sobre energia e sobre a geopolítica por trás
dela, tanto a mundial quanto a regional, pode contribuir para um melhor entendi-
mento do mundo em que vivemos e o papel do Brasil neste novo cenário inter-
nacional que se redesenha no presente. Esta é a proposta das próximas
páginas.

AS FONTES DE ENERGIA DE ORIGEM FÓSSIL

Pode-se afirmar que hoje existe pelo menos um dualismo ideológico no


debate sobre energia, com vantagem para os defensores das fontes renováveis.
De um lado, estão aqueles que acreditam que as fontes de origem fóssil são
imprescindíveis e até mesmo insubstituíveis; são os mesmos que desdenham
das previsões sombrias sobre o aquecimento global.
De outro, situam-se aqueles que defendem o avanço dos biocombustíveis
como uma das formas mais eficientes de se combater o problema climático da
atualidade. Tal debate se observa no cotidiano das sociedades e na visão estra-
tégica dos Estados. Acresce que a discussão em torno do uso de combustíveis
fósseis tem gerado muita polêmica nos meios de comunicação, não somente
pelo futuro esgotamento das reservas de petróleo e gás natural, mas principal-
mente pelo dano provocado ao meio ambiente.
A questão é complexa, considerando-se que não será fácil substituí-los
no curto prazo por fontes renováveis e, ao mesmo tempo, manter o padrão de
vida conquistado por boa parte da população do mundo. Séculos de inovações
tecnológicas introduziram automóveis, aviões, trens, eletricidade e produtos in-
dispensáveis ― como o plástico ― no dia a dia das sociedades, e uma mudança
de paradigma energético poderia significar retroceder a padrões de vida ultra-
passados.
O momento é crítico.
No entanto, o desafio de se rever toda a matriz energética, em escala
planetária, poderá representar uma ruptura e ao mesmo tempo um avanço his-
tórico para a humanidade. O aquecimento global nos coloca diante de uma das

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maiores provações que os seres humanos já enfrentaram em toda a sua existên-
cia no planeta. A continuação da elevação do nível dos oceanos pode afetar
diretamente uma parte significativa da população mundial que vive no litoral ou
próximo dele.
A produção de energia está no centro desse debate: basta constatar que
“as atividades energéticas respondem por 85% das emissões de dióxido de en-
xofre, 45% da emissão de particulados, 41% de emissões de chumbo, 40% das
emissões de hidrocarboneto e 20% das emissões de óxido nitroso na atmosfera.”
(HOLDREN; SMITH apud GELLER, 2003, p. 20). A redução da degradação am-
biental, portanto, passa, inexoravelmente, pela revisão da matriz energética de
todas as nações do mundo. Antes de prosseguir pelo ponto central da pesquisa,
optou-se por uma descrição das principais fontes energéticas em uso nos dias
de hoje, objetivando fornecer subsídios para o desenvolvimento da geopolítica
daquelas mais importantes. Primeiramente, serão abordadas as especificidades
das fontes de energia, incluindo aspectos locacionais, técnicos, econômicos e
comerciais, que podem contribuir para o entendimento da sua geopolítica.
Em seguida, será analisada a geopolítica energética de forma integrada e
sistêmica, daquelas fontes sobre as quais podemos afirmar que existe, sim, uma
geopolítica de energia.

Petróleo
O petróleo esteve e permanece no centro dos conflitos e focos de tensões
internacionais porque seus maiores consumidores dispõem de poucas reservas
e dele não podem, pelo menos por enquanto, abrir mão por diversos motivos. O
óleo atualmente é responsável por quase 40% de toda a energia global, sendo
que mais da metade das reservas se encontram numa região relativamente pe-
quena: o entorno do Golfo Pérsico, perfazendo uma área que abrange o território
de apenas seis países.
De todas as fontes de energia que servem a humanidade nos dias de
hoje, o petróleo é, de longe, a mais utilizada; é, também, a commodity mais ne-
gociada e mais consumida no planeta (PINTO JUNIOR, 2007). A versatilidade
do seu uso o transformou em matéria-prima básica de vários setores fundamen-
tais da economia de todos os países.

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O petróleo fornece basicamente dois tipos de derivados: os energéticos e
os não energéticos. Entre os energéticos, podem-se enumerar os combustíveis
para veículos de transporte, como o óleo diesel (para caminhões, ônibus, loco-
motivas e navios), a gasolina de aviação (para helicópteros e aviões de pequeno
porte equipados com motor de combustão interna), a gasolina (para carros de
passeio e motocicletas), o querosene (para aviões a jato) e aqueles combustíveis
para o setor industrial, como o óleo combustível. Entre os não energéticos, têm-
se o asfalto, o enxofre, o solvente, o lubrificante, o fertilizante e o plástico.
Esta hegemonia do petróleo faz com que esteja presente em quase todos
os ambientes e lugares em que as pessoas se encontrem. Sua importância ge-
opolítica adquiriu dimensões inimagináveis por nossos antepassados, a ponto
de tê-lo tornado a matéria-prima mais cobiçada e estratégica do século passado.
Nenhuma fonte de combustível se equipara ao petróleo quando se considera a
capacidade de armazenamento, a facilidade e o baixo custo do seu transporte e
os inúmeros derivados oriundos do seu refino e processamento.

Por tudo isso, o petróleo esteve presente nos conflitos geopolíticos mais
importantes do século XX. Na Primeira Guerra Mundial, por exemplo, os solda-
dos franceses foram transportados de Paris para a linha de frente de batalha por

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táxis particulares movidos à gasolina, quando a indústria do hidrocarboneto
ainda estava em fase de gestação na Europa e em outras partes do mundo. Na
Segunda Guerra Mundial, os nazistas almejavam tomar posse das reservas que
existiam no Cáucaso, e privá-los deste objetivo fazia parte da estratégia dos Ali-
ados para minar o poder bélico da Alemanha foi.
As crises petrolíferas de 1973, 1979, 1991 e 2003-2008 tiveram um papel
central na desestabilização política e econômica de diversas nações do mundo.
Para se entender a evolução da geopolítica mundial do petróleo, é necessário
abordar alguns aspectos importantes da economia do petróleo. Em seguida, será
feita a análise geopolítica, a partir de um breve histórico da sua evolução como
fonte de conflitos e focos de tensões desde que passou a ser usado em escala
industrial na era moderna.
A moderna indústria do petróleo se originou em meados do século XIX.
Surgiu em resposta a várias demandas que se faziam sentir num mundo que
ansiava por maior conforto, rapidez nos deslocamentos e lucro. As máquinas a
vapor e os meios de transporte em uso na revolução industrial demandavam um
combustível que fosse mais potente e versátil do que o carvão mineral, e lubrifi-
cantes mais baratos e abundantes para as engrenagens de suas máquinas do
que os óleos vegetais. As cidades, inchadas pelas migrações em massa, oriun-
das do campo, necessitavam de um combustível que fosse menos nocivo à
saúde para seus lampiões do que a gordura animal, como o óleo de baleia, por
exemplo, que era caro e cujo acesso era privilégio de elites.
O querosene, que significava “nova luz”, surgiu nesse contexto. John
Rockefeller (1839-1937) foi um dos pioneiros desta nova era, e enriqueceu
vendendo-o a preços populares para as sociedades americana e europeia
ávidas por modernidade (JUHASZ, 2009). A luz elétrica, popularizada logo em
seguida, parecia destinada a tirar a importância do querosene de petróleo, que
rapidamente havia se incorporado à vida das pessoas para a iluminação do-
méstica e urbana. Todavia, outra inovação tecnológica, mais importante do que
o próprio querosene, colocaria o petróleo, gradativamente, na vanguarda ener-
gética, por um longo período de tempo. Trata-se da invenção do motor de com-
bustão interna, que rapidamente equiparia praticamente todos os veículos que
viriam a ser produzidos. O petróleo é hoje responsável pelo funcionamento de
boa parte do sistema de transporte do mundo.

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O uso dos seus derivados pelas sociedades é amplamente reconhecido
mas, historicamente, foi sua importância militar, e não econômica, que primeiro
o colocou no centro da geopolítica internacional. “Em particular, como foi perce-
bido por Winston Churchill, no início do século XX, é o combustível mais eficiente
para mover as forças armadas.” (TORRES FILHO, 2004, p. 309).
Para navios de guerra, proporcionava maior velocidade, economia de es-
paço e de mão de obra, e para os aviões de guerra, foi durante um certo tempo
o único combustível possível. Embora o petróleo tenha se tornado popular nas
sociedades modernas somente a partir do final do século XIX, historicamente já
era um velho conhecido da humanidade. Na Mesopotâmia, atual Iraque, o petró-
leo aflorava naturalmente em determinadas regiões. A palavra petróleo vem do
latim petroleu (petra+oleum), que significa “óleo de pedra” (FERREIRA, 1999, p.
1558). Esta denominação surge para diferenciá-lo do óleo vegetal, produzido por
oleaginosas como a soja, a mamona ou o girassol, e da gordura animal,
produzida a partir da baleia ou da banha de porco. Conhecido com “óleo de
pedra” no Ocidente, “betume” no Oriente Médio e “óleo de sêneca” para seu uso
como remédio (quando era considerado uma panaceia), algumas de suas pro-
priedades já eram realmente conhecidas há milênios pelos humanos. Esse óleo
viscoso e de forte odor, produto de milhões de anos de decomposição de sedi-
mentos orgânicos armazenados no subsolo, tornou-se matéria-prima indis-
pensável à indústria moderna. Sua constituição, formada por uma mistura com-
plexa de longas cadeias de moléculas de hidrogênio e carbono (hidrocar-
bonetos), permite infinitas combinações com inúmeros elementos químicos,
como o oxigênio, o nitrogênio e o enxofre, dentre outros. Essas combinações
possíveis dão origem a substâncias de grande variedade estrutural, inclusive
moléculas com cadeias longas e de complexa arquitetura tridimensional (PE-
TRÓLEO..., 2003).

Economia e indústria do petróleo

A logística do petróleo é tão complexa quanto grandiosa; exige pesados


investimentos em extração, transporte, armazenamento, refino e distribuição. A
extração no litoral ou em águas profundas exige plataformas que funcionam

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como cidades no oceano. A última etapa do processo é a distribuição dos deri-
vados através de caminhões-tanque, que têm a capacidade de abastecer não só
os grandes centros, mas também as cidades que se encontram geograficamente
afastadas das refinarias.
Em função da distribuição geográfica desigual das jazidas, o petróleo é a
principal commodity negociada no comércio internacional (PINTO JÚNIOR,
2007). Mas está longe de ser uma mercadoria qualquer, pois além de ser um
recurso mineral não renovável, as condições de oferta e de demanda são forte-
mente influenciadas pelo cenário geopolítico. de todas as commodities comerci-
alizadas no mundo, é aquela que mais sofre interferência dos fatores geopolíti-
cos e, por isso mesmo, tem na instabilidade do seu preço um elemento funda-
mental e, ao mesmo tempo, preocupante.
Nas palavras de um magnata, “petróleo é quase dinheiro” (YERGIN,
1992). Trata-se de matéria-prima capaz de gerar lucros exorbitantes para as
companhias que nela sabem e podem investir. Para se ter uma ideia do retorno
proporcionado pela sua exploração, basta comparar o custo médio de produção
por barril e confrontá-lo com os preços de revenda no mercado internacional. Em
julho de 2008, por exemplo, o barril chegou a ser negociado a US$ 147, enquanto
o custo de produção no entorno do Golfo Pérsico, o mais baixo do mundo, gira
em torno de US$ 1 por barril.
A diferença entre um e outro é praticamente o lucro líquido do produtor.
Some-se a isso a quantidade média diária de barris produzidos, por exemplo,
pela Arábia Saudita (em torno de 11 milhões de barris por dia), e pode-se ter
uma ideia da envergadura deste setor da economia que faz suas contas em bi-
lhões de dólares. No caso do Brasil, a maior parte do petróleo vem da bacia de
Campos, que tem um custo de produção em torno de US$ 13 o barril. Ainda
assim, o retorno é garantido, considerando que, desde a primeira crise do petró-
leo, em 1973, o preço do barril tem se mantido em patamares quase sempre
superiores a esse valor.
Mesmo o petróleo da camada pré-sal, cujo custo estimado de extração
pela Petrobras gira em torno de US$ 40 ou 50 por barril, poderá render grandes
lucros à companhia, uma vez que o barril se mantenha num patamar acima dos
US$ 60, o que não é de todo difícil (PINTO JÚNIOR, 2007). Rigorosamente, não
se produz petróleo: encontra-se e extrai-se o óleo das reservas preexistentes,

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que precisam ser procuradas, descobertas e mapeadas. Essas reservas, por es-
tarem distribuídas de forma desigual no planeta, em termos quantitativos e qua-
litativos, constituem um elemento central na dinâmica geopolítica que marca o
uso desta matériaprima. Nas palavras de Pinto Junior,
A competição pelo acesso às reservas e, portanto, à geração e apropria-
ção das rendas diferenciais de um insumo essencial para a sustentação da ati-
vidade econômico-social mundial constitui o motor fundamental de crescimento
da indústria mundial do petróleo e das disputas geopolíticas mundiais. (PINTO
JÚNIOR, 2007, p. 44). Por que a organização da indústria petrolífera se coaduna
com as políticas dos governos? Quais são as razões que levam o setor a ser
dominado por megaempresas, sejam elas privadas ou estatais? Por que a geo-
política detém um papel central na evolução da indústria petrolífera e no relacio-
namento energético entre governos? Quais são as razões pelas quais o preço
do petróleo assume tamanha importância entre operadores econômicos, gover-
nos e nações? Estas são algumas das indagações a respeito das quais cabe
refletir no presente capítulo.
O petróleo se manifesta de diferentes maneiras na natureza. Denomina-
se petróleo as acumulações de hidrocarbonetos líquidos em rochas-reservató-
rios que levam milhões de anos para se formar. Daí ser o petróleo considerado
uma fonte de energia esgotável do ponto de vista do seu aproveitamento econô-
mico, embora tecnicamente seja renovável, pois novas reservas serão formadas
num horizonte de milhões de anos, o que certamente não contribuirá para bene-
ficiar a humanidade em futuro tão longínquo.
A natureza, portanto, apresenta um número finito de reservatórios petro-
líferos, cada um com diferente potencial de produção e qualidade. Isto significa
que nem todo óleo dos reservatórios existente na natureza pode ser extraído.
“Existem restrições técnicas que atualmente limitam a produção do óleo exis-
tente nos reservatórios a cerca de 30% a 40% do seu volume total.” (PINTO
JUNIOR, 2007, p. 45).
A economia do petróleo apresenta uma estrutura industrial altamente ver-
ticalizada, na qual grandes companhias costumam controlar os diferentes seg-
mentos da atividade de toda a cadeia, desde a extração até a distribuição e co-
mercialização dos derivados no varejo (do poço ao posto). Isto se dá em função

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dos atributos técnico-econômicos e do fator estratégico deste setor, que motiva-
ram a maioria das firmas a integrar suas atividades, de forma a distribuir os riscos
e os custos entre os vários segmentos da cadeia industrial verticalizada.
Ao fazê-lo, as companhias procuram, por um lado, beneficiar-se das vantagens
inerentes da economia de escala em todos os segmentos da cadeia produtiva e, por
outro, buscar a diversificação geográfica das suas atividades, operando em vários paí-
ses hospedeiros, com diferentes níveis de estrutura geológica das jazidas e de riscos
políticos.12 Desta forma, procuram privilegiar sua sobrevivência no longo prazo em sa-
crifício temporário dos lucros no curto prazo, de maneira a destinar parte suficiente do
capital para a atividade de pesquisa exploratória (PINTO JUNIOR, 2007). Outro ponto a
ser destacado é o volume de dinheiro envolvido no processo produtivo, considerando
as duas etapas principais (upstream e downstream) da indústria do petróleo. Algumas
corporações petrolíferas chegam a obter um faturamento próximo de meio trilhão de
dólares, advindos da venda diária de milhões de barris de derivados energéticos e não
energéticos. Segue abaixo ilustração da cadeia produtiva e distributiva da indústria do
petróleo, conforme Figuras 05 a 12:
a) Exploração e produção, incluindo desde a prospecção geofísica para a iden-
tificação das jazidas, até a produção e o armazenamento do óleo extraído. O
petróleo pode ser extraído em terra ou no mar.

b) A segunda etapa da cadeia produtiva e distributiva diz respeito à rede de


transporte do petróleo, desde as áreas de produção até as áreas de refino. Ex-

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istem duas formas básicas de se transportar o óleo: para o transporte continen-
tal, em terra, utilizam-se redes de oleodutos; para o transporte transcontinental,
via oceânica, utilizam-se navios petroleiros de grande capacidade.

c) A terceira etapa da cadeia é o armazenamento do óleo bruto, realizado em


grandes reservatórios, muitos dos quais localizados perto do litoral, em função
do transporte marítimo.

d) A quarta etapa é o refino do petróleo bruto, através do processo de aqueci-


mento progressivo e craqueamento, realizado em refinarias.

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e) A quinta e última etapa é a distribuição e comercialização de derivados. Em
geral, é realizada através de caminhões-tanque para indústrias e postos de com-
bustíveis no interior do território. Os principais derivados energéticos de petróleo
são os combustíveis para abastecer o sistema de transporte.

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Existem cerca de 200 tipos de óleo cru, agrupados em faixas de quali-
dades, que são identificadas pelo parâmetro conhecido como “grau API”. Trata-
se de um ranking estabelecido pelo American Petroleum Institute (API), que
sistematizou as especificidades físico-químicas que determinam a qualidade do
petróleo, que pode ser classificado como leve, médio, pesado ou ultrapesado.
Óleos com grau API superior a 300 são considerados leves, isto é, permitem a
produção de derivados nobres a menor custo, como a gasolina, o diesel, a nafta
e o gás liquefeito de petróleo (GLP). Os óleos de grau API baixo são considera-
dos óleos pesados ou ultrapesados, estes últimos também conhecidos como pe-
tróleo não convencional, que exigem refinarias mais complexas e caras para re-
finá-los (PINTO JUNIOR, 2007).
As reservas de óleo podem ser classificadas em vários tipos, de acordo
com o grau de certeza de sua existência. O termo “reservas provadas” é utilizado
para se referir ao volume de óleo que pode ser extraído de sua jazida. Na maioria
dos casos, a extração se limita a 30% ou 40% do volume total da reserva, em
função de limitadores técnicos e geológicos. Todavia, há jazidas das quais se
consegue extrair até 90% do óleo nelas existente, mas são casos raros. Na
verdade, nem mesmo a empresa que estimou o montante das reservas de um
campo pode ter certeza da quantidade exata existente. Esse é um número que
só pode ser obtido de uma forma mais aproximada no final do ciclo de vida de
um campo. Na estrutura dos custos de produção, são identificados dois tipos
básicos de tributação. O primeiro são os royalties, que representam uma das
formas mais antigas de pagamento sobre atividades econômicas. A expressão
royalty tem origem na língua inglesa na palavra royal (real, realeza).
O pagamento cobrado era originalmente referente ao uso das terras
pertencentes ao reino por produtores agrícolas. Nos dias de hoje, utilizase a co-
brança de royalties para o pagamento pela exploração de recursos esgotáveis.
Neste caso, o pagamento está associado, em particular, ao ressarcimento de
gerações futuras pelo esgotamento de recursos hoje existentes. O segundo tipo
básico de tributação são os impostos, referentes ao pagamento de direitos de
propriedade e outros encargos tributários, que costumam incidir sobre o lucro
líquido da companhia ou através de outra forma de cálculo. Os custos de
produção de petróleo variam consideravelmente conforme a região geográfica
do planeta e as condições geológicas e técnicas das empresas exploradoras

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deste recurso natural. O menor custo unitário de produção se refere à exploração
de poços nos campos em terra (onshore), no Oriente Médio, de aproximad-
amente US$ 1 por barril, seguido pela extração em terra, no Texas e na Califór-
nia, com o uso do cavalo mecânico, estimado em US$ 6 o barril.
O custo intermediário se concentra nos poços de certas faixas de área
offshore no litoral da África e do Brasil, estimado em US$ 13 por barril, e no Mar
do Norte, ligeiramente superior, de US$ 20 o barril, onde a extração é feita a
grandes profundidades, associada a condições metereológicas muito adversas.
Já os custos mais altos se referem à extração do petróleo do pré-sal (no Golfo
do México e no Atlântico brasileiro) estimados em torno de US$ 40 ou 50, e
àqueles extraídos das areias betuminosas do Canadá, o maior produtor deste
tipo de petróleo não convencional, a um custo estimado de US$ 60 por barril
(PINTO JUNIOR, 2007). Em suma, o Oriente Médio, o sudoeste dos Estados
Unidos, a África e a América Latina se situam na banda inferior dos custos de
produção, ao passo que parte da América do Norte (Canadá e Alasca) e do norte
da Europa se encontram na banda superior de custos, incluindo-se aí o petróleo
da camada pré-sal do litoral brasileiro.
O fator mais significativo na economia do petróleo, contudo, é a diferença
de produtividade. Nos Estados Unidos, a média de produção por poço é de 13
barris por dia; no Oriente Médio, determinadas regiões chegam a ter produção
superior a 7.000 barris por dia para cada poço de perfuração! (PINTO JUNIOR,
2007). Isto significa que montantes semelhantes de investimento aplicado em
exploração e produção em diferentes regiões pode resultar num diferencial de
produtividade que chega a ser mais de 500 vezes superior, se considerado o
exemplo acima entre os Estados Unidos e o Oriente Médio. Essas diferenças
verificadas no custo de produção e de produtividade ao redor do mundo são um
elemento essencial na configuração da geopolítica do petróleo, estando na ori-
gem de uma série de conflitos e focos de tensões, envolvendo não só governos,
mas também grandes empresas privadas e estatais. Um agravante deste quadro
é o fato de que apenas seis países no entorno do Golfo Pérsico detêm, juntos,
aproximadamente 60% das jazidas de petróleo convencional, com reservas
provadas distribuídas por enormes áreas geográficas (Mapa 02). Estas carac-
terísticas expostas acima contribuem para tornar o petróleo especial do ponto de
vista econômico, pois a sua oferta total no mundo comporta o óleo árabe, mais

18
produtivo e de extração mais barata, mas, também, o petróleo produzido no mar
(offshore), com custos que podem atingir mais de US$ 20 o barril e, no caso do
pré-sal brasileiro, até US$ 50. Em nenhum outro negócio do mundo, um produtor,
com uma estrutura de custos dezenas de vezes maior do que a de seus concor-
rentes, poderia permanecer competindo no mercado (PINTO JUNIOR, 2007). Na
economia do petróleo, os riscos são altos, mas o prêmio também é muito ele-
vado.

Em suma, a possibilidade de geração de lucros extraordinários e as van-


tagens competitivas em todos os segmentos da indústria petrolífera explicam o
tipo de padrão de concorrência entre as companhias e os focos de tensões ge-
opolíticos pelo acesso e controle das regiões que dispõem das maiores e
melhores reservas. A geopolítica do petróleo nasce juntamente com a sua in-
dústria, adquirindo dimensão e importância sem paralelo por qualquer outra fonte

19
de energia no século XX. Das dez maiores empresas do mundo, conforme rank-
ing de 2009 da revista Fortune, sete são petrolíferas, e uma, automobilística,
dependente, portanto, da indústria do petróleo (Quadro 04).

A Petrobras, neste ranking, ficou em 34º lugar, com faturamento de US$


118 bilhões. Essas características da economia e da geopolítica petrolífera ex-
plicam por que a possibilidade de formação de cartéis nesse segmento é grande.
De fato, a geopolítica do petróleo foi notadamente marcada pela presença de
trustes e cartéis em diferentes momentos do século XX: o truste configurado pela
Standard Oil, de John Rockefeller, o cartel das Sete Irmãs, que dominou de 1928
até 1973, e o cartel da OPEP, a partir de 1973.
Operar no mercado em forma de cartel garante aos seus membros tomar
as rédeas do poder deste setor econômico estratégico, com a possibilidade de
controlar o preço do insumo no âmbito internacional. O estudo da configuração
da indústria do petróleo, bem como dos cartéis que se formaram no interior deste
setor, é fundamental para se entender a geopolítica mundial do petróleo e, por
isso mesmo, será tratado a seguir.

20
Geopolítica mundial do petróleo (1860-2003)

O ano de 1859 representa um marco para a indústria moderna do petró-


leo. Foi neste ano que Edwin Drake fez sua descoberta pioneira, com a perfura-
ção do primeiro poço em Titusville (Pensilvânia, Estados Unidos).
O petróleo originou a mais competitiva indústria do mundo e fundou a
base tecno-energética do desenvolvimento do século XX; forjou, também, uma
nova e complexa geopolítica que, até então, não existia. Com o ingresso do pe-
tróleo no cenário internacional, a energia do óleo passou a coexistir com a do
carvão mineral em cenários de conflitos e focos de tensões geopolíticos entre
países importadores e exportadores e entre firmas petrolíferas e governos. É a
respeito dessa geopolítica que o capítulo a seguir tratará.
O desenvolvimento da indústria mundial do petróleo e a evolução da sua
geopolítica tiveram origem em duas modalidades de organização industrial. A
primeira, originalmente norte-americana, centrou-se no crescimento de firmas
privadas que evoluíram rapidamente para a internacionalização industrial. A se-
gunda, tendo o Reino Unido, a Argentina, o México e o Brasil como precursores,
difundiu-se para a maioria dos países de industrialização tardia, centrando-se no
desenvolvimento de empresas estatais. Nas palavras de Pinto Junior,
As grandes firmas petrolíferas privadas e as estatais de petróleo evo-
luíram na arena imbricada pelas estratégias de poder hegemônicas e subordina-
das, no plano das políticas nacionais e também no da dinâmica política das
relações internacionais. O petróleo selou o ‘destino’ das nações e das coalizões
de nações vencedoras e vencidas nas duas grandes guerras mundiais do século
XX, promovendo a luta pela descolonização e industrialização das nações em
desenvolvimento, em particular nas nações do mundo árabe. (PINTO JÚNIOR,
2007, p. 60).
A evolução da indústria e da geopolítica do petróleo pode ser dividida em
cinco fases bem distintas e delimitadas no tempo. A primeira foi essencialmente
norteamericana, e se deu no período 1860-1870.
A segunda vai de 1870 a 1911, ano em que o império de John D. Rocke-
feller é desmembrado por força de lei. Esta fase também é concentrada nos Es-
tados Unidos. A terceira vai de 1911 a 1928, ano em que se forma o cartel das
Sete Irmãs (ou majors). A quarta fase é a mais longeva e teve um alcance global,

21
vigorando entre 1928 e 1973, dominada pelo cartel das companhias privadas
anglo-saxônicas de petróleo que se configurou na etapa anterior. A quinta fase
se inicia em 1973, com a primeira crise do petróleo, quando o cartel da OPEP
toma o controle da situação e passa a ditar os rumos geopolíticos do petróleo
em escala global. Esta fase perdura até os dias de hoje, com algumas alterações
conjunturais e estruturais que serão analisadas neste capítulo.
Iniciando-se pela primeira fase (1860-1870), a corrida pelo ouro negro se
deu de forma amadora no Oil Greek Valley (Pensilvânia), atraindo aventureiros
de toda espécie, quando efêmeras empresas de petróleo disputavam os terrenos
exploráveis da região. Todos se lançaram a produzir o mais rápido e na maior
quantidade possível, com frequência danificando reservatórios ou levando os
poços à exaustão prematura. Prova disso é que o preço do barril de petróleo, de
US$ 20 em 1859, caiu para US$ 0,10 em 1862 (PERCEBOIS apud PINTO JUN-
IOR, 2007).
A falta de conhecimento geológico estimulava a drenagem despropor-
cional dos poços, a redução do aproveitamento dos poços adjacentes e a corrida
para exauri-los. Apesar disso, no final desta fase, já se vislumbravam alguns
avanços tecnológicos, como a substituição de carroças pela ferrovia e a con-
strução de oleodutos de madeira para o transporte, além da melhoria nos méto-
dos de perfuração e a valorização do refino. Entretanto, o baixo custo e a aces-
sibilidade do querosene — principal subproduto do petróleo na época — utilizado
em lampiões foram ameaçados pela praticidade da energia elétrica, descoberta
por Thomas Edison, em 1877.
O principal nome desta primeira fase do petróleo, e também da seguinte,
foi o de Rockefeller, que solucionou racionalmente os desafios de armazenar,
transportar e refinar petróleo, para vender seus derivados. A preocupação com
a qualidade dos produtos oferecidos ao mercado inspirou o nome da empresa
que ele criou: a Standard Oil Company, em 1870, que em tradução literal para o
português significa “Companhia de Óleo Padronizado”. Todavia, a maior ino-
vação deste empreendedor americano na história do petróleo foi ter percebido e
realizado a integração da cadeia industrial, fundando o maior dos monopólios da
economia norte-americana na passagem do século, configurado através de uma
estrutura empresarial em forma de truste ― inaugurando, nos Estados Unidos,
uma nova forma de administrar empresas coligadas, o que, para a época, era

22
uma novidade. A segunda fase da indústria do petróleo se inicia em 1870 e vai
até 1911. O ano de 1870 inaugurou a ascensão da carreira empresarial de Rock-
efeller. Entre 1880 e 1890, a Standard Oil controlava 90% de todo o refino nos
Estados Unidos, 80% do mercado de produtos à base de petróleo, 25% da
produção total de óleo bruto e mais de 25% da oferta mundial de querosene
(JUHASZ, 2009).
Os produtos à base de óleo invadiam a Europa, a Ásia, a África do Sul e
a Austrália, sendo que, em 1900, 70% das atividades do truste de empresas
comandado por ele se desenvolviam fora dos Estados Unidos (GIRAUD; LA
TOUR apud PINTO JÚNIOR, 2007). Para chegar a esse ponto de quase monop-
olização do mercado, Rockefeller apostou no aproveitamento econômico de dois
conceitos fundamentais para a economia industrial, e que viriam moldar toda a
economia e a geopolítica do petróleo nas décadas seguintes: a economia de
escala e a integração vertical da produção.
Economia de escala significa produzir grandes volumes de um determi-
nado produto. Isto possibilita uma forte redução dos custos médios, fazendo com
que as empresas concorrentes passassem a experimentar dificuldades de rent-
abilidade, do que resultou que muitas delas acabaram sendo compradas pela
Standard Oil. O segundo conceito econômico desenvolvido por Rockefeller é
aquele que controla todas as fases da cadeia produtiva (integração vertical, do
upstream ao downstream), o que transformou a Standard Oil em um price maker
(formador de preços), consolidando sua posição dominante e criando enormes
barreiras à entrada de novas empresas na indústria petrolífera norte-americana.
Na visão de Juhasz (2009), a Standard Oil era famosa tanto pela “crueldade”
como pela “ilegalidade” de seus métodos empresariais.
A companhia comprou hostilmente produtores, refinadores e outros for-
necedores de petróleo; ofereceu suborno a funcionários governamentais, intimi-
dou ou reduziu a cinzas seus concorrentes; muitas pessoas de todo o país esta-
vam enfurecidas com seu controle sobre o governo norteamericano.
Esta segunda fase da indústria do petróleo foi caracterizada pela
formação de grandes trustes na economia americana, e o mais poderoso deles
foi, sem dúvida, o de Rockefeller. Um truste é uma combinação de empresas,
em que um conselho de administração conserva as ações de cada empresa e
gerencia o negócio de todas. Enquanto a companhia funciona como um único

23
conglomerado gigantesco, as empresas individuais mantêm o status legal.
(JUHASZ, 2009). Na época, a palavra truste rapidamente se transformou em
sinônimo de grande empresa nos Estados Unidos. A formação destes grandes
conglomerados e trustes está na origem de desdobramentos sociais que moti-
varam a apreensão da opinião pública americana.
A mobilização política passou a pressionar Washington para controlar os
excessos do poder econômico e político dos grandes grupos empresariais, em
especial o do emblemático “império” Rockefeller. A legislação do Sherman Act
nasceu em 1890 com este objetivo, iniciando uma longa onda de reformismo
progressista, controle e regulamentação dos grandes negócios. “Esta legislação
é considerada, até hoje, o principal ponto de apoio de todos os mecanismos de
defesa e regulação da concorrência, servindo de inspiração para os dispositivos
jurídicos e institucionais que tratam desta matéria em muitos países.” (PINTO
JÚNIOR, 2007, p. 62). Finalmente, em 1911, a Suprema Corte Federal dos Es-
tados Unidos utilizou a Lei Antitruste Sherman para dividir a Standard Oil em 34
empresas distintas, entre as quais algumas evoluíram para se tornar as maiores
companhias da indústria mundial do petróleo daí por diante.
A Standard Oil of New Jersey tornou-se a Esso e, depois, a Exxon; a
Standard Oil of New York tornou-se a Mobil; a Standard Oil of California virou a
Socal, hoje Chevron. Essas três empresas passaram a disputar com outras duas
americanas, a Texaco e a Gulf Oil, criadas a partir das descobertas de petróleo
no Texas, na Lousiana e em Oklahoma, o controle do crescente mercado norte-
americano de óleo e derivados. Em suma, esta segunda fase da geopolítica do
petróleo (1870-1911) foi marcada pelo avanço das empresas dos Estados
Unidos nos mercados internacionais, em especial o europeu, e pela concen-
tração de poder, através da formação de trustes e grandes conglomerados que
procuravam monopolizar o mercado. Destacam-se aqui as duas inovações de
Rockefeller, já mencionadas anteriormente: o desenvolvimento da produção de
escala, reduzindo custos produtivos até deixar seus concorrentes sem saída, e
o controle de todas as fases da cadeia produtiva (integração vertical, do up-
stream ao downstream), tornando-se, em última instância, um formador de pre-
ços. Essas duas inovações foram fundamentais para a geopolítica do petróleo
nas fases seguintes, uma vez que foram capazes de concentrar enorme poder
nas mãos das grandes companhias, com desdobramentos importantes para a

24
geopolítica petrolífera até os dias de hoje. O ano de 1911, portanto, encerra a
segunda fase da indústria do petróleo e dá início à terceira fase (1911 a 1928).
Esta é caracterizada pelo momento em que a indústria petrolífera, a do motor de
combustão interna e a petroquímica mudaram a natureza da Primeira Guerra
Mundial.
Nesta época, governos e grandes corporações da Europa e dos Estados
Unidos iniciaram a disputa para tomar posse das jazidas do Oriente Médio. As
imensas reservas de óleo descobertas no período entreguerras colocaram
países como Arábia Saudita, Iraque, Irã, Kuwait e Emirados Árabes Unidos no
centro da geopolítica energética internacional. A demanda por petróleo era tanta
naquela época que, em 1938, o rei Abdul Aziz, da Arábia Saudita, chegou a fazer
um irônico comentário a um interlocutor: “Você sabe o que eles [os astronautas]
encontrarão quando chegarem a Marte? Eles encontrarão norte-americanos ali,
no deserto, procurando petróleo.” (JUHASZ, 2009, p. 21). Esse movimento rumo
ao Oriente Médio foi precedido por esforços de pesquisadores, que mapearam
e realizaram descobertas pioneiras no entorno do Golfo Pérsico, estabelecendo
os primeiros contatos e relações com os governos locais dessa região (PINTO
JUNIOR, 2007).
Nesta fase, o controle do suprimento do óleo cru era considerado estraté-
gico, para evitar a sobreposição e a guerra de preços, além de fundamental para
a dominação geopolítica desse setor econômico cada vez mais crucial para o
desenvolvimento das nações, inclusive para se fazer a guerra. A partir daí, as
nações e organizações incorporaram o petróleo aos seus planos econômicos e
estratégicos, transformando a história do século XX numa sucessão de focos de
tensões, conflitos e problemas políticos relacionados à geopolítica petrolífera.
Nas palavras de Juhasz,
As comunidades que vivem em países ricos em petróleo ― desde o
Equador até a Nigéria, passando pelo Iraque ― sofrem a tirania das violações
diárias dos direitos humanos, da violência e da guerra. A tirania da poluição am-
biental, dos riscos à saúde pública e da destruição do clima é criada em cada
etapa da utilização do petróleo: da exploração até à produção, do transporte até
o refino, do consumo até o descarte. Ademais, a tirania política exercida pelas
maiores empresas da indústria do petróleo corrompe a democracia e destrói a
capacidade de escolha de o quanto sacrificaremos em nome do petróleo.

25
(JUHASZ, 2009, p. 12). A possibilidade do controle do suprimento de óleo cru
em escala mundial, pelas majors, 13 dependia de dois fatores. Em primeiro lugar,
a definição dos direitos de propriedade e do controle das reservas pelas empre-
sas nos países do Oriente Médio; em segundo, a adoção, entre as majors, de
uma coordenação oligopolista que impedisse formas perigosas de competição,
alocando-se níveis de produção e de suprimento de demanda nas áreas ge-
ográficas da indústria. O primeiro fator foi implantado através do sistema de con-
cessões. Este sistema foi o instrumento jurídico concebido para regular as
relações entre os governos dos países com grandes reservas de óleo cru e as
companhias internacionais de petróleo.
A concessão outorgava à empresa um tipo de direito absoluto em certa
área territorial sob jurisdição do Estado hospedeiro para procurar, extrair e
vender volumes de óleo a preços também definidos pela concessionária, em
troca de uma compensação financeira. O regime de contratos de concessão é
empregado, atualmente, em cerca de 50% da produção mundial. Ele prevê que
as empresas estrangeiras são responsáveis pelas atividades de exploração e
produção sob sua conta e seu risco. Em caso de êxito, as empresas terão direito
à propriedade do petróleo produzido.
O governo do país hospedeiro é remunerado com royalties e outras for-
mas de tributação. Fosse o Estado hospedeiro um país árabe, africano ou sul-
americano, o fato é que as companhias petrolíferas conseguiram se impor junto
as suas autoridades, transformando e consolidando a posição subordinada dos
países periféricos frente às maiores companhias de petróleo do mundo. A cober-
tura territorial da concessão se estendia frequentemente à totalidade ou à quase
totalidade da área geográfica do país.
O tempo de vigência da concessão também era bem generoso: poderia
contemplar, em alguns casos, entre 60 e 75 anos. A compensação financeira ao
Estado, paga através de royalties pelo volume vendido e de imposto de renda
sobre o lucro realizado, se baseava numa contabilidade anual que era totalmente
controlada pela empresa estrangeira (PINTO JUNIOR, 2007). O segundo fator
que contribuiu para dar às majors o controle sobre a maior parte do fluxo inter-
nacional de petróleo foi a organização das empresas em sistema de consórcio,
que precedeu a negociação do grande acordo sobre a formação do conjunto de

26
regras conhecido como “Acordo de Achnacarry”,14 reunião que configurou o car-
tel das Sete Irmãs. Realizando a partição dos mercados mundiais de petróleo,
pari-passo com o controle geográfico das reservas do Oriente Médio, o acordo
consolidou as posições estratégicas até aquele momento conquistadas pelas
sete maiores corporações petrolíferas do mundo, tendo profundo impacto na ge-
opolítica do petróleo até a primeira grande crise, em 1973.
Esse acordo de 1928 marca o início da quarta fase da geopolítica do pe-
tróleo, quando as Sete Irmãs passam a controlar parte considerável da
produção, do refino, do fluxo e do mercado petrolífero internacional no âmbito
mundial, com a incorporação paulatina da produção nas gigantescas reservas
descobertas no entorno do Golfo Pérsico. Nas palavras de Perons, citado por
Pinto Junior, Em 1950, excluídos os países à época denominados socialistas, as
majors controlavam 65% das reservas mundiais, mais de 50% da produção de
óleo bruto, detinham a propriedade de 70% da capacidade de refino e cerca de
dois terços da frota mundial de petroleiros, além dos mais importantes oleodutos.
(PINTO JUNIOR, 2007, p. 68). Pode-se afirmar, com segurança, que esta con-
centração de poder nas mãos destas empresas inaugurou a geopolítica do pe-
tróleo das Sete Irmãs, que perduraria por quase meio século. O domínio
econômico, diplomático e militar dos Estados Unidos, após 1945, manifesto na
implementação do Plano Marshall e na tutela sobre a Alemanha, a Itália e o
Japão, assim como sobre as organizações internacionais, consolidou o ingresso
das empresas norte-americanas nos mercados europeus e japonês de deriva-
dos. Entre as majors, não havia a participação de capital italiano ou japonês,
apenas a participação acionária do Deutsche Bank alemão, de forma minoritária,
através de participações no consórcio da Turquish Petroleum Company.
Até a França não fazia parte das majors, embora alguns autores consid-
erem a CFP francesa (união da Petrofina belga com a Elf francesa, atual Total)
como a oitava irmã do cartel (SANTOS, 2003). Apesar disso, a Segunda Guerra
Mundial marcou um ponto de inflexão que foi minando, paulatinamente, o poder
das majors até o golpe final, em 1973. A partir do pósguerra, a estabilidade or-
ganizada e coordenada pelo cartel foi sendo progressivamente erodida. Novos
eventos contribuíram para minar o seu poder, destacando-se, dentre eles: a) a
criação de empresas estatais e a nacionalização das indústrias de petróleo em

27
países periféricos, iniciadas na década de 1950, ampliadas nos anos 60 e con-
cluídas nos anos 70; b) o retorno do petróleo russo ao mercado europeu, por
volta dos anos 1950; c) a criação da OPEP em 1960, em resposta à redução de
preços operada pelas majors; d) o início da internacionalização das grandes
companhias independentes americanas, denominadas minors, na década de
1960; e) a negociação de acordos mais favoráveis entre os países exportadores
e as estatais europeias, notadamente a italiana Ente Nazionale Idrocarburi (ENI),
desestabilizando as regras contratuais estabelecidas pelas grandes empresas
do cartel das Sete Irmãs nas concessões do Oriente Médio; f) e o surgimento de
novos produtores, como a Indonésia e a Nigéria, nos anos 1960, o que contribuiu
para descentralizar ainda mais a geopolítica petrolífera, em detrimento do poder
das majors (PINTO JUNIOR, 2007).
A ordem instaurada pelas Sete Irmãs no Oriente Médio tinha como ala-
vanca o poder político anglo-americano. Esse poder, porém, estava enfraque-
cido no final da década de 1960, particularmente pela crescente força do mo-
vimento de descolonização dos países da Ásia e África e, de um modo geral,
pelas reivindicações de progresso econômico pleiteadas pelas nações não alin-
hadas (outrora conhecidas como Terceiro Mundo). Para os Estados Unidos, em
particular, o fracasso anunciado pela Guerra do Vietnã tornava as coisas ainda
mais preocupantes. A partir de 1960, ano de criação da OPEP e do surgimento
progressivo de empresas estatais nos países da organização, observa-se um
processo denominado desintegração vertical das majors que estavam à frente
da geopolítica do petróleo.
Esse processo acarretou a revisão dos contratos de concessão e a ne-
cessidade de estabelecimento de contratos de longo prazo de compra de petró-
leo. [Desta forma] os países detentores de reservas assumiram efetivamente,
através da revisão das concessões, o controle das reservas nacionais, a fim de
utilizar a renda petrolífera como principal fonte de financiamento do desenvolvi-
mento econômico e social. (PINTO JÚNIOR, 2007, p. 76). Este movimento refor-
çou a importância da dimensão geopolítica petrolífera, uma vez que a criação da
OPEP respondeu à busca de maior poder internacional de certos países do Ori-
ente Médio, como nos casos da Arábia Saudita, do Irã e do Iraque. Essa guinada
retirou das Sete Irmãs a autonomia e os privilégios que tinham adquirido na ex-
ploração do petróleo das nações do entorno do Golfo Pérsico, cujas reservas e

28
produção passaram a ser controladas diretamente pelas suas próprias empresas
estatais. Em consequência, consolidou-se o modo de organização industrial dos
monopólios petrolíferos estatizados e foram estabelecidas barreiras institucion-
ais à entrada das companhias estrangeiras na exploração e na produção, de
forma diferenciada da que vinha sendo feita.
Essas transformações estão no cerne do fim da quarta fase da geopolítica
do petróleo, que se encerra em 1973, quando a OPEP, que fora criada 13 anos
antes em Bagdá, como um “cartel para confrontar o cartel”, finalmente toma o
controle da situação e passa a usar o petróleo como arma política. As Sete Irmãs
e seus governos-sede foram surpreendidos e, em conjunto, simplesmente se
recusaram a reconhecer a OPEP.
De fato, na maior parte da década de 1960, tanto as companhias petrolí-
feras quanto o governo dos Estados Unidos não tiveram motivos para se pre-
ocupar demais com o cartel árabe, uma vez que seus países-membros vinham
tendo dificuldade para encontrar seu fundamento organizacional. No entanto,
como ressalta Juhasz, Três forças agiram em conjunto para modificar radi-
calmente a ordem existente, fazendo tanto as empresas petrolíferas como o gov-
erno norteamericano darem mais atenção à Opep. Em 1970, os Estados Unidos
alcançaram o auge da sua produção interna de petróleo.
A partir daí, o país se tornou muito mais dependente das importações para
atender ao consumo doméstico, e as companhias norte-americanas viram-se
com menos poder para dar garantias contra mudanças da oferta internacional,
tendo a produção doméstica diminuída. Além disso, em 1970, a demanda por
petróleo havia crescido mais do que as companhias tinham previsto, e elas não
haviam produzido suficiente petróleo para atendê-la. Desse modo, pela primeira
vez desde a criação da Opep, o cartel dos produtores tinha um mercado favorá-
vel ao vendedor, com a demanda pelo petróleo superando a oferta disponível.
(JUHASZ, 2009, p. 102). A quinta fase desta complexa geopolítica, assim, se
inicia com o primeiro choque do petróleo. Entre 1950 e 1974, os preços estáveis
em torno de US$ 2 ou 3 por barril contribuíram para o aumento da demanda
mundial de óleo, a uma taxa média de 9,5% ao ano. Entretanto, a guerra do Yom
Kippur, entre Israel e Egito, levou os países árabes, liderados pela Arábia Sau-
dita, a ameaçarem as nações que apoiassem Israel com uma redução mensal

29
de 5% nas exportações, com o risco de ruptura do abastecimento. O agrava-
mento da situação levou a OPEP à decisão unilateral de elevar os preços de
US$ 2,90 para US$ 11,65 o barril (PINTO JUNIOR, 2007), conforme Figura 13.

O apoio incondicional do governo norte-americano a Israel gerou uma rea-


ção dos exportadores árabes de petróleo que provavelmente não fazia parte dos
cálculos das potências ocidentais no complexo contexto geopolítico do Oriente
Médio.15 Era a primeira vez que o petróleo havia sido usado como arma política,
ainda mais por países considerados periféricos. Estes países, todavia, haviam
se tornado grandes potências produtoras e exportadoras de óleo em pouco
tempo. Ironicamente, essa nova geopolítica teve origem nos pesados inves-
timentos em produção, refino e transporte realizados pelas Sete Irmãs nas dé-
cadas anteriores nos países do Oriente Médio, muitos dos quais expropriaram
seus ativos e nacionalizaram as reservas em seus territórios nos anos 1970.
A OPEP sabia que o Ocidente não poderia passar sem as importações,
sob pena de ficarem energética e estrategicamente vulneráveis. Em 1973, o rei
Faiçal, da Arábia Saudita, declarou à imprensa norte-americana: “O apoio com-
pleto dos Estados Unidos ao sionismo e contra os árabes torna dificílima para
nós a continuidade do suprimento de petróleo para os Estados Unidos ou mesmo
a manutenção da amizade com os Estados Unidos.” (JUHASZ, 2009, p. 103).
Apesar de ter sido criada em 1960, foi o ano de 1973 que colocou a OPEP no
centro da geopolítica mundial do petróleo, pois a fase anterior foi substituída, em

30
poucos meses, após várias medidas que desestruturaram o mercado internac-
ional petrolífero, dando início à quinta fase da geopolítica petrolífera mundial. A
balança passou a pender favoravelmente para os grandes exportadores ― situ-
ação que só se relativizaria na segunda metade dos anos 1980, quando o mer-
cado se tornou favorável aos consumidores, levando ao contrachoque do petró-
leo. Não bastasse a interrupção do fluxo de óleo para parte do Ocidente,
acompanhada da quadruplicação do preço do barril, as medidas tomadas pela
OPEP levaram o Japão e alguns países da Europa a procurar os árabes direta-
mente, na expectativa de se desvincularem da desgastada imagem norte-amer-
icana pró-Israel (SANTOS, 2003).
Para Washington, isso soava como perda de influência na política inter-
nacional do petróleo e o consequente enfraquecimento do seu poder de nego-
ciação junto à OPEP, que agora parecia estar disposta a negociar como um car-
tel coeso e coerente.

INDÚSTRIAS ENÉRGETICAS

O fim da Guerra Fria e seus desdobramentos posteriores marcaram o


início de uma nova era nas relações internacionais. Muitas das Ciências Sociais
acompanharam com interesse o que ocorreu no mundo após 1989, analisando
as suas consequências nas relações sociais, econômicas e políticas internacion-
ais.
A Geopolítica, ciência que se preocupa com as relações entre a política
internacional e o espaço geográfico, foi uma das mais impactadas; pode-se afir-
mar inclusive que, a partir da década de 1980, a Geopolítica foi resgatada, nos
meios acadêmicos e na imprensa, de seu longo período de hibernação experi-
mentado desde a derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial.
A década de 1990 se configurou como um período inquietante, revolu-
cionário e de grande perplexidade para analistas internacionais; foi marcada pela
desintegração do bloco comunista, pela guerra do Golfo, pelo aumento da prolif-
eração de armas de destruição em massa, pelos levantes na Croácia e na
Eslovênia, pelas guerras da Bósnia-Herzegovina e de Kosovo, pelo genocídio
de Ruanda e pelo avanço do terrorismo internacional da al-Qaeda, cujo ataque
mais violento ocorreria no início da década seguinte, em 11 de setembro de

31
2001. Uma das principais consequências do fim da Guerra Fria, em termos
globais, foi a redução temporária da influência geopolítica dos russos no mundo
e até mesmo no entorno da Rússia, com a independência política de suas ex-
repúblicas e com o avanço da Organização do Tratado do Atlântico-Norte
(OTAN) e da União Europeia (UE) em direção ao Leste Europeu.
Por outro lado, a unificação de Berlim ― a capital geográfica e política da
Guerra Fria na Europa ― em 1989, consolidada no imaginário popular através
da queda do muro de Berlim, associada à desintegração da União Soviética dois
anos depois, alterou os rumos da geopolítica mundial de forma surpreendente,
no final do século XX.
A importância atribuída a esses dois eventos para o mundo tem inúmeras
interpretações, podendo-se afirmar, objetivamente, que encerraram dois dos
capítulos mais importantes que moldaram as relações internacionais do século
passado: a derrota do nazi-fascismo e uma certa submissão da Alemanha, da
Itália e do Japão aos Aliados, a partir de 1945, e o epílogo da revolução que
transformou a Rússia numa superpotência militar e comunista de atuação global,
a partir de 1917.
Esse breve século, nas palavras de Eric Hobsbawm, terminou de forma
“abrupta” porque a geopolítica internacional estava mudando aceleradamente,
seguindo rumos bem diferentes das décadas anteriores em questão de poucos
anos, e até meses. Ao falar da perplexidade para o homem do novo século,
Hobsbawm afirma que:
O breve século XX acabou em problemas para os quais ninguém tinha,
nem dizia ter, soluções. Enquanto tateavam o caminho para o terceiro milênio
em meio ao nevoeiro global que os cercava, os cidadãos do fin-de-siècle só
sabiam ao certo que acabara uma era da história. E muito pouco mais.
(HOBSBAWM, 1995, p. 265).
Ao longo da rivalidade ideológica da Guerra Fria, acostumamo-nos a uma
outra maneira de ver o mundo, de configuração mais clássica e mais estável,
que privilegiava a economia, tanto quanto a ciência. Um mundo que, nas pa-
lavras de Yves Lacoste (1995), em seu Dictionnaire de Géopolitique, fosse ele
adaptado do liberalismo ou da tendência marxista, assegurava que todos os
problemas da sociedade, bem como as rivalidades políticas, decorriam das rival-
idades econômicas, fossem elas a concorrência empresarial ou a rivalidade de

32
classes. Como se explica, para Lacoste, que os conflitos geopolíticos são cada
vez mais numerosos? No tabuleiro geopolítico europeu, exemplifica ele, uma
dezena de novos Estados surgiu após a queda do muro de Berlim; suas reivin-
dicações territoriais tornaram-se cada vez mais agressivas, como se pôde con-
statar na guerra das ex-repúblicas iugoslavas iniciada após o fim da União So-
viética.
Não se trata, para Lacoste, de negar a importância dos problemas
econômicos, nem de achar que a Geopolítica, esta revigorada forma de ver o
mundo, responde a todas as questões; trata-se, sobretudo, de colocar os prob-
lemas de forma diferente e complementar (LACOSTE, 1995).
A libertação da imposição ideológica da Guerra Fria, com o fim da bipo-
laridade mundial que norteava a política internacional, abriu novos horizontes em
diversos campos de estudo, em particular na Geopolítica, contribuindo para res-
gatá-la de seu ostracismo.
Nesta nova perspectiva, o mundo se reorganiza em outras bases, con-
forme analisa Ignacio Ramonet: Ao libertarem o pensamento das opressões ide-
ológicas e das fidelidades impostas, o fim da Guerra Fria e as mudanças em
curso encorajam-nos a compreender melhor o mundo real, fora dos dogmas, das
doutrinas e dos esquemas intelectuais escolásticos. [...] Sabe-se, agora, [...] que
a nova ordem deve englobar tudo e não excluir nada de seu campo de ação: a
política, a economia, o social, o cultural e a ecologia. [...] De fato, ao projeto da
unificação do mundo sob a condução de Washington, opõe-se com vigor a volta
de todos os particularismos nacionais, religiosos, étnicos... Todas essas forças
históricas, durante muito tempo, imobilizadas pelo equilíbrio do terror e que,
neste final de milênio, estão se desencadeando torrencialmente. (RAMONET,
1998, p. 15).
Neste emaranhado pós-moderno e sua era de incertezas, as palavras
mais disseminadas são, segundo Amorim Filho, “la diversidad, la pluralidad y la
incertidubre.” (PENNA; SENA FILHO; SOUZA, 2004, p. 87). Neste sentido, a
geopolítica clássica que privilegiava as relações interestatais do passado foi sub-
stituída, nos dias de hoje, por uma geopolítica mais abrangente, e ainda mais
complexa, que precisa lidar com uma quantidade maior de atores e fenômenos
internacionais, se quiser explicar de forma satisfatória boa parte dos conflitos e
focos de tensões no mundo. Lacoste afirma, no preâmbulo de seu Dictionnaire

33
de Géopolitique, que para compreender um problema geopolítico, mesmo em
linhas gerais, não é suficiente recorrer a causas genéricas, ou seja, ao conflito
leste-oeste, como anteriormente; é necessário um certo número de informações
relativamente precisas e objetivas (LACOSTE, 1995).
Atualmente, considerar o Estado como o único ator importante do sistema
internacional já não é mais suficiente para explicar os fenômenos globais. Novos
atores entraram em cena, num fenômeno que advém da mundialização dos
meios de comunicação e de transporte e do desenvolvimento tecnológico sem
precedentes.
Outro campo de estudo da Geopolítica, além do internacional, é a geopol-
ítica no interior dos Estados, onde ocorrem competições pela possessão e pelo
controle de certos territórios. Os partidos políticos e as forças nacionais, como
organizações não governamentais (ONGs) e grupos sociais organizados (como
o Movimento dos Sem Terra, no Brasil, por exemplo), também têm criado focos
de tensões importantes e muitas vezes desestabilizadores.
Por outro lado, a mídia e a opinião pública, ambas beneficiárias da glob-
alização dos meios de comunicação e da liberdade de imprensa em muitas
nações, também têm desempenhado um papel crescente na geopolítica contem-
porânea.
O papel das ideias, por sua vez, mesmo as absurdas, também impactam
na Geopolítica, uma vez que são elas que justificam certos projetos e determi-
nam as escolhas das estratégias de Estado, por exemplo. Essas ideias são
chamadas por Lacoste de “representações”; são formas “desenhadas” de ver o
mundo, que podem ser traduzidas como um ato teatral, que desenvolvem per-
sonagens simbólicos e situações dramáticas, o que é próprio da Geopolítica.
A cartografia, por exemplo, sempre teve um papel de destaque na geo-
política do passado e, também, do presente. Esta concepção nova e global da
Geopolítica, que evoluiu em outras bases a partir dos anos 1980, foi evidenciada
por Amorim Filho, em artigo intitulado Geografia Política Ampliada, publicado em
1991, em Quito, no Equador.
Entre as transformações importantes porque passavam as relações inter-
nacionais, o autor identifica as mais notáveis, como a mundialização dos acon-
tecimentos e dos processos políticos; a politização de assuntos que não são

34
necessariamente políticos, como da investigação técnico-científica e do desen-
volvimento das comunicações; a preocupação com o equilíbrio ambiental em to-
dos os níveis geográficos do planeta; o permanente questionamento de con-
ceitos, paradigmas e dogmas ideológicos, que tiveram papel importante na es-
truturação dos espaços e territórios da Terra; a crescente importância dos
valores, das representações, das visões de mundo, do espaço vivido e da per-
cepção ambiental e social, além de outras.
De fato, esses novos temas, incluindo-se neles o da energia, trazem
abordagens inovadoras que merecem um estudo mais aprofundado nos dias de
hoje. A geopolítica energética, objeto de estudo deste trabalho, tem tido um peso
cada vez maior nesse cenário geopolítico complexo. Segundo Amorim Filho, a
luta pelos recursos naturais e pelas matériasprimas, em geral, faz parte das
“cadeias causais”, as quais, na análise geopolítica, são consideradas como de
fundamental importância para se estudar a tipologia dos conflitos. A geopolítica
de energia, embora não tenha origens históricas recentes, uma vez que as dé-
cadas (e mesmo os séculos) precedentes confirmam esta constatação,
apresenta enorme complexidade, passando, atualmente, por profundas trans-
formações que merecem um estudo mais detalhado. Como será examinado nas
próximas páginas, geopolíticas que historicamente foram de suma importância
para o mundo, como a do petróleo e a do carvão mineral, tendem a ver sua
importância reduzida ao longo das próximas décadas; em contraposição, veri-
fica-se a gestação de novas geopolíticas, como a dos biocombustíveis, a solar,
a eólica e a ambiental, que tendem a ocupar, gradativamente, o lugar das petrol-
ífera e carvoeira. Neste contexto de profundas transformações, constata-se,
ainda, a reorganização de outras geopolíticas energéticas que, embora não ten-
ham sua origem em tempos recentes, adquirem caráter renovado, como a do
gás natural, ou questionável, como a nuclear.
O resgate da Geopolítica a partir dos anos 1980, portanto, procura dar
conta de entender e explicar a realidade das relações internacionais que, de uma
forma ou de outra, tem na Geografia um condicionante fundamental de análise.
A “segunda revolução russa” do século XX, iniciada por Mikail Gorbatchev e con-
solidada por Boris Yeltsin, permitiu o surgimento de novos atores que passaram
a figurar entre os mais influentes do sistema internacional, colocando em xeque
a forma de se pensar a Geopolítica que vigorava até então. A importância

35
atribuída ao Estado nos estudos geopolíticos não deixou de ser relevante mas,
em muitos conflitos internacionais, ele já não pode ser considerado o ator pre-
ponderante; em outros, a sua centralidade passou a ser compartilhada com
atores não estatais. Um dos maiores exemplos desta nova realidade é aquele
que seria tratado, por Amorim Filho (2003), como a “primeira guerra do século
XXI”, considerando-se, como tal, desde os atentados de 11 de setembro de
2001, até as ações militares subsequentes.
O líder da organização terrorista alQaeda, Osama bin Laden, desenvolveu
estratégia de atuação transnacional, independentemente do apoio institucional
de qualquer Estado, amparado em recursos financeiros próprios e, pelo menos
parcialmente, não estatais, com capacidade para angariar e treinar terroristas
em países geograficamente distantes e politicamente dissociados, como Afegan-
istão, Filipinas, Alemanha, Paquistão, Iêmen e Estados Unidos, para citar alguns
exemplos. Em sintonia com o nosso tempo, portanto, a Geopolítica passa por
um processo de renascimento em outras bases.
Nelas estão presentes aspectos que adquirem importância cada vez ma-
ior nas relações internacionais, principalmente nos anos que se seguiram ao fim
da Guerra Fria. Aquele mundo deu origem a outro, menos preciso, mais com-
plexo, instável e aberto aos novos valores culturais e religiosos que, até então,
se conformavam com um papel secundário na geopolítica predominantemente
ideológica desde 1945. O início do segundo milênio abre novas perspectivas so-
bre temas que antes caíam no esquecimento, ou eram considerados menos rel-
evantes ou, até mesmo, obsoletos. É quase impossível realizar uma análise mi-
nuciosa da maioria dos conflitos atuais sem levar em consideração elementos
étnicos, culturais e religiosos, frequentemente presentes em tais conflitos.
O conflito árabeisraelense, as escaramuças na Caxemira indiana, e os
ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, de 11 de
março de 2004, em Madrid, na Espanha, e de 7 de julho de 2005, em Londres,
para citar alguns exemplos, reforçam esta constatação. No caso específico da
geopolítica da América da Sul, pode-se identificar mudanças de rumo im-
portantes nas duas últimas décadas. Após a “década perdida” dos anos 1980, a
região assistiu à retomada do crescimento econômico e a uma certa consoli-
dação da democracia nos países da região.

36
O início do novo milênio parecia confirmar a certeza de que o continente
caminhava para um período de prosperidade sem precedentes, com índices de
crescimento econômico superiores aos de muitos países avançados e, aparen-
temente, sem maiores problemas políticos entre as suas nações. Todavia,
episódios recentes, entre os quais o protagonizado por governos rivais, como os
da Venezuela e da Colômbia, mudaram este quadro. Delicados e inusitados
focos de tensões ocorreram nos últimos anos, em muito contribuindo para apro-
fundar a complexidade das relações sul-americanas, das quais o Brasil tem sido,
ultimamente, um dos maiores protagonistas.
A questão energética, especificamente, tem sido o pivô de muitos prob-
lemas bilaterais e multilaterais no continente, o que nos leva a afirmar que existe
hoje, de fato, uma geopolítica energética importante no hemisfério, cuja pauta
tem contribuído decisivamente para moldar um novo relacionamento regional
entre seus países, cuja configuração organizouse em torno do que denomina-
remos, no Capítulo 7, de Eixos geopolíticos. O presente trabalho procura en-
tender e interpretar a nova geopolítica sul-americana contemporânea a partir dos
condicionantes energéticos e dos focos de tensões que, como mencionado
acima, têm contribuído significativamente para direcionar os rumos de uma nova
geopolítica regional, pós-Guerra Fria; pretende, também, ajudar a responder à
pergunta sobre que tipo de papel o Brasil está destinado a ter neste novo e
inusitado contexto geopolítico sul-americano.
Desde os tempos em que se começava a pensar a política moldada a
partir dos condicionamentos e da realidade geográfica, o conflito aparece como
tema central nos estudos geopolíticos. Segundo Amorim Filho (2003, p. 332), “o
estudo dos conflitos é o tema por excelência da Geopolítica atual.” Algumas
tendências temáticas novas vêm sendo incluídas nos estudos dos conflitos, gra-
ças ao contato da Geografia Política acadêmica com a geopolítica aplicada em
tempos recentes.
Paul Claval, citado por Amorim Filho (2003), enumera algumas delas,
como por exemplo, a pesquisa minuciosa das causas ou dos fatores de tensão;
a compreensão das relações geoestratégicas dos atores envolvidos nos focos
de tensões; a ênfase no estudo da complexidade étnica, religiosa e cultural dos
Estados, e não apenas na descrição e comparação de seus indicadores
econômicos, demográficos etc. A Geopolítica tem incorporado também novos

37
aspectos anteriormente pouco contemplados pelos geógrafos políticos, tais
como os fatores psicológicos, os processos de decisão e o papel da opinião pú-
blica e das questões ambientais. Outros autores, citados ainda por Amorim Filho
(2003, p. 336-337), reforçaram a importância das quase sempre múltiplas causas
dos conflitos, contribuindo para “enriquecer a fundamentação teóricometodo-
lógica do estudo dos conflitos.” Entre eles se destacam Michael Brown, cuja obra
editada em 1996 é um marco, assim como Aymeric Chauprade e François Thual
(1998), para os quais “os conflitos não surgem sem causas e a identificação das
causas constitui o primeiro estágio da análise geopolítica.” O estudo da geopol-
ítica energética passa necessariamente pelo estudo dos focos de tensões e dos
conflitos políticos que têm, na questão energética, um dos fatores ou o fato cau-
sador. A bibliografia a esse respeito é escassa.
As obras que tratam deste assunto tendem a focar os aspectos econômi-
cos (geografia econômica ou macroeconomia) ou técnicos (engenharia ener-
gética), passando ao largo de suas causas e consequências políticas; outras,
realizam uma análise superficial da questão. Esta pesquisa objetiva contribuir
para o preenchimento desta lacuna, concentrando-se, portanto, na geopolítica
de origem energética.
A região a ser estudada é bem delimitada: a América do Sul. O presente
trabalho considera, ainda, que existe uma tendência recorrente a focos de
tensões no continente, por uma série de motivos. Primeiramente, porque os dois
maiores consumidores de energia não a produzem em quantidade suficiente
para abastecer seus respectivos territórios: Argentina e Brasil são importadores
de gás natural da Bolívia; este país e a Venezuela, por sua vez, são detentores
das maiores reservas de gás do continente.
Em segundo lugar, a Venezuela possui a maior reserva de petróleo con-
tinental e uma das maiores do mundo, o que fez dela grande exportadora desta
matéria-prima e, pelo menos por agora, refratária ao avanço dos biocombustíveis
― colocando-a em rota de colisão com o Brasil, um fervoroso defensor destas
fontes alternativas de energia. Este complicado tabuleiro energético sul-ameri-
cano tem gerado muitos focos de tensões geopolíticos recentes no continente,
principalmente após a implantação de uma política energética agressiva por
parte de Hugo Chávez, nos últimos tempos.

38
O Brasil foi o país mais atingido por esta política, o que contribuiu para
que se questionasse a consistência da sua liderança geopolítica regional, cun-
hada ao longo de décadas de iniciativas diplomáticas que pareciam ter consoli-
dado, pelo menos em tese, a imagem de um Brasil amigo e solidário junto aos
seus pares sul-americanos. Entre alguns dos novos e preocupantes focos de
tensões, podemos identificar os mais recentes, como a crise do gás natural entre
o Brasil e a Bolívia, em 2006; a exigência do Paraguai em rever o Tratado de
Itaipu com o Brasil, em 2007; a falta de acordo entre a Venezuela e o Brasil para
a construção de um gasoduto de sentido norte-sul, cortando todo o continente;
o desacordo entre a Petrobras e a Petróleo de Venezuela S.A. (PDVSA), no to-
cante à implantação de uma grande refinaria no estado brasileiro de Pernam-
buco ― batizada de Abreu e Lima; a crítica coletiva realizada por Hugo Chávez
e Fidel Castro ao avanço do etanol no mundo, numa alusão ao etanol brasileiro;
finalmente, a expulsão de uma empreiteira brasileira do Equador, a Odebrecht,
em 2008, por problemas relacionados com a construção de uma usina hidre-
létrica naquele país.
O Brasil vem assistindo, nos últimos anos, a uma aliança estratégica entre
Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua e Cuba, que se organizaram em torno
de um eixo geopolítico que tem causado problemas de ordem geral à liderança
brasileira no continente. Multiplicaram-se, assim, vários focos de tensões de in-
spiração energética, contribuindo para o surgimento de uma importante geopol-
ítica de energia de dimensões local, nacional e macrorregional. Efetivamente, a
segurança energética tem se revelado, cada vez mais, fundamental para a geo-
política internacional, numa escala que só faz crescer em termos de importância
estratégica para todas as nações do mundo. Em consequência, a geopolítica
hemisférica passa por profundas transformações que merecem um estudo mais
aprofundado e abrangente, capaz de indicar possíveis respostas a novas
perguntas oriundas deste novo contexto regional.
Toda sociedade, para se desenvolver e se proteger de ameaças externas,
deve ter um cuidado especial com as condições de geração e distribuição de
energia em seu território, ou com a estabilidade de fluxos de abastecimento com
base em fontes energéticas localizadas em outros países. Sem energia, por ex-
emplo, os sistemas de transportes e de comunicações não funcionam. O

39
propósito desta pesquisa, no atual cenário internacional de profundas trans-
formações, é descrever e analisar certos aspectos da geopolítica da América do
Sul, tendo como objeto de estudo os principais focos de tensões e conflitos cujas
origens estão, de algum modo, ligadas às políticas de energia dos países do
continente.
Neste contexto, as questões energéticas e suas geopolíticas apresentam-
se como um dos temas mais importantes da atualidade, em particular no hemis-
fério sul-americano. Isso se dá, não só pela necessidade fundamental que os
países têm na produção e no consumo de energia, mas também, pela consciên-
cia crescente da necessidade de se reduzir a degradação ambiental em curso
no planeta. Pode-se afirmar, inclusive, que a preocupação com a preservação
do meio ambiente fez surgir, em escala global, uma geopolítica ecológica e am-
biental que não existia poucas décadas atrás. Esta nova geopolítica se relaciona
e dialoga diretamente com a produção e o consumo de energia ― uma vez que
a queima dos combustíveis fósseis responde por 87% da matriz energética mun-
dial e está entre os maiores responsáveis pelo aquecimento global (ver Quadro
02). A geopolítica de energia, portanto, está diretamente relacionada à nova ge-
opolítica ambiental.
O mais intrigante, todavia, no cenário sul-americano, é a constatação de
que muitas das tensões energéticas têm moldado, recentemente, a política ex-
terna dos países do continente e contribuído para a configuração de um novo
contexto geopolítico, organizado, nos últimos dez anos, em torno de eixos geo-
políticos. Esta nova geopolítica, de âmbito regional, se desenvolve, pelo menos
parcialmente, a partir de acordos e desacordos no campo da energia. O Brasil,
por ser a maior potência da região e o que mais investe nos países vizinhos,
possui interesses estratégicos que ultrapassam suas fronteiras, situando-se no
centro destas discussões.
É nesse espírito de transformação das relações geopolíticas hemisféricas
da última década que se enquadra o presente trabalho, tendo como contexto
geográfico principal a América do Sul. Antes de seguir especificamente pelo ex-
ame destas questões, torna-se necessário discutir, preliminarmente, dois assun-
tos fundamentais para a execução deste trabalho. Primeiramente, suas premis-
sas epistemológicas e, num segundo momento, sua metodologia. Como a dis-

40
cussão aqui presente situa-se no campo da Geopolítica, será dada atenção es-
pecial aos conceitos utilizados e à própria definição do termo geopolítica
adotado. Este assunto será desenvolvido no Capítulo 2. Posteriormente, ainda
no mesmo capítulo, será feito um levantamento e uma breve reflexão sobre os
principais trabalhos acadêmicos relacionados com o tema, concomitantemente
à análise da geopolítica a partir da sua epistemologia.
Nas palavras do acadêmico Vágner Camilo Alves, Todo escrito no campo
das Ciências Sociais apresenta um viés teórico que, através de sua dupla função
descritiva e explicativa, permeia-lhe a narrativa e lhe dá encadeamento lógico.
No entanto, todo e qualquer modelo teórico é redutor da realidade. Essa consta-
tação é de suma importância, ainda que seja mesmo tautológica. [...] a função
descritiva de uma teoria, ainda que importante, é subsidiária e subordina-se sem-
pre à sua função explicativa. Isto significa dizer que um modelo teórico poderá
descrever menos, desde que, com isso, o potencial explicativo do trabalho seja
maximizado. [...] Na verdade, a escolha de um modelo teórico implica necessari-
amente um exercício de reducionismo. O esforço humano em conhecer e ex-
plicar a realidade encontra barreiras instransponíveis. Nunca é demais lembrar
que a realidade, em totalidade, é incognoscível. (ALVES, 2002, p. 18-19). Feitas
estas observações, serão delineadas agora as principais premissas sobre as
quais se assentará o presente estudo. Optou-se por não fazer uso específico de
nenhuma teoria geográfica ou geopolítica, mas sim de conceitos e princípios da
própria Geopolítica ― alguns oriundos da Geopolítica clássica, outros, da Geo-
política contemporânea.
A preocupação do autor desta tese não é, portanto, teórica. Entretanto,
faz-se necessário, antes de abordar o tema, uma releitura das principais teorias
em Geopolítica, bem como uma análise das bases epistemológicas da disciplina,
de forma a permitir um balanço do estado atual desse ramo da Geografia, tão
fascinante, mas, às vezes, refém da evolução das relações internacionais. Fas-
cinante pelos inúmeros ramos do conhecimento relacionados diretamente ao es-
tudo da Geopolítica, tornando-a uma área do saber transdisciplinar e erudita,
mas que não deve perder o foco; refém porque, como veremos no próximo
capítulo, o da epistemologia, o estudo da Geopolítica esteve, em certos períodos
da história, à mercê do desequilíbrio de poder internacional, cujas guerras quase
sempre contribuíram para a tendência ao ostracismo acadêmico da disciplina,

41
ou mesmo ao desenvolvimento de um certo preconceito em relação a ela. A
metodologia adotada nesta pesquisa não adota uma matriz conceitual, de forma
clássica; segue, isto sim, pelo caminho de uma pesquisa básica, bibliográfica,
documental e de caráter exploratório. Ao adotar a geopolítica contemporânea da
América do Sul como objeto de estudo, sua hipótese é necessariamente de
cunho exploratório, uma vez que trata de um tema de carater instável, contin-
gente, imprevisível e dinâmico. Trata-se, portanto, de uma proposta que está em
construção, não podendo ser considerada um modelo acabado. O objetivo prin-
cipal da tese, neste sentido, é o de trazer para a academia um olhar geopolítico
novo, atual e relevante, que merece um acompanhamento da sua evolução nos
próximos anos.
O espírito da pesquisa, assim, baseia-se na aplicação de alguns princípios
teóricos e conceituais na realidade geopolítica da América do Sul. A hipótese
principal levantada neste trabalho se subdivide em duas partes. A primeira é a
de que a geopolítica sul-americana apresenta, atualmente, uma configuração
sistêmica que não se organiza mais apenas em torno de pólos políticos ou ideo-
lógicos (herdados da Guerra Fria), mas em torno de Eixos de poder, re-
sponsáveis por uma nova geopolítica regional ainda em fase de consolidação. A
partir deste novo contexto geopolítico, o presente estudo procurará, finalmente,
fundamentar a segunda parte da hipótese (Capítulo 8), a partir da identificação
dos vínculos existentes entre a geopolítica energética sul-americana da última
década com a configuração dos novos eixos geopolíticos regionais. Como decla-
rou com razão o matemático e filósofo francês Henri Poincaré, “a ciência é con-
struída com fatos, como uma casa é feita com pedras. Mas uma coleção de fatos
não é mais ciência do que uma pilha de pedras é uma casa.” (POINCARÉ apud
SINGH, 2006, p. 26). Neste sentido, pode-se afirmar que a geopolítica da Amé-
rica do Sul está associada a uma outra geopolítica mais abrangente, hemisférica
e mundial, cujas forças têm um papel importante na configuração da geopolítica
sul-americana. A pesquisa, por isso, se inicia com o estudo da geopolítica ener-
gética de caráter global, para que se possa, em seguida, interpretar a sua
vertente regional. A partir do raciocínio que parte do geral para o particular, do
mundial para o regional, será possível reunir elementos para inferir os fatores
causais a moldar o novo contexto geopolítico sulamericano, e as consequências
que a política energética brasileira tem neste novo cenário. Certas áreas do

42
conhecimento terão destaque na condução do trabalho, entre elas a Cartografia,
a Geografia econômica e regional, a Política Internacional, a História mundial, a
Economia da energia e, claro, a Geografia Política. Alguns recursos de geopro-
cessamento serão utilizados objetivando facilitar, especialmente em termos es-
paciais, as descrições e análises sobre a geopolítica energética em escala global
e regional. Entre os dados a serem mapeados e analisados, dentro do escopo
maior da geopolítica de energia, estão as reservas de petróleo, gás natural,
carvão mineral e urânio, as redes de transporte de gás, a distribuição das usinas
de etanol no Brasil, o mapeamento dos países-membros da Organização dos
Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e a delimitação da zona econômica
exclusiva brasileira. Neste contexto, a evolução do que é produzido em termos
energéticos, bem como a comparação do status brasileiro com outros países na
área energética, serão temas relevantes e fundamentais nesse estudo. Para a
elaboração dos mapas apresentados na tese, foram utilizados dois softwares: o
MapInfo 9.0®, para análise e representação dos dados, e o Corel Draw®, para
acabamentos.
As representações cartográficas foram organizadas em dois grupos, de
acordo com a fonte dos dados: mapas coropléticos (dados da British Petroleum)
e mapas adaptados de outras fontes. A simplicidade é uma qualidade valiosa da
ciência. Por isso, os dados para o desenvolvimento da pesquisa, que compõem
mapas, tabelas e gráficos, foram recolhidos de três fontes principais: da Agência
Internacional de Energia (AIE), da Revista Análise Energia 2010 e da empresa
petrolífera British Petroleum. Os números não são definitivos e 100% precisos,
uma vez que se trata de estimativas, mas a decisão de pesquisá-los em institui-
ções de renome internacional, reconhecidas pela comunidade acadêmica, cer-
tamente contribui para o rigor científico possível que se pretende alcançar neste
trabalho. Esta observação também vale para os dados sobre as demais fontes
de energia.
A bibliografia sobre Geopolítica em geral, principalmente na sua vertente
epistemológica, é vasta, inclusive no Brasil, com um número razoável de obras
no idioma nacional. Encontra-se grande variedade de obras em inglês, francês
e alemão, devido à contribuição da escola norte-americana e das europeias, em
particular da francesa, da alemã e da britânica. Já a produção bibliográfica no

43
campo da geopolítica de energia é bem menor. Encontram-se muitos textos, ar-
tigos e livros sobre o tema energia em diferentes campos do saber, como o
científico (Física e Geologia, por exemplo), o econômico, o técnico-produtivo, o
comercial, mas o geopolítico ainda está para ser melhor desenvolvido e aprofun-
dado. Levando-se em consideração o escasso conhecimento sobre o tema nos
meios acadêmicos e, em particular, no ramo da Geografia, apesar da importân-
cia que a questão energética tem na política internacional, pode-se afirmar que
os estudiosos ainda esperam a elaboração de uma teoria geopolítica sobre en-
ergia.
Esta situação, por um lado, nos limita neste estudo; por outro, abre per-
spectivas de se desbravar um território do saber que se encontra em fase pouco
avançada nos meios acadêmicos. Considerando a natureza e o propósito da
pesquisa, foram realizadas duas visitas técnicas. A primeira foi efetuada numa
importante unidade industrial processadora e distribuidora de energia no Brasil,
onde foram coletadas informações de caráter técnico e econômico ― a Refinaria
Gabriel Passos (Regap), da Petrobras, no município de Betim, em Minas Gerais.
A segunda foi realizada no Centro Brasileiro para o Desenvolvimento da Energia
Solar Térmica ― Green, com sede na PUC Minas, no bairro Coração Eucarístico,
em Belo Horizonte. Os relatórios sobre as visitas técnicas encontram-se nos an-
exos desta pesquisa. A energia e sua visão territorializada sempre estiveram no
centro dos principais debates internacionais. Na atualidade, o tema passou a
figurar entre os mais importantes e comentados do mundo, ganhando maior vis-
ibilidade, a exemplo do que ocorre com os temas ambientais e com aqueles rel-
acionados ao terrorismo. Este debate contemporâneo sobre energia e meio am-
biente ocorre em consequência da conscientização de que a atmosfera dá sinais
de exaustão na sua capacidade de absorver os gases poluentes, frutos, em sua
maior parte, da queima de combustíveis fósseis, e da constatação de que as
reservas de gás natural e petróleo caminham para o esgotamento, num futuro
não muito distante. A matriz energética mundial, portanto, está sendo question-
ada por cientistas, políticos, climatologistas e ambientalistas e passa por lento,
porém contínuo, processo de transformação: um modelo antigo, baseado no uso
dos combustíveis fósseis, está dando lugar a um modelo novo, que demora a se
estabelecer, por motivos que aqui serão discutidos. Trata-se de uma transição
global sem precedentes e de suma importância, que já está afetando, inclusive,

44
o cotidiano da população mundial. O Brasil passou a figurar no centro deste de-
bate internacional nos últimos anos. Os motivos para isto são muitos, mas uma
rápida análise do contexto regional e internacional é suficiente para justificar tal
afirmativa.
Primeiramente, o Brasil tem uma matriz energética diversificada. Embora
o petróleo ocupe uma posição de destaque, sendo responsável por 40% do con-
sumo nacional, a exemplo do que ocorre em boa parte do mundo, a presença
relativamente equilibrada das demais fontes de energia em nossa matriz con-
tribui para uma saudável diversificação, destacando-se a hidrelétrica (13%), a
cana-de-açúcar (14%), a lenha / carvão vegetal (13%) e o gás natural (9%). O
Quadro 01 permite visualizar melhor a posição que cada fonte ocupa na matriz
energética brasileira. O segundo motivo para uma presença mais marcante do
Brasil no cenário internacional, em termos energéticos e ambientais, está no fato
de que quase a metade das fontes utilizadas diariamente no país são limpas e
renováveis, somando 43% do total. Isso transformou o Brasil num paradigma de
matriz energética, em contraposição às nações que optaram pelo uso indiscrimi-
nado de fontes poluentes, situadas, portanto, entre as maiores poluidoras pela
queima de combustível sujo, cujas reservas caminham para a exaustão.

A matriz mundial de energia é, como verificado no Quadro 02, extremamente


poluente a altamente dependente dos combustíveis fósseis, que respondem por

45
87% do total. Estas fontes de energia são, reconhecidamente, as maiores cau-
sadoras do aquecimento global. O terceiro motivo que levou o Brasil a figurar no
centro do debate internacional, nos últimos anos, é o fato de que o país
apresenta boas condições para se tornar um dos maiores produtores e exporta-
dores de fontes limpas e renováveis, o que certamente, num futuro não muito
distante, o elevará à condição de potência energética mundial. Além disso, a
descoberta de jazidas de petróleo na camada pré-sal do litoral (parte delas con-
tendo óleo leve, de boa qualidade), também altera o tabuleiro geopolítico ener-
gético em favor do Brasil no âmbito regional e global, considerando que esta
commodity continuará sendo uma fonte de energia importante, pelo menos, pe-
las próximas duas décadas. Este novo cenário que se configura tem o potencial
de alterar significativamente a geopolítica energética regional, podendo trazer
benefícios para a população brasileira e alçando o Brasil a um patamar internac-
ional bem mais alto.

O tema energia adquire dimensão geopolítica ainda maior ao se verificar


que a capacidade do planeta em prover matéria-prima suficiente para a geração
de combustíveis se esgota rapidamente. Esse problema seria contornável de
forma menos dramática não fosse a urgente necessidade de se rever toda a
matriz energética mundial em função do aquecimento global, que já afeta o
planeta de forma preocupante. A perspectiva é de uma transição contínua e de
longo prazo, que pode ser melhor visualizada na Figura 01. Neste sentido, a
transição do modelo energético poluente para outro renovável contribuirá para
alterar as relações de poder no mundo, a exemplo do que o petróleo do Oriente

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Médio fez no século XX. A partir da leitura da Figura 01, percebe-se que o petró-
leo e o carvão mineral tendem a perder participação e importância no longo
prazo, sendo gradativamente substituídos pelo gás natural, pela biomassa
moderna e pelas demais fontes renováveis, com destaque para a energia solar.
O Brasil, sendo o país que já detém o maior percentual do mundo de en-
ergia renovável em sua matriz e por possuir, de longe, um vasto território bene-
ficiado com as melhores condições para a produção de energia renovável, com
abundância de água, sol e calor, terá um papel fundamental neste novo tabuleiro
geopolítico que se redesenha para o futuro próximo. Estas perspectivas que se
abrem têm, na verdade, contribuído para conferir ao Brasil um novo papel no
renovado cenário internacional do século XXI

No caso específico nacional, as fontes nuclear, eólica e hidrelétrica de


energia, bem como o etanol, o petróleo e o gás natural são temas fundamentais
para se entender o contexto no qual o país está inserido e as perspectivas futuras
nestes setores.
Por outro lado, os recentes e inéditos focos de tensões de origem ener-
gética que colocaram o Brasil em rota de colisão com a Bolívia, a Venezuela, o
Equador e o Paraguai trouxeram para a pauta do dia o debate acerca das pre-
tensões geopolíticas desses países, em detrimento de uma liderança continental
brasileira que, por sinal, tem sido perturbada pelos esforços do presidente da

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Venezuela no sentido de se “contrapor” ao Brasil. Feitas estas observações, jus-
tifica-se o presente estudo, de forma a procurar elucidar algumas questões de
grande complexidade e, na medida do possível, antever o papel que o Brasil terá
neste novo e inusitado contexto sul-americano no tocante a sua geopolítica da
energia

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