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Copyright © 2021 por Caroline Andrade

Ariel| 1ª Edição
Todos os direitos | Reservados
Livro digital | Brasil

Esta é uma obra de ficção.


Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos aqui são produtos da imaginação
do autor. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.

Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, distribuída ou transmitida por
qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópia, gravação ou outros métodos
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de breves citações incluídas em revisões críticas e alguns outros usos não-comerciais
permitidos pela lei de direitos autorais.

Capa: Mellody Ryu


Revisão: Assessoria Grámaticalizando
Diagramação: Mellody Ryu

O artigo 184 do Código Penal tipifica como crime, apenado com detenção de 3 (três) meses
a 1 (hum) ano, ou multa, a violação de direito de autor. Pela Lei nº 10.695/2003 incluiu, em
seu tipo penal, a violação dos direitos conexos aos direitos de autor, que são aqueles
relacionados aos artistas intérpretes ou executantes, aos produtores fonográficos e às
empresas de radiodifusão, conforme o disposto nos artigos 89 a 96 da Lei nº 9.610, de
19.2.1998 ("Lei de Direitos Autorais"), mantendo-se a mesma pena.
Por sua causa, eu nunca ando muito longe da calçada...
Por sua causa, eu aprendi a jogar do lado seguro, assim não me machuco...
Por sua causa, eu acho difícil confiar não só em mim, mas em todos à minha
volta...
Eu não posso chorar, sou forçada a fingir um sorriso, uma risada, todos os
dias da minha vida. Meu coração não pode quebrar quando não estava
inteiro para começar...
Por sua causa, eu tenho medo!
Because Of You, de Kelly Clarkson
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Sumário
Copyright © 2021 por Caroline Andrade
Ariel| 1ª Edição
Todos os direitos | Reservados Livro digital | Brasil
Esta é uma obra de ficção.
Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos aqui são produtos da imaginação
do autor. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.
Capa: Mellody Ryu
Revisão: Assessoria Grámaticalizando
Diagramação: Mellody Ryu
Playlist
Sinopse
Prólogo
Roleta-russa
Cristina Pener
Doutor Miller
Capítulo 01
O céu é o limite
Cristina Self
Capítulo 02
Toy Boy
Cristina Self
Capítulo 03
Vírus carnal
Cristina Self
Capítulo 04
O engano
Cristina Self
Capítulo 05
Nada angelical
Cristina Self
Capítulo 06
Doce vênus
Cristina Self
Capítulo 07
Férias interrompidas
Cristina Self
Capítulo 08
Do céu ao inferno
Ariel Miller
Capítulo 09
Gatilhos
Cristina Self
Capítulo 10
Terror noturno
Cristina Self
Capítulo 11
Eu também não sei o que fazer comigo
Cristina Self
Capítulo 12
Anjo sombrio
Ariel Miller
Capítulo 13
Olhos de coruja
Ariel Miller
Capítulo 14
Pílula mágica
Ariel Miller
Capítulo 15
Anjo protetor
Cristina Self
Capítulo 16
Atenuante
Ariel Miller
Capítulo 17
Irrevogável
Cristina Self
Capítulo 18
Lei e ordem
Ariel Miller
Cristina Self
Capítulo 19
O desembargador
Ariel Miller
Capítulo 20
Na companhia do medo
Ariel Miller
Cristina Self
Capítulo 21
Argumentos válidos
Ariel Miller
Capítulo 22
Apelação
Cristina Self
Capítulo 23
Arcanjo negro
Ariel Miller
Capítulo 24
Tambores do medo
Cristina Self
Capítulo 25
A visita do anjo ao inferno
Ariel Miller
Capítulo 25
Entre anjos e demônios
Cristina Self
Ariel Miller
Cristina Self
Capítulo 26
Buquê de rosas
Cristina Self
Epílogo
Ariel Miller
Agradecimentos
Sinopse

Cristina Self passou anos reclusa em seu mundo seguro, o qual criou
para si mesma depois de uma separação conturbada e violenta. Até que seu
caminho se cruzou com o notório advogado criminalista Ariel Miller,
conhecido nos tribunais por seu cinismo e frieza calculista. Seduzida pelo
magnetismo que ele possui, a encantando com seu olhar intenso, Cristina se
desprende do seu mundo seguro, se permitindo se perder por uma única noite
no calor dos braços do charmoso homem. Mas o que Cristina não sabe é que
o destino tem outros planos para eles, um que ligará as duas almas quebradas
para sempre. E de um engano nada angelical, mas sim completamente sexy e
envolvente, Cristina irá do céu ao inferno para viver sua história de amor.
AVISO DE GATILHO: o livro contém violência doméstica e
relacionamento abusivo.
Prólogo
Roleta-russa
Cristina Pener

Sacramento – Califórnia
Aperto meus olhos, os fechando com força, enquanto meus braços se
erguem sobre minha cabeça. O grito de dor que invade o quarto sai dos meus
lábios quando o terceiro chute desferido em puro ódio acerta minhas
costelas. Sinto o ar faltar dentro dos meus pulmões e me retorço de dor. O
ataque de cólera dele não para, nem diminui, mesmo eu gritando e
implorando por minha vida. As mãos sujas com meu sangue puxam meus
cabelos, os segurando, olhando para minha face machucada, com o sangue
escorrendo do meu nariz quebrado. Seus olhos frios e vazios não
demonstram um único fio de arrependimento por estar me espancando.
— Renan... Renan...
Minha voz entrecortada pela dor e o choro, fala seu nome,
implorando por clemência. Não sei mais onde estou, nem em qual momento
ele começou a me bater. Minha mente vaga entre o pavor e o desespero e
imagino que minha vida terminará dentro desse quarto.
— Fica tão bela quando chora, meu amor. — A voz gélida, como a de
um cadáver sem coração, fala mansamente.
Ele beija meu rosto, me fazendo chorar ainda mais. Estou ferida,
acovardada e sem esperança de sobreviver ao seu ataque de fúria. Seu punho
fechado se ergue uma única vez, acertando minha face com pura pressão. É
rápido e brutal, fazendo voar sangue pela minha boca. Meu corpo mole, sem
mais força ou coragem para se mexer, se estica ao chão, e sinto as lágrimas
em minha bochecha colarem ao piso, junto ao meu sangue. Em meio à baixa
visão que minhas vistas têm, com os olhos nublados de vermelho, observo
apenas seu vulto caminhar para fora do quarto, e aqui, caída, anulada,
humilhada, fico pelo que parece uma eternidade para minha alma, até
conseguir me arrastar pouco a pouco, chorando, com medo de que ele volte.
Consigo pegar o telefone caído perto da cama. Me encolhendo, disco os
números. O toque se prolonga, me torturando dentro do meu cérebro, até que
ouço a voz do outro lado da linha me saudar.
— Alô?
— Mãe, me tira daqui. — O telefone rola dos meus dedos, enquanto
luto para continuar consciente.
— Todos de pé! — A voz do policial, assistente do juiz, é alta, me
tirando das minhas lembranças.
Me levanto junto com meu advogado, observando o juiz entrar no
tribunal para deferir a sentença. Eu não preciso olhar para o lado para ver
Renan, meu corpo sente seus olhos repousados sobre mim.
— No caso de violência doméstica e tentativa de homicídio de Renan
Pener contra sua cônjuge, Cristina Pener, a corte chega ao seu veredito final.
Meu coração se aperta dentro do meu peito, estou olhando para o juiz.
A bancada dos jurados, que tem como grande maioria homens, me olha com
atenção. Me sinto silenciada, renegada, com meu sofrimento desmerecido
diante de todos que me julgam silenciosamente com seus olhares frios e
calculistas.
— Declaro Renan Pener inocente de todas as acusações.
— Não... Não... Oh, meu Deus! — Tapo meu rosto, negando com a
cabeça, balbuciando em meio ao choro desesperado que me domina ao ouvir
a voz do juiz declarar a sentença.
Falta ar em meus pulmões. Sinto meu corpo desabar lentamente na
cadeira, tendo as lágrimas nublando minha visão. O pranto dolorido rasga por
minha garganta. Me sinto humilhada, diminuída, degradada, como um ser
humano sem valor algum, uma poeira, alguém sem caráter. Colocaram à
prova minha sanidade mental e meus princípios. Minha cabeça se ergue e
vejo Renan sair caminhando altivo, com um sorriso cruel nos lábios, com
seus olhos frios cravados em mim.
— Senhora Pener...
O toque da mão do meu advogado ao meu lado me assusta, me
deixando alarmada. Giro minha face na mesma hora para ele.
— Eu sinto muito, lamento. Se puder fazer algo pela senhora, basta
apenas me falar...
— Self! — murmuro, chorando, limpando meu rosto. — O divórcio já
foi assinado, me chamo Cristina Self.
Ele sorri com vergonha e balança a cabeça em positivo para mim.
— Se precisar de algo é só me avisar, senhorita Self.
O vejo fechar sua maleta e partir junto com os outros dentro do
tribunal, que vai se esvaziando. Tapo minha boca, chorando desesperada. A
única coisa que eu carecia, a única coisa que eu queria, era a justiça!
E ela foi tirada de mim. Foi distorcida, ficando a favor de um homem
frio, sem remorso, que usou todo dinheiro, poder e influência da sua família
para me humilhar mais uma vez. Comprou o julgamento, desmereceu as
provas. Renan tinha arrancado tudo de mim: minha dignidade, minha alma,
anos da minha vida ao lado dele, meu mundo todo. Ele me fez morrer a cada
lágrima que ele sentia prazer em tirar de mim. Uma roleta-russa, na qual ele
me torturou psicologicamente, fisicamente e emocionalmente, até eu ser
apenas uma sombra da mulher que já fui um dia.
Doutor Miller

Nova York

— O grande júri chega ao veredito final, Meritíssimo.


Levo minha mão ao bolso da calça, observando os rostos dos jurados.
Meu cliente, de pé ao meu lado, transpira pelos poros como um porco prestes
a ir para o abate, deixando sua respiração alta a cada puxada de ar pelas
narinas.
— Contra o caso de agressão e tentativa de homicídio à senhorita
Vagas, declaramos Charles Lorax inocente das acusações, por não haver
provas contra ele.
Meu rosto se mantém imparcial, não demonstro minha reação com o
resultado do julgamento. Charles se vira, me abraçando de forma
desagradável. O afasto educadamente, fecho minha maleta e comprimo meus
lábios com desagrado pelo seu toque imundo em meu terno.
— Oh, meu Deus, estou livre... Estou livre da acusação dessa vadia!
Lhe dou um olhar semicerrado, não dividindo meus pensamentos de
desprezo por ele. É um homem patético, com seus 1,58m de altura, cabelos
curtos, pernas finas e barriga sobressalente.
— Realmente você é o melhor! Valeu cada centavo! Muito obrigado,
muito obrigado, doutor Miller...
— Não me agradeça, fiz apenas meu trabalho. — Seguro minha
maleta e olho por cima da cabeça dele, para a vítima, que está sentada no
banco da promotoria, chorando melancólica. — Faça o pagamento dos meus
honorários para minha secretária.
Caminho para fora da sala de julgamento a passos firmes, seguindo
para a porta da frente, mas antes mesmo de sair para fora do prédio, os
flashes dos fotógrafos me acertam, junto com o enxame de repórteres que
aguardam do lado de fora pelo fim do julgamento. A mídia em peso está
cobrindo o caso do dono de uma das maiores transportadoras da cidade, que
foi acusado de agredir uma mulher dentro do apartamento dele.
— Doutor Miller, poderia nos dizer como se sente com a absolvição
do seu cliente?
Não olho para seus rostos, apenas mantenho meus passos, os
empurrando lentamente, tentando sair de perto deles.
— Acredita mesmo na inocência do seu cliente? Acha que foi correto
ele ter sido inocentado?
— Oh, saiam logo da frente, seus abutres! — O segurança do tribunal
me ajuda a ter passagem livre, abrindo um pequeno corredor entre os
repórteres, para que eu possa passar por eles e retornar para dentro do
tribunal. — Tenha um bom dia, doutor Miller.
— Muito obrigado, Bill. Depois me conte como anda Flin na escola.
— Pisco para ele, que balança a cabeça em positivo.
— Ele está muito feliz com a bolsa de estudos, doutor. Nunca vou
poder lhe agradecer o suficiente pelo que fez ao meu menino. — Bill abre a
porta da cafeteria do tribunal, apontando para mim. — Saia pelos fundos, vou
segurar esses vermes curiosos na entrada do tribunal.
— Agradecido, meu amigo.
Bato em seu ombro e passo apressado pela porta, sentindo alívio em
deixar a aglomeração dos repórteres para trás. Passo pela cafeteria a passos
rápidos, indo direto para o elevador, no intuito de descer no estacionamento
do subsolo. Antes das portas fecharem, um corpo esguio entra ligeiro, com os
olhos castanhos brilhando de raiva para mim.
— Você é um grande cretino miserável, Miller! — A mulher zangada,
com sua boca semicerrada, arruma seus cabelos, os jogando para trás, com
suas bochechas vermelhas de ira.
— Bom dia para você também, Adele.
— Bom dia uma ova! Como consegue voltar para sua vida e dormir à
noite depois de soltar aquele monstro nas ruas?!
— Não seja dramática, minha querida. — Sorrio, negando com a
cabeça para ela. — Você, como promotora, sabia o final desse julgamento
melhor do que eu. Não existiam provas reais contra meu cliente.
— Você distorceu as palavras da minha cliente e a fez parecer uma
mulher promíscua!
— Eu?! — A olho, rindo, negando mais uma vez com a cabeça. —
Oh, meu Deus, como eu pude fazer algo tão horrível, não é? Onde já se viu
fazer uma prostituta viciada em metanfetamina parecer promíscua?! Chega a
ser abominável minha conduta!
— Abominável é sua frieza, Miller!
— Deveria ter aceitado meu acordo, Adele, quando eu propus. Avisei
para você que não pegaria leve se chegássemos a ir diante do grande júri. Eu
sou condicionado em liberdade. Não escolho causas para defender alguém,
apenas desempenho com maestria minha profissão, e nunca perco! Isso não
faz de mim um cretino, mas sim um advogado criminalista bem-sucedido.
Ela fecha sua face com raiva, virando seu rosto para as portas,
negando com a cabeça.
— É por causa de advogados como você, que existem tantos monstros
de colarinho branco[1] impunes, como Charles Lorax. — As portas se abrem
no térreo. Adele dá dois passos para fora do elevador, antes de se virar para
mim. — Você sabe que Charles Lorax é um maníaco depravado e que é
apenas questão de tempo antes dele fazer algo hediondo e fatal contra uma
vítima. Quando isso acontecer, espero que você sofra muito com sua
consciência, por ter deixado esse monstro à solta!
— Meu sentimento de inimizade por você é recíproco também, minha
cara. Nos vemos no próximo caso. — Pisco para ela, apertando o botão das
portas do elevador, para se fecharem.
Assim que as portas se fecham, solto o nó da gravata, afrouxando o
aperto em minha garganta. Respiro fundo, desejando que esse dia acabe logo.
Quando o elevador chega ao estacionamento, caminho para fora, indo em
direção ao meu carro.
— Doutor Miller?
A voz masculina que me chama, me faz virar. Vejo um homem
grisalho, sério, me encarando. Ele retira seu documento, o mostra para mim e
estende sua outra mão para me cumprimentar.
— Sim, sou eu. — Olho da sua mão aberta para sua face, repuxando
meu nariz. — E você seria?
— Detetive Maiar. Passei no seu escritório, mas sua secretária me
avisou que poderia lhe encontrar aqui, no tribunal. Como estava em
audiência, tive que aguardar.
— E qual seria o motivo da sua espera? Se quer uma consultoria,
sugiro que marque uma hora.
Me viro e volto a caminhar para meu carro, retirando as chaves do
bolso da calça.
— Doutor, não estou aqui por conta de uma consultoria. Nesta
madrugada, por volta das três e quarenta, uma Mercedes Sedan vermelha
colidiu com outro veículo — o homem fala nervoso atrás de mim, o que me
faz parar de andar. — O veículo está registrado em seu nome, doutor Miller,
foi assim que conseguimos identificar os passageiros.
— Esse carro fica com minha ex-mulher, estamos passando pelo
processo do divórcio, meu motorista é quem conduz o veículo. Não consigo
ver Tober se perdendo na direção...
— Doutor Miller, sua esposa estava na direção.
— Oh, merda! — grunho com raiva. Mais uma vez, Silvia se superou
com suas infantilidades. — Ela machucou alguém, as pessoas do outro
veículo, por isso está aqui? — Esfrego meu rosto com cólera, respirando
fundo. — Olha, eu não tenho mais paciência para as irresponsabilidades de
Silvia, vou lhe passar o contato da irmã dela. Se tiver algo que possa fazer
para...
— Houve uma morte — o homem me corta, me fazendo calar.
Esfrego meu rosto, não acreditando que ela fez isso. Como pôde
dirigir o carro de madrugada, sendo que tinha Tober para conduzir o veículo?
Ela tirou a vida de alguém por sua falta de responsabilidade.
— Deus! Eu nem sei o que dizer. Quem estava no outro veículo?
— Doutor Miller, não foi no outro veículo. Havia mais alguém com
sua esposa, deitada no banco de trás do Mercedes, e ela não estava na
cadeirinha.
Meus olhos caem para o chão enquanto compreendo o que ele está
falando. Meu coração vai parando de bater, o frio sobe pela minha espinha.
— Dolly?! — Ergo minha face com ira, segurando a jaqueta do
detetive, o puxando com desespero. — Minha filha! O que aconteceu com a
minha filha?!
Capítulo 01
O céu é o limite
Cristina Self

Sacramento – Califórnia

Quatro anos depois


Depois de muita resistência, observando a parede e não tendo para
onde fugir, ao som do insistente alarme em cima da penteadeira, me sento na
beirada da cama, esfrego meus olhos e o desligo. Caminho pelo quarto, vou
ao banheiro, deixo meu rosto focar na mulher descabelada que me encara
pelo reflexo do espelho. Posso ver as olheiras, destacadas abaixo dos olhos
por conta das noites mal dormidas e do cansaço puro. Desvio minha atenção
para o panfleto que tinha colado na moldura superior do espelho e solto um
suspiro de alívio. Observo a praia paradisíaca de areias brancas e águas de
um azul-céu, que arranca meu fôlego. Abaixo das palmeiras há uma delicada
rede, que destaca a beleza de Kona, no Havaí.
— Apenas mais um dia de trabalho, Cris, e em quarenta e oito horas
tomará Mai Tai[2] de frente para essa bela vista. — Sorrio, animada, ansiosa
para minha viagem de férias. Me dei ao luxo de pagar essa viagem para mim.
Só preciso aguentar mais esse dia. Tentar não cair no estresse total do
trabalho e sobreviver a mais algum presente terrivelmente constrangedor da
minha mãe. Depois de fazer minha higiene matinal e estar pronta para o
trabalho, respiro fundo, abro a porta do quarto, torcendo para minha mãe
ainda estar no quarto dela, trancada a sete chaves. Mas, ao entrar na cozinha,
colido com o cara da semana da minha mãe, o que não é novidade, já que
toda semana ela tem uma nova paixão.
— Olá, bom dia, gata! — Ele sorri, me saudando assim que me vê.
O homem, que deve estar próximo da casa dos trinta anos, me
cumprimenta, segurando uma xícara de café, só de cueca, com seus cabelos
úmidos de quem acabou de sair do banho.
— Bom dia — balbucio, desviando meus olhos dele, me
encaminhando para o armário de louças.
Pego uma xícara para mim, me sirvo de café o mais rápido que posso,
e ao tentar sair da cozinha, dou de cara com minha mãe entrando só de
roupão.
— Oi, meu anjo, bom dia. — Ela me dá um beijo estridente na testa,
sorrindo animadamente para mim. — Vejo que já conheceu Filipe.
Ela sorri, dando um beliscão na bunda do homem, parando ao lado
dele.
— Filipe é latino, meu bem. Olha que coisa mais linda! — Suas
sobrancelhas se mexem de forma desavergonhada, fazendo uma careta safada
para mim.
Minha mãe dá um superbeijo no cara, digno de cinema, aqueles de
fazer o pescoço ficar torto. Vejo a mão dele espalmada na bunda dela,
pressionando seu quadril mais ao dela. Ela solta um grande suspiro, sorrindo
para ele, quando finalmente o exagerado beijo termina.
Fico observando minha mãe, uma mulher excepcional, no auge dos
seus cinquenta e nove anos, se deleitando nos braços do latino, suspirando
como uma colegial. Quem olha para ela num primeiro momento, pensa:
“nossa, essa mulher é uma porra louca[3]”, mas não imagina o tanto que ela
já sofreu nessa vida. Meu pai morreu quando eu ainda estava na barriga dela,
e meus avós a expulsaram de casa, a largando à própria sorte. Minha mãe
trabalhava como garçonete em dois turnos em uma lanchonete decadente para
poder se virar. Se casou quando eu ainda era um bebê e nos mudamos de Los
Angeles para a Califórnia. Conforme os anos se passavam e eu ia crescendo,
via a cada dia o brilho de minha mãe se apagar, seu espírito aventureiro
morrer, sem os traços da mulher alegre que ela sempre foi. Bruce, seu
marido, era um alcoólatra narcisista, batia nela com grande frequência. Me
recordo que até os meus doze anos, nossas vidas foram horríveis. Em uma
noite de chuva, Bruce estava dirigindo embriagado quando se perdeu em uma
curva. Seu carro bateu de frente com um caminhão, o levando a óbito
instantâneo. Sei que é horrível dizer isso, mas aquele infeliz prestou para
algo, a deixou com uma vida estável e ela não precisa se preocupar com
grana. Porém, como minha mãe sempre foi uma mulher de paixões
avassaladoras, ela nunca conseguiu ficar sozinha, e assim fui vendo a cada
semana um novo amor entrar e sair de sua vida. Mas, ao fim, sempre
desconfiei que era meu pai que ela procurava em todos esses envolvimentos
relâmpagos.
Sorrio sem graça para os dois, que estão namorando na minha frente,
e tento escapar da cozinha outra vez, mas sou impedida pela pequena mulher,
que começa a tagarelar ao me ver me afastar.
— Ande, Cris, sente-se! Vou preparar o seu café da manhã. Não
achou que esqueci o aniversário da minha gatinha, né?!
— Na verdade, eu já estou de saída, mãe. — Dou um sorriso amarelo,
girando meu corpo e caminhando para a porta.
— Nem tente, Cristina! — Seus dedos já estão bem presos em meu
braço, me puxando para me sentar na cadeira. — Não pode achar que está tão
velha assim para me negar um pequeno carinho para minha rosquinha...
— Oh, meu Deus, mãe! — Esfrego meu rosto, deixando a xícara em
cima da mesa. — Já falamos sobre eu não ter mais idade para apelidos, certo?
— Pense em uma menina que apenas comia rosquinha recheada
quando criança, Filipe. — Ela me ignora descaradamente, sorrindo para o
sarado seminu dentro da cozinha. — Ainda continua se entupindo de
rosquinha, a única diferença é que agora não é mais minha menininha.
Me afundo na cadeira, desejando poder transformar meu corpo do
estado sólido para o gasoso, apenas para poder evaporar daqui. Sinceramente,
detesto datas comemorativas, e meu aniversário está no topo delas. Estar
completando vinte e oito anos, morando dentro da casa da minha mãe de
favor, enquanto espero a reforma do meu apartamento terminar, apenas me
faz me sentir mais patética. Devia ter ido para um hotel, ao invés de ceder e
vir para cá pela insistência dela. É estranho saber que quando eu completei a
maior idade, tinha toda minha vida planejada, e ela simplesmente
desmoronou.
Aos vinte anos conheci Renan enquanto eu cursava faculdade de
Direito, e ele Gestão Empresarial. Me apaixonei por ele perdidamente. Logo
após minha formatura, nos casamos, e ao invés de seguir carreira, me vi
trocando códigos civis por afazeres domésticos, já que era o que Renan
queria e o que eu também achava que queria. Me transformei em uma perfeita
mulher que fica em casa, pois para a educação que ele teve, isso seria o
correto. E eu, por amá-lo demais e ser uma completa idiota, renunciei à
minha formação acadêmica e virei a melhor dona de casa que um homem
poderia querer. Mas sempre me sentia como se não fosse suficientemente boa
para ele. Seu ciúme em demasia me sufocava tanto, ao ponto de eu não ter
nenhum tipo de amizade verdadeira com outra pessoa, nenhuma amiga e
muito menos um amigo, e poucas vezes eu visitava minha mãe. Eu mentia
para mim mesma que estava tudo bem, que não precisava me preocupar, que
seu ciúme era algo normal, porque, afinal, ele me amava. Mas não tem nada
de normal em um ciúme doentio, não existe nada de saudável em um parceiro
que te diminui, que usa sua fraqueza contra você, te torturando lentamente,
como um vampiro que chupa toda sua alegria, sua luz e sua vida, até restar
apenas dor.
Depois do primeiro ano de casamento, tudo piorou quando ele decidiu
ter um filho. Claro que abracei a ideia da maternidade na mesma hora, pois
meu sonho sempre foi ser mãe. Mas então nada acontecia, cada mês um novo
fracasso, até que procuramos ajuda médica. Quando Renan trouxe os
resultados dos exames, me deu a notícia que eu não poderia ser mãe. Meu
corpo é oco e seco por dentro. Isso me devastou, me deixou mais abalada
psicologicamente do que eu já me encontrava, e fiquei de bandeja para a
dominação que ele tinha sobre mim.
Aprendi da pior maneira a distinguir uma relação saudável de uma
relação maligna. O ciúme doentio de Renan, em nossa relação tóxica e
narcisista, me consumia. Em nosso último agonizante ano de casamento, no
qual já me encontrava melancólica ao extremo, em uma noite, quando
voltávamos do cinema, sorri com ternura para uma criança dentro do
shopping, não reparei no homem ao lado dela, apenas imaginei como seria
estar passeando com meu filho, se eu pudesse ser mãe. Foi apenas um sincero
sorriso para uma criança, mas Renan não viu com esses olhos. Ao chegar em
casa naquela noite, Renan ficou louco, zangado, espumando de ódio pela
boca, enraivecido. Ficou alterado de uma forma brutal, só que dessa vez ele
não usou apenas de palavras maldosas para me ferir, não foi só o abuso
psicológico. Ele me olhava com nojo enquanto me arrastava para o nosso
quarto, puxando meus cabelos. Gritando palavras chulas e grosseiras, me
arremessou ao chão, jogando todas as coisas da cômoda na parede, me
dizendo que eu era uma vagabunda, que mesmo ao lado dele estava
paquerando outro homem, que o sorriso que dei era para o homem e não para
a criança, que no fim ele sempre soube que eu seria igual à minha mãe, uma
puta suja. Fiquei assustada e com muito medo, acuada, me sentindo pequena
e insignificante. Não tive qualquer tipo de reação quando ele partiu para cima
de mim. Renan me bateu de forma brutal, desferindo um murro em meu
rosto, puxando meus cabelos, dando chutes no meu estômago, que me faziam
contorcer de dor caída ao chão, sentindo o gosto do meu sangue se misturar
às minhas lágrimas a cada vez que ele acertava minha face.
— Sempre soube que no fim você seria só mais uma vagabunda
negra! — Ele me chuta com força. Minhas mãos só conseguem tapar meu
rosto, tentando estancar o sangue que sai pelo meu nariz. — Bem que me
avisaram, mulheres como você são fogosas demais para se contentarem com
apenas um pau dentro da boceta. Não passa de uma vadia que não tem onde
cair morta. Você sem mim não é nada, só uma cadela imunda!
Deus, eu ainda posso ouvir a voz dele me dizendo aquilo dentro do
quarto. Renan é duas vezes maior que o meu tamanho. O que seriam meus
1,59m contra um homem de 1,85m e com 90 quilos me espancando? Nada!
O que Renan sentia por mim não era amor, e sim posse. Seu ciúme
patológico, que eu tentava sempre perdoar, era assustador, e não tinha mais
como enganar a mim mesma que nossa relação era saudável. Ele me abusava
psicologicamente, me fazia me sentir inútil e culpada por qualquer coisa que
o irritasse.
Renan saiu de casa me xingando de todos os nomes sujos e
depravados. Me arrastei até o telefone, que estava no chão, o peguei em meus
dedos sujos de sangue, e liguei para minha mãe. Quando minha mãe chegou e
me encontrou toda machucada, encolhida no chão do quarto, ela me tirou
daquela casa na mesma hora. Não houve nenhum diálogo entre nós,
questionamento ou um “eu te avisei que ele não era bom para você”. Ela não
falou nada. Minha mãe não pegou nenhuma roupa minha, já que todas foram
Renan quem comprou, nem fez as malas, apenas me tirou de lá. E assim
deixei quatro anos de casamento para trás. Minha única felicidade em tudo
isso foi que pelo menos para alguma coisa me foi útil meu ovário seco: não
tivemos filhos.
A separação foi dolorosa em todos os sentidos. Fui humilhada pelos
advogados da família dele diante do tribunal, que me espezinharam,
apontando como ele era um bom marido. E de vítima agredida fisicamente,
emocionalmente oprimida por quatro anos, me vi tendo minha sanidade
mental contestada. Os advogados distorceram tudo, desmerecendo os fatos,
omitindo a personalidade agressiva de Renan, o transformando em um
empresário de boa índole, familiar, respeitoso, de família nobre. Isso foi feito
de uma forma tão fria, calculista e baixa, que até eu mesma tive dúvida sobre
minhas memórias e sanidade mental. Eu estava fraca e abalada, e fui de
vítima para ré em questão de segundos. Depois dessa humilhação, quando
achei que tudo iria terminar, Renan retornou dia após dia, vindo me ofender
na porta da casa da minha mãe, onde fiquei um tempo depois da separação.
Quando me estabelecia em algum apartamento, ele sempre dava um
jeito de descobrir onde eu estava, e ia até a porta do meu prédio ficar me
acuando. Mudei de endereço por três vezes, de tanto medo que eu sentia.
Passava um tempo e eu ficava calma, quando achava que tudo estava se
encaminhando e eu podia respirar aliviada, Renan voltava, me perseguindo
na rua, fazendo juras de amor, implorando por uma segunda chance, me
aterrorizando na frente do prédio do meu novo apartamento, cuidando de
cada passo da minha vida. E toda vez que eu dava uma queixa na polícia
contra ele, Renan não ficava mais que duas horas preso, logo era solto por
conta do seu pai, que tem grande influência por ser um governador do estado.
O máximo que eu consegui foi uma restrição protetiva, e mesmo assim ele a
quebrava, ficando feito um fantasma, parado do outro lado da rua do meu
prédio.
Apenas tive um pouco de paz quando Renan arrumou uma garota.
Descobri por acaso, em uma reportagem de jornal, que ele estava noivo outra
vez. Isso me deixou aliviada e ao mesmo tempo triste. Aliviada por mim, mas
temerosa pela coitada da mulher que deve ter caído no charme irresistível de
predador dele.
Finalmente encontrei um bom lugar para morar, sem precisar mais
fugir dele, agora que Renan encontrou alguém. É um apartamento simples,
mas acolhedor, e estou animada com meu imóvel. Já estou lá há uns três
meses, só que decidi retirar a parede que divide a cozinha da sala e trocar o
porcelanato do chão, para o deixar mais belo, por isso precisei passar uns dia
na casa da minha mãe.
No entanto, de alguma forma, eu morri, não dentro daquela casa
sendo espancada por ele, mas por dentro, em minha alma. A garota
sorridente, extrovertida, romântica, apaixonada pela vida e pelo amor, não ri
mais, nem brinca ou dá brecha para outra pessoa entrar na sua vida. Os
vestidos soltos e saltos altos, com roupas coloridas e alegres, foram trocados
por saias compridas sem cor até as canelas, sapatilhas discretas e blusas de
gola alta, que me dão a sensação de proteção. Os cabelos soltos viraram um
coque, as maquiagens foram jogadas no lixo. Eu era uma luz brilhante que
tinha se apagado. Prefiro ficar no escuro, onde os monstros não me alcançam.
— Olha só o que preparei para você. — Minha mãe me tira dos meus
devaneios, colocando um prato de panquecas com mel na minha frente.
— Obrigada, mãe, sabe que é minha comida preferida — digo,
sorrindo para ela, lhe dando uma piscada.
— Feliz aniversário, meu amor! — Ela sorri carinhosa, apoiando seus
cotovelos na mesa. — E aí, já sabe o que vai fazer hoje? — Ela está
parecendo uma adolescente me olhando, ansiosa, batendo seus longos cílios.
— Vai sair para beber, encher a cara, pegar uns rapazes gostosos para transar
a noite toda?
Meus dedos congelam segurando o garfo, que está enfiado em cima
das panquecas. Expando meus olhos, a encarando.
— Por favor, não faça isso...
— Por quê? Você gostava quando brincava com você, antes de virar
esse fantasma ambulante.
— Mãe...
— Isso mesmo! Transar, foder, trepar até suas coxas ficarem
assadas... — Olho para o rapaz, que sorri atrás dela e segura sua cintura.
Perco qualquer resquício da mínima fome que eu pudesse ter, enquanto ela
tagarela sem parar: — São atos naturais para o ser humano.
— Mãe, suspeito que erraram nossos corpos, sabia? — suspiro
envergonhada, soltando o garfo, sentindo uma falta de ar me pegar.
— Ah, qual é, Cris? Pelo amor de Deus! Você parece uma velha
chata! Só se faz vinte e oito anos uma vez na vida. — Ela puxa uma cadeira e
senta ao meu lado, segurando meu rosto em suas mãos. — Sério, garota, você
está precisando de uma boa noite de sexo, com um deus grego maravilhoso,
que te tire desse mundo chato que você se fechou, por conta daquele merda
do Renan.
— Mãe, meu mundo não é chato, e eu não sou assim — falo séria,
afastando meu rosto de suas mãos.
Meu mundo, no qual eu tinha me recluído depois do aterrorizante fim
do meu casamento, durante esses quatro anos de divórcio, não é chato, é
seguro.
— Não?! — Ela encosta suas costas no encosto da cadeira, cruzando
os braços. — Então me diz, quando foi a última vez que transou? E não
venha com encontros enfadonhos de reuniões da empresa. O que estou lhe
perguntando é sobre dar, foder de uma forma que ficou dolorida por pelo
menos um dia.
Pisco, confusa, negando com a cabeça para ela.
— Veja... — Ergo meu dedo, apontando no ar, tentando trazer algum
encontro, no qual eu transei, em minha mente. — Bom... Teve... Humm...
Foi... Foi...
— Foi há muito, muito tempo. — Minha mãe balança a cabeça em
negativo, sorrindo para mim, me dando um olhar arteiro. — Precisa voltar a
viver, Cris. Precisa de sexo, e já resolvi isso para você da minha maneira.
— Mãe?! — Ela sorri, gesticulando seus dedos no ar como quem não
quer nada. — Não quero que faça nada. Sem gracinha ou qualquer presente
que vá me deixar envergonhada.
— Relaxa, relaxa. — Minha mãe se levanta da cadeira e se afasta da
mesa. — Sabe do que você precisa, dona Cristina?
— Desconfio que mesmo que eu não queira saber, a senhora vai me
contar...
Ela se vira, me olhando, sorrindo diabólica. Bebo meu café, não
quebrando nosso contato visual, tentando descobrir o que ela está tramando.
— De um cara com um pau bem grande, não digo tipo McLanche
Feliz[4], com aqueles brinquedos pequeninos mixurucas, mas sim aqueles
homens Subway[5], com 21cm.
Me engasgo na mesma hora que ela me diz isso, quase jogando o café
da minha boca para fora. O tal de Filipe ri junto com ela, saindo da cozinha,
indo na direção do quarto dela.
— Mãe, pelo amor de Deus! — Solto a xícara de café na mesa,
limpando minha boca com o guardanapo, a olhando de cara feia. — A
senhora não pode falar sobre minha vida sexual na frente dos caras da
semana.
— O que foi? É verdade! Veja o Filipe, por exemplo. Pensa em um
homem que sabe usar o que tem, Cris. Deus, se você soubesse como ele tem
doutorado em manusear aquela língua dele... — Enquanto a estou olhando
chocada, quase saltando meus olhos para fora do meu globo ocular, minha
mãe está rindo descaradamente da minha face de pânico. — Filipe me
proporcionou os melhores orgasmos que já tive na minha vida...
Me levanto em um pulo, derrubando no chão a cadeira em que estava
sentada com o movimento abrupto.
— Lembra aquela linha invisível que eu estipulei sobre assuntos que
podemos falar uma para outra? — Respiro rápido, sentindo a falta de
oxigênio aumentar. Faço um risco com meu dedo no ar na frente dela, como
se fosse nossa linha imaginária. — A senhora acabou de ultrapassá-la. Não
vamos falar sobre seus orgasmos ou como o cara da semana sabe usar a
língua.
— É Filipe, Cris. Não chame ele de cara da semana, pega mal falar
assim, sem dizer que parece que estou desmerecendo-o... — Ela abaixa o tom
de voz, olhando na direção que o homem foi, enquanto ergo a cadeira do
chão. — Meio que ontem à noite eu dei uma mancada, esquecendo o nome
dele na hora do sexo...
— Mãe, você é inacreditável. — Aliso meu peito por conta de uma
palpitação em meu coração, e percebo a dor latente em minha nuca. — Não
vai me contar mais nada das suas aventuras sexuais, a senhora vai me fazer
ter um infarto antes dos trinta anos. — Passo meus dedos em minha nuca, a
massageando. — Acho que minha pressão está alta...
— Você está ótima, Cristina. Pare com essas suas manias de
hipocondríaca[6]. E outra, não vejo qual o problema de falarmos sobre minha
vida sexual. Se eu não contar para você, eu vou falar com quem? Para a
vizinha amarga do outro lado da rua?
— Inacreditável! Mude de assunto, por favor.
— Inacreditável é uma mulher na sua idade ficar sem transar por
quatro anos. — Ela nega com a cabeça, revirando seus olhos. — Já que quer
mudar de assunto, me diga: vai voltar para casa cedo hoje ou vai ficar até
tarde no escritório?
— Não vou voltar cedo, amanhã estou oficialmente de férias, então
preciso deixar tudo encaminhado hoje, para a secretária temporária.
— Secretária. — Ela volta a revirar seus olhos, me deixando saber
que vai fazer um discurso. — Ainda não entendo como pode ficar trancada
dentro de uma sala, atendendo telefonemas, quando poderia estar brilhando
dentro dos tribunais, defendendo as pessoas, como sempre foi seu sonho.
— Mãe, por favor...
— Anos de estudos, uma carreira promissora em Direito jogada no
lixo, para sobreviver de atender telefones...
— Mãe, para seu governo, meu serviço é muito mais do que atender
telefones, e não há nada de errado com a profissão de secretária. — Ela ergue
sua mão, me calando, fechando sua face.
— Não pense que estou desmerecendo o serviço de secretariado, eu
seria a primeira a me encher de orgulho por você ser uma ótima profissional
— minha mãe me olha séria, negando com a cabeça —, se essa fosse a
profissão que você realmente queria exercer. Eu quero que você seja feliz,
que viva, e não que apenas sobreviva nessa forma sem cor na qual você se
transformou.
— Eu sou feliz, mãe. Da minha maneira, eu sou.
Desvio minha face do rosto dela, olho para a janela e respiro fundo.
Não quero voltar a ter essa conversa com ela.
— Bom, se é o que você diz a si mesma para acreditar nessa mentira,
não falarei mais nada.
— Eu tenho que ir, vou me atrasar para o trabalho. — Olho para ela e
lhe dou o mais próximo de um sorriso que minha face consegue expressar.
— Se não tiver nessa casa antes das 20h, vou mandar seu presente
para seu trabalho, uma entrega especial. E nem pense em o recusar, Cristina.
— Ela sorri para mim, me dando uma piscada. — Irá gostar de algo palpável
para animar essa sua vida.
Minha mãe desliza sua língua pelo canto da boca de forma obscena,
olhando na direção do quarto, onde o cara da semana está.
— Você precisa de uma terapeuta. — Esfrego meu cenho, sentindo
meu coração palpitar dentro do peito. — Na verdade, eu preciso de uma
terapeuta, não sei mais como lidar com uma mãe ninfomaníaca[7].
— Não precisa de terapia porra nenhuma!
Saio da cozinha e ouço minha mãe rir e gritar em alto e bom som atrás
de mim, enquanto caminho apressada para meu quarto.
— Você tem que transar, Cristina! — ela continua gritando, eufórica.
— 21cm, lembre-se disso!
Pego minha bolsa no cabideiro e saio a passos acelerados, antes que
eu acabe me atrasando para o serviço. Paro perto da porta da saída e pego
minha chave de casa na mesinha do telefone. O pequeno cartão vermelho
chama minha atenção, me fazendo olhá-lo atentamente.
O céu é o limite, escrito em negrito, brilha em letras ofuscantes. Tem
a descrição de garotos de programa logo abaixo. Olho em direção à cozinha,
que agora está vazia, voltando a encarar o cartão.
— Ela não ousaria fazer isso comigo! — resmungo baixo, puxando as
chaves, me negando a acreditar que minha mãe me sacanearia no dia do meu
aniversário. Mesmo assim fico com a pulga atrás da orelha ao sair para o
trabalho.
Capítulo 02
Toy Boy
Cristina Self

— Cris, será que você pode me cobrir hoje?


Desvio meus olhos da tela do computador para a mulher parada do
outro lado da minha mesa, e vejo Bete me dar um sorriso travesso. Não, eu
não posso, e não quero. Já estou três horas a mais depois do meu expediente,
deixando todo o trabalho mastigado, direcionando meu serviço para a moça
que ficará cobrindo minhas férias. Bete me sacaneou durante todo o dia,
jogando o serviço dela em cima de mim, redobrando todos os relatórios que
eu tive que transcrever durante o expediente, e apenas agora pude finalizar as
planilhas para a menina da agência de secretárias temporárias.
— Preciso resolver uns assuntos com Dover...
Minha vontade é de dizer para ela que sair para dar para o cara do
departamento de contas não é assunto para resolver, é apenas uma forma dela
ser vadia.
— Claro. — Tiro meus óculos, suspirando, me restringindo a apenas
uma única palavra.
Confesso que hoje a única coisa que mais quero é estar longe de casa,
caminhando para o aeroporto com minha mala. Sei que minha mãe está
aprontando alguma coisa, e no meu íntimo até desconfio o que possa ser. Ela
sempre faz algo fora do normal nos meus aniversários, e dessa vez não irá ser
diferente, aquela porcaria de cartão que encontrei hoje pela manhã me alerta
disso. Graças a Deus, quando eu retornar das férias, meu apartamento já
estará liberado, para eu poder voltar!
— Sei que deve estar ansiosa para sair de férias, mas acontece que
não tenho como desmarcar esse compromisso. — Bete cruza seus braços
acima do peito, me olhando sorrindo. — Queria ter essa sorte de poder
encaçapar 60 dias afastada da empresa.
— Estou com férias vencidas e a outra vence daqui a três dias, então
não havia como adiá-las... — falo calma para ela, recolocando os óculos em
minha face.
— Bom, que seja, teve sorte. A propósito, pode ficar até as 21h30
também. Vai chegar um daqueles jovens que acabou de sair da faculdade de
Direito, o novo sócio da firma. Se caso o novato aparecer, pode recebê-lo
para mim. Não é certeza que ele venha, mas precisa ter alguém aqui até este
horário apenas por precaução. Se ele vir, entregue para ele o envelope que
está em cima da minha mesa. São apenas os direcionamentos de como
funciona a firma, e depois pode ir embora — Bete tagarela e se encaminha
para a saída da sala.
— Na verdade, eu... — Ela nem sequer se vira para me ouvir, apenas
acena, dando tchau. — Piranha! — murmuro baixo, balançando minha
cabeça em negativo, me sentindo exausta e com raiva dessa vadia
exploradora.
Olho para o canto da tela do computador e vejo que já são quase sete
horas da noite. Me sinto desanimada por saber que não vou ter chance
alguma de trocar minha passagem de amanhã para hoje à noite. Já são 21h50
quando finalmente finalizo as planilhas. Sendo a última funcionária dentro do
escritório, abro uma nova janela de pesquisa, navegando entre os sites de
companhia de viagem aérea, torcendo para que milagrosamente apareça
alguma disponibilidade de trocar meu voo para hoje à noite, para assim
conseguir fugir da minha mãe. Eu não tenho do que reclamar do meu serviço,
gosto de trabalhar com Pietro e Max. Consegui um bom trabalho de secretária
na companhia de Direito dos irmãos Toll, na qual eu realmente aprecio
trabalhar. Viro meu rosto para a janela, vendo a noite alta. O prédio está
praticamente vazio, restando apenas eu no meu andar, esperando algum
filhinho de papai mimado que acabou de receber seu diploma de advogado,
sem compromisso algum. Imagino quando tiver que ir ver um juiz, com
certeza vai dizer:
— Desculpe, Vossa Excelência, estava testando meu novo carro
esporte, que meu pai me deu...
Disco o número da recepção no primeiro andar e ouço a voz do
segurança que me atende.
— Oi, Mithi, é a Cris. Boa noite...
— Feliz aniversário, boneca. — A voz alegre dele me corta, me
fazendo sorrir.
— Obrigada, Mithi — suspiro, girando meu corpo na cadeira de
rodinhas. — Me diga uma coisa, sabe me informar se alguém se apresentou aí
na recepção ou se algum carro entrou no estacionamento da firma depois do
expediente?
— Não apareceu ninguém, e pelo que estou vendo nas câmeras, o
estacionamento está vazio...
— Bom, está tudo bem. — Bocejo, preguiçosa, balançando meus pés.
— Estava esperando alguém? — o segurança me pergunta, animado.
— Um novo sócio que iria vir. Mas, pelo visto, ele não vem mais.
— Bom, se ele aparecer, eu te ligo avisando... Mas, escuta, você não
vai embora para comemorar seu aniversário?
— Eu estou finalizando uns trabalhos e vou embora daqui a pouco.
Agora preciso terminar as coisas aqui. Obrigada — minto descaradamente
para ele, desligando em seguida, não dando tempo de me perguntar mais
nada.
Tiro o sapato do meu pé e solto as sapatilhas ao chão, admitindo
mentalmente que prefiro ficar aqui dentro, escondida, do que voltar para casa
e me surpreender com as loucuras da minha mãe. Sabia que ela estava
blefando, não seria louca de mandar um motoboy fazer uma entrega aqui no
meu serviço depois das 20h. Continuo a ficar vadiando na internet por um
tempo. Tendo certeza de que o engomadinho não vai aparecer, solto a
presilha dos meus cabelos, o livrando do coque. Talvez eu possa passar a
noite em um hotel. Isso é tentador. Pela manhã vou para casa, pego minha
mala e corro para o aeroporto. Sorrio com a ideia.
Abro uma guia para pesquisar um hotel próximo ao escritório. Depois
retiro o telefone do gancho, para discar para um que achei, mas abre uma
porcaria de propaganda em cima da página. Clico em cima do pequeno x,
tentando fechar a guia, mas sou direcionada para outro site diferente no
computador e uma outra guia se abre sozinha. A porcaria da propaganda que
estava tentando fechar me direcionou para um site de vídeos pornográficos.
Meu rosto queima de vergonha, me fazendo olhar assustada para a tela,
correndo o mouse na mesa com rapidez e o deixando se espatifar no chão. Me
entorto na cadeira, tentando pegá-lo, e, quando consigo, arrasto a flechinha
em cima do x na lateral da página, mas ao invés de encerar a página, fico
curiosa ao ler o título que brilha na tela.
Garota má com Toy Boy.
Sério, eu juro que não iria ver, mas sabe aquele minuto de besteira
que bate na gente? Pois então, provavelmente é isso que deve estar
acontecendo comigo. Ergo meus olhos e percorro o escritório vazio,
confirmando que estou sozinha, e antes que pense se é o certo ou não, minha
bisbilhotice me faz clicar no play.
Como a grande maioria dos vídeos pornôs, ela começa chupando o
cara no sofá. O homem é extravagante em todos os sentidos, é bem-dotado,
musculoso e tem tatuagens preenchendo o corpo inteiro. As mãos enormes
apertam a bunda dela, se cravando na carne. Não sofro de nenhum tipo de
libido sexual, pelo contrário, por mais que não transe com nenhum cara há
muito, muitoooo tempo, eu sou sexualmente ativa comigo mesma e meus
vibradores. Acho que por não transar e estar por fora da prática, fico
abismada com tudo que vejo acontecer nesse vídeo. Ele a pega de quatro e
volta em um frenesi rápido, se afundando dentro do rabo dela. Chega a ser
assustador como essa mulher é flexível com as juntas do corpo dela, pelo
tanto que ele a gira de cima do sofá. Ele sai dela e joga seu corpo debruçado
sobre o braço do sofá, erguendo sua perna até ela estar toda reta, e começa a
penetrar mais fundo e mais rápido ainda. E como uma idiota, tombo minha
cabeça para o lado, tentando entender que posição é essa, e fico olhando as
estranhas acrobacias. Se eu tentasse fazer algo assim com minha perna,
provavelmente iria rasgar algum músculo ou morrer gritando, tendo uma
câimbra agressiva.
— Como ela consegue fazer isso, meu Deus! — murmuro, arrumando
os óculos no meu rosto, me aproximando da tela do computador.
— Suspeito que ela faça pilates[8]. — Uma voz rouca sussurra
próximo ao meu ouvido, assoprando um ar morno em meu pescoço.
Dou um pulo na cadeira, jogando meu corpo para trás e soltando um
grito, apavorada.
— MEU DEUS! — grito, assustada, me atrapalhando em minhas
pernas, andando para trás. A maldita cadeira se vira, me levando ao chão
junto com ela, de pernas para cima.
Fico lá, caída, por alguns segundos, antes de ver duas mãos grandes
nos meus tornozelos, afastando minhas pernas, as abrindo. Seus cabelos
dourados são tudo o que vejo antes de enxergar um sorriso irônico alargado
de orelha a orelha em um rosto másculo e charmoso ao mesmo tempo. Pisco,
confusa, me perdendo em seus olhos azuis e em seus lábios grossos, que
estão sorrindo para mim.
Capítulo 03
Vírus carnal
Cristina Self

— Vejo que é adepta de pilates também, senhorita... — O intruso


terrivelmente sexy desvia seu olhar para minha mesa e vê a placa com meu
nome. — Cristina Self!
Suspeito que meu cérebro ainda não assimilou que estou esborrachada
no chão, com as pernas erguidas e com o traseiro preso na cadeira, encarando
um homem estranho dentro do escritório. Continuo cativa em seu olhar
provocador e em seus lábios, que possuem um sorriso travesso no canto. Seu
olhar penetrante arrancaria o que quisesse de mim, pois não tenho capacidade
mental para raciocinar com clareza. Meu QI[9] diminui drasticamente assim
que tenho a noção que suas mãos ainda se mantêm em minha pele. Ele brinca
com seus dedos, subindo e descendo em meus tornozelos, desenhando
pequenos círculos, trazendo arrepios pelo meu corpo, os quais há muito
tempo não sentia. Sua mão quente, unida com o tecido da meia fina da minha
perna, me faz imaginar como seria se ele descesse um pouco mais suas mãos.
Pisco diversas vezes, tentando me livrar desses pensamentos libertinos que
estão inundando minha mente. Arrumo os óculos tortos em meu rosto. Em
um movimento ágil, o intruso sexy estica seu braço e segura meu pulso, me
erguendo em um solavanco só, como se eu fosse uma almofada largada no
chão, que estava atrapalhando seu caminho. Meu corpo vai de encontro ao
dele, me chocando contra seu peitoral, dando um soco na minha libido assim
que seu cheiro amadeirado invade minhas narinas.
— Se machucou? — A voz rouca me pergunta de forma íntima,
próxima ao meu ouvido, enquanto mantenho meus olhos nos botões da
camisa jeans que contém os três primeiros abertos. — Cristina?
Ele chama pelo meu nome um pouco mais firme, e ergo meu rosto
para encarar o seu. Se minha mente estava paralisada, agora ela entrou em
modo de bloqueio. Inferno! Ele realmente é terrivelmente sexy. Um anjo sexy
com cabelos dourados e olhos safira com um ar sombrio. Pigarreio,
balançando minha cabeça em positivo para ele. Me afasto dele, mesmo contra
os protestos do meu corpo para que eu não me distancie desse aroma
embriagante. Deixo uma boa distância entre nós dois, endireitando minha
saia.
— Estou bem. Obrigada! — balbucio com um fio de voz. Olho pelo
canto dos olhos, o avaliando com cautela.
Percebo agora como ele é extremamente alto. Lhe dou no mínimo
1,96m de altura, com ombros largos e uma falsa magreza, escondida sobre a
camisa jeans de botões e a bermuda branca. Tem uma postura despreocupada,
com ares despojados, e os traços em seu rosto masculino me deixam saber
que não é mais um jovem, talvez tenha uns trinta e oito ou quarenta anos.
Coço minha cabeça, olhando para a porta aberta do escritório e os corredores
vazios. Como ele entrou aqui?
— Foi um tombo e tanto, hein?
— Eu... — Meus dedos trêmulos erguem meus cabelos, os enrolando
em um coque, sentindo meu rosto queimar de vergonha. — Estou bem,
apenas estava... — Aponto para a tela do computador, soltando o ar do meu
peito.
OH, ME FODE... MAIS RÁPIDO... MAIS FUNDO...
O grito da mulher na tela do computador faz eu querer abrir um
buraco e me enfiar dentro para o resto da minha vida, enquanto ela geme,
soltando um ruído agudo da garganta.
Olho para o homem, que está sério, observando o monitor em cima da
minha mesa. Seus olhos voltam-se para mim, me encarando, arqueando suas
sobrancelhas claras.
— É vírus! — digo em uma voz baixa, sem coragem de manter meus
olhos nos seus.
Ele apenas balança a cabeça para mim em positivo, levando suas
mãos ao bolso da bermuda. Me obrigo a me mexer, indo para o computador,
e tento fechar a merda da tela, mas é como se tivesse congelado, ficando
travada na cena do pau se afundando no rabo da peituda. Em um ato de
desespero, puxo o fio da tomada, forçando o desligamento do aparelho. Ao
me virar, dou de cara com o homem alto a dois passos de distância de mim,
me olhando curioso. Meu corpo se cola à minha mesa e puxo minha perna
para o lado enquanto me arrasto para longe, deixando ele remotamente
distante do meu espaço pessoal.
— Em que posso lhe ajudar, senhor? — falo, nervosa, tentando
resgatar um pouco da dignidade que possa ter me sobrado.
— Acho que não gostaria de saber, Cristina — ele me diz com sua
voz rouca, em tom baixo. — Quando cheguei, estava tão distraída com seu...
— Sua cabeça tomba para o lado, dando uma pequena pausa em suas
palavras, me olhando sério. — Vírus. Creio que foi esse termo que usou para
descrever seu momento.
— Realmente foi um vírus, abriu uma página...
— Percebi — ele fala sério, me cortando, caminhando pela sala de
forma autoritária. — Tanto que não quis lhe interromper, você estava tão
concentrada com seu “vírus”, que seria uma pena lhe atrapalhar, sem falar no
seu rosto tão expressivo. — Sua face se volta para mim e sorri
diabolicamente. — Seria até um crime privar um homem de ver suas
expressões faciais.
Ele é um grande filho da puta que sabe usar as palavras! Meu cérebro
grita “perigo” em alto e bom som, mas minha vagina repete as palavras da
minha mãe: “você precisa transar, Cristina”. Balanço minha cabeça, para
tirar essas ideias de lá, e avalio sua forma despojada com roupa casual, não
parecendo nem um pouco com um advogado, e muito menos um jovem saído
da faculdade de Direito, como Bete falou. Fico confusa e me pergunto o que
um homem como esse está fazendo por aqui.
— Bom, e o senhor é quem? — pergunto, tentando descobrir de onde
diabos ele veio. — Como conseguiu subir?
Olho para o telefone, vendo que o aparelho está fora do gancho.
Merda, devia estar tão curiosa com a porcaria da acrobacia pornográfica, que
nem reparei que não tinha enganchado o telefone! Antes de me mexer para
arrumar o aparelho, a sombra se movendo chama minha atenção. Me volto
para ele a tempo de o enxergar dando dois passos, parando à minha frente.
Seu braço se estende e a grande mão fica parada no ar, perto da minha
barriga.
— Sou Ariel. Creio que o segurança devia estar ocupado, por isso não
me viu subir. — Ele não tem cerimônia alguma em pegar minha mão na sua,
apertando forte entre seus dedos.
Ele faz círculos com os dedos dentro da palma da minha mão, me
embebedando com sua colônia, e nunca um aperto de mão me pareceu tão
pecaminoso e sacana como o dele está sendo agora. Mas, em um estalar de
dedos, tudo se encaixa dentro da minha mente. Seu rosto sexy, o ar
autoritário e perverso, até sua roupa despojada, com os três botões abertos da
camisa, provocativo, deixando um vislumbre do seu peitoral musculoso.
Corpo atlético com mãos ásperas demais para ser um advogado, os cabelos
angelicais dourados que têm uma mecha preguiçosa caída em sua testa,
sorriso avassalador em sua face quadrada, praticamente uma festa sexual
ambulante repleta de testosterona.
“O céu é o limite.”
As palavras do cartão se fazem em minha mente, tão nítidas quanto
seu olhar safira agora preso ao meu. Vou matar minha mãe! Não é um
motoboy com um presente estranho que ela me mandou, mas o próprio
homem é o presente.
— Ariel, sério? — digo, não acreditando no que estou vendo à minha
frente. — Muito criativo mesmo, muito criativo.
Solto sua mão, balançando minha cabeça para os lados, me afastando
dele e esfregando meu rosto. Deus, vou matá-la! Como pôde fazer isso
comigo?!
— Não acredito que ela fez isso — rosno entre meus dentes, fechando
meus dedos em punho, soltando meus braços ao lado do corpo. — Está certo
que estou sozinha há bastante tempo, mas mandar você?! — Aponto para ele,
negando com a cabeça, odiando muito minha mãe nesse momento. — Quanto
ela te pagou?
O vejo piscar seus cílios dourados, arrumando seus cabelos e voltando
a levar suas mãos ao bolso.
— Pagou?
— Minha mãe se superou agora! — Me viro com raiva para não olhar
para a face dele, cortando suas palavras. — Sério, contratar um garoto de
programa para mim?! — Bufo pelas narinas, batendo meus pés no chão. —
Tá certo que você é muito lindo e gostoso, e, porra, lhe daria numa boa —
giro, o encarando —, mas saber que ela te pagou para me comer, isso é
humilhante!
O grande homem ergue minha cadeira do chão, sentando-se nela,
cruzando suas pernas, olhando para mim.
— Ela não me pagou.
— Oh, meu Deus, sou eu que vou ter que te pagar! — Bato a mão em
minha testa, não acreditando nisso.
— Se lhe disser que ela não me pagou, e que estou pensando se você
precisa me pagar ou não, isso lhe deixará mais calma?
— Não, claro que não me deixa calma. Uma mãe normal dá um
perfume de presente de aniversário para a filha, um dia de SPA ou qualquer
outra merda fútil feita entre mãe e filha. Mas não minha mãe. Não! Ela me dá
um garoto de programa! — falo rápido, tentando não ter uma crise de falta de
ar.
— Creio que devo parabenizá-la. — A voz dele sai calma, não
perdendo um movimento sequer meu. — Feliz aniversário, Cristina!
— Não seja cínico, pois isso é feio. — Esfrego meu rosto, andando da
janela até a minha mesa e mantendo o ritmo dos meus passos fazendo o
caminho contrário. — Olha, minha vida não anda fácil, isso eu admito, me
fechei depois do que Renan fez comigo, mas eu vou saber quando será a hora
certa para transar.
— Presumo que ele seja um cretino?
— Cretino seria elogio. — Massageio minha nuca, sentindo minha
pressão subir.
Não acredito que ela me mandou um garoto de programa, ainda mais
para o meu trabalho. Estou andando de um lado ao outro da sala, balançando
minha cabeça em negativo.
— Por que não me fala sobre ele? Poderia se sentar, sim? — Ele puxa
a cadeira vazia perto da dele, deixando de frente para a sua, apontando para
mim.
Olho da cadeira para o rosto inexpressível do garoto de programa,
descendo para sua cintura, e vejo o volume acomodado por baixo da
bermuda.
— Acho que isso é uma má ideia, estou bem de pé. — Balanço minha
cabeça em negativo, desviando meus olhos da sua virilha. — Renan é o
babaca do meu ex-marido. Olha, eu sou limitada em sexo, eu sei, mas acho
que tenho capacidade para arrumar um homem por conta própria. Te garanto
que não seria tão lindo e angelical como você, mas poderia achar um cara
para transar sem ter que pagar por ele.
— Não sou tão angelical assim, Cristina. — Ele me olha sério.
Paro meus passos no meio do meu caminho e fico olhando para ele,
engolindo minha saliva. Sim, realmente ele não tem um aspecto tão angelical
assim, está mais para um demônio sexual, que desencadeia pensamentos
perversos na minha cabeça. Sinto minhas mãos úmidas, meu corpo enérgico,
as pernas trêmulas. A adrenalina corre solta dentro de mim a cada segundo
que olho para esse ser de outro mundo sentado na cadeira, com suas pernas
abertas e suas mãos que se esfregam em suas coxas grossas, deixando eu ter
uma bela visão do seu pau, que está começando a ficar ereto, acompanhando
seu olhar para meus pés descalços.
— Isso será interessante! — Ariel fala calmo, erguendo seus olhos
para minha face. — Por que não fazemos assim? Você está aí, eu estou aqui.
Esta sala está completamente vazia, vai ser inesquecível para nós dois, isso
lhe garanto.
— Olha, eu vou te pagar por ter vindo até aqui, daí você não perde
sua noite por completo, mas não vou ter relação sexual com você. Não que
esteja te desvalorizando, tenho certeza de que deve valer cada centavo, mas,
sem chance... — Me viro, procurando pela minha bolsa que caiu no chão
quando a cadeira tombou. A ergo em meus dedos, puxando minha carteira. —
Acho que se você sair agora, ainda consegue arrumar outra cliente... Escute,
por um acaso trabalha com cartão de crédito? Acho que estou com pouco
dinheiro. Garoto de programa consegue parcelar as prestações sem juros? —
pergunto, preocupada, talvez eles não parcelem. — Quanto eu lhe devo?
O giro abrupto que meu corpo recebe, faz com que eu me assuste
quando ele segura firme meu quadril, me manobrando como uma boneca de
pano para me chocar em seu peitoral. Derrubo a carteira da minha mão, tendo
meu coração acelerado batendo tão rápido, que posso jurar que vai sair pela
minha garganta.
— Para uma pessoa tão pequena, você fala demais, senhorita Self. —
Sua voz rouca é enérgica, e ele cola sua boca perversa na minha.
Meu cérebro explode, virando uma geleia molenga sem consistência,
igual as minhas pernas. O gosto de menta que tem em seus lábios é
refrescante e ao mesmo tempo abrasador, me fazendo me render pela forma
urgente como ele me beija. Minha sorte é que ele está me segurando bem
presa, com suas grandes mãos na lateral da minha cintura, pois é só por conta
disso que não caio no chão, visto que não tenho condição de me manter em
pé. Sinto suas mãos deslizarem para minha bunda, a achatando bem apertada
sobre o tecido da saia, chocando meu quadril com o seu. Meus dedos se
prendem em sua camisa, esmagando o jeans com o desespero de um náufrago
que está se afogando. Realmente ele vale cada centavo. Ele me beija com
pressão, me incendiando a cada toque da sua língua com a minha. Deus, eu
tinha me esquecido como beijar alguém pode ser tão mágico!
— Tentador demais para que eu possa perder essa chance, pequena —
ele sussurra no meu ouvido, descendo seus beijos para meu pescoço,
apertando minha bunda em sua mão.
— Oh, Cristo... Por favor, preciso que me solte — balbucio em meio
a um fio de lógica em que me seguro.
O telefone tocando insistentemente em cima da mesa chama minha
atenção, o que me dá uma chance de tomar o controle de volta do meu corpo.
Me afasto desse homem que me deixou excitada e com a pele do meu corpo
completamente quente com apenas um beijo. Com a respiração entrecortada,
retiro o aparelho do gancho, o levando ao ouvido.
— Cris, o rapaz que estava esperando chegou aqui agora...
— Deus, o sócio! — Meus dedos tremem enquanto seguro o aparelho,
tentando não olhar para o grande volume na frente da bermuda do garoto de
programa, que respira pesado, com seus olhos cravados em mim.
— Eu tive que ir buscar minha carteira de cigarro dentro do carro,
quando voltei ele estava na frente da porta do prédio...
— Inferno, Mithi! Quantas vezes te falei para não largar o saguão
para ir fumar?! — Droga de vício desse segurança, por isso esse cretino sexy
conseguiu subir sem ser visto. — Mande-o subir!
Olho para a parede, vendo que já são quase 22h30 da noite. Por que
isso tinha que acontecer comigo justamente hoje?
— Na verdade, já mandei, você disse que estava esperando por ele...
Desligo o telefone no momento que compreendo o que ele falou.
Minha cabeça se abaixa e vejo minha roupa desalinhada. Levo meus dedos ao
rosto, arrumando meus óculos, respirando apressadamente. O diabólico
homem, com seu rosto calmo, me olha despreocupado, passando uma mão
nos lábios. O som do elevador subindo me faz olhar para lá na mesma hora.
— Oh, merda!
Capítulo 04
O engano
Cristina Self

Eu não tenho tempo para pensar. Uso toda minha força para empurrar
o grande homem para dentro do banheiro.
— Por favor, não sai daí! — Fecho a porta do toalete na sua cara, que
esboça surpresa com meu ato, mas nesse momento estou mais preocupada em
salvar meu emprego do que ser educada com o garoto de programa.
Me movo, catando minhas sapatilhas no chão, as calçando com
pressa, correndo rápido para a mesa de Bete, que fica na outra ponta da sala,
perto do escritório de Pietro e Max. Puxo o envelope marrom que está perto
do computador dela. Quando me aproximo da porta do elevador, a vejo se
abrir na mesma hora, e sou surpreendia pelo jovem rapaz de terno, com
sorriso largo e perfume exagerado.
— Olá, deve ser...
— Senhorita Self. — Seguro as portas do elevador, soltando as
palavras com urgência pela minha boca, não o deixando sair. — Me pediram
para lhe entregar isso. Por conta do horário tardio, presumo que prefira
conhecer a empresa na segunda-feira, correto?
Passo o envelope para ele, apertando o botão do elevador para ele
voltar para o térreo, me afastando das portas.
— Acho que não entendi...
— Dentro do envelope tem todas as diretrizes sobre o que vai precisar
saber. Apenas esteja aqui na segunda-feira, às oito, sim? — Aceno para ele,
que olha da minha face para o envelope, ficando perdido. — E não se atrase!
Fecho meus olhos e respiro fundo assim que as portas do elevador são
fechadas.
— Deus, minha mãe vai me fazer ter um infarto antes dos trinta! —
Esfrego meu peito, tentando me acalmar.
Minhas pálpebras se abrem assim que escuto a porta do banheiro ser
aberta. O grande homem caminha silenciosamente, olhando para os lados e
parando sua atenção em mim quando seus olhos safiras me encontram.
— Olha, por favor, preciso muito que você vá embora, sim? —
Encolho meus ombros, caminhando para perto da minha mesa.
— Presumo que foi surpresa dupla? — Ele olha para o elevador, o
encarando.
Ignoro o som de brincadeira em suas palavras, pois elas não passam
despercebidas aos meus ouvidos, insinuando que estava esperando outro
homem.
— Qual foi o valor que minha mãe combinou com você? Apenas me
diga, eu dou um jeito de pagar, ok? — Caminho para o centro da sala,
erguendo minha carteira caída no chão. — Tem um caixa eletrônico do outro
lado da rua, posso efetuar seu pagamento em dinheiro, se você não trabalhar
com cartão...
— Vamos fazer um trato, Cris. — Ele caminha lento, correndo seus
olhos pelo escritório. — Não tenho pretensão em arrumar outros
compromissos agora. Podemos atravessar a rua, e ao invés de ir ao caixa
eletrônico, você toma uma bebida comigo.
— Está tarde. — Puxo minha bolsa de cima da mesa e ando para o
elevador, apertando o botão, aguardando-o subir. A sombra alta para ao meu
lado, mantendo seus olhos safiras presos em mim. — O mais longe que vou
acompanhada com você é até a saída do prédio.
— Uau, que língua felina! — É estranho como o magnetismo do seu
olhar me prende. Ariel solta um longo assobio, deixando um sorriso
sarcástico no canto dos lábios. — Desmerecimento profissional é crime.
— Veja, não quero parecer grossa, e muito menos estou insultando
sua profissão. — Balanço minha cabeça em negativo, enganchando a alça da
bolsa em meu braço, guardando minha carteira lá dentro. — Mas isso não vai
rolar. Tenho certeza de que sua agenda deve estar repleta de clientes
interessadas em tomar um drinque com você, posso notar que deve ter muito
tempo nessa profissão...
— Está me chamando de velho? — ele me interrompe, me olhando
cínico.
— Bom, claro que não. Apenas estou dizendo que...
— Agora compreendo algumas coisas! — O tom da sua voz sai em
deboche, me fazendo ficar confusa com a forma prepotente que se direciona
para mim.
— Como?
A porta do elevador é aberta e sinto a grande mão espalmada em
minhas costas, nos conduzindo para dentro dele. Ariel estica sua mão, aperta
o botão do térreo e logo as portas de aços se fecham. Ele se vira para me
olhar, levando suas mãos aos bolsos, como se estivesse me estudando.
— O motivo de precisar pagar por sexo — ele fala casualmente, como
se estivesse falando qualquer assunto corriqueiro do dia a dia.
— Isso foi extremamente grosseiro da sua parte. — Ergo meus dedos,
empurrando meus óculos em minha face. — E para seu governo, eu não
preciso pagar por sexo... Posso fazer sexo a hora que eu bem quiser.
— Me corrija se eu estiver enganado, mas suas palavras lá dentro do
escritório foram: está certo que estou sozinha há bastante tempo... — Ele
sorri descaradamente, usando minhas palavras contra mim.
— Estar sozinha e estar sem sexo são duas coisas completamente
opostas — rebato sua provocação, não lhe dando o prazer da minha
confirmação.
— De fato, mas, no seu caso, presumo que não seja isso. A forma
quente como recebeu meu beijo desmente esse seu argumento. — Ele recai
seus olhos para o meu coque e depois para minha roupa. — Quantos anos
está fazendo, afinal, babá McPhee[10], sessenta e nove?
Meus olhos se expandem e sinto vontade de esganar esse homem
prepotente. Meus dedos se erguem, cutucando seu peito repetidas vezes com
ódio.
— Definitivamente, eu não transaria com você, nem que fosse de
graça! — Fecho minha cara e semicerro minha boca. — Nem que fosse o
último pau da Terra, para ficar esclarecido. Sim, eu lhe chamei de velho. Não
acha que está muito maduro para estar vendendo seu corpo, tiozão?!
As portas abertas do elevador, com o segurança parado, olhando para
nós, faz com que eu me cale. Os olhos bisbilhoteiros do guardinha param em
meu dedo, congelado no peito de Ariel, e depois se erguem para minha face.
— Não sabia que tinha alguém lá em cima com você. — Mithi me
olha com mais interesse, segurando a porcaria de um sorriso malicioso.
— Se não tivesse largado seu posto para ir fumar, saberia que tinha
alguém lá em cima comigo. — Lhe dou um olhar de advertência, para que ele
mantenha sua boca fechada. — Bom, de qualquer forma já estou de saída,
tenha um bom trabalho, Mithi. — Saio do elevador o mais rápido que posso,
encarando o homem arrogante. — Quanto a você, desejo que volte para o
lugar de onde veio, velhote!
Não dou tempo de resposta para nenhum dos dois, batendo em
retirada, rumo à saída do prédio. Respiro aliviada quando passo pelas portas
giratórias. Troco minha bolsa de braço, caminhando apressada na calçada.
— Babá McPhee! — resmungo com raiva. Meus olhos param em
minha imagem refletida no grande vidro do prédio, me fazendo me sentir
desgostosa.
Está certo que não sou nenhuma modelo sensual da Victoria's
Secret[11], mas também não me pareço com uma babá velha, rabugenta e
repleta de verrugas. Prendo meu olhar no coque alto, todo torto, o soltando e
desfazendo a bagunça dos meus cabelos com meus dedos.
— Idiota...
Paro na esquina, esperando o sinal abrir para que eu possa atravessar a
rua.
— Presumo que não é muito de relaxar. — Me assusto com a voz
baixa de Ariel, que está parado ao meu lado.
— Oh, meu Deus, por que está me seguindo?
— Não estou te seguindo, estamos indo para o mesmo lado. — Ele
passa seus olhos pelos meus cabelos, me pegando de surpresa quando sua
mão se ergue, afastando os fios soltos do meu rosto.
— Assim está bem melhor, McPhee. — Seu sorriso aumenta quando
estapeio sua mão, o fazendo se afastar de mim.
— Seu grande cretino arrogante!
Me afasto dele e atravesso a rua a passos duros quando o sinal de
pedestre fica verde.
— Por que tem que ser tão desagradável?
— A única pessoa desagradável aqui é você. E, além de detestável,
ainda por cima é um psicopata que está me seguindo — rosno com raiva,
desejando estar um inferno longe dele.
— Por mais que me doa ferir seu ego, minha cara McPhee, realmente
não estou te seguindo. — O encaro por cima do meu ombro, cerrando meus
olhos.
— Vou enfiar essa bolsa na sua cara se me chamar de McPhee outra
vez!
— Não lhe chamo mais de McPhee se você me contar porque se veste
como uma velha de sessenta anos e é rabugenta como tal.
— Minhas roupas não são da sua conta, e eu não sou rabugenta.
Apenas quero ficar longe de você. — Respiro aliviada quando vejo o hotel ao
longe, sabendo que estarei a pouco passos de finalmente me livrar dessa
criatura impertinente. — Olha, está me seguindo porque quer dinheiro, se for
isso, é só me falar e eu te pago, e assim eu nunca mais tenho que olhar para
você.
— Me diz como deve ser sua vida, ou melhor, deixa eu adivinhar —
Ariel fala, divertido, acompanhando o ritmo dos meus passos. — Se
divorciou por conta da amargura desse seu coraçãozinho frio e acabou se
vendo abandonada dentro de um apartamento cheio de gatos, trabalhando até
tarde como secretária. Adora assistir filme pornô às escondidas, mas não
pratica sexo há muito tempo e se masturba toda noite. É socialmente
deslocada e raramente se diverte ou relaxa. Era o Patinho Feio na
adolescência, que se habituou com as roupas bregas de segunda mão, de
alguma seção de liquidação de supermercado. — Fecho meus olhos, sentindo
o ódio me tomar por esse homem arrogante. — Me diga, seu marido lhe
deixou por que não conseguia mais lidar com sua amargura e sua limitação
sexual?
Giro abruptamente, o pegando distraído e acertando minha bolsa com
força em sua cabeça. Deus! Eu nunca tinha agredido alguém na minha vida,
mas esse homem parece ter o dom para desencadear a agressividade dentro de
mim.
— Sou alérgica a gatos, Sherlock Holmes[12]. — Minha voz zangada
sai baixa, enquanto o estapeio outra vez com a bolsa. — E, se quer saber, lhe
bater com essa bolsa me deixou extremamente relaxada.
Seus olhos têm um lampejo de ira rapidamente, enquanto ele deixa
sua face carrancuda. O largo para trás e caminho rumo ao hotel, não me
dando o desprazer de olhar para a direção dele outra vez.
Capítulo 05
Nada angelical
Cristina Self

— Nenhum quarto? — insisto para a moça, olhando-a com


melancolia.
— Infelizmente, não. — Ela nega com a cabeça. — Estamos com
todos os quartos lotados. Está tendo uma conferência de medicina na cidade,
como estamos mais perto do salão de reuniões, grande parte dos médicos
vieram para cá.
— Não quer olhar mais uma vez, talvez possa ter alguma coisa. É
apenas para eu passar a noite, não quero uma suíte nem nada. Aceito até o
cantinho onde guardam as vassouras...
— O último quarto foi locado hoje, no começo da noite.
Suspiro com desânimo, balançando minha cabeça em confirmação.
Me viro, olhando o hall do hotel, pensando seriamente em passar a noite
sentada no sofá que tem perto da porta. Eu realmente não pretendo ir para
casa agora, seria capaz de gastar meu réu primário[13] enforcando minha mãe
com minhas próprias mãos por conta do maldito presente que ela me deu esse
ano.
— O bar do hotel ainda está aberto? — pergunto para a recepcionista.
— Está sim, senhorita. Pode seguir à direita.
Chateada, sem um pingo de vontade de ir para casa, me arrasto na
direção do bar do hotel, para afogar minha frustação em um reconfortante
copo de bebida. Solto minha bolsa sobre o balcão, tamborilando meus dedos
com preguiça na madeira, aguardando o barman vir me atender.
— Olá, boa noite. Em que posso lhe ser útil?
— Vodca — murmuro triste para ele, que balança sua cabeça
positivamente, me dando um sorriso amigável.
Não faço muita cerimônia quando ele entrega o copo para mim,
enchendo-o. Seguro-o em meus dedos, o ergo para minha boca e aponto para
a garrafa, para ele saber que é para deixá-la sobre o balcão. Sinto a bebida
queimar ao descer por minha garganta, mas isso não me impede de virar o
copo de vez, não deixando nenhuma gota dentro dele. Bato o copo no balcão,
segurando a garrafa para enchê-lo outra vez.
— Feliz aniversário, Cristina! — sussurro para mim mesma, levando
o copo aos lábios.
— Aposto cinco pratas, que antes do quarto copo você vai tomar
direto no bico da garrafa. Cafona, amarga e alcoólatra, praticamente a mulher
fatal.
Sou pega por um ataque de tosse, que me faz arregalar os olhos e
abaixar o copo da minha boca. Dou um passo para trás, inclinando meu corpo
para olhar para a ponta do balcão do bar, encarando o grande filho da puta
nada angelical do Ariel, que segura uma garrafa de cerveja e a entorna na
boca. Ele termina de beber e a ergue para mim, esticando seu braço em um
gesto de brinde.
— Oh, meu Deus, você realmente é um psicopata? — Tomo minha
bebida e esfrego minha testa. — O que faz além de vender o seu corpo? Fica
aterrorizando as pessoas por prazer?
— Depende da clientela. — Olho para o lado e o vejo sério, me
encarando. — Mas, nesse momento, eu estou de folga, então não precisa se
preocupar.
— Fico extremamente aliviada — falo com desdém, puxando a
banqueta ao meu lado e sentando-me nela.
Olho para meu copo de bebida e para minha bolsa, encolhendo meus
ombros quando avisto pelo canto dos olhos a chave de um quarto de hotel em
cima do balcão, perto do cotovelo dele. O idiota não estava me seguindo,
realmente estávamos indo para a mesma direção.
— Eu sinto muito por ter lhe batido.
— Não, acho que não sente não. Mas vou fazer de conta que eu
acredito. — Sou obrigada a rir da voz debochada dele.
— Lá no fundo, bem no fundinho, eu realmente lamento por ter
batido... tão pouco em você. — Sua gargalhada alta repercute dentro do salão
do bar, me fazendo olhar para sua face relaxada e observar como um sorriso
fica bonito em seus lábios.
— Nisso acredito — Ariel fala, se levanta, pega sua cerveja e a chave
do quarto e anda na minha direção. — Bom, senhorita vírus, além de
espancar as pessoas na rua com sua bolsa pesada, ter alergia a gatos e estar
comemorando seu aniversário hoje, o que mais esconde?
Ergo meu copo para ele, balançando-o na sua frente.
— Eu me divirto de outra maneira. — Tomo minha vodca e respiro
fundo quando abaixo o copo dos meus lábios. — A bebida me relaxa.
— Bom, creio que ter uma companhia para beber possa ser mais
divertido do que beber sozinha.
Ariel puxa um banco e se senta ao meu lado, pedindo um copo para o
garçom e o enchendo de vodca quando o rapaz o entrega. Logo na sequência
serve meu copo, abaixa a garrafa no balcão e bate seu copo de mansinho no
meu.
— Feliz aniversário, Cristina.

Realmente beber na companhia de um homem como Ariel não faz


mal a ninguém. O que é maléfico à minha saúde é minha libido carente, são
os olhos safiras que brilham em divertimento, as gargalhadas em tom rouco
ao ouvir as loucuras da minha mãe enquanto as conto, o vendo sentado ao
meu lado no banco do bar do hotel.
— Juro, ela não tem um pingo de discernimento. — Ergo meu copo
para meus lábios. Já parei de contar depois da segunda garrafa de vodca.
— Ela parece ser uma mulher divertida. — Ariel vira sua banqueta e
fica de frente para mim, abaixando sua garrafa de cerveja no balcão.
— Na verdade, ela é — suspiro baixo, balançando minha cabeça em
positivo, sorrindo. — Tanto que ela achou divertido mandar você para meu
trabalho.
Ele respira fundo, diminui seu sorriso e confirma com a cabeça. Na
sequência, pega sua bebida em cima do balcão e a toma pouco a pouco.
— Posso te fazer uma pergunta, Cristina?
— Claro que pode. Acabei de te contar sobre minha mãe, pode me
perguntar qualquer coisa... — Seguro meu copo em meus dedos, olhando
para minha bebida.
— Por que sua mãe achou necessário te pagar um garoto de
programa?
Sorrio amargamente, me sentindo duplamente patética por ouvir essa
pergunta saindo da boca dele. Tomo um grande gole da bebida, balançando
meu corpo na banqueta.
— Por favor, não ria, mas ela acha que eu preciso transar. — Rio da
minha própria desgraça, desviando meus olhos para o balcão do bar quando
deixo meu copo em cima dele. — Então me mandou você...
— E presumo que você não quer transar comigo.
— Sim, eu quero! — As palavras são soltas pelos meus lábios antes
que eu possa as segurar dentro da minha boca, por conta dos copos de
bebidas. — Oh, meu Deus, não acredito que falei isso!
Fico sem graça e sinto minhas bochechas queimarem de vergonha, o
que me faz levantar da cadeira cambaleando, olhando para ele com pouca
coragem. Eu tinha me esquecido como era ser assim: natural, espontânea,
falando bobagem sem se preocupar com as pessoas em volta me julgando.
Tento me recompor, pois estou sentindo-me estranha. É como se eu pudesse
ouvir a voz de Renan dentro da minha cabeça me xingando, me condenando,
me humilhando.
— Obrigada por ter bebido comigo — sussurro para Ariel.
Abro minha carteira e jogo uma nota de dinheiro para o barman. Não
fico para esperar o troco. Estou me afastando de Ariel, quase correndo para
fora do bar, rezando para não tropeçar e cair, por conta de tanto álcool que
está no meu corpo.
O que estou pensando... O que passa pela minha cabeça para falar
algo tão despudorado assim?
— Nós dois somos adultos, o que há de errado nisso?
A voz rouca fala firme, me fazendo parar perto da saída, olhando para
o grande homem alto que está de pé, me encarando.
— Ariel... — Minha boca fica seca, pisco rapidamente. Observo o bar
do hotel quase vazio, e arfo, com meu peito acelerado a cada respiração que
puxo pelo nariz. — Eu não sou assim.
Ele me examina por um tempo, antes de seus passos virem em minha
direção, como uma locomotiva desgovernada, tão decidido e certeiro. Talvez
eu devesse ir embora, com toda certeza o correto é me virar e sair daqui. Só
que eu não consigo, estou paralisada, desejando realmente sentir mais dos
seus beijos, me perder nem que seja uma única vez em seus braços. Me
fechei depois da minha separação, me sentindo anulada como mulher,
fisicamente e psicologicamente. Todas as coisas que Renan me falou me
sufocam por todo esse tempo. Não sou como minha mãe, não tenho nada
contra a forma como ela vive a vida dela, acontece que eu não sou o tipo de
mulher que dorme com um cara diferente toda semana. Porém, eu era feliz,
eu amava a vida, amava o contato com as pessoas. Fiquei tão aterrorizada
pelo que passei, pela forma como Renan me condenou e me aplicou seu
castigo, que após nosso divórcio nunca quis estar fisicamente com nenhum
outro homem. Mas esses olhos safiras embargados de magnetismo, tão
sexuais com seu sorriso charmoso, me fazem querer mais. Ariel finaliza o
caminho entre nós e estica seu braço, espalmando sua mão em minhas costas,
me puxando para ele. Sua outra mão se ergue e sinto as pontas dos seus dedos
alisarem meu rosto. Uma carícia roubada, a qual eu entregaria de bom grado
a ele a qualquer momento que me pedisse.
— Me deixe ver como você realmente é, então. — Seu sorriso
charmoso é devasso, tanto quanto seu toque brando em minha pele. — Eu
não lhe parabenizei da forma que você merece. — Sua voz fala perto do meu
ouvido mansamente.
Seu rosto se move, alastrando sua face, e se esfrega em meu cabelo.
Minhas mãos trêmulas param em seu peito, me segurando em sua camisa.
Meu coração descompassado acelera suas batidas, enquanto puxo o ar para
meus pulmões, sentindo minhas pernas ficarem estremecidas.
— Feliz aniversário, pequena vênus. — O beijo quente depositado em
minha bochecha faz uma corrente elétrica se espalhar pelo meu corpo, me
queimando por inteira.
— O-bri-ga-da... — Posso pôr a culpa de estar gaguejando na bebida,
mas sei que isso é uma grande mentira.
O que está me deixando tão débil quanto a moleza que assalta meu
corpo é a aproximação de Ariel. Mas meu ódio por mim mesma desfalece
rapidamente, ao ser substituído por um calor infernal que me abrasa, quando
sua mão em meu rosto desce pela minha garganta, indo para minha nuca.
Nossos rostos estão tão próximos, que sinto sua respiração quente acertar
meus lábios. Meu coração está saindo pela minha boca, de tão disparado que
se encontra. Meu desejo por ser beijada por seus lábios vai aumentando.
Minhas mãos espalmadas prendem sua camisa em meus dedos. Sinto o leve
roçar de sua boca em minha bochecha. Um predador que atiça sua presa a
cair na tentação.
— Me dê um motivo, apenas um único motivo, para que eu não faça o
que realmente nós dois temos vontade, Cristina. — Ariel se afasta e segura
meu rosto em suas mãos, me deixando completamente enfeitiçada em seus
olhos safiras.
Minha mente tenta refutar todos os argumentos que eu possa ter, os
anulando um a um, me deixando à mercê dos desejos do meu corpo. E é por
impulso que ajo, assim que fico na ponta dos meus pés, me alavancando,
colando nossos lábios. E em questão de segundos estou sendo beijada com
tamanha fome despudorada, tão selvagem e urgente.
Capítulo 06
Doce vênus
Cristina Self

Foi só tempo do elevador do hotel abrir, antes de Ariel segurar em


meus dedos e me arrastar para a porta do seu quarto. Assim que ele a abre,
meu corpo já está colado ao seu. O beijo com fervor e sinto suas mãos presas
em minha bunda, me tirando do chão. Circulo minhas coxas em sua cintura,
gemendo a cada raspar da minha calcinha em cima da braguilha da sua
bermuda. Seu pé chuta a porta, a fechando, e ele nos leva para o sofá. Seu
grande corpo se senta, me arrumando em seu colo, com minhas pernas
esparramadas nas laterais das suas pernas, aumentando a pressão do seu
beijo.
Meu cérebro para de funcionar, se negando a raciocinar ou até mesmo
a questionar o fato de eu estar indo mesmo ter uma noite de sexo com um
estranho sexy e devasso. Suas mãos grandes esfregam minhas coxas, as
esmagando com seus dedos, parando na lateral do meu quadril, acelerando a
fricção entre os tecidos das nossas virilhas. Empurro sua cabeça para trás e
meus dedos se prendem em seus cabelos dourados. Mordo seu pescoço e
escorrego minha língua por sua pele, lambendo seu pomo de adão. Os
gemidos roucos que escapam por sua boca, me incentivam a libertar esse meu
lado libertino, o qual vai gostando cada vez mais de estar no controle.
Ariel esfrega meu quadril ao dele, me fazendo sentir seu pau rígido
pulsar dentro da bermuda. Relaxo meu quadril, o soltando e mexendo
lentamente em um tortuoso rebolado, ficando com a calcinha molhada a cada
investida do seu pau acertando minha boceta dolorida e inchada, que implora
por senti-lo por completo dentro de mim. Ariel solta um urro, como o de um
animal feroz, no meu ouvido, achatando mais suas mãos em minha cintura,
forçando meu quadril para baixo. Escorrego minha mão entre nós dois, a
infiltrando por baixo de sua camisa, e sinto sua pele lisa com músculos
firmes. Tão perdido quanto eu nessa chama de prazer urgente que nos
queima, Ariel não precisa de muito esforço para tirar minha camisa, me
deixando apenas de sutiã. Seus olhos recaem para a lingerie vermelha, me
presenteando com um sorriso perverso.
— Babá McPhee. — Suas mãos se espalmam em meus seios, os
comprimindo entre seus dedos. — Como você é devassa com suas lingeries
sexys escondidas por baixo dessas roupas puritanas.
— Seu cretino! — Puxo seus cabelos em meus dedos, beijando sua
boca, mordiscando seu lábio inferior, o sugando de mansinho.
— O que mais você esconde, pequena vênus?
Ariel liberta meus seios do sutiã, o jogando para longe assim que
passa as alças pelos meus braços. Sua mão se ergue, retirando meus óculos,
os deixando em cima do sofá. Ele impulsiona seu corpo para frente, me
fazendo inclinar para trás, com meus dedos entrelaçados atrás da sua nuca.
Meu corpo vibra com o toque gelado da sua boca quando ela captura um dos
meus seios. Perversamente, ele se diverte, passando sua língua com preguiça
sobre o bico da mama. Minhas mãos se alastram, se embrenhando em seus
cabelos, e os puxo com força, estufando meu peito para frente, lhe dando
total acesso para continuar me desbravando. Ariel morde minha pele na
lateral do meu seio, cravando seus dentes fundo, perfurando a pele,
arrastando suas mãos na lateral da minha coxa, movendo o pano da saia para
cima. Sinto que todo meu corpo está queimando nessa loucura. Viverei esse
momento me deixando ser livre, sem nenhum tipo de restrição ou receio, não
ficarei me controlando por medo dele me achar depravada ou uma vagabunda
qualquer. Se é por esse motivo que ele veio a mim, para me dar muito prazer,
então será isso que pretendo aproveitar dessa noite. Vou arrancar dele até o
último gemido e suspiro. O mais puro e glorioso prazer, o qual eu me neguei
a sentir por tanto tempo, terei hoje.
Ariel arrasta sua bunda, se sentando na ponta do sofá, e deita o meu
corpo por completo no tapete macio. O vejo ficar de pé sobre mim, me
olhando com intensidade, e nunca me senti tão viva com apenas um único
olhar.
— Magnífica, minha doce vênus! — O timbre grosso, quase como um
rosnado sexy, sai dos seus lábios. Ele percorre seus olhos por meus seios nus,
que estão arrepiados, latentes de desejo por seu toque.
Não estou me preocupando com minhas estrias ou celulites, muito
menos com algumas gordurinhas bem localizadas do meu corpo, pois Ariel
faz eu me sentir mulher, uma mulher desejável e viva. Me sinto em chamas
com seus olhos percorrendo meu corpo com tanta fome. Que eu vá me
arrepender, talvez haja alguma chance; que ele esteja aqui agora só por conta
do seu trabalho, eu não sei, só sei que este momento é apenas meu, e me nego
a sentir menos do que eu mereço neste instante. Quero me sentir amada por
esse homem.
Minhas mãos descem despudoradas pelo meu corpo lentamente,
alisando minha pele, e retiro minhas sapatilhas, as jogando para os lados com
meus pés, os usando como apoio para alavancar meu quadril pouco a pouco,
mantendo meus olhos presos aos dele. Mordo meus lábios devagar, não me
importando de ser promíscua. Abaixo minha saia, a retirando do meu corpo,
deixando apenas a minúscula calcinha vermelha à mostra para ele. Vejo o
ritmo do seu peito acelerar, enquanto ele suga forte o ar, dilatando suas
narinas a cada respirada. Engancho meus dedos na lateral do tecido fino
vermelho, alastrando a calcinha tão preguiçosamente, como se nada tivesse
importância além desse singelo ato. A escorrego por minhas pernas,
descendo-a por completo, até ficar completamente nua diante dos seus olhos.
Por essa noite ele será meu delicioso demônio com ar de anjo, que paira sobre
mim, com seus olhos safiras repletos de fome carnal, me consumindo a alma
com a sensualidade que exala dele.
Ariel retira sua camisa sem desviar sua atenção de mim, deixando seu
peitoral em exibição, me deixando ver que estava correta em pensar que por
baixo da roupa e da falsa magreza, os músculos de atleta se escondem. Ele
retira suas botas, as descartando com a mesma rapidez que tirou sua camisa,
silenciando qualquer resquício de dúvida que possa ter em minha mente
assim que abaixa sua bermuda por completo. Ariel é tão onipotente em sua
nudez, não possui vergonha alguma, está totalmente à vontade, com seu pau
ereto para a frente, me fazendo expandir meus olhos e percorrer todo o
comprimento. Mordo o canto da minha boca com mais pressão, observando o
belo espécie de pênis com o qual ele foi agraciado. Ariel pode ter apenas o
nome angelical, sendo um completo demônio sexual irresistível, mas, com
toda certeza, seu pau é divino. Minha língua passa por meus lábios, desejando
que fosse seu pau em minha boca.
Ele se abaixa de forma territorialista, como um predador, em minha
direção. Age como um caçador mortal em busca da sua presa, a qual ele sabe
que não tem escapatória. Sua boca para em minha coxa, depositando beijos
quentes, me torturando com leves mordidas, subindo sem pressa até parar
com sua face em cima da minha boceta. Sinto sua língua lamber o meu sexo
pouco a pouco, e meu corpo vibra em felicidade por sentir ele me sugar em
sua boca, me chupando com desejo, ludibriando meu clitóris entre lambidas
lentas, com círculos certeiros e sucção forte dos seus lábios. Minhas unhas se
cravam no tapete, esparramando minhas coxas para o lado, dando-o acesso
livre para me chupar em pura fome. Ele faz eu soltar um grito de desespero,
que há muito tempo estava preso em meus lábios. Meu corpo ansiava por
isso, por cada toque, calor, pele raspando, transpiração, respiração acelerada e
o coração disparado. Os gemidos escapam dos meus lábios e seguro seus
ombros em euforia, marcando sua pele com minhas unhas. Meu quadril se
move junto à sua boca freneticamente, recebendo um choque que corta meu
corpo. Ariel se afasta, me deixando em loucura por ele ter cortado a onda de
clímax que me atingia. Seu corpo se estica, pairando sobre o meu, me
engaiolando entre seus braços, com suas mãos espalmadas no tapete ao lado
do meu rosto. Seus olhos azuis se fundem com os meus, perversos e quentes.
— Ainda não, minha doce vênus. Quero ver seu lindo rosto quando
seu orgasmo chegar. — A voz rouca sai repleta de luxúria, sorrindo malicioso
para mim.
Seu quadril se encaixa no meio do meu, movendo seu pau na entrada
da minha boceta, se empurrando lentamente, me forçando a receber seu pênis
grosso. Sinto as paredes da minha boceta se expandirem para lhe acomodar,
perdida entre a dor e o prazer de estar sendo preenchida. Minhas mãos
escorregam, segurando em seus braços, cravando minhas unhas em sua pele.
Meu corpo arqueia para cima, afastando o máximo que consigo minhas
coxas, para lhe acomodar entre elas. Nem se estivesse morrendo de dor, iria
lhe mandar parar. Ariel me penetra cada vez mais fundo, se aprofundando
dentro do meu corpo. Nós dois gememos, em um misto de prazer e dor a cada
segundo que nossos corpos se ligam. Ao senti-lo por completo dentro de
mim, perecendo meu corpo por inteiro, com minha boceta o sugando, aperto
as paredes internas em volta dele, me sentindo viva, extasiada e com pura
fome.
— Oh, meu Deus! Eu amo Subway! — sussurro entre os gemidos,
tombando meu rosto para o lado, mordendo seu pulso.
— O que disse? — Ouço a voz dele preocupada, ficando com seu
corpo rígido, sem se mover.
— Esqueça, apenas se mova, por favor. — Meu braço enlaça sua
nuca, puxando seu rosto para perto do meu, aplacando minha agonia e prazer
em seus lábios.
Ariel começa a se movimentar devagar dentro de mim, se retirando
pouco a pouco, voltando na sequência a afundar seu pau dentro da minha
boceta. Nossos gemidos são abafados em meio a beijos de perdição que nos
consomem, tão selvagem quanto nossos corpos se unindo.
— Porraaa! — Ariel quebra o beijo e rosna entre seus dentes, me
penetrando fundo, até ter sua pélvis colada à minha. — Isso é um inferno de
quente...
Ele se retira e retorna seu pau profundamente em uma única estocada.
Minhas pernas se cruzam em sua cintura, o deixando preso a mim. Meus
braços se esticam, levando minha mão para sua bunda, agarrando com força,
o incentivando a me foder duro. Seu quadril se choca com o meu,
aumentando o ritmo das estocadas, não tendo mais nada de lento em seu ato,
apenas a mais pura e necessidade da luxúria. Ariel, em um movimento
rápido, me puxa para cima, prendendo suas mãos em minhas costas,
dobrando suas pernas, me deixando montada em seu colo, com seu pau
dentro de mim, estourando em penetrações brutas.
— Quero que se liberte, minha vênus. — Ariel segura meu cabelo em
sua mão, puxando minha cabeça para trás.
Sua boca trilha um caminho da minha garganta ao meu peito,
deslizando sua língua sobre a pele quente, até seus lábios capturarem meu
seio, o sugando com força, me deixando mais inflamada. Movimento meu
corpo, sentindo por completo seu pau dentro de mim. Meu corpo está em
chamas, e Ariel atiça, para aumentar ainda mais o fogo, que ganha vida,
explodindo em labaredas de luxúria. Relaxo meu quadril, o deixando solto
para lhe cavalgar, e subo e desço freneticamente, o engolindo dentro da
minha boceta, fazendo Ariel gemer alto, assim como eu.
Rebolando e intercalando em cavalgadas, o tomo por inteiro cada vez
mais dentro de mim. Suas mãos espalmadas em minhas costas me abraçam
com força, me prendendo em seus braços. Deixo livre oito anos de pura
frustração, onde perdi minha vida em um casamento miserável por quatro
anos, o qual prendia minha libido, e os anos que passei em abstinência,
aprisionando meus desejos, por medo de ser julgada outra vez, da mesma
forma que Renan fez comigo. Mas, nesse momento, não quero ser mais essa
mulher reprimida, anulada, eu quero ser livre e pecaminosa.
A cada movimento do meu quadril cavalgando no colo de Ariel, o
fodendo com vontade, caio no abismo de euforia que o orgasmo me puxa.
Sinto a energia crescer em meu íntimo, percorrendo cada parte do meu corpo,
queimando em minhas veias. E mesmo sentindo o orgasmo me rasgar de
dentro para fora, eu não paro, não diminuo o ritmo do meu quadril se
chocando com o de Ariel, faço o inverso, aumento a cadência, jogando para
fora minha mente por completo, com tamanha luxúria e força, que o clímax
me pega. Meu corpo o engole, fazendo seu pau se afundar com mais
profundidade dentro da minha boceta, o prendendo dentro de mim, fazendo
nós dois gritarmos juntos com toda a euforia do gozo. Outro clímax vem com
mais força do que o anterior.
Ariel me segura com mais força, me pegando de surpresa quando fica
de pé, com seus braços me segurando firme contra o seu corpo. Sinto seu pau
se enterrar dentro de mim a cada passo que ele move, e apenas tenho
consciência que ele me soltou sobre o colchão, quando ele se afasta de mim,
se retirando de dentro do meu corpo, me girando com rapidez sobre a cama.
Ele esmaga meu quadril em sua mão, empinando meu traseiro para cima. O
colchão se afunda, seu pau me invade sem aviso, me penetrando até ter suas
bolas coladas em minha bunda. Ariel me prende firme, me fodendo
selvagemente em bruscas estocadas, me marcando de todas as maneiras
possíveis para ele, e sinto meu corpo tremer quando outro orgasmo me toma.
Grito em meio aos gemidos, com minha pele colando por causa da
transpiração. Ariel mantém o ritmo descontrolado, me fodendo duro,
ganhando sua libertação, soltando um gemido alto e rouco da sua boca, com
seu corpo trêmulo, gozando forte.
Meu corpo se desmancha sobre o colchão, molengo, suado e
completamente gelatinoso, sem um pingo de lucidez. A respiração pesada de
Ariel se faz próxima ao meu ouvido assim que ele se deita sobre mim, me
puxando para seus braços quando se vira na cama, jogando sua coxa sobre
minhas pernas. Ergo meus olhos para sua face, deixando nossos olhos se
encontrarem. As safiras intensas brilham para mim, entregues à luxúria. Elas
me fazem me entregar por completo a esse demônio nada angelical. Nós dois
dividimos o silencioso momento, apenas ouvindo nossas respirações
descompassadas. Acho que meu erro não foi ter transado com ele, meu erro é
o que estou cometendo agora, me deixando ficar cativa do seu olhar,
enxergando o completo abandono e entrega que refletem em suas safiras
intensas, e isso, de alguma forma, mexe comigo, me assusta. Eu prometi a
mim mesma nunca mais me sentir assim por ninguém, a não dar a chance
para outra pessoa me machucar. Ariel move seu braço, passando-o por baixo
da minha cabeça, se aproximando mais de mim, até minha face se encostar
em seu peito. Sua mão alisa minhas costas e ele deposita um beijo em meu
ombro, roçando seus dentes em minha pele, erguendo sua face outra vez para
mim.
— Inesquecível, minha doce vênus.
Ouço a voz em tom brando sussurrar cálida, de forma íntima,
afagando meu rosto com o seu de forma carinhosa. Meus olhos se fecham,
enquanto tento não perder o controle, e ainda posso observá-lo por um longo
tempo. Quando Ariel adormece, me arrasto para fora da cama de mansinho,
me sentindo confusa e amedrontada. Não tem mais o efeito da bebida, nem a
euforia da luxúria, apenas uma sensação estranha que me aperta tanto a alma
como meu coração. Me esgueiro pelo quarto de hotel como uma ladra
noturna, começando a pegar cada peça de roupa minha caída ao chão e
minhas sapatilhas. Volto meus olhos uma única vez para a cama, observando
Ariel adormecido, completamente belo em sua nudez. Me visto correndo e
abro minha bolsa, olhando as duas notas de cem pratas que estão lá dentro, as
deixando sobre a bermuda dele. Não é muito, eu nem sei quanto ele cobra,
mas é o que eu tenho comigo. Saio do quarto com pura pressa, fechando a
porta bem devagar atrás de mim, carregando uma pontada de tristeza, sem
nem saber o motivo pelo qual ela está me ferindo.
— Estúpida, estúpida, estúpida! — me recrimino enquanto corro para
o elevador, fugindo apressada e envergonhada de dentro do hotel.
Capítulo 07
Férias interrompidas
Cristina Self

Dois meses depois


Inalo o ar com força pela minha boca, soltando pouco a pouco pelas
narinas, e mantenho meus olhos fechados, sentindo o gosto salgado da minha
bílis dentro da minha boca pelo tanto que vomitei. Fecho a tampa da privada,
dando a descarga, e me afasto do vaso sanitário do banheiro. Caminho para a
pia e abro a torneira, enchendo minha mão de água e lavando meu rosto.
Escovo meus dentes, suspirando desanimada, olhando meu reflexo no
espelho do banheiro do meu apartamento. O dia mal começou e já é a terceira
vez que o enjoo matinal me pegou nessa manhã. Abaixo meus olhos para
meu ventre, alisando minha barriga, enxaguando minha boca na pia.
— Vocês dois podiam me dar uma trégua — sussurro, mantendo a
carícia no meu ventre enquanto escovo meus dentes. — Mamãe vai ter que
voltar ao trabalho hoje, bebês.
Depois de secar minhas mãos, caminho para o quarto e pego a roupa
que deixei separada em cima da cama para me trocar. Me visto rapidamente,
parando de frente ao guarda-roupa. Arrumando meus cabelos, opto por um
rabo de cavalo em vez do costumeiro coque alto como penteado. Me olho no
espelho do guarda-roupa, conferindo meu aspecto, e me vejo apertada na
minha saia azul-marinho, que comprime minha cintura. A blusa de lã negra,
com gola alta, disfarça um pouco minha cintura. Calço as sapatilhas,
passando minhas mãos pela saia, garantindo que não esteja torta. Meu corpo
está mudando rápido demais, se adaptando à gestação, percebo isso pelo
volume dos meus seios, que estão aumentando.
Descobri que estou grávida na metade das minhas férias, que foi
interrompida por conta de um desmaio que tive no hall do hotel que estava
hospedada no Havaí. Quando começou o mal-estar repentino, eu não dei
muita bola, achava que era apenas pela mudança de clima ou por estar
sobrecarregada com tanto trabalho e estresse nos últimos tempos. Mantinha
em meu pensamento que apenas precisava descansar e relaxar. Quando o
vômito e os enjoos me pegaram, coloquei a culpa na comida exótica. Minha
menstruação atrasada nunca foi de me deixar preocupada, até porque nunca
fui regrada e sabia que não podia ter filhos. Foi uma surpresa sem tamanho
quando o médico me disse que estava grávida. Não acreditei, entrei em
absoluta negação. Lhe falei que tinha acontecido algum engano, pois eu não
podia ter filhos, que fiz exames que comprovavam que eu era estéril. Mas ele
me mostrou que estava completamente enganada, refazendo todos os meus
exames, comprovando que meus ovários e útero são saudáveis, tanto que eu
estava grávida de um mês.
As férias foram interrompidas imediatamente, me fazendo embarcar
no primeiro voo que achei de volta para casa. Fui direto para o ginecologista
que tinha feito meus exames na época que eu era casada com Renan. O
médico me olhou espantado quando lhe disse que eu não podia ser mãe e não
entendia por que estava grávida. Ele buscou pelo meu histórico em suas
fichas clínicas, e no arquivo de pacientes confirmava que eu nunca tive
qualquer problema de saúde, que quem não podia ter filho não era eu, mas
sim Renan. Eu chorei, me derramei em lágrimas segurando aquele maldito
papel. Renan mentiu para mim, fez eu me sentir uma mulher incompleta por
acreditar que nunca seria mãe, e mesmo me vendo sofrer, Renan manteve sua
mentira.
Mas mal eu sabia que estar grávida seria apenas o começo da virada
de pernas para o ar que minha vida daria. Minha mãe simplesmente me
deixou um recado na caixa de mensagem, avisando que estava no Marrocos.
Estava quase tendo uma crise de desespero, precisava falar com ela, precisava
do maldito cartão da agência de garoto de programa. Quando saí do hotel
aquela madrugada, largando Ariel para trás, apenas corri para a casa dela,
fazendo minhas malas, chamando um táxi e indo direto para o aeroporto. Nós
duas nem chegamos a conversar, minha mente estava confusa. Achei que
quando voltasse de férias estaria mais calma para conversar com ela,
entretanto, minha mãe embarcou para mais uma de suas viagens de loucura, a
qual ela não tem data de retorno. A última viagem que ela fez repentina foi
para África, e ela demorou cinco meses para voltar para casa, se desligando
por completo de telefone e e-mail. Para minha sorte, pelo menos a reforma do
meu apartamento ficou pronta na data estipulada. Tentava assimilar tudo que
estava acontecendo, as consequências de uma noite fora de série,
impulsionada por duas garrafas de vodca, com um garoto de programa
terrivelmente sexy, sem proteção alguma.
Na última consulta de pré-natal que fui, com uma obstetra
recomendada pelo ginecologista, eu realmente fiquei sem conseguir falar nem
uma palavra sequer. Na ultrassonografia, que me deixava ver e ouvir o meu
filho que está dentro de mim, me fazendo chorar de emoção, a médica
apontou para o pontinho ao lado dele, e eu descobri que tenho dois corações
batendo fortes dentro do meu ventre. Fui de emocionada para desesperada em
questão de segundos, não acreditando que não estou apenas grávida, mas sim
duplamente grávida. São gêmeos! Sem minha mãe para me ajudar a encontrar
Ariel, comecei a procurar pelo nome dele na lista de telefone, até pesquisei
sobre o nome da empresa do cartão na internet, mas nada. Sem rastro algum
que me ajudasse o encontrar, fui até a casa dela. Revirei cada cômodo e
gaveta atrás da porra do cartão, e nada, ele simplesmente sumiu. Não tenho
medo de ser mãe, esse sempre foi meu maior sonho, e mesmo sem ele nem
saber, Ariel me deu o melhor presente de aniversário que eu poderia ganhar
em minha vida. Não sei se ele pensará assim se um dia descobrir que é pai,
mas não me importo como ele agirá, meus filhos se tornaram tudo para mim.
Suspiro, alisando minha barriga, ficando de lado, a olhando no espelho.
Imagino como ficarei daqui alguns meses, com a barriga grande, não
conseguindo esconder de mais ninguém que vou ser mamãe.
— Vou proteger vocês, sempre — sussurro para eles, sorrindo,
pegando minha bolsa no cabideiro e caminhando para fora do quarto.
Nem penso em passar perto da cozinha, pois sei que qualquer coisa
que eu comer agora vai ser vomitado imediatamente. Tranco meu
apartamento e vou para a escadaria, mas ao passar pela portaria, sou parada
pelo porteiro, que sorri para mim.
— Retornando para o serviço hoje, senhorita Self.
Sorrio, confirmando para ele com um balançar de cabeça, parando
perto do seu balcão.
— A mordomia das férias acabaram. — Olho o cesto de envelopes
para ver se tem alguma carta para mim, qualquer sinal de vida da desmiolada
da minha mãe.
— Senhorita Cris, eu sei que é chato tocar nesse assunto — ouço a
voz dele abaixar, enquanto se levanta da cadeira, tamborilando seus dedos no
balcão —, mas a senhorita me pediu para lhe avisar se aquele rapaz voltasse a
aparecer.
O sorriso que tenho em meus lábios morre, sinto um arrepio de medo
percorrer minha nuca, enquanto olho perdida para ele.
— Renan apareceu aqui? — As palavras pesam em meu coração, e
institivamente levo minhas mãos para meu ventre.
— Infelizmente, sim, três vezes só no meu turno. Perguntei para os
outros porteiros e eles confirmaram que ele também esteve aqui. Como
sempre, o rapaz ficou alterado quando falamos que ele não tem permissão de
entrar no edifício.
Deus, por que justo agora esse inferno tinha que voltar? Renan tinha
arrumado outra pessoa, por que ele simplesmente não me deixa em paz?
— Quando foi a última vez que ele veio, Bobe?
— No começo da semana passada, a senhorita tinha saído cedo. —
Bobe me dá um olhar compreensivo, falando calmo para mim. — Quando
voltou, lhe achei com o rosto tão abatido, que não quis lhe deixar mais
preocupada.
Foi na última consulta de pré-natal, quando eu soube dos gêmeos. Me
recordo desse dia, voltei para o apartamento tão desligada, que apenas queria
entrar dentro do apartamento e ficar encolhida na minha cama. Não tenho
como lidar com as loucuras de Renan, não agora. As medidas protetivas não
estão funcionando, ele não se importa de ser preso, porque sabe que seu pai
vai tirá-lo da cadeia. Respiro nervosa, esfregando meu rosto, sentindo meu
coração bater acelerado.
— Obrigada por ter me avisado, Bobe.
Saio do edifício e caminho apreensiva pela calçada, sentindo todas as
emoções me engolirem: o acuamento, o medo, o pavor a cada carro que passa
na rua e os pedestres que andam na calçada. Não acho justo ter que passar por
todo esse terror outra vez, não agora, não quando tenho meus bebês dentro de
mim. Depois de ter colocado toda minha vida em ordem, Renan volta para
me assombrar. Vou ter que conversar com Max, ele me ajudou uma vez,
talvez possa conseguir outra restrição mais rigorosa, algo definitivo, que
mantenha Renan longe de mim. Durante todo o trajeto do meu apartamento
ao ponto de ônibus e até eu chegar na frente do edifício que trabalho, fico me
sentindo apreensiva, como se Renan fosse aparecer a qualquer momento na
minha frente. Olho no relógio do meu pulso, vendo que ainda tenho alguns
minutos, e aproveito para ligar para minha mãe, mas, novamente, a ligação
chama até cair na caixa de mensagens. Droga!
— Mãe, sou eu, sua filha, se recorda?! Não sei mais quantas
mensagens eu lhe deixei nesses últimos dias, mas, por favor, preciso que me
retorne assim que as ouvir. Preciso urgente da senhora, você vai ser vovó...
— Respiro fundo e encerro a ligação. Olho para a rua e volto a encarar o
prédio.
Entro no prédio da empresa e guardo o celular dentro da minha bolsa,
pendurando-a no meu antebraço. Olho para o elevador e repuxo meu nariz,
me sentindo desconfortável, sabendo exatamente a tontura que vou sentir por
conta da gestação, com os solavancos do elevador, quando ele começar a
subir pelos andares. Fecho meus olhos, entro e espero ansiosamente até ele
chegar ao terceiro andar. Assim que as portas são abertas, respiro fundo, abro
meus olhos, e ao sair do elevador vejo uma outra secretária sentada em minha
cadeira. Não era para ela estar aqui. Como eu voltava hoje, o contrato de
serviço temporário dela acabou.
— Graças a Deus você voltou, Cris! — Ouço a voz ansiosa me
chamar, e sou pega pelos braços de Bete, que me espreme com força em um
abraço. — Nunca desejei tanto que suas férias acabassem — ela diz, rindo, se
afastando, soltando um longo suspiro.
Olho perdida para ela, sem entender por que o escritório está
desorganizado, com pastas espalhadas pelas mesas.
— Por que tem uma moça no meu lugar, Bete? E qual o motivo de
tantas pastas espalhadas? — pergunto baixo para ela, desviando meus olhos
da menina que está ao telefone.
— Nem te conto! Perdeu tanta coisa... — Bete olha em volta,
cruzando seus braços. — Esse maldito sócio que chegou assim que você saiu
de férias fez muitas mudanças. Ele disse que seria melhor ter alguém aqui na
recepção, enquanto nós duas ficamos à disposição dele, Pietro e Max. Estou
ficando louca tendo que atender os três... Esse homem é o capeta!
— Por um momento pensei que fui demitida — falo, sentindo alívio.
— Está organizando os documentos?
— Não, ele mexeu no seu computador e viu que metade dos
documentos estavam digitalizados, separados em pastas, na nuvem. Ele me
obrigou a digitalizar o restante e transferir para o computador... Acho que vou
morrer com cãibra em meus dedos.
Olho para ela e arqueio uma sobrancelha, sentindo uma feição pelo
novo sócio, por finalmente conseguir fazer Bete me ajudar com algo dentro
desse escritório. Eu comecei a transferir os arquivos para o computador já
tem um tempo, mas sou uma só, não posso fazer tudo sozinha, pois há casos
imensos, com mais de 300 páginas. Se tivesse que fazer isso sem ajuda,
levaria anos para finalizar.
— Ele não me parece tão diabólico assim, afinal. — Sorrio para a
moça sentada na minha mesa, que acena para mim.
— Não se engane, Cris. Lhe dou três dias para pedir as contas, porque
o homem é um demônio carrasco. Três estagiárias temporárias pediram
demissão, saindo chorando da sala dele depois que foram severamente
repreendidas.
— Cristina, meu bem, está de volta! — A voz de Max me chamando
faz eu me virar, olhando para trás de mim.
O vejo sorrir, fechando os botões do seu terno, caminhando em minha
direção com sua forma galanteadora de sempre. Sou puxada para seus braços,
recebendo um abraço forte de Max. Eu gosto dele, o adoro muito, sempre foi
um homem bom, e foi por conta do meu caminho se cruzar com o seu em
uma audiência no tribunal contra Renan, que o conheci. Estava abalada,
sentada na cadeira perto da saída, por conta da forma distorcida e fria com
que o advogado de Renan me fez passar por uma mulher desequilibrada, que
estava inventando calúnias contra ele apenas para ganhar uma pensão. Cristo,
eu nunca quis nada de Renan, apenas quero que ele fique longe de mim! Max
assistiu à audiência, estava esperando pelo caso que iria representar, que seria
o próximo, e foi empático, conversando comigo e ouvindo meus relatos
quando me perguntou por que eu estava no tribunal. Não foi o advogado que
contratei que conseguiu me ajudar com a medida protetiva, mas sim Max. E
de sua cliente, virei sua funcionária, quando um dia ele me fez a proposta de
trabalho. Ele estaria abrindo a firma de advocacia junto com seu irmão mais
velho, Pietro, que é o oposto de Max, um homem reservado, mas igualmente
educado como seu irmão.
— O que você fez? — Max diz quando se afasta, dando um passo
para trás e levando as mãos aos bolsos da calça, me avaliando intrigado. —
Cortou o cabelo?
— Não, eu não fiz nada, Max — falo, sorrindo, negando com a
cabeça.
— Não! Você fez, sim! — Ele me olha de cima a baixo, retirando
uma das mãos do bolso, coçando seu queixo. — Está diferente, com um
brilho bonito na pele. Me conte o que fez.
Engravidei!
Meu cérebro dispara rápido dentro da minha mente. Em alguns meses
o brilho da minha pele vai choramingar em meus braços, ou melhor, vão...
— Ei, Pietro! — Max ergue a mão, chamando pelo seu irmão. —
Olha só quem voltou de férias! Me diga se ela não está diferente.
Viro e vejo Pietro sair da sua sala. Ele sorri ao me ver, andando para
mim, me dando um sorriso carinhoso, apertando minha mão em
cumprimento.
— Está linda como sempre, Cristina, mas Max tem razão, tem um
brilho diferente em você, meu anjo. — Sua grande mão cobre a minha, e a
outra dá um leve tapinha em meu ombro.
— Deve ter sido o sol do Havaí — falo baixo, lhe dando um sorriso
amarelo, encolhendo meus ombros.
— Senhorita Carlon, pode vir até minha sala?!
A voz alta e severa chamando por Bete ganha minha curiosidade, o
que me faz olhar para a porta da sala ao lado da de Max e Pietro, e então a
porta é aberta abruptamente.
— Miller, quero que conheça minha pequena joia. — Max gira seu
corpo, ficando na minha frente, bloqueando minha visão.
Ouço os passos pesados andando até nós, o que me faz esticar minha
perna, dando um passo para o lado, saindo de trás de Max, deixando um
sorriso profissional estampado em meu rosto para dar as boas-vindas ao novo
sócio. Naquela noite, a única memória que fiquei dele foi do seu perfume
enjoativo, quando as portas do elevador foram abertas.
— Querida, este é Miller. Ariel Miller chegou há dois meses de Nova
York para assumir o cargo de novo sócio da empresa. — A voz animada de
Max fala, mas a única coisa que sinto são minhas pernas ficando bambas.
— Ariel e eu nos formamos juntos em Direito, em Nova York. —
Pietro sorri, piscando para mim. — Conheça o melhor criminalista de nossa
época. — Pietro segura meu ombro, deixando sua mão lá. — Se não se
importar, fizemos algumas mudanças enquanto estava de férias, Cris, e achei
correto designar você para ser a secretária dele, assim Ariel para de ficar
aterrorizando as pobres estagiárias da agência de emprego.
Não preciso nem dizer que meus joelhos fraquejam e que tenho
grandes chances de desabar no chão, no meio do escritório. Meu coração bate
descarrilhado e uma tontura me pega, me fazendo ficar com as mãos suadas e
trêmulas, encarando o homem sério, trajado em seu terno negro, com as
safiras presas em minha face. Ariel não esboça nenhuma reação ao me ver,
simplesmente está parado, com suas mãos nos bolsos, não parecendo nem um
pouco com aquele homem casual com roupa despojada que entrou nesse
escritório dois meses atrás.
— Acho que não entendi...
— Dentro do envelope tem todas as diretrizes sobre o que vai
precisar saber. Apenas esteja aqui na segunda-feira, às oito, sim? — Aceno
para ele, que olha da minha face para o envelope, ficando perdido.
— Deus... — A palavra sai tão baixa da minha boca, que apenas
balbucio, medrosa, compreendendo o que aconteceu naquela noite.
— Seja bem-vinda, senhorita Self. — Sua voz é rude, salientando seu
ar tirano, me olhando zangado. — Se já terminaram a confraternização,
gostaria de voltar ao trabalho, tenho que ir ao tribunal ainda hoje — ele fala e
se vira, voltando para sua sala, batendo a porta atrás de si.
Me sinto horrível ao ver a forma como ele me tratou, seu olhar
acusador me condenando com a voz rude. Meu Deus! Eu transei com esse
homem, sem pudor algum, tanto que estou com a consequência dessa noite
dentro de mim, mas se já era desesperador ter passado todos esses dias
procurando por ele, agora, nesse momento, eu desejo nunca ter o
reencontrado.
— Não se preocupe, meu bem — Pietro fala calmo, batendo em meu
ombro. — Ariel parece um diabo quando está focado em seus casos, porém,
por trás da sua cara rabugenta, ele é um bom homem.
Max me dá outro beijo na testa e sai andando, conversando com
Pietro, dispersos do frangalho que eu me encontro. Deus! Esfrego meu rosto,
respirando fundo. Ariel não era um garoto de programa. Eu dormi com a
porcaria do novo sócio da firma! Eu estou grávida de um dos advogados.
Merda!
— Você não me disse que o novo sócio era um rapaz jovem, saído da
faculdade? — pergunto para Bete, me sentindo sem ar.
— Oh, eu me confundi, devo ter ouvido errado. Quando Pietro me
falou, eu estava no telefone — ela fala rápido, dando de ombros. — A
verdade é que o doutor Miller fez faculdade com Pietro, não estava se
formando recentemente, ele é apenas dois anos mais novo que Pietro, tem
trinta e sete anos. Já é um veterano nos tribunais.
— Oh, meu Deus!
Bete olha para a porta fechada, balançando a cabeça em negativo.
— Ele aceitou a proposta de associado e veio trabalhar na Califórnia,
e você nem imagina quem está tentando pescar esse demônio — Bete
sussurra, abrindo um sorriso, tão preocupada em fazer a fofoca, que não
percebe que estou tendo um surto de medo. — Malvina já está com as garras
nele. Ouvi dizer que eles estão transando, sabia? Aquela advogada vadia do
setor trabalhista não perde tempo. Como não conseguiu fisgar Max e muito
menos Pietro, ela atacou o novo sócio.
— Eu... eu preciso ir ao banheiro. — Viro para trás, girando em meus
calcanhares, praticamente correndo rumo à porta do toalete dos funcionários.
Me escondo dentro de um dos lavabos, o trancando, respirando
descompassada, sentindo minhas pernas sem força alguma. Cristo, eu sofri o
pão que o diabo amassou nos primeiros dias, quando vim trabalhar aqui na
empresa, pois grande parte dos funcionários achavam que eu apenas consegui
o serviço porque estava transando com Max. Dei duro, me esforçando todo
dia dentro dessa empresa, para mostrar que se estava aqui, é porque tenho
competência em realizar meu serviço, e não porque fazia troca de favores
sexuais. Todo o falatório vai começar em dobro quando minha barriga
começar a crescer e eles souberem que o pai dos meus bebês é o novo
advogado criminalista.
— Oh, meu Deus, ficou sabendo da novidade? — Ouço a risada de
uma das meninas do almoxarifado, que entra no banheiro. — Designaram a
estranha quatro olhos para ficar como secretária do bonitão de Nova York.
Olho para a porta fechada, ouvindo os risos aumentarem, entendendo
que é de mim que elas estão falando.
— Cristo, aquela mulher é uma geladeira fria! Coitado dele por ter
que passar o dia todo olhando para as roupas cafonas dela!
Abro a porta do banheiro e saio de dentro do lavabo, não direcionando
meu olhar para elas. Apenas caminho até a pia, lavo minhas mãos e jogo uma
água refrescante em meu rosto, usando o papel toalha para me secar. O
descarto no cesto de lixo, abro minha bolsa, retiro meus óculos de lá e levo à
minha face. Me viro, olho para elas rapidamente e saio do banheiro. Antes
mesmo de sair do corredor, meus passos param ao ser confrontada pelo olhar
de aço de Ariel, que se mantém sério, me encarando com sua face fechada.
Capítulo 08
Do céu ao inferno
Ariel Miller

— Terei que sair à sua procura toda vez que precisar dos seus
trabalhos, senhorita Self?
Minha voz sai firme, enquanto meus olhos se mantêm presos em sua
face pequena. Tento não inalar o aroma do seu perfume, que invade meu
nariz, me fazendo ter memórias dos sons suaves que escaparam dos seus
lábios enquanto ela queimava em meus braços. Quero poder afirmar para
mim mesmo que não reconheci sua voz no momento que ouvi ela
conversando com a outra secretária, que meu coração não errou uma batida e
que muito menos fiquei ansioso, como um maldito novato que acaba de
reencontrar sua garota. Não foi para esse propósito que aceitei vir trabalhar
na Califórnia, quando Pietro me convidou, eu apenas almejei novo ares,
largar as velhas lembranças dolorosas que estavam me consumindo em Nova
York. A morte de Dolly, minha pequena filha de dois anos, tinha devastado
minha vida, e por quatro anos depois da sua perda eu me mantive focado
apenas no trabalho, despejando toda minha concentração nos julgamentos e
nos meus clientes. Tinha cometido um erro quando me casei com Silvia, no
fundo sabia que ela apenas ambicionava uma vida luxuosa, o status, o
glamour. Seu grande amor era a boa vida que eu lhe proporcionava, não eu,
muito menos nossa filha. Eu amava minha filha, ela era a minha conquista
mais preciosa. Me recordo do seu sorriso em sua face carinhosa na última vez
que a vi, quando parti daquela casa.
— Ei, minha princesa, papai tem que ir. — Beijo seu pescoço apenas
para ouvir o som da sua risada gostosa.
Deposito Dolly no berço, alisando seus cabelos, pegando minha bolsa
em cima da cama e caminhando para fora do quarto.
— Quer que eu faça alguma coisa? — Meus olhos pousam na mulher
parada no corredor, com os braços cruzados.
— Arrume um advogado. — Caminho reto, passando a passos duros,
sem olhar para ela. — Minha filha vai ficar comigo.
— Ariel... Ariel, não pode.
Não paro de caminhar, nem me viro para olhar sua face.
— Apenas observe.
— Não pode fazer isso, eu sempre cuidei da minha filha...
— Silvia, que horas ela dorme? Qual é o desenho preferido dela?
Sabe ao menos com qual bichinho de pelúcia ela dorme abraçada? — grito
com raiva, tendo ela alterada, caminhando atrás de mim, me seguindo até a
garagem, puxando minha bolsa com força das minhas mãos.
— Ela fica comigo!
— Você sabe o que ela come no café da manhã? Sabe o nome do
pediatra dela? Por um acaso, tem ele anotado na sua lista de contatos? Você
não sabe nada sobre nossa filha!
— Eu não vou deixar você tirar minha filha de mim, não vou deixar
você a levar para longe. Você acha certo nunca estar presente, trabalhando
toda hora, estando sempre na merda do telefone nos fins de semana, e me
deixando triste o tempo todo?
— Triste? — Cerro meu maxilar com ódio, olhando para sua face. —
Está triste?
— Estou... — ela grita, com a voz chorosa.
— Eu lamento se estava tão triste com a vida de luxo que eu sempre
lhe dei, com toda sua forma frívola, se ludibriando em salão e joias caras.
Lhe deixei tão triste que precisou ir atrás do seu amigo Samuel, da época da
faculdade, apenas para trepar com ele dentro da minha casa! — Puxo minha
bolsa com ódio da sua mão, respirando com força. — Realmente deve ser
muito triste saber que não vai gastar mais nenhum centavo meu, e muito
menos usar minha filha como moeda de troca para continuar se mantendo às
minhas custas.
Entro no carro e bato a porta com força, ligando-o e pisando no
acelerador.
Dois dias depois, em uma noite chuvosa, após Silvia sair de uma festa
na casa de uma amiga, mesmo ela consciente que tinha bebido, decidiu
conduzir o veículo, dispensando o motorista. Ela perdeu a direção do carro e
colidiu contra outro automóvel. Dolly estava adormecida no banco de trás,
deitada ao invés de estar na cadeirinha. Perdi minha filha naquela noite,
restando apenas um buraco imenso em minha alma. Me afundei no trabalho
depois do luto pela perda dela, e por todos esses anos nada mais me fez sorrir
e muito menos me despertou encanto ou curiosidade. Isso até dois meses
atrás, quando me deparei com os grandes olhos de coruja brilhosos, olhando
tão atenta para a tela do computador, distraída da minha presença. Seu modo
atrapalhado me despertou interesse e intriga, e talvez tenha sido por isso que
não desfiz seu engano. Fiquei tão fascinado na atrapalhada senhorita Self,
com suas roupas estranhas para sua idade e gestos nervosos, falando pelos
cotovelos, que aproveitei o breve momento. Suponho que o fato dela não se
parecer com as mulheres ambiciosas que sempre me rodeiam, me fez ficar
intrigado com ela.
Dormir com a moça não foi algo intencional. Não tinha planos de
trepar com alguém quando fiz o check-in[14] no hotel e me direcionei para o
edifício da empresa. Talvez meu primeiro erro não foi ter omitido a verdade
sobre quem eu sou, mas sim ter cedido à tentação de provar seus lábios.
Depois, no hotel, foi algo natural, o que meu instinto implorava para ter, mas
não foi a dor da ressaca por conta do porre que tomamos juntos que me fez
acordar de mau humor, mas sim despertar naquela cama de hotel tendo
apenas a fragrância do seu corpo impregnada no lençol.
E na segunda-feira, quando cheguei para me apresentar ao trabalho,
apenas a cadeira vazia da sua mesa estava, pois havia uma moça diferente,
que saiu do banheiro, e muito tempo depois de Pietro me apresentar a todos
os funcionários, descobri que a pequena vênus estaria ausente pelos próximos
sessenta dias. As lembranças da sua face, do seu sabor, a forma doce como
ela se entregou, tão viva, sem barreiras ou vergonha, me levou à lona. Por
trás daqueles óculos grandes e roupas antiquadas, uma mulher intensa e
lasciva governava seu corpo. E foi com ódio que me vi revivendo cada
momento dela em meus braços dentro da minha mente. Os boatos que
chegaram aos meus ouvidos de forma perversa, se infiltraram dentro de mim
como veneno, e eu percebi a forma carinhosa com que Max falava
constantemente da sua pupila Self. Me senti amargo assim que soube sobre
como a senhorita Self tinha alcançado seu cargo dentro da firma de Direito.
Me controlei, tentando disciplinar minha mente, me negando a ficar pensando
nela, mas aqui estou eu, a farejando como um animal que há muito tempo
ansiava por sua doce presa.
— Eu precisei usar o toalete, e agora estava indo procurar onde será
minha nova mesa de trabalho, doutor Miller. — Sua voz sai baixa, com seus
dedos comprimindo a bolsa em suas mãos, olhando em volta antes de
repousar seus olhos nos meus.
— Me acompanhe, senhorita Self.
Giro, caminhando para minha sala, abrindo minha porta. Ao me virar,
a vejo olhar apreensiva para a sala e depois para a direção do elevador.
— Poderia ser para hoje, temos trabalho a fazer!
O tom da minha voz sai ríspido, não consigo esconder a forma
desorientada que fico com seu retorno. Ela entra de mansinho, balançando
sua cabeça em positivo, olhando a sala brevemente, parando ao centro dela.
Aponto a segunda mesa pequena ao canto da sala, que fica de frente para a
minha, olhando sério para ela.
— Sua mesa é aquela. — Seus olhos se expandem, ficando
arregalados com seu olhar de coruja amedrontado. — Como pode ver, seu
computador estará ligado ao meu, assim não precisará perder tempo com
vírus.
Cruzo meus braços, acompanhando os gestos nervosos dos seus
dedos, que esfregam sua face. Eu poderia dizer que me sinto horrível por ter
finalmente conseguido ela para ficar como minha secretária, mas não me
sinto. Quando dei a ideia que seria mais vantajoso cada advogado ter uma
secretária particular, ao invés de sobrecarregá-las os três juntos, sendo que
cada um trabalha em uma área de Direito diferente, eu já pensava em ter a
senhorita Self para mim. Max saiu na frente, solicitando ela, enquanto Bete
ficaria com Pietro. Odiei todas as estagiárias, sempre reclamava de algo.
Eram sem competência, risonhas demais, desastradas, mas o que me
incomodava é que nenhuma delas era a atrapalhada babá McPhee. Recusei
todas elas. A última estagiária não chegou a ficar nem meio período antes de
pegar sua bolsa e ir embora. Pietro reconsiderou a divisão e designou a
senhorita Self para mim. E agora percebo a armadilha que eu mesmo me fiz.
Estou com ela em minha frente, desejando quebrar o curto espaço que tem
entre nós dois, apenas para sentir outra vez o sabor dos seus beijos e saciar
essa maldita vontade que me corroeu por todos esses dias, desde a noite que
meus olhos se encantaram pela atrapalhada mulher com olhos de coruja.
— Ariel. — Sua voz nervosa é baixa, enquanto olha para a porta
aberta atrás dela. — Sobre aquela noite. Bom, foi um engano. — A encaro,
levando meus dedos para o bolso da calça, para mantê-los longe dela. — Eu
não sou, bom... eu não sou aquilo.
— Atenha-se ao seu lado profissional, senhorita Self! — As palavras
duras saem da minha boca, cortando suas desculpas. Não quero ouvir seus
arrependimentos. — A menos que queira seu dinheiro de volta. — Um
sorriso amargo estampa minha face. — A propósito, confesso que fique
insultado por valer tão pouco no seu ponto de vista.
Ela nega com a cabeça, mordendo seus lábios nervosamente.
— Ariel, preciso lhe contar...
Dou um passo à frente de forma pesada, respirando com força,
cerrando meu maxilar, parando à sua frente.
— Limite-se ao seu trabalho! — falo frio, com firmeza, com um tom
de voz alto, para ela parar com o assunto.
Minha mão sai do bolso da calça e se ergue abruptamente, com força,
rumo a ela, apontando na direção da sua mesa, mas congelo no ar meu braço
quando vejo seu corpo se encolher à minha frente, como se fosse se afundar
ao chão. Seus olhos assustados estão presos em minha mão aberta, estagnada
no ar, e seu peito sobe e desce rapidamente. Dou um passo para trás, me
distanciando dela, balançando minha cabeça em negativo, com a forma
petrificada que ela ficou apenas por um gesto abrupto da minha parte.
— Não precisa dar uma de vítima, Cristina — digo com raiva,
passando as mãos nos cabelos, a encarando. — Se toda vez que eu gritar
dentro dessa sala, você ficar assim, estarei perdido, com uma secretária inútil.
— Respiro fundo e pego minha maleta sobre minha mesa. — Foi um
inesquecível engano, como você bem sabe. Digamos que adorei o presente de
boas-vindas da empresa. Só que agora acabou, quero que faça um favor a nós
dois e deixe esta história para lá. — Aponto para a mesa dela, olhando a hora
no relógio que está meu pulso. — Preciso estar no fórum, volto ao fim da
tarde. Aconselho que vá se sentar e faça seu trabalho, senhorita Self. Pelo
tanto de elogios que ganhou, creio que não precisa da minha presença para
direcioná-la ao que fazer.
Abandono a sala, precisando achar meu controle outra vez. Não
imaginei que reencontrar essa mulher me deixaria tão desestabilizado.
Repuxo o nó da minha gravata, aliviando um pouco o aperto sobre o
colarinho do meu pescoço, caminhando a passos duros para o elevador.
Aperto o botão para ele subir no meu andar, e assim que as portas são abertas,
me encaminho para dentro, respirando profundamente, fechando meus olhos.
— Quase perdi ele. — A voz ansiosa de Max é alta. Ele ri, entrando
no elevador.
Abro minhas pálpebras e observo Maximiliano olhar atentamente para
seu aparelho de celular.
— Se perdesse o elevador, tinha grandes chances de chegar ao fórum
da família atrasado. Pietro me contou que você está com um caso grande. —
Ele ergue seus olhos para mim, enquanto balanço a cabeça, confirmando.
— Caso Brat.
— Acho que vi alguma coisa sobre isso. Foi corajoso em pegar esse
caso, ouvi boatos na comarca que há bastante provas contra o sr. Brat, o
deixando como principal suspeito da morte da esposa e do amante dela.
— Até que se prove o contrário, meu cliente é inocente — falo calmo.
Sei que será fácil retirar a acusação do Estado de cima do meu cliente.
— Bom, eu esbarrei na advogada da tia do enteado dele, a guarda do
adolescente vai ficar com o Estado até que o caso finalize.
— Estava pensando em encaminhar essa parte do caso para você, não
trabalho com a área da família — falo sereno, olhando sério para ele.
— Realmente não sei se é um caso que eu quero me intrometer. Por
mais que seja bom para chamar a atenção dos repórteres que estão cobrindo
esse caso para nossa firma, ainda assim repasso educadamente. — Ele respira
fundo, me dando um olhar atento, fechando seu semblante. — Optei pela
carreira de Direito para fazer a diferença, ser um profissional honrado, não
me vejo como um advogado cínico, sem nenhum respeito pela lei.
Troco minha pasta de mãos, levando a outra mão ao bolso do terno,
compreendendo o comentário mordaz.
— Devo presumir que esse segundo tipo de advogado sou eu. — Rio,
sarcástico, respirando calmo. — Eu respeito a lei, apenas não a venero, não
me sinto oprimido por ela. Se o estado da Califórnia não puder arcar com um
bônus culpado, e eu livrar meu cliente, a culpa não é minha, e sim da
promotoria, com seus profissionais honrados e incompetentes. Argumento
que gostei do seu ponto de vista, Max... — Retiro a mão do bolso, olhando
para a tela do meu celular. — Mas, da próxima vez que desejar falar sobre as
índoles profissionais, sugiro marcarmos um almoço.
Ele fecha mais ainda sua face, cerrando seu maxilar, me olhando
acusadoramente.
— Como consegue dormir à noite, Miller? Apenas me tire essa
curiosidade. Como se sente sendo um advogado renomado, com grandes
casos, um dos mais caros atualmente? — Ele balança a cabeça em negativo,
rangendo entre seus dentes. — Como se sente sabendo que todas as pessoas
que você representa são culpadas?
— Simples, eu não ligo. E você mesmo respondeu sua pergunta.
Como disse, eu sou caro. Inocentes não têm como me pagar.
Finalizo a conversa e volto minha atenção para as portas do elevador,
quando elas se abrem.
Eu poderia ter optado por exercer minha profissão na área cível, da
família, até mesmo trabalhista, mas havia um certo magnetismo na
criminalista, esse é meu habitat natural: refutar, desmoronar como um castelo
de cartas cada argumento contra meus clientes, olhar para os jurados e os
fisgar em minha rede, em cada palavra, as quais sei usar bem ao meu favor,
invertendo o pior réu em vítima aos olhos do júri. Esse é meu mundo, meu
jogo, meu tabuleiro de xadrez, o qual sempre termina comigo dando xeque-
mate e meu cliente saindo inocentado. E o caso Brat não foge à regra. A
promotoria pode ter muitas provas, mas todas são vagas, sem estruturas para
se manterem. Eles alegam que Brat assassinou a sangue frio a esposa e seu
amante, mas há muitas controvérsias. Nenhuma câmara da residência
comprova a entrada dele dentro da casa, muito menos acharam a arma do
crime, e não há uma única testemunha. Consegui seu habeas corpus[15] com
uma fiança estipulada em cem mil dólares, a qual ele pagou imediatamente.
Um homem íntegro diante da sociedade, com uma grande fortuna avaliada
em mais de dois bilhões de dólares.
Respiro fundo enquanto ando pelo hall do edifício, sabendo que Max
está caminhando ao meu lado, com seus olhos presos na porta. Dou uma
olhada de lado para ele, ainda sem compreender o que ele quer. Nossa
amistosa conversa no elevador, pelo visto, não foi o suficiente. Não que eu
não tivesse boa convivência profissional com Maximiliano, mas minha
amizade é com Pietro. Raramente troco algumas palavras com Max, nossas
ideias não são compatíveis. Max é um idealista que ainda acredita na bondade
humana, e sei que ele condena minha forma de trabalhar.
— Quer me dizer alguma coisa, Max? Ou apenas está emocionado
com nosso momento dentro do elevador?
— Na verdade, eu quero. — Max para na saída do edifício, gira seu
rosto para mim e abre a porta, apontando para fora.
Caminho a passos lentos para a calçada, me virando com calma,
confrontando seu olhar, me sentindo enfadonho com sua fala maçante.
— Como meu irmão falou, Self foi designada para ser sua secretária.
Confesso que preferia ela sendo minha secretária, pois trabalhamos bem
juntos.
Ouço a voz de Max e o encaro sério, travando meu maxilar a cada
palavra que sai dos seus lábios.
— Compreendo. Me parou na saída do prédio para reivindicar sua
pupila?
— Poderia não ser sempre tão cínico, Ariel — ele fala com a voz
contrariada. Na sequência, esfrega seu rosto e respira fundo. — Não estou
aqui para pedir que troque de secretária comigo. Até acho que vai ser bom
para vocês dois trabalharem juntos, principalmente para Self. Ela é uma
pessoa esforçada, o que ela não souber, ela vai dar um jeito de aprender, para
poder ser útil para você...
— Mas? — o indago, querendo saber onde ele quer chegar com essa
conversa.
— Apenas não seja um babaca com ela, como foi com as estagiárias,
sim?
Sorrio friamente para ele, retirando a chave do meu carro de dentro do
bolso do terno e olhando para ela, a balançando em meus dedos.
— Noto que se preocupa muito com a senhorita Self. — Arqueio
minhas sobrancelhas, mantendo meu olhar sério quando encaro sua face. —
Algum interesse específico, Maximiliano?
— Cris é uma boa amiga, tenho um carinho especial por ela. Conheço
sua fama carrasca, Miller. Cristina não precisa de um otário egocêntrico a
diminuindo. Pode ter certeza de que eu vou estar com meus olhos em você!
— Uma via de mão dupla, Maximiliano. Lembre-se que também te
conheço. Assim nós dois podemos ficar um de olho no outro. Se me recordo
bem do que seu irmão me contou, sua fama conquistadora ainda continua a
mesma da época da faculdade — falo sério, esmagando a chave em minha
mão. — Se conhece tão bem assim minha fama, como diz, sabe que não
costumo ser complacente com distrações da minha equipe de trabalho.
Me afasto dele e caminho para meu carro, desejando poder ter socado
sua boca. Max ter me parado, apenas para me confrontar dessa forma, só
mostra que os boatos de como a senhorita Self conseguiu esse emprego são
verdadeiros.
Passo o resto do dia dentro dos fóruns e em reuniões com juízes,
trabalhando em cima dos meus casos. Poderia dizer que realmente gosto
dessa burocracia, e não que estou protelando meu tempo, para não ter que
voltar para o escritório e me sentir atraído pelos olhos de coruja da doce
vênus que me virou do avesso, mas eu estaria mentindo, pois tive certeza que
foi exatamente por isso quando retornei ao fim da tarde e me senti agitado ao
olhá-la, a encontrando dentro da sala, arrumando os documentos em cima da
minha mesa. Se eu não tivesse visto com meus próprios olhos suas curvas
suaves, moldadas por sua pele macia, tão quente, que se encaixou tão
perfeitamente em mim, jamais acreditaria que por baixo da saia comprida até
suas canelas e da blusa sem vida, existe uma mulher apaixonante. Ela se vira,
distraída, se assustando quando me vê parado dentro da sala, atrás dela.
— Eu não o ouvi. — Seus dedos vão ao rosto e arruma seus óculos,
endireitando-os sobre seu nariz. Prefiro seus cabelos soltos, moldando sua
face, salientando as covinhas que tem em suas bochechas quando ela ri.
— Como foi seu retorno? — Tento respirar o mínimo que posso, para
não ser traído pelo meu próprio corpo a cada segundo que inalo seu perfume.
— Foi bom, senhor. Consegui ficar a par dos meus novos afazeres,
também gostei de poder rever meus colegas de trabalho.
Sugo as paredes internas da minha bochecha, mordiscando-as com
meus dentes, balançando minha cabeça em confirmação para ela.
— Analisei seu histórico aqui na empresa e achei interessante ter uma
advogada desempenhando a função de secretária — falo sereno, caminhando
para minha mesa, escorando minha bunda nela, olhando para a senhorita Self.
— Está correta essa informação, minha cara colega de profissão?
— Na verdade, em partes, doutor. — Os movimentos dos seus
ombros, os encolhendo, me faz ficar atento em seus braços, que vão para trás
das costas, negando com um movimento de cabeça. — Me formei em Direito,
mas não cheguei a ter meu registro diante da Ordem dos Advogados.
— Reprovou ou apenas se formou e desistiu da carreira? Posso saber
o motivo para ter abdicado de anos de estudos em sua formação acadêmica?
— Para ser franca, não pode. — Sua voz não falha quando ela me
responde rápido, respirando com força.
— Que seja! A única coisa que me importa é que sua formação será
útil para mim. Ter alguém que saiba o que quero é melhor do que ficar me
estressando com as estagiárias temporárias...
— Na verdade, se não abrisse sua boca para despejar todas essas
palavras pomposas do seu vocabulário, elas poderiam entender... — Ouço seu
resmungo, me provocando, o que me faz ter apenas um leve deslumbre da
mulher de língua felina que me encantou.
— Está me recriminando, senhorita Self, por não ter paciência com
jovens acadêmicas? — Me afasto da mesa, dando a volta nela com passos
lentos.
Sento em minha cadeira e olho para minha mesa organizada
cuidadosamente.
— Eu tomei a liberdade de fazer uma agenda dos seus compromissos
da semana, senhor Miller. — Balanço minha cabeça em positivo, olhando
para ela, que ignora minha pergunta.
Seu rosto ficou gravado em minha mente e me assombrou por muitas
noites, me fazendo ver o brilho dos seus olhos negros em cada face que
enxergava. Não me recordo de ter passado por isso em toda minha vida, nem
com Silvia foi assim. Mas a atrapalhada senhorita Self tem, de alguma forma,
se esgueirado para dentro de mim, me fazendo ficar condicionado a ela, me
levando do céu ao inferno em uma única noite.
— O senhor recebeu três ligações de clientes antigos de Nova York,
marquei os recados e deixei à esquerda, no bloco amarelo em cima da sua
mesa. Também agendei novos clientes para semana que vem...
— Como foram suas férias? — pergunto, ansioso, desejando ouvir
qualquer disparate da sua boca atrevida, testando até onde ela se mantém
nesse papel de funcionária exemplar.
Quero enxergar a Cris daquela noite, que me encantou, não essa
forma robótica, que repassa seus afazeres e os meus como se fosse uma
inteligência artificial.
— Como?
— Suas férias, relaxou? — Pego uma caneta sobre a mesa, a rodando
em meus dedos. — Bateu em alguém com sua bolsa estranha e pesada?
Quero ouvir qualquer coisa, um grito, uma risada, algo natural e
espontâneo, qualquer sinal de calor daquela mulher que ela esconde dentro
dela a sete chaves. Seu lábio superior suga o canto do inferior, mordiscando
sua boca lentamente. Seus olhos piscam, com ela desviando-os de mim,
olhando para a janela do escritório, respirando fundo, batendo seus pés no
chão.
— Ariel, eu estou...
— Você voltou, Miller. — O som da voz estridente da mulher parada
na porta da sala silencia as palavras de Self.
Ergo meus olhos para Malvina. Nunca odiei tanto ela como estou
nutrindo esse sentimento agora.
— Passei o dia no fórum, agora a senhorita Self está passando minha
agenda para mim. Gostaria de esperar lá fora até nós dois terminarmos nossa
conversa? — falo sério para a advogada trabalhista do segundo andar, que
está a me infernizar há vários dias.
— Na verdade, já terminamos, senhor — Self fala rápido, quase como
se estivesse aliviada pela intrusão de Malvina.
— Mas eu não. — Olho para Malvina, a deixando compreender que
desejo que ela saia.
Mas, ao invés de sair, ela apenas se mantém na porta, com seus braços
cruzados.
— Precisa de mais alguma coisa, senhor Miller? — Volto meu olhar
para a senhorita Self e a vejo se encaminhar para sua mesa.
— Amanhã terei uma audiência de apresentação de provas, você vai
me acompanhar. — Solto a caneta, falando sério para ela.
— Mas eu sou funcionária interna, não faço serviço de campo. Max
nunca me pediu para acompanhá-lo.
— Como pode ver, não sou Maximiliano.
— Mas não vejo necessidade de precisar de uma secretária nos
tribunais... — Ela se cala, notando pela minha expressão facial que não estou
nem um pouco inclinado a mudar de ideia. — Como desejar... — O som
baixo da voz de Self sai em tom bravo, me dando um pequeno sinal de zanga.
— Já estou no meu horário, posso ir ou deseja mais alguma coisa?
Arqueio minha sobrancelha, lhe dando um sorriso malicioso. Nego
com a cabeça, erguendo minha mão, a dispensando.
— Excelente, isso quer dizer que não preciso ficar lá fora. — Malvina
se desencosta da porta, caminhando pela sala, puxando a cadeira que fica de
frente para minha mesa. — Bom descanso, meu anjo!
Acompanho o andar apressado de Cris para fora da sala, mantendo
seus olhos ao chão.
— Passei três vezes por aqui hoje, para saber se já tinha chegado.
— Estava ocupado, trabalhando — respondo seco, me levantando e
caminhando para a porta da minha sala, segurando a maçaneta dela.
— Imagino, ainda mais agora com esse caso que pegou...
Minha mente se desliga do que Malvina tagarela dentro da sala, me
concentrando apenas na imagem de Cris caminhando para o elevador,
deixando um sorriso largo em sua face se abrir, o mesmo sorriso que eu
desejo ver, mas que não é direcionado a mim, e sim a Max, que se aproxima,
conversando e entrando no elevador junto com ela.
— Vai quebrar desse jeito. — A risada de Malvina me faz virar para
ela, sem entender o que ela fala.
— Desculpe, mas o que disse?
— A maçaneta. Está segurando-a tão forte, que cheguei a ouvir o
estalo do metal, então disse que vai quebrar. — Movo meus olhos para lá,
vendo os nervos dos meus dedos vermelhos pela pressão que faço.
Solto a maçaneta, esfregando minha mão, olhando apenas uma vez na
direção do elevador, onde os dois partiram.
— Estava pensando, o que acha de irmos jantar juntos essa noite?
— Tenho trabalho a fazer, mas agradeço seu convite, Malvina. —
Caminho para minha mesa, me sento na cadeira e olho para o pequeno bloco,
com as anotações que Cristina deixou. — Se recorda sobre aquele boato que
me contou sobre Max e a senhorita Self?
— Oh, aquilo nunca foi comprovado! Max sempre alega que só a vê
como uma irmã caçula. Sabe como são os funcionários, adoram aumentar —
ela fala, rindo, olhando para mim. — Mas, como diz o ditado, onde há
fumaça, há fogo, e Max nunca escondeu a superproteção que tem com ela.
Pelo que me recordo, acho que Cristina foi uma cliente dele... Tem certeza de
que não quer ir jantar?
Nego com a cabeça, repousando meu olhar na cadeira vazia da mesa
ao canto da sala.
Capítulo 09
Gatilhos
Cristina Self

Me sinto tola e humilhada com a forma que Ariel vem me tratando no


decorrer das duas semanas, piorando gradativamente a cada dia que se segue.
Ariel faz de tudo para fazer eu me sentir mal, sendo grosseiro e tirano com
suas demandas e perfeccionismo. Ele faz questão de ser estúpido e
desagradável, e cada vez mais vou desistindo de lhe contar sobre a gravidez.
Mas não é apenas com seu mau humor que tenho que lidar, estou há três dias
sem dormir, sem pregar o olho, me sentindo aterrorizada com o pavor que me
assola.
Começou com dois telefonemas durante o dia, um de manhã, antes de
eu sair para trabalhar; e outro à noite, quando já estava em casa. Ninguém
fala nada, fica apenas a respiração pesada do outro lado da linha, fria e
apavorante, como se ele quisesse me avisar que está se aproximando. Então a
quantidade de telefonemas aumentou. Renan liga constantemente, toda noite,
seja no celular ou no telefone fixo, me aterrorizando apenas com sua
respiração pesada do outro lado da linha. Cheguei ao ponto de desligar todos
os aparelhos e me trancar dentro do meu quarto. À noite, fico olhando para
fora da janela do meu apartamento, escondida pela cortina, tendo a certeza
que ele está em algum lugar me vigiando. Já deixei uma enxurrada de
ligações no celular da minha mãe, comuniquei à polícia, mas eles não me
ajudam, não fazem absolutamente nada, já que o número que me liga está
codificado como desconhecido. Não tenho como provar que é o Renan, mas
eu sei, tenho certeza de que é ele. Não tive nem tempo de conversar com Max
sobre isso, pois ando tão soterrada de trabalho, tendo que andar de um lado
ao outro atrás de Ariel, entre fóruns e audiências.
Antes, raramente eu tinha que sair do escritório, agora, depois que
fiquei designada a ser a secretária particular dele, o acompanho por todos os
lados, o auxiliando em tudo que precisa. É quase como se ele quisesse me
manter longe do escritório quando não está aqui. E quando está, ele consegue
ser terrivelmente egocêntrico, pairando como um gavião ao meu redor,
cuidando para que eu faça meu trabalho, o qual eu nunca deixei de fazer. Em
meio a todo caos que está me pegando, sou obrigada a ficar na sala, olhando
para Malvina, que vem como uma cadela no cio atrás dele. Porém, de tudo
que ele me faz, minha maior raiva se tornou o maldito café. Ariel se nega a
tomar o café do refeitório. Todos os advogados tomam o café da maquininha,
Max vive lá, se entupindo de cafeína, e nunca morreu, mas Ariel não. Ele
simplesmente tem aversão de passar perto da sala de café. Sendo assim, tenho
que ir buscar o café dele e o meu, em uma cafeteria que fica uma quadra
acima do nosso prédio. Subo e desço todos os lances de escada, pois só de
imaginar me aproximar do elevador, já passo mal. Invento todo tipo de
desculpa quando ele se encaminha para o elevador, e já cheguei a dizer que
estou optando pela escadaria porque só assim pratico algum exercício.
Ariel me faz trabalhar como uma escrava, me mantendo sempre
ocupada. Apenas me vejo presa mais e mais em meu segredo. Se ele já me
trata assim apenas porque dormimos juntos, imagina como ficará ao saber
dos bebês? Mas uma coisa eu tenho que admitir: Ariel é um advogado
brilhante, diabolicamente astuto, que manuseia suas palavras, brincando com
os jurados como se fosse uma criança em um dia ensolarado no parque. Ele
tem como causa ganha o caso Brat, e o álibi é que Stano Brat estava em seu
escritório, com sua assistente pessoal, mantendo seu caso secreto, na hora que
sua esposa foi assassinada junto com seu personal trainer[16], o suposto
amante da vítima. Isso deu a Ariel mais uma carta na manga. Suponho que
por conta de toda minha carga emocional e da minha destruidora relação com
Renan, não consigo acreditar em Stano Brat, mas prefiro não expor minha
opinião para Ariel. Fico em silêncio, sentada no segundo andar, na primeira
fileira de bancos ao canto do tribunal, acompanhando a audiência, enquanto o
promotor de justiça conversa com os jurados.
— E quando as provas forem apresentadas e todas as peças estiverem
encaixadas, os senhores concluirão — o homem calvo, franzino e de estatura
mediana diz, caminhando diante da bancada, de uma ponta a outra, sem
desviar os olhos dos jurados — que Stano Brat matou duas pessoas a sangue
frio, calculadamente e com intensão premeditada — o promotor finaliza seu
argumento apontando para o acusado, que está ao lado de Ariel. Seus olhos se
voltam para os jurados, que o encaram complacente. — Obrigado.
Observo as safiras, que brilham em tédio puro na face de Ariel. Vejo
seus dedos, que batem na mesa, cessarem seus movimentos. Ele ergue seu
pulso, verificando o horário em seu relógio. Ariel se levanta de forma
dominante, como o jogador atacante que entra em campo, segurando os
olhares de todos dentro do tribunal. O magnetismo natural que exala dele dá
mais autoconfiança, tão belo quanto brutal. Seus dedos param em frente ao
blazer do terno, o fechando, caminhando para a banca dos jurados.
— Senhoras e senhores do júri, sei que passaram a manhã toda
ouvindo o senhor Black falar. — Ele aponta para o promotor, deixando um
olhar ardiloso em sua face quando retorna sua atenção para os jurados. — Sei
que estão com fome, cansados de estarem há tanto tempo sentados nessas
cadeiras, mas prometo que serei breve no que tenho a lhes dizer.
Ariel sorri manso para eles, ganhando a simpatia dos jurados. As
mãos dele se prendem na grade de madeira, dando leves toques com a ponta
dos seus dedos, ficando sério quando se silencia.
— Serei breve e direto. Eu não aprecio Stano Brat, não creio que seja
um ser humano de boa índole. — Os murmúrios se espalham pelo tribunal
assim que Ariel começa seu discurso. — E realmente não espero que gostem
dele.
A face de Stano Brat está carrancuda, se fechando como uma máscara
de ferro. Meus olhos ficam atentos aos gestos de Ariel, que se vira,
caminhando casualmente, como se divagasse seus pensamentos de forma
natural, e não como alguém que está desmerecendo a credibilidade do seu
cliente diante dos jurados.
— Foi um péssimo cônjuge para suas antigas esposas, as duas que ele
teve antes do terceiro casamento. — O tom de voz rouco aumenta, deixando
todos calados, apenas concentrados em suas palavras. — É uma horrível
influência para seus filhos e seus enteados. Renega suas obrigações com o
Estado, burlando os pagamentos fiscais da sua empresa, usando de manobras
para continuar empurrando seus impostos para debaixo do tapete. E sim, eu
volto a afirmar, eu não gosto nem um pouco dele.
Solto minha bolsa no banco vazio do meu lado, arrastando minha
bunda para a ponta da cadeira, debruçando meus braços no parapeito de
madeira, admirando o diabólico advogado Miller.
— Posso garantir que até o final desse caso, estarão repudiando o
senhor Brat tanto quanto eu. — Seu corpo gira rápido, olhando os jurados,
caminhando em linha reta para eles. — Mas não estamos aqui para fazer
laços fraternos com ele, e sim para julgá-lo. E o fato incontestável desse
julgamento, é que meu cliente estava em outro local quando esses crimes
bárbaros aconteceram.
Suas manobras com as palavras vão desfazendo as faces cansadas dos
jurados. Eles o olham com interesse, não perdendo uma palavra sequer que
sai dos lábios do advogado calculista.
— Nosso promotor não está medindo esforços. Rebuscando,
recorrendo a fatos não pertinentes ao caso. — Ariel respira fundo, erguendo
seu indicador. — Mas da minha parte, vou pedir apenas uma coisa, apenas
uma, meus caros jurados. — Suas mãos voltam a segurar a viga de madeira
próxima à banca do júri, olhando sério para a face de cada um, pouco a
pouco. — Perguntem a si mesmo: não sentir empatia por Stano Blat, por ele
ser um homem baixo, que mantinha relação sexual com outras mulheres, e
por ser portador de grandes falhas de caráter, é aceitável para culpá-lo por
assassinato?
Ele os ganha apenas com um olhar. Ariel tem os jurados na palma da
sua mão, de forma astuta e fria, distorcendo suas próprias palavras para
ganhar a atenção da banca do júri, os cativando em sua argumentação
desmerecida da péssima índole de Stano Blat. Ele dá um passo atrás, levando
as mãos ao bolso, mantendo contato visual com eles.
— Desejo um bom almoço a todos vocês! — Ariel fala firme, se
virando e voltando para sua mesa. Seus olhos se erguem repentinamente,
parando em mim, me flagrando o admirando.
Eu achava que o advogado que o pai de Renan tinha contratado era
cruel, mas ele não passaria de um benfeitor puritano, de porta de igreja, perto
do impiedoso e diabólico Ariel Miller. Abaixo meus olhos, me sentindo
angustiada dentro do tribunal, revivendo em minha mente todas as
lembranças daquele julgamento, no qual fui desmerecida, silenciada, anulada
diante de um monstro que saiu impune pelo mal que me causou. Me afasto do
parapeito, pego minha bolsa, me levanto lentamente e fujo pela porta atrás da
arquibancada superior. Preciso de vinte minutos dentro do banheiro para ficar
apresentável outra vez, depois de ter tido uma crise de choro e vomitado todo
meu café da manhã. Saio do banheiro a passos lentos, respirando fundo,
arrumando meus óculos em minha face, a cabeça abaixada, com a mesma
forma apática e melindrosa que saí há quatro anos atrás de dentro desse
tribunal.
— Achei que teria que chamar o segurança para entrar lá dentro e
saber se estava viva. — Ergo meu rosto e me deparo com o grande homem
parado à minha frente, me olhando sério.
— Eu acabei sujando minha blusa, precisei limpar. — Aliso minha
roupa, escondendo a barra da camisa dentro do cós da saia. — Pensei que
demoraria mais um pouco, por isso demorei no toalete.
As safiras gélidas recaem para minha blusa de lã com desdém,
soltando o ar pelas narinas.
— Tenho certeza que deve ter mais umas trinta desse modelo de mau
gosto, uma para cada dia do mês, dentro do seu guarda-roupa. — Sua voz
mordaz é fria, e ele troca sua maleta de uma mão para a outra. — Venha, a
audiência já terminou, temos que almoçar antes de trabalharmos em cima do
álibi de Brat.
Ele gira seu corpo, me deixando para trás, caminhando a passos
duros. Antes que possa lhe mandar à merda e dizer que minhas camisas não
são de mau gosto, Stano Brat passa por mim como um trator desgovernado,
me empurrando para a parede. Meu braço se esmaga no concreto e a bolsa
desliza dos meus dedos, me fazendo soltar um baixo som de dor. Quando
Ariel se vira, seus olhos passam de mim para seu cliente. Me abaixo para
pegar minha bolsa, esfregando meu ombro, deparando-me com a face
vermelha enraivecida de Ariel encarando Stano.
— Seu filho da puta engomadinho! Que porra foi essa que fez?! — A
voz baixa de Stano, em tom zangado, sai carregada de ira ao confrontar Ariel.
— Eles vão me odiar por culpa sua!
Ariel é ágil. Em segundos engancha sua mão no braço de Stano,
pegando-o de surpresa e puxando-o para a porta de uma das salas abertas.
— Self, entre e feche a porta. — Ariel respira rápido, me ordenando a
ir atrás deles.
Fecho a porta da sala com rapidez, e ao me virar vejo o corpo de
Stano sendo empurrado conta a parede por Ariel. Os dedos dele, presos à
lapela do terno, forçam o homem a ficar contido. Fico com meus olhos
arregalados, sem ação, não sabendo o que fazer.
— Tenha mais respeito ao se dirigir a mim, e respeite a minha
secretária. Não está lidando com suas vadias de rua, Stano! — Ele bate outra
vez o corpo de Stano na parede, fazendo o homem se alarmar, com a voz
rouca carregada de cólera.
Ariel o solta, dá dois passos para trás, passa as mãos em seus cabelos
e endireita as mangas do blazer do seu terno.
— Agora preste atenção nas minhas palavras. Muita atenção, Stano.
— Ariel não quebra seu contato de visão com Stano, apontando para o meio
da cara dele com raiva. — Eu vou dar o meu melhor para que eles odeiem
você, que não suportem olhar para você, porque enquanto estava com seu pau
afundado dentro da boceta larga da sua assistente, seu dedo não estava na
porra do gatilho da arma que matou duas pessoas dentro da sua casa, seu
grande cretino de merda!
Ariel se vira para mim, parando suas safiras em minha face
amedrontada. Sinto meu coração acelerar, bater forte dentro do meu peito.
Atenta à sua face raivosa, vejo-o suavizar suas expressões, respirando fundo.
— Por que simplesmente não me contou seus planos, não conversou
comigo? — O senhor Brat se desencosta da parede, endireitando seu terno,
tendo um sorriso maléfico nos lábios quando compreende a estratégia de
Ariel.
— Porque você não me paga para conversar, e sim para tirar seu rabo
da reta de uma cena de crime. — Ariel se abaixa, pega sua maleta, que ele
havia jogado no chão, a deixa pendurada em uma das mãos e leva a outra ao
bolso. — Agora peça desculpa para minha secretária, pelo seu
comportamento grosseiro, senhor Brat.
Não me atrevo a falar que não precisa de uma retratação, não quando
a voz de Ariel sai mais rouca que o normal, parecendo um rosnado alto de um
lobo alfa. Stano se move nervoso em minha direção, com a respiração
alterada. Me resigno a abaixar meu olhar, segurando firme minha bolsa em
meus dedos, olhando para as pontas do meu sapato.
— Claro, onde estão meus modos... Eu lamento pela grosseria. — A
voz tão falsa como uma cobra, fala de forma branda.
Balanço minha cabeça em positivo para ele, me sentindo sufocada
quando ele se aproxima ainda mais de mim, ao ponto de eu poder sentir o ar
da sua respiração. Não consigo explicar, não consigo ter poder sobre meu
corpo quando ele se aproxima de mim, invadindo meu espaço pessoal,
esticando sua mão. Meu corpo se encolhe de medo, como se eu estivesse
diante de um predador. É a mesma sensação que eu tinha quando Renan se
aproximava de mim, falando com uma voz mansa. Sinto a fisgada em meu
pescoço, a transpiração que aumenta em minhas mãos. O medo me engole, a
dor em minha cabeça é grande, como se fosse explodir. Estar dentro desse
tribunal, e ter esse homem frio e cruel perto de mim, desencadeia lembranças
dolorosas. Sinto as memórias me sufocarem, como se estivesse revivendo
todo o abuso que sofri com Renan.
— Está tudo bem, senhor Brat. — Balanço minha cabeça outra vez
em positivo, me afastando da porta, abrindo-a o mais rápido que posso,
precisando sair de dentro desse cômodo.
E é apenas quando saio para fora do prédio do tribunal de justiça, que
consigo respirar com alívio. Retiro os óculos e esfrego minha face,
intercalando entre respiradas longas pela minha boca e dispersão do ar pelas
narinas, até meu coração desacelerar. Recolo meus óculos e fecho meus
olhos.
— Me dê sua mão! — A voz enérgica me deixa sobressaltada quando
seus dedos puxam minha mão para as suas, fazendo minha respiração voltar a
ficar desregular.
— O que pensa que está fazendo? — Ele gira minha mão, sentindo a
pele suada, logo erguendo seu dedo, esfregando em cima da veia do meu
pulso. — Oh, meus Deus!
Ariel segura minhas costas, espalmando uma de suas mãos abertas
nela, sua outra mão vai para meu rosto, baixando os óculos, como se
estivesse analisando minhas pupilas.
— Oh, céus, dá para parar? Está chamando a atenção das pessoas. —
Tento me afastar de Ariel, mas isso apenas o faz me prender mais, colando
seu corpo ao meu.
— Há quanto tempo está sofrendo com esse transtorno? — Ele
entrega meus óculos para mim e ergue sua mão para meu pescoço, passando
seu dedo na veia que pulsa rápido em minha pele.
— Não tenho transtorno algum, Sherlock Holmes — resmungo brava,
não compreendendo o que ele está fazendo. Levo meus óculos para minha
face, o estapeando quando ele tenta voltar seus dedos curiosos para minha
garganta.
— A transpiração na sua mão, seu batimento cardíaco acelerado, o
sangue que pulsa em sua veia... — ele fala sério, pensativo, olhando para
minha boca. — Seu corpo se retraiu com a aproximação explosiva do senhor
Brat, da mesma forma que se encolheu de medo quando eu me alterei dentro
da minha sala. E você se esquivou do aperto de mão dele agora há pouco, por
medo.
— Para. — Forço meu corpo para trás, apertando minhas mãos em
seu peito, tentando me afastar dele. — Por favor, me solte, doutor Miller.
— O que desencadeou esse transtorno de estresse pós-traumático[17],
Cristina? — Pisco, confusa, sendo esmagada de dentro para fora por seu
olhar penetrante.
— Já pedi para me soltar. Não sofro com transtorno algum... — falo
brava, virando meu rosto para o lado, não suportando ter mais o peso do seu
olhar inquisidor em cima de mim. — E mesmo se sofresse, você seria a
última pessoa a saber os motivos, então me solte, doutor Miller! Não sabia
que a Ordem dos Advogados agora está carecendo de graduação de
psicanálise para seus pomposos doutores.
Seu toque em minha face é brando. Respira profundamente, relaxando
o aperto, apenas me mantendo junto a ele.
— Não seja obtusa, Cristina. Tenho anos de prática como advogado
criminalista, sei ler bem o comportamento humano... — Se cala, ficando em
silêncio por um breve tempo, olhando para meu rosto, repuxando o canto dos
lábios. — Achou que eu iria lhe agredir aquele dia, dentro do meu escritório,
não foi?
— Ariel, por favor... — Minha voz baixa sai envergonhada, não quero
lhe confessar que meu corpo paralisou de medo com o repentino ataque de
fúria dele. — Me solte, por favor.
Ariel tira sua mão das minhas costas, mas ainda posso sentir seu olhar
em cima de mim. Fecho meus olhos, respirando fundo, esfregando minha
nuca para amenizar a dor latente que sinto nela.
— Não procurou ajuda médica? — A voz dele mantém o tom
autoritário, mesmo soando baixa. — Não, óbvio que não procurou. Seu
trauma está ligado ao motivo que a fez desistir da carreira em Direito?
Volto meus olhos aos seus, me odiando por ficar à sua frente como
um livro aberto. Me senti tão humilhada ao ter minha sanidade mental testada
dentro desse tribunal, sendo vista como uma mulher desequilibrada, que não
tive coragem de procurar ajuda médica quando os ataques de estresse pós-
traumático começaram. Minha memória se recordava dos chutes, murros,
gritos, e eu revivia o episódio como se estivesse ocorrendo naquele momento,
com a mesma sensação de dor e sofrimento que senti no brutal dia. E
conforme comecei a reconhecer os gatilhos que me acionam, com o tempo
apenas os evitei. Porém, não posso contar para Ariel sobre como sofro com o
estado medroso e tão frágil que me tornei. Estou andando entre a cruz e a
espada, sem saber qual predador vai me machucar primeiro. Se será Renan
com sua perseguição, ou Ariel quando descobrir sobre a gravidez. Ele pode
ser tão brutal quanto Renan, não me refiro fisicamente, mas tirando meus
filhos de mim. Eu o vi por todos esses dias em ação dentro do tribunal, e o
que seria de mim diante da sua astúcia? Renan já me tirou tanto, me
destruindo de todas as formas, mas Ariel me mataria se arrancasse meus
bebês de mim. Eu passei anos da minha vida me amargurando, me
amaldiçoando por acreditar que eu não poderia ser mãe, e agora que eu tenho
meus tesouros, vou protegê-los com todas as minhas forças.
— Eu estou bem, ok? — Mordo meus lábios, o encarando. Ariel
mantém seu olhar severo, não comprando minha mentira. — Não gosto de
Stano e muito menos confio nele, foi por isso que não apertei a mão dele.
Sinto muito se ofendi o cliente.
— Foda-se o Stano! — Ariel gira seu corpo, caminhando duro pela
calçada. — Caminhe, babá McPhee, não tenho o dia todo para lhe esperar
para o almoço.
Respiro fundo, me sentindo aliviada por esse breve momento,
sabendo que ele está voltando sua mente para o caso Brat.
Relaxo meu corpo na minha cadeira, no escritório de Ariel, enquanto
ele repassa o álibi com a assistente pessoal de Stano Brat.
— Senhorita Violet, confirma que na segunda-feira do dia 02 de julho
de 2021, passou do seu horário de expediente porque estava esperando o
escritório estar vazio para ter relações sexuais com o acusado?
— Sim.
— Então o senhor Stano não é apenas seu patrão, mas também seu
amante?
— Sim, está correto, estamos juntos há um...
— Pare! — A voz rouca de Ariel silencia a mulher sentada à minha
frente, enquanto ele anda de um lado ao outro da sala, com as mãos nas
costas. — Não se engane com o promotor, senhorita Violet, ele não vai ser
brando e muito menos fácil, pelo contrário, irá fazer perguntas ardilosas, que
vão lhe deixar abstraída. O ritmo dele consiste em arrancar muito mais da
senhorita do que apenas seu testemunho. Se obtenha apenas em dizer “não” e
“sim”. — Ariel se vira, a olhando sério. — Compreendeu?
— Sim, senhor Miller, eu entendi...
Ariel arqueia as sobrancelhas, a fazendo se calar com apenas um olhar
de advertência.
— Sim — ela responde baixo, cruzando suas pernas, deixando as
coxas aparecerem.
Fico em silêncio, observando a mulher que alega ser o álibi de Stano.
Alta, esbelta, com os cabelos vermelhos de fogo compridos, unhas bem-feitas
e maquiagem impecável. Entretanto, não sei o motivo de não conseguir vê-la
se deitando com o senhor Brat, não porque ele seja um velho gordo ordinário,
mas sim porque Stano é reservado. Nenhuma das suas amantes anteriores,
que estão nos relatórios, têm o perfil da senhorita Violet.
— Pode confirmar, senhorita Violet, que das 19h30 até as 20h56
estava tendo relações sexuais com o acusado dentro do escritório dele?
— Sim.
— E no decorrer dessas horas, onde comungava a ligação carnal, não
se distanciou do senhor Brat em momento algum?
— Não, não perdi nenhuma das bolas dele de vista! — ela fala, rindo
de forma vulgar, olhando para mim.
— Ele precisou ir ao banheiro?
Demoro um segundo para compreender o que ela falou, enquanto
Ariel mantém o ritmo do interrogatório com a testemunha.
— Uma bola... — sussurro, pensativa.
— O quê? — A moça ri, olhando de mim para Ariel, confusa.
— Self? — Giro meu rosto para Ariel, que caminha e para ao meu
lado.
Me levanto e caminho para a mesa dele, puxando o arquivo perto do
computador, procurando pela informação que tinha levantado. Eu tive que
estudar a vida de Stano Brat, parte por parte, na terça à noite. Ariel investigou
de nota fiscal de banca de jornal até o último fio de cabelo que cai da cabeça
daquele verme do Stano quando se deita para dormir no travesseiro. Acho
minha informação, confirmando meu pensamento.
— Disse bolas, não foi? — Ergo meu rosto, perguntando para Violet.
— No sentido plural.
— Sim, disse.
— Quantos sacos o senhor Brat tem, senhorita Violet? — Caminho
para ela, parando na frente da mulher.
— O que isso tem a ver? Achei que quem me interrogaria seria o
advogado...
— Responda-a! — Ariel fala firme, a encarando. — Está fodendo
com seu patrão há mais de cinco meses, não tem como errar uma pergunta
dessa!
A face dela fica vermelha, e quase posso sentir pena pela forma como
o olhar de gelo de Ariel a incrimina.
— Ele tem dois, como todo homem!
— Senhor Brat sofreu um acidente de bicicleta quando tinha seis
anos, colidiu contra um automóvel. — Solto a pasta aberta sobre minha mesa,
virando meu rosto para Ariel. — Ele perdeu um dos testículos no acidente.
Os médicos removeram o saco escrotal inutilizado, ele tem apenas um.
— Filho da puta!
Ariel entende imediatamente que ela está mentindo. O álibi de Stano
Brat é tão falso quanto ele.
Capítulo 10
Terror noturno
Cristina Self

O som dos rosnados de fúria na outra mesa, próxima à janela, me faz


olhar para o homem bravo, que esmaga uma bola de tênis em sua mão,
enquanto grita no telefone.
— Já lhe disse que não vou levar Violet para testemunhar no tribunal!
— Ariel está quase espumando de raiva, enquanto conversa com Stano. —
Quer saber o motivo? Então vou lhe dizer o porquê, seu cretino de merda!
Sua assistente vadia está mentindo, assim como você, Brat! E vou lhe falar
mais uma vez, sou a única pessoa em quem você pode confiar para livrar seu
rabo da pena máxima! Se não me contar a verdade do que aconteceu aquela
noite, pode procurar outro advogado!
Ariel desliga o telefone com raiva, jogando a bola que tem em seus
dedos na lixeira, a qual ele estava usando como cesto. Ele se arruma de frente
para a tela do computador e pega a caneta em cima da mesa, erguendo seus
olhos para mim. Desvio meu olhar dele na mesma hora, voltando para meus
relatórios. Não precisa ser um gênio para saber que a mentira do álibi da
senhorita Violet desestabilizou o caso. Ariel vai ter que usar outras manobras
e estudar o caso por completo novamente. Eu não disse a ele o que penso, que
dentro de mim tenho quase certeza de que Brat realmente cometeu o
assassinato a sangue frio da esposa e do personal trainer, todavia, no fundo,
desconfio que Ariel saiba disso desde o começo, no segundo que Stano
passou pela porta do escritório solicitando seus serviços. E isso apenas
diminui cada vez mais minha vontade de contar para ele sobre os bebês. Ele
retira o aparelho do gancho e disca rapidamente, cerrando o maxilar.
— Tenho um serviço para você, preciso que venha para a Califórnia!
— Sua voz enérgica é séria. Aperta o aparelho em suas mãos e desliga logo
em seguida.
O som da porta da sala sendo aberta me faz olhar para a face risonha
de Max, que bate lentamente na madeira, me olhando.
— Poderia roubar sua secretária por uma hora, Miller?
Max invade a sala, rindo para mim. Me sinto feliz, pelo menos há um
pouco de compaixão nesse escritório. Finalmente terei tempo para conversar
com Max sobre o que vem acontecendo: as ligações insistentes fora de hora,
o aparecimento de Renan no meu prédio, e se tiver um pouco que seja de
coragem, lhe confidenciar sobre estar grávida. Retiro meus óculos, sorrindo
animada para Max, que desvia seus olhos de mim para o homem carrancudo
sentado na outra mesa. Ariel quebra sua atenção de Max, repousando sua
carranca em mim, e vejo seus dedos se esmagarem em volta da caneta que há
em seus dedos, respirando fundo.
— Creio que terá que ficar para outro momento. — Ele me dá um
balde de água fria no instante que sua boca cretina se abre. O vejo ficar de pé
e estufar seu peito, sorrindo falsamente para mim. — A senhorita Self tem
um compromisso agora — ele diz sem um pingo de compaixão, dando de
ombros.
— Mas agora? — Max olha para seu pulso, negando com a cabeça. —
Está quase no horário do almoço.
— Ela almoçará aqui. Preciso de Self, estou fechando o caso Brat,
estamos a poucos dias da próxima audiência. Ela vai me ajudar a rever alguns
pontos que possam ter ficado em aberto.
— Bom, se é assim, fica para próxima então, meu anjo. — Max me dá
um sorriso triste, piscando para mim. Retribuo seu carinho apenas com um
sorriso amarelo, não disfarçando minha tristeza por não poder conversar com
ele. — Depois nos falamos.
— Claro... — sussurro em resposta, levando meus óculos de volta
para meu rosto.
Volto meu olhar para as porcarias dos documentos, me afundando na
cadeira, ficando chateada. Assim que Max parte, ouço os passos pesados de
Ariel andando rumo à porta, a batendo com força demasiada, tão forte que faz
os quadros da parede balançarem. Fico parada, sem saber o que dizer com o
estranho rompante de agressividade que ele tem. Não consigo evitar o
encolher dos meus ombros. Me sinto amedrontada toda vez que algum
homem se altera próximo a mim, e isso me tira da minha zona de conforto. E
apenas para piorar, como ando com os nervos à flor da pele, só o som da sua
respiração enérgica já é o suficiente para me engatilhar todas as lembranças
ruins do que Renan fez comigo. Permaneço olhando para os documentos,
com minha cabeça abaixada, voltando a digitar os processos pendentes, nos
quais eu trabalhava.
— Me diga, deu o mesmo tratamento para Max, Cristina? — Sua voz
amarga infesta a sala feito veneno, saindo ríspida por seus lábios.
Levanto meu olhar para a face endurecida de Ariel, compreendendo o
que ele está insinuando. Não preciso ser um gênio para saber que os malditos
boatos sobre eu ter dormido com Max já chegaram em seus ouvidos. E como
posso me defender diante do seu olhar acusador, o qual me julga
impiedosamente, se já me condenou como culpada?
— Qual é o meu compromisso urgente, senhor Miller? — pergunto
baixo para ele, tentando não ficar mais nervosa do que já estou, para não
prejudicar meus bebês.
Sua boca se esmaga. Passa seus olhos pela sala e abre um sorriso
gélido em seus lábios.
— Tão prestativa, babá McPhee. — Sua voz zomba de mim de forma
malvada, caminhando para perto da minha mesa. — Responda minha
pergunta.
— Não me chame assim — falo brava, odiando-o com todas as
minhas forças por estar me julgando dessa maneira. — Já separei alguns
documentos sobre o caso Brat, senhor. Está na minha hora de almoço... —
Me levanto, querendo fugir dessa sala, não suportando mais a forma fria que
ele me olha.
Sua mão se fecha com força em meu braço, me assustando quando ele
me puxa, me fazendo ir de encontro a ele. Ergo minha face e encontro seu
olhar frio próximo ao meu rosto, com sua boca esmagada, puxando o ar pelo
nariz, como se fosse um touro bravo que apenas enxerga vermelho à sua
frente.
— Responda a porra da pergunta, Cristina! Trepou com Max igual fez
comigo? — ele rosna perto do meu rosto, espumando de ódio por sua boca.
— Ou manteve essa forma fria e distante, o deixando iludido, sem saber a
verdadeira mulher selvagem que se esconde por trás desses óculos?
— Me acusa como se dormir com você fosse algo premeditado. Do
que o nobríssimo advogado Miller se esquece tão facilmente, é que quem
sabia a verdade aquela noite era você! — Soco com raiva o ombro dele,
querendo que me solte. — Você, seu cretino! Você sabia que eu tinha me
enganado e mesmo assim se divertiu, brincando comigo, manipulando minha
mente como se eu fosse mais uma da sua banca de jurados burros!
— Não seja ingênua, Self. — Sua mão me aperta com o dobro de
força, me fazendo encará-lo. — Em nenhum momento eu afirmei ser um
garoto de programa, todos os pensamentos e certezas foram apenas seus.
— Seu bastardo! Você também não negou, preferiu continuar
brincando comigo, então não ouse abrir essa sua boca arrogante para me fazer
acusações com sua forma desagradável!
— Forma desagradável para mim é ver a porra do Maximiliano
entrando nessa sala feito um cachorrinho, abanando o rabo toda vez que você
olha para ele... — Sua voz escorre veneno por sua boca, me deixando presa
por suas mãos, enquanto destila sua raiva. — Ansioso para ver a mulher
sedutora de lingeries sexys e provocativas que se esconde por baixo dessa
carapuça mórbida em que você se fechou.
— Você não tem o direito de me falar isso! — Tento me afastar dele,
mas isso apenas o faz me puxar para mais perto, prendendo sua outra mão em
minha cintura.
— Não se engane, meu bem, tenho todo o direito. — Ariel é rápido,
soltando meu braço, me mantendo presa pela cintura, arrancando os óculos da
minha face. Ele os joga sobre minha mesa, me empurrando para trás, fazendo
minha bunda ficar esmagada na mesa. — Tenho todo o maldito direito desde
o momento que meu pau se afundou dentro da sua boceta.
— Seu cretino de merda! — Tento o estapear com ódio, mas sinto sua
grande mão soltar o coque dos meus cabelos. — Filho de uma puta
depravado, não tem direito algum de falar assim comigo apenas porque se
meteu no meio das minhas pernas!
— Aqui está! — Ele range seus dentes, me olhando eufórico, com
suas safiras brilhando zangadas. — A pequena vênus, a provocadora de boca
ligeira, é essa mulher que Max conhece? É essa versão que ele vê o rosto se
torcer tão lindamente quando chega ao clímax?
Minha mão estoura em sua face, a deixando vermelha, enquanto meu
corpo todo treme de medo, raiva e ódio, encarando esse homem maldito que
virou minha vida de pernas para o ar. Ariel esfrega seu rosto onde minha mão
o acertou, estou assustada com a explosão agressiva que acabei de ter. Meus
olhos ficam arregalados quando sua mão se prende firme em meus cabelos,
os puxando para trás, mantendo minha cabeça parada.
— Vou tomar esse seu pequeno ato de bravura como um não, doce
vênus. — Sua voz rouca fala raivosa, rosnando com ira. — Max, com toda
certeza, não teve nem um minúsculo vislumbre dela. — Ariel abaixa seu
olhar para minha boca, me deixando ver as safiras ficando claras como um
céu ensolarado. — Não, ele não a viu, muito menos ouviu os gemidos suaves
que escapam dos seus lábios, fazendo o homem que a fode se sentir um
maldito imperador, por ser o responsável pelo prazer que floresce dentro do
seu corpo.
É um bote rápido, como o de um predador selvagem sem piedade, que
o faz massacrar meus lábios com um beijo duro e perverso, cheio de
turbulência. Meus dedos se achatam em seu braço e me seguro no terno dele,
enquanto me pressiona contra a mesa. Sinto meu corpo sendo aceso entre a
raiva e a saudade pelo sabor dos seus lábios colados aos meus. Mesmo de
forma dura e ríspida, obrigando minha boca a se abrir para dar passagem para
sua língua felina, sua mão em minha cintura sobe lenta, afagando minhas
costas, me fazendo ronronar em seus braços, me desfazendo pouco a pouco.
Não existe nada lá fora, nem aqui dentro dessa sala. Não tem mais
Renan, nem os terrores noturnos, apenas a emoção de estar sendo aplacada
por seu beijo devasso e cruel. Noto suas pernas se infiltrando entre as minhas,
afastando minhas coxas, esfregando seu joelho no centro do meu quadril.
Gemo com mais luxúria com o raspar dos tecidos sobre minha boceta. Meus
dedos se desprendem dos seus braços, enlaçando seu pescoço, me deixando
presa a ele. Sinto dor quando seus dentes mordem meu lábio inferior, o
sugando dentro da sua boca. A mão firme arrasta minha saia para cima,
apalpando minha coxa com posse. Ariel solta meus lábios, beija meu queixo
e escorrega sua boca para minha garganta. Fico perdida em um estado
lascivo, no qual ele me consome. Minha cabeça tomba para trás e mordo
minha boca, gemendo baixo assim que seus dedos tocam o tecido da
calcinha, o que o faz soltar um ruído rouco da garganta ao sentir a renda
molhada, o deixando mais dominador. Seguro em seus ombros, navegando
em um mar perigoso, ao qual o grande tubarão me leva, infiltrando seu dedo
dentro da calcinha, inflamando minha boceta apenas com um único toque
escorregadio para dentro dela.
— Ariel... Ohhh!
— Preciso ouvir dos seus lábios, pequena. — Sua face se ergue, me
beijando com luxúria, retirando mais gemidos dos meus lábios com seu beijo
bruto. — Dormiu com Max?
Eu quero abominá-lo, quero me desvencilhar do seu toque e tomar o
controle do meu corpo, mas não consigo, não quando ele me castiga, me
fodendo com seu dedo, o empurrando duro dentro de mim, e ao mesmo
tempo me acalenta com beijos quentes. Fecho meus olhos, cravejando minhas
unhas em seu ombro, choramingando baixo a cada sensação que se desperta
dentro de mim. Nunca foi assim, Renan nunca me tocou dessa maneira tão
possessiva, nenhum homem jamais tinha me tocado dessa forma, silenciando
meus pensamentos. Seu polegar para em cima do meu clitóris, o achatando
enquanto o massageia. Estou sendo empurrada à deriva, a língua quente
marca meu pescoço, pairando sobre a veia da minha garganta com sua boca
se fechando, me chupando com pressão. Ariel introduz outro dedo,
aumentando o ritmo das estocadas.
— Diga-me, Cris. — Ouço sua voz próxima ao meu ouvido trazer
arrepios para meu corpo, mantendo seus dedos perversos me fodendo.
— Não... Oh, Deus, não... — Minha cabeça se inclina para frente,
tombando meu rosto em seu peito. Meus dentes se cravam em sua camisa,
para abafar meus gemidos.
Meu corpo implora por mais, como se reconhecesse cada toque dele,
o cheiro, o calor, me condicionando apenas a Ariel. Poderia lhe confessar
todos os meus temores apenas para que ele não me abandonasse justo agora.
O som das batidas na porta da sua sala nos tira desse momento de loucura no
qual nos encontramos. Ariel grunhe com ódio, retirando os dedos de dentro
do meu corpo, e eu quero chorar, quero segurar seu pulso para que ele não se
afaste. Ele mantém seus olhos aos meus, levando seus dedos para sua boca,
os sugando sem resquício algum de acanhamento. Territorialista, ama o
estado em que me abandonou e a resposta que ouviu. Minhas mãos trêmulas
abaixam minha saia e puxo o ar com força. Sinto meu peito bater acelerado e
me desencosto da mesa com minhas pernas bambas.
— Pode entrar! — Sua voz rouca é brava, com a insistência das
batidas na porta aumentando.
Ariel se vira e caminha silencioso para sua mesa, com sua face
sombria.
— Queria saber se poderia me tirar algumas dúvidas... Cris ainda não
foi almoçar? — Olho para o chão, não tendo coragem de encarar doutor
Pietro, apenas negando com a cabeça. — Estão trabalhando? Não queria
interromper...
— Não, está tudo bem, senhor. Eu estava indo buscar nosso almoço...
— Me viro rápido, pegando minha bolsa pendurada em minha cadeira, não
olhando para nenhum dos dois homens dentro da sala.
Saio da sala feito um furacão, nem olho para trás, apenas caminho
depressa. Vou direto para as escadas, respirando com força quando me
encontro sozinha, longe dos olhos dos outros funcionários. Me encosto na
parede e esfrego meu rosto, sentindo meus lábios inchados e doloridos por
conta da forma bruta como Ariel me beijou. Arrumo minha calcinha e a sinto
melada pela minha boceta. Eu perdi completamente a lucidez. Como me
deixei levar por seu toque outra vez? Se Pietro não tivesse batido naquela
porta, eu teria me entregado outra vez para Ariel, com tanta urgência e
necessidade, que seria até maior do que quando me entreguei na primeira vez
que estive em seus braços.
Ergo meus cabelos, os arrumando no coque outra vez, usando as
pontas dos cabelos para prendê-lo, sentindo minhas pernas fracas. Consigo
me movimentar outra vez, sem perigo que eu desmorone no chão. Tento pôr
meus pensamentos em ordem, não querendo cair nessa armadilha a qual meu
coração está me puxando. Desço as escadas lentamente, querendo poder
correr para meu apartamento e ficar trancada lá dentro. Assim que saio do
prédio, ando até o restaurante da esquina, rezando para que ele não esteja
cheio, para que eu possa ficar o menor tempo possível lá dentro. Ao chegar
lá, para meu prazer, fico grata por não ver tantas pessoas. Faço meu pedido e
fico próxima à janela, o que diminui meu mal-estar, causado pelos cheiros
misturados de comida que invadem o local. Depois de pagar pelo almoço e
pegá-lo, bato em retirada para fora do restaurante, pois o cheiro da comida
está embrulhando meu estômago a cada segundo que passo dentro do local.
Porém, ao passar pelas portas apressadamente, saindo do restaurante, de
cabeça baixa, esbarro em uma pessoa na calçada.
— Oh, eu sinto muito! — me desculpo, trocando as sacolas de mão.
Meu corpo gela, meu coração bate acelerado em puro terror assim que
levanto a cabeça para olhar para o estranho em quem colidi. Fico com as
pernas moles, meus dedos transpiram em pavor ao ver Renan parado, me
olhando em silêncio.
Capítulo 11
Eu também não sei o que fazer comigo
Cristina Self

Fico com a respiração acelerada e um medo puro me domina. A


sensação que tenho é que estou de frente para o mal que havia me destruído,
e que agora voltou para me machucar de novo. Ele sorri para mim, um sorriso
doentio, deixando à mostra seus dentes brancos. É apavorante olhar para a
face que um dia eu já amei tanto e que agora a única coisa que desencadeia
em mim é o mais perverso horror.
— Cris, que saudade estou de você! — Ele tenta se aproximar de
mim, mas dou um passo para trás, sentindo meu suor frio escorrer por minha
testa. Renan para na mesma hora, abaixando seus olhos para meu peito,
sorrindo melancólico. — Eu queria te ver, apenas te ver. Você sumiu, eu não
sabia onde estava, faz tempo que não te vejo.
— Renan, não pode estar aqui. — Sinto meus olhos encherem de
lágrimas, choro de medo e angústia. Olho para ele e fico paralisada quando
sua mão se ergue, alisando minha face. — Por favor, se afasta, sabe que não
pode chegar perto de mim, Renan. Estou atrasada, se me der licença, gostaria
de passar.
As lágrimas escorrem por minha face, que está quente e amedrontada.
A cada segundo que sinto seu toque frio em minha pele, mais paralisada vou
ficando. Seus olhos vazios ficam perdidos, olhando para minha boca, como
se não escutasse as palavras que saem dos meus lábios.
— Renan, eu vou chamar a polícia... — balbucio, com a voz
embargada de choro.
Sua face se fecha em uma máscara fria e recolhe sua mão para o lado
do seu corpo. Me obrigo a me mexer, para me afastar dele, em uma tentativa
de fuga, mas antes de dar um passo que seja, sinto seus dedos em meus
braços, me mantendo presa.
— Espera, me deixa te olhar mais um pouco.
Fecho meus olhos quando ele aproxima sua face, cheirando meu
pescoço.
— Renan, por favor, por favor... — Choro com medo, balançando
minha cabeça em negativo.
Meu corpo se encolhe quando ele volta a erguer sua mão para meu
rosto, alisando minhas bochechas, que estão úmidas pelas lágrimas.
— Você sempre fica tão linda quando chora... — A voz fria dele
sussurra, como se sentisse prazer em ver meu pranto.
Meu Deus, eu quero gritar de medo e nojo, por sentir seu toque outra
vez em mim!
— Por favor, Renan, me deixa ir embora... Para de ficar me ligando,
me deixa ser livre...
— Eu pensei tanto no que iria lhe dizer quando encontrasse você,
Cris. — Ele aumenta a força da sua mão em meu braço, me segurando com
força, não querendo ouvir minhas súplicas. — Cris, eu quero você de volta,
amor. Eu perdi a cabeça, todos perdem a cabeça, me perdoa. Eu ainda te amo,
mais do que tudo. Você é a única mulher que eu quero.
Tento me desvencilhar dele quando seu rosto volta a se enterrar em
meu pescoço, me cheirando. Olho desesperada para os lados, vendo as
pessoas passarem. Todos estão ocupados demais com suas conversas, que
nem notam o meu completo desespero diante desse homem que sente prazer
em me aterrorizar.
— Renan, me larga ou vou gritar por socorro — digo desesperada,
puxando meu braço para que ele solte. — Já nos separamos, Renan. Nossa
história acabou. Acabou, Renan! — Torço meu braço e consigo me livrar do
seu toque frio sobre minha pele.
Saio de perto dele, correndo desesperada o mais rápido que posso,
porém, ao chegar na esquina, antes de atravessar a rua para ir para a outra
calçada, Renan me segura de volta, usando de mais força bruta. Ouço a sua
respiração de raiva, enquanto seus olhos estão brilhando com ódio.
— Por quê? — Ele está com seus olhos semicerrados, com sua boca
comprimida, chacoalhando meus ombros com raiva. — Por que não pode
voltar para mim? Sempre me jurou amor eterno, ou vai me dizer que aquele
amor todo acabou?
— Meu amor por você acabou, porque você me espancou, Renan.
Quebrou duas costelas minhas e deixou meu rosto completamente
machucado. — Estou quase desmaiando, sentindo minhas pernas moles a
cada chacoalhada bruta que ele impulsiona em meu corpo.
— Eu pedi perdão, eu disse que errei. Por que não pode me perdoar?
Por que não quis dar uma chance para o nosso casamento? Você é a culpada
dele ter terminado...
— A única chance que lhe daria seria de me matar se eu tivesse
continuado casada com você. Por favor, me solta — digo, sentindo meu rosto
molhado, chorando, apavorada. — Oh, meu Deus, por favor, me solta...
— Não voltou para mim porque não quis. Deve ter descoberto como é
ser como a sua mãe, não é, Cris? Ser a vagabunda imunda que sempre foi —
ele fala com raiva, ficando mais agressivo a cada segundo.
— Renan, por favor...
— Cristina? — A voz de Max atrás de mim me dá um alívio imediato
quando a ouço.
Renan me solta na mesma hora, olhando para trás de mim com raiva.
Sinto as mãos de Max passarem por meus ombros, parando ao meu lado, e
ele me puxa, me levando para perto dele. Max passa seus braços pela minha
cintura e dou graças a Deus por isso, porque já não sinto mais minhas pernas.
Estou a um passo de desabar no chão, de tão fraca que estou.
— A gente não terminou nossa conversa. — Renan me olha com
nojo, cuspindo no chão. — Faça bom proveito dessa puta! — ele diz com
raiva para Max, virando as costas, se misturando no meio dos pedestres que
passam pela rua. Max tenta ir atrás dele, mas o seguro, me mantendo presa ao
lado dele.
— Não, por favor, deixa para lá, Max. Não sei se consigo ficar de pé
se você me largar agora.
Vejo sua boca semicerrando enquanto ele olha com ódio na direção
por onde Renan foi.
— Você devia me deixar ir atrás dele e dar uma surra naquele bosta!
— ele fala, nervoso. — Esse filho da puta não está respeitando a medida
protetiva! Ele voltou a lhe incomodar, não foi?
Balanço minha cabeça positivamente. Sinto vergonha e olho para o
chão.
— Queria apenas poder ter cinco minutos com esse bosta, e deixar
essa cara de filhinho de papai dele duas vezes pior do que ele fez com você!
Ergo minha mão, tapando minha boca, abafando o soluço do choro.
Max tinha revisado todo o meu processo de agressão, ele tinha visto todas as
fotos do meu rosto machucado e sangrando. Eu odeio tanto essa forma
melindrosa na qual Renan me transformou. Mas eu sinto tudo, ainda acordo
no meio na noite com o corpo suado, como se estivesse dentro daquele quarto
outra vez.
— Um dia ainda vou ver esse filho da puta preso — ele fala baixo, me
virando lentamente. — Um dia ele não vai ter como escapar.
— A família dele tem dinheiro, Max. Você se lembra do que fizeram
comigo dentro daquele tribunal. Foi a palavra de uma mulher negra contra a
de um homem de classe alta da sociedade, de família nobre — digo triste para
ele, relembrando o julgamento horrível, do qual saí com fama de mulher
desequilibrada. Os advogados alegaram que eu tinha me machucado de
propósito.
— Ele machucou você? — ele pergunta, me avaliando, limpando meu
rosto.
— Eu estou bem, foi mais o psicológico mesmo...
Minhas palavras são interrompidas pelo mal-estar que vem com força,
só me dando tempo de abaixar meu rosto e vomitar todo o meu café da
manhã na rua. Max segura minha cintura para que eu não caia, retirando as
sacolas da minha mão, me olhando assustado, esperando a vertigem passar.
— Vem, Cris, vamos voltar para a empresa! Vou avisar a Ariel que
você precisa ir para casa.
Max nos conduz pela calçada, até chegarmos na frente do edifício da
empresa, mantendo seus braços sustentando meu corpo. Estou tão fraca e
pálida, que nem vejo o momento que ele me leva para o elevador. Quando a
grande máquina se movimenta, seguro seu braço com força e fecho meus
olhos, por conta da tontura que me dá.
— Vendo você assim, me lembrei do dia que peguei o elevador com a
Ângela — diz, alisando minhas costas, afagando meu ombro. — Só que no
caso dela, os enjoos e o mal-estar de elevador eram por causa da grav...
Max para de falar, segurando meu rosto, me fazendo olhar para ele.
Sua face tomba para meu ventre, voltando para meu rosto em seguida.
— Cris?
Apenas balanço minha cabeça em confirmação, com os olhos cheios
de lágrimas, não conseguindo segurar mais o choro. Max me puxa para seus
braços outra vez e eu me escondo em seu peito, chorando, sendo acolhida por
ele. Estou exausta, assustada com tantas emoções novas me pegando. A
gravidez, Ariel, o retorno de Renan, tudo me levou ao limite.
— Por favor, não diga a ninguém, Max — sussurro para ele em meio
ao choro.
— Oh, Cris, me diz que você não se envolveu com nenhum cliente
idiota!
— Não, foi pior, eu engravidei de um dos sócios da firma. — Max
puxa o ar com força, ficando em silêncio, entendendo minhas palavras.
— Bom, sei que não foi o Pietro, pois ele ama a Ângela, e sei que
também não fui eu, pois não esqueceria de ter tido uma noite de amor com
você. Mas fora nós dois, só sobra... Puta merda! Meu Deus, Cris! Me diz que
não é quem estou pensando...
— Eu não sabia, Max, te juro. Não sabia que Ariel era o novo sócio
na noite que nos conhecemos, foi um engano. — Meu rosto se esconde em
seu ombro e volto a chorar, melancólica.
Max alisa meus cabelos e deposita um beijo na minha cabeça, dizendo
que tudo acabará bem, como se eu realmente pudesse acreditar nisso. Não vai
acabar bem.
— Já contou a ele sobre a gravidez?
— Não. Eu nem sei como contar a ele, Max. — Fungo, soluçando em
meio ao choro, negando com a cabeça.
— Ariel não é o tipo de homem que vai querer se envolver, Cris. Não
tem ideia do que ele fez com Silvia. Ele vai lhe estraçalhar... — Max fala,
nervoso, no mesmo momento que as portas do elevador são abertas.
Não me mexo, não consigo mover um músculo sequer. Meu corpo
sente sua presença só pelo aroma do perfume que invade o elevador, me
avisando que Ariel está aqui. Me afasto de Max, ficando de costas para as
portas abertas do elevador, limpando meu rosto, não tendo coragem para
confrontar Ariel agora, não depois de ter acabado de ver Renan.
— Achei que tinha deixado claro que o encontro de vocês dois
poderia esperar. — A voz amarga de Ariel é altiva, mostrando sua raiva.
— Encontrei Cristina por acaso na rua. Ela passou mal, então ajudei-a
a voltar para a empresa — Max diz de modo protetor, alisando meu ombro.
— Vou levá-la para casa.
— Senhorita Self! — A voz de Ariel sai baixa, com um rosnado
rouco.
Me viro com pouca coragem, pegando as sacolas da mão de Max,
tendo mais força para encarar Ariel. Bete, que aparenta estar nervosa, com
seu rosto vermelho, fica séria, me olhando.
— Me desculpe pela demora, senhor Miller — digo baixo, saindo do
elevador, ouvindo o som pesado da sua respiração. Viro meu rosto, olhando
para Max, observando suas íris apreensivas. — Eu estou melhor, Max, muito
obrigada pela ajuda.
Volto minha atenção para Ariel, o vendo olhar para mim e para a
sacola com raiva, voltando a encarar Max.
— Vamos para a minha sala — ele fala zangado, respirando com
força.
Justo nesta hora, em meu estado mais frágil, chega Malvina, com seu
perfume adocicado, parando à minha frente. Não posso controlar, e antes que
me dê conta, meu corpo se inclina para a frente e vomito outra vez, em cima
do sapato de grife dela. Meus joelhos falham, não sustentando meu corpo, se
flexionando para tocar o chão. As mãos grandes de Ariel me seguram pela
cintura, me amparando. Ele tira as sacolas da minha mão e as entrega para
Max. Meus dedos tocam seu ombro, me dando apoio para me manter de pé,
forçando meus joelhos a ficarem eretos. Ariel leva uma das suas mãos à
minha testa, puxa o lenço da lapela do terno, o ergue e limpa minha boca.
— Você está bem? — ele diz, preocupado, com a voz baixa.
— Se ela está bem? — Malvina grita, enraivecida, apontando para o
pé, me olhando com ódio. — Esse sapato é um Prada[18], um Prada! E ela
acabou com meu sapato! DESTRUIU ELE! — Malvina grita, dando um
passo em minha direção.
Ela é bloqueada pela grande sombra que fica entre nós duas. Não sei o
que ela iria fazer, se queria me bater ou me xingar por conta do sapato caro
dela, estou tão enjoada que não consigo pensar, apenas fecho meus olhos,
encolhendo meu corpo, me sentindo como um balão que se esvazia pouco a
pouco.
— Vá até porra da loja e compre outro, Malvina! — A voz fria como
aço é de Ariel, que rosna com raiva. — Se não vai fazer nada para ajudar,
sugiro que suma da minha frente!
Ele gira sua cabeça de volta para mim. Sua feição está zangada, seus
olhos safiras se prendem aos meus, enquanto ele se abaixa manso, passando
um braço pelo meu joelho e outro em minhas costas. Facilmente me ergue no
colo, me assustando com seus movimentos rápidos. Seguro forte seu ombro,
fechando meus olhos para diminuir a tontura.
— Pode deixar que cuido da minha secretária agora, Maximiliano.
Obrigado! Bete, chame o pessoal da limpeza. — Ariel me endireita em seus
braços, me segurando firme. — O SHOW ACABOU, VOLTEM AO
TRABALHO!
Ariel sai andando comigo pelo escritório, rumo à sua sala, e escondo
meu rosto em seu terno negro, conseguindo imaginar todo os olhares
maldosos dos funcionários em nossa direção.
— Deveria ter me dito que estava com mal-estar, Cristina — ele
sussurra próximo ao meu ouvido quando entra na sala, fechando a porta atrás
de si.
Ariel me aperta forte em seus braços, e nessa hora uma dor imensa me
atinge. Antes que perceba estou soluçando alto, com o rosto coberto em
lágrimas outra vez. Fico me sentindo sem futuro, sem saída, acuada, com
medo de Renan machucar meus filhos. Não sei o que fazer, nem como vou
fugir dele. Choro por não saber como vou contar sobre a gravidez para Ariel,
visto que ele é frio e calculista, não se importando em ser rude com as
pessoas se for para conseguir afirmar seus objetivos. Imagino o que fará se
souber dos meus bebês! Ele pode me dizer que fiz aquilo de propósito, para
pescar um peixe grande, e tirará meus filhos de mim. Sinto quando ele desce
meu corpo devagar no sofá do escritório, me deitando como se eu fosse um
filhotinho ferido. Ariel se levanta e tira a parte de cima do seu terno, usando-
o para cobrir minhas pernas. Retira os óculos da minha face e os deixa no
braço do sofá. Seus dedos alisam meus cabelos, descendo para minha face,
acariciando meu rosto, e aqui me perco, em meio ao choro, sendo presa em
seus olhos, que estão me encarando como da primeira vez que o vi, tão belos
e quentes.
— O que eu faço com você, minha doce vênus? — ele diz mais para
si mesmo, com sua voz rouca sussurrando, tão confuso quanto eu me
encontro agora.
E não sei por que, mas isso só me faz chorar com mais sofrimento.
Sei que meu coração se prendeu ao seu dentro daquele quarto de hotel,
quando me encantei por suas safiras. Eu o amei antes mesmo de querer
aceitar. Amo este anjo perverso que me levou ao céu e me largou no inferno
em um curto espaço de tempo, e isso só me faz desabar mais em choro. Eu
não sei se Ariel é meu anjo ou o meu diabo, que vai me arrastar para a dor.
— Eu também não sei o que fazer comigo, Ariel! — digo, soluçando
com dor, desfazendo-me em lágrimas.
Muita carga emocional em tão pouco espaço de tempo me afunda,
como uma avalanche de sentimentos. É demais para mim. Mantenho o choro
sofrido, não consigo ter controle sobre mim. Ariel continua me acariciando,
para me acalmar, e a única coisa que me lembro vagamente depois que a crise
de choro passa, é de sentir um beijo gelado em meus lábios antes de eu cair
no sono, exausta.
Capítulo 12
Anjo sombrio
Ariel Miller

— O que pretende fazer?


Meus olhos estão concentrados no sinal de trânsito do lado de fora,
observando a noite, tendo a pequena face chorosa de Cristina inundando
meus pensamentos. A confusão que ela desencadeia dentro de mim, me
tirando de rotação, me fazendo querer apenas a manter em meus braços, para
que ela nunca escape, é atordoante. O perfume da sua pele está impregnado
em meu blazer e me acalma a cada sugar de ar para meus pulmões. Entrar em
minha sala algumas horas depois, devido ao fato de ter precisado dar uma
saída, e ver apenas o blazer dobrado, descansando no sofá, onde eu a tinha
abrigado e passado longos minutos observando sua face abatida, e o
encontrar vazio, sem sua presença, me desencadeou uma grande frustação.
Quando Bete me avisou que Max tinha levado Cristina para casa, a frustação
foi trocada por ira. Relaxo meus ombros, respirando fundo, girando meu
corpo e ficando de frente para Pietro, que está sentado na sua cadeira,
olhando para a tela do computador.
— Ouviu o que eu disse?
— Sim. — Ergo meu dedo, afrouxando o nó da gravata. — Não posso
levar Violet para testemunhar diante do grande júri, ela está mentindo.
— Todos mentem, Ariel — Pietro fala calmo, tamborilando seus
dedos na mesa. — Se descartar o álibi do seu cliente, tenha consciência que a
promotoria vai investigar o porquê.
— Stano a comprou, Pietro, ele forjou seu álibi e continua a omitir a
verdade do que aconteceu aquela noite. E sem saber a verdade, não posso
construir a defesa dele.
— Suspeita que ele cometeu o crime? Que matou aquelas pessoas?
— Stano é um puto de merda, que pode matar a sangue frio, mas ele
não é o tipo de homem que negaria a morte da esposa. — Respiro fundo,
soltando os botões do blazer. — Conheço esses tipos de criminosos de
colarinho branco há muito tempo, sei exatamente o modus operandi[19]
deles. Stano está mentindo. Pode não ter apertado o gatilho daquela arma,
mas sabe quem foi.
— Crime premeditado — Pietro responde rápido. — Pode ter
contratado alguém.
— Não, homens como Stano são calculistas e pragmáticos em tudo,
até para cometer um crime. O assassino agiu pela emoção, de forma
bagunçada. Os dois corpos foram atingidos na sala, estavam um distante do
outro. — Esfrego meu rosto, erguendo minha face de volta para a janela. —
Na segunda-feira vou passar na casa de Stano, para descobrir o que está
faltando nesse quebra-cabeça.
— Tenho certeza de que vai se sair bem com esse caso. Como sempre
se saiu. — Pietro solta um longo suspiro, pigarreando baixo, chamando
minha atenção para sua face. — Quer falar sobre a Cris?
Ele me dá um sorriso amarelo, repuxando o canto da sua boca quando
tomba a cabeça para o lado.
— O que quer saber, Pietro? — pergunto polido, mas não estou
inclinado a ceder alguma informação para saciar sua bisbilhotice.
— Bom, como nos conhecemos há muito... muito tempo, vou fingir
que não notei o que realmente estava acontecendo dentro da sua sala quando
entrei no horário de almoço, e nem adianta me dizer que não estava
acontecendo nada, porque a energia dentro daquela sala era praticamente
palpável. — Desvio meus olhos dos dele, afundando meu corpo na cadeira
quando descruzo minhas pernas. — Não tenho nenhuma objeção, desde que
seja algo desejado pelas duas partes. Suspeito que não pegaria bem, para o
notório Ariel Miller, advogado criminalista, ter uma ação de assédio sexual
sendo movida contra ele, e eu iria chutar muito seu traseiro daqui até Nova
York se você estiver molestando a Cristina.
Sorrio sem nenhum traço de alegria, travando meu maxilar. Meus
dedos se fecham em punho, dando leves socos no braço de descanso da
cadeira.
— Não tem com o que se preocupar. Como disse, nos conhecemos há
muito tempo, jamais forçaria uma mulher a nada.
— Forçar sei que não, mas manipularia a situação, do mesmo modo
como manipulou ao descartar todas as secretárias que lhe foram oferecidas,
com apenas um único objetivo. — Sua voz calma solta uma risada baixa. —
O qual julgo que alcançou com êxito.
— Ela é uma boa secretária, tem discernimento com o mundo
jurídico... — Reclino meu rosto em sua direção. — Foi apenas por isso. E, a
meu favor, posso garantir que aquelas secretárias que me encaminhou eram
incompetentes...
— Está gostando dela? — Pietro me corta, fazendo a pergunta à
queima-roupa.
Me arrumo na cadeira, ficando desconfortável com sua pergunta
direta.
— Aprecio a companhia da senhorita Self, se é o que quer saber. —
Balanço meu corpo na cadeira, olhando para minha mão, que soca o braço da
cadeira.
— Aprecio sua companhia, meu amigo, mas não tenho vontade de lhe
ver pelado em minha cama. Como pode ver, há uma diferença entre minha
pergunta e sua resposta, e você sabe disso — Pietro rebate meu argumento
com petulância, em meio às suas risadas, debochando de mim. — Pare de ser
evasivo com sua resposta e me conte. — Ele abre a gaveta da sua
escrivaninha e puxa uma garrafa de uísque e dois copos, os enchendo em
seguida e empurrando um para a ponta da mesa, para que eu possa pegar. —
Somos amigos há quinze anos, não precisamos de meios-termos.
Estico meu braço, pegando meu copo e o trazendo aos meus lábios, o
virando de uma única vez. Sinto a bebida queimar ao deslizar dentro da
minha garganta. Meus olhos se fecham enquanto respiro fundo, vendo a
pequena face abatida de Cris e tudo que ela desencadeou em mim: o instinto
de proteção, a raiva por Pietro ter nos interrompido dentro da minha sala,
quando a assisti partir a passos apressados, se distanciando de mim, quando
tudo que eu queria naquele momento era sentir meu pau se afundar dentro da
sua boceta quente, arrancando mais gemidos suaves dos seus lábios e
aplacando essa maldita condenação que ela me jogou desde a noite naquele
quarto de hotel. Como senti saudade do seu cheiro, do seu sabor, do toque
macio das suas mãos sobre mim. Eu senti saudade dela. E ver Max ganhando
dela aquele sorriso, o qual eu desejei ver tanto por todos esses malditos dias
desde que ela voltou, me fez perder o controle. Aquele sorriso me pertence,
os olhos brandos e brilhantes devem estar voltados para mim, não para ele. E
em questão de segundos fui de um homem pragmático para um neandertal
dominador, que apenas teve sua fúria refreada depois de ouvir dos lábios dela
a confirmação que Max nunca lhe tocou. Inferno! O que ela está fazendo da
minha vida?!
— Vocês dormiram juntos?
— Sim. — Deixo o copo sobre a mesa de Pietro, encostando minhas
costas no couro da cadeira. — Foi no último dia dela antes de sair de férias.
Eu cheguei tarde, muito tarde, passei no hotel que tinha me hospedado e vim
para o escritório. Então eu a vi. No primeiro momento fiquei fascinado por
sua face expressiva, como de uma pesquisadora curiosa. — Sorrio
melancólico, me recordando exatamente da forma divertida como seus olhos
negros de coruja brilhavam por trás dos óculos. — Houve um engano, e eu
não desmenti e nem confirmei, estava curioso pela forma atrapalhada dela.
— Sua curiosidade insaciável sempre foi seu mal, Ariel — Pietro
suspira calmo, enchendo os copos. — Está apaixonado por ela.
— Não usaria essa palavra. Tenho sentimentos por ela, se é o que
quer saber. — Pego meu copo, o tomando sem pressa.
— Não há vergonha em dar nomes às emoções, Ariel, lhe digo isso
por experiência. Quanto mais rápido aceitar que está apaixonado por ela,
mais fácil sua vida se tornará. — Pietro arrasta seu corpo com a cadeira,
apoiando seus cotovelos em cima da mesa. — Vou ser franco com você, meu
amigo. Max tem um carinho imenso pela senhorita Self. — Pietro ergue sua
mão quando eu rosno baixo, virando meu rosto. — Não faça essa cara. Disse
que meu irmão tem carinho por ela, não que nutre uma paixão platônica. O
que liga Max e Cris é outro sentimento, um afeto fraternal, e foi por isso que
o autorizei a tirar ela de sua sala enquanto você estava em reunião.
Volto meu rosto para Pietro, esmagando meu maxilar, sentindo raiva
ao saber que ele está confraternizando com isso.
— Eu iria cuidar dela, iria levá-la para casa — falo bravo, abaixando
o copo na mesa. — Acha que eu seria tão baixo a ponto de me aproveitar do
momento frágil de uma mulher? Oh, pelo amor de Deus, nos conhecemos há
anos!
— Sei disso, e foi justamente esse seu propósito que me fez agir
assim — Pietro fala sério, negando com a cabeça. — Vou lhe mostrar algo, o
que pode custar a renegação de laço de sangue entre mim e o meu irmão, se
ele descobrir que quebrei o sigilo dele com a sua cliente.
Pietro abre a gaveta e retira uma pasta marrom de dentro dela,
depositando-a sobre a mesa.
— Cristina não é só uma amiga para Max, muito menos a secretária
antiga. Cris é aquele caso que nos ligamos de forma emocional e sabemos
que merece justiça, mas ela nunca teve, e isso é uma marca na vida de
Maximiliano, por nunca ter conseguido justiça para ela.
Puxo a pasta para minhas mãos, vendo o nome dela escrito em uma
etiqueta.
— Max estava no tribunal no dia que o julgamento estava
acontecendo na vara da família, violência doméstica. Meu irmão se sentou do
meu lado enquanto esperávamos pela audiência da cliente dele, com seus
olhos perdidos em toda dor que a face de Cristina demonstrava.
Escuto a voz de Pietro enquanto abro a pasta, lendo apenas pelos
autos a descrição do caso.
— Já ouviu falar de Hugo Pener? — Balanço minha cabeça em
positivo, folheando as páginas. Não tinha sido apurado absolutamente nada, o
caso dela estava frágil, sem consistência. — Renan Pener, o filho de Hugo,
espancou Cris até ela ter duas costelas quebradas, sua mandíbula fraturada,
supercílio esquerdo cortado, diversos hematomas pelo corpo e vinte por cento
da sua visão do olho esquerdo comprometida. Porém, com o dinheiro e a
influência do pai, em conjunto com o batalhão de advogados que eles
levaram para a audiência, além de muita propina distribuída dentro do
tribunal, Cristina Self passou de vítima para ré em questão de segundos.
Paro no laudo médico que foi feito de forma errônea, um serviço de
porco, apenas relatando brevemente o estado da paciente. O perito filho da
puta, dava a entender que foi algo sem grande repercussão.
— Todos foram comprados: perícia, o relatório policial manchado, os
vizinhos que foram de testemunhas, dizendo que nunca viram Renan Pener
maltratar sua esposa, e que no fatídico dia não ouviram nada dentro da
residência.
— Ela não chamou a polícia? — Ergo meus olhos para Pietro,
sentindo meu corpo se abrasar de ódio puro.
— Não. Cris foi socorrida pela mãe, que a tirou de dentro da casa. Ela
procurou o hospital apenas no outro dia. Os advogados usaram isso para
alegar que ela mesmo podia ter feito aquilo — Pietro fala amargo, suspirando
pesado. — O filho da puta do juiz comprou a ideia escrota que eles passaram
dela, alegando que ela era uma mulher desequilibrada, que tinha se ferido de
propósito apenas para arrancar dinheiro do marido quando ele pediu a
separação, e manchar a boa reputação e índole impecável dele. Mas o covarde
nunca pediu a separação, quem pediu foi Cristina.
Posso vê-la sozinha dentro do tribunal, acuada, sendo empurrada por
mentiras e alegações falsas, com os olhos de coruja negros brilhando de
medo.
— Por que não recorreram? Por que não assumiram o serviço de
merda desse advogado? Cristina não tinha como perder essa ação...
— Como você mesmo me disse... — A voz baixa vem de trás de mim,
fazendo tanto eu como Pietro olhar para a porta da sala dele, enxergando Max
parado, com os olhos no arquivo. — Vítimas não podem pagar por
advogados caros e ardilosos como você.
Ele se desencosta da porta e caminha para nós, jogando outra pasta
sobre a que eu olhava.
— Acho que meu irmão esqueceu dessa pasta quando foi mexer em
meus arquivos sem pedir minha permissão. — Ele para perto da mesa, pega a
garrafa de bebida e enche um copo para ele. — Ou na certa quis lhe poupar
de ver como o doente do Renan deixou Cristina.
Pietro encolhe seus ombros, olhando para a garrafa com pesar.
— Não faça essa cara, Max, Ariel precisava saber. — Pietro respira
fundo, fechando seus olhos.
Devolvo a pasta para ele, ficando apenas com a que Max entregou
para mim. Abro ela lentamente, me deparando com a foto de Cristina
machucada. Seus olhos quase não se abrem, a boca está inchada e cortada. O
filho da puta tinha batido nela com todas as forças. Vejo tudo vermelho à
minha frente. Quero encontrar esse homem que a machucou, lhe ferir de
forma tão miserável quanto ele a feriu. Cruel e brutal, até sua face não ser
nada mais que um esboço horripilante de um homem morto.
— Quando assumi o caso, depois que o advogado dela perdeu
propositalmente, Cristina estava muito abalada, não queria seguir adiante.
Renan a estava ameaçando, perseguindo-a constantemente, ela apenas queria
uma medida protetiva — Max fala amargo, olhando para a fotografia.
— Ele não foi preso? Não foi condenado pelo que fez a ela?
— Não, ele não foi. Ele sequer chegou a passar uma noite dentro da
cadeia, mesmo infringindo a medida protetiva — Max me responde baixo.
Fecho a pasta com raiva, jogando-a sobre a mesa.
Me levanto e caminho dentro da sala, me sentindo um animal
enjaulado, sentindo a porcaria da gravata, mesmo afrouxada, me sufocar.
— Disse “mesmo infringindo a medida protetiva”, correto? — rosno
entre meus dentes, olhando para Max. — Isso quer dizer que ele ainda
continua se aproximando dela?
— Eu o vi pessoalmente hoje, no horário de almoço, amedrontando-a.
— Esfrego meu rosto, respirando fundo ao ouvir a voz de Max.
— Filho da puta! — Pietro xinga baixo, socando a mesa.
— Ele é um miserável que a persegue. Ele para por um tempo, some,
se distancia dela, mas não demora muito para voltar. Cris me contou que ele
anda rodeando o novo endereço dela, liga para o celular e para o telefone
fixo, sem dizer nada, apenas a assustando.
— E por que vocês me contaram isso só agora? — Cuspo as palavras
com raiva, sentindo o gosto amargo em minha saliva.
— Porque o advogado dela sou eu. Não precisa saber sobre a vida da
Cris — Max fala amargo, me fazendo erguer meus olhos para ele. — Não
passa de um advogado sem escrúpulos.
— Não gosta como eu trabalho, não é? E quer saber? Até acho
louváveis seus pensamentos de salvador da pátria, mas eu cago para seus
conceitos puritanos. — O olho sério, não medindo minhas palavras. — Mas
deixa eu lhe contar um segredo, meu caro benfeitor. São advogados
mesquinhos e ordinários, como eu, que comem homens como Renan Pener
no café da manhã, que não se vendem e muito menos se intimidam por conta
de rótulos do papaizinho dele. Se diz o advogado dela, mas o que fez até
agora para sua cliente, além de arrumar a porcaria de uma medida protetiva
falha?
Pego as duas pastas em cima da mesa, as segurando com raiva,
repousando meus olhos em Pietro.
— Me fez uma pergunta, e aqui está minha resposta, Pietro. — Ergo
as pastas, balançando-as com ira em minhas mãos. — Vou garantir
pessoalmente a estadia desse verme asqueroso em uma penitenciária máxima.
Renan Pener não chegará mais perto de Cristina. Se ele chegar, é um homem
morto, esse é o tamanho do apreço que tenho por ela!
Saio de dentro da sala, os largando lá, caminhando com raiva para o
meu escritório.
Capítulo 13
Olhos de coruja
Ariel Miller

Inalo o ar com força para meus pulmões, tentando não perder minha
paciência no sábado de manhã, enquanto encaro o homem melindrado à
minha frente.
— Senhor, eu realmente não posso lhe passar informações sobre os
moradores.
Levo as mãos aos bolsos da calça, olhando sério para o porteiro,
respirando fundo.
— Quantas vezes Renan Pener já apareceu na porta desse prédio,
atrás da senhorita Self? — falo ácido, o deixando saber que não vou embora
tão cedo desse prédio sem as respostas que preciso.
— Como eu já falei, não posso falar sobre...
— Fala logo, sua criatura preguiçosa, eu não estou lhe pedindo. Não
estou aqui como um especulador curioso, eu sou a porra de um advogado que
não pensaria duas vezes antes de lhe foder, por omitir informações da minha
cliente!
O homem pequeno arregala seus olhos, ficando com sua face
vermelha.
— Realmente não está fingindo, não é? É a pessoa mais desagradável
que já conheci. — Ele ergue seu dedo, apontando-o para mim.
Sorrio com ironia para o gorducho, dando um passo à frente, parando
perto do balcão que ele usa para se esconder.
— Nesse momento estou na minha versão mais doce, seu idiota. —
Movo minha mão para fora do bolso da calça, a erguendo para minha face e
retirando os óculos escuros. — Mas assim que eu te intimar e colar essa sua
grande bunda flácida em um banco de testemunha e extrair cada informação
de dentro do seu rabo, lhe dando a sensação da mais alarmante
colonoscopia[20] da sua vida, aí sim você vai conhecer meu lado
desagradável. — Cerro meus dentes com raiva, o olhando de cima a baixo. —
Então lhe aconselho a responder minha pergunta!
O homem se encolhe, se sentando na cadeira atrás dele, balançando a
cabeça em confirmação.
— Senhor Pener aparece com bastante frequência atrás da senhorita
Self. Como ela já tinha nos repassado sobre a presença dele ser proibida, ele
não passa do saguão do prédio. Só nessa semana ele veio duas vezes.
Retiro meu cartão do bolso, empurrando em cima do balcão,
apontando para ele.
— Quando ele der o ar da graça outra vez, você vai ligar para mim,
não importa a hora do dia. Vai ligar diretamente para esse número e não vai
repassar mais nada para a senhorita Self. — Ele pega o cartão e fica em
silêncio. — Compreendeu?
— Sim, senhor Miller.
— Esplêndido! — Sorrio para ele, arrumando meu terno, levando os
óculos de volta à minha face. — A propósito, senhor... — Estalo as pontas
dos dedos, olhando para o crachá dele. — Bobe, gostei do nome. Adorei
nossa conversa amistosa, conto com sua discrição sobre esse momento
também.
Ele apenas balança a cabeça, confirmando. Me viro e saio do prédio,
caminhando até o meu carro. Antes que eu possa abrir a porta, reconheço o
pequeno corpo que vira a esquina, andando apressado, segurando firme as
sacolas em seus dedos, olhando para trás. Me afasto do carro e marcho de
encontro à Cristina, que mantém sua cabeça virada, olhando por cima do seu
ombro, andando rapidamente. Estico meu braço e seguro seu ombro antes que
ela trombe em mim, o que a faz soltar um grito, derrubando suas sacolas.
— Oh, meu Deus! — Sua face se ergue para mim, ficando com a
respiração pesada, puxando o ar fortemente para suas narinas. — Ariel! Quer
me matar do coração?
Ela se afasta, abaixando para pegar as coisas que caíram das sacolas.
Olho no rumo de onde ela veio, mas não enxergo ninguém caminhando atrás
dela. Me abaixo e auxilio Cristina a pegar suas compras, repousando meu
olhar em sua face. Sua veia está saltada na lateral da sua garganta, os olhos
arregalados. Seu coque bagunçado, com fios soltos, cai na lateral do seu
rosto.
— Do que estava fugindo? — pergunto sério. Cristina ergue seus
olhos para mim, se levantando lentamente.
— Nada, apenas estava distraída... — Ela abaixa seus olhos para
minha mão, tentando pegar o frasco de xampu dos meus dedos, mas eu o
puxo para trás, a impedindo de pegá-lo. — O que está fazendo em pleno
sábado no portão do meu prédio, doutor? Pensando bem, como sabe meu
endereço?
— Passei no setor de RH[21] da firma — respondo sem pressa,
abrindo seu xampu e o levando perto do meu nariz e cheirando. — Apenas
Ariel, babá McPhee. Não estamos em horário de trabalho, para ser tão formal.
— Repuxo meu nariz, fazendo cara feia. — Não sei se gosto desse xampu,
tem cheiro de produto de liquidação.
— Oh, meu Deus, não acredito que vai resolver me infernizar até nos
fins de semana! — Ela pega o frasco da minha mão, fechando sua face
enquanto o joga dentro da sacola.
— Na verdade, ainda temos muito trabalho a fazer sobre o caso Brat
— falo a primeira coisa que vem em minha mente, não querendo a deixar
saber meu real motivo para ter vindo até seu endereço. — O que mais tem aí
dentro das sacolas?
— O quê? — Ela tenta se afastar quando me aproximo.
Minha mão se estica, e olho curioso para suas compras, retirando uma
das sacolas da mão dela.
— Veja, alguma coisa de qualidade. — Pego o molho de tomate. Olho
o restante das coisas e não gosto muito do que vejo: cereal de morango,
iogurte, doce, pasta de amendoim... E piora a cada segundo que mexo dentro
dela. — Foi fazer compras para uma criança?
— Me devolve a merda da minha sacola, Ariel!
Puxo a barra de chocolate, a virando em meus dedos, negando com a
cabeça.
— Não é à toa que passou mal, olhe o tanto de porcaria! Come
alguma coisa que preste, babá McPhee?
— Babá McPhee é o seu c... — Ela se cala quando ergo meu rosto
para ela, sorrindo sarcástico. Olho a ponta do seu dedo erguida em minha
direção.
— Vejo que está recuperada, pelo desenrolar do seu linguajar, minha
adorável secretária — falo em deboche, a vendo resmungar zangada,
esticando sua mão para mim.
— Devolva a minha sacola e vá embora, Ariel. Hoje é minha folga e
me nego a ser escravizada por você.
Observo sua face abatida e vejo as olheiras embaixo dos seus olhos,
de quem passou a noite toda em claro. Sei que deve ser isso, já que foi esse o
motivo que me fez usar os óculos escuros, pois minha noite foi longa,
enquanto andava como um felino enjaulado dentro do meu apartamento, de
um lado ao outro, lendo cada palavra do seu caso, vendo as fotos dos
hematomas do seu corpo, sua face machucada. Me viro e caminho para a
entrada do prédio, levando sua sacola de compra comigo.
— Ande, babá McPhee, não tenho o dia todo para esperar que você
tenha bons modos e me convide para entrar.
— Como assim entrar? Você quer subir no meu apartamento? —
Ouço sua voz perguntar confusa atrás de mim.
Paro meu corpo, olho para ela e retiro meus óculos.
— Aceito seu convite!
Self se engasga, erguendo sua mão no ar e a fechando em punho,
apontando apenas o indicador para mim.
— Não foi um convite, sabe disso. E você distorceu minhas palavras.
— Ouço seu gritinho de raiva enquanto ela bate seu pé no chão, feito uma
menina pirracenta.
— “Você quer subir no meu apartamento?” — falo suas palavras
anteriores, as usando contra ela. — Para mim, isso foi um convite. E agora
que eu aceitei subir, será feio da sua parte o retirar.
— Inacreditável! Você é um ser humano inacreditável!
— Eu sei disso, meu bem. Não precisa inflar meu ego. — Pisco para
ela, lhe provocando. — Ande, vamos, estou com fome! Talvez ache alguma
coisa decente dentro dessas sacolas, para nos alimentar.
Aponto para a entrada do seu prédio, esperando que ela passe,
rabugenta, balançado sua cabeça em discordância. Antes que ela se afaste,
retiro as outras sacolas da sua mão, levando as compras para ela. Meus olhos
param na esquina uma última vez, em busca de alguma pista do que a estava
deixando assustada, mas não tem ninguém. Ando atrás dela, voltando para o
prédio, passando pelo segurança quando entro com Cristina do meu lado.
— Olá, Bobe, como está indo seu dia? — Cris sorri para ele de forma
branda, apontando para mim. — Esse é o doutor Miller, meu chefe.
— Olá, Bobe, prazer em lhe conhecer — cumprimento-o cinicamente,
não demonstrando para ela que já me apresentei para ele.
O homenzinho flácido com rosto vermelho apenas balança sua cabeça
para mim, em saudação. Cristina está distraída, caminhando para as
escadarias, o que me faz parar e olhar das merdas dos degraus para o
elevador.
— Por que serei obrigado a subir escadas quando tem elevador nesse
prédio? — Ela para no terceiro degrau e segura no corrimão, olhando para
mim.
— Oh, meu Deus, é verdade! Você tem preguiça de usar escadas,
correto? — Sua mão bate em sua testa, negando com a cabeça. — Está tudo
bem, não vou me sentir ofendida se recusar subir, e nem no caso do nobre
doutor Miller quiser voltar para o quinto dos infernos de onde veio.
— Bonitinha... — falo com desdém, subindo o primeiro degrau da
escada.
— Eu sei que sou, não precisa ficar inflando meu ego, doutor. — Sua
voz risonha é baixa, me fazendo erguer meu rosto e olhar para ela.
Sou pego pelo sorriso doce que se alarga em sua bochecha, me
levando ao nocaute a cada segundo que ela me fisga com seus olhos grandes
de coruja estalados, como uma noite quente de verão.
— Ande, Ariel, não é o fim do mundo subir escadas! — Seu corpo
gira, com ela voltando a se mover.
Ouço o pequeno pigarro vindo de trás de mim, me fazendo olhar para
o bisbilhoteiro do Bobe, que tem seus olhos atentos em mim. Fecho meu
semblante para ele, subindo os degraus atrás de Cristina.
— Cobro uma fortuna dos meus honorários aos meus clientes pelo
meu tempo, para manter meu padrão elevado de vida, para no fim estar aqui,
trocando o elevador por escadas em um prédio mediano na periferia da
cidade.
— Oh, céus, cale essa sua boca cretina, Miller!
O som da sua risada se espalha, me fazendo sorrir por ser o causador
do som feliz que sai dos seus lábios. Estico minha perna, subo de dois em
dois degraus, alçando a pequena vênus, parando no degrau abaixo do dela.
Cris gira sua face para mim, ficando a poucos centímetros do meu rosto,
soltando um baixo sorriso, tranquila.
— O que foi? — A voz envergonhada pergunta baixinho.
— Estou pensando sobre o que disse. — Recaio meus olhos para seus
lábios, que se comprimem, quase em um convite doce para que eu os prove.
— No quê?
— Sobre calar minha boca cretina — sussurro rouco, engolindo
minha saliva, sentindo minha boca ficar seca. — Aprecio quando seus lábios
felinos silenciam minha boca cretina.
Ela me desarma com tanta facilidade, como se eu fosse um castelo de
cartas sendo desempilhado pela brisa suave do vento. Observo os gestos
desajeitados das suas mãos, que se erguem, empurrando seus cabelos para
trás das orelhas, sorrindo de lado, tombando sua face em seu ombro.
— O que realmente veio fazer aqui, Ariel, em pleno sábado?
Me enganar!
Menti para mim mesmo, dizendo que apenas revirei os arquivos do
RH atrás do endereço dela, porque odiava o serviço porco de advogados
aproveitadores, como o que a deixou à mercê de um julgamento
inescrupuloso, e não porque cada parte do meu corpo, do meu ser, grita
ansioso, tendo minha alma inquieta e ao mesmo tempo esperançosa por
encarar seus olhos negros expressivos de coruja. Puxo o ar com força para
meu peito, inalando seu perfume que me embriaga, a quentura da sua
respiração morna que me acaricia a face. Tombo meu rosto na mesma direção
que o dela se encontra, me aproximando lentamente, não resistindo aos seus
olhos pecaminosos, que me chamam para ela.
— DROGA, VOU ME ATRASAR! — A voz alta gritando nos faz
afastar.
Ergo meu rosto para cima da cabeça de Cris e vejo um jovem, que
desce correndo os degraus, com um celular em suas mãos, que provavelmente
está filmando tudo. Ele sorri quando nos vê, apontando o celular para
Cristina.
— Bom dia, lindona, dá oi para a galera do canal! — Cris se afasta,
respirando rápido, olhando para o chão, ficando de costas para mim,
erguendo seus olhos para o garoto.
— Olá, Estence! Olá, galera do canal do Estence! — Ela acena para
ele e volta a subir a escadaria.
Respiro com desânimo, encarando o pivete que sorri para mim,
apontando a porcaria do aparelho na minha direção, com sua face espinhenta
e os dentes presos a um aparelho ortodôntico.
— E aí, tiozão! — Ele desce os degraus apressado, me
cumprimentando, dando um leve tapinha em meu ombro.
Olho para meu ombro, onde sua mão de bater punheta juvenil tocou,
sujando meu terno de alfaiataria.
— Tio é meu ovo, moleque de merda! — resmungo baixo, desviando
meus olhos do meu ombro, olhando para minha frente vazia.
Estalo minha língua, me sentindo mal-humorado pelo pivete ter
interrompido meu momento com Cristina.
— Vai me dizer que já está fadigado de subir degraus, tiozão?
Ergo minha cabeça e a vejo no segundo lance de escadas, sorrindo
para mim, me provocando, com a parte superior do seu corpo inclinado sobre
a barra de proteção da escadaria.
— Engraçadinha! — Volto a subir os degraus, odiando,
definitivamente, esse prédio cafona. — Qual tipo de padrão de emissora
contrata um pré-adolescente?
Ouço a risada dela explodir em uma gargalhada, ao mesmo tempo que
nega com a cabeça.
— Estence filma para seu canal em uma rede social na internet,
doutor Miller. Ele filma de tudo que puder, acho que fica 24 horas com esse
celular na mão, gravando. Está por fora da atualidade dos jovens, tiozão!
— Patético, babá McPhee!
Capítulo 14
Pílula mágica
Ariel Miller

— Meu Deus, isso é assustador!


Me afasto do fogão, depois de abaixar o fogo da panela, onde está
cozinhando o molho para o espaguete. Olho Cristina sentada na ponta da
mesa, cortando os legumes para a salada.
— O quê? — Limpo minha mão no pano de prato, me encostando na
pia. — Não acredita que Stano possa algum dia ter posto o pau velho e
murcho dele dentro da boceta larga da assistente?
— Bom, isso também, agora que acabou de falar com tantos detalhes.
— Ela faz careta, negando com a cabeça. — Mas, na verdade, me refiro a
você com esse avental amarelo preso na cintura, invadindo minha cozinha.
Ela aponta para mim e abaixo meu olhar, vendo os desenhos de
patinhos no tecido brega, num amarelo pavoroso. Cruzo meus braços, que
tem as mangas da minha camisa dobradas em meus cotovelos.
— Discordo, acho que combina com o dourado do meu Rolex[22]! —
Pisco meus cílios docemente para ela, debochando do pano feio. — Estou até
pensando em ir com ele na audiência, acho que fará um bom par com meu
blazer.
Aponto para a parte de cima do meu terno, pendurada na cadeira,
rindo para ela. Cristina se levanta, rindo, negando com a cabeça, caminhando
para a pia e me fazendo me afastar. A vejo se abaixar para pegar uma
travessa, olhando para mim.
— Tenho uma teoria! — Ela ergue sua mão, empurrando sua mecha
de cabelo teimosa para trás da orelha. — Stano entrou em casa, pegou sua
mulher no flagra com o suposto amante, aguardou os dois terminarem o
momento íntimo e os matou quando eles saíram da área de exercício e
entraram na casa.
— Teoria falha! — rebato para ela, pegando a taça de vinho e levando
aos lábios.
Cris me olha perdida e caminha para perto da mesa, jogando os
legumes na travessa.
— A esposa de Brat estava a quatro metros de distância do outro
corpo. A não ser que ela tenha entrado e caminhado até o marido, enquanto o
amante ficou parado na porta, vendo a mulher com quem ele trepava ser
assassinada, não tem como eles terem entrado juntos na casa.
— Ela já tinha sido baleada — Cris fala, pensativa, erguendo sua
cabeça. — Veja, ele ouviu o som do tiro e entrou na sala. O assassino estava
com a arma em mãos, se assustou e matou o rapaz.
— Correto, isso que pensei. — Seguro a garrafa de vinho barata que
encontrei no armário dela, fazendo uma anotação mental de deixar bebidas
com mais qualidade dentro desse apartamento. — O personal morreu porque
foi abelhudo. Lugar errado, hora errada. — Passo meus olhos pela mesa,
procurando pela taça de bebida dela. — Não está bebendo?
O som da tábua de cortar legumes caindo da mão dela, me faz olhar,
sem entender, para seus olhos arregalados.
— Eu tomei remédio ontem à noite por conta do mal-estar. Prefiro
não beber — ela fala rápido, pegando a tábua, indo para a pia e ficando de
costas para mim.
— Posso lhe garantir que é o melhor que faz, até eu não queria estar
bebendo esse vinho de atacadista[23]. — Deixo a taça no balcão, olhando
com desgosto para ela.
— Oh, meu Deus, você pensa antes de abrir sua boca ou apenas solta
todas as bobagens que vêm em sua mente egocêntrica? — Cris fala, rindo,
lavando a louça que está na pia.
— Eu sei, é um charme natural. — Dou de ombros para ela, indo para
perto do fogão, conferir o meu molho. — Acho que mais um pouco e minha
massa italiana vai estar pronta.
— É macarrão, Ariel. — Cris se afasta da pia, parando ao meu lado,
secando suas mãos no avental da minha cintura. Seu dedo se ergue, indo na
direção da panela. Estapeio seu dedo e a recrimino assim que percebo o que
ela pretende.
— Não difame meu prato gastronômico. Se estou falando que é massa
italiana, então é.
Ela age rápido, levando o dedo para dentro da panela e o melecando
de molho, o sugando rapidamente em sua boca.
— É macarronada, doutor Miller! — Suas sobrancelhas se arqueiam,
me dando um sorriso debochado.
— Agora é, já que enfiou seu dedo curioso dentro do meu molho —
rebato, me virando para pegar minha taça de vinho no balcão do armário.
Caminho para a sala com poucos passos, devido ao fato do
apartamento ser pequeno, e o olho atentamente: o sofá de três lugares está de
frente para a TV na parede e tem alguns livros espalhados sobre a mesinha de
centro. Minha atenção se retém na moldura, onde há duas mulheres
sorridentes abraçadas. Vejo Cristina segurar seu chapéu de formatura com um
grande sorriso na face jovial, os cabelos estão soltos, destacando o vestido
vermelho elegante e terrivelmente sexy no corpo. Quem olhar para essa
mulher impecavelmente arrumada, desde a sandália de salto fino no pé até a
maquiagem em sua face, não encontrará semelhanças com a mesma que se
encontra na cozinha. Deixo a taça na estante e pego o porta-retratos,
admirando-a de perto. Parece animada. Observo o brilho de felicidade que
tinha em seus lábios pintados de vinho. Paro perto das cortinas escuras
compridas, as abrindo, observando a porta da varanda fechada. O som dos
passos dela, caminhando rápido para mim, me faz virar. Cristina fecha as
cortinas imediatamente, passando seus dedos agitados em sua saia.
— Está sol lá fora, não quer deixar aberta? — pergunto baixo,
olhando-a.
Sua boca se comprime, com ela negando com a cabeça.
— Esse horário, prefiro elas fechadas. — Seus olhos param no quadro
em minha mão, sorrindo melancólica. — Foi o dia da minha formatura...
Travo meu maxilar e balanço minha cabeça em positivo. A moça do
porta-retratos está escondida dentro de Cris, deixando apenas essa casca
frágil que a protege aparecer.
— Estava feliz?
— Sim, muito feliz. A época da faculdade foi a mais alegre da minha
vida. — Sua voz é um sussurro triste.
Meu ódio pelo seu ex-companheiro só aumenta, sabendo que foi ele
que a transformou nisso, que apagou a vida dela, como se fosse uma vela sem
importância.
— Segure para mim, sim? — Entrego o porta-retratos para ela, a
deixando o guardar de volta no lugar dele.
Giro meu corpo e fico de frente para as cortinas. Minha mão se estica
e segura com força, as abrindo até o fim, destrancando a porta, as
empurrando para fora.
— Ariel... — Cris estica seu braço para me impedir, mas eu apenas o
seguro, apertando sua mão em meus dedos.
A trago para perto de mim, envolvendo meu braço por sua cintura, a
deixando protegida, envolvida por mim, de frente para a grande porta.
— Por favor, feche a porta. Realmente preciso que feche a porta,
Ariel... — Sua voz é quase um fio de choro, e ela olha assustada para o meu
rosto.
Nego com a cabeça, varrendo com meus olhos a rua e a pequena
praça do outro lado, buscando algum rosto virado para a janela dela. Quero
que ele veja, se ele estiver lá, como eu tenho certeza de que deve estar,
escondido como a barata nojenta que ele é, a espreitando. Quero que ele saiba
que ela não está sozinha. Que ele tenha consciência que ele não é mais o
caçador, que ele é a minha caça. Ergo meus dedos, me virando para ela,
segurando seu rosto em minha mão, a impedindo de se afastar de mim.
— Estou com o arquivo do seu caso, Cristina — falo sério,
acompanhando o ritmo descompassado do seu peito, que sobe e desce. —
Também sei que Renan te acuou na rua ontem, assim como eu também sei o
porquê de você ter medo de ficar exposta diante dessa janela.
— Você não tinha esse direito. — Suas mãos tentam me empurrar, ela
me olha assustada. — Max me prometeu nunca mostrar para ninguém aquele
arquivo...
— Maximiliano continua com sua preciosa ética intacta, Cristina.
Quem me mostrou foi Pietro. — A puxo pela cintura, a deixando
impossibilitada de fugir. — Você já se escondeu por muito tempo, minha
vênus, está na hora de sair desse casulo, e não pretendo te deixar mais nem
um minuto aí dentro.
Não me privo mais nem um segundo sequer do que realmente desejo.
Minha cabeça se inclina e a beijo com pura posse. Sinto seu medo, seus
dedos agitados que se prendem em minha camisa, tentando se afastar. Forço
meu domínio, aplacando toda minha fúria e ódio em um único ato. Abraço-a
com força com os dois braços, a tirando do chão, a beijando com uma fome
de mil anos por estar junto a ela. Sua língua se solta, assim como seus dedos
relaxam, presos à minha camisa, devolvendo o beijo na mesma intensidade
com a qual a tomo. Meu coração bate acelerado dentro do meu peito,
desfibrilado, ganhando um real motivo para se manter batendo, pulsando
sangue pelas minhas veias. Eu morri por dentro quando perdi minha filha,
achando que nada no mundo me faria voltar a desejar viver, mas cá estou,
gritando dentro de mim por uma segunda chance de poder lutar e cuidar de
algo que seja meu, de abrigar ela em meus braços, destruindo qualquer coisa
que possa machucá-la.
Ela é minha, apenas minha, e não vou abdicar dela. Estou
reivindicando o que é meu, e vou lutar por ela com toda minha fúria, não
deixarei Renan sair ileso se tentar ferir Cristina. Uma das minhas mãos se
solta das suas costas quando sinto seus braços circularem meu pescoço. Puxo
suas pernas para cima, a forçando a me prender entre elas. Caminho
segurando seu corpo, não afastando minha boca da sua, a beijando com
prazer. Suas costas batem na parede da sala quando a uso para apoiar seu
corpo. Afasto meu tórax do seu apenas poucos centímetros, para facilitar
minha mão de se livrar daquela maldita blusa de lã, a jogando para o chão. Os
olhos mornos dela me olham intensos, brilhando com luxúria.
— Sua massa italiana? — ela fala, atrapalhada, com sua voz
entrecortada. Enfio minha mão em seu quadril, abaixando o zíper da minha
calça, libertando meu pau.
— É só a porra de um macarrão!
Colo meus lábios aos seus, tendo a fome que consome meu corpo
muito além do que o espaguete poderia saciar. Meu desejo é por ela, por seu
corpo, por sua essência, por tudo que essa mulher me desperta. Empurro sua
saia para cima, segurando sua calcinha com meu dedo, a empurrando para o
lado, e é de forma animalesca que me afundo forte e duro dentro da sua
boceta, estocando meu pau tão fundo, como se a pudesse pregar na parede.
— Ariel... Oh, meu Deus! — Ela solta meus lábios, gemendo alto, me
recebendo dentro do seu corpo.
Beijo seu queixo, arrastando minha boca por cada canto da sua pele,
mordendo sem raciocínio seu pescoço, movendo meu quadril para trás,
apenas o suficiente para voltar implacável meu pau em sua boceta. Minha
mão se espalma na parede, ao lado do seu rosto, com a outra esmagando sua
coxa, a fodendo com tamanha urgência, sabendo que nada me faz me sentir
tão vivo quanto estar enterrado, a fodendo até minhas bolas colarem em sua
pele quente. A cada bateria desregulada de estocadas frenéticas, tão intensas e
insanas quanto minha mente, e a cada gemido que escapa dos seus lábios,
colados em meu rosto, com suas mãos presas em meus cabelos, mais
necessitado eu fico. Não é sexo, não é a porcaria de uma foda, é a mais carnal
urgência que minha alma pede. A tomo com fúria, como um animal sem
raciocínio, que apenas precisa a marcar. Cristina trava suas pernas em minha
cintura, apoiando seus calcanhares em minha bunda, o usando como alavanca
para duplicar o impacto das estocadas, me cavalgando com a mesma
lascividade com a qual a fodo. Essa é minha mulher, essa é a criatura
selvagem e libertina que me prendeu a ela dentro daquele quarto de hotel.
— Ohhhhhh... — Sinto seus dentes morderem meu ombro, com ela
me engolindo por completo. Meu pau escorregadio desliza por sua boceta
molhada para fora do seu corpo, voltando mais agressivo.
Fecho meu punho na parede, alavancando seu corpo com a força do
meu quadril, que se choca com o seu. Meus dedos em sua coxa, atracados em
sua pele, a comprimem, retirando novos gemidos da sua garganta quando ela
se liberta, gritando pelo meu nome, gozando com euforia, lavando meu pau
com seu esguicho e me fazendo me sentir a porra de um imperador
prepotente que chegou ao topo do mundo. Seu corpo trêmulo convulsiona e
aperta as paredes quentes da sua boceta no meu pau, que está tão fundo
dentro dela, ao ponto de fazer minha mente explodir. Sinto quando meu gozo
chega, tendo um breve momento de lucidez em meio ao nirvana que me
engole, saindo de dentro dela. Colo minha face entre seus peitos, ouvindo seu
coração disparado, enquanto meu pau pulsa, soltando os jatos da minha porra
na parede. Meu corpo todo, cortado pela corrente elétrica, desencadeia por
completo minha adrenalina. Ergo minha face para a sua quando os tremores
diminuem, me perdendo em seu olhar carinhoso. Beijo seu queixo,
esfregando meu nariz em sua garganta, ouvindo o suspiro suave que ela solta.
Sua pele suada está colada à minha camisa e escorrego suas pernas molengas
ao redor da minha cintura. A seguro, mantendo seu corpo preso ao meu,
protegido de uma queda, respirando com força. Sorrio, fechando meus olhos.
— Mais um pouco e eu não teria conseguido tirar meu pau a tempo.
— Rio para ela, balançando a cabeça para os lados, me sentindo um calouro
de faculdade, que acaba de meter com vontade dentro da sua garota. — Em
nossa primeira noite, tudo foi tão explosivo e ardente, e ainda teve aquelas
garrafas de vodca que tomamos. Não me lembro se te perguntei se toma
algum contraceptivo. Se quiser, posso comprar uma pílula do dia seguinte por
precaução. Acho que mesmo eu tirando agora, acabou ficando um pouco de
esperma dentro de você...
Me calo ao ouvir o som baixo do soluço que escapa dos seus lábios.
Meus olhos se abrem e me deparo com Cristina chorando.
— Eu te machuquei? — pergunto, me sentindo inseguro.
Estava com tanta saudade de tê-la em meus braços, afoito apenas por
aplacar minha necessidade de marcá-la como minha, que foi inevitável a
possuir com tamanha aspereza pelo tanto de adrenalina que corria em minhas
veias.
— Não era para ter sido assim, eu a queria como ainda quero agora,
apenas perdi o controle. Não tem ideia de como desejei ter você de volta em
meus braços desde aquela noite do hotel.
O choro aumenta, ficando cada vez mais forte. Seu rosto está lavado
em lágrimas, os olhos de coruja tristes se fecham, escondendo sua face em
meu pescoço, me fazendo me sentir perdido, não compreendendo o motivo
dela chorar com tanta dor.
Capítulo 15
Anjo protetor
Cristina Self

Abro meus olhos com preguiça e enxergo a noite que toma conta do
quarto. Meu rosto tomba do travesseiro e olho o espaço vago ao meu lado.
Me mexo na cama, ficando deitada de lado, e estico meu braço, percorrendo
minha mão, alisando o lençol amarrotado, marcado pelo corpo grande do
homem que estava deitado aqui. Seu cheiro masculino ainda paira dentro do
quarto, assim como em minha pele. Suspiro vagarosa, levando meu braço
para cima do meu rosto e tapando meus olhos.
— O que foi fazer, Cristina?! — me recrimino baixinho por ter
abaixado por completo a guarda diante de Ariel.
A urgência como me tocou, a necessidade como meu próprio corpo
respondeu a ele, tudo nebulou minha mente, meu raciocínio, e o amei com
pura devassidão, não me importando com nada além de ser sua. O medo, o
pavor, a ansiedade, tudo se silenciou. Apenas uma mulher apaixonada,
vibrando nos braços do homem que deseja, se fez dentro da minha sala. E foi
por isso que quando sua voz falou tão naturalmente, que as palavras pesaram
dentro do meu coração. Tinha que ter tomado a pílula do dia seguinte dois
meses atrás, agora não adiantava mais, mas como eu poderia pensar nisso?
Acreditava que nunca poderia ser mãe, então nem me preocupei.
Hoje eu estava em seus braços, o amando perdidamente, sendo que
dentro de mim duas vidas estão sendo geradas, e eu não tenho nem ideia de
como contar para Ariel. Ele me desarmou com sua forma presunçosa e cínica,
com piadas sacanas, que tiraram de mim o amedrontamento que eu estava
desde ontem, quando encontrei Renan. Essa nova face de Ariel, tão íntimo,
invadindo minha cozinha, revirando minhas sacolas, enquanto tirava seu
blazer, falando todos os tipos de disparates, que apenas ele consegue falar,
me deixou à mercê dele, pois, de alguma maneira, sua presença me pareceu
tão familiar, tão desejada em minha vida solitária, que me perdi.
Ainda sinto meu corpo dolorido, tendo cada músculo, juntas e nervos
se deleitando por terem sido usados de forma devassa em seus braços. De um
ataque brusco e selvagem, me tomando com lascividade colada àquela
parede, ele virou um guardião protetor, que me abraçou forte, me consolando
do choro triste que me golpeava, sem ter noção que eu não chorava porque
ele tinha me amado da melhor forma que eu já fui tomada em minha vida, eu
chorava por não saber como ele aceitará a notícia de que vai ser pai. E mesmo
assim, fraca, demonstrando minha fragilidade, ele não me afastou. Ariel me
acolheu em seus braços, caminhando para o quarto, soltando meu corpo
apenas depois que me depositou na cama. Tapei meu rosto para abafar meus
soluços, tão dispersa em minha dor, que nem senti seus dedos me despindo, e
muito menos percebi em qual momento ele saiu do quarto para desligar as
panelas do fogão, ou quando se livrou da sua própria roupa. Apenas me
segurei em seus ombros, o abraçando com força, quando seu corpo se juntou
a mim na cama. E morri a cada segundo que suas safiras me encararam,
parecendo um menino perdido, se culpando pelas lágrimas que rolavam por
minha face. Talvez tivesse que ser ali, naquele breve segundo, enquanto ele
me confortava, que eu devia ter tido coragem de lhe confessar meu segredo,
mesmo sabendo que me destruiria se ele tirasse meus filhos de mim. Mas eu
fui fraca, me rendi à minha covardia, me deixando esquecer todas as minhas
dores no beijo calmo que ele me deu. Meu anjo perverso que me presenteou
com mais uma nova faceta entre tantas que ele tem.
O suor está transpirando por minha pele, colando meu cabelo
bagunçado em minha face. Meu coração e minha respiração estão
completamente acelerados, apressados, como se estivesse parada diante de
um penhasco. Ariel se move em um ataque seguro, parando seu corpo sobre
o meu, deixando seu rosto próximo à minha face. Seus olhos me fitam
diretamente, com seus cabelos dourados revoltos por meus dedos, que os
desalinham. Tão perfeito na mais controversa beleza brutal, um anjo ou
demônio. Eu não sei como lidar com Ariel, estou completamente rendida a
ele. Meu corpo implora por ser amado por ele, exigente por seu toque,
ansiando por tê-lo dentro de mim, me tomando até não restar mais nenhuma
dor em minha alma. E como um anjo benevolente, que lê os pedidos mais
secretos da minha alma, não preciso esperar por muito tempo. Sua face para
na lateral da minha. Ele flexiona seu tórax nu para cima, impulsionado seu
quadril para frente, e sinto seu pau entrar dentro de mim, sem pressa, me
torturando a cada centímetro que sou preenchida. Meus olhos vão em busca
dos seus, segurando seu rosto, precisando olhar para ele. Ariel vira sua face,
beija minha mão antes de cravar os dentes na pele, se enterrando por inteiro
dentro de mim quando seus olhos se abrem, ficando cruzados com os meus.
Avisto a luz da luxúria que queima tão fortemente dentro dele, e sei que é a
mesma que incendeia dentro de mim.
— Eu não quis machucar você. — Sua voz é rouca, com seu peito se
estufando a cada ar que ele suga para seus pulmões.
Ariel move seu quadril, retirando seu pau de dentro de mim, voltando
a me foder lento e profundo. Gemo com prazer, apertando minha mão em seu
braço, afastando minhas pernas da cama, para que eu possa o ter mais
colado a mim.
— Quero isso de você. Seus sons, seu sabor, seu prazer, seus arrepios
e tremores, me deixando ver sua face tão expressiva quando se entrega para
mim.
Seu corpo repete os movimentos, me fazendo cair entre o prazer de
estar sendo tomada por ele e a depravação do meu ser, que precisa de mais.
— Ariel... Ohhh!
Seu corpo se abaixa, colando seu peitoral em meus seios, os
comprimindo. Sinto o gosto dos seus lábios me drogando, não tendo nada
mais real do que esse segundo em seus braços. Sua língua invade minha
boca, trazendo mais desejo ao meu corpo com seus beijos quentes, e acelera
o ritmo do seu quadril, me fodendo com mais propriedade. Meus gemidos se
silenciam entre nossos beijos, minhas mãos rodeiam suas costas, me colando
mais a ele, o abraçando com força. Seus lábios se separam dos meus,
descendo para meu pescoço, mordiscando, beijando com paixão. Ariel ergue
seu tórax e seu corpo se afunda com pressão dentro de mim. Minhas unhas
cravam em sua pele, e seus olhos se mantêm presos aos meus. Suas estocadas
aumentam. Rápido, forte, me esticando, fodendo muito além do que apenas
minha boceta, mas a minha mente. Sinto meu corpo ser consumido por uma
corrente elétrica, que vai se expandindo cada vez mais. Enlaço minhas
pernas em sua cintura, colando minhas coxas na lateral do seu corpo. Com
uma das suas mãos, Ariel me prende por baixo de minha cintura, fazendo
meu corpo ficar ainda mais cativo a ele. Meu anjo devasso acelera as
investidas, soltando toda sua energia em cada penetração, e minha cabeça
explode quando o orgasmo me pega, me jogando para o abismo. Meus
músculos se apertam mais em torno do seu pau, fazendo meu corpo entrar
em erupção com o orgasmo que me rasga. Minhas mãos se prendem em seu
rosto, trazendo-o para mim, o beijando com abandono, o levando para a
queda junto comigo. Ariel me fode com mais força, se enterrando uma última
vez antes de sair de dentro de mim. Sinto seu corpo trêmulo, enquanto seu
pau jorra sua porra em cima da minha barriga, me melecando a cada pulsar
do seu corpo.
E é com meu coração acelerado e minhas pálpebras ficando pesadas
depois que ele retorna do banheiro, trazendo uma tolha umedecida e me
limpando, que vou me concentrando apenas no som rouco da sua respiração.
Com ele deitado ao meu lado, me abraçando com pressão, adormeço. Seus
braços me prendem a ele, e toda falta de sono por medo, que tive nos últimos
dias, desaparece quando me sinto protegida em seus braços.
Um anjo, um demônio ou um protetor? Eu desconheço a verdade.
Mas, nesse momento, nada mais tem importância.
Me sento na cama e esfrego meu rosto, batendo meus pés lentamente
no piso do quarto. Solto um espirro, que me pega quando o ar da janela aberta
me acerta. Coço a ponta do meu nariz e olho para lá. Ariel deve ter a deixado
aberta, e o gato da vizinha andou passando por aqui. Espirro outra vez,
direcionando meu olhar na direção da porta do quarto aberta. Levanto e
caminho para o armário, pegando uma camisa dentro dele e a vestindo. Ando
para fora do quarto silenciosamente e vejo a cozinha arrumada. O relógio da
parede me mostra que dormi a tarde inteira, já que passam das 19h30.
Caminho sonolenta pelo apartamento, avistando um pequeno bilhete sobre a
mesa da cozinha, e reconheço a caligrafia de Ariel, que se destaca em um tom
azul sobre a folha branca, com uma singela, mas impactante frase, que torna o
meu mundo seguro.
Já volto!
Esfrego minha nuca, virando meu rosto para a sala, e vejo a janela da
varanda fechada, com as cortinas abertas. Caminho lentamente para lá,
apertando seu bilhete em minhas mãos. Observo a noite estrelada do lado de
fora, com o céu tão belo. Meus olhos repousam para o local onde o veículo
dele ainda está estacionado do outro lado da rua, de frente para o prédio, e
suspiro, sem ter ideia do que vou fazer. Ergo minha mão e mordo o cantinho
da minha unha, me recordando das palavras de Max dentro do elevador. Elas
martelam forte em minha cabeça, de forma pesada, me estrangulando o
coração.
— Ariel não é o tipo de homem que vai querer se envolver, Cris. Não
tem ideia do que ele fez com Silvia. Ele vai lhe estraçalhar...
Quem é Silvia?
Um ex-amor, uma mulher importante em sua vida? O que Ariel fez de
tão abominável para ela que causou o repúdio de Max? Ontem eu estava tão
abalada quando Max me trouxe para casa, que nem me atentei a isso, e agora
me sinto perdida. Porque o homem que me amou em minha cama essa tarde,
não parece ser o mesmo homem frio de olhos safiras que Max me advertiu
para ter cuidado.
— Onde você foi se meter, Cristina? — sussurro, completamente
perdida
Mas, dentro de mim, eu sei que não posso esconder mais do Ariel
sobre os bebês. Terei que enfrentar sua reação, independente de qual seja.
Não posso prolongar mais o segredo. Me giro e volto para o quarto,
caminhando a passos decididos. Vou contar para ele sobre os bebês, talvez
ele entenda que não fiz por maldade, que não penso em lhe dar um golpe e
muito menos tenho pretensão em prendê-lo a mim. Eu só quero meus filhos,
poder cuidar deles. Mostrarei o exame de gravidez e a ultrassonografia, e que
seja o que Deus quiser.
— Merda! — Coço meu nariz e solto outro espirro assim que volto
para o quarto.
Caminho direto para a janela e a fecho. Meus olhos param na rua
escura sem ninguém. Respiro com força, me negando a sentir ansiedade
agora. Não agora! Ando pelo quarto, tendo a luz do corredor iluminando um
pouco o ambiente, e empurro a porta do banheiro. Espirro com mais força,
sentindo agonia pela sessão de espirro alérgico que me pega.
— Oh, droga! Esse gato entrou dentro do meu quarto. — Puxo a
gaveta do armário do banheiro, tentando encontrar meus exames. Assim que
seguro os documentos, espirro outra vez, cambaleando para trás. Sinto meu
pé escorregadio pela viscosidade líquida no chão do banheiro, como se eu
tivesse pisado em uma poça de água. — Mas o quê?! — Ergo meu pé,
olhando para o chão, sem entender de onde está vindo o vazamento.
Meus dedos se esticam e aperto o interruptor. Acendo a luz do
banheiro e olho para o chão. A grande poça vermelha de sangue, na qual eu
piso, mancha o chão por inteiro. Olho a mancha vindo de dentro do boxe e
sinto meu corpo frio, com minhas pernas perdendo forças a cada segundo.
Estico minha mão e empurro a cortina do boxe.
— OH, MEU DEUS! — grito apavorada, vendo o pobre gato da
minha vizinha pendurado pelo rabo, com a mangueira do meu chuveirinho no
ferro do chuveiro, com seu pescoço cortado.
Ando atrapalhada, com meus pés melados de sangue, e escorrego
quando tento fugir do banheiro. Meus dedos se seguram na pia para eu não
cair. E é ao olhar para o espelho, lendo a palavra escrita com sangue no vidro,
que meu corpo desaba no chão, em meus joelhos. Engatinho para fora do
banheiro, gritando apavorada, chorando de medo, me segurando ao batente da
porta para me levantar. A luz do quarto acesa me faz erguer a cabeça para
Ariel, que entra como um furacão, parando seus olhos em mim.
— Cris!
Estico meu braço para ele, derrubando os exames no chão, sentindo a
pontada de dor que me acerta no ventre. Retraio todo o meu corpo com a
cólica forte, que me rasga como uma faca invisível. As batidas do meu
coração pulsam desregular a cada lufada de ar, tanto que vai se tornando
difícil respirar.
— Meus bebês... Meus bebês... — Seguro minha barriga, olhando
para minhas pernas, vendo meus joelhos sujos de sangue. — MEUS BEBÊS!
EU TÔ PERDENDO MEUS FILHOS, ARIEL!
Tudo é tão frio, tão lento, enquanto meu corpo vai se inclinando para
o lado, perdendo as forças dos movimentos. O grande corpo me pega antes de
eu tocar o chão. Vejo os mesmos olhos que me amaram parando a poucos
centímetros do meu rosto, se expandido, trocando as safiras por um azul-
escuro, enquanto me segura em seus braços, interrompendo a queda.
— Meus bebês... — Minha voz é um murmúrio, com os pensamentos
ficando vagos, tendo minha mente sendo invadida apenas pela mais sombria
escuridão e medo.
Capítulo 16
Atenuante
Ariel Miller

— A caixa torácica dela não suportou a colisão com o painel do


veículo no momento que ocorreu a abatida.
Tapo minha boca, mordendo o mais forte que posso minha mão,
abafando minha dor dentro do necrotério.
— Ela foi arremessada do banco de trás para a parte frontal interna
do carro. Sua morte foi instantânea. Lamento por sua perda, senhor Miller.
Meus dedos acariciam seu rosto pequeno tão frio, retirando seus
cabelos da sua face, enquanto tombo meus joelhos no chão, ficando
ajoelhado ao lado dela, morrendo junto com minha filha. Sinto meu coração
ser arrancado de dentro do meu corpo, privado de seus olhos alegres, da sua
face risonha, que agora é apenas o aspecto do adormecer eterno.
— Foi uma grande fatalidade. Sei que não serve de consolo, ainda
mais nesse momento, mas o senhor e sua esposa são novos, poderão, quem
sabe...
— CALE-SE, pelo amor de Deus! Antes que eu lhe mate dentro dessa
sala! — grito com ódio, urrando como um animal ferido, que perdeu a parte
mais importante do seu corpo.
Seguro sua mão pequena entre as minhas, a beijando, não querendo
acreditar que nunca mais terei ela em meus braços, que não ouvirei sua doce
voz. Na minha vida, nada pôde me preparar para perder minha filha. Nem a
condenação da minha alma no inferno pela eternidade me faria sofrer o
tanto que estou sofrendo agora. Me deixo ficar caído, ajoelhado ao seu lado,
chorando, sem consolo algum que possa me acalmar a alma. E por quatro
horas seguidas, me mantenho aqui, ao lado dela, odiando a Deus por ter me
presenteado com meu pequeno anjo apenas para tirá-la de mim de forma tão
fria. Excomungo minha fé, meus sonhos, me odeio, me amaldiçoo por não ter
a protegido. Nessa hora, nada me parece ter valor, nem importância, nada.
Nem todo o dinheiro que tenho no banco, nem minha carreira, carros, casa,
nada que eu tenho trará minha filha de volta. Meu corpo se levanta inerte,
sem alma, tão robótico e apático como minha vida se tornará de agora para
frente, olhando meu bebê sobre a maca fria.
— O senhor gostaria de saber alguma notícia sobre sua esposa,
senhor Miller? — A voz do médico é baixa, parando ao meu lado.
— Silvia está morta? — pergunto com a voz quebrada. As lágrimas
secaram em meu rosto, enquanto eu olho minha filha.
— Não, sua esposa...
— Então não tem nada que eu queira saber sobre ela. — Estico meu
braço, alisando o rosto frio sem vida da minha filha, olhando para ela como
eu fazia todas as noites, quando chegava em casa e a encontrava dormindo
no berço. — Gostaria que nos deixasse a sós, doutor.
Meu coração congela, não tenho mais nenhum motivo para pulsar
com vida dentro de mim.
Seguro o exame em meus dedos, olhando para o estranho esboço da
imagem, não sendo nada mais do que dois pontos, que o médico circulou com
a caneta.
— Ela está estável agora, senhor Miller. Tanto ela como os bebês. —
Ele sorri para mim, amistoso, falando com a voz calma. — A pressão arterial
disparou.
— O sangramento era todo dela ou do gato?
— Não era dela, o sangue em suas pernas era do felino. Pelo que o
senhor me relatou, foi um grande susto para ela, o que acabou disparando a
pressão arterial. O senhor gostaria de entrar para ver sua companheira? Ela
está adormecida, mas, se quiser, pode ficar ao lado dela.
Apenas balanço minha cabeça em positivo, tendo as palavras
bloqueadas dentro da minha garganta. Seguro firme o papel, seguindo o
médico, que me conduz para a porta do quarto, onde Cristina está
hospitalizada.
— O senhor agiu rápido ao trazer ela direto para nós, alguns papais de
primeira viagem acabam entrando em pânico — o médico fala baixo, abrindo
a porta do quarto.
Respiro fundo, pousando meus olhos em Cristina, que está deitada na
cama hospitalar. Os fios de soro estão ligados em suas veias, e ouço o som
dos bipes dos aparelhos, que medem e controlam os batimentos cardíacos e
sua pressão. Não respondo para o médico que não sou pai de primeira viagem
e que não sabia sobre a existência dos meus filhos até uma hora atrás.
— Vou deixar vocês a sós — fala calmo, se virando para sair do
quarto.
— Obrigado.
Espero ele fechar a porta atrás de mim e caminho para perto dela,
olhando sua face adormecida, que não traz a mesma dor e medo que estavam
em seus olhos quando entrei no quarto, a encontrando gritando apavorada. Se
fechar meus olhos, ainda posso enxergar sua mão esticada para mim,
enquanto segurava seu ventre, implorando pela vida dos bebês. Não precisei
ser um gênio da matemática quântica quando o médico me contou de quantas
semanas Cristina está grávida. Os bebês que crescem dentro da sua barriga
são meus. E, por um instante, a sensação de perder algo que tinha acabado de
descobrir me acertou como dois punhos fortes e certeiros em meu estômago,
destrancando memórias antigas e dolorosas, que havia detido dentro da minha
mente. A mancha vermelha de sangue do animal ainda está em minha camisa
e ainda posso sentir o suor frio do rosto de Cristina na ponta dos meus dedos.
O chão do banheiro ensanguentado, o gato pendurado no chuveiro. O filho da
puta ainda escreveu vagabunda no espelho dela. Eu tinha saído por dez
minutos, dez malditos minutos, para ir até o meu carro, que estava
estacionado do outro lado da rua, na frente do seu apartamento, que começou
a disparar o alarme sem parar. Isso foi o suficiente para ele invadir o quarto
dela e a ver nua, adormecida na cama. Dez minutos que quase me custaram
meus filhos e Cristina! Desço meu olhar por seu corpo, parando em cima do
seu ventre, sentindo meu coração tão apertado e minha alma se enchendo de
ódio profano a cada segundo que observo seu corpo em cima dessa cama.
— Por que não me contou, Cristina? — sussurro, perdido em meus
pensamentos, tentando compreender por que ela não me falou que estava
grávida.
O vômito no escritório, as manias dela de fugir dos elevadores, a
expressão abatida e cansada, tudo vem em minha mente, se formando como
uma quebra-cabeça. A porta do quarto sendo aberta me faz olhar para Pietro,
que passa apressado, olhando para mim.
— Como ela está?
Meus olhos não param nele, mas sim em Maximiliano, que caminha
preocupado atrás do irmão. Afasto Pietro da minha frente e prendo meus
dedos no terno de Max, o empurrando contra a parede e estourando suas
costas com raiva.
— Sabia a verdade, não é?! — Empurro com mais força, mantendo
meus dedos presos em sua roupa, mesmo com ele tentando se desvencilhar.
— Me solta, porra!
— Me responda, filho da puta! Sabia que Cristina estava grávida, e
mesmo assim não me contou! — rosno com ódio a centímetros da sua face,
estourando seu corpo outra vez na parede.
— Não era eu que tinha que te contar, Miller! — ele grita com raiva,
enquanto Pietro me puxa para trás, tentando livrar seu irmão. — Cristina
tinha que te contar, cabia a ela contar para você. — Solto sua roupa com
ódio, querendo socar sua cara maldita. — Se ela não te contou, a pergunta
que devia fazer para si mesmo é: o que a levou a preferir omitir a gravidez ao
invés de lhe contar a verdade?
— CRETINO DE MERDA...
— Parem os dois! — Pietro entra na frente, me olhando nervoso,
respirando fundo. — Imagino o que deva estar sentindo com essa notícia,
mas ter uma explosão de raiva não vai ajudar.
Não, ele não tem ideia de como eu estou me sentindo. Estou sendo
levado por uma gangorra do céu ao inferno, sentindo todas as emoções que
trancafiei por anos dentro de mim aflorarem com ardor, sem ter controle
sobre elas. O som dos aparelhos bipando me fazem virar para Cristina, a
olhando preocupado. Respiro fundo e observo a atrapalhada mulher que
bagunçou minha vida em todos os sentidos, deitada na maca, tão frágil, não
lembrando em nada a criatura doce e sensual que passou a tarde em meus
braços.
— Ariel, como ela está? — Pietro coloca a mão em meu ombro,
parando ao meu lado. — Aconteceu algo com o bebê?
— Bebês... — falo baixo, deixando a palavra sair pela primeira vez da
minha boca. — Cristina está gravida de gêmeos. — Olho para ele confuso,
balançando minha cabeça. — Vou ser pai de gêmeos, Pietro, gêmeos...
— Gêmeos? — Max fala baixo, olhando para a cama.
— Seu filho da puta sortudo, não acredito que acertou dois tiros de
primeira! — Pietro bate em minhas costas, rindo para mim e virando seu
rosto para Cris. — Estou feliz por vocês, meu amigo, realmente estou feliz!
Nunca imaginei sentir essa emoção outra vez, nunca me vi sendo pai
de novo. Havia trancafiado essa palavra dentro de mim, junto com as
lembranças dolorosas, mas agora, olhando para Cris, compreendo que não
consigo parar de pensar que fizemos nossos filhos naquela noite,
embriagados dentro do quarto do hotel.
— Eu vou ser pai.
Me afasto de Pietro e caminho para perto da cama, esticando minha
mão, repousando-a sobre a barriga de Cristina, me permitindo pela primeira
vez tocar seu ventre conhecendo sobre a existência dos meus filhos. Ergo
meus olhos para ela, e dentro de mim sei que vou caçar esse filho da puta até
dentro do inferno.
— Vou acabar com Renan Pener, Pietro. Vou fazê-lo se arrepender
amargamente por ter machucado ela — falo baixo, deixando o ódio profano
sair da minha boca. — Mato esse homem com minhas próprias mãos, se for
preciso, mas ele vai se arrepender.
O som das batidas na porta me faz olhar para lá. Logo ela é aberta, me
deixando ver o policial que chama por mim.
— Doutor Miller, sou o investigador responsável pela ocorrência na
residência da senhorita Self, poderia me dar um segundo do seu tempo?
Olho para Cristina, relutando em deixá-la, mas será necessário. Bobe
chamou a polícia, tinha feito o que mandei quando desci às pressas do
apartamento de Cristina, com ela desmaiada em meus braços.
— Sim — respondo para ele, caminhando para a porta, sendo seguido
por Pietro.
— Já foram atrás do responsável? — Pietro pergunta sério para o
policial, parando no corredor, do lado de fora da porta do quarto de Cristina,
cruzando os braços sobre o peito.
— Não, ainda não temos nada, o caso é muito atenuante[24].
— Atenuante? — pergunto sério para ele. — Acha que invasão de
propriedade, maldade com um animal, o qual foi degolado de ponta-cabeça,
preso dentro do banheiro dela, com uma palavra agressiva escrita no espelho,
claramente sendo uma ameaça e coação para uma mulher grávida, é
atenuante?
— Não estou dizendo que não estamos dando importância a esse caso,
doutor Miller. Mas não tem arrombamento, não teve invasão. As câmeras de
segurança não pegaram ninguém estranho no prédio, e, infelizmente, a lateral
do prédio não tem segurança de câmeras nas escadas de incêndio.
— Filho da puta! — rosno com ódio, esfregando meu rosto. Pietro
balança a cabeça em negativo, olhando para o policial.
— A senhorita Self tem uma medida protetiva contra seu ex-
companheiro, a qual ele não cumpre, então me diga, qual prova precisa para
ir atrás dele?
— É apenas uma suposição, ninguém o viu no prédio, perguntamos
para os vizinhos, revisamos as filmagens.
— Inacreditável, inacreditável! — Pietro resmunga com raiva,
olhando para mim.
— Passei apenas para lhe assegurar que vamos investigar esse caso a
fundo, doutor Miller.
— Eu percebi — respondo irônico, olhando sério para ele.
Capítulo 17
Irrevogável
Cristina Self

— Está com fome, sede, quer algo?


— Não, eu estou bem... — Estalo meus dedos, os apertando um a um,
observando minha mala ser depositada lentamente no chão. — Por que eu
não estou no meu apartamento?
— A polícia não liberou ele ainda, e não é seguro para você ficar lá.
— Ariel atravessa o grande quarto, se encaminhando para a janela, abrindo as
cortinas bordô.
Observo o grande quarto com carpete creme no chão, a cama de casal
arrumada ao canto, com o guarda-roupa combinando com a cabeceira da
cama.
— Ali fica o banheiro, o guarda-roupa pode usar para guardar suas
coisas.
Ele não olha para mim, nem sequer me dirige as palavras diretamente.
Seus olhos passam por todo o cômodo, menos em minha face. A única vez
que Ariel me olhou diretamente nos olhos e manteve o mais humano e brando
contato visual comigo, foi no domingo de manhã, quando eu despertei, e ele
estava sentado na cadeira, ao lado do leito da minha cama. Sua face se
abaixou, recaindo sua atenção para o meu ventre, me deixando saber que ele
enfim tinha descoberto sobre a gravidez. Sua voz foi baixa quando me falou
que estava tudo bem comigo e com os bebês. Eu tinha me preparado, de certa
forma, para qualquer tipo de reação que ele tivesse: explosão de raiva, grito,
seu cinismo e até aceitação, que eu tinha esperança que iria haver, mas a
única coisa que eu não tinha previsto foi seu total silêncio. Ainda fiquei vinte
e quatros horas em observação no hospital, até o médico me dar alta, e qual
não foi a minha surpresa quando a porta do quarto foi aberta na segunda-feira
por Ariel, taciturno, segurando uma mala minha em seus dedos. Ele não foi
para meu apartamento, e muito menos ouviu meus protestos quando disse que
queria ir para a casa da minha mãe, que estaria segura lá. Ele me trouxe para
a residência dele. Sua casa fica afastada de Sacramento, é grande, arejada e
completamente silenciosa, com paredes brancas, arquitetura moderna, tão
sem vida e calor humano quanto seus olhos safiras estão agora, olhando para
a varanda do quarto.
— Ariel... — chamo por ele, vendo seus ombros enrijecerem e a
pequena repuxada em seu pescoço para a esquerda não me passa
despercebida.
— Por que não me contou sobre meus filhos? — Ele finalmente volta
sua face para mim, parando seus olhos enigmáticos nos meus.
— Eu tentei... — respondo baixo, mordendo a lateral dos meus lábios.
— Estava tentando achar o momento certo.
— O momento? — Sua voz é fria, se igualando ao seu olhar, quando
me corta de uma única vez. — E quando exatamente seria esse momento?
Talvez quando lhe perguntei sobre o anticoncepcional? Ou quando passou
mal dentro da firma? Talvez até nos primeiros dias teria sido interessante.
Então me fala, qual seria a porra do momento perfeito para me contar que
está carregando meus filhos, Cristina?!
— Eu não sei, tá legal?! — Tapo meu rosto, negando com a cabeça.
— Tive medo.
As palavras saem pesadas, igual meu coração se sente agora. Ergo
meu rosto e olho para ele, que se mantém fechado.
— Medo?! Medo de ser mãe? Medo de ter que cuidar de outras vidas?
Defina seu medo. Não queria meus filhos, é isso? — Sua forma fria me
contra-ataca com palavras maldosas, me olhando como se eu fosse um animal
irracional.
— Oh, meu Deus! Como ousa abrir essa sua boca arrogante de merda
para dizer uma banalidade desse tipo?!
— Eu não sei, estou tentando entender porque omitiu a verdade sobre
meus filhos. Talvez não os quisesse, por isso não me contou. Pretendia
abortá-los?
— NÃO! — grito com raiva, negando com a cabeça para ele. — Por
anos da minha vida achei que eu era seca, Ariel, uma mulher incompleta por
não poder gerar uma vida. Renan usou isso para me torturar, me culpando por
não poder lhe dar um filho. Isso me destruiu psicologicamente... E quando
descobri sobre os bebês e sobre a mentira de Renan, sobre eu não poder ser
mãe, foi o momento mais assustador e mágico da minha vida. A única certeza
que eu tive, e tenho dentro de mim, é que eu vou protegê-los...
— De mim? — O som rouco sai da sua boca em tom de
ressentimento.
— Se for preciso, sim. — Ergo meus dedos para minha barriga,
abaixando minha face para meu ventre, segurando o choro. — Eu não quero
nada, não vou te obrigar a nada também. — Sinto as lágrimas quentes
escorrerem pela minha face, mesmo eu tentando prendê-las. — Mas eu não
vou deixar você tirar eles de mim.
O som dos passos dele atravessando o quarto é tudo que ouço antes do
meu corpo ser arrematado em seus braços, me apertando forte. Sinto meu
coração voltar a bater com força em meu peito a cada segundo que ele me
acalenta. Ariel afasta apenas um pouco sua face da minha, trazendo uma de
suas mãos para frente, alisando minha bochecha, retirando os óculos, que
estão embaçados pelo choro dos meus olhos.
— Eu apenas precisava ter certeza de que você os quer o tanto que eu
quero.
Fungo baixo, ficando com meus olhos presos aos seus, não sabendo o
que ele quer dizer com isso. Como ele pôde achar que eu não queria meus
filhos?
— Não existe lei e poder nesse mundo que me faça renunciar a eles,
Ariel.
Ariel me abraça em silêncio, trazendo minha cabeça para seu peito.
Sinto seu queixo no topo dos meus cabelos, com o som calmo da sua
respiração.
— Venha, precisa deitar-se um pouco. — Sua voz rouca, em tom
brando, sussurra para mim.
Girando nossos corpos lentamente, nos leva para a cama. Ele me deita
e se arruma ao meu lado, ficando em silêncio. Fecho meus olhos, sentindo o
toque quente da sua mão sobre minha barriga, com seu peito arfando para
frente a cada respiração pesada. Estou tão cansada e exausta, que não quero
brigar. Não quero gritos, nem ataque de fúria, apenas quero proteger meus
filhos.
— Gosta?
Desvio meus olhos do grande jardim para Ariel, que entra na varanda
da sala com suas mãos nos bolsos.
— É bem espaçosa. — Volto a olhar o jardim, percorrendo meus
olhos pela piscina. — Para ser franca, achava que você ainda estava
hospedado no hotel.
Ouço a risada baixa dele, enquanto dá um passo à frente, se virando
de frente para mim.
— Para ser franco, vim apenas três vezes aqui, ainda durmo naquele
mesmo quarto de hotel. — Ariel olha em volta, parando sua atenção em mim.
— Eu comprei ela tem quatro semanas. Um antigo cliente de Nova York, que
é corretor de imóveis, entrou em contato com alguns conhecidos e conseguiu
achar essa casa para mim.
— Ela é linda, muito linda! — Desvio meus olhos dos seus,
abaixando para meus sapatos. Esfrego meu braço com minha mão, podendo
imaginar como as crianças vão ficar felizes aqui, quando vierem visitar o pai.
— Tem bastante espaço, é distante, gosto disso.
— Sim, tem bastante espaço, e parece ser muito segura. — Ergo meu
rosto para ele, tentando não me sentir melancólica. — Vai ser bom para você
ter todo esse espaço com a chegada dos bebês. Veja se aquele quarto lhe
agrada, escolhi ele para ser o quarto de casal por conta do quarto ao lado, que
vai ficar com as crianças.
— Como? — Pisco, confusa, olhando na direção dos corredores do
quarto. — Quarto de casal?
— Não pensou que vou dormir no sofá, não é?
— Não somos um casal, Ariel, a gente apenas...
— Transa e faz filhos no tempo livre?!
Ele arqueia a sobrancelha, me encarando, negando com a cabeça.
Esfrego minha nuca, batendo meu pé no chão, preocupada.
— O que está querendo dizer com quarto de casal, Ariel?
— Estou falando sobre onde os casais dormem juntos depois que se
casam.
— VOCÊ QUER CASAR?!
— Esperava pelo menos um anel ou você de joelho, um pedido
romântico. Mas, pedindo assim, tão eufórica... eu aceito! — Ariel passa por
mim e entra na casa, me deixando atrapalhada com o cinismo dele e com essa
mania de distorcer minhas palavras.
— Ariel... Ariel, volte aqui, eu não lhe pedi em casamento, você sabe
muito bem disso! — Caminho rápido atrás dele. — Não pretendo me casar.
— Uma pena, porque você já pediu e eu aceitei. — Ele aponta para a
mesa, nem sequer se dando ao trabalho de disfarçar sua arrogância. — Tem
que se alimentar, se sente.
— Não vamos nos casar, doutor Miller! — Puxo a cadeira, me
sentando emburrada, discordando completamente dessa ideia absurda. —
Não existe casamento por conta de filhos, está me entendendo? Somos dois
adultos e podemos agir como tais.
— Preparei torradas, se quiser tem frutas, o que prefere?
— Ariel, pare de me ignorar!
— Não estou lhe ignorando, fiz uma pergunta comum. — Ele aponta
para a torradeira e para as frutas em cima da mesa. — O que prefere?
Filho da puta prepotente, está fazendo isso de propósito, nem sequer
dá ouvidos para o que eu falo! Retiro os óculos e esfrego meu rosto, bufando
com raiva pelas minhas narinas.
— Não vou me casar com você...
— Torrada. — Ele pega um prato, indo para a torradeira, caminhando
com preguiça. — Entenda uma coisa, Cristina, não vou ver meus filhos em
horários estipulados ou festas de final de ano, muito menos deixar outro
homem criá-los.
— Não funciona assim. Você, melhor do que ninguém, entende de
leis e sabe que podemos ter a guarda compartilhada. Eu já tenho vontade de
matar você apenas por trabalharmos juntos, imagina se for sua esposa?
— Pequenos detalhes matrimoniais que podemos chegar em comum
acordo.
— Casamento não é um acordo. E eu vou deixar claro para que
entenda: não vou me casar com você!
Ariel se vira rápido, depositando o prato à minha frente e o
empurrando para mim. Mesmo sobre seu olhar zangado, não desvio nem por
um centímetro meus olhos dos dele.
— Entenda uma coisa: não vou deixar meus filhos em perigo por
conta da sua teimosia, e muito menos lhe deixar voltar para aquele
apartamento. — Seus punhos se fecham ao lado do corpo, cerra seu maxilar.
— Quem segurou você no colo foi eu, quem teve que descobrir a existência
dos meus filhos enquanto você estava entrando no pronto-socorro foi eu, não
estou inclinado a revogar minha sentença.
— Não sou uma das suas clientes, doutor Miller! Muito menos um
acordo comercial será feito pela segurança dos meus filhos. Vou voltar para
minha casa...
— PELO AMOR DE DEUS! O FILHA DA PUTA ENTROU NO
SEU APARTAMENTO, CRISTINA!
Me calo, ficando congelada assim que sua voz estoura dentro da
cozinha, seguida de um soco forte em cima da mesa. Sinto meu corpo
trêmulo e assustado, meus olhos arregalados, e respiro com força. Ariel
amaldiçoa baixo, recolhendo seu braço, com sua face vermelha de raiva,
virando de costas para mim. Não consigo falar, nem sequer sei se posso me
mexer, me sinto paralisada com seu rompante.
— Merda! — Vejo suas mãos passarem por seus cabelos, com ele
soltando uma respiração pesada. — Preciso que entenda que não está segura.
Renan entrou dentro daquele apartamento sem ninguém ver. Ele deve ter
entrado no quarto enquanto você dormia, depois de disparar o alarme do meu
carro, o que me obrigou a descer para o desligar. Ele não teve medo de ser
pego, ele foi frio, deixando um animal degolado dentro do seu banheiro,
Cristina. — Fecho meus olhos, desejando poder esquecer aquela barbaridade
feita ao pobre animal. — Nossos filhos não estão seguros. Quero cuidar de
vocês.
Ariel gira seu corpo e caminha lento, parando perto de mim. Observo
sua mão tão grande, com os nervos vermelhos, por ter socado a mesa. Ele
poderia me derrubar apenas com um tapa, se ele quisesse.
— Não me olhe assim, por favor. — A voz rouca dele sai baixa. Se
aproxima mais um pouco de mim, com cautela. — Estou zangado, isso é
visível, mas eu nunca machucaria você. Nunca na minha vida eu lhe faria
mal, Cris.
A verdade é que, no fundo do meu coração, eu desejo poder acreditar
nisso, mas as memórias que me prendem me seguram ao meu medo. Eu
nunca conheci Ariel verdadeiramente, não sei como era sua vida em Nova
York, muito menos como foi sua relação antiga. As palavras de Max voltam a
me assaltar e tudo me amedronta.
— Só quero cuidar de você. — Ariel estica sua mão para tocar as
minhas em cima da mesa, mas para seus movimentos assim que eu recolho as
minhas, as depositando em minhas pernas.
— Eu vou ficar aqui até minha mãe retornar de viagem, Ariel. Já tem
minha resposta sobre sua ideia de casamento, e ela é irrevogável.
Empurro meu corpo para fora da cadeira e me levanto apressada.
Sinto minhas pernas fraquejarem pelos tremores enquanto caminho, voltando
para o quarto, tentando manter o controle da minha respiração. Fecho a porta
atrás de mim, meu rosto se inclina para frente, repousando minha testa na
madeira, sentindo toda as lembranças me rasgarem de dentro para fora.
Gatilhos, malditos gatilhos sendo disparados dentro da minha mente!
— Não faz nada, absolutamente nada nessa porra de vida, e a única
coisa que te peço, ainda faz errado! — Renan se move rápido, me deixando
encurralada na porta do banheiro. — Tem alguma coisa aqui dentro? Hein?
Sabe usar isso que tem na sua cabeça? — Seu dedo esmaga com força minha
testa, cutucando com raiva. — O nome dessa porcaria é cérebro, mas acho
que você não tem, é oco aí dentro, vazio igual seu útero!
— Eu não fiz de propósito, sinto muito. — Fecho meus olhos,
desejando desaparecer.
— Você sempre sente muito. Sente pelo quê, Cristina? — O som do
punho socando a porta do banheiro, ao lado do meu rosto, me faz ficar
paralisada. — Pelo que sente? Por ser uma imprestável? — ele grita com
raiva, empurrando sua camisa estragada com força para meu peito.
Continuo petrificada, enquanto ele se afasta, entrando no chuveiro,
me xingando por conta do tecido da sua camisa polo que diminuiu durante a
secagem na máquina de lavar e secar. Me arrasto de mansinho, saindo do
quarto, usando como abrigo a lavanderia. Tapo meu rosto, chorando por ser
tão burra, por não ter separado as peças de roupas na hora da lavagem.
Estou tão atarefada, que apenas peguei todas as roupas e joguei dentro da
máquina, não conferindo quais estavam misturadas. Nem para lavar a
porcaria de uma muda de roupa eu presto!
— Ei, bonequinha. — A voz baixa fala tão lenta perto do meu ouvido,
abraçando meu corpo por trás. — Estou zangado, não queria te magoar. —
Renan beija o topo da minha cabeça, acariciando sua face em meus cabelos.
— Eu nunca machucaria você, nunca na minha vida eu lhe faria mal, amor.
Você é minha bonequinha de porcelana.
Sinto seu peito úmido pelo banho se colar em minhas costas. Sua mão
empurra meus cabelos para meus ombros, beijando meu pescoço. Sinto a
lágrima escorrer pela minha bochecha, tão dolorosa, como se seu toque me
machucasse.
— Eu cuido de você, protejo você.
O arrepio que percorre meu corpo não é de prazer, e muito menos de
emoção por seus carinhos, é apenas a mais pura melancolia.
— Eu cuido, não cuido?
Sua mão esmaga meu peito por cima do tecido do vestido, mordendo
minha orelha com força.
— Responda minha pergunta, Cristina! — Sua voz não é mais baixa,
o tom carregado de agressividade escondido em rouquidão é firme. Ele leva
a outra mão para a barra do vestido.
— Sim, sim, você cuida. — Tento segurar sua mão, para ele não
erguer meu vestido, mas isso apenas o instiga. Nos empurra para perto da
máquina e pressiona a frente do meu corpo nela. — Renan, por favor... Por
favor, hoje não.
Minhas palavras são apenas um murmúrio em meio ao choro. Não
quero seu toque em meu corpo.
— Cuido de você, lhe dou uma vida de princesa. Sabe que sem mim,
você não seria nada, Cris. — Sua respiração quente acerta minha nuca,
enquanto ele beija minha pele. — É tão distraída, atrapalhada, delicada
como uma bonequinha, por isso eu lhe protejo.
— Renan, por favor...
Sinto o empurrão em minhas costas abruptamente, meu tórax é
inclinado em cima da máquina de lavar, com a lateral do meu rosto colando
ao frio do material de inox do eletrodoméstico.
— E quando eu peço uma coisa, uma única coisa simples, você ainda
faz errado. Isso me deixa chateado, amor. — Sua mão joga o vestido para
cima das minhas costas, enquanto sua perna empurra a minha para o lado.
Sinto seus dedos puxarem a calcinha para o lado e ouço o som forte da sua
respiração. — Você me deixa bravo, me faz ficar zangado com besteira. Por
que faz isso, boneca? Por que gosta de me deixar chateado? Isso é culpa sua.
Mordo meu pulso com força, abafando o grito de dor quando sinto
minha boceta ser invada de forma bruta, sem lubrificação alguma. A mão
forte se prende na minha cintura, tendo a outra sendo posta em meu ombro,
sustentando os impactos do seu quadril em meu traseiro.
— Eu cuido de você, sempre vou cuidar de você, amor.
O som da sua voz em meio aos gemidos sai alta. Me fodendo com
mais rapidez, seus dedos comprimem meu ombro, me fazendo sentir dor com
a força que ele deposita no toque. Abro meus olhos, focando no azulejo
branco da lavanderia, tendo apenas o som da respiração forte de Renan
dentro do cômodo.
— Não cuido bem de você?
— Cuida — sussurro, sentindo minha alma morta, tendo as lágrimas
quentes transbordando pelos meus olhos.
Capítulo 18
Lei e ordem
Ariel Miller

— Tem que ter paciência com a moça, Ariel.


Ergo meus olhos para Greg, que me observa sentado na cadeira do seu
quarto de hotel, ouvindo eu contar sobre Cristina.
— Eu tenho paciência, só que assintomática. — Solto a porcaria da
gravata, respirando com desânimo. — Não sei como fazer ela entender que
não vou deixá-la sozinha e muito menos meus filhos. Não pretendia ser pai,
Greg, jamais me imaginava construindo uma família novamente, mas agora
que tenho, não estou disposto a abdicá-los...
— Já contou isso a ela? Falou sobre Dolly e Silvia com Cristina?
Nego com a cabeça. Tinha passado a noite dentro do hospital, sentado
ao lado do seu leito, revivendo cada momento do meu passado em minha
mente: as brigas constantes entre Silvia e eu, o fim do casamento, a trágica
forma como perdi minha filha. Tudo me nocauteava: a mistura de emoções, a
forma como Cristina entrou em minha vida, os sentimentos novos que ela me
faz sentir, o choque pela descoberta da sua gravidez, o pavor que senti ao
segurar essa mulher desmaiada em meus braços, e o ódio incondicional que
estou nutrindo por Renan Pener.
— Gosta dela? — Levanto meu rosto para Greg, que está pensativo.
— Aprecio a companhia de Cristina.
— Da mesma maneira que apreciava a companhia de Silva quando
vocês dois se casaram? Porque, se for assim, você já sabe que não vai
funcionar.
— Não! — Minha voz sai firme, negando essa comparação entre a
empolgação que eu e Silvia sentíamos um pelo outro, ao que Cristina me faz
sentir. — Cristina é diferente, ela me desperta emoções confusas.
Não sei como explicar, nem sei ao certo como dizer a ele que aquela
mulher me leva do céu ao inferno em questão de segundos, me desencadeia
batidas descompassadas em meu coração na mesma proporção que a vontade
de estrangular seu pescoço fino por conta da sua teimosia é grande.
— Talvez esteja fazendo errado, meu amigo. Sempre admirei sua
inteligência e astúcia dentro de um tribunal. Como advogado, seus atributos
intelectuais são incontestáveis, mas quando se trata de sentimentos, assuntos
do coração, você é um ser obtuso — Greg fala, rindo. Se levanta e caminha
para o frigobar.
— Obrigado pela sua franqueza desnecessária, Greg — o respondo
com ironia.
— Qual é, Miller? A garota não tem lembranças nem um pouco
memoráveis do seu antigo matrimônio, passa por uma situação pavorosa, e
você acha que ela iria ir saltitando para os seus braços, quando você a pediu
em casamento?
Desvio meus olhos dos seus, ficando calado. Greg pega uma garrafa
de água do frigobar, o fechando, ficando estático, me encarando por um
segundo.
— Oh, merda! Não me diga que você nem ao menos fez um pedido
decente para a garota.
— Tecnicamente, foi ela quem fez o pedido.
— Usou manobras com ela, não foi?! Filho da puta! — Greg abre a
garrafa de água, a levando aos lábios, enquanto sorri.
— Ela vai aceitar, apenas preciso achar uma forma de induzi-la a ver
que meu ponto de vista é mais assertivo que o dela.
— Assertivo seria você agir como um ser humano e descartar todos os
protocolos que aprendeu em todos esses anos de advogado. Lidar com uma
mulher que deseja ter ao seu lado não é como um caso jurídico, Ariel, mas
sim coração. Use isso, não isso. — Greg aponta do seu coração para sua
cabeça. — Mude a estratégia, seja paciente e descubra uma forma de
conseguir demonstrar esse lado meigo que você deve ter enterrado em algum
canto bem fundo e escuro da sua alma.
Fecho meus olhos e nego com a cabeça, rindo com a forma de velha
casamenteira que Greg tinha se transformado.
— Obrigado pela sua consultoria amorosa, mas não foi para isso que
eu pedi para que viesse para Sacramento, Greg. — O encaro sério,
finalizando essa conversa de coração. — Como foi a viagem para cá?
— Foi maçante. Sabe como é. Mas esse hotel que arrumou para me
hospedar é bom. — Ele pisca para mim, sorrindo irônico. — Então me
chamou aqui para eu ser seu padrinho de casamento, ou uma testemunha a
seu favor, caso a moça denuncie o cárcere privado que você impôs a ela?
— Ela não está em cárcere privado, Greg. — Fecho meu semblante,
negando com a cabeça.
— Não? Jura? Então me conte quantos seguranças ficaram cuidando
da sua casa, com ordem absoluta de não a deixar sair da sua residência?
— Dois — falo baixo, desviando meus olhos dos seus, verificando a
hora em meu pulso.
— Miller? — Sua impertinência aumenta, com ele me encarando
astutamente.
— Inferno! Foram cinco, ok? Deixei cinco seguranças — respondo
rápido, afrouxando o nó da minha gravata. — Preciso ir para as montanhas,
tenho que garantir a segurança dela.
— Viu, isso para mim se enquadra legalmente em sequestro.
— Não, não se enquadra. Legalmente sou apenas um homem
superprotetor com a segurança da minha residência e de quem está dentro
dela.
— Seu cretino. — Greg ri e caminha para perto da sacada. Ele cruza
seus braços, me olhando sério. — Disse que vai para as montanhas, está indo
para Georgetown, visitar o velho?
— Sim. — Respiro fundo, confirmando com a cabeça para Greg.
— Já tem quanto tempo que vocês não se falam? Três ou quatro anos?
— Greg coça a nuca, soltando um longo assobio, me olhando curioso.
— Desde a morte de Dolly.
— Nossa, tem tempo que estão sem se falar. Vai contar para o
desembargador sobre os netos dele?
Eu não sei ainda. A verdade é que ir visitar meu pai é a última coisa
que eu quero, mas sei que ele é o único a poder me dar qualquer tipo de
informação sobre a família Pener. Seus contatos antigos sempre lhe devem
favores, e não há nada que o desembargador Ostem Miller não saiba.
— Ele pode saber de algo útil para me auxiliar com o pai de Renan,
afinal, é justamente por conta do velho que esse merda se garante.
— Durante a viagem analisei os documentos que me mandou por e-
mail, pelo visto vai querer trabalho completo, né, Miller?
Balanço minha cabeça para ele em positivo. Greg é bom no que faz, o
conheço desde que comecei minha carreira de advogado. Trabalhamos em
muitos casos juntos, com ele levantando todas as informações dos meus
clientes, me deixando me antecipar a qualquer alegação do lado oposto. É o
melhor detetive particular que já conheci. A princípio, o chamei para me
ajudar com Stano Brat, mas agora tudo mudou, meu alvo se tornou um só.
— Quero tudo sobre Pener. O que faz, o que fez, quantas mulheres já
passaram pelo mesmo que Cristina passou nas mãos dele. Se esse filho da
puta der um espirro, eu quero saber quem foi que lhe entregou o lenço.
— Pode deixar, chefe. — Greg balança a cabeça em positivo, me
deixando saber que ele não falhará. — Vou fazer um pente fino minucioso.
— Mandei o endereço do apartamento dela para seu e-mail também,
quero que vá até lá, converse com os vizinhos, com os pedintes da rua,
qualquer um que o tenha visto. A polícia disse que não tem nada que prove
que foi Renan que entrou no apartamento dela, que as câmeras de segurança
do prédio não pegaram ninguém, mas eles não procuraram as câmeras dos
comércios da rua. Deve ter alguma, de um poste, banco ou da loja de
conveniência que tem na esquina, pode ser que uma delas o tenha filmado.
— Depois disso, o que pretende fazer?
— Ele é um predador frio, Greg. Sem medo porque sabe que tem
costas quentes com o cargo político do pai dele, mas como todo predador que
se sente inalcançável, está propenso a erros. Ele deve ter deixado rastro, deve
ter caçado durante esse tempo do divórcio. — Respiro fundo, batendo a ponta
do meu sapato no chão. — Busque pelas mulheres que passaram pela vida
dele, antes e depois de Cristina.
— Se estiver certo em suas suspeitas, não será apenas um agressor.
— Sim, exatamente isso — respondo baixo.
Se eu realmente estiver certo em minhas suspeitas, Renan Pener é
mais perigoso do que Cristina pensa. Tinha visto suas fotos, seus olhos
vazios, ele é um predador nato.
— Sei de uma promotora de justiça que vai gostar de saber que existe
um predador sexual à solta em Sacramento.
— Adele?! Jura? — Balanço a cabeça em negativo para ele. — Ela
me odeia desde o caso de Lorax.
— Não tinha como saber o que aquele monstro iria fazer depois que
foi absolvido.
— Sim, eu tinha — falo sério para Greg, me virando, caminhando
para a janela do seu quarto de hotel.
Eu sabia, dentro de mim, que Charles Lorax era um maníaco filho da
puta. Os olhos frios sem alma que me encaravam, quando o homem sentou-se
na cadeira dentro da minha sala na primeira vez que o vi, confirmavam que
ele era culpado. Charles Lorax tinha espancado aquela mulher com toda força
que seu punho pôde desferir no rosto dela. A garota de programa apenas
conseguiu se salvar porque acertou um chute entre as pernas dele quando ele
tentou estrangular seu pescoço, e aproveitou o segundo de chance, pulando
pela janela da sala, correndo para a rua, gritando incêndio. Todos os vizinhos
saíram para fora, para saber o que tinha acontecido, mas ela não parou,
continuou correndo, até ninguém mais a ver. Reapareceu duas semanas
depois, que foi quando deu queixa na polícia. Adele se interessou pelo caso
de agressão na mesma hora, ainda mais porque estava de olho em Lorax há
muito tempo. Ele já tinha espancado outras prostitutas, mas nenhuma delas
iam adiante, retiravam a queixa no outro dia.
Eu não me importei. Nunca me importei com quais eram os motivos
que faziam meus clientes passarem por minha porta em busca do meu
serviço. Apenas cumpria meu trabalho, finalizava os casos e me concentrava
no próximo. A garota não errou apenas porque procurou a polícia duas
semanas depois, mas sim porque especulou sobre quanto ganharia em cima
de uma indenização corporal. Precisei apenas dessa informação para
desmerecer o caso inteiro diante do tribunal. Sem testemunha que
reconhecesse que foi ela que saiu gritando na rua, sem perícia da agressão ou
confirmação que ele tinha solicitado seus serviços aquela noite, se tornou
fácil derrubar o caso. Foi um castelo de cartas frágil e sem nada sólido, que
não ratificava que foi meu cliente que a espancou. Charles Lorax foi
absolvido pela corte.
Três semanas depois do julgamento, enquanto eu estava trancado
dentro do meu apartamento, sobrevivendo de bebidas alcoólicas e com uma
dor sem fim pelo luto da perda de Dolly, acompanhei pelo noticiário matinal
a prisão de Charles Lorax, pelo assassinato de uma garota de programa.
Livinia Lin tinha vinte anos e estava se vendendo para pagar a faculdade. Ela
foi brutalmente estuprada e depois teve seu corpo esquartejado, sendo
enterrado no quintal, ao fundo da residência de Lorax. O cachorro do vizinho
apareceu um belo dia roendo o pé de um cadáver e, automaticamente, seu
dono ligou para a polícia. Adele tinha me dito no dia do julgamento, quando
Charles foi absolvido, que desejava que eu sofresse muito com a minha
consciência quando isso acontecesse. E ela tinha razão, eu sofri, e não tem
um maldito dia da minha vida que não fecho minhas pálpebras e não pense
nos olhos frios de Charles Lorax, sentando-se à minha frente e me dizendo
que era inocente, mesmo eu sabendo que ele era culpado.
Não vou cometer esse mesmo erro com Pener. Não vou cometer o
mesmo erro, o qual eu cometi com Dolly, com meus filhos e Cristina.
— Quando vai querer que eu comece?
Me viro para Greg, retirando minha mão do bolso. Arranco meus
óculos escuros, que estão enganchados em minha camisa, os levando para
meu rosto, e digo:
— Agora.
Lhe dou sua resposta e caminho para a porta de saída do quarto.
Cristina Self

— A senhora precisa de alguma coisa?


— Senhorita — respondo séria, fechando meu semblante para o
gigante homem parado diante da porta. — Preciso que saia da minha frente.
— As ordens que recebi são para deixá-la dentro da casa, senhorita —
ele fala calmo, esticando seus braços, parando-os à frente do seu corpo, com
seus ombros retos. — Se deseja algo, apenas precisa me dizer, que peço para
um dos meninos ir buscar.
— Ordens... — Respiro fundo, puxando o ar pelo nariz, esmagando
minha bolsa em minha mão, tentando compreender o que Ariel aprontou. —
E como assim meninos?
Estico meu pescoço, olhando para o lado, tentando ver algo, me
atentando às palavras do grande homem.
— Os outros seguranças, senhorita. Sou o chefe dos seguranças, estou
aqui como seu guarda-costas pessoal...
— Oh, meu Deus! — Ergo a mão para meu coração, espalmando-a
sobre a camisa, esfregando freneticamente, sentindo minha respiração se
acelerar. — Não acredito que ele teve a audácia de fazer isso...
— Está se sentindo bem? Precisa de um médico? — o grandão com
voz rouca fala, preocupado, dando um passo em minha direção. O que
automaticamente faz meu corpo dar três passos para trás, balançando a
cabeça em negativo.
— Vou matá-lo... Deus, vou matar aquele homem! — Quero gritar de
ódio.
Apenas queria sair um pouco da casa, já estava cansada de ficar
deitada a tarde toda. Seria uma esticada de pernas, uma caminhada para tentar
descobrir exatamente onde estou. Mas foi apenas abrir a porta da casa, para
me deparar com o protótipo de Wesley Snipes[25], parado feito uma estátua,
me encarando. A face fechada, com o cabelo curto em corte militar, deixa o
homem negro mais mal-amado, com seus óculos escuros e o grande casaco
preto que ele veste, além do coturno de soldado no pé. Se ele me dissesse
agora que sai caçando vampiros no meio da noite, igual no filme Blade[26],
eu acreditaria.
— Quantos de vocês ele deixou aqui?
— Cinco, senhorita.
— CINCO? — A palavra sai em um grito pelos meus lábios, com
meus olhos se expandindo em espanto. — O que ele acha que eu sou? Uma
criminosa fugitiva? — Nego com a cabeça, não vou aceitar essa loucura de
Ariel. — Olha, não quero ser grossa com você... — Pisco, confusa, tendo que
ficar com o pescoço esticado para encarar o grande homem. — Qual seu
nome, moço?
— Me chamo Brow.
— Brow, eu sou a Cris...
— Cristina, senhorita Cristina Self, doutor Miller me passou todas as
informações sobre a senhorita.
— Claro que ele passou, aquele egocêntrico de merda! — xingo Ariel
com raiva, olhando para dentro da casa. — Olha, eu não preciso de segurança
para sair e comprar uma barra de chocolate ou dar um passeio. Pode ir
embora, sim? Eu não preciso dos seus serviços.
— A senhorita quer de qual marca?
— O quê? — Olho confusa para ele, que me interrompe, parecendo
não ouvir o que eu acabei de lhe falar.
— O chocolate.
— Eu não sei, gosto de todos. Veja, meu sabor preferido de chocolate
não vem ao caso, o ponto dessa conversa é o que estou te falando agora, eu
não preciso de um guarda-costas...
Ele se vira, me largando falando sozinha, levando sua mão à orelha
enquanto conversa com alguém. O celular dentro da minha bolsa começa a
tocar, me fazendo abri-la com raiva. O atendo de forma brusca, levando-o ao
meu ouvido.
— Alô — murmuro com ódio.
— COMO ASSIM EU VOU SER AVÓ?
O grito estridente do outro lado da linha me fez afastar o aparelho
alguns centímetros da minha orelha.
— Graças a Deus! — Me sinto aliviada ao reconhecer os gritos da
minha mãe. — Por que não me atendeu e não retornou minhas ligações, mãe?
— Eu estava fazendo um tour por Marrocos, deixei o celular no hotel
que estou hospedada, sabe que não mexo muito nele.
— Eu te liguei, só Deus sabe quantas vezes, mãe. Tem ideia da
loucura que está minha vida? — Respiro com urgência, massageando minha
nuca, desejando poder passar pelo outro lado da linha e esganar essa mulher.
— Eu sinto muito, meu amor, sabe como eu sou. Respire com calma.
Ande, estou ouvindo sua respiração disparada daqui. — Tento não prestar
atenção na voz debochada dela enquanto estou sofrendo um ataque de raiva.
— Não sabia que se eu lhe deixasse sozinha por um tempo você iria adotar
uma criança.
— Mãe, eu não adotei uma criança, eu estou esperando um bebê —
falo rápido.
— Mas, você...
— Renan mentiu, mãe. Aquele resultado não era o meu, e sim o dele.
— Fecho meus olhos, encostando meu corpo na parede. — Eu nunca fui
estéril, mãe, eu nunca fui uma inútil.
— Deus, vou matar aquele verme nojento! Apenas uma ligação e
você sabe que eu posso achar alguém para dar fim na vida daquele
merdinha!
— Mãe, esquece isso. Meu problema agora não é Renan. — Abro
meus olhos, encarando a grande casa de Ariel. — Preciso que volte, tem que
voltar o quanto antes para Sacramento. Compre a porcaria de uma passagem
e volte para casa. Minha maior dor de cabeça nesse momento é o pai dos
meus bebês.
— BEBÊS? — ela grita outra vez. Afasto o aparelho da minha orelha,
repuxando meu nariz. Estou com uma agonia nos meus tímpanos pelos gritos
dela. — VOCÊ ESTÁ GRÁVIDA DE GÊMEOS? Quem é o pai dessas
crianças, Cristina?
— Oh, meu Deus, mãe, eu nem sei como explicar! — Nego com a
cabeça. — O cara apareceu no meu trabalho, nós tomamos um porre de vodca
e eu dormi com ele. Jurava que Ariel era um garoto de programa que você
tinha me mandado, então fui embora correndo depois que ele dormiu. No
meio das férias, passei mal, o teste de gravidez deu positivo, descobri que são
gêmeos, e o cara que eu achava que era o garoto de programa, na verdade, é
Ariel Miller, meu chefe. A gente se encontrou quando voltei ao trabalho.
— Cristina, fale devagar — ela me corta, me deixando saber que
estou falando tudo atropelado, vomitando todas as informações de uma vez
só.
— Mãe, preciso que volte, apenas faça isso por mim.
— Respire com calma e me deixa ver se entendi. Dormiu com um dos
seus chefes?
— Sim.
— E não foi com Max e muito menos Pietro?
— Isso, mãe. Claro que eu nunca iria dormir com Max e jamais com
Pietro. Pelo amor de DEUS! Qual parte do novo chefe não ouviu?
— Ok, ok, apenas queria ter certeza de que estou entendendo.
Dormiu com o chefe novo? E como não sabia que era ele seu chefe? Meu
Deus!
— Mãe, se lembra do nosso café da manhã no dia do meu
aniversário? Recorda-se de dizer que mandaria meu presente para o serviço?
No momento que ele falou o nome dele, eu tive certeza de que você mandou
um garoto de programa. Nunca me passou pela cabeça que ele seria o novo
sócio da firma.
— Que ideia mais absurda! De onde tirou uma coisa dessas,
Cristina?!
— Mãe — rosno com raiva, esmagando o aparelho com força. —
Vamos ver de onde eu tirei uma ideia absurda dessas. No meu aniversário de
vinte e cinco anos, você me deu um kit de vibradores; no de vinte e seis, um
vale-massagem com final feliz em um local bem suspeito; sem esquecer o
presente dos vinte e sete, que a senhora contratou um stripper para arrancar a
roupa no meio da sala da sua casa, na hora de cantar os parabéns. Me
desculpe se passou pela minha cabeça que você teria coragem de me mandar
a porcaria de um garoto de programa!
— Jamais mandaria um garoto de programa para seu trabalho...
— Você mandou, tanto que ele também apareceu lá. — Me recordo
do rapaz que ficou com aspecto confuso quando lhe entreguei o envelope.
Cristo, se não tivesse ficado tão eufórica com o beijo de Ariel dentro daquele
escritório, teria visto o imenso engano que tinha acontecido.
— Lober? Está se referindo ao decorador de interiores?
— Como? — pergunto, pasma, sem entender mais nada agora.
— Lober Tiler, o rapaz que mandei para seu trabalho. O serviço dele
era seu presente, uma decoração para seu quarto, em seu apartamento novo.
Confesso que tinha esperança de que você se encantasse com ele, quem sabe
saíssem para beber...
— Decorador? — Caminho para perto da mesa da sala de estar,
deixando a bolsa em cima dela, me segurando na cadeira. — Mãe, eu vi o
cartão da agência de garotos de programa, como agora está me dizendo que
mandou um decorador?
— Cartão? — ela pergunta, perdida, logo caindo na risada, deixando
sua gargalhada ficar estridente. — Oh, meu Deus, Cris! O cartão da agência
de garotos de programa era de Filipe.
— O carinha da semana? — Tento respirar fundo, não acreditando
nas loucuras que ela faz.
— Claro! Como acha que ele sabia usar tão bem aquela língua?
Filipe valeu cada centavo que paguei por ele.
— Meu Deus, a senhora vai me fazer ter um infarto! — A sombra
parando ao meu lado me faz virar o rosto na mesma hora para Brow, que está
com uma sacola estendida para mim.
— Seus chocolates, senhorita Self.
— Isso é a voz de um homem, Cristina? — A voz curiosa da minha
mãe é alta no telefone.
Fico com a boca aberta, olhando perdida para ele, abaixando meus
olhos para a sacola. Dou um passo para perto dele e movo minha cabeça para
ver a sacola cheia de barras de chocolates variadas, que ele estende para mim.
— Solicitei para trazerem todas as marcas que achassem.
— Oh, meu Deus! — Pego a sacola da sua mão, ainda não
acreditando que o homem fez isso. Eu dei apenas um exemplo para ele, não
que estivesse indo comprar chocolate. — Obrigada, Brow. — Sorrio sem
graça para ele.
— Precisa de mais alguma coisa?
— Essa voz é do cretino que enfiou o pau dentro da sua boceta e te
engravidou? — minha mãe grita tão alto, que até Brow arregala seus olhos
com a pergunta descabida dela.
Tapo o celular, fechando meus olhos e balançando a cabeça em
negativo, sussurrando um “sinto muito” para ele.
— Eu preciso... preciso... — falo atrapalhada, apontando para a
direção do sofá da sala para ele. — Vou me sentar um pouco, acho que minha
pressão subiu.
Brow concorda com sua cabeça. Me viro lentamente e caminho, indo
me sentar no sofá.
— Deus, eu vou infartar antes dos trinta! — resmungo, chateada. —
Mãe, ainda está aí?
— Claro que estou! Quem está no seu apartamento?
— Mãe, não estou no meu apartamento. Ariel me trouxe para a
residência dele, a voz que ouviu é do guarda-costas que ele pôs na porta de
entrada, para eu não sair de dentro dessa casa. Isso é praticamente um
sequestro manipulado.
— Guarda-costas? Ele te levou à força? Machucou você?
— Não, não, Ariel não fez isso. Talvez ele tenha me trazido a
contragosto, mas não à força. Tive uns problemas com o apartamento. — Lhe
dou uma breve informação, não querendo entrar em detalhes sobre o pobre
gato dentro do meu banheiro, que me fez parar no hospital. — Preciso que
volte. Faça as malas e volte agora, por favor... Por favor, preciso sair daqui e
descobrir uma forma de me mudar para outra cidade e fazer ele desistir dessa
ideia de casamento.
— Eu já retorno a ligação! — ela fala rápido, antes de deixar apenas
o som da ligação encerrada repercutir no aparelho.
— SÉRIO?
Olho meu celular, não acreditando que ela desligou na minha cara,
sem cerimônia alguma. Grito com raiva, jogando o celular no sofá, abrindo a
porcaria da sacola e puxando uma barra de chocolate para mim. Desconto
minha ira na embalagem, a rasgando com o dente e mordendo com o dobro
de zanga a guloseima.
— Um suco fresco lhe ajudaria a se acalmar?
Meus cílios batem rapidamente, com meu pescoço girando para cima
do meu ombro. O gigante homem está com um copo de suco estendido para
mim, me dando um sorriso amável, e por um breve segundo me sinto
afeiçoada pelo gentil senhor Brow.
Capítulo 19
O desembargador
Ariel Miller

— Bete me avisou que queria falar comigo, estou de saída em cinco


minutos.
Entro na sala de Pietro depois que bato na porta e ele me chama para
entrar. O vejo sentado em sua cadeira, rindo ao telefone.
— Claro, claro que entendo. A propósito, falando no diabo, ele
acabou de aparecer. — Pietro ri escancarado com algo que ouve do outro
lado da linha. — Não, não se preocupe. Sabe que jamais mentiria para você.
Respiro fundo, me sentindo estressado por estar perdendo meu tempo
aqui. Estava tentando pôr meus pensamentos em ordem e focar em meus
casos, quando a secretária de Pietro bateu em minha porta, me
interrompendo. É para ser apenas uma passada rápida no escritório antes de
eu ir para o aeroporto.
— Vou passar para ele, depois nos falamos mais.
Arqueio minha sobrancelha, olhando sem entender para ele, que estica
o telefone em minha direção. Notando minha desconfiança, ele usa sua mão
para bloquear a parte inferior do telefone, inclinando seu corpo para perto da
mesa.
— Lhe aconselho a atender, vai precisar de reforço.
— Quem é? — Estico meu pescoço e olho o aparelho.
— Isso vai depender de você. Se lhe disser o que ela quer saber com
sinceridade, vai ser sua melhor amiga; se mentir, lhe garanto que vai ser sua
carcereira.
Pego o aparelho da mão dele, o vendo se levantar lentamente da sua
mesa, com um sorriso cretino na face, caminhando para fora da sua sala e
fechando a porta atrás de si. Fico um tempo ainda olhando o telefone, antes
de o erguer, levando-o ao meu ouvido.
— Ariel Miller falando.
— Sei quem é você, doutor! Se não soubesse, não teria ligado atrás
da sua pessoa!
— Desculpe, mas quem está falando?
— A avó dos seus filhos, senhor Miller! — A mulher de voz séria fala
rápido, o que me faz xingar Pietro mentalmente, por não ter me avisado sobre
a identidade de quem estava do outro lado da linha. — Bom, serei breve e
franca, não tomarei muito do seu tempo. Pietro já me repassou o que
precisava saber sobre seu caráter, então apenas lhe dou um aviso: se
realmente pretende ser um homem bom para Cristina, sugiro que faça isso
antes de eu regressar para Sacramento, pois quando isso acontecer, e eu ir
direto para a porta da sua casa, onde está hospedando minha filha, e ela
ainda desejar querer sair de lá, não vou pensar duas vezes antes de chutar
seu rabo para tão, TÃOOO distante dela. Fui clara, doutor Miller?!
— Sim. — Rio, balançando a cabeça para frente e para trás, podendo
ver a pequena mulher bater na porta da minha casa, cumprindo sua promessa.
— Não pretendo deixar sua filha longe de mim, senhora Self, e muito menos
não participar da vida dos meus filhos. Quero cuidar dela...
— A última vez que um homem disse para Cristina que cuidaria dela,
isso quase lhe custou a vida, doutor Miller!
— Eu sei sobre Renan Pener, creio que nós dois dividimos o mesmo
sentimento por ele.
— Não, o senhor não sente nem um décimo do que eu sinto por esse
homem. O desejo de explodir da face da Terra a existência de alguém que
machucou seu filho. Esse sentimento perpétuo de ódio contra alguém que
feriu a parte mais importante do seu corpo cabe apenas aos pais, doutor
Miller. — Meus olhos se fecham ao ouvir o suspiro melancólico do outro
lado da linha. — Eu a segurei em meus braços, eu vi a monstruosidade que
ele fez a ela, eu limpei seus ferimentos enquanto ela chorava amedrontada,
com medo de buscar ajuda, se negando a ir ao hospital e ele ir atrás dela.
Foram os meus joelhos que se dobraram ao chão, segurando sua mão entre
as minhas, enquanto o médico lhe dava os primeiros socorros dentro da
minha casa.
— Posso lhe garantir que sei o que a senhora sentiu, senhora Self. A
única diferença é que um de nós pôde continuar com sua filha. — Solto o ar
dos meus pulmões pela minha boca, abrindo meus olhos, que ficam presos na
janela aberta. — Já nutri ferozmente por alguém esse mesmo ódio que a
senhora sente por Renan Pener.
— Lamento por sua perda, Ariel. — A voz branda, que responde
baixa, é calma ao telefone. — Quantos anos ela tinha quando você a perdeu?
— Dois anos, foi em um acidente de carro. — As palavras pesam ao
sair pela minha boca. Não falo sobre Dolly, é um assunto que evito dizer em
voz alta, mesmo pensando nela todo santo dia da minha vida.
— Cristo...
— Não lhe contei sobre isso para ganhar sua empatia, senhora Self,
mas sim porque quero que entenda o quanto Cristina é importante para mim,
o quão importante meus filhos são para mim. E realmente não pretendo me
afastar de nenhum deles.
— Gosto da sua franqueza, senhor Miller, aprecio a honestidade de
um homem e a respeito. E será por isso que vou lhe retribuir com toda minha
franqueza e sinceridade. Se pretende ficar com minha filha apenas pelos seus
filhos que ela espera, esqueça. Cristina não vai ficar presa a um segundo
casamento. Isso apenas fará com que ela queira se afastar de você, e lhe
digo, não há nada mais selvagem para despertar a ira em uma mulher do que
o instinto de proteção pelas suas crias, o qual a maternidade causa.
— Não quero fazer mal a ela, quero cuidar de Cristina.
— Risque essa palavra do seu vocabulário, não a diga para Cris,
pois vai causar o efeito contrário — ela fala rápido, me deixando pensativo.
— Não compreendi. O que há de errado?
— “Cuidar”, isso é errado. Cuidar, para nós, é proteger, abrigar,
mas para Renan significa a posse, a forma dominadora que ele exercia sobre
ela. Eu assisti minha filha se fechar dentro de uma ostra, ficando
aprisionada, se afastando de todos à sua volta, enquanto ele brincava com
ela, como se ela fosse uma boneca, a deixando com medo de ser cuidada,
porque Renan ensinou para ela que cuidar significa dor.
— Cuidar... — repito baixo a palavra, tendo a recordação entrando em
minha mente.
— Só quero cuidar de você. — Estico minha mão, querendo tocar na
dela, sentir seu calor, lhe mostrar que não precisa ter medo de mim, mas
refreio meus movimentos assim que Cristina tira suas mãos de cima da mesa,
as depositando em suas pernas, como se meu toque fosse indesejado.
— Merda! — Balanço a cabeça em negativo, compreendendo o
porquê dela responder daquela forma o meu contato.
— Sugiro que ache uma forma de chegar até ela antes que eu
atravesse o Oceano Atlântico, Ariel.
A mulher é breve em sua despedida. Reponho o aparelho ao gancho e
encaro silenciosamente o telefone.

Assim que estaciono o carro esportivo na frente da grande


propriedade, depois de ter encarado seis horas de voo, fico em silêncio,
observando a casa de madeira escondida em meio à mata. Quem olha a
propriedade rústica, talhada toda à mão, não imagina que o mais temido
desembargador da Califórnia está se abrigando aqui. Minha relação com o
velho não é a das melhores, mas se não fosse por Cristina, eu realmente não o
teria procurado. Brow me contou sobre como ela passou o resto da tarde. Não
quis informá-la sobre minha viagem precipitadamente, pois sei que
acabaríamos entrando em outra discussão por conta da sua relutância em
perceber que apenas quero proteger e cuidar dela.
Abro a porta do carro e caminho para fora dele, olhando pelos
arredores e voltando a olhar para a casa. A fumaça que sai da chaminé no
telhado me garante que meu pai está em casa. Respiro fundo, alinhando as
mangas do meu blazer, andando até a casa. A grande porta de madeira da
frente da residência se abre, me dando um vislumbre do morador, que segura
uma caneca em seus dedos, parado no batente da porta, dando dois passos
para fora. Paro a três passos da varanda, com as mãos nos bolsos, mantendo
meus olhos fixos aos dele. Meu pai olha para o carro de luxo estacionado
atrás de mim e depois para a minha face com ar aristocrata.
— Estacionou em cima das minhas hortênsias.
Giro meu rosto por cima do meu ombro, olhando para as porcarias das
flores que o pneu da frente do carro está amassando. Repuxo o canto da
minha boca e sinto a fisgada em meu ombro. Retorno meus olhos sérios para
ele, o vendo se virar e caminhar para dentro da casa, deixando a porta aberta.
Estalo meu pescoço, tentando suavizar a tensão que tem em meus músculos,
sabendo que vou odiar cada segundo que passar dentro dessa casa.
— Não espera que eu estenda um tapete vermelho para você entrar,
correto?
A voz ríspida vem de dentro da casa, com as luzes da varanda sendo
acesas.
— Jamais esperaria algo assim vindo de você, Vossa Excelência —
respondo seco, caminhando para dentro da casa.
Meus olhos param nos porta-retratos pregados nas paredes, indo até as
cabeças de cervos que ele ostenta. A espingarda de caça, destacada sobre a
lareira, está lustrada e brilhando, como se ele tivesse acabado de limpá-la.
Puxo a cadeira e me sento em silêncio, observando o velho caminhar dentro
da cozinha, mexendo em um fogão rústico, feito de barro, que ele mesmo
construiu. Desvio minha atenção dele e olho para o porta-retratos com a
fotografia da minha mãe sobre a mesa de centro da sala. Ela possui um
sorriso amável enquanto segura um buquê de girassol. Chega a ser de mau
gosto saber que por trinta e três anos de casamento, minha mãe sonhou com o
dia que meu pai largaria finalmente seu trabalho e viria morar nas montanhas
com ela. Minha mãe tinha desenhado a arquitetura da casa inteira, seria o
chalé dos sonhos dela, mas ela nunca viu o projeto além das linhas das folhas.
O infarto a levou de forma rápida e fulminante quando a pegou. Depois que
ela morreu, ele finalmente se afastou dos tribunais, ficando recluso, como se
tivesse se penitenciado por não ter vivido esse momento com ela ao lado
dele.
— Ainda gosta de café ou mudou esse gosto também? — Meu pai
empurra uma caneca em cima da mesa, me olhando sério, cruzando seus
braços.
— Nunca deixei de gostar de café, desembargador.
— Quem foi que te ensinou esse gosto? — Ele mantém seus olhos
presos aos meus.
— O senhor, desembargador.
— E o que mais lhe ensinei, além do bom gosto, Miller?
A ser um cretino sem remorso como você, meu cérebro responde
rápido dentro da minha mente, desejando que sejam essas palavras que saiam
dos meus lábios.
— Me ensinou muitas coisas que não vêm ao caso agora. — Minha
resposta polida é completamente reversa ao que penso, mas me calo,
quebrando nosso contato visual.
— A ligar antes de vir à casa de alguém, para saber se ela quer lhe
receber, foi uma delas.
Solto o ar com desgosto, ouvindo a voz dele ríspida me recriminar de
forma cínica.
— Preciso da sua ajuda, Meritíssimo. — Nunca me foi tão pesado
falar uma frase, como está sendo agora. Apenas o fato de dizer a frase
“preciso de ajuda” e ela ser direcionada ao meu pai, já me parece um
martírio. Odeio ter que pedir ajuda, ainda mais sendo ele.
— Que você precisa, eu sei! — ele fala sério, cruzando seus braços.
— Apenas algo muito pertinente faria você trazer essa sua bunda arrogante de
Nova York para cá. O que eu não sei, é se quero saber o porquê precisa da
minha ajuda.
— Estou tão radiante de felicidade em te ver quanto você está em me
receber, velho. — Levanto e me afasto da cadeira, socando meus dedos no
bolso da calça com raiva, os esmagando firme.
— Oh, peço desculpa se não fiz uma celebração à altura do notário
cínico doutor Miller, que pensa que toda vez que o vejo, tenho que dar cinco
estrelinhas pelo bom desempenho...
— Qualquer maldito pai me daria cinco estrelas! Eu me fiz longe de
você. Se formei minha fama e minha carreira, foi com meu próprio esforço, e
você nunca teve a capacidade de dizer nada de agradável para mim.
— Não fez mais que sua obrigação. Lhe dei um teto, comida, estudos,
uma vida em um lar honrado. Se é quem é hoje, não foi por suas pernas, mas
sim pela educação que lhe dei, pelo homem que aperfeiçoei você para ser.
Então, de nada!
— Velho miserável de merda! — rosno enfurecido, odiando esse
maldito homem. — Enche essa sua boca velha e flácida para falar de honra,
mas o que sabe de honra? De um lar honrado? Qual honra deu à minha mãe
enquanto você se esquentava em camas de prostitutas? A única coisa que
tenho para lhe agradecer é por eu não ter puxado nada de você,
desembargador.
— No que você foi melhor do que eu, Miller? Um advogado de merda
cínico, que nunca se importou com nada além do seu trabalho. Posso não ter
sido o mais perfeito marido desse mundo, mas eu cuidei da minha casa, da
minha esposa e do meu filho. Já você, o que fez, além de casar-se com uma
vagabunda siliconada, que matou sua própria filha?
Chuto a porcaria da cadeira em uma explosão de agressividade, a
fazendo voar, estourando na parede. Minhas mãos se fecham em punho, com
ódio, ao lado do meu corpo, e respiro rápido, desejando poder chutar esse
velho maldito.
— Você devia ter morrido, não minha mãe — sibilo baixo,
esfregando meu rosto. — Deveria saber que seria perda de tempo ter vindo
atrás de você, sua múmia decrépita.
Giro com hostilidade, caminhando para fora da casa dele, me
amaldiçoando por mil vidas por ter vindo nesse lugar. Retiro a porra das
chaves do meu bolso e ando com amargura na direção do carro. O disparo é
alto e acerta o pneu da frente do veículo antes mesmo que eu possa perceber.
Olho com antipatia para o velho, que está feito uma estátua, segurando sua
espingarda em sua mão.
— SEU LOUCO DE MERDA! — grito com fúria, apontando para
ele. — Essa porra é alugada!
— A janta fica pronta em vinte minutos.
Ele se vira e entra na casa, me largando gritando sozinho, exasperado.
Chuto a porcaria do pneu, que está colado à terra. Abro a porcaria do porta-
malas e xingo o dobro, sentindo meu rosto ferver de ira.
— INFERNO!
O maldito carro esporte não possui estepe. Chuto o pneu do carro
outra vez, aborrecido, o que me faz ficar um bom tempo do lado de fora,
extravasando minha ira entre chutes no pneu, antes que eu tenha que entrar na
casa outra vez. Vejo o velho sentado na cadeira, com uma garrafa de uísque,
e em cima da mesa um copo à sua frente e outro vazio. Caminho na direção
da cadeira caída ao chão, perto da parede, a levanto com brutalidade e a
empurro para perto da mesa, me sentando.
— Eu fui caçar semana passada. — Ouço a voz dele baixa, enquanto
olha para seu copo.
Puxo a garrafa e a destampo, enchendo meu copo, o virando de uma
única vez em meus lábios, olhando com ódio para ele.
— Percebi um rastro diferente e segui para saber do que se tratava. Eu
dei de cara com um urso marrom. Nunca tinha visto um animal magnífico tão
de perto, poderoso, grande e selvagem. A mira estava ajustada para o centro
da cabeça dele, entre os olhos, precisava de apenas um disparo, mas recolhi a
espingarda e voltei lentamente, caminhando de costas, sem desviar meus
olhos dos dele.
— E o que isso me importa? — Encho meu copo outra vez, bebendo
outra dose.
— Suspeito que nada, mas eu fiquei pensando que ele podia ter me
matado da mesma forma que eu a ele. Mas nenhum dos dois quis o confronto.
Você, hoje aqui, é aquele urso, Ariel. Por que veio até minha porta, se não foi
para me confrontar?
Abaixo meus olhos para o copo e o rodo em minha mão. O desprezo
na mesma medida que um dia desejei poder ser motivo de orgulho para ele.
Jurei a mim mesmo que jamais viria atrás dele depois que perdi minha filha.
A última vez que o vi foi parado ao meu lado, diante do caixão, me olhando
com olhos frios, refletindo a mesma culpa que me corroía.
— O senhor será avô... — sussurro para ele e encho meu copo e o
dele. — Avô de gêmeos, desembargador.
Meu pai fica em silêncio por um breve momento, olhando seu copo,
antes de erguer sua face para mim, com seus olhos se expandindo.
— Vai ser pai... Por que não trouxe ela para me conhecer? É mais
uma daquelas plastificadas de Nova York?
Solto o botão do meu blazer e o empurro para o lado, me recostando
na cadeira.
— Sacramento. Não vivo mais em Nova York já tem três meses.
— Está me dizendo que está em Sacramento por todo esse tempo e só
agora resolveu vir me contar que engravidou uma mulher?
— Não sabia sobre a gravidez, fiquei sabendo no fim de semana. Mas
não foi para lhe dar as boas novas que vim até aqui. — Estufo meu peito e
solto o ar pesado dos meus pulmões.
— Claro que não. — Ele ergue seu copo, tomando sua bebida, o
depositando logo em seguida sobre a mesa. — Do que precisa?
— Me perguntou o que tinha me ensinado, e o que me ensinou bem é
sempre estar a dois passos diante dos meus inimigos. Preciso saber tudo sobre
Hugo Pener e sua trajetória na política.
O desembargador se encosta na cadeira e cruza seus braços acima do
peito, me encarando com um sorriso cínico nos lábios.
— Vamos jantar, depois falaremos sobre o lixo!
Capítulo 20
Na companhia do medo
Ariel Miller

A visita ao meu pai me tomou mais tempo do que eu imaginava, não


só pelo transtorno de chamar um guincho para aquela porcaria de fim de
mundo entre as montanhas, mas sim por ter que achar uma borracharia e
trocar o pneu do carro, o que acabou me tomando dois dias. Brow me
manteve informado a respeito de como ela estava, e sobre seu mau humor e
xingamentos, por não poder sair de dentro da casa. Mas por um lado foi bom.
Meu pai conhece Hugo Pener, e com alguns telefonemas foi rápido em
levantar minhas informações. Pener não passa de um político de merda que
teve toda sua campanha financiada por dinheiro vindo da prostituição. Renan
tem a quem puxar, afinal, seu pai não passa de um cafetão revestido com
ternos caros, ocupando um cargo importante no governo. Porém, se
misteriosamente essas informações vierem a público, acho que isso não
deixará o nobre político confortável, já que as investigações que cairão sobre
ele podem destruir sua carreira. Com o pai já sei como lidar, agora apenas
preciso saber o que Greg descobriu sobre Renan.
Passei no escritório quando aterrissei em Sacramento, acompanhando
o caso de Brat, que está perto de ter o julgamento final marcado, o que
acabou tomando mais tempo do que eu imaginava. Quando estaciono o carro
na frente da minha casa já passa das 23h da noite. Pensei nela todos os dias.
Segurava o telefone, desejando poder ligar para ela e ouvir sua voz, saber
como estava, mas a imagem dos seus olhos assustados, me encarando na
cozinha, na última vez que a vi, me fez evitar fazer isso. Não quero que ela
me olhe com medo, amedrontada. Desejo seus olhos brandos e negros, que
ela esconde por trás daqueles óculos grandes de grau, cheios de travessura.
Quero apertá-la em meus braços e dizer que vou condenar todos que tentarem
machucá-la cruelmente, e que nunca mais ela terá que sentir medo em sua
vida.
— Os dias foram agitados por aqui? — Deixo minha maleta em cima
da mesa, olhando Brow dentro da cozinha.
O vejo deixar o pano de prato sobre o balcão de mármore, ao lado de
um refratário cheio de rosquinha.
— Você não tem ideia. — Ele segura o pote, depositando-o sobre a
mesa, o empurrando na minha direção. — Há mais três desses dentro da
geladeira e outros dois no micro-ondas, fora os que ela deu para mim e os
rapazes comerem e levarem para casa. Ela quis cozinhar.
Estico meu pescoço e olho em direção à saída da cozinha, levando
minhas mãos aos bolsos da calça.
— Como ela está?
— Ela disse que iria assistir TV depois do jantar, mas ficou agitada
durante todos esses dias, nervosa e com picos emocionais disparados,
oscilando entre a vontade de te matar e a segurança dos bebês — ele me
responde, rindo.
— Devo me preocupar?
— É uma mulher, Ariel, sempre temos que ter preocupação. — Ele
coça sua nuca, balançando seus ombros. — Ela gosta de cozinhar quando está
brava, acho bom deixar sua despensa abastecida.
— Vou me atentar a isso.
— Boa noite, chefe.
— Obrigado por ter aceitado o trabalho, por ficar cuidando dela para
mim.
— Eu que agradeço. Sabia que estava fora de campo há um tempo. —
Ele pisca, sorrindo, caminhando para fora da cozinha.
— Boa noite, Brow — murmuro e olho para o refratário de doces.
Sabia que Brow tinha sido uma boa escolha para proteger Cristina na minha
ausência.
Tinha ajudado Pietro com o julgamento dele uma vez, quando meu
amigo me chamou. O caso do ex-pugilista que estava sendo condenado por
assassinato tinha me intrigado. Brow estava com sua namorada na época,
saindo de uma casa noturna, quando dois indivíduos aliciaram ela. O homem
que mexeu com sua namorada partiu para agressão física, usando um
canivete, mas foi muito idiota para querer encarar o nocaute de um pugilista.
Brow acertou um soco no cara na mesma hora, o levando ao chão. O impacto
da batida da cabeça do rapaz no chão causou a morte dele instantaneamente.
Consegui a liberdade de Brow e provar sua inocência, alegando legítima
defesa, mas o estrago já tinha sido feito na vida dele. Brow perdeu todos os
patrocinadores, seu treinador e a equipe, deixando de ser um boxeador
profissional e virando um segurança de boate, com alguns bicos de guarda-
costas aqui ou ali, apenas para poder sobreviver.
No sábado à noite, quando os policiais saíram do hospital, me
deixando saber que estavam pouco se lixando para o que Renan fez no
apartamento de Cristina, compreendi que teria que cuidar da segurança dela e
dos meus filhos. Pietro me indicou uns seguranças de uma firma que ele
conhecia para cuidar da minha casa, mas para ficar de segurança dela sabia
que teria que ser alguém em quem eu confiava em seu caráter e índole. E foi
isso que me fez ir atrás de Brow, contratando seu serviço.
Caminho para a sala e observo a TV ligada. Não pretendia voltar tão
tarde, queria vê-la, ouvir sua voz raivosa. Me preparei para os gritos dela, seu
ataque de raiva e até mesmo sua bravura, que me deixa ver um relance da
verdadeira Cristina, que se esconde dentro dela. Mas o que vejo à minha
frente é seu rosto cansado, com cabelos bagunçados e fios soltos sobre sua
testa, completamente torta, deitada no sofá. Afrouxo o nó da gravata,
retirando a parte de cima do meu terno, os depositando no braço do sofá. Seu
corpo quente se aconchega em meu peito assim que ergo ela em meus braços,
caminhando para o quarto. Sinto o cheiro bom que tem em seus cabelos, o
que me faz sorrir. Respiro profundamente para inalar seu aroma. Brinquei
com ela naquele dia, na frente do seu apartamento, desmerecendo a marca de
xampu, mas a única verdade é que amo o aroma dele nos cabelos dela.
Não vou deixá-la ir para longe de mim. Caminho com Cristina
adormecida em meus braços até nosso quarto, e a deito na cama, afastando as
mechas de seus cabelos coladas em sua bochecha, admirando seu rosto. Puxo
a manta aos pés da cama e a cubro, lhe deixando aquecida. Minha mão
escorrega por seu pescoço, descendo até parar sobre seu ventre. Recaio meus
olhos para lá quando sinto o toque da sua mão sobre a minha, me segurando
como se não quisesse que eu me afastasse. Acomodo meu corpo, deitando-me
ao seu lado, me aproximando do seu corpo.
— Ariel... — Um murmúrio tão sonolento quanto ela escapa dos seus
lábios.
Ela se encolhe, tão delicadamente, me permitindo levar meu outro
braço para debaixo da sua cabeça.
— Durma, pequena vênus — sibilo baixo, alisando seu ventre,
ouvindo o som da sua respiração calma, com ela dormindo em meus braços.
— Você sabia que eu não queria isso.
A mulher brava dentro do quarto anda de um lado ao outro,
empurrando seus cabelos para trás, balançando sua cabeça em negativo.
— Não vou autorizar o que está me pedindo, Silvia.
— É o meu corpo, minha vontade, e eu não quero isso que está aqui
dentro!
— Isso é o nosso bebê. Não pode achar que vou lhe apoiar a tirar
nosso filho.
Me viro, ficando de costas para ela, não sabendo como lidar com
essa notícia. Silvia me atropelou, indo de uma notícia maravilhosa para a
mais assustadora que já ouvi. Foi fria e raivosa ao me contar que estava
grávida, e mais fria ainda ao dizer que pretendia tirar o bebê.
— Não preciso do seu apoio, é o meu corpo, minha escolha, e eu não
quero ser mãe. Não estou pedindo, estou lhe informando minha decisão.
Ouço o som da porta do quarto, que é fechada com brutalidade,
enquanto ela sai a passos decididos. Não pensei, nem cogitei a hipótese de
ser a favor disso, não a deixarei tirar nosso filho. Já estou traçando meu
caminho atrás dela, a pegando antes de chegar perto da porta de entrada do
apartamento, segurando firme seus braços.
— É o seu corpo, mas dentro de você é o meu filho. E não vou deixar
que o tire de mim. — A olho e tento manter minha paciência, negando com a
cabeça. Meus dedos se esticam para acariciar sua barriga, mas são
interrompidos pelo tapa forte dela em minha mão.
— Não toca em mim! Você pôs isso dentro de mim!
Meus olhos se abrem, ficando focados no teto do quarto, ouvindo o
som baixo da respiração de Cristina. Sua mão ainda segura a minha sobre seu
ventre, a mantendo lá.
— Medo? Medo de ser mãe? Medo de ter que cuidar de outras vidas?
Defina seu medo. Não queria meus filhos, é isso? — Mantenho meus olhos
presos aos seus, precisando ouvir a verdade dos seus lábios.
— Oh, meu Deus! Como ousa abrir essa sua boca arrogante de
merda para dizer uma banalidade desse tipo?
— Eu não sei, estou tentando entender porque omitiu a verdade sobre
meus filhos. Talvez não os quisesse, por isso não me contou. Pretendia
abortá-los? — A empurro para a borda, sentindo todo meu controle se
desfazer em minhas mãos.
Não serei benevolente com Cristina se ela cogitar dizer que não quer
esses filhos, não passarei por isso outra vez.
— NÃO! — O som da sua voz gritando com raiva irrompe pelo
cômodo, ela nega com a cabeça para mim. — Por anos da minha vida achei
que eu era seca, Ariel, uma mulher incompleta por não poder gerar uma
vida. Renan usou isso para me torturar, me culpando por não poder lhe dar
um filho. Isso me destruiu psicologicamente... E quando descobri sobre os
bebês e sobre a mentira de Renan, sobre eu não poder ser mãe, foi o
momento mais assustador e mágico da minha vida. A única certeza que eu
tive, e tenho dentro de mim, é que eu vou protegê-los...
— De mim? — pergunto baixo, sentindo meu peito ser aliviado pelo
peso que o prendia.
— Se for preciso, sim. — Ela ergue os dedos para sua barriga,
abaixando seu rosto para o ventre, soluçando baixinho. — Eu não quero
nada, não vou te obrigar a nada também. — Respiro fundo, sentindo meu
mundo todo se ligar a ela de forma urgente. — Mas eu não vou deixar você
tirar eles de mim.
Preciso de dois passos para atravessar o quarto e a prender em meus
braços.

Depois de um banho gelado e ter vestido um pijama para dormir,


adormeço rápido, abraçado à Cristina, quando me deito para dormir. Mas os
gritos dentro do quarto escuro me fazem despertar sobressaltado, acendendo
o abajur ao lado da cama. Vejo Cristina se debater na cama e a puxo,
tentando controlá-la para não se machucar.
— NÃO... NÃO! — Cristina grita mais alto, querendo se afastar.
Seguro seus pulsos como contenção, colando seu peito ao meu,
abraçando suas costas rapidamente. Sinto sua pele suada, com o som da sua
respiração alterada.
— Shhh, está tudo bem... — sussurro em seu ouvido, abraçando-a
mais forte. — É só um pesadelo.
— Não... não. — Cristina chora, soluçando, negando com a cabeça.
— Está segura, vocês estão seguros.
Me afasto apenas o suficiente para segurar sua face entre meus dedos,
e empurro seus cabelos bagunçados, colados em suas bochechas molhadas de
choro.
— Meus bebês... — Suas palavras se cortam com o soluço de choro,
seu corpo trêmulo se cola mais ao meu. Sinto seus braços passarem por meu
pescoço, me segurando firme entre eles.
— Estão bem, está tudo bem com eles. — Afago suas costas, me
arrumando na cama, a trazendo comigo, sentando seu corpo sobre minhas
pernas.
— Oh, meu Deus, foi tão real! — Seu rosto busca abrigo em meu
pescoço, choramingando assustada.
Meus dedos espalmam em suas costas, acariciando, depositando um
beijo em seu ombro, a deixando se sentir segura em volta dos meus braços,
que circulam seu corpo.
— Você não foi embora? — A voz quebrada pelo choro, embargada
de dor, cochicha próximo ao meu ouvido.
Empurro meu corpo para trás, apoiando minhas costas na cabeceira,
segurando seu queixo. Cristina me mostra dor em seus olhos confusos.
— Precisei resolver algumas coisas, não fui embora. Pensou que tinha
te deixado?
Cristina chora com mais urgência, fechando seus olhos, libertando as
lágrimas que escorrem por sua face. Ela volta seu corpo para o meu,
prendendo seus braços em meu pescoço, escondendo sua face de mim. Me
colo em seu corpo, sentindo meu coração disparar, tão perdido com todas
essas emoções que ela arrebenta dentro de mim. Seu cheiro floral tem o poder
de me acalmar na mesma proporção que tira meu autocontrole.
— Nunca vou deixar vocês, Cristina. — Suas mãos estão enroscadas
em meus cabelos, com ela choramingando em meu pescoço. — Não posso
dizer que vou controlar totalmente meu temperamento e meus rompantes,
mas juro que nunca vou machucar você.
O som do seu choro aumenta e a aperto firme em meus braços,
beijando seus cabelos.
— Eu tive medo — ela diz baixinho. — Sei que você não é como ele,
mas eu tive medo e fiquei paralisada. Dentro da minha mente tudo se repete,
é como se estivesse vivendo outra vez aquela agonia. — Esfrego meu rosto
em seu pescoço, sentindo a quentura da sua pele, dando graças a Deus por ela
não poder ver a vontade que tenho de causar dor a Renan. — Não sou forte,
Ariel, eu sou uma covarde presa dentro da minha própria mente.
A agonia vai tomando conta de mim, aumentando os batimentos do
meu coração. Quero mostrar a essa mulher que jamais permitirei que ela se
sinta assim. Minhas mãos passam por suas costas, descendo por sua pele,
entrando por baixo da sua camisa. Beijo seu pescoço, fazendo uma trilha
junto com suas lágrimas até ter sua boca para mim, devorando seus lábios
com uma saudade que me consumia, precisando sentir seu sabor para aplacar
minha raiva. Suas mãos seguram com força meus ombros, devolvendo com o
mesmo ardor o beijo que tomo dela. Subo sua camisa, libertando sua boca
apenas para tirar de vez o tecido do seu corpo, o descartando para longe.
— Preciso de você, Ariel — ela fala baixo, trazendo seu corpo para
perto do meu outra vez, sussurrando, me beijando mais desesperada. —
Preciso de você agora.
Seu choro em nenhum momento cessa. É dor, paixão, medo e raiva,
tudo de uma vez. Só que ela demonstra isso com seus toques atrapalhados,
retirando minha camisa e a jogando no chão junto com a dela. Giro na cama,
a deitando no colchão, cuidando para não esmagar seu corpo com o meu. As
unhas de Cristina cravam em minhas costas, ela arfa com seus seios
estufados, me deixando morrer em seus beijos. Passo minhas mãos pelas
laterais do seu corpo, descendo até o quadril, e empurro a calcinha para
baixo, a descartando com a mesma urgência que usei para tirar sua camisa.
Espalmo minhas mãos em cada lado das suas coxas, a segurando com posse.
Sinto seus dedos apertarem minha pele, com o corpo quente dela abaixo do
meu. Sua boca solta meus lábios, mordiscando meu queixo. A ponta da sua
língua desliza, lambendo minha garganta, enquanto suas unhas traçam um
percurso por meus braços, os arranhando. Sua mão para em minha cintura,
empurrando a calça para baixo, usando seu pé como auxílio para a descartar
de vez do meu corpo. Capturo com minha boca, prendendo entre meus
dentes, um dos bicos dos seus seios, o sugando com mais força, até ouvir os
gemidos escaparem dos lábios dela. Seu corpo quente se afunda no colchão,
empurrando seu tórax para cima. Ergo uma das minhas mãos, a prendendo
em seus cabelos espalhados no travesseiro. Meu corpo inflama em desejo
puro, implora por tê-la, com uma necessidade de mil vidas.
— Ariel, por favor... — Sua voz abafada entre o choro e o desejo me
pede para possuí-la com urgência.
Liberto seu seio, erguendo minha cabeça para ela. Seus olhos
queimam como chamas, me dizendo com apenas um olhar, tudo que ela
poderia me contar em palavras. Ouço cada batida do seu coração, que bate
rápido em seu peito, no mesmo ritmo que o meu. Sua mão apressada se
move, esbarrando na minha. Solto sua coxa, prendendo seus dedos entre os
meus. Suas pernas cruzam em volta do meu quadril, minha boca procura pela
sua com urgência, da mesma forma que estimulo minha pélvis para frente,
chocando com a dela. Meu pau invade sua boceta, a tomando por cada canto,
me fazendo arfar com a quentura com a qual sua cavidade me suga. A beijo
com ardor, apertando seus dedos aos meus, me afundando de uma única vez,
profundamente, dentro dela. Suas coxas raspam minha pele, comprimindo
suas pernas em minha cintura, me dando mais acesso ao seu corpo. Cris
desgruda sua boca da minha, soltando seus gemidos. Minha mão em seu
cabelo se solta, achatando-se à cabeceira da cama, usando-a como alavanca
para impulsionar meu corpo para cima. Volto a me enterrar dentro dela,
movimento meu corpo em um frenesi desenfreado. Preciso de cada som,
sabor, calor que ela me entrega, enlouquecendo nessa montanha-russa que ela
me jogou, acelerando a cada estocada forte e rápida, a fodendo.
— Ariel... — Seu grito sai em um rompante. Move seu corpo de
encontro ao meu, fazendo assim meu pau se aprofundar com mais pressão
dentro da sua boceta quente.
Ergo nossas mãos e as deixo paradas próximo à sua cabeça. Cris
ergue seu rosto, com sua mão livre se embrenhando em meus cabelos, me
beijando com luxúria.
— Nunca vou te deixar. Você é minha, Cris — digo, cerrando meus
dentes. A voz grossa está inundada de desejo, olhando no fundo dos seus
olhos.
— Ohhh, Ariel, eu não vou aguentar! — Seus dentes mordem meus
lábios, com sua boceta me sugando forte. Seu corpo febril treme com força a
cada estocada.
Cristina me entrega tudo, me recebendo em abandono. Não estamos
fodendo nem trepando, é uma urgência, e a cada ritmo das estocada, onde me
afundo por completo dentro dela, seu clímax a rasga ao meio, com suas
pernas suadas travadas ao meu redor. Suas unhas se cravam no couro da
minha cabeça. A cada segundo sinto meu pau melado com o orgasmo dela,
que me lambuza com seus fluidos quentes.
— Porra! — rosno entre meus dentes, escutando seus gemidos.
Meu corpo treme todo, com minha mente explodindo junto com a
onda de prazer que me acerta. Seguro sua mão com força bruta, empurrando
meu quadril com impactos latentes, gozando com euforia dentro dela, que me
ordenha, recebendo cada jato de porra que solto em sua boceta quente. Meu
gemido sai rouco, sendo liberado por minha garganta como um rugido, que se
espalha pelo cômodo. Não a deixo se afastar quando meu corpo tomba ao seu
lado, a seguro em meus braços, arrumando seu corpo sobre o meu. Ficamos
colados um ao outro, com seu coração disparado no mesmo ritmo que o meu
se encontra. As bochechas quentes se esfregam em meu peito de mansinho, e
deixo minha mão em suas costas, acariciando sua pele nua, respirando rápido,
olhando para o teto do quarto. Sua mão pousa em cima do meu coração, ouço
os baixos sons da sua respiração, que vai voltando ao normal, diminuindo
seus batimentos cardíacos, enquanto ela suspira, bocejando. Seguro ela firme,
a mantendo em cima de mim, alisando seus cabelos, sussurrando que jamais a
deixarei.
Cristina Self

A claridade do sol acerta meu rosto, me fazendo comprimir meus


olhos fechados, me virando na cama. O aroma fresco amadeirado invade
minhas narinas de forma agradável. A primeira lufada de ar quente acerta a
ponta do meu nariz, como um assopro provocativo, me fazendo abrir as
pálpebras com preguiça. Pisco, confusa, demorando apenas um segundo para
me chocar com as duas esferas claras me encarando serenamente. O rosto de
Ariel está tão perto do meu, que posso acompanhar o delinear da sua
sobrancelha e cada espaço que suas narinas dão quando são alargadas para
respirar.
— Você ronca terrivelmente, babá McPhee. — Sua voz cínica é
baixa, trazendo um tom provocador, com a mesma travessura que brilha em
seus olhos. — Dormiu bem?
Quero odiá-lo, puxar o travesseiro e lhe dar uma surra por me fazer
me sentir tão tola e fora da minha zona de conforto depois dele me deixar
sem saber onde ele estava, se voltaria. Mas Ariel é isso, esse estranho ser
humano egocêntrico, que consegue ser arrogante e gentil com a mesma
porcentagem para ambos os lados. E isso me dificulta a ser fiel ao meu ódio
por ele.
— Eu não ronco — murmuro preguiçosamente, levando minha mão
para baixo da minha bochecha, não conseguindo controlar meus olhos, que
desbravam seu corpo despido ao meu lado. — O que está fazendo dentro
desse quarto, doutor Miller?
— Seu traseiro empinado, se aconchegando em minha cintura
enquanto ficou de conchinha comigo, quando te reboquei do sofá para a
cama, foi algo tentador demais, tanto que me fez desistir do quarto de
hóspede. — Ele dá de ombros, fechando seus olhos, soltando o ar lentamente.
— Ariel, isso não vai funcionar — suspiro com acalento, olhando seu
rosto, aproveitando o breve segundo da pequena paz que vejo em seus traços.
— Seja mais precisa, sim? O que não vai funcionar? Transarmos à
noite e acordarmos juntos na mesma cama, ou seu ronco quando entra em
sono profundo?
Ele abre seus olhos, erguendo sua mão para o lençol, em cima dos
meus seios, circulando lentamente minha mama por cima do tecido com a
ponta do seu dedo.
Depois do telefonema da minha mãe, passei todos esses dias sentindo
raiva por ela ter desligado na minha cara, e por ele simplesmente ter
desaparecido. O pobre Brow foi quem ficou como vítima, suportando meus
momentos de desabafo. Entendo que agora, mais do que nunca, não posso
lidar com Renan, mas isso não é motivo para que eu me case com Ariel.
— Não vou me casar, preciso que entenda isso. Vamos achar uma
forma de lidar com a gravidez e tudo que acarreta a chegada dos bebês à
nossa vida, mas eu não posso passar por um casamento outra vez.
Ariel afasta sua mão do meu seio, a levando para minha cintura,
fechando seus olhos, apenas me deixando ver seu peito se estufar com a
respiração profunda que ele inala.
— Eu me casei por amor uma vez e foi com esse amor que eu quase
perdi minha vida. Não posso embarcar novamente em um relacionamento,
ainda mais com todos esses gatilhos que tenho, seríamos infelizes...
— Ok!
Apenas uma palavra sai dos seus lábios, de forma calma e rápida,
cortando meu discurso, que tinha ensaiado por todos esses dias, sobre o que
diria a esse homem quando nos encontrássemos novamente, todos os motivos
pelos quais não daria certo nosso casamento. Com uma única palavra de uma
sílaba, ele causa um turbilhão de confusão, jogando meu discurso no lixo.
— Ok?
— Sim. — Ele abre seus olhos, me sugando para a impetuosidade
profunda das suas íris. — Se é o que quer, não falaremos mais sobre
casamento, mas com uma condição.
— Claro que tem uma condição. — Fecho meus olhos e cerro meus
lábios. Seria muita ingenuidade da minha parte pensar que o trapaceiro Miller
não teria alguma condição para ter aceitado tão bem minha resposta. — Diga
logo, seu cretino astuto.
Sua mão grande escorrega para minha bunda, me pegando de surpresa
e me fazendo abrir meus olhos, atenta aos seus, que me encaram.
— Me deixe proteger vocês, Cris. — Ariel não pisca, muito menos
demonstra alguma emoção, apenas abaixa seus olhos para meu ventre,
ficando em silêncio, olhando-o. — Não estou lhe impondo um casamento,
nem mantendo você aqui como capricho, estou protegendo vocês, pedindo
uma chance para conseguir fazer você me ouvir.
— Ariel...
— Eu já fui casado, Cristina. — As palavras dele, sendo ditas de
forma tão pesada, me fazem calar. — Um casamento aceito pela empolgação
do momento. Ela engravidou no nosso primeiro ano morando juntos. No dia
que ela me contou sobre a gravidez, eu explodi de alegria, apenas para
segundos depois ser atropelado pela decisão que ela tomou em abortar a
criança.
— Ariel, eu sinto muito... — murmuro com dor. Vejo à minha frente
o homem impertinente se desnudando por completo. Ariel não me mostra sua
pele, mas sua alma, e, pela primeira vez, desde nosso atrapalhado engano,
Ariel me mostra um pouco dele. Quase como por instinto, minha mão se
ergue, segurando seu braço. — Lamento...
— Eu não a deixei tirar o bebê — ele fala sério, mantendo os olhos
em meu ventre. — Dolly nasceu em uma manhã de primavera. Acho que foi
a primeira vez que tomei noção que teria alguém tão pequeno e indefeso
dependendo de mim. Silvia nunca quis ser mãe. Eu me iludia, achando que
ela mudaria de ideia quando nossa filha nascesse, mas não mudou. Ela
cuidava, fazia suas obrigações maternas a contragosto, mas fazia. Quando
Dolly completou dois anos, descobri que Silvia estava me traindo com um
amigo antigo dela.
Não sei o que dizer, nem sequer o que posso falar para amenizar a
escuridão que está dentro do seu olhar, se escondendo atrás das suas palavras
ditas em tom calmo.
— Pedi o divórcio, já estava saturado há muito tempo com nossa
relação. Acho que a traição foi a última gota, tanto que não sofri por saber do
caso dela, me senti aliviado, em certo ponto. — Ariel sorri sem um pingo de
alegria, negando com a cabeça. — Saí de casa, fui para um hotel qualquer,
entrei com o pedido de divórcio e a guarda integral da minha filha. Silvia foi
para uma festa e levou nossa filha junto. Ela dispensou o motorista na hora de
voltar para casa, deixando nossa filha adormecida no banco de trás, sem a
proteção da cadeirinha...
É estranho, como se mesmo antes das palavras saírem pela boca dele,
eu pudesse sentir toda a dor que as acompanhará. Talvez o olhar vazio dele
tenha me alertado, ou o aperto em meu coração, ou seus dedos que me
esmagam com mais força. Não sei ao certo dizer, mas dentro de mim sinto
toda a melancolia que Ariel soterra dentro dele.
— Dolly foi enterrada em uma manhã de primavera florida e cheia de
cor, igual a que ela nasceu.
Meus olhos se fecham, não consigo segurar a lágrima que escorre por
minha face.
— Muitas vezes me questiono se teria sido melhor ter deixado Silvia
ter feito o que ela queria desde o princípio, quando soube da gravidez, isso
teria causado menos sofrimento.
— Ariel, eu nem posso imaginar o que sentiu...
— Não vou lhe impor minha vontade, babá McPhee, mas vou fazer de
tudo para proteger vocês. — Sinto o toque quente da sua mão, que se espalma
em minha bochecha, a afagando com carinho, e ouço o som pesado da sua
respiração. — Não me afaste, Cristina. Por favor, não me afaste.
Meus olhos se abrem e enxergo o mundo de promessas que brilham
em seus olhos. Tudo tão nítido e vivo, despertando um sonho antigo, há
muito tempo adormecido dentro de mim. Mas o medo é um companheiro
perigoso para se conviver por muito tempo, ele se entranha dentro de você,
acorrenta sua vontade, suas ambições. Os desejos de outrora, que pareciam
tão certos, na companhia dele se tornam assustadores e aterrorizantes. Meu
mundo, que construí para mim, tijolo por tijolo, que era tão seguro alguns
meses atrás, porém depois do desastroso engano dentro do escritório, que me
levou até aquele quarto de hotel com Ariel, agora me parece frágil. E,
lentamente, o cínico homem arrogante se infiltrou dentro dele, se apossando
de cada canto.
Capítulo 21
Argumentos válidos
Ariel Miller

Passo a esponja por seus braços, fazendo-a rir para mim, relaxando
seu corpo dentro da banheira. Ela descansa sua cabeça em meu peito e
empurro seus cabelos para o lado, assoprando a espuma que tem em cima da
sua cabeça. Esfrego demoradamente cada parte do seu corpo, apreciando esse
momento dela abaixando sua guarda, me permitindo cuidar dela. Solto um
beijo em seu ombro, e seu corpo se aninha mais ao meu, suspirando baixinho.
Meus braços contornam sua cintura, trazendo-a mais a mim, ficando com
minhas mãos em cima do seu ventre. Suas pequenas mãos se encaixam por
cima dos meus braços. Aliso sua barriga com uma das mãos, que a abraça por
debaixo da água quente. Me vejo sentindo um grande desejo de vê-la
crescendo com nossos filhos.
— Como pode ter certeza de que isso vai funcionar? — A voz baixa
de Self pergunta calma.
— Não possuo vícios, você compreende o que eu falo, aprecio sua
companhia e gosto de ficar com meu pau enterrado dentro da sua boceta.
— Oh, meu Deus, sua boca cretina só fala merda! — Ela me dá um
tapa, o que acarreta em água transbordando pela banheira. Mordo a ponta da
sua orelha, fazendo seu corpo se encolher.
— O que foi? Apontei a lógica, temos pontos compatíveis.
— Cale-se, Ariel! — Cris esfrega seu rosto em meu braço, suspirando
com preguiça. — Acho que devo me sentir honrada pelo traste do doutor
Miller apreciar minha companhia.
— Gosto do seu aroma, assim como de quando fica irritada, com os
olhos espremidos, parecendo que vai soltar um raio de energia em minha
direção. — Ela molha meu braço, o esfregando, soltando o ar dos pulmões.
— Ainda estou pensando o que vamos fazer sobre o som cavernoso e áspero
que sai dos seus lábios quando dorme...
— Idiota! — Cristina joga água por cima do seu ombro, acertando
meu rosto, rindo quando eu belisco sua coxa.
— Fique quieta, estou elaborando meus argumentos.
— Seus argumentos são falhos, doutor Miller. Gostar de boceta, do
meu cheiro e da forma como eu te olho quando você me irrita, não são
motivos para fazer um casamento dar certo.
— Muitos casamentos não têm nem isso — falo sério, assoprando
seus cabelos. — Acho muito válido. Boceta, perfume e olhares.
— Seu advogado pervertido.
Belisco sua coxa de volta, a fazendo rir, gargalhando dentro do
banheiro.
— Para seu governo, a secretária pervertida, que assiste vídeos
pornográficos no serviço, é você. Eu, pelo menos, quando quero ver algum
vírus, faço isso sozinho, em um lugar discreto, como uma pessoa normal.
— Oh, meu Deus, eu já falei que não foi culpa minha! — Seu corpo
se vira para mim, com seus olhos brilhando em divertimento.
A calo, segurando seu queixo, beijando seus lábios, os sugando
lentamente, absorvendo seu sabor conforme aprofundo o beijo.
— Quais são seus argumentos, babá McPhee?
Olho sua face com seus olhos fechados e boca inchada quando solto
seus lábios, afastando apenas um pouco minha cabeça de perto da sua para
poder admirá-la.
— Seu pau — ela sussurra, deixando um pequeno sorriso ao lado dos
seus lábios.
— E?
Cris abre seus olhos, os deixando fixos em um ponto aleatório do
banheiro, como se estivesse pensando profundamente sobre isso. Sua cabeça
balança para os lados em negativo, rindo, voltando a olhar para mim.
— Não! Apenas seu pau é meu argumento. Não consigo pensar em
mais nada.
— Me tornei apenas um brinquedo sexual para você. — Solto seu
queixo, mantendo minha atenção em seu sorriso.
— Não seja tão cínico, Ariel, acabou de dizer que gosta da minha
boceta também.
— Mas ainda tive mais argumentos que você.
— Sua boca cretina é irrevogavelmente impertinente, assim como seu
humor ácido é terrível de lidar. Sem falar quando tem aquela expressão
neandertal no semblante, sabe? — Ela ergue suas mãos, movendo seu dedo
na direção do meu rosto, gesticulando. — Igual essa que está fazendo agora,
doutor Miller.
Seus lindos olhos negros risonhos me deixam em transe e me sinto
sendo sugado por ela, repercutindo apenas o som da sua risada dentro do
banheiro. Suas pequenas mãos se erguem, repousando em meu peito, me
fazendo sentir diversas emoções. Mas meu mundo para, quando, sem que eu
espere, seu rosto se levanta e seus lábios repousam nos meus de forma tão
terna, espontânea, e sinto como se tudo em minha vida voltasse a fazer
sentido. Não sou mais a metade de um homem amargo, que odeia a vida, e
nem o difamado advogado sem caráter. Aqui, com ela em meus braços, me
beijando de mansinho, eu estou inteiro. Meus lábios forçam mais os seus, e
logo a puxo para colar seu corpo ao meu, não me importando com a água que
cai para fora da banheira.
Sua pequena forma se encaixa tão perfeita a mim enquanto a arrumo
em meus braços, a deixando totalmente de frente para mim. Suas mãos se
enroscam em meus cabelos, apertando seus dedos entre eles, e antes que Cris
perceba, estou a erguendo em meu colo, me levantando firme dentro da
banheira. Suas pernas travam em minha cintura, me fazendo sentir mais seu
corpo quente e molhado colado ao meu. Ela arfa, respirando fundo quando
minhas mãos, em sua bunda, apertam sua carne. Saio da banheira e caminho
a passos firmes, a segurando com proteção, colada a mim. Cris está com suas
mãos agarradas ao meu cabelo, e as minhas estão presas à sua bunda, a
massageando. Sinto a pele tão macia sobre meus dedos. Não possuo mais
minha vontade, apenas obedeço ao desejo de sentir ela cada vez mais.
— Ariel... — Escutar meu nome em seus lábios é algo tão
paradisíaco, que desejo passar o resto da minha vida ouvindo.
Deito seu corpo, que arfa, na cama, me afastando apenas um pouco
para ter uma visão privilegiada das suas mamas molhadas. Minha boca vai
para elas, abocanhando um seio com pura luxúria. A fome que me invade
pelo seu pequeno corpo, me faz sentir uma necessidade animal. Não me
prendo mais, apenas libero essa necessidade que Cris despertou dentro de
mim pelo corpo dela.
— Ariel... Oh, Deus! — ela geme alto, segurando meu ombro.
Solto seu seio, repetindo a mesma sucção no outro antes de libertá-
los. Cris está com seus lindos olhos brilhantes me fitando com luxúria, com a
mesma liberdade com que a vi a primeira vez. Desço meu corpo lentamente
sobre o seu. Meu pau, como um caminho que ele aprendeu bem, já se encaixa
entre os lábios molhados e inchados da sua boceta, que o deixa entrar
devagar, com meu quadril se empurrando contra sua pélvis. Ela segura mais
forte meus ombros, fazendo assim suas unhas marcarem minha pele.
— Cristo! Vai me fazer virar uma viciada... — Ela fecha seus olhos e
morde sua boca. Minhas mãos estão paradas ao lado do seu corpo,
sustentando meu peso para não a machucar.
E apenas me deleito, saboreando cada expressão de lascividade que
tem em sua face.
— Seu argumento, doce vênus. — Inclino meu rosto, lambendo sua
garganta, sugando a lateral da pele, onde a veia dela pulsa com força.
Usarei tudo que tiver em meu poder para mantê-la ao meu lado.
Poderia apenas ter me levantado e ido embora naquele dia, quando a vi pela
primeira vez, enquanto observava a pequena atrapalhada falando sem parar,
mas ela me acorrentou, me capturando com seus olhos, e agora, nem que
minha vida dependesse disso, eu me afastarei de Cristina. Ainda mais quando
ela se entrega tão bela assim para mim.
Seus lábios se colam aos meus, com suas pernas cruzando atrás do
meu quadril, me deixando preso a ela. O gosto do seu beijo me rouba cada
pensamento e a linha tênue que eu possa ter, e então a fodo com mais
urgência. Seu grito é abafado pelos nossos beijos, e cada vez mais nossos
corpos se prendem em um só. Ela se aperta mais a mim, engolindo meu pau
dentro da sua boceta. Seu corpo treme junto ao meu quando ergo meu tronco
para cima, aumentando minhas estocadas. A luz do sol que entra pela janela,
brilha em cima do seu corpo, e tenho a perfeita visão dele. Observo seus
olhos, que se fecham. Sua boca morde o canto dos lábios, e o som que ela
solta quando chega ao seu orgasmo é lindo. Continuo acelerando dentro dela,
sua vagina aperta meu pau, fazendo assim a sensação ser três vezes mais forte
no seu interior escaldante. A fodo mais forte, aumentando as investidas, me
perdendo no sorriso sacana que ela abre em seu rosto. O gozo vem certeiro, e
jorro dentro dela minha porra. Meu cérebro explode por completo, meus
pulmões voltam a se encher de ar aos poucos, minha respiração vai
desacelerando e meu corpo cai ao seu lado.
— Definitivamente, seu pau, sempre seu pau — ela fala, fadigada,
rindo.
— Suspeito que posso viver com seus roncos também. — Viro meu
rosto no travesseiro, esticando minha mão e alisando suas bochechas.
— Vai chegar atrasado para o trabalho, doutor Miller — ela fala
baixo, suspirando.
— Talvez possa tirar a manhã de folga. — Olho para sua boca,
gostando de como seus lábios ficam inchados depois dos meus beijos.
— Não, não pode. Se bem me recordo, sua agenda está bem atarefada
para hoje. Amanhã será o julgamento de Brat, precisa rever seus argumentos
e tudo que envolve o caso.
— Alguns pontos negativos de engravidar a secretária.
— Cale essa boca cretina, Miller. — Cristina ri, se levantando e se
afastando da cama. — Já decidiu o que vai fazer com aquela assistente
mentirosa de Stano?
Ela vai para o banheiro e pega uma toalha para ela e outra para mim.
— Não me decidi ainda se a levo diante do júri ou não. Se não levar,
Brat vai preso. Se a levar, vai ser perjúrio. Se eu contar a alguém sobre a
mentira dela, será quebra de confiança entre advogado e cliente. De todas as
formas, estou amarrado a esse caso.
— Você realmente acredita na inocência dele, Ariel?
— Stano não matou sua mulher e muito menos aquele preparador
físico.
Seus olhos desviam dos meus, mordendo o canto dos seus lábios,
batendo lentamente seu pé no chão.
— Bom, eu vou dar um jeito nessa bagunça de quarto molhado. Já
que meu atestado termina hoje, amanhã estarei com você no tribunal.
Me sento na cama, pego a tolha no ar, quando ela me joga, e fico em
silêncio, observando-a secar seus cabelos.
— Estava pensando que talvez não precise voltar para a firma.
Ela para seus gestos, olha para o chão e volta sua face na mesma hora
para mim, negando veementemente com a cabeça.
— Não, nem pense em abrir sua boca para continuar.
— Cristina, me ouça. — Me levanto e jogo a tolha em cima da cama.
— Não estou dizendo para largar o serviço, apenas que por esse momento
poderia se afastar, até ser seguro.
Ela caminha para o armário, o abre e pega uma regata e uma bermuda,
com um sutiã e uma calcinha, se vestindo às pressas.
— Vou preparar algo para tomarmos café, e não vamos mais falar
sobre isso.
A vejo sair a passos rápidos para fora do quarto, me largando sozinho.
Esfrego meu rosto e respiro fundo.
— Mulher teimosa!

— Como assim não achou nada? — rosno com raiva, encarando Greg
dentro da minha sala no escritório.
— Não encontrei nada que incrimine e ligue Renan Pener à invasão
do apartamento da sua garota e a morte do gato, mas consegui outras
informações — Greg fala sério, respirando pesado.
Ele estica suas pernas quando se senta na cadeira de frente para minha
mesa, abaixando sua mochila.
— O que descobriu sobre esse verme, Greg? — pergunto sério,
esmagando meus dedos, sentindo raiva por saber que não tem nada ainda que
prove que Renan fez aquela barbaridade com o animal, com o intuito de acuar
Cristina.
— Me pediu para fazer um pente fino, não foi? Bom, eu fiz. — Ele
retira uma pasta de dentro da mochila, arremessando em cima da mesa.
A puxo em minhas mãos, a virando, abrindo apressado a pasta de
documentos.
— Renan Pener, categoricamente, é doente pela ex-esposa. Pode ver
pelas mulheres que ele se envolveu depois do casamento, desde as trepadas
rápidas, namoradas de curto prazo ou as prostitutas, todas se...
— Parecem com a Cristina — termino por ele, olhando as fotos das
meninas dentro do documento. Cabelos pretos, pele negra, estatura baixa,
fisionomia volumosa do corpo, todas têm algum traço de Cristina. — Filho
da puta!
— De onze meninas que rastreei, ele espancou oito, mas nenhuma
delas quis falar comigo. — Greg respira fundo. — O cara é um usuário
contínuo do pozinho mágico, o nariz dele é praticamente um aspirador de pó
portátil, consegue cheirar cinco carreiras de cocaína em uma noite, brincando.
— Se droga há quanto tempo?
— Ao que parece, desde a época da faculdade, mas eu chuto um
pouco mais, pelo tanto de grama que ele consome.
— Homem patético.
— Bom, em relação às meninas anteriores a ela, todas são mistas,
cores, tamanhos, peitudas, com peitos pequenos. A primeira agressão dele foi
em uma empregada que trabalhava na casa dele, na época da adolescência. O
pai abafou o caso e pagou uma boa quantia para a garota sumir do mapa. Na
faculdade, ele se acalmou, até conhecer...
— Cristina. — Balanço minha cabeça em positivo, já sabendo o que
ele dirá.
— É, a sua garota. Ele se encantou por ela. — Greg puxa o ar com
força para seus pulmões, respirando fundo. — Pener é agressor de mulheres,
isso é incontestável, não passa de um merdinha escroto!
— Alguma prova concreta, que ele agrediu essas mulheres?
Depoimento, procura em hospitais? Não achou nada contra esse puto que
possa incriminá-lo?! — pergunto para ele, o vendo negar com a cabeça.
— São garotas de programa, Miller. Ele solta um dinheiro alto nas
mãos delas, as fazendo se calar.
Aperto meus olhos e respiro fundo, fechando a pasta com força e
sentindo tudo dentro de mim me puxar para ela.
— O medo foi aumentando gradativamente, a cada vez que ele
descobria meu endereço novo e aparecia. No começo, achei que estava
louca, por achar que ele me seguia.
Seus olhos amedrontados ficam expressivos, com o brilho de lágrimas
em suas esferas negras. Seguro sua face em minhas mãos, beijando sua testa
e limpando as lágrimas do seu rosto em seguida.
— Mas não estava louca. Eu sabia, podia sentir os olhos de alguém
cuidando de cada passo que eu dava. No mercado, nas lojas, qualquer lugar
que eu fosse, eu sentia a presença de alguma pessoa me vigiando.
— Contou à polícia quando foi registrar as queixas?
— Eu contei, disse para eles que alguém me seguia, e que eu sabia
que era Renan. Mas eles me disseram que sem provas não poderiam fazer
nada. — Ela sorri, triste, negando com a cabeça. — Um policial me
perguntou se eu estava tomando algum remédio controlado. Eles me
acharam louca, mas eu não estava... não estava.
Quero tirar sua dor, abraçar ela tão forte, abrigá-la em meus braços
para sempre, ao ver o sofrimento que ela carrega.
— Um dia eu estava voltando do trabalho, já era tarde, estava
cansada, então parei perto de um aglomerado de pedestres, esperando o
sinal abrir. Eu o senti, Ariel, senti o momento exato que os dedos tocaram em
meus cabelos. As pessoas começaram a andar e eu corri, corri o mais rápido
que pude, atravessando a rua. Quando me virei, avistei apenas a sombra do
homem virando a esquina.
Ela se cala e respira fundo. Vira seu rosto para a janela do quarto.
— Mas eu sabia que era ele.
— Aconteceu outras vezes? — pergunto sério, trazendo seu rosto
para frente, segurando a ponta do seu queixo.
— Uma noite acordei quando o telefone começou a tocar. Atendi
ainda sonolenta, e apenas a respiração alta se fazia do outro lado da linha.
— Cristina fecha os olhos, apertando seus dedos em meus braços. — Ele
estava do outro lado da rua, eu o vi distante, com o capuz da jaqueta
cobrindo sua cabeça e seu rosto, mas ele estava lá, me vigiando. E depois
disso...
— Não abriu mais as cortinas.
— Exatamente isso, porque eu sabia que ele estaria me olhando em
algum lugar.
Abro meus olhos, ainda podendo ver sua face amedrontada, de
quando me relatou tudo pelo que estava passando desde o divórcio, sobre a
sensação constante de estar sendo vigiada. Naquele momento que olhei para
ela, apenas disse a mim mesmo que ninguém a machucaria. Eu destruirei
qualquer um que tente fazer mal a ela ou aos meus filhos.
— Há um assunto que eu quero falar com você. — A voz baixa de
Greg sai preocupada, com ele batendo seus dedos no encosto da cadeira.
— Diga — falo sério para Greg, que não contou tudo ainda.
— Eu fui até o endereço dela, falei com o tal do Bobe, como me
passou no e-mail. Ele me deixou entrar no apartamento quando eu citei o seu
nome. Pelo que eu analisei, não teve arrombamento algum. Precisa conversar
com ela, pedir para lhe contar tudo o que aconteceu naquele sábado, do
normal ao mais diferente que possa ter sido.
As memórias do sábado de manhã me acertam precisamente.
Estico meu braço e seguro seu ombro antes que ela trombe em mim, o
que a faz soltar um grito, derrubando suas sacolas.
— Oh, meu Deus! — Sua face se ergue para mim, ficando com a
respiração pesada, puxando o ar forte para suas narinas. — Ariel, quer me
matar do coração?
Ela se afasta, abaixando para pegar as coisas que caíram das
sacolas. Olho no rumo de onde ela vinha, mas não enxergo ninguém
caminhando atrás dela. Me abaixo e auxilio Cristina a pegar suas compras,
repousando meu olhar em sua face. Sua veia está saltada na lateral da sua
garganta, os olhos arregalados. Seu coque bagunçado, com fios soltos, cai
na lateral do seu rosto.
— Do que estava fugindo? — Cristina ergue seus olhos para mim, se
levantando lentamente.
— Nada, apenas estava distraída...
Ela estava assustada. Cristina não estava distraída, mas sim
amedrontada. Algo ou alguém a tinha assustado. Estava tão agitado, me
sentindo elétrico por estar com ela perto de mim, que não me atentei a isso
como deveria.
— Continue buscando por algo, volte outra vez ao edifício, converse
de porta em porta se for preciso, Greg. E eu vou conversar com Cristina,
descobrir mais algumas informações.
Depois que Greg parte, ainda espero uns dez minutos, antes de me
levantar e caminhar para a porta, a abrindo e encarando Stano Brat, que está
na sala de espera. Aponto minha sala para ele, esperando-o entrar, fechando a
porta atrás de nós. Ele se senta calmo, olhando em volta, cruzando suas
pernas, balançado seu pé de forma impaciente. A respiração eufórica aumenta
o som dentro da sala, o que apenas me faz sentar em minha própria cadeira, o
encarando por um tempo antes do confronto.
— Não estou no meu melhor momento de paciência, Brat, e serei
ríspido e franco. Ou me conta a verdade de onde estava, e o porquê mentiu
sobre sua assistente, ou pode se retirar da minha sala e procurar outro
advogado para lhe representar amanhã, diante do grande júri.
— Não pode fazer isso comigo, Miller.
— Posso, e irei fazer sem um pingo de remorso, a escolha será sua!
— Me encosto na cadeira, segurando minha caneta, a rodando em meus
dedos. — Tenho dez minutos antes de ter que ir ao fórum, então sugiro que
fale rápido.
Ele esfrega seu rosto, negando com a cabeça, me amaldiçoando
baixinho.
— Nove minutos — falo sério, erguendo meu pulso, olhando para
meu relógio.
— Estava em um motel — Stano vomita as palavras de forma rápida,
desviando seu rosto para o chão.
— Se abrir sua boca para me dizer que estava na companhia da sua
assistente, vou te chutar para fora da minha sala.
— Era Deem, meu enteado, que estava comigo, por isso eu não lhe
falei. E é por isso que eu não posso contar para ninguém com quem eu estava.
Solto a caneta dos meus dedos sobre a mesa, respirando fundo,
querendo passar por cima da porra da madeira e socar a cara escrota de Stano
Brat.
— Está me dizendo que no momento que sua esposa foi morta, você
estava na porra de um motel comendo seu enteado?
— Não foi algo planejado, eu não pretendia ter nada com ele...
— Pare! — Ergo minha mão, o silenciando. — Onde estava com a
cabeça, Stano? Tem ideia de que isso é crime de todas as formas? Estamos
falando de um menor de idade.
— Miller, é minha vida que está em jogo, acha que eu não sei? Tudo
que eu construí, minha empresa, meu nome, um império todo irá desmoronar
se isso vier a público. Aconteceu...
— Aconteceu?! — Balanço minha cabeça em ironia por suas
palavras. — Será isso que vai dizer ao juiz quando ele lhe perguntar o que
passou na sua cabeça quando teve a brilhante ideia de pedir para seu enteado
chupar seu pau?
— Deem fará dezoito anos mês que vem, não será mais crime.
— Inacreditável!
Respiro fundo, o encarando com nojo, não pelo fato de manter uma
relação sexual com um homem, mas pelo fato de ser uma criança. E ele
parece não ouvir o que sai da boca dele. O fato do menino estar prestes a
completar a maior idade, não anula que foi com idade insuficiente que os dois
começaram a ter uma relação sexual.
— Precisa levar Violet ao tribunal, eu não posso trazer esse assunto a
público. Não matei minha mulher e nem aquele bosta que estava com ela.
Porra, eu não matei, preciso que me ajude!
— Saia da minha sala, Brat!
— Não pode me abandonar. — Ele ergue seu rosto para mim,
balançando sua cabeça para os lados. — Tem a obrigação de me defender, é o
meu advogado!
— Minha única obrigação nesse momento é não quebrar sua cara
escrota depravada. Agora, saia da porra da minha sala! — A voz carregada de
raiva sai da minha boca, enquanto o fuzilo de ira com meu olhar.
— Estará no tribunal amanhã, não é?
Ele se levanta e caminha para a porta do escritório. Mantenho meus
olhos em sua cadeira vazia, não o respondendo, ficando em silêncio, e apenas
quando ouço o som da porta sendo fechada, é que chuto com repúdio a
porcaria da mesa.
— Doente de merda!
Capítulo 22
Apelação
Cristina Self

Suspiro com prazer ao sentir o aroma da torta de banana que acabei de


tirar do forno. A deposito em cima da ilha da cozinha.
— Acho que me empolguei. — Coço minha testa e me viro para o
fogão, vendo as panelas de comidas que fiz.
Eu tinha me esquecido de como era preparar uma refeição para outra
pessoa, como eu amo essa demonstração de afeto que é alimentar o outro,
dedicar-se ao tempo de preparar algo saboroso. Eu evitava cozinhar depois do
divórcio, apenas fazia isso quando estava nervosa e precisava silenciar meus
pensamentos. Hoje comecei com pequenas bolachas caseiras no começo da
tarde, para poder distrair minha mente, e, quando vi, já me encontrava
dispersa dentro da cozinha, atarefada entre o frango assado, o macarrão
caseiro, o creme de milho, o arroz, a batata frita e a torta de banana.
Brow tinha ficado comigo a tarde toda, sentado na cozinha,
conversando e experimentando o que eu ia fazendo. Sei que, no fundo, ele
apenas está fazendo isso para me distrair, me perguntando sobre as receitas,
mas fico feliz pela presença dele. E é tão bom, tão prazeroso esse momento
de paz que sempre tenho quando cozinho, que nem vejo a hora passar. Me
familiarizei rápido demais com a cozinha de Ariel, que é o local da casa onde
mais passo tempo desde o dia que ele me trouxe para cá. Corro meus olhos
pela mesa e a vejo arrumada, com os copos e talhares dispostos corretamente
ao lado dos pratos. Transfiro as comidas para as travessas e as levo para a
mesa, olhando para a janela, que já mostra a noite.
— O que você está esquecendo? — Bato meu pé no chão, conferindo
tudo disposto na mesa. Alinho os óculos em meu rosto, confirmando minhas
suspeitas ao não avistar a jarra de suco. — O suco!
Giro rápido, com intensão de ir para a geladeira, mas sou bloqueada
pelo corpo revestido em seu terno sob medida, que tem seu dono silencioso
me encarando.
— Deus, eu não tenho suficiência cardíaca para levar sustos! —
Esfrego meu peito, olhando assustada para ele.
Ariel desvia seus olhos de mim para a mesa, a olhando com
estranheza.
— Isso seria?
— Nossa refeição — falo orgulhosa, olhando para a mesa que eu
arrumei, estufando meu peito. — Bom, não é nenhuma receita de massa
italiana, mas me saí bem.
A grande mão dele se estica, me pegando de surpresa quando espalma
em meu rosto, me fazendo olhar para ele.
— Percebo! — Ariel mantém sua concentração em meus cabelos,
erguendo sua outra mão e tirando algo da minha mecha, abaixando a ponta do
seu dedo para que eu possa ver o farelo de trigo. — Isso é alguma hidratação
para o cabelo?
Assopro a sujeira de trigo da ponta do seu dedo, repuxo meu nariz e
aliso minha camisa, tentando me endireitar.
— Largue de ser chato, Ariel.
— Não estou sendo chato, gostei desse seu aspecto desmazelado,
completamente desarrumada, digo que é até melhor que aquele saiote e blusa
de gola alta que você compra em quantia absurda. — Ele abaixa seus olhos
para a regata, sorrindo cinicamente, enganchando seu dedo no decote e
puxando-o de mansinho. — É, com toda certeza prefiro essa vista.
Estapeio seu dedo, tirando sua mão de perto dos meus seios.
— Não há nada de errado com as minhas roupas — respondo baixo,
forçando um sorriso, inclinando meu corpo para trás, tentando me afastar um
pouquinho da força que emana dos seus olhos. — Pare de ficar me
constrangendo.
— Cozinhou especialmente para mim?
— Óbvio que não, cozinhei porque estava com fome.
Desvio meus olhos dos seus, a mão dele ainda está em meu rosto, o
segurando para si. Foi para ele, a verdade é essa. Conscientemente, eu sabia
que queria fazer um jantar para nós dois, e isso me deixou feliz, silenciou os
temores e medos dessa manhã.
— Devo julgar que sua fome é de uma leoa, pela quantidade de
comida que fez. Ainda bem que trouxe você para cá, assim meus filhos param
de ficar se nutrindo de porcaria açucarada. — Ariel estende sua mão para
meu ventre, a espalmando, sorrindo.
— Cale essa boca cretina, Miller! Eu não como apenas besteira.
— Sim, eu sei. Estou aqui para comprovar seu bom gosto. — Entendo
sua piada banal com o trocadilho, o que me faz rir de sua forma descarada.
— Nojento, presunçoso! — Me afasto dele, o contornando, indo para
a geladeira. — Vá se limpar, antes que eu mude de ideia e não o deixe comer
a comida que fiz.
É o tempo de Ariel ir para o quarto se limpar e tirar seu blazer do
terno, para que eu finalize o suco, levando a jarra para a mesa. O vejo sentar
na ponta, onde arrumei um dos lugares, enquanto puxo a cadeira do lado
direito, me sentando também. Ele tem sua face enigmática, olhando para as
travessas de comida.
— Ficou sabendo de algo? — Seguro meu copo e me sirvo de suco,
voltando a olhar para ele.
— Stano está transando com o enteado dele — Ariel fala rápido, de
forma simples, me dando a notícia de uma única vez. Minha mão aperta o
copo de suco em meus dedos, o deixando parado no meio do caminho,
suspenso no ar, próximo à minha boca.
— Nossa! — sussurro, espantada, piscando confusa. — Não era bem
a isso que me referi, mas... NOSSA!
— Não tem com o que se preocupar, lhe disse que estaria
investigando sobre o que aconteceu no seu apartamento.
Ariel estica seu braço e pega meu prato de forma ágil, e antes que eu
possa fazer algum protesto, já está empanturrando o prato de comida e
devolvendo à minha frente. Olho para a comida, ainda incrédula com a
notícia que recebi.
— Stano não matou mesmo a esposa dele.
— Não, ele estava com o garoto no motel. — Ariel faz seu prato, o
deixando duas vezes mais farto do que o meu.
— Isso... isso é nojento em todos os aspectos da moralidade. Ele criou
o menino como se fosse filho dele por sete anos. E é crime, Ariel, o menino
tem o quê? Quinze anos?
— Dezessete anos, vai completar a maior idade mês que vem.
— Sabia que Stano é um medíocre, mas nojento a esse grau de se
envolver com o filho da esposa dele, isso não esperava.
— Por isso ele comprou o álibi falso, está tentando esconder sua
relação extraconjugal com seu enteado, Deem. — Ariel corta o frango e pega
a coxa, a levando para seu prato e fatiando outro pedaço imenso do peito para
mim. — Está com uma cara boa.
— Oh, meu Deus, não precisa ser esse exagero todo...
— Está comendo por três agora, precisa se alimentar. Nessa fase sente
muita fome.
Meu sorriso morre pouco a pouco em meus lábios, imaginado se ele
cuidava da sua esposa assim também.
— Como era...
— O quê? A relação de Stano, eu não sei, não pedi para ele entrar em
detalhes. — Ele leva uma garfada de comida à boca, mastigando, dando de
ombros para mim.
— Não. — Nego com a cabeça, enrolando o macarrão em meu garfo.
— Digo, como era sua relação com Silvia?
Não olho para ele quando finalizo a pergunta, mantenho minha
atenção nos cordões de macarrão que levo à boca, como se fosse o ápice da
minha noite e merecesse toda minha concentração. Escuto o som rouco da
sua garganta quando ele pigarreia, limpando sua boca com o guardanapo.
— Minha relação com Silvia foi uma cadeia de erros seguida de
arrependimento, Cristina.
Dou uma rápida olhada pelo canto dos meus olhos nele, enxergando
sua face abaixada, encarando seu prato de comida.
— Entendo. — Bebo o suco, tentando disfarçar o desconforto que
sinto, imaginado como devia ser a vida dele com outra mulher.
— Creio que não entende. Silvia é uma mulher linda, como um belo
carro de colecionador, custa caro manter a manutenção dele, mas o interior é
frio e vazio, se igualando à sua lataria brilhosa.
— Uauuu, isso realmente foi uma comparação única. — Volto a me
alimentar, preferindo ficar em silêncio e esperar ele falar mais alguma coisa
ou apenas deixar o assunto morrer.
Ariel opta pelo silêncio, não dizendo uma única palavra que seja
sobre sua ex-esposa. E, por incrível que pareça, de resto é agradável, ficar
apenas nós dois saboreando o jantar, sem briga, gritos ou pratos voando,
sendo arremessados com raiva na parede. É familiar, o que acaba me fazendo
levar meus olhos para as cadeiras vazias, imaginando qual será a
probabilidade dessa relação dar certo. Após o jantar, o deixo partir em
silêncio, indo conversar com Brow, que está fazendo a ronda com os outros
seguranças. Limpo a mesa, guardo tudo que sobrou em potes, armazeno na
geladeira, recolho a louça suja e as coloco na pia, para lavá-las.
O som baixo da música tocando no aparelho de som da sala, quebra
meu silêncio, me distraindo de manter minha atenção focada entre talheres e
espumas da esponja. O ar quente da respiração calma acerta minha nuca,
fazendo meu coração parar de bater por apenas um segundo, sendo disparado
por batidas violentas quando ele inclina sua face, encostando a ponta do seu
nariz em meus cabelos. Os longos braços, com as mangas da camisa dobrada
até os cotovelos, se infiltram pela lateral do meu corpo, repousando suas
mãos, uma em cima da outra, sobre meu ventre. Sua cabeça se mexe,
apoiando seu queixo no topo da minha cabeça, embalando nossos corpos em
um balançar calmo, pouco a pouco. Enxáguo os talhares, os deixando no
escorredor de louça, sentindo seu coração colado em minhas costas, batendo
desalinhado como o meu, enquanto ele puxa fundo o ar para seus pulmões.
Suas mãos massageiam meu ventre, circulando seus dedos pelo meu umbigo,
por cima da camisa. Inclino minha cabeça para trás, tendo seu peito como um
encosto macio e aconchegante.
— Era uma relação agressiva, onde eu me sentia mais estressado
dentro de casa do que no trabalho. Não digo agressiva fisicamente, mas
mentalmente. Brigas, discussões, o que apenas foi desgastando tudo
rapidamente. Foi um amor venenoso e violento.
Ergo minha cabeça para a janela e olho a imagem dele refletida atrás
de mim, com seus olhos presos ao meu rosto.
— Não tínhamos maturidade, eu não tinha paciência, principalmente,
e nem estava disposto a tentar compreender Silvia. Assim como ela não
estava inclinada a melhorar.
— Eu aprendi muitas coisas com a forma tóxica que Renan julgava
erroneamente ser amor. — Mantenho meus olhos presos aos seus através do
reflexo. — E uma delas é saber que o amor é bonito, brando, protetor, quente
e acolhedor. Mas se tem uma coisa que o amor não é, é doloroso e violento.
Baixo minha cabeça, puxando o pano de prato e secando minhas
mãos, desviando meus olhos dos seus. As grandes mãos em minha barriga se
separam, ficando cada uma de um lado do meu quadril. O giro calmo em meu
corpo me faz ficar de frente para ele. Respiro fundo e ergo meus olhos aos
seus, me perdendo no azul mais limpo e calmo que transmite em seu olhar.
— Aprecio sua companhia, babá McPhee. — Ariel tem sua voz rouca.
Ergue sua mão para o meu queixo, o segurando com seus dedos, passando
seus olhos por minha face. Ele solta meu queixo e retira os óculos dos meus
olhos, o deixando no cantinho da pia. — Aprecio muito sua companhia.
Minhas pálpebras se fecham e sinto a fraqueza que sempre me pega
quando fico dessa forma, tão íntima diante dele. O escorregar dos seus dedos
por minha bochecha, se embrenhando no coque do meu cabelo, me mantém
presa à sua delicada carícia.
— Aprecio muito sua companhia, doutor Miller — sussurro, abrindo
meus olhos e colidindo com as íris mais cintilantes que já me encararam.
E eu caio de cabeça, escorregando sem apoio algum em meio ao
turbilhão de emoções que me acarreta quando seus lábios se apossam dos
meus. Envolvo meus braços em seu pescoço, usando seu corpo como meu
apoio, para me garantir um ponto de equilíbrio nessa tempestade chamada
Ariel que entrou em minha vida. Não me sinto como se estivesse perdendo a
direção, mas sim a encontrando.
O amor pode ser tudo. A loucura, a queimadura e a exatidão. Mas o
amor nunca será violento.
Meus dedos circulam seus joelhos, que estão flexionados ao lado do
meu quadril. Me sinto preguiçosa, com meu corpo lânguido deitado na cama,
entre as pernas de Ariel, apoiando minha cabeça em seu peito. A janela aberta
deixa uma brisa fresca entrar para apaziguar o calor no qual tínhamos nos
queimado, bagunçando o quarto por completo. Rio ao sentir a ponta dos seus
dedos correrem por meus braços, fazendo pequenas cócegas quando toca meu
cotovelo. O movimento do seu peito, respirando calmo, me faz ficar mais
dengosa, aproveitando as suaves carícias dele.
— Por que não seguiu em frente com o caso contra Renan?
Ariel inclina sua cabeça e beija meu ombro, dando uma leve mordida,
sussurrando próximo ao meu ouvido. Suas mãos passam por debaixo do meu
braço, alisando meus seios nus.
— É muito cansativo e doloroso para uma mulher passar por um
momento cruel, como foi o meu, e ainda ser julgada duplamente, com
perguntas que não são ditas e palavras que mascaram o julgamento.
— Podia ter recorrido.
— Eu recorri a mim, Ariel, recorri à minha autoproteção. Foi tudo
uma distorção vulgar e doentia dos fatos, ao ponto de me fazer questionar
minha sanidade mental, se eu realmente estava louca e se foi tudo coisa da
minha cabeça, mesmo eu trazendo em cada canto do meu corpo as provas da
agressão que sofri.
Fecho meus olhos e respiro fundo, balançando minha cabeça em
negativo.
— A mulher, quando é agredida pelo seu parceiro, não encara apenas
a dor física e a humilhação, mas ela também lida com os julgamentos de
terceiros. — Esmago minha boca e sinto o gosto amargo das frases horríveis
que tive que ouvir. — Na certa, se apanhou, foi porque fez alguma coisa para
merecer a surra. Ou, se estava tão ruim assim, por que continuou com ele?
Sorrio sem um pingo de felicidade, me recordando de toda
humilhação que passei dentro da delegacia, quando fui registrar a queixa, e
dos meus antigos vizinhos, quando me encontraram no tribunal. Tudo tão feio
e cruel.
— Não importa qual o seu grau de estudo, sua condição financeira,
quando uma mulher é agredida, ela se torna uma vítima. E ninguém nos olha
como vítima, somos apenas uma consequência das nossas escolhas. — As
lágrimas queimam minha visão, enquanto nego com a cabeça. — Mas
ninguém escolhe sofrer na mão de quem julga amar, ficamos frágeis,
acorrentadas àquela situação, psicologicamente abaladas, fisicamente
molestadas pelo parceiro, que força o corpo dele ao nosso. Somos incapazes
de enxergar nossa própria força, porque nos julgamos inúteis, pois ficamos
condicionadas ao fracasso, à incapacidade de quebrar o vínculo.
O som da sua respiração pesa, enquanto ele me abriga forte em seus
braços, me enjaulando em seu abraço, movendo nossos corpos, me fazendo
ficar de frente para seu rosto. Seu maxilar está apertado, com seus olhos
semicerrados confrontando os meus.
— Renan te molestou? — Ariel pergunta seco, me deixando ouvir o
som rouco da sua voz sair de forma grave.
Levo meus dedos para frente do meu rosto, tapando minha face,
abafando o soluço do choro, que me rasga por dentro. Balanço minha cabeça,
confirmando sua pergunta.
— Sim... — digo baixo, fechando meus olhos.
Dizer isso em voz alta, pela primeira vez, é o mesmo que quebrar uma
barricada de um lago. O choro vem forte e violento. Sai para fora toda dor
que tranquei dentro de mim por anos. Os braços fortes que me têm sobre seu
domínio, se mantêm firmes, apenas me deixando me sentir segura, sem
julgamento, sem repúdio. Me presenteia com seu silêncio, sabendo que de
alguma forma isso me corroeu por dentro durante esses últimos quatro anos.
— O pior disso tudo é ter que compreender e admitir que se não
tivesse chegado ao ponto extremo da agressão, provavelmente eu ainda
estaria presa naquela relação doente — digo, chorando com melancolia. —
Estava tão condicionada psicologicamente àquela situação doentia, me
sentindo covarde, inferior e inútil, que eu mesma não me achava digna e
capaz de conseguir sair dela por conta própria. E isso é humilhante.
Sua mão se ergue e segura meu rosto, puxando minha face para seu
peito, me acolhendo em seus braços. O choro me domina com uma força
possessiva, saindo de dentro das minhas entranhas, rasgando minha alma a
cada soluço que escapa dos meus lábios. E tenho de Ariel a única coisa que
preciso: um abrigo seguro que me sustenta, me garantindo desmoronar em
seus braços. Suas mãos alisam meus cabelos, sussurrando palavras ternas em
tom brando, não se importando se demorará uma hora ou a noite inteira para
cessar as lágrimas. Com sua forma silenciosa e gestos calmos, me diz sem
palavras que ele continuará exatamente aqui. Depois que o choro passa, pelo
que me parece um longo tempo, me livro do desespero antigo, que finalmente
foi libertado do meu coração. Me sinto em paz.
— Gentil — sussurro, fungando e erguendo meus olhos para ele.
Ariel se demora em minha face, levando sua mão para minhas bochechas, as
limpando.
— Gentil não é palavra que eu ousaria aderir para descrever meu
estado de espírito nesse momento, minha doce vênus.
— Mas eu sim. Essa manhã usou seus argumentos válidos, e agora eu
estou usando de apelação, doutor Miller. — Sorrio para ele, escorregando
meu dedo pela sua sobrancelha, a contornando lentamente. — É a pessoa
mais arrogante que eu conheço, mas também a mais gentil.
Colo minha testa à sua, esfregando meu rosto na pele quente dele,
suspirando com calma. As mãos de Ariel escorregam por minhas costas,
parando em minha cintura, segurando firme. Não sei ao certo dizer como
faremos isso funcionar, se tem grandes chances de erros muito mais do que
acertos, mas a verdade é uma só: eu me sinto segura em seus braços, me sinto
viva. Ariel nos gira na cama, depositando minhas costas no travesseiro. Sua
mão alisa meu rosto com seus gestos dominantes, se arrumando sobre mim,
se apossando com poder da minha boca, com seus beijos apagando todas as
lembranças ruins.
— Ohhh, Ariel! — A minha virilha inflama em desejo, enquanto
estico minhas pernas, as empurrando para os lados, quase me torcendo de dor
com toda a luxúria que ele desencadeia em mim.
Meus braços se erguem, parando perto da minha cabeça, esmagando
meus dedos no travesseiro. A língua de Ariel desliza curiosa pela minha
garganta, entre beijos e mordidas, até chegar aos meus seios, que arrepiam a
pele quando a quentura da sua respiração paira sobre eles. Meu peito sobe e
desce rapidamente, aumentando as batidas do meu coração. Arqueio meu
tórax para cima, com o bico ereto da mama praticamente implorando por
atenção.
— Apelação aceita, senhorita Self — Ariel fala rouco, com a
respiração acelerada, erguendo meu pulso para cima da minha cabeça,
levando o outro junto logo em seguida, os segurando unidos, me deixando
com eles imobilizados.
Minha boca se abre em um perfeito “O” quando sinto o hálito quente
dos lábios de Ariel se fechando sobre meu seio, mamando com força,
circulando sua língua em volta da auréola. Choramingo de prazer, o que o
incita a sugar mais forte meu seio com pura vontade.
— Ohhh... — Mordo meus lábios, fechando meus olhos, sendo
arrastada para a sedução tão crua a qual ele me tem.
Ele desliza mais sua língua, brincando apenas com o bico entre seus
dentes, dando pequenas pinceladas apenas para voltar a sugar como se tivesse
pretensão de me aplicar essa tortura a noite toda. Seu pau pulsa entre minhas
pernas, raspando na entrada da minha boceta molhada, que parece apenas
precisar tê-lo por perto para estar pronta para recebê-lo. Ariel segura meu
quadril, investindo-o de forma lasciva contra o meu. O leve toque da cabeça
grossa do seu pau, raspando em minha boceta, como provocação, é o
suficiente para me fazer querer chorar, em uma mistura de ódio e desejo. Sua
grande boca curiosa solta meu seio apenas para pegar o outro, o torturando da
mesma forma que fez com o primeiro. Gemo, com os olhos fechados em
abandono, me sentindo ser empurrada para a borda, quando finalmente Ariel
começa a empurrar seu pau dentro de mim, encaixando nossos quadris.
Minha vagina se expande para receber seu pau latente dentro do meu interior.
Ariel entra pouco a pouco, se afundando lentamente, me torturando
enquanto sua boca continua a sugar meu seio, o chupando com pressão, o
deixando tão firme entre seus lábios. E como um perfeito quebra-cabeça,
nossos corpos se completam. O gemido escapa dos meus lábios e desejo
apenas estar com as mãos livres, para me segurar a ele, pois posso jurar que
estou caindo em um precipício. Sinto o sangue que corre como fogo em
minhas veias, me levando a respirar duas vezes mais rápido, enquanto meu
mundo é sugado para o dele. O quarto escuro se torna minha cela preferida,
me prendendo em meio ao misto de paixão que Ariel está me levando. Meu
cérebro lateja forte, como se explodisse em mil partículas. Meus dedos se
fecham em punho e sinto as mãos fortes dele segurando com brutalidade meu
quadril. Meu coração bate acelerado, como se pudesse sair explodindo de
dentro do meu peito. A boca de Ariel suga com mais força meu seio, tendo
seu pau pressionando dentro de mim. Em leves movimentos, sai e entra,
tomando cada canto do meu ser. Ele me marca quando seus dentes se forçam
sobre a pele sensível com tanta força, me fodendo fundo, nos colando um ao
outro.
— Ohhh, Ariel! — Minha cabeça vira para o lado, abafando meu
grito na pele grossa do braço dele, que se mantém esticado, segurando meus
pulsos.
E, por impulso, meu corpo se arqueia para cima. Tento mexer meu
quadril, querendo mais, implorando por tudo que ele me faz sentir.
— Mais rápido... Por favor. — É como se fogo puro percorresse
minhas veias agora, a lava mais pura e quente de um vulcão que entrou em
erupção depois de muito tempo adormecido, me incendiando, queimando
meu corpo por inteiro.
Não sei ao certo se sinto alívio, abandono ou perdição quando ele
solta meu seio, trazendo suas mãos para o lado do meu corpo, libertando
meus pulsos, deixando as grandes mãos dele espalmadas no colchão,
movendo com pressão o corpo contra o meu. Minha vagina o recebe com
alegria descarada a cada estocada bruta, que vai aumentando conforme a
batida forte da sua pélvis contra a minha. As mãos, que estão livres agora, me
fazem matar minha vontade, e deslizo-as por seus braços, apertando meus
dedos à carne. Meus olhos se abrem e gemo enquanto chamo seu nome,
sendo fisgada pela sua intensidade. Vejo os olhos brilhantes em azul, que me
absorvem. Ergo minha mão e seguro em sua nuca, abrindo ao limite minhas
pernas, as deixando esparramadas na cama. Meu braço se prende em suas
costas, cravando minhas unhas em sua bunda, gemendo com seu pau tão
fundo, que me toma por completo. Tudo vira uma eterna montanha-russa de
emoções.
— Mais! Deus... Mais, mais... — imploro sem vergonha alguma a ele,
pois é a única coisa que consegue sair com algum nexo dos meus lábios.
Meus dedos espalmam em seu rosto, e o vejo tão perdido quanto eu
em sua queda livre, na qual nós dois nos encontramos.
— Nunca vou deixar você, Cris.
Sua cabeça se abaixa, tomando meus lábios em toques desesperados,
e o gosto do seu beijo é como um vício, liberando todas as químicas que
disparam dentro de mim, me deixando em perdição por vontade de nunca o
deixar ir para longe de mim. Os corpos se unindo, a dor, a agonia, tudo
misturado ao beijo, a cada penetração profunda. Minha vagina se aperta mais,
se colando em volta do seu pau, o sugando para mim, o recebendo entre o
desejo e a euforia. Meus dedos param em seus ombros, e me agarro a eles. O
som rouco que sai pelos lábios de Ariel entre nossos beijos, entra em meus
ouvidos e se espalha por todo meu corpo, que vibra junto ao dele. E entre
batidas latentes e rápidas, vejo tudo explodir à minha volta em milhões de
partículas, com o orgasmo forte que corre por todo meu corpo. Ele separa
nossos lábios e geme alto, me deixando tão cheia e quente a cada jato que
solta dentro de mim, gozando junto comigo.
Ariel deixa novos sons roucos escaparem dos seus lábios, travando
seus olhos com os meus, se arrematando fundo entre as últimas estocadas.
Seu grande corpo tomba sobre o meu, mantendo seus cotovelos presos ao
colchão, segurando parte do seu peso, enquanto nossos corações batem com
força desesperada, como dois náufragos que chegam à terra firme. Minha
boceta se retrai, assim que a curiosa língua dele desliza em minha garganta,
parando em cima da veia, circulando a pele. Ele respira fundo, esfregando seu
rosto em meus cabelos.
— Somos bons nisso. — Minha voz trêmula sussurra. Escondo meu
rosto em seu pescoço, abafando um gemidinho quando ele empurra seu
quadril contra o meu.
— Somos muito bons nisso, babá McPhee.
Meus braços se apertam em suas costas e solto o ar lentamente dos
meus pulmões, relaxando os músculos das minhas pernas.
— Podemos tentar — murmuro, abrindo meus olhos e encarando o
teto do quarto.
A respiração de Ariel se acalma enquanto ele se afasta, se retirando
lentamente de dentro do meu corpo. E é muito a contragosto que meus braços
o soltam. O vejo em seus joelhos quando ele se senta entre minhas pernas,
olhando para meu corpo nu e suado à sua frente. Seu olhar recai sobre minha
barriga. Estica sua mão, parando-a em cima dela, a deixando achatada com os
dedos abertos.
— Somos bons juntos. — Sorrio para ele, arrumando meus cotovelos
no colchão, inclinando a parte superior do meu corpo para cima, olhando sua
mão sobre o meu ventre. — Talvez dê certo.
E mesmo em meio à escuridão, com a pouca luz que entra pela janela
do quarto, eu posso jurar que vejo, por uma fração de segundos, uma centelha
de tristeza brilhar em seus olhos, o que me faz ficar com a guarda erguida. E
se o homem se arrependeu da ideia de querer realmente formar uma família?
— O que... O que foi? — Ariel desvia seus olhos dos meus, voltando
a olhar para o meu ventre. — Se arrependeu?
Uma vergonha tão grande vai me consumindo, e estar nua e exposta
diante dele nunca me pareceu uma cena tão horrível quanto agora. O deixei
ver muito além do meu corpo, tinha mostrado a Ariel minha alma. Tento
puxar as pernas, procurando uma maneira de esconder meu corpo, para me
afastar dele, mas suas mãos são mais rápidas quando ele segura meus joelhos,
mantendo minhas pernas quietas, as deixando exatamente como estavam. Ele
volta sua atenção para meu corpo, passando seu olhar por cada canto de mim,
e a grande mão que estava em meu ventre, desliza livre por minha pele, me
fazendo observar atenta o contraste das nossas peles, alisando de mansinho,
deixando meu corpo relaxado.
— Não sou gentil, Cristina — Ariel fala baixo com sua voz rouca,
tombando sua face para o lado, com seus cabelos bagunçados, tendo sua pele
brilhando pelo suor.
Ele para sua mão sobre meu seio, onde sinto a pele tão sensível e
acompanho seu olhar, enxergando a marca da sua arcada dentária. É visível a
pressão que ele usou para morder minha pele. Estava tão dopada com toda a
luxúria, que nem notei a força com que ele tinha me mordido.
— Não foi com cavalheirismo que eu a fodi, foi com posse.
— Está tudo bem. — Volto meus olhos para os seus. — Não foi ruim.
Na cama eu posso lidar com seu controle.
Sorrio, me deitando no colchão e alisando seu braço, suspirando com
calma.
— Não posso garantir que minha necessidade por controle não falará
mais alto em alguns momentos fora da cama.
— Quando isso acontecer, eu vou lhe informar, doutor Miller.
Vejo seus olhos brilharem de forma quente enquanto ele se deita
lentamente sobre meu corpo novamente. Deixo meus dedos voltarem para
seus braços, acompanhando as linhas dos seus músculos, indo para seus
ombros, percorrendo suas costas, fechando meus braços em sua volta em um
abraço assim que seu corpo volta para mim outra vez. Sinto a ponta do seu
nariz passar por minha bochecha, alisando meu pescoço como se estivesse
me farejando. Sua respiração pesada retorna e viro meu rosto para o lado, o
tombando no travesseiro, procurando por seus lábios. Posso sentir aquela
emoção que me aquece, o coração me tomando outra vez quando nossos
lábios se encontram. Não é mais a loucura ou o desejo desenfreado que me
consome, é algo brando, acolhedor, de forma terna, o que nunca senti por
ninguém. E de repente não me vejo mais amedrontada ou assustada com
todos os rumos que nosso futuro pode tomar. Sua mão forte afaga meu corpo,
apertando cada canto que toca. Felicidade e paz me assaltam com seus
toques. Afasto novamente minhas pernas, o deixando confortável entre mim,
sentindo seu pau voltar a ficar duro, se encaixando entre os lábios da minha
boceta inchada. Ariel entra, mesmo não estando tão duro como antes, mas
posso sentir como ele cresce em meu interior, quando seu corpo começa a se
mover lentamente.
— Somos fodidamente bons juntos.
Sua voz baixa geme rouca entre meus cabelos, me apertando mais a
ele, enquanto nos conduz de volta ao precipício, só que dessa vez de uma
forma que me rouba muito mais que gemidos, rouba a minha alma, a
deixando presa a ele.
Sim, somos bons juntos.
— Mas, senhorita Self...
Ergo minha mão, negando ao ouvir seu discurso outra vez.
— Não vai entrar comigo, Brow — falo rápida, pegando minha bolsa.
— Imagina o que as pessoas do escritório vão dizer se eu entrar com um
homem de dois metros de altura me escoltando a cada passo dentro do meu
trabalho?
— Foi ordem direta do Ariel, Cristina.
— Deixa que me viro com ele. Eu cumpri minha parte, não foi?
Aceitei você me trazer e me levar para casa quando ele não puder, e me
acompanhar quando eu precisar, mas nada de querer entrar junto comigo na
firma.
— Ele vai ficar bravo. — Os olhos de Brow me encaram pelo
retrovisor interno do carro.
— Ariel sempre está bravo, Brow. — Repuxo meu nariz e olho para o
prédio.
— Não quer mesmo que eu suba com você?
Não posso mentir que não estou tentada a aceitar sua oferta, pois
posso imaginar o olhar gélido que o notório criminalista vai me dar assim que
me ver entrando em seu escritório.
— Creio que consigo dar conta do mau humor dele.
— Qualquer coisa vou estar aqui na frente do prédio, lhe aguardando.
Pisco para ele em concordância, abrindo a porta do carro e saindo
feito uma bala disparada para dentro do prédio. Passo pelas portas do edifício
e me deparo com Bete, que está tagarelando com duas assistentes do primeiro
andar.
— Cris, bom dia!
— Merda! — murmuro baixo quando ela me avista, deixando as
assistentes de lado e caminhando para mim. — Bom dia, Bete.
— Menina, fiquei preocupada com você, sumiu todos esses dias,
fiquei assustada. A última vez que lhe vi, foi sendo carregada nos braços
daquele demônio.
Desconfio que a preocupação de Bete não seja com a minha saúde e
nem com as minhas faltas. Ela apenas quer especular porque um dos sócios
me pegou no colo.
— Pois é, acabei precisando de mais alguns dias para minha saúde
estabilizar.
— Ainda bem que teve ajuda rápida do doutor Miller. — Esmago
minha boca, balançando a cabeça em positivo para ela. — Todos nós ficamos
sem reação com a forma grosseira como ele falou com Malvina. Dizem que
ela está tão ressentida por ele não ter se desculpado, que nem olha na cara
dele...
Atravesso o hall do prédio, indo direto para as escadarias, tentando-a
fazer desistir de me acompanhar. Mas, para meu desânimo, Bete não só abriu
a porta para que eu pudesse passar, como ela também começou a subir os
degraus à minha frente.
— Na verdade, estava tão desligada com a minha queda de pressão,
que não reparei — falo séria, tentando soar calma, mas dentro de mim admito
que estou feliz por saber que aquela vadia está afastada dele.
— Pois foi só você. De resto, todos repararam. Malvina saiu com os
olhos marejados de lágrimas, soluçando baixo. — Bete ri, me contando sobre
Malvina, o que me faz ficar mais preocupada com os rumores. — Não que eu
tenha sofrido por ela, para ser franca, gostei de ver alguém colocando aquela
megera no lugar dela, mas eu ainda continuo achando aquele homem
pavoroso. Não sei por que não pede para o doutor Pietro lhe remanejar para
Max. Ele ainda não arrumou uma secretária...
Ela não para. Bete tem um dom peculiar de falar diversas asneiras
pela sua boca como se estivesse palestrando, e o pobre desavisado que cai no
seu momento de discurso apenas se torna um ouvinte entediado, que cortaria
os próprios pulsos para poder se matar e parar de escutar sua voz irritante.
Avisto a porta do meu andar e me sinto feliz por saber que logo meu
momento tortuoso terminará.
— Estou agradecida por sua preocupação, Bete, mas não penso em
pedir remanejamento para trabalhar com Maximiliano. — Passo à sua frente,
quando ela para, se virando para me encarar.
Subo mais quatro degraus, usando meu cotovelo para empurrar a
porta. Antes mesmo de dar dois passos para dentro do escritório, sou
confrontada pelo diabo em pessoa em seu terno sob medida, completamente
negro, me encarando severo.
— Para minha sala agora! — Ariel estica sua mão, a espalmando em
minhas costas, levando sua atenção para Bete tagarela, que finalmente entope
sua grande boca ao encarar o olhar bravo de Ariel.
— Como? — Olho perdida para ele, sem entender como ele sabia que
eu estava subindo, mas então me lembro do linguarudo do Brow. — Bom dia,
doutor Miller... — Minha voz, com altivez fajuta, usa uma mixaria de
coragem, que raspo do meio das minhas entranhas. Mantenho meus olhos
fixos aos seus.
E quem me olhar aqui, o encarando, não notará que passei a noite toda
dormindo feito um bebê, aconchegada em seus braços, com sua grande mão
espalmada em meu ventre.
— Vamos. — Ele dispensa Bete com um olhar bravo, se virando e
caminhando rabugento rumo à porta da sua sala, mantendo sua mão em
minhas costas, de forma íntima.
Sorrio apática para alguns dos funcionários bisbilhoteiros que nos
acompanham com seus olhares curiosos. Ariel abre a porta do escritório e nos
leva para dentro dele, fechando a porta atrás de si de forma bruta, a
chaveando.
— Vou ser obrigado a te amarrar na cama?
— Oh, deixe de bobagem, doutor Miller. — Solto a bolsa em cima da
mesa e me viro para encarar meu sexy carcereiro zangado.
Ariel me surpreende, parando à minha frente, com suas mãos ligeiras
e terríveis puxando minha camisa para cima, espalmando sua mão em minha
barriga.
— Devia estar descansando, como o médico recomendou. — Ele
tomba sua cabeça para o lado em seu ombro, com um leve brilho nos olhos
azuis ao contemplar meu ventre. — Por que tem que ser tão teimosa,
Cristina?
— Ariel, estou bem, o atestado não duraria para sempre.
— Posso arrumar isso, se for o caso.
— Não... Não pode! — Tento estapear seus dedos, para que ele se
afaste de mim, mas isso é quase o mesmo que tentar empurrar uma parede. —
Ariel... Ariel, o que pensa que está fazendo?
Ele não me responde, apenas mantém o ritmo das suas carícias em
minha barriga, me fazendo ter cosquinhas quando a ponta do seu dedo
contorna meu umbigo.
— Quando será a próxima consulta com a obstetra?
— Semana que vem. — Ele balança sua cabeça em positivo e ergue
seus olhos para mim. — Vou ter que arrumar uma brecha na sua agenda —
digo.
— Daremos um jeito. — Suas mãos escorregam por minha pele,
enlaçando minha cintura, apertando seus braços em minhas costas, tirando
meus pés lentamente do chão. — Bom dia, babá McPhee.
— Bom dia, doutor Miller. Como foi sua noite? — Meus braços
param ao lado do seu pescoço, abaixando meus olhos para seus lábios.
— Muito boa, deliciosamente boa.
— Descarado! — murmuro, sorrindo, me agarrando em seus ombros.
Solto de vez minha vontade de sentir a textura dos seus lábios nos
meus, o capturando lentamente, me derretendo com a forma esmagadora
como Ariel me tira o ar. Sinto minha bunda aterrissar em cima da minha
mesa, com os dedos curiosos dele puxando a barra da grande saia para cima,
resmungando entre nosso beijo.
— Não pode ser tão pervertido, de querer ficar de amasso com a
secretária dentro da sua sala — sussurro, mordiscando seus lábios.
Não preciso de muito para ele me incitar. Meu corpo queima como
uma chama forte sempre que seu toque repousa em mim. Minhas mãos
imploram por sentir sua pele entrando em contato com a minha, e essa fome
apenas me desencadeia tanto vontades quanto urgências. O som das coisas
caindo ao chão enquanto ele me empurra para trás não me incomoda, nem o
fato de Ariel estar prestes a me tomar aqui dentro dessa sala de escritório. Ele
sabe como deixar uma mulher viciada por seu sexo. Seus beijos marcam
minha pele, sendo depositados em um caminho tortuoso, do meu queixo ao
pescoço, passando por cima do tecido da camisa até sua cabeça ficar
posicionada entre minhas pernas. E é assim que me sinto eufórica. Meus
hormônios descontrolados pedem mais dele, sendo disparados desenfreados
dentro de mim com apenas um beijo. E eu me queimo feliz assim que sua
respiração quente assopra em cima do tecido fino da calcinha, apenas a
empurrando para o lado, me sugando entre seus lábios.
— Oh, merda! — Mordo minha boca, segurando um gemido,
tentando abafar os sons que escapam dos meus lábios.
As pinceladas da sua língua aumentam como uma chibata certeira,
que me pune, me levando ao prazer pleno. O som do telefone, que começa a
tocar dentro da sala, me faz rir, e o empurro para longe de mim. Ariel segura
minha cintura e me ajuda a descer da mesa, abaixando a minha saia.
— Não pense em sair dessa sala. — Ele caminha para sua mesa e
retira o telefone do gancho, levando-o à sua orelha. — Miller falando. —
Assim que estou devidamente alinhada outra vez, arrumo meus óculos tortos
em minha face e olho para ele. — Sim, sim. Diga que já estou chegando.
Ele deposita o aparelho no gancho e encerra rapidamente a ligação,
olhando para o relógio em seu pulso.
— Eu tenho que ir para o tribunal.
— Claro, só vou pegar sua agenda.
— Não, Cristina. Disse que eu tenho que ir para o tribunal. Você fica
e me aguarda aqui, até o fim do julgamento.
— Mas, Ariel... — Nego com a cabeça. Não entendo por que ele tem
que ser tão teimoso. — Estou bem, eu quero acompanhar o final do caso Brat.
— Preciso saber que você está segura, para que eu possa me
concentrar — ele me corta de uma única vez, sério, com sua face fechada. —
Já que não posso te amarrar de vez na cama, pelo menos fique dentro da
minha sala. Brow trará seu almoço, não sei quanto tempo o julgamento pode
demorar.
— Está legal — respondo a contragosto, sabendo que se eu tentar
argumentar, será pior. — Mas não precisa pedir para Brow trazer meu
almoço, eu posso pedir para o restaurante entregar aqui.
— Brow vai trazer seu almoço e você vai ficar dentro dessa sala, me
esperando. — Ele não me deixa falar, tapa minha boca com a sua em um bote
sorrateiro e rápido, me beijando com força. — Por favor, eu preciso que faça
isso para que possa me concentrar nesse julgamento.
Estou pronta para brigar, discutir até o último argumento, se for o
caso, mas seu olhar preocupado me desarma. Mais uma das diversas facetas
do notório infame doutor Miller, que mais uma vez me desestabiliza, me
deixando ver uma de suas faces. E o que ela me mostra é medo, não apenas
sua mania de me controlar, mas sim uma preocupação alarmante. Posso
compreender um pouco da egocentricidade de Ariel e a sua forma amarga de
lidar com a vida depois que ele me contou sobre Dolly. Isso deve ter
abrangido bastante essa sua persistência de ser autoritário.
— Já que não tem remédio, fazer o quê, né?! — Lhe dou um sorriso
calmo, recebendo dele um beijo em minha testa.
O vejo partir e me largar dentro da sala, a fechando atrás dele. Solto o
ar pelos meus lábios, esfregando meu cenho franzido. Ainda não acredito que
ele não me deixou acompanhá-lo. Depois de arrumar a bagunça que fizemos
em minha mesa, pegar o que caiu no chão, guardando em seu devido lugar,
me sento e puxo os relatórios para cima da mesa. Vou deixar em ordem toda
a documentação que eu perdi nesses dias, já que é o que me resta para fazer.
Entre novos casos que deixei digitalizados, e telefonemas marcando os
recados para Ariel, cumpro minha parte, ficando dentro do escritório pela
manhã toda, apenas matando minha curiosidade uma hora ou outra, buscando
por informação do andamento do caso de Brat pela internet. Mas nada de
notícia do resultado da audiência ainda. Provavelmente levará grande parte
do dia até sair o veredito final. Não sei se Ariel irá levar Violet para o banco
das testemunhas ou a descartará.
— Fiquei sabendo que alguém voltou e nem foi me ver. — O som da
voz de Max, falando dentro da sala, me tira da concentração do meu trabalho,
me fazendo sorrir ao olhar para ele, que segura um copo de café, deixando
sobre minha mesa. Me levanto e afasto a cadeira, lhe dando um abraço.
— Oh, Max, perdão, eu devia ter ido na sua sala!
— Imagino que deva estar cheia de trabalho, por isso lhe dou um
desconto. — Ele se afasta, sorrindo, alisando meu rosto. — Como está a
futura mamãe?
Automaticamente olho na direção da porta aberta e caminho para lá, a
fechando, sorrindo sem graça para ele.
— Estou bem — sussurro, olhando meu ventre.
— Quis ir te visitar, mas Pietro não achou que seria de bom tom,
ainda mais agora, que Ariel está tão superprotetor em relação a você.
— Ele exagera, eu sei. — Coço minha cabeça e a tombo para o lado.
— Devia ter me ligado, mandado uma mensagem, eu o teria recebido de
qualquer jeito.
— Eu sei que sim, e é por isso que te amo. — Ele pisca para mim,
levando seu olhar para meu ventre. — Mãe de gêmeos?!
— Sim, dá para acreditar, Max? — Tapo meu rosto e encolho meus
ombros. — Às vezes tenho medo de que seja um sonho, mas então olho para
minha barriga e sei que é verdade. — Retiro meus dedos do meu rosto,
olhando sua face risonha. — É uma sensação única, saber que estou gerando
duas vidas dentro de mim.
— Você merece, Cris, merece toda felicidade desse mundo. E eu
estou muito feliz por você. — Max caminha para mim, segurando meus
ombros. — Vai ser uma mãe maravilhosa.
O abraço com carinho, dividindo com ele esse momento tão feliz que
estou. Max, melhor do que ninguém, sabe o quanto eu sofri nessa minha
trajetória. Sinto seu beijo terno em cima da minha cabeça, com ele respirando
fundo.
— Sabe que pode contar comigo no que precisar, não vai estar
sozinha.
— Eu sei, meu amigo. — Me afasto dele, mordendo meus lábios,
decidindo se converso com ele ou não sobre minhas decisões sobre o futuro.
— Ariel quer se casar, Max.
O vejo dar um passo para trás, levando suas mãos aos bolsos da calça,
olhando surpreso para mim, dando um comprido assobio.
— Uau! Sério? Miller quer se casar por causa dos filhos?
— Bom, não é exatamente por conta dos filhos. — Desvio meus olhos
dos seus, sentindo minhas bochechas queimarem de vergonha.
— Estão se entendendo? — Max me pergunta de uma vez só.
— Digamos que sim. Ariel pode ser muito difícil de lidar em alguns
momentos, mas ele é, ele é...
— Está apaixonada por ele, Cris? — ele pergunta, intrigado,
estreitando seus olhos, me analisando.
Cruzo meus braços em cima do meu peito, batendo lentamente a
ponta do meu sapato no chão.
— Estou... Acha que isso é ruim, Max? — Elevo meus olhos aos seus,
que estão pensativos. — Que estou fazendo outra burrada, como foi com
Renan?
O som das batidas na porta nos interrompe, e Bete entra, chamando
por ele. Max retira sua mão do bolso da calça, ergue seu dedo indicador e
endireita meus óculos.
— Vou ficar com meus olhos em você, ok?!
— Ok!
Sorrio para ele e o vejo se retirar da sala. Os olhos curiosos de Bete
estão parados em mim, bisbilhotando, e ela morde o canto lateral da sua boca.
— O que foi? — Descruzo meus braços e a olho.
— Já que voltou, poderia me dar uma ajuda com alguns documentos
que estão pendentes? Meio que cuidar de Pietro, Max e do doutor Miller foi
muita coisa para uma só durante esses dias, acabei acumulando trabalho.
Seu sorriso se expande, com ela batendo seus cílios para mim, com
cara de pedinte. Sou obrigada a rir e caminho para perto dela, para lhe ajudar.
— Vamos lá, me mostre no que está precisando de ajuda.

Fingir que não vejo os olhares estranhos em minha direção, quando


Brow entra no escritório, me trazendo o almoço, não é nada comparado ao
desconforto de ter que encarar Malvina na sala de café, que não esconde um
segundo sequer sua antipatia por mim. Acho que a mulher nasce com um faro
natural para saber quando outra chutou o rabo dela para fora da jogada, pois a
rivalidade que ela mantém no seu olhar de rapina é gritante, o que me faz
perder o apetite por completo, descartando meu almoço na lata de lixo, o
deixando pela metade. Saio de lá o mais rápido que posso, para não ouvir os
murmúrios. Passo no banheiro, me limpo e escovo meus dentes, indo na
direção da sala de Ariel em seguida.
Encontro um entregador, parado no meio da sala da recepção, e não
há ninguém para recebê-lo. Ele segura uma imensa caixa em suas mãos, e é o
responsável por me fazer mudar minha rota. Certeza que Bete saiu para
almoçar, sem esperar que o meu horário de almoço terminasse, e a outra
menina também não tinha voltado.
— Pois não? Em quem posso te ajudar?
— Senhorita Self? — ele pergunta, puxando uma prancheta
pendurada na lateral do seu corpo.
— Sim, sou eu.
— Entrega para a senhorita.
Olho confusa para a caixa branca com o laço negro aveludado, sem
entender o que seria isso.
— Poderia assinar aqui, por favor? — O rapaz estica a prancheta para
mim.
Pego a caneta em cima da minha antiga mesa, onde eu trabalhava na
recepção, e assino o documento. Assim que a folha é rubricada, o entregador
estende a caixa para mim.
— De quem é? Veio algum cartão?
— Veio sim, só um momento. — Ele leva a mão para trás da calça,
puxando o envelope negro com ele. — Mas não está assinado. Só tinha a
caixa lá no balcão da firma, com o endereço de entrega para a senhorita,
quando fui pegar minha rota.
— Claro, obrigada.
O vejo se afastar, enquanto me viro, voltando para a sala de Ariel.
Deixo a caixa em cima da minha mesa e solto o laço negro. Assim que meus
dedos vão para a tampa, o telefone começa a tocar com insistência. Estico
meu braço e o tiro do gancho, atendendo a ligação.
— Escritório de advocacia. — Abro o cartão e puxo o bilhete, que
contém letras digitadas.
O som grave de uma respiração pesada do outro lado da linha me faz
ficar alarmada.
— Alô?
“Ainda se lembra de quando nos conhecemos?”
O som baixo de uma puxada forte de ar, do outro lado, me faz gelar.
Ouço a respiração alterada dele enquanto leio o cartão.
“Eu sim. Me lembro de tudo, de cada segundo. E se eu fechar meus olhos,
posso me ver diante de você agora.”
— Renan... — Fecho meus olhos e seguro o aparelho, sentindo meus
dedos trêmulos, compreendendo as palavras do bilhete. — Por que fica
fazendo isso?
Abro meus olhos e sinto as lágrimas os queimarem, enquanto ele
mantém suas lufadas de ar fortes e roucas no telefone.
“Me recordo que olhei você e a vi de cabeça baixa, desprotegida, tão frágil...
E a única coisa que pensei foi em como seria a esposa mais linda, como eu
queria ser o pai dos seus filhos. Mas eu não sou, não é, Cristina? Você foi
rápida em achar um pau para meter em suas pernas, para lhe engravidar.
Espero que aproveite seu presente, meu amor. Servirá tanto para você como
para o que cresce dentro do seu ventre.”
— Oh, meu Deus! — Tapo minha boca, sentindo meus olhos
queimarem. — Como... — Seguro o choro, olhando a mesa de Ariel. —
Renan, como soube? Quem te contou?
Meus olhos se voltam para a caixa em cima da mesa e respiro com
força. Estico meus dedos e empurro a tampa. Meu rosto está queimando, com
o ar sendo puxado rápido para meus pulmões, com meu coração acelerado. A
coroa de flores negra, com uma faixa de condolências a cobrindo, tranca por
completo minha fala. Mas é o que tem no meio dela, que fraqueja de vez
minhas pernas. O telefone escorrega pelos meus dedos, caindo ao chão,
ficando pendurado ao fio, enquanto meus olhos estão presos ao pequeno feto
envolto no cordão umbilical. Minha mão vai ao meu ventre e solto o bilhete.
Tento me mover, mas minhas pernas parecem ter petrificado, ficando
pesadas, com toda a sala rodando à minha volta. Um breu horripilante me
puxa para dentro dele, me engolindo enquanto meu corpo vai ao chão.
Capítulo 23
Arcanjo negro
Ariel Miller

O som dos pneus do meu carro freando bruscamente em frente à


calçada do bar noturno no centro da cidade, faz o pessoal se assustar, pulando
para trás. Greg traga um cigarro, encostado na parede, do lado de fora, e olha
para mim preocupado. Ele se desencosta da parede e joga seu cigarro no
chão, pisando em cima, esfregando suas mãos uma na outra.
— Onde ele está? — Bato a porta do carro com força quando saio
dele, encarando Greg. Seu dedo se ergue, apontando para dentro da boate.
— Quarto quinze, com uma prostituta.
Meus punhos se fecham, enquanto toda adrenalina entra no meu
corpo, fazendo meu coração bombardear em velocidade extrema.
— Não achei que iria querer vir pessoalmente quando me ligou,
pedindo para rastrear o engomadinho, pensei que desejava só algumas fotos.
Vai querer conversar com ele?
— Podemos dizer que sim! — Respiro com força, esmagando minha
boca, me dirigindo para a entrada da boate. — Pode ir, daqui eu comando.
Retiro a grana do meu bolso e entrego para ele, o dispensando. Greg
precisou de apenas quarenta minutos para me passar a informação que eu
precisava depois que liguei para ele, pedindo para encontrar Renan Pener. O
achou dentro de uma espelunca nojenta, que pertence a um dos meus clientes.
Há uma pequena regalia quando se defende homens inescrupulosos,
independentemente de seus negócios. Se você os livra do corredor da
penitenciária máxima, você faz muito mais que clientes felizes, faz aliados. E
um bom advogado criminalista sabe quais são os clientes que podem ser úteis
futuramente. O corpulento homem careca, parado na porta da boate, com os
braços cruzados, que me encara enquanto ando para ele, não precisa de muito
tempo para me reconhecer, já que Greg o tinha alertado que eu estava a
caminho. Ele estica sua mão para mim quando me aproximo, me
cumprimentando.
— Boa noite, patrão Miller, seu GPS se perdeu por esses lados da
cidade? — A grande barriga dele balança, passando a mão pelo rosto. — Ou
resolveu finalmente conhecer minhas meninas?
— Tem alguém dentro do seu estabelecimento com quem eu preciso
conversar, Bosh! — Minha voz sai ríspida, enquanto o encaro. — Em
particular.
— Isso não vai me dar dor de cabeça, patrão? Tenho que ganhar pelo
menos alguma coisa. — Ele ergue sua outra mão, passando por sua cabeça
careca, olhando para mim. — Eu ainda estou em liberdade provisória.
— Sabe que eu posso tirar sua liberdade provisória com a mesma
facilidade que eu a consegui para você, não é? — Mantenho meu aperto
firme em sua mão, não a soltando, espumando de raiva por minha boca. —
Posso lhe garantir que o juiz não será brando dessa vez, quando souber que
está aliciando menores de idade para se prostituir nesse lixo de casa noturna.
Solto sua mão enquanto ele xinga baixo, olhando para trás dele. Sua
cabeça balança em positivo para um dos seguranças, confirmando minha
entrada.
— Tenta pelo menos tirar aquela vadia da assistência penitenciária do
meu pé. — Ele se afasta, apontando para a porta.
— Quarto quinze? — pergunto com raiva.
— Segue até o bar, vire à esquerda, primeira porta à direita.
Passo reto por ele e caminho com raiva, olhando o corredor escuro,
com luzes neon piscando. Ao fim, a porta branca é aberta, me levando para
dentro do miserável cubículo com música alta e cheiro de cigarro misturado
com odor de corpos suados. Vejo mulheres nuas transitando pelo salão, ao
fundo os clientes observam as dançarinas fazendo striptease em cima da
mesa. Encontro o bar e vou direto para ele. Minha mente se desliga, nada me
acalma, ainda tenho o cheiro do corpo dela colado em minha roupa, seu rosto
abatido dentro do hospital, com os olhos vermelhos de choro, olhando
fixamente o teto do quarto da sala de emergência.
Foi Bete quem a encontrou caída dentro da sala e a levou direto para o
hospital. A maldita caixa de presente ainda estava em cima da mesa do meu
escritório quando eu entrei em busca dela, recebendo a notícia que Cristina
estava internada e teve o começo de uma hemorragia. O maldito julgamento
tinha me tomado praticamente o dia todo. Stone saiu livre da acusação de
assassinato, por conta do álibi mentiroso da sua assistente. Eu apenas queria
vê-la, queria esquecer esse maldito caso e nunca mais olhar na cara de Stone.
Voltar para Cristina, isso foi tudo que pensei durante cada segundo dentro
daquele tribunal. Mas eu perdi o controle quando soube do que aconteceu. Há
poucas coisas que me deixo governar, e minha raiva é uma delas, porque
tenho consciência dos estragos que faço quando a liberto, mas nada me
controla nesse momento.
A porta do quarto sendo estourada pelo meu chute, assusta a
prostituta, que pula da cama, correndo para o canto da parede. Olho o homem
pelado, que de forma patética estufa seu peito a cada respirada, me
observando com raiva.
— O que pensa que está fazendo?
Olho para a garota de programa, balançando minha cabeça na direção
da porta, a ordenando sair. Ela passa ligeira, de forma assustada. O corpo
negro, com cabelos bagunçados, recorda Cristina, o que me faz sentir o dobro
de raiva. Caminho para perto da cama e tombo minha face para o lado,
mantendo meus olhos fixos no fodido Pener.
— Sabe quem eu sou? — Ele se arrasta para fora da cama, ficando de
pé, parando à minha frente. Meus olhos recaem para sua mão grande, e posso
visualizar ela fechada enquanto desferia socos no rosto frágil e pequeno de
Cristina. — Tem ideia de quem é minha família, seu otário?
Ele não vê, nem sequer estava preparado. Minha cabeça se inclina
para trás e acerto uma cabeçada em seu rosto, o fazendo gritar de dor. Meu
punho fechado o presenteia com um golpe certeiro na lateral da sua
mandíbula. Ergo minhas mãos e o puxo pelos ombros, o arremessando para
cima da estante, estourando seu corpo no espelho da penteadeira.
— Filho da puta! — Renan grita, erguendo sua mão para tapar sua
boca ensanguentada, cuspindo sangue em seus dedos.
— Se defenda, seu verme! — Minha mão desfere um tapa forte em
seu rosto, para ele prestar atenção em mim.
— Seu... Seu...
Fecho meu punho e o soco com toda força em seu rosto, o fazendo
tombar para o lado.
— Se defenda, PORCO DE MERDA! — grito com ódio, apertando
meus dedos em sua garganta, o arrastando para perto de mim. — Ou só sabe
usar sua força para espancar mulher?
Seus olhos se expandem, ficando escuros, e ele ergue suas mãos,
segurando meu braço.
— Está aqui por ela, não é? Por aquela vadia! Você é o pau que
Cristina arrumou...
Dou outra cabeçada em seu rosto, o desnorteando, fazendo ele se
engasgar com suas palavras. Soco seu rosto com ódio, desferindo um murro
atrás do outro. Seu nariz quebrado pinga sangue, que escorre por sua boca.
Quando o solto, vejo seu corpo rolando, deslizando da penteadeira ao chão.
Renan se torce de dor a cada chute que acerto em sua barriga. Não vejo nada
à minha frente além da ira que governa meu corpo. Aumento a sequência de
chutes, prensando seu corpo contra a penteadeira, a balançando a cada
impacto que ele recebe. Ele grita de dor, feito um porco imundo, e sua boca
se abre, se engasgando com seu sangue quando meu último chute acerta com
toda a força seu pau nojento. Respiro com raiva, me afastando dele, passando
as mãos em meus cabelos, com minha mente bombardeando com as imagens
das fotografias da face ferida de Cristina; do choro dela dentro do quarto, se
abrigando em meus braços; das suas mãos segurando sua barriga, deitada na
maca do hospital; do feto enrolado com o cordão umbilical dentro da caixa,
com a porra de uma coroa de flores. O chuto com mais ódio, mirando em sua
barriga, a cada memória que vai me inundando, me enchendo de ira.
— Não vai falar o nome dela, nem sequer vai chegar perto dela outra
vez. — Olho para ele e o vejo gemer, com seu corpo se torcendo de dor.
— Miserável... — Ele tomba seu corpo, ficando de barriga para cima,
segurando seu estômago.
Dou um passo à frente, até Renan, me abaixando perto dele, ficando
agachado. Uma das minhas mãos segura seu cabelo, erguendo sua cabeça,
para que ele olhe para mim.
— Miserável será o estado do seu corpo quando for encontrado dentro
de uma cela imunda de penitenciária, com o maldito buraco do seu rabo
arrombado por todos os presidiários, depois que eles te foderem até a merda
do seu cu sair pela sua boca. — Cerro meu maxilar, não desviando meus
olhos dos dele. — Se pensar em intimidá-la, assustar Cristina ou ficar a
espreitando como uma barata nojenta de volta, tenha em mente que será meu
rosto a última coisa que você vai ver.
— Vadia desgraçada! — Sua boca se abre, cuspindo seu sangue
nojento em minha camisa.
Meu punho se fecha, e soco seu nariz quebrado com ódio, soltando a
cabeça dele com força no chão, batendo-a três vezes seguida no chão, antes
de eu o libertar. Me levanto, endireito meu corpo, arrumo as mangas do meu
blazer e encaro o ser desprezível. Minha perna se ergue, flexiono meu joelho
e solto o peso com força, esmagando seu pau com meu pé. Ele arqueia seu
corpo para cima, ficando com sua face roxa e os olhos arregalados, soltando
um grito fino da sua garganta. Tombo minha face para o lado, esmagando
meu pé em suas bolas, como se fosse uma inútil porcaria de bituca de cigarro.
— Nunca mais vai machucar ela, vou garantir que você apodreça na
cadeia se alguma coisa de ruim acontecer com ela ou com meus filhos! —
Retiro meu pé de cima das suas bolas, cuspindo em sua cara.
— Ela nunca vai me esquecer, nunca. — Ele tenta se levantar,
espalmando seus dedos no chão.
Seu corpo explode na cômoda com a força que eu chuto seu abdômen,
como se fosse um saco de merda. Estou cego, apenas me mantendo
governado pela raiva, desferindo bicudas no corpo dele com toda força que
solto em minha perna. A última acerta seu rosto, o que o faz cuspir seus
dentes para fora, junto com a gosma de sangue.
— Filho da puta, doente de merda! — rosno com ódio, segurando
seus cabelos, fechando meu punho, pronto para socar sua cara.
— CHEGA, ARIEL! — Greg me puxa pelos ombros, me empurrando
para trás. — Vai matar esse verme se não parar.
Eu não me importo, é isso que quero. Desejo apagar a existência
asquerosa desse homem da face da terra. Olho com raiva para Greg, que entra
na minha frente, bloqueando Renan de mim. Respiro com fúria, me
levantando, cuspindo no chão.
— Vamos, precisa sair desse quarto. — Greg estica seu pescoço,
encarando o que está atrás de mim.
Direciono minha atenção para lá e noto a presença de algumas
prostitutas paradas na entrada do quarto, olhando de mim para Pener caído no
chão. Meus dedos empurram meus cabelos para trás e aperto o nó da minha
gravata, girando meu corpo, andando na direção da porta do quarto,
respirando fundo.
— Meu Deus, nunca pensei que sentiria prazer em ver alguém
apanhar — uma delas fala, rindo, tirando o celular do bolso do short. —
Merda, devia ter gravado esse porco levando uma surra!
Saio de lá sem encará-la, sendo seguido por Greg, que me
acompanha. Volto todos meus pensamentos para Cristina. Estou agitado,
respirando com furor, querendo voltar dentro daquele quarto e o matar de
forma fria, o destruindo da mesma forma que ele fez com o espírito dela.
Esfrego meu rosto com indignação e empurro as pessoas à minha frente, até
conseguir respirar o ar fresco da noite, que entra pelos meus pulmões quando
saio para fora da boate imunda.
— Vamos encontrar algo que o ligue aos fatos, precisa ter calma. Mas
não pode querer fazer justiça com as próprias mãos, porra!
Retiro a porcaria do bilhete do bolso da calça, empurrando no peito
dele, o olhando com exasperação.
— Ligue esse miserável a isso. Ligue ele à porra daquele
apartamento. Me dê uma prova concreta para acabar com ele dentro de um
tribunal, mas não ouse me pedir calma, não depois dele ter mandado um feto
morto, enrolado em um cordão umbilical, para a minha mulher, junto com a
merda de uma coroa de flores, GREG!
Ele fica sério e olha para minha face, erguendo o bilhete e o lendo.
— Caralho! — Greg fecha seus olhos, balançando sua cabeça em
negativo. — Não me disse no telefone porque queria vê-lo. Ela está bem?
Nego com a cabeça e entro no carro. Meus dedos se erguem,
estrangulando o volante, e observo os nervos das minhas mãos vermelhos. A
porta do carona é aberta, com o corpo de Greg se sentando ao meu lado.
— Quer que eu dirija?
— Não — falo de forma ríspida, girando a chave que ficou largada na
ignição quando estacionei o carro.
— Como sua garota está, Ariel?
— Ela teve um início de aborto, Greg. Cristina só não perdeu os
bebês, porque uma funcionária a encontrou desmaiada dentro da minha sala e
chamou a ambulância. E eu não tenho nada de concreto contra esse filho da
puta!
Viro meu rosto para a janela, esmagando o volante com irritação.
— Se alguém tinha a filmagem de Renan daquele sábado à noite,
simplesmente ela sumiu...
— Vou matar esse cretino...
Minha voz se cala quando volto meu rosto para Greg. A prostituta que
tirou o celular do bolso perto da porta do quarto, onde eu estava com Renan,
caminha, rindo, segurando o aparelho, mostrando para outra garota na
calçada.
— Bom dia, lindona, dá oi para a galera do canal! — Cris se afasta,
respirando rápido, olhando para o chão, ficando de costas para mim,
erguendo seus olhos para o garoto.
— Olá, Estence! Olá, galera do canal do Estence! — Ela acena para
ele e volta a subir a escadaria.
Respiro com desânimo, encarando o pivete que sorri para mim,
apontando a porcaria do aparelho na minha direção, com sua face
espinhenta e os dentes presos a um aparelho ortodôntico.
— E aí, tiozão! — Ele desce os degraus apressado, me
cumprimentando, dando um leve tapinha em meu ombro.
Olho para meu ombro, onde sua mão de bater punheta juvenil tocou,
sujando meu terno de alfaiataria.
— O punheteiro de aparelho ortodôntico — falo baixo, me lembrando
daquele dia.
— Punheteiro?
— Engraçadinha! — Volto a subir os degraus, odiando,
definitivamente, esse prédio cafona. — Qual tipo de padrão de emissora
contrata um pré-adolescente?
Ouço a risada dela explodir em uma gargalhada, ao mesmo tempo
que nega com a cabeça.
— Estence filma para seu canal em uma rede social na internet,
doutor Miller. Ele filma de tudo que puder, acho que fica 24 horas com esse
celular na mão, gravando. Está por fora da atualidade dos jovens, tiozão!
— Me disse que foi ao apartamento dela, não foi? — pergunto sério
para Greg.
— Sim, eu fui. Disse que não encontrei nada.
— Conversou com os moradores? Com um moleque espinhento com
aparelho nos dentes chamado Estence?
— Não, eu não posso ficar batendo de porta em porta, interrogando os
moradores, Ariel. Sou detetive particular, não a porra de um policial com um
mandado.
Arranco com o carro, pisando fundo no acelerador assim que ele fala.
Viro o volante, entrando na outra pista, engatando a marcha e disparando os
ponteiros de velocidade do carro.
Capítulo 24
Tambores do medo
Cristina Self

— Esse medicamento, junto ao soro, lhe ajudará a dormir. — A


enfermeira risonha me olha amavelmente, se afastando de mim depois de
verificar minha pressão pela quinta vez. Seus olhos param no grande homem
encostado na parede, com seus braços cruzados, o que é o suficiente para
fazer a pobre ficar intimidada. — Sua pressão já está estável e seus bebês
seguros. Isso quer dizer que só amanhã cedo vou te incomodar, lá pelas
quatro horas da manhã, quando vai tomar outra dose de remédio, para manter
sua pressão estabilizada. — Ela volta seus olhos para mim, me dando uma
piscada. — Apenas descanse.
Gostaria de poder retribuir o sorriso brando com que ela me
presentou, mas me sinto tão fadigada, que apenas confirmo com um leve
balançar de cabeça. A vejo sair do quarto, nos deixando sozinhos. Meu rosto
se vira para a janela do quarto e enxergo a noite que está alta. Apenas
consegui sentir meu coração voltar a bater quando escutei os batimentos
cardíacos dos meus filhos e o médico me garantiu que eles estavam bem.
Ariel não ficou mais que cinco minutos dentro do quarto quando soube da
notícia de que eu quase perdi os bebês. A instabilidade da minha pressão é
um risco para a vida deles. Os olhos azuis que me amaram com tanta
intensidade, roubando minha alma na noite passada, agora não passavam de
duas pedras frias, que mal me olharam. Não suportando ver a raiva dentro das
suas íris, direcionei meus olhos para o teto do quarto, sendo esmagada pela
minha dor, meu medo, minha incapacidade por não ser forte o suficiente para
proteger meus filhos dentro do meu próprio corpo. Quando minhas pálpebras
se fecham, ainda posso ver aquele feto enrolado no cordão umbilical no meio
da coroa de flores. Era tão frágil e pequeno, que podia caber na palma da
minha mão. Uma coisa é ver em fotografias, mas quando a imagem real de
um feto morto envolto de sangue e resquício de placenta se apresenta à sua
frente de forma nítida, é esmagador.
— Tenho algo para lhe deixar feliz — Brow fala baixo, caminhando
para a cama. Viro, o vendo descruzar seus braços e olhar por cima do ombro
na direção da porta, como se estivesse com medo da pequena enfermeira. —
Chocolate com caramelo.
Sorrio para ele, que estende a barrinha de guloseima para mim.
— Está traficando produtos ilícitos dentro do hospital, Brow? — Ele
ri, encolhendo seus ombros, negando com a cabeça.
— Fui pegar um café para mim, mas a máquina desse andar está com
defeito, só a do oitavo está funcionando, então não quis ir lá para buscar, mas
resolvi pegar o chocolate e trazer um para você.
— Obrigada, Brow. — Seguro o doce em minha mão, abaixando
meus olhos para o acesso da agulha perto do meu pulso. Suspiro com
melancolia, piscando rápido para dissipar as lágrimas.
— Vai ficar tudo bem, vocês vão ficar bem — ele fala calmo, me
olhando com carinho. — O chefe avisou que vai demorar um pouco para
chegar, mas ele virá assim que puder.
O sorriso em minha face é de tristeza ao ouvir Brow. Balanço minha
cabeça em positivo para ele. Acho que, de certa forma, já sabia dentro de
mim, me preparava para isso, apenas não queria acreditar. Ariel deseja estar
junto com seus filhos, não comigo.
— Quer que eu ligue para ele?
— Não, não. Gostaria que tentasse ligar para aquele número da minha
mãe outra vez, se for possível.
— Claro, irei tentar novamente. — Brow sorri em compreensão, ao
entender que eu não desejo falar com Ariel.
— Por que não vai ao oitavo andar buscar seu café?
— Não posso deixar você sozinha novamente, Cristina. — Sua voz
sai baixa, como se estivesse se culpando. — O hospital não autorizou a
entrada dos outros seguranças, apenas o acompanhante. Não quero lhe deixar
sozinha.
Nego com a cabeça sua indagação, sabendo que ele se refere ao
trabalho. Brow queria ter subido comigo para o escritório, mas eu não o
deixei, jamais imaginei que Renan mandaria aquele presente cruel para mim.
— Brow, eu estou bem agora. Foi eu quem pedi para você não subir
comigo. Se alguém tomou a decisão errada, fui eu. — Fecho meus olhos e
seguro as lágrimas que ardem em minhas vistas.
— Não foi sua culpa, senhorita Self.
Balanço minha cabeça em positivo. Apenas consinto com suas
palavras para lhe confortar, mas dentro de mim eu sei que é. Foi minha culpa
ter ficado presa àquela relação por tanto tempo com Renan, foi minha culpa
por não ter tido coragem de levar ele a justiça, quantas vezes fosse preciso,
até ele parar de me atormentar.
— Por que não fazemos assim? — Limpo meu rosto, tombando
minha face no travesseiro, abrindo meus olhos para ele. — Vá pegar seu café,
assim você pode trazer um suco de morango para mim, sinto minha boca
amarga.
— Vai ficar bem?
— Sim, vou ficar exatamente onde estou. — Sorrio para ele, o
incentivando a ir buscar seu café. Sei que ele está cansado, mesmo ele não
dizendo uma única palavra.
— Não vou demorar mais de cinco minutos, ok? — Seus dedos se
esticam, deixando a luz do quarto mais fraca. — Por que não tenta dormir um
pouco? Ouviu a enfermeira, ninguém vai vir te incomodar por enquanto.
Ele pisca para mim, se virando, saindo do quarto. Fecho meus olhos e
abaixo minha mão para minha barriga, suspirando fundo. Não vou perdê-los.
Já perdi demais na minha vida, mas não vou deixar nada acontecer com eles.
O barulho da máquina que acompanha meus batimentos cardíacos é todo som
que tem dentro do quarto, com a luz baixa. Suspiro fundo, me sentindo
sonolenta, com meus pensamentos confusos. A ardência em minhas veias,
com o remédio circulando pelo soro, torna tudo tão vago. O som da porta
sendo aberta por uma mulher alta, com jaleco branco e salto alto, me faz
olhar em sua direção.
— Hora do medicamento, senhorita Self.
Pisco diversas vezes, tentando dissipar meu sono, olhando para ela
sem compreender.
— Mas... — Minha voz se cala, enquanto tento sentir alguma saliva
dentro do céu da boca, que está amargo. — A enfermeira disse que não teria
mais...
A mulher para perto de mim, sorrindo, negando com a cabeça,
retirando a seringa do bolso do seu jaleco. Com muita força consigo me
arrastar na cama, me sentando, tentando focar minha visão nela.
— Ela esqueceu de uma, acredita? Como está ocupada, me pediu para
vir aqui lhe medicar.
— Não entendo... — Forço minha respiração para entrar em meus
pulmões, negando com a cabeça quando ela estica sua mão, segurando meu
braço.
Viro meu rosto e estico meu braço para o balcão pequeno, próximo à
cama, pegando meus óculos em cima dele, os arrumando em minha face,
olhando para a porta do quarto aberta, e vejo a mesa da enfermeira sorridente
vazia.
— Que remédio é esse que está me dando?
— É só uma picadinha, para lhe ajudar a dormir. Quando acordar, vai
ser tudo como antes.
Volto meu rosto para a mulher, com meu cérebro disparando, com o
fluxo de sangue acelerando ao entender suas palavras. Minha mão se move
rápido e seguro o pulso dela, a afastando do meu braço.
— Não... Não! — Balanço minha cabeça em negativo, vendo suas
mãos desprotegidas, sem as luvas, com unhas compridas pintadas de rosa
pink. O cheiro forte do seu perfume é enjoativo e entra em minhas narinas. —
Você não é uma enfermeira!
— Senhorita... Senhorita, precisa se acalmar.
— NÃO! — grito forte, puxando meu braço quando ela tenta o pegar
de volta, o que faz a seringa do acesso se desconectar.
— Droga! — ela fala baixo, olhando o sangue que começa a sair do
meu braço. — Me dá seu braço!
— Fica longe de mim!
Estou tão nervosa, que não me importo com o sangue escorregando
do meu acesso aberto. Desço da maca e ouço os disparos da máquina do
coração, que bipa alto quando levo minhas mãos por debaixo da camisola
hospitalar, desconectando os eletrodos do meu peito, jogando os cabos para
longe.
— Está sangrando, precisa sentar aqui e me deixar cuidar de você.
— Fica longe de mim! — Ergo minha mão e aponto meu dedo para
ela. — Veio matar meus bebês... Isso não é remédio!
— Senhorita, está tendo alucinações, ninguém aqui quer lhe fazer
mal.
— Não, não... não... — sussurro, olhando perdida para ela.
— É apenas coisa da sua mente, eu só quero cuidar de você.
Gatilhos são disparados como uma bala potente em meu cérebro:
latente, fria e dolorosa. Os jurados comprados, que aceitaram a alegação que
eu estava mentalmente desequilibrada. O som dos meus gritos ecoando pelas
minhas ondas cerebrais a cada lembrança dos murros que Renan me desferia.
O martelo do juiz batendo sobre a madeira, o inocentando. Tudo pago,
comprado de forma injusta e fria. Levo a mão à minha cabeça, a esmagando
forte, como se pudesse tirar tudo de dentro dela, espremendo para fora como
a um pus sujo que infecta o sangue.
— Ele comprou você também, não foi? Pagou você para vir tirar
meus bebês de mim.
A imagem do feto sem vida, tão desprotegido em sua cor arroxeada,
empastado de sangue seco e placenta, me acerta, tudo me engole. Meu
coração bate disparado, como um tambor forte, repercutindo o som de medo
a cada sequência de batidas.
— Volte para a cama, garota!
Ergo meu rosto quando ouço a voz dela, e a vejo segurar firme a
seringa em suas mãos. É um click, um botão de alarme sendo repercutido
pelos tambores do medo, pode se dizer que é reflexo, ou apenas a teoria de
toda ação ter uma reação, mas, para mim, é o mais primitivo instinto de
proteção com os meus filhos. Assim que ela dá a volta na cama, vindo em
minha direção, meu braço puxa o cabide de ferro que sustenta o saco do soro,
acertando nela com força, a fazendo cambalear para trás, caindo no chão.
Meus passos já estão se atrapalhando apressados, e me viro com urgência,
enquanto corro para a porta do quarto, largando o ferro no chão. A adrenalina
entra em minha mente, o medo me anula, sinto tudo vindo: as lembranças, as
memórias me empurrando para a borda da minha lucidez e da loucura.
— Fica tão bela quando chora, meu amor. — A voz gélida como a de
um cadáver sem coração, fala mansamente.
Ele beija meu rosto, me fazendo chorar ainda mais. Estou ferida,
acovardada e sem esperança de sobreviver ao seu ataque de fúria.
Ergo minha mão e esfrego meu rosto, tentando tirar os cabelos da
minha face. A vista apenas fica nublada pelo embaçamento das lentes dos
óculos, decorrente das lágrimas. Limpo de forma grotesca, apenas com as
pontas dos meus dedos, olhando perdida para os lados, sem saber para onde
ir, em quem confiar, o que é real e o que é efeito do medo sendo projetado em
meu desequilíbrio. O corredor quase vazio, tendo apenas alguns visitantes,
me faz encolher, e enxergo todos como pessoas hostis, que querem machucar
meus filhos. A dor rasga minha cabeça novamente, com uma pontada
profunda, quase como se um martelo estivesse pregando um prego dentro
dela. Minhas mãos se erguem, esmagando minha cabeça, e mordo minha
boca com força, até sentir meus dentes machucarem a pele, para poder parar a
dor.
— Declaro Renan Pener inocente de todas as acusações.
— Não, não... Não sou louca! — murmuro entre a dor agressiva,
respirando com força, sentindo cada parte do meu corpo rígida.
Abro meus olhos e encaro o corredor frio, sentindo pavor. Estou
sozinha e assustada.
— Ariel... — Meus dedos trêmulos param perto dos meus lábios,
enquanto sussurro seu nome como se fosse uma ponte que me mantém
estável. — Ariel, Ariel... Ariel.
Meus pés descalços caminham rápidos no chão frio, com meu corpo
tremendo. Estou amedrontada, usando seu nome como um mantra. Preciso
chegar até ele, tenho que sair daqui. Renan pode ter mandado outras pessoas,
ele vai mandar mais pessoas para fazer mal aos meus bebês. Eu não estou
desequilibrada, nunca fui louca. Meu corpo não diminui o ritmo acelerado,
apenas corro, olhando assustada para trás, como se a qualquer segundo Renan
fosse aparecer para me machucar. Estaco na frente do elevador, apertando o
botão, desesperada para que as portas se abram.
— Ariel... Ariel. Preciso chegar até Ariel. — Fecho meus olhos com
dor, tentando me lembrar para qual andar Brow foi. Ele me levará até Ariel.
— Ariel...Oh, meu DEUS! — Tapo minha boca, segurando o soluço de
choro, sentindo o gosto do meu sangue se misturar com minhas lágrimas.
Choro de dor, medo e angústia, por não conseguir me lembrar em
qual andar Brow está. É como se minha mente regressasse entre memórias do
passado e o agora, me torturando com flashes de dor, me levando de volta
para aquele quarto e depois para o tribunal. A porta do elevador se abre,
fazendo meu rosto se erguer para ela.
— O que está fazendo aqui? Deus! O que aconteceu com você?
Meu cérebro bagunçado demora alguns segundos para processar e
fazer o reconhecimento da voz do homem que me olha preocupado.
— MAX... Oh, meu Deus, Max!
Entro no elevador, não o deixando sair, levando meus dedos para seu
terno, me segurando firme a ele.
— O que houve? Está fria, com seu corpo suado. Oh, meu Deus, está
sangrando! — Ele tenta segurar as portas, para que não se fechem. — Precisa
voltar para o quarto.
— Não, não, não, não — falo rápido, com meus lábios trêmulos,
balançando minha cabeça em negativo.
Puxo seu braço, para que as portas se fechem, cravando minhas unhas
em seu terno, olhando apavorada para ele.
— Ele... ele está aqui, não é seguro. — As palavras saltam por minha
boca em pavor. — Meus bebês estão em perigo. Uma mulher, ela tinha uma
seringa, não era remédio para dormir, não era, não era... — Direciono meus
olhos para o ponto de acesso que está sangrando em meu pulso. — Eu bati
nela, bati nela. Oh, meu Deus, eu bati em uma pessoa, Max, mas foi para
proteger meus bebês. Preciso que acredite em mim, eu não estou louca. Max,
não estou...
— Eu acredito em você, Cris... Calma...
Levo meus olhos aos seus, que estão preocupados, me olhando.
— Ariel, Ariel... Preciso chegar até o Ariel. — Escondo meu rosto em
seu peito, chorando desesperada. — Não estou louca, não sou louca, não
sou...
— Ei, está tudo bem. Tudo bem — Max sussurra próximo ao meu
ouvido, me abraçando com força. — Sei que não é louca.
Ele me afasta apenas um pouco, tirando seu paletó e jogando por cima
dos meus ombros, voltando a me abraçar com força. As palavras martelam
em meu cérebro como um disco arranhado, que se repete por várias vezes.
— Ariel, Ariel... Ariel.
Capítulo 25
A visita do anjo ao inferno
Ariel Miller

— Por mais que ache instrutiva a anatomia humana das garotas da


Playboy, retratadas nas páginas de revista pregadas na parede do seu quarto
imundo, meio que já estou ficando irritado de ficar aqui dentro.
— Qual é, tiozão? — O garoto sentado na cadeira gamer, se vira para
mim, abrindo seus braços. — Estou dando o meu melhor. Tem ideia de
quantas filmagens eu fiz naquele dia?
— Estence... ESTENCEEEEEEE! — O som agudo da mulher
gritando na sala por ele, o faz virar seu rosto para a porta do quarto.
— QUE FOI, MÃE?
— VEM LOGO JANTAR!
Fecho meus olhos, respirando fundo, me sentindo aprisionado dentro
do quarto que tem aroma de meia suja, e tenho até medo de pensar há quanto
tempo o lençol desarrumado da cama está sem ser trocado.
— NÃO VOU JANTAR, MÃE, TÔ TRABALHANDO COM MEUS
AMIGOS! — Ele volta seus olhos para mim, sorrindo.
— QUE AMIGOS? VOCÊ NÃO TEM AMIGOS!
— Você me cobrou quinhentos paus pela porra de uma filmagem que
nem sabe se tem, então, definitivamente, você não é meu amigo. — Balanço
minha cabeça em negativo, comprimindo meus lábios.
— Se eu filmei, eu tenho todo direito de cobrar. Amizade é uma
coisa, negócios são outra. Não me culpe se eu posso ter feito um
headshot[27].
Não entendo o que ele disse, mas antes que pergunte, o som de portas
sendo batidas com força se faz alto pela casa.
— VÊ SE ARRUMA A PORCARIA DESSE QUARTO, ESTENCE!
— Qual o problema de diálogo em tom baixo entre você e sua mãe?
— pergunto sério para ele.
— A gente se entende, mas às vezes ela é surda, quando tá muito
estressada dá uns BUG[28].
— Por que eu não entendo nada que sai da boca desse garoto?
— Gíria de gamer[29], Ariel. — Greg dá de ombros, me respondendo.
Olho para Greg, que está sentado ao lado do garoto, com o notebook
do pivete em sua perna, conferindo as imagens na tela, enquanto Estence fica
com o computador. Greg segura o riso, me olhando divertido. Balanço minha
cabeça com desgosto, respirando profundamente.
— ESTENCEEEEE, VEM JANTAR!
O grito sonoro da mulher repercute pelo quarto, com a voz dela
zangada outra vez.
— JÁ FALEI QUE NÃO VOU, EU TÔ TRABALHANDO! DÁ PRA
RESPEITAR?!
— DESDE QUANDO FICAR VADIANDO NA INTERNT É
TRABALHAR? SE APARECER MAIS UMA COBRANÇA NA MINHA
FATURA DE CARTÃO DE CRÉDITO, PORQUE VOCÊ ENTROU EM
SITE PORNOGRÁFICO, EU VOU TE MATAR!
O som da porta batendo novamente com força em algum canto da
casa, me faz balançar a cabeça em negativo. Já estou me arrependendo
terrivelmente por ter vindo atrás do moleque de quinze anos, que está me
extorquindo, cobrando quinhentos dólares para o caso de achar alguma coisa
de valia para mim em suas filmagens. Tive que me segurar para não
estrangular o pescoço dele quando ele quis me ensinar sobre direito de
imagens.
— Ela exagera, foi só uma vez — Estence fala, envergonhado, com
suas bochechas ficando vermelhas.
— Explicar esse tipo de coisa só piora. — Greg bate em seu ombro,
rindo para ele.
— Vocês estão com fome? Eu nem sequer perguntei se estão com
fome. Minha mãe não é uma cozinheira de mão cheia, mas é tragável o que
ela prepara. Se quiser, posso buscar um prato de comida para vocês.
— Depende, o que ela fez para o jantar? — Greg fala, rindo.
Seguro o ombro de Estence, o fazendo se sentar outra vez, quando ele
ergue sua bunda da cadeira, dando a ele e a Greg uma prévia da raiva que está
estampada em meu rosto.
— Você se senta e acha os vídeos de sábado à noite e começa a falar
na mesma língua que a minha! — rosno para o pirralho. — E você, Greg, se
concentra nos vídeos que está assistindo!
— Ok... Ok, tiozão, relaxa um pouco. — O menino sorri, fazendo o
metal dos seus dentes brilhar. — Por que não se senta um pouco? Relaxa.
Olho para a cama dele bagunçada e as imagens das mulheres nuas
coladas na parede, ao lado da cama.
— Estou bem de pé. — Alinho meu terno com força, endireitando
meu blazer.
— Está legal, você que sabe. — Ele volta sua atenção para a tela do
computador, olhando as datas e horários. — Então, você é o carinha que deu
match[30] na Cris. Está dando uns pegas nela?
— O que ele falou agora? — Olho para Greg, buscando por ajuda.
— Ele quer dizer que vocês se gostam, que você deu uns... — Greg
fala, se calando, erguendo seus braços ao lado do corpo, fazendo um gesto de
foder com o quadril, olhando para o notebook. — Entendeu?
Observo o menino espinhento curioso, que ri para mim, e fecho meu
semblante, o encarando.
— Para seu governo, eu dei muito mais que uns pegas nela. E sim, eu
e a senhorita Self apreciamos a companhia um do outro.
— Nossa, tiozão, isso foi deprimente! — Ele bate seu braço no de
Greg, com os dois trocando olhares. — Quem diz isso?
— Ariel, é realmente deprimente. — Greg balança a cabeça em
negativo, não desviando seus olhos da tela.
— Escuta, por que não diz para ela que a curte e que quer muito mais
que dar uma ficada? As meninas gostam de caras sinceros e emocionalmente
decididos. — Seu sorriso metálico se expande, enquanto eu estou me
segurando para não estrangular sua garganta fina.
Minha mão se prende em sua cabeça, a virando de volta para o
computador, respirando com raiva.
— Foca na porra dos vídeos, ou seus quinhentos paus já eram!
Solto sua cabeça, esfregando meu cenho, ainda não acreditando que
recebi conselhos amorosos de um punheteiro, que passa mais tempo no
mundo virtual que no real. Vejo Greg se segurar para não rir, com sua boca se
esmagando. Ergo meu pulso, verificando a hora no relógio. Tenho que voltar
para o hospital. Desejo tanto olhar Cristina e lhe deixar segura.
— Acho que achei alguma coisa! — o menino fala rápido, apertando
o botão de enter. — Eu fiz essa filmagem de noite, depois da janta, quando
fui jogar o lixo. Não soltei ela no canal, não sei se tem serventia para você.
— Onde fica a lixeira?
— Fica do lado do prédio, no beco.
— Deixa eu ver. — Me abaixo, me aproximando da tela, apoiando
minha mão na mesa.
— Olha, mas foi só por curiosidade mesmo que eu fiz, viu? —
Estence fala rápido, assim que o carro estacionado no beco começa a
balançar.
A câmera dá zoom, nos presenteando com a imagem de um casal
trepando dentro do automóvel. Viro meu rosto para Estence, que tem sua face
corada, repuxando a ponta do nariz.
— Eu achei que podia ser alguém roubando. Não foi nada demais.
Nego com a cabeça, o encarando, vendo seu rosto ficar cada vez mais
vermelho.
— Não, isso é direito de imagens, Estence, e tenho certeza de que o
casal do carro não te autorizou a fazer um vídeo caseiro da trepada deles.
— Lembra o que te falei? Se explicar é pior. — Greg vira seu rosto
para Estence, batendo em seu ombro. — Já assistimos mais de vinte
filmagens, uma por uma, ele não está em nenhuma delas — Greg fala para
mim, repuxando seu nariz.
— Miserável, filho da puta! — Me afasto da tela do computador,
levando minhas mãos para a cabeça, respirando com raiva.
— Talvez deva levar ela para as montanhas, deixá-la escondida, longe
disso tudo, até descobrirmos o que aconteceu, como ele entrou no prédio dela
e saiu sem ser visto.
— A lavanderia — o menino fala rápido, respondendo Greg, virando
sua cadeira para me olhar.
— Como?
— A lavanderia que tem no beco. Quando quero entrar e sair do
prédio sem ser visto, uso a escada de emergência deles. Você só precisa ir
para o terraço do nosso edifício. — Ele aponta para a janela do quarto, rindo
para mim. — Às vezes faço isso quando minha mãe não me deixa sair. Os
prédios são unidos, entende? Um ao lado do outro. Você apenas precisa pular
a divisória e já está no terraço da lavanderia, e daí para a escada de incêndio é
um passo.
Greg retira o notebook das suas pernas, deixando em cima da cadeira
que ele estava sentado, caminhando para a janela do quarto de Estence,
olhando para fora.
— A janela dela fica distante do prédio da lavanderia, ao menos que
ele fosse o Homem-Aranha, não teria como ir até lá.
— Mas se você estiver dentro do prédio, não precisa ter que invadir
uma janela.
O menino ri, respondendo Greg outra vez.
— Você me disse aquele dia no escritório que não tinha
arrombamento. — Olho de Estence para Greg, o vendo confirmar com sua
cabeça.
— Sim, não tem vestígio algum, a polícia estava completamente certa.
— Greg se afasta da janela, com um olhar intrigado.
— Talvez quem entrou no prédio tinha a chave da porta do
apartamento da Cris — Estence fala, voltando seus olhos para a tela do
computador.
Greg olha na mesma hora para mim, batendo as mãos com força,
como se tivesse pescado alguma informação com a teoria de Estence.
— E ficou esperando o momento certo de você sair, para entrar no
apartamento... — Ele se cala, abaixando seus olhos para o chão. — Ou...
— Ou? — pergunto, nervoso, dando um passo à frente.
— Ou ele já estava lá dentro, junto com vocês, Ariel. — Greg trava
seus olhos com os meus. — O tempo dele foi pouco, para disparar seu alarme
e correr para as escadas de incêndio da lavanderia, fazer todo o percurso e
entrar no apartamento, degolando o gato... O alarme do veículo sendo
disparado foi uma vantagem que ele não esperava, mas ele não se aproveitou
disso para entrar.
— Mas sim para sair — termino por ele.
— Você saiu em algum momento antes disso? Qualquer brecha que
tenha dado para ele entrar?
— Não, eu não saí — falo com convicção. — Nós dois fomos para o
quarto, acabei pegando no sono depois que fizemos... — Me calo, olhando
para o garoto curioso, que está com sua atenção em mim.
— Pode falar, eu não sou nenhum virgem!
— Se masturbar não é perder a virgindade. — Bato na cabeça de
Estence, revirando meus olhos, respirando fundo. — Eu só saí de perto dela
quando o alarme disparou — termino de falar para Greg.
— Deixei passar alguma coisa. — Greg olha em volta, levando suas
mãos à cintura. — Passou alguma coisa batido, que eu não percebi dentro do
apartamento quando entrei. Um sótão, closet, qualquer lugar que alguém
possa ficar sem ser percebido.
O ar entra em meus pulmões como gasolina, e sinto os nervos da
minha mão se fecharem com ira.
— Os dois! — Estence se levanta, esfregando a cabeça onde eu bati,
indo para uma porta do quarto dele. — Vê? Todos os apartamentos vêm com
um pequeno armário dentro dos quartos.
Ele abre a pequena estrutura, acendendo a luz interna e apontando
para o teto. Caminho para lá, erguendo minha mão e puxando a alça pequena.
A escada que cai, fica pendurada, mostrando a ligação do closet para o sótão.
— Os apartamentos são padrão?
— Sim, todos são. Quando quero me esconder da minha mãe, entro
nele. Acredita que eu consigo ver tudo dentro do apartamento por conta das
frestas de ar? Minha mãe nem sabe disso.
— O filho da puta a vigiava — Greg fala, sério.
— Ele estava o tempo todo a espreitando. — Meus olhos vagam pelo
quarto de Estence. Me lembro dela em meus braços, comigo.
Apenas por imaginar que ele estava lá dentro, olhando para ela,
enxergando a forma livre e amorosa dela, como eu enxerguei, me faz ter
vontade de matar esse verme doente.
— Você tinha razão, realmente temos um caso de predador aqui.
— Renan a manteve afastada de qualquer pessoa, controlando-a de
longe, usando o medo da Cristina para ficar presente na vida dela, acuando-a.
— Deus, há quanto tempo ele pode estar fazendo isso? Invadindo a
casa dela, a perseguindo...
— Tudo começou depois do divórcio... — falo, perdido, com meus
olhos presos na filmagem pausada na tela do computador. Mas não é o casal
trepando que chama minha atenção, mas sim o rosto que reflete na janela do
banco do carona, passando do outro lado da rua.
— Noto que se preocupa muito com a senhorita Self. — Arqueio
minhas sobrancelhas, mantendo meu olhar sério quando encaro sua face. —
Algum interesse específico, Maximiliano?
— Cris é uma boa amiga, tenho um carinho especial por ela.
Conheço sua fama carrasca, Miller. Cristina não precisa de um otário
egocêntrico a diminuindo. Pode ter certeza de que eu vou estar com meus
olhos em você!
— Filho da puta! Filho da puta doente! — Minha boca espuma de
raiva, enquanto empurro Estence da minha frente, dando mais zoom na tela
do computador.
Me afasto da tela, agitado, levando as mãos à minha cintura,
respirando forte. Tudo se encaixa: a superproteção, a forma como ele olha
para ela quando a vê... Cris é sua presa, e ele se alimenta do medo dela.
— O bilhete. Cadê a porcaria do bilhete que mandaram para ela?! —
Viro meu rosto para Greg na mesma hora.
— O bilhete de Renan? — ele pergunta sério, retirando o papel do
bolso.
Pego a folha em minhas mãos, relendo outra vez as palavras.
“Ainda se lembra de quando nos conhecemos?
Eu sim. Me lembro de tudo, de cada segundo. E se eu fechar meus olhos,
posso me ver diante de você agora. Me recordo que olhei você e a vi de
cabeça baixa, desprotegida, tão frágil... E a única coisa que pensei foi em
como seria a esposa mais linda, como eu queria ser o pai dos seus filhos.
Mas eu não sou, não é, Cristina? Você foi rápida em achar um pau para
meter em suas pernas, para lhe engravidar. Espero que aproveite seu
presente, meu amor. Servirá tanto para você como para o que cresce dentro
do seu ventre.”
— Cristina conheceu Renan Pener na faculdade. — Me lembro do
porta-retratos, do sorriso na face dela, que a iluminava, deixando-a tão linda.
— Estava feliz.
— Sim, muito feliz. A época da faculdade foi a mais alegre da minha
vida. — Sua voz é um sussurro triste.
— Não foi Renan Pener. Nunca foi Pener!
Greg para ao meu lado, virando seu rosto para a tela do computador,
encarando a face de Max, que está visível pelo reflexo do vidro do carro.
— Max estava no tribunal no dia que o julgamento estava
acontecendo na vara da família, violência doméstica. Meu irmão se sentou
do meu lado enquanto esperávamos pela audiência da cliente dele, com seus
olhos perdidos em toda dor que a face de Cristina demonstrava.
Chuto a porra do cesto de lixo com raiva, travando meu maxilar. Cris
se tornou uma presa fácil e instigante assim que ele pôs os olhos nela dentro
do tribunal. Não era a medida protetiva que era falha, mas sim as manobras
nojentas de Max. Se Renan continuasse se aproximando dela, Cristina nunca
suspeitaria de quem é o verdadeiro monstro, que a está assustando com os
telefonemas e as vigias constantes nas ruas.
— Maximiliano foi quem conheceu a versão triste de Cristina.
— Filho da puta! — Greg fala sério, xingando com raiva.
— Pega as filmagens, vou ligar para a polícia — falo rápido. Giro e
caminho para a porta do quarto, a abrindo e saindo apressado. Antes mesmo
de levar a mão ao bolso, para retirar o aparelho, meu celular começa a tocar
insistentemente. O puxo com rapidez, olhando o nome de Brow na tela.
Atendo na mesma hora, o levando ao ouvido.
— Como ela está?
— Ela saiu do hospital, chefe. — A voz dele é nervosa enquanto fala
rápido. — Eu procurei por tudo, mas não a achei, então consegui ter acesso
às câmeras de segurança. Aquele rapaz do serviço dela tirou Cristina do
hospital. As filmagens do estacionamento gravaram ela entrando no carro
dele.
Meus olhos se fecham enquanto sinto meu mundo congelar. O
sentimento de impotência emerge, um enorme desespero me atinge. Tudo
isso está me engolindo de uma única vez.
“O amor é bonito, brando, protetor, quente e acolhedor. Mas se tem
uma coisa que o amor não é, é doloroso e violento.”

Estou caindo no inferno, voltando para aquele lugar sombrio, onde o


luto da perda da minha filha me jogou, ouvindo as orlas de demônios que me
rodeiam, instigando toda a violência para fora de mim, sendo misturadas com
a voz doce de Cristina, que me governa.
— Brow, preciso que arrume uma coisa para mim. — Esmago o
aparelho em minhas mãos, me virando para a entrada do quarto, cravando
meus olhos na imagem parada na tela do computador. — Preciso de uma
arma sem numeração.
Capítulo 25
Entre anjos e demônios
Cristina Self

— Está se sentindo melhor?


Max estica sua mão e alisa meu rosto, abaixando seus olhos para o
curativo que fez em meu pulso.
— Sim — sussurro lentamente, puxando a manta para cobrir meu
corpo.
— Viu, lhe disse que um banho quente lhe ajudaria a se sentir melhor.
— Seu dedo bate na ponta do meu nariz, sorrindo para mim. — Trouxe chá
para você.
Olho perdida para a xícara e avisto o vapor que sai dela. Balanço
minha cabeça em negativo, sentindo o enjoo que me acerta ao inalar o aroma
forte que exala do chá. Me sinto mais calma depois que Max me tirou do
hospital, me trazendo para a sua casa. Ele me emprestou uma muda de roupa,
me deixando usar seu banheiro, para que eu pudesse tomar um banho. Depois
que saí, fez o curativo, me levando para a cama, mas ainda assim não me
sinto segura, por não estar junto de Ariel.
— Vai lhe ajudar a dormir, você vai ver. Beba um pouco — ele fala
calmo, apertando minha mão, me ajudando a segurar a xícara.
— Não tenho vontade, Max, meu estômago está embrulhado. —
Encolho minhas pernas na cama, olhando a xícara. — Tenho medo de que
piore o enjoo se eu tomar.
— Não vai, isso vai lhe fazer bem. — Ele sorri e ergue a xícara junto
comigo, a parando perto dos meus lábios. — Eu sempre cuido de você, não
cuido?
Meus lábios se apertam e sinto uma fisgada de dor dentro do meu
cérebro. Repuxo meu nariz, tendo os gatilhos sendo disparados na minha
mente.
— A mulher, o que houve com a mulher? — Pisco, confusa, ainda me
lembrando do rosto dela. — Ela não pode escapar, ela tentou ferir meus
bebês.
— Eu liguei para o hospital, Cris, como se quisesse saber notícias
suas, e eles não comunicaram que você fugiu. Mas quando falei da
enfermeira, eles disseram que não havia nenhuma pessoa com as
características que você descreveu dentro do hospital.
— Não... Não... Ela é real. Eu a vi, Max. Ela estava lá, entrou no meu
quarto, tentando me medicar, então bati nela.
— Você estava nervosa, Cris. Foi um dia conturbado.
— Eu vi... Max, eu a vi, não estou louca...
— Não, não está, meu anjo — ele sussurra carinhoso, tentando me
acalmar.
Fecho meus olhos e balanço minha cabeça em negativo. Não estou
tendo alucinações, aquela mulher estava lá dentro.
— Ariel... — murmuro com dor, abaixando a xícara. — Conseguiu
achar ele? Ligar para ele? Avisar onde eu estou? Ele vai encontrar essa
mulher, ele vai saber o que fazer.
Max nega com a cabeça, esticando sua mão e alisando meu rosto.
— Eu liguei, mas ele não atendeu. Deixei inúmeras mensagens de voz
pedindo para ele retornar assim que ver o telefone dele.
— Tentou no escritório? — Seguro mais firme a xícara, olhando
perdida para Max. — Talvez ele esteja lá...
— Não tem mais ninguém no escritório. Brat foi inocentado. Sabe
como Pietro é, adora levar os funcionários para comemorar no bar quando
nossa firma ganha um caso grande.
— Miller ganhou o caso... — Dou um fraco sorriso melancólico.
— Isso era certo que ia acontecer. Miller nunca se importou em burlar
as leis, não foi nada para ele levar uma testemunha falsa para o tribunal.
— Ele a levou... Eu... eu não sabia que ele usaria o testemunho dela.
— Me sinto afundar dentro de mim mesma. — Pietro deve estar feliz com a
visibilidade que a empresa vai ganhar.
— Não tem ideia do quanto. Malvina estava toda curiosa, querendo
saber qual foram os truques que Ariel usou no caso. — Max se cala, fechando
seu rosto, negando com a cabeça. — Droga, eu não devia ter lhe contado.
— Ariel está comemorando com eles? — Sinto as lágrimas
queimarem meus olhos e volto minha atenção para a xícara.
— É coisa rápida, garanto que ele já vai olhar o celular dele. — Max
se senta na beirada da cama, ficando próximo a mim. — Na verdade, quando
eu saí de lá, ele e ela já não estavam mais no bar, eu até pensei que Miller
estaria no hospital quando cheguei.
— Ele... Ele... — Fecho meus olhos, tentando organizar meus
pensamentos. Ariel mal tinha olhado para mim, saindo apressado de dentro
do quarto, sem trocar uma única palavra comigo.
— Não fica assim. Descanse e tome seu chá, vai se sentir melhor
depois de uma boa noite de sono. — Sua mão cai em meu braço, fazendo
pequenos círculos em minha pele. — Não temos controle sobre as ações das
outras pessoas, o ser humano é uma criatura perigosa.
— Ele não iria fazer isso...
— O quê? Lhe deixar solitária em um quarto de hospital enquanto
aproveita a grande noite dele, recebendo os louros[31] pela mente brilhante
do notório advogado criminalista em que ele se transformou? — Max sorri
para mim e ergue seus olhos para os meus. — Nada é de valor para Ariel,
absolutamente nada, apenas a carreira dele, que sempre virá acima de
qualquer coisa e pessoa para ele.
Sinto meu coração se partir com meus sentimentos, me negando a
acreditar nas palavras de Max. Luto para achar algum argumento que
desminta as acusações, mas as palavras se prendem em minha garganta.
— Com Silvia foi a mesma coisa, tanto que foi por isso que o
casamento dele afundou. Silvia apenas servia para ele quando lhe convinha
desfilar com ela ao seu lado, nas festas que ele frequentava. Quando não
precisava, ele a descartava instantaneamente. A coitada acabou se perdendo
na bebida, mas ele não se importou, não até perder a filha.
— Dolly... — sussurro triste.
— Sim. Depois que a filha morreu, ele acabou com a vida da mulher.
É muito triste a forma como Silvia está.
— O que houve com ela?
— Ele não te contou? — Max balança a cabeça em negativo,
encolhendo seus ombros. — Não sei se devo te contar, isso não é um assunto
que eu deva falar, ainda mais que você está grávida dele.
— Max, o que ele fez com a ex-esposa? — Seguro sua mão na minha,
não deixando seus olhos desviarem dos meus.
— Ariel a internou. Silvia está desde a morte da sua filha internada
em um sanatório em Nova York. Ele a levou a julgamento, alegando que ela
é um risco para a sociedade por conta do seu desequilíbrio mental e do
alcoolismo, e que por isso a filha deles morreu.
— Ariel não faria algo assim...
— Oh, ele fez! Ariel fez sim. Foi diante do juiz e fez ele mesmo sua
representação contra sua ex-esposa. No fundo, suspeito que ele queria fazer
isso desde a época que a filha era viva, pois, se a internasse, a guarda seria só
dele. É mais fácil para ele se livrar de alguém do que ajudar. — Max respira
fundo, alisando meu rosto, e solta um suspiro lento. — Ela estava assustada,
se sentindo abandonada, inútil e fragilizada, então se entregar à bebida foi
quase inevitável, mas ela não era louca, apenas não tinha mais serventia para
Ariel. Mas isso não quer dizer que ele vá fazer a mesma coisa com você.
— Comigo...
Fico em silêncio, tentando compreender tudo que ouvi. Ariel quer
ficar com os filhos, ele deixou claro no primeiro momento que nunca se
afastará dos filhos. Me pedir em casamento não foi por mim, mas sim pela
descoberta dos gêmeos. Max me puxa para seus braços, cuidando para não
me deixar derrubar a xícara. Sinto seu queixo ficar no topo da minha cabeça,
com os dedos dele acalentando minhas costas com palavras suaves, me
acalmando.
— Não sofra, não vai mais sofrer, eu te prometo, Cris. Está segura
agora. — Escondo meu rosto em seu peito, sentindo a dor que sai entre as
lágrimas. — Nunca mais vai sofrer. Não se desgaste, Cris. Beba seu chá e
descanse agora... — Sua mão para na xícara, olhando para ela. — Esfriou.
Demorou tanto, que acabou ficando fria. Vou preparar outra para você.
Ele beija minha testa de forma carinhosa, se levanta, pega a xícara da
minha mão e olha com brandura para mim.
— Está segura agora, Cris. Prometo que nada mais de ruim vai
acontecer com você.
Meus olhos se fecham assim que ele sai do quarto. Deixo as lágrimas
rolarem por minhas bochechas, fungando entre os soluços, com meus dedos
achatados em minha barriga. Eu tinha fugido tanto de me envolver com outra
pessoa durante tanto tempo, para no fim seguir o mesmo caminho que
embarquei no início. Estou confusa, sozinha, me sentindo isolada, apenas eu
e os meus bebês. Tapo meu rosto, sentindo o enjoo me tomar, me dando
apenas poucos segundos para levantar-me da cama, correndo para o banheiro
e vomitando minha bílis. O gosto amargo em minha boca é o mais doloroso
fel, se igualando ao meu coração e minha alma quebrada. Tento, assim que
passa os espasmos do vômito, me escorar na parede para me erguer.
Caminho para a pia e dou descarga na privada. Lavo meu rosto com a
água gelada da torneira. Procuro por uma toalha no banheiro do Max, mas
não encontro, o que me faz sair para fora do banheiro olhando em volta, para
ver se ele levou a toalha que me emprestou. Mas nada está ali, Max a levou,
junto com a camisola do hospital. O vento que passa por minhas costas me
faz encolher, estou com um pouco de frio. Ergo meus olhos para a janela e a
vejo fechada. Meu rosto se vira, procurando de onde vem a corrente de ar
gelado, observando uma das portas do guarda-roupa encostada. Ajeito meus
óculos em minha face, olhando sem entender para ela. Meu braço se estica e
deixo minha mão aberta, próxima à fresta, sentindo a correnteza fria que sai
dela. Abro lentamente, vendo a luz que se acende lá dentro. O que julgava ser
um guarda-roupa, é o closet refrigerado de Max. Mas não são suas peças de
roupas que encontro, o que vejo é aterrorizante. Dou um passo para frente e
olho a quantidade de fotos minhas pregadas na parede. Fotos íntimas,
inclusive. Em algumas estou dormindo em meu quarto, em outras deitada no
sofá, lendo um livro, em outras andando na rua. Cada foto reflete um
momento da minha vida. Em uma mesa ao canto, há um manequim sem
braços e pernas, apenas o torço, usando um dos meus conjuntos de lingerie,
que julgava há muito tempo perdido. Em volta dele tem mechas de cabelos
humanos, iguais aos meus.
— Oh, meu Deus... — Tapo minha boca, vendo a foto grande do meu
rosto em cima do pescoço do manequim.
Minha respiração está acelerada, meu coração bate desesperado.
Tropeço quando ando para trás, fechando a porta com força.
— Não era para ter entrado aí. — Giro meu rosto para Max, que tem
sua feição zangada, apertando forte a xícara em sua mão. — Não era para ter
visto isso.
— Você... Você, Max... — Me afasto dele e vou para a outra ponta do
quarto, abraçando meu corpo. — Todo esse tempo foi você me aterrorizando.
— Cuidando — ele fala baixo, negando com a cabeça. — Eu cuidei
de você, cuidei para nunca mais ninguém te machucar... Vigiei você. Eu
protegi você.

— Não voltou para mim porque não quis. Deve ter descoberto como é
ser como a sua mãe, não é, Cris? Ser a vagabunda imunda que sempre foi —
ele fala com raiva, ficando mais agressivo a cada segundo.
— Renan, por favor...
— Cristina? — A voz de Max atrás de mim me dá um alívio imediato
quando a ouço.
Renan me solta na mesma hora, olhando para trás de mim com raiva.
Sinto as mãos de Max passarem por meus ombros, parando ao meu lado, e
ele me puxa, me levando para perto dele.
As memórias me acertam, me deixando perdida. Max sempre esteve
ao meu lado, como um bom amigo em quem eu confiava. Me sentia segura
ao lado dele. Sua amizade verdadeira era reconfortante. Desde o primeiro dia
que nos conhecemos, dentro do tribunal, a empatia que ele sentiu por mim, o
acolhimento... Agora tudo é tão cínico, tão distorcido.
— Você estava me seguindo... Fez aquilo com o pobre gato... O
presente mórbido... Deus, Max... Eu confiava em você...
— Você errou, precisava ser disciplinada. — Ele joga a xícara no
chão, balançando sua cabeça para os lados. — Se comportou como uma
vagabunda suja, se deitando com qualquer um de forma promíscua, sentindo
prazer em ser fodida na parede, como uma cadela.
— Meu Deus, Max, o que fez?
— Eu te vi, enxerguei você quando ninguém mais te viu, avistei a
mulher linda que você é, mas você ficou feia, ficou asquerosa, como uma
vadia barata, trepando com Ariel e gostando de ser fodida feito uma porca
nojenta. — Ele suaviza sua face, sorrindo para mim. — Mas eu perdoei você,
eu perdoei sua traição, porque eu cuido de você, sempre cuidei de você, Cris,
nunca te deixei sozinha.
— Não... Não, por favor, para. — Tapo meus ouvidos, batendo
minhas costas na parede quando recuo, fechando meus olhos. — Fez eu me
sentir uma louca, uma louca que não conseguia provar que estava sendo
ameaçada...
— CUIDEI DE VOCÊ! E até agora eu cuido de você... Então você
disse que queria casar. Não vê que ninguém nunca vai cuidar de você como
eu cuido? — Abro meus olhos e vejo sua mão esticada em minha direção.
Meu corpo se encolhe, sinto medo, pavor do olhar desequilibrado de
Max. Ele recolhe seus braços para o lado do seu corpo, abaixando seus olhos
para o meu ventre.
— Tentei fazer você enxergar que essas coisas dentro de você foram
um erro, que precisava tirá-las, mas não saiu como eu esperei.
— Mandou aquela mulher para o meu quarto...
— Eu não queria chegar a esse ponto, mas precisei. Pietro me contou
sobre sua pressão alta, ele não me deixou ir te ver. Miller afastou você de
mim, tirou você de mim, por conta desses estorvos que ele pôs dentro de
você. — Sua boca se esmaga com ódio.
— Você mandou um feto morto para mim, Max, fez isso para me
machucar.
— Não, não. Eu nunca machucaria você... — Ele nega com a cabeça,
sorrindo. — Eu precisei agir rápido. Você se apaixonou por aquele verme...
Se perdesse seus filhos, você não teria mais serventia para Ariel, e o veria
como ele realmente é. Mas não perdeu as sementes dele, elas são maléficas
igual a ele, entranhadas dentro de você, se negando a morrerem. — Max
respira fundo. — Eu vou cuidar de você agora, para sempre. Ele não vai
afastar você de mim, nunca mais ninguém vai machucar você.
— Max, não faz isso, por favor...
— Devia ter deixado a mulher te dar a injeção, Cris, devia ter tomado
o maldito chá. Assim, pelo menos, seria menos doloroso.
O som dos seus passos aumenta, com ele caminhando em minha
direção de forma fria, me encarando.
Aperto meus olhos, os fechando com força, enquanto meus braços se
erguem sobre minha cabeça. O grito de dor que invade o quarto sai dos meus
lábios quando o terceiro chute desferido em puro ódio acerta minhas
costelas. Sinto o ar faltar dentro dos meus pulmões e me retorço de dor.
As lembranças me inundam, me pegando com força, me paralisando a
cada passo que Max dá em minha direção.
— Você não vai sofrer por conta dessas coisas que estão dentro de
você, não vai. — Max retira o cinto da sua calça, o esticando em sua mão,
olhando para o couro. — Nunca mais vai sentir dor, medo, nunca mais vai
chorar... Nunca mais vai sofrer ou ser chamada de louca, eu vou cuidar para
sempre de você.
O instinto primitivo de sobrevivência pura, de proteção de uma mãe
pelos seus filhos, é o que me arranca da minha paralisia e me faz chutar suas
pernas quando ele se aproxima de mim, com seus braços esticados, prontos
para me estrangular com seu cinto. O rompante do meu corpo, que se move
em disparada para a saída do quarto, é ligeiro. Ouço os gritos de ódio de
Max, que vem atrás de mim. Ouço o som da respiração dele se aproximando.
Meus pés estabanados se atrapalham, me levando ao chão quando ele puxa
meus cabelos. Sinto o impacto e a dor dos meus joelhos sendo pregados no
chão, a textura do cinto em minha pele, sendo comprimido tão forte, como se
fosse ultrapassar minha garganta e quebrar minha traqueia. Meus gritos
roucos e grotescos são abafados pelo ar que me falta, e entre tudo, o caos, o
medo, o terror que submerge, minha mão se estica, como se eu pudesse de
alguma forma alcançar a porta da saída da casa, que está tão distante. Vejo a
madeira ser arrombada, escancarando a porta. Um vulto alto se move. Apenas
um único som se faz em meio ao caos, é frio, sonoro, latente e inabalável. O
aperto do couro cede, me fazendo sugar com todas as minhas forças o ar para
meus pulmões, tombando a parte superior do meu corpo para frente, com
meus dedos espalmados no chão. Rapidamente, tudo fica lento, distorcido
com os gritos de ódio e passos pesados, que parecem minas terrestres
explodindo dentro da minha mente. Então tudo se silencia, abafa, os
zumbidos, os ecos... Sinto apenas o calor quente da mão firme que segura
minha face em seus dedos. A escuridão me suga no segundo que meus olhos
se chocam com os seus, em um azul tão angelical, mas em uma face
demoníaca, violenta, agressiva e cruelmente perversa. É como ir do céu ao
inferno.
Ariel Miller

— Chefe, precisa ficar calmo, vamos chegar a tempo! — Brow fala


nervoso, sentando-se ao meu lado enquanto dirijo o carro em alta velocidade.
Sinto tudo me sufocar. Um anseio de medo, desejo de morte e
incompetência por tê-la deixado sozinha. Como não vi, como não consegui
enxergar a verdade que estava diante de mim por todo esse tempo? Meu
desejo por vingança me fez ficar concentrado em Renan Pener e em todo mal
que ele causou na vida de Cristina, me fez ficar restrito a uma única linha de
raciocínio. Não abri os leques. Estava tão assertivo, todos os índices
apontavam que era o maldito do Renan, que não me atentei a única outra
pessoa que estava ao lado dela desde o divórcio dela.
Greg me passou o endereço pelo celular, e estaciono o carro, o
deixando atravessado na frente do jardim. Em seguida, pego o revólver da
mão de Brow. Os gritos, que vêm da residência, faz eu sentir meu sangue
congelar dentro das minhas veias. Corro rápido e estouro a porta da frente. A
imagem dela ajoelhada ao chão, com seu rosto ficando pálido, completamente
lavado por lágrimas, esticando a mão para mim, me faz não pensar. Vejo
apenas ela lutando para tentar respirar. Meu dedo pressiona o gatilho da arma
assim que a ergo em um rápido movimento. Miro em Maximiliano e disparo
contra ele. Seu corpo desaba no chão, próximo a ela, que tenta se arrastar
para outra direção. Eu estou ao lado de Cris em questão de segundos. Retiro o
couro do seu pescoço e a pego em meus braços.
— Não... Não! — Minha voz, carregada de cólera, sussurra enquanto
tento não cair na insanidade, a tendo desmaiada em meus braços.
— Cretino de merda! Seu cretino doente de merda, você não pode
tirá-la de mim! — Ergo meu rosto para Max, que grita, tentando fugir,
segurando seu ombro baleado.
Minha mão se ergue mais uma vez, e miro o revólver em sua direção,
tendo cada canto do meu ser implorando para matar esse desgraçado. Brow
entra na frente, marchando como um demônio enfurecido em sua direção.
— Doente filho da puta! — Brow o amaldiçoa, e seu punho se fecha,
acertando a face de Max com toda força, o derrubando no chão. Ele retira o
celular do bolso e disca para a emergência.
Aperto as costas dela, a mantendo colada em meu corpo. Ainda quero
acabar com a vida de Max, pelo que ele fez por todos esses anos a ela. Max
usou do trauma dela para aprisioná-la, melindrá-la tão fodidamente, a ponto
de fazê-la se sentir sozinha e louca.
— Sai da frente, Brow! — Cerro meu maxilar, ainda com a arma
empunhada para o filho da puta que é Max. Brow se vira e olha o revólver em
minha mão.
— Ariel, não faça isso... — Ele tenta soar calmo, esticando sua mão
para mim.
— Sai da frente dele, Brow!
— Chefe, ela precisa de você. Eu sei o que está sentindo, e eu sei
também quais são as consequências de fazer algo por impulso. — Ele abaixa
seus olhos para ela, voltando a encarar a arma. — Não precisa da morte desse
verme lhe assombrando. Me entregue a arma, chefe. Te garanto que ele vai
pagar pelo que fez. Cuide dela e deixe o resto comigo.
Não reluto quando Brow se aproxima de mim e retira a arma dos
meus dedos, a tirando lentamente da minha mão. Me volto para Cris, tiro os
fios de cabelos da sua face e vejo sua pele molhada. Arrumo ela em meu colo
e me levanto. Brow segura a arma e usa sua camisa para não tocar nela,
enquanto a limpa. O vejo caminhar de volta para Max. Saio com ela rumo à
porta e o som da ambulância ao longe vai ficando alto. Os paramédicos estão
se aproximando da residência.
A giro pouco a pouco, a fazendo ficar de frente para mim. A quentura
da sua respiração morna me acerta, tendo seus olhos brandos me fitando.
Nada do que sinto ao seu lado é o que eu dividia com Silvia. Meu mundo
tinha encontrado o ponto de equilíbrio desde o segundo que entrei naquele
escritório e meus olhos repousaram nela.
— Aprecio sua companhia, babá McPhee — murmuro com
rouquidão, não conseguindo dizer para ela que não só aprecio estar ao seu
lado, mas que eu a amo. Ergo minha mão e seguro seu queixo, observando
cada centímetro da sua face. Solto seu queixo e retiro os óculos dos seus
olhos, os deixando no cantinho da pia. — Aprecio muito sua companhia.
— Eu te amo, babá McPhee... — A aperto mais forte em meus braços.
Cristina Self

Quando abro meus olhos outra vez, tenho minha mente confusa. Está
tudo tão claro, o teto branco... O cheiro de álcool que invade minhas narinas,
faz voltar lentamente meus sentidos. Sinto as agulhas em meu braço e ouço o
som distante de um insistente bipe, que se repete. Fico com meus olhos
parados, sem desviar do teto, piscando com minhas pálpebras pesadas. Sinto
o toque forte em meus dedos, sendo segurados por uma mão firme. Movo
minha cabeça lentamente, olhando o grande homem desalinhado, com sua
cabeça baixa, com os cotovelos apoiados na cama, segurando minha mão na
sua, à frente do seu rosto, sentado em uma cadeira ao lado da cama, com sua
postura melancólica. Vejo seus ombros se enrijecerem quando mexo meus
dedos, retribuindo seu carinho. Seu rosto mortificado se ergue, apertando
minha mão entre as suas. Ariel tem sua feição abatida, a pele pálida e seus
cabelos desalinhados.
— Graças a Deus, você acordou! — Seus olhos vermelhos se fecham
por um instante, antes dele se mover rápido e se levantar da cadeira
abruptamente, soltando minha mão, inclinando seu corpo para cima do meu.
Sinto o aperto forte dos seus braços ao redor dos meus ombros, e ouço
sua respiração pesada, esfregando seu rosto em minha bochecha.
— Tirou uma grande soneca, não foi? — ele me diz baixo, beijando
minha testa, afastando apenas um pouco sua face, passando seus olhos pela
minha.
— Meus... meus bebês. — Minha mão pesa, sem conseguir se erguer
mais que poucos centímetros do colchão. — Meus bebês...
— Eles estão bem, estão seguros, minha babá McPhee. — Sua mão se
abaixa sobre a minha, a levando até meu ventre, espalmando nossas mãos
juntas.
Sua mão em meus cabelos os massageia, empurrando para trás,
sorrindo para mim. Fecha seus olhos e respira fundo, colando sua testa à
minha. Sinto o alívio me inundar e felicidade de ver seus olhos presos aos
meus. Ariel se afasta um pouco, passando seu dedo por minha boca,
tombando sua cabeça para a esquerda, em cima do seu ombro.
— Quando minha filha morreu, eu rompi os laços com Deus, o
amaldiçoando por Ele ter me tirado ela, ter levado minha menina de mim, me
privando da existência dela, por ter deixado sua inocência partir de forma tão
trágica. — Ele esmaga seus lábios melancolicamente, fechando seus olhos e
esfregando minha barriga. — Jurei a mim mesmo que jamais deixaria nada
ser tão importante outra vez. — Uma única lágrima escapa por sua face, com
seus olhos se abrindo, me olhando. — E por uma maldita semana, os sete dias
mais longos da minha vida, senti todo aquele sofrimento outra vez, enquanto
segurava sua mão, conversando seriamente com Deus outra vez, tentando
compreender o que eu podia ter feito de tão errado nessa minha vida, para
não ser merecedor de uma segunda chance. Se foi uma esmola que neguei,
algum domingo que deixei de ir à missa, qual foi meu pecado para merecer
perder as pessoas que eu amo.
— Ariel...
— Ele me ouviu, Ele me ouviu — Ariel murmura calmo, sorrindo
para mim. — Ele não me deu uma segunda chance, Ele me deu três.
Meu peito arfa e sinto meu coração disparar. Respiro fundo, ficando
presa na intensidade dos seus olhos. O azul tão calmo e suave, está sem
aquela tempestade que brilhava lá dentro.
— Eu te amo, Cristina Self. Te amo como eu nunca amei nenhuma
mulher. Te amo como eu jamais vou amar qualquer outra. — Sua testa se
cola à minha novamente e sinto as lágrimas descerem pela minha face.
Aperto seus dedos com força sobre meu ventre.
— Te amo, eu te amo... — Beijo sua bochecha e sinto o gosto da sua
lágrima em meus lábios, murmurando o que grita em meu coração.
— Oh, meu Deus, ela acordou! — O som estridente, o qual reconheço
bem, me faz sorrir, olhando para Ariel.
Ele se afasta apenas um pouco, ainda deixando sua mão em minha
barriga.
— Oi, mãe. — Viro meu rosto no travesseiro, olhando na direção
dela, a vendo entrar no quarto, sendo seguida por Brow.
— Cristo, você vai me fazer ter um infarto ainda!
Sua mão se estica para meu rosto, com ela se abaixando, disparando
vários beijos em minha face.
— Quando a senhora chegou?
— Já tem quatro dias, meu amor. Liguei para Ariel e o guarda-costas
ali foi me buscar no aeroporto, me trazendo direto pra cá. Me senti a própria
Whitney Houston[32]. — Ela pisca para mim, me fazendo rir com a forma
envergonhada que o pobre Brow fica.
— Fico muito contente em lhe ver bem, senhorita Self. — Brow se
aproxima da maca e me dá um sorriso triste. — Eu sinto muito...
— Ainda me deve um chocolate com caramelo e um suco de
morango, Brow — respondo a ele, lhe dando um sorriso terno. Ele sorri,
balançando a cabeça em positivo. — É tão bom lhe ver, ver todos vocês.
— Eu senti tanto medo de perder você, meu amor.
Volto meus olhos para minha mãe e vejo seus olhos marejados,
balançando sua cabeça lentamente para os lados.
— Eu te amo, dona Kenia — sussurro para ela, sentindo o beijo
demorado que ela dá em minha testa.
— E eu te amo mais que tudo, meu amor — ela suspira e limpa meu
rosto, sorrindo. — Chega de lágrimas, nada de choro, o único choro que
quero ouvir de agora em diante é dos meus netos.
— Netas. — A voz de Ariel é calma.
Tanto eu como minha mãe erguemos nossos rostos para ele. O vejo
dar um leve sorriso de lado, com sua mão massageando meu ventre.
— Mas, como... — Fico perdida, sem entender. Estou entrando para a
décima quinta semana, o médico tinha me tido que a ecografia de sexo seria
feita apenas depois da décima sexta semana.
— Pedi para fazerem todos os exames em você e nos bebês, queria ter
certeza de que vocês estavam bem. Um deles foi a sexagem fetal...
— Três chances — sussurro, me recordando do que ele disse.
— Sim. — Sua mão se ergue para meus cabelos, os acariciando. —
As três mulheres que mais amo em minha vida, três vênus.
Fecho meus olhos, rindo, não acreditando que vou ser mãe de duas
meninas. Sinto meu peito explodir a cada batida, como fogos de artifícios.
— Te amo, babá McPhee.
Abro meus olhos para me chocar com as esferas azuis de Ariel de
frente para mim, com seu corpo inclinado.
— Aprecio sua companhia também, doutor Miller. — Sorrio para ele.
— Acho bom mesmo, porque pelo que consta nos autos, você me
pediu em casamento e eu aceitei.
Ele pisca descarado para mim, sorrindo com malícia.
— Pediu o homem em casamento, Cristina? — A gargalhada da
minha mãe se espalha, me fazendo rir para a face cínica de Ariel.
Balanço minha cabeça em positivo, erguendo minha mão lentamente,
até conseguir tocar sua face. Seus olhos se fecham, com ele inclinando seu
rosto em meus dedos, sentindo meu carinho.
— É, eu pedi.
Seus olhos se abrem, abaixando sua cabeça, beijando meus lábios de
forma suave.

Ainda tenho que ficar mais alguns dias no hospital em observação,


antes do médico me dar alta. Ariel me dá as notícias em doses homeopáticas,
cada dia um pouquinho. Ele tinha conseguido rastrear o endereço de Max,
indo direto para lá depois que se encontrou com Brow. Greg ligou para a
polícia. Meus gritos foram ouvidos por Ariel assim que ele desceu do carro, o
que o fez correr para a porta da casa e a estourar. Ariel atirou no braço de
Max, o fazendo me soltar, e correu para mim, para me proteger, enquanto
Brow imobilizou Max com um nocaute, que o fez desmaiar. Brow pegou a
arma com um lenço que tinha no bolso, fazendo Max segurá-la, espalhando
as digitais dele por toda a pistola, antes da polícia chegar.
Ariel foi comigo na ambulância dos paramédicos, não saindo de perto
mim em momento algum. Os médicos acharam mais seguro me manter
sedada, para manter a estabilidade da minha pressão. Quando a sedação
acabou, ainda permaneci apagada por mais alguns dias. Encontraram o quarto
assustador dentro da casa de Max, e logo uniram com a filmagem do
computador de Estence. A polícia fez uma perícia novamente no meu
apartamento, encontrando no sótão esperma e a digital do Max. Ariel não
quis entrar em detalhes e nem contar toda a história, preocupado com minha
saúde. Tudo que Max tinha me falado era mentira, apenas para me manter
fragilizada. Ariel nunca foi para festa alguma, e muito menos se aproximou
de Malvina. Quando lhe perguntei sobre Silvia, se ele tinha a internado em
um hospício, ele desmentiu a história toda. Silvia está casada novamente,
mora na Carolina do Sul com seu marido, que é um jogador de tênis. A
polícia encontrou a mulher que tinha entrado em meu quarto. Ela realmente é
uma enfermeira, mas não do hospital no qual eu estava. Ela era uma antiga
cliente de Max, que recebeu uma boa quantia para injetar um remédio
abortivo em minhas veias. Eu não conseguia acreditar em tanta crueldade e
frieza, em como Max, de uma forma horripilante, fez tudo isso alegando me
amar.

Algumas semanas depois


— Cris, você tem que sair desse quarto.
Meus dedos estão tremendo, segurando o delicado buquê em minhas
mãos, olhando perdida para ele.
— Já vou, mãe — respondo para ela, que me chama pela terceira vez,
batendo na porta.
— Você está bem? — Sua voz preocupada pergunta.
— Sim, eu estou...
— Cristina, se não abrir essa porta, vou chamar Ariel para arrombá-la.
Me sento na cama, observando tudo à minha volta, sendo pega por um
medo que me deixa mais que aflita. Ouço a porta do meu quarto ser aberta à
força por Brow, que com todo o seu grande tamanho, não precisa de muito
esforço para arrombá-la. Minha mãe passa por ele, alisando seu braço, dando
uma piscada.
— Belos músculos fortes, Brow.
— O que os dois estão fazendo aqui dentro? — Levanto e os encaro.
— Sua mãe estava preocupada. — Ele me dá um sorriso, admirando
meu vestido. — Está linda, Cris. Vou voltar lá para segurar o noivo.
Minha mãe se entorta na porta, sorrindo para Brow, que caminha nos
corredores.
— Olha que bunda durinha, já pensou dar uma mordida ali?
Hummm...
— Mãe!!!
Ela ri e balança sua mão no ar, se virando para mim. Seus olhos me
avaliam de cima a baixo.
— Deus, está linda, minha rosquinha!
Me olho no espelho mais uma vez, admirando o vestido claro que vai
até minhas canelas, tendo as duas alças finas. Estou ficando a cada dia que
passa maior. Nesse mês que passou, minha barriga cresceu mais um pouco.
Aliso minha barriga, feliz por saber que minhas duas meninas lindas crescem
saudáveis aqui dentro. Viro para minha mãe, que está toda emocionada,
tentando não borrar a maquiagem.
— Mãe, já passamos por isso, lembra? — falo baixo, a vendo me dar
um sorriso torto.
— É, eu sei — ela diz, limpando suas lágrimas. — Mas dessa vez é
diferente, é especial.
Dou um dos meus melhores sorrisos para ela, que me avalia com toda
cautela quando seus olhos se prendem aos meus, e assim vou deixando meu
sorriso morrer.
— Estou com medo — digo, sentindo meu coração disparar. Me sento
na cama outra vez, batendo meus pés ao chão.
— Oh, meu anjo, é normal, ainda mais depois de tudo que passou —
ela fala e caminha até a cama, se sentando ao meu lado. — Qual o motivo do
seu medo? — Ela segura minhas mãos nas suas, apoiando seu braço no meu
joelho. — Vocês serão uma família agora.
— E se Ariel se arrepender depois? E se for realmente só por causa
dos bebês?
— O homem te ama, Cristina. — Ela limpa uma lágrima que escorre
pela minha face. — E ele está lá na sala agora, andando como um animal
enjaulado, louco para vir lhe buscar, como um homem das cavernas. — Ela
sorri para mim. — Se isso não for amor por você, então eu não sei mais nada
nesta vida, meu anjo.
Abraço forte a minha mãe, e fico colada a ela por um tempo, sentindo
todo seu carinho.
— Eu te amo, mãe.
— Oh, Cris... vai me fazer borrar a maquiagem assim. — Ela beija
meu rosto e alisa meu queixo. — Eu te amo muito, meu amor. Agora vá para
aquele seu homem sexy, que só pelo tamanho do volume da calça, suspeito
ser um Subway.
Caio na risada assim que ela me fala sua bobagem.
— Vamos, garota! — Ela sorri para mim, se levantando. — Tem um
homem lindo lhe esperando.
Seguro forte minhas flores em meus dedos e solto uma longa
respiração. Passo minha mão sobre meu ventre e me levanto, sorrindo para
ela.
— Vamos — digo, encaixando meu braço ao dela, que me leva para
fora do quarto.
Saímos nós duas caminhando pelo corredor da casa de Ariel. Ao me
aproximar da sala, a vejo toda florida. Minha mãe decorou tudo para o meu
casamento, mesmo sabendo que será apenas eu, ela, Ariel, Brow, Greg e o
juiz de paz. Uma balada antiga, lenta, começa a tocar no rádio, assim que
entro na sala. Sorrio para Brow, que pisca para mim, se afastando do aparelho
de som. Mas é no homem irresistível que meus olhos param. Ariel está
magnífico ao centro da sala, perto do juiz, vestindo um terno branco sob
medida. Seu aspecto me lembra um anjo, mas seus olhos brilhando em
travessura me falam que não há nada de angelical. Fico fascinada com meu
anjo sombrio, que esconde por trás da sua forma excêntrica tanta gentileza, a
qual ele renega. Ele me dá um lindo sorriso largo, balançando a cabeça para
mim, me convidando a me juntar a ele. Viro meu rosto para minha mãe, que
está soluçando, tentando segurar suas lágrimas para não borrar a maquiagem.
— Mãe — a chamo baixinho, a fazendo olhar para mim. — 23 cm —
sussurro para ela, lhe dando uma piscada.
Vejo seus olhos se expandirem, com ela engolindo o choro. Começo a
andar, sorrindo. Caminho para o simples e modesto altar, feito com a mesa de
centro da sala. Sinto os olhares dos outros sobre mim, mas os meus estão
presos a uma única pessoa. Deus, eu amo esse homem de boca cretina, que
sempre tem alguma palavra estranha para me irritar, mas que faz eu me sentir
segura quando seus olhos estão presos aos meus, como eu nunca me senti em
minha vida.
— Onde está a saia e a gola alta? — Ariel segura minha mão quando
me aproximo dele.
— Não achei apropriado para o casamento — falo, rindo, o olhando.
— Você demorou. — Ele estica a mão livre, alisando meu ombro. —
Eu pensei que tivesse...
— Aprecio sua companhia, doutor Miller — o corto, murmurando,
apenas para ele me ouvir. — Amo sua companhia.
Ariel deposita um beijo na ponta do meu nariz, nos virando de frente
para o juiz, soltando o ar dos seus pulmões, me deixando o sentir ficar
relaxado ao meu lado. E nada mais me aflige ou me deixa amedrontada, pois
meu lugar é aqui, ao lado dele.
A cerimônia é formal, mas de uma forma bela e quase cômica, já que
quando o juiz nos declara marido e mulher, Ariel olha para Brow e Greg,
como se estivesse os intimando a se retirarem, parecendo ser algo que já
estava planejando e arranjado antes da festa. Quando vou procurar por minha
mãe, ela já está encostada nos braços de Brow, rindo com ele, entrando no
carro.
— Eles não ficaram nem para comer. — Olho perdida para a janela, e
quando me viro, apenas tenho tempo de erguer meus braços para o ataque
que recebo.
Ariel está me erguendo no colo, caminhando para o quarto, respirando
fundo.
— Eles vão comer, eu fiz reserva para eles em um ótimo restaurante.
— O correto não é os noivos irem junto, doutor Miller?
— Creio que no nosso caso, podemos optar por jantar no quarto. —
Jogo minha cabeça para trás, rindo do cinismo dele. — O que quero comer,
está em meus braços.
— Seu cretino. — Beijo sua boca, suspirando dengosa quando ele
morde meus lábios de mansinho.
Meu corpo desaba na cama em pouco tempo, e sou despida de forma
urgente, com Ariel tirando minha roupa e a dele. Fecho meus olhos e respiro
fundo, sentindo suas mãos se fecharem em volta do meu rosto. Seus dedos
acariciam minhas orelhas e vão descendo por meu pescoço. Abro meus olhos
e me perco nos seus. Meu corpo implora pelo que seus olhos me prometem, e
apenas me deixo levar quando seus lábios tocam os meus com acalento,
candura, me fazendo derreter. Suas mãos tomam direções opostas. Uma se
prende em meu rosto e a outra me puxa pela cintura, me colando ao seu corpo
quente. Sinto seu coração pulsar forte sobre meus dedos quando espalmo
minha mão em cima de sua pele. Ariel me beija sem restrição, me tomando
como sua, derretendo todo meu autocontrole, me fazendo promessas mudas
de tempos felizes. Não sei se está certo, mas só quero que ele me tome nesses
braços.
Suas mãos me prendem com força, para que eu não me afaste dele.
Ariel se ajoelha, levando minha calcinha ao chão com seus dedos ágeis. Meus
olhos acompanham seus movimentos, sua testa descansa sobre meu ventre,
parando por alguns segundos em cima da minha barriga. Sinto sua respiração
quente sobre minha pele, e logo seus lábios depositam um beijo no meu
umbigo. Ariel se arrasta, deixando traços dos seus beijos por todo meu corpo.
Vou me perdendo em seus beijos lentos e devassos, que me queimam a alma.
Meus dedos seguram em seus cabelos, para não me deixar cair de vez nesse
mar revolto que se chama Ariel. Ele deixa um beijo em cada canto das
minhas pernas, mordiscando meu joelho, lambendo minha virilha. Sua língua
percorre do começo da minha barriga até a minha garganta, me chupando, me
marcando com seus dentes. Ele se encaixa, afastando minhas pernas com as
suas, tomando controle do que já é seu.
— Cris — fala meu nome baixo, com sua face perto da minha. —
Olhe para mim.
Seus olhos azuis brilhosos, que tanto gosto de admirar, que me fazem
lembrar do céu em um dia lindo, que sempre me fazem me apaixonar mais e
mais por ele, me observam. O sinto se encaixar em minha boceta, que vai o
tomando com prazer, enquanto ele empurra seu quadril devagar. Ele abre
seus lábios para mim, soltando um baixo gemido, se empurrando com mais
pressão, até estar por completo dentro de mim. Minhas mãos vão para sua
nuca, se enroscando atrás da sua cabeça, com as dele descansando entre meus
cabelos. Ariel se move lentamente, me fazendo gemer, mordendo meus
lábios.
— Ariel...
Ele me beija com paixão, e conforme sua língua entra dentro da
minha boca, ele se movimenta, tornando mais profundo o beijo, mais rápidas
suas estocadas. Suas mãos se apertam em minhas costas, cruzo as minhas
pernas ao redor do seu quadril, me deixando tê-lo mais para mim. Posso
sentir ele enterrado até o último centímetro do seu pau dentro de mim. Meus
gritos, abafados pelos nossos beijos, saem baixos entre os gemidos, e seu
gosto me faz me sentir embriagada. Ariel acelera as estocadas, com seu pau
me fodendo. Sua cabeça se vira, trazendo seus dentes para o meu ombro.
— Oh, meu Deus, Ariel... — Minhas palavras morrem, seguidas por
um gemido, que o faz acelerar as penetrações.
Aperto mais forte minhas coxas em volta dele, com seu pau me
fodendo de forma urgente, o que me empurra para cair no êxtase. Seus olhos,
que não deixo desviarem de mim, brilham como chamas quentes, e gozo
chamando por seu nome, abraçando Ariel com todas as minhas forças, o
sentindo latente dentro de mim, gozando junto. Quando enfim a euforia
passa, Ariel rola seu corpo para o lado e me puxa com ele, para não
pressionar minha barriga. Ouço sua respiração voltar ao normal junto com a
minha. Meus braços moles ficam soltos em sua cintura, com ele me
abraçando, alisando minhas costas, fazendo carinho.
— Eu te amo — sussurra em meu ouvido. Sorrio para ele, sabendo
que Ariel entrou em minha vida, me tirou do inferno e me levou ao céu.
Capítulo 26
Buquê de rosas
Cristina Self

Quatro meses depois

— Não precisa abrir a porta se não quiser.


Paro meus passos no corredor, me virando para Ariel, que tem seu
rosto sério, com o olhar emburrado.
— Está falando isso de brincadeira, não é? — Levo minha mão à
cintura, com a outra espalmada no grande barrigão, o alisando.
Ariel dá de ombros, levando as mãos aos bolsos, olhando para a porta
e depois para minha barriga, batendo a ponta do seu pé no chão, repuxando a
ponta do seu nariz, se assemelhando a uma criança zangada.
— Desfaça essa cara emburrada, Ariel.
— Não estou emburrado, apenas disse que não precisa abrir a porta se
não quiser.
A campainha tocando outra vez, o faz fechar os olhos, rangendo seus
dentes.
— Ele não é uma pessoa amável, e muito menos amigável, é grosseiro
e arrogante, além de cínico...
— Nossa, por que essa descrição me parece tão familiar? — Estico
meus braços para ele, que retira as mãos dos bolsos e para ao lado do meu
barrigão, nos puxando para seu peito.
Beijo sua boca, mordiscando seus lábios e ouvindo seu gemido rouco.
Ele escorrega uma das suas grandes mãos para minha bunda, apalpando-a por
cima do vestido.
— Meus argumentos foram melhores que os seus, não entendo por
que eu tive que perder.
— Fazer espanhola[33] com meus peitos não é um argumento
válido...
— Depende do ponto de vista. Para o meu pau é. — Ele abaixa seu
rosto e esfrega seu nariz em meu decote. — Inferno de petições ilegais! Isso
que dá aceitar seus pedidos quando está com sua boca no meu pau!
— Pare de reclamar, fui extremamente justa.
A campainha toca outra vez, o que me faz afastar dele e o olhar,
sorrindo.
— Não vai ser tão ruim assim.
— Vai ser torturante, Cris. — Ariel sorri quando as meninas se
mexem, o fazendo abaixar seu rosto e beijar minha barriga. — Viu? Elas
concordam comigo.
— Não as induza a isso. Ande! Vamos abrir a porta. Não estamos
recebendo “Jack, o estripador”[34] na nossa casa, mas sim o seu pai.
Balanço minha cabeça em desgosto para ele. Caminho para a porta,
segurando o trinco, mas sinto o aperto firme da sua mão em meu braço, o que
me faz olhar para ele.
— Ele não é como sua mãe, é rude e rabugento. Não quero que ele
seja tirano com você. — Ele olha para a porta e depois para minha barriga,
caminhando para perto de mim. — Não quero que se decepcione.
Abro a porta e me preparo para conhecer o homem ranzinza. Foi
praticamente um parto conseguir fazer Ariel aceitar o convite de trazê-lo aqui
em casa, para participar do churrasco de família. Vejo um homem grisalho e
alto, o que me deixa saber de quem Ariel herdou o porte aristocrata e olhos
claros. O homem charmoso, com rosto quadrado e másculo, está encarando
Ariel, mas ao repousar seus olhos em mim, abre um largo sorriso, erguendo
sua mão à frente do corpo, me deixando ver o gracioso buquê de rosas cor-
de-rosa bem clarinhas.
— Você deve ser a doce Cristina. — Ele estende sua mão para mim
de forma galanteadora, e sorrio para ele, esticando minha mão, recebendo um
beijo casto sobre meus dedos. — Acho que essas rosas não fazem jus a essa
beleza toda, minha linda nora.
— Obrigada, são lindas! — Seguro as rosas em minhas mãos,
encantada com a beleza delas. — Eu fico tão feliz que tenha aceitado nosso
convite. Olha essas flores delicadas, Ariel!
O som ranzinza da respiração pesada ao meu lado, de Ariel, me faz
olhar para sua face emburrada. Ele revira os olhos com tédio, desdenhando
das minhas rosas.
— Olá, Miller. — Seu pai o encara, falando sério, com sua voz tão
rouca quanto a de Ariel.
— Olá, desembargador. — Ariel arqueia suas sobrancelhas, olhando
para as flores em minha mão e depois para o seu pai. — Você veio.
— Óbvio que eu vim, Miller. Não achou que eu recusaria o convite da
minha nora, certo?! Porque, claramente, não foi algo seu.
— Por que não entra, desembargador? — Estico meu braço para ele,
empurrando Ariel da frente da porta, para desbloquear a entrada. — Apenas
faltava o senhor para chegar, os outros convidados já estão aqui.
— Sem formalidades, minha querida. Faça uma gentiliza para esse
velho e o deixe ouvir uma mulher bonita o chamar pelo seu nome.
— Inacreditável! — Ariel rosna entre os dentes, o que me faz o
ignorar, sorrindo para o cavalheiro que sorri para mim.
— Posso tocar em minhas netas? — Os olhos do desembargador
brilham com emoção, e ele estica sua mão, mas ainda a mantém parada perto
do meu ventre volumoso.
— Claro que pode, Ostem! Na verdade, deve! — Minha voz sai feliz,
sentindo a grande mão dele espalmar minha barriga.
Seus olhos ficam petrificados e ele respira fundo. E um olhar de
surpresa, misturado à alegria, me encara quando ele sente o chute de uma
delas.
— Elas gostam do vovô. — Elevo meu rosto para Ariel, que está com
os braços cruzados, olhando curioso, agora caminhando para perto da minha
barriga. Outro chute vem seguido de novas sequências. — Elas estão bem
animadas.
— Elas estão agitadas — meu sogro fala, rouco, emocionado.
Ariel descruza seus braços, não se aguentando mais em si quando um
dos chutes marca o vestido certinho. Ele espalma sua mão em minha barriga.
Agora tenho a do pai dele de um lado e a de Ariel do outro.
— Talvez elas estejam com medo — Ariel murmura, rabugento,
dando uma olhada pelo canto dos olhos para o seu pai.
— Talvez elas saibam que se dependesse do pai delas, o avô morreria
sem conhecê-las — Ostem o rebate, mantendo sua atenção em minha barriga.
— Elas estão felizes, é isso — falo rápido, me afastando dos dois. —
Ostem, por que não segue até o jardim? Pode ficar à vontade, que eu já vou
lhe servir uma bebida.
Sorrio para o senhor, o vendo retribuir o sorriso, balançando a cabeça
em positivo.
— Vou amar, Cris... Não se incomoda de eu te chamar assim, certo?
— Nego com a cabeça, segurando minhas flores, as cheirando.
Vejo ele se afastar com o mesmo andar dominador do seu filho.
Suspiro, animada, cheirando minhas flores novamente, e recebo uma
encarada zangada de Ariel quando o olho.
— O quê? Eu gostei dele — falo em minha defesa rapidamente. —
Ele é um cavalheiro.
— Ele é uma múmia, Cristina!
— Uma múmia bem conservada, educada e charmosa. — O abandono
e caminho em direção à cozinha.
— Charmosa? Como assim?
— Seu pai é muito bonito, Ariel, e ele me deu flores. — Olho por
cima do ombro para ele.
— Eu lhe dou orgasmos e não ouço você me chamar de charmoso.
— Cala essa boca cretina, Ariel! — Rio com sua forma insultada. —
Pegue um vaso para mim, quero deixá-las bem-cuidadas.
Ariel passa por mim, se abaixa perto da pia e pega o cesto de lixo.
— Ariel... — rosno brava para ele.
— O quê? Me pediu um vaso, cesto de lixo serve também.
— Suma da minha frente, Ariel.
Fecho meus olhos, negando com a cabeça, indo eu mesma buscar um
vaso no armário. O encho de água na pia, deixando o belo ramo de rosas
dentro dele. Ariel abre a geladeira e pega duas cervejas.
— Deixa que eu sirvo aquela múmia — ele fala sério, abrindo uma
delas e levando aos lábios, respirando fundo.
— Se comporte, doutor Miller. — Sorrio, olhando para sua face
descontraída.
— Está feliz? — ele pergunta baixo, dando um sorriso de lado.
— Estou, estou muito feliz. — Paro à sua frente e recebo um beijo em
meus lábios.
— Ótimo, porque sua mãe está lá fora dançando colada com o Brow
— Ariel fala, rindo, cochichando para mim.
— Quantas cervejas ela tomou? — Fecho meus olhos, respirando
fundo.
— Algumas. Digamos que eu parei de contar depois da sexta
cerveja...
— Cristo! Vamos lá, antes que ela o agarre!
Ariel passa sua mão pelo meu ombro, nos levando para o nosso
quintal. Rio, balançando minha cabeça assim que vejo Brow e minha mãe
dançando colados. Greg, o detetive amigo de Ariel, que ele tinha me
apresentado assim que recebi alta do hospital, está rindo, conversando com o
jovem Estence, o qual caiu nas graças de Ariel, virando estagiário no
escritório do doutor Miller. Isso aí, Ariel rompeu com a sociedade da firma
de Pietro e abriu seu próprio escritório de Direito Criminalista. Bete quase
caiu da cadeira quando me viu entrar no escritório ao lado do notório
diabólico doutor Miller, de mãos dadas, no dia que ele foi tirar seus
pertences. Os olhos de Malvina, que saia do elevador, entrando no escritório
nesse momento, pararam diretamente nas nossas alianças de casamento, e
mesmo que eu nunca tenho falado isso em voz alta, senti uma leve pontada de
felicidade ao ver as outras duas funcionárias cretinas, que caçoaram de mim
dentro do banheiro, ficarem de boca aberta quando Bete gritou, eufórica, no
escritório, assim que lhe contei sobre as meninas.
Quem é a geladeira fria e cafona de quatro olhos agora?!
Greg gostou da ideia de vir morar em Sacramento, para trabalhar
junto com Ariel. E sabe quem procurou Ariel, dois meses depois do seu
julgamento, buscando seus serviços, mas foi educadamente direcionado a ir
embora pelo infame doutor Miller? O escroto do Stone Brat, quando
misteriosamente uma filmagem das câmeras de segurança do motel foi
vazada na internet, mostrando Stone saindo do estabelecimento com seu
enteado no dia que a mulher dele morreu, em um certo canal de um jovem
aspirante a advogado criminalista. Óbvio que Ariel negou ter alguma
participação nisso, e disse que não tinha ideia de como as filmagens foram
parar com Estence. Greg nem sequer se deu ao trabalho de disfarçar a faceta
dos três, apenas rindo quando os confrontei.
Depois de uma denúncia anônima, Renan Pener foi pego em flagrante
pela polícia dentro de um quarto de hotel em Nova York, com uma
acompanhante de luxo, que estava cheia de hematomas. E para piorar a
situação de Renan, ele estava em posse de oito quilos de cocaína. O que não
se encaixou nessa história, nem foi a quantidade gigantesca de droga, mas
sim a mulher, uma promotora nova-iorquina, que ligou para Ariel, lhe
contando sobre a prostitua espancada por Renan, que a procurou. E o astuto
criminalista fingiu muito bem sua cara de surpresa, quando ela perguntou se
ele não estaria interessado em dar um pulo em Nova York e trabalhar nesse
caso junto com ela. Mas se não fosse pelo prazer que vi brilhar em seus olhos
azuis, quando Ariel retornou da audiência de Nova York, garantindo um
longo e penoso tempo da vida de Renan dentro de um presídio, eu até podia
ter acreditado em todas as coincidências do destino e que não tinha um único
dedo dele metido nessa história toda. Renan foi espancado brutalmente no
primeiro dia que começou a cumprir sua pena, teve três costelas fraturadas, o
maxilar trincado e perdeu a visão de um dos olhos. E mais uma vez Ariel fez
bem seu papel, demonstrando surpresa, quando ficou sabendo destes
acontecimentos por Greg.
A última vez que vi Pietro foi quando recebi alta do hospital. Ele não
conseguia nem falar, estava completamente abalado com tudo que tinha
acontecido. Me deu um longo abraço, dizendo que sentia muito pelo que
aconteceu. Tentei conversar com ele no dia que fui junto com Ariel no
escritório, mas ele se recusou a me ver. Desconfio que Pietro ficou em
choque quando entrou naquele cômodo assustador dentro do quarto do irmão
dele. O julgamento de Max foi dois meses atrás, mas não tive coragem de ir.
Porém, Ariel fez questão de estar sentado na primeira fileira. Max pegou
vinte anos de cadeia, mas não chegou a completar nem três semanas, foi
encontrado enforcado com um cinto de couro dentro da cela dele, com sua
face roxa e língua cortada. Tive medo de perguntar a Ariel se ele tinha
alguma ligação com isso, mesmo dentro do meu peito eu sabendo a resposta.
A verdade é que tento não pensar sobre aquele dia, porém, ainda
acordo no meio da noite suada, como se eu estivesse sendo enforcada outra
vez. Mas são os olhos azuis de Ariel que me acolhem, me tirando daquela
imensa dor, me abraçando forte, até eu me sentir segura e adormecer nos seus
braços. Busquei ajuda médica com uma psicóloga, para conseguir lidar com
todos esses traumas. Acho que nunca teria imaginado passar por tudo isso
que passei, e muito menos que seria no momento mais doloroso da minha
vida que meu destino se cruzaria com uma pessoa cruel. Da mesma forma
que no momento mais estapafúrdio conheci o homem que mudaria minha
vida para sempre. Foram-me apresentadas algumas formas do que dizem ser
amor em minha vida. O maléfico, o tóxico, o que envenena a alma, o cruel, o
frio, o perverso, o intenso, o avassalador, o revigorante e o carinhoso. E foi
apenas em um deles que eu encontrei o que realmente é amor, e é nos olhos
de Ariel que me sinto viva e forte a cada dia.
— Eu amo você, doutor Miller — sussurro para ele, erguendo meus
olhos aos seus. Ariel abaixa seu rosto e beija a ponta do meu nariz.
— Aprecio sua companhia, minha doce vênus.
Sorrio e encosto meu rosto em seu peito, olhando para nossa família e
amigos. Aliso minha barriga e suspiro feliz, me sentindo em paz, e isso é um
sentimento de amor.
O amor é bonito, brando, protetor, quente e acolhedor. Mas se tem
uma coisa que o amor não é, é doloroso e violento.

Fim!
Epílogo
Ariel Miller

— Prometi que nunca mais conversaria com você, nem lhe pediria
nada, porque você já me tirou tudo. — Passo as mãos pelo meu cabelo,
negando com a cabeça. — Apenas queria que me dissesse o que eu fiz de tão
mal, nessa porra da minha vida, para merecer perder as pessoas que eu amo.
Respiro fundo e olho para a face frágil de Cristina, que está ligada
aos soros e eletrodos. Minha vida parou, meu mundo perdeu a cor por esses
sete dias que se seguem sem ela abrir seus olhos para mim. Os médicos
conseguiram estabilizar a pressão dela apenas no quinto dia, a deixando
medicada por um longo período. Terei que deixá-la despertar sozinha, mas
Cris não abre seus olhos, apenas se mantém em um sono longo, que está a
levando para longe de mim a cada dia que passa. Eu fui ao céu quando
recebi o resultado que Cristina está esperando duas meninas, o que me fez
chorar de emoção; e caí ao inferno por ela ainda não acordar. Tento
entender por que Deus fez isso comigo. Por que fez meu caminho cruzar com
essa mulher, que está gerando minhas filhas dentro do seu ventre, apenas
para tirar ela lentamente de mim, me castigando por ser o grande filho da
puta egocêntrico que sempre fui?!
— Eu sei que já fiz muitas coisas nessa minha vida que não é de se
orgulhar. — Abaixo meu rosto, sentindo meu peito ser rasgado enquanto
tudo vai quebrando à minha volta. — Não sou perfeito, e entre todos seus
filhos, devo ser o que o Senhor tem menos apreço. Mas se não for por mim,
que seja por ela. — Esmago minha boca, sentindo a umidade em minha face,
com a lágrima que rola por minha bochecha, enquanto vou morrendo pouco
a pouco. — Por ela. — Fecho meus olhos e esfrego meu rosto, respirando
fundo. — Eu preciso dela, eu preciso de uma segunda chance... Preciso dessa
segunda chance. Por favor, não me faça passar por isso outra vez, não me dê
algo que traga cor e esperança para minha vida, apenas para arrancar logo
em seguida. Porque eu não tenho mais forças. Se me tirar ela e minhas
filhas, não vai me restar mais nada, Deus.
Deixo meus cotovelos se apoiarem à cama, ao lado do seu corpo,
segurando sua mão entre as minhas. Me sinto fraco, impotente, pequeno
como uma criança que busca por colo. Sinto as lágrimas ficarem mais fortes.
O choro que tranquei por quatro anos dentro de mim, depois da morte da
minha filha, rompe de dentro da minha alma. Trago sua mão entre as
minhas, para perto dos meus lábios, a beijando, fechando meus olhos,
tentando compreender o que eu fiz, o que eu pude fazer para não merecer
uma segunda chance de ser feliz, e dessa vez ao lado da mulher que eu amo e
das minhas filhas.
— Por favor, por favor...
Esmago minha boca, abaixando meu rosto, implorando para Deus
não me condenar outra vez a cair no inferno. Cristina chegou em minha vida
como um pontinho de luz de sol, que se infiltra pela fresta de uma casa velha
fechada e trancafiada há muito tempo. Me fez querer ver a luz do sol outra
vez, sentir a quentura do calor tocar minha pele, me fazer sair do breu no
qual minha vida tinha se transformado. E eu não quero voltar para lá, não
quero viver no escuro e saber que nunca mais a terei ao meu lado.
O gesto suave, um aperto leve, quase imperceptível em minha mão,
corre por minha pele como choques, descarregando uma carga elétrica de
vida em minhas veias. Ergo meu rosto e olho na direção da sua face,
encontrando o sentido da minha vida me observando, tão delicada, frágil,
arrancando batidas descompassadas do meu coração.
— Graças a Deus, você acordou! — Fecho meus olhos, sentindo a
luz voltar para mim. Me movo rapidamente, levantando da cadeira às
pressas, libertando sua mão, inclinando meu corpo sobre o dela, precisando
senti-la em meus braços.
— Mãe, você tem que sair! — Cristina fala agitada, enquanto minha
sogra volta para perto da médica, batendo mais fotos. — Oh, meu Deus,
Ariel! Tire esse celular da mão dela!
Os olhos arregalados de Cristina se expandem quando ela me encara,
enquanto tento respirar com calma. Aperto a mão dela com firmeza.
— Ariel... Ariel, você está pálido. Vai desmaiar no meio da cesárea
das nossas filhas? — Nego com a cabeça, tentando não olhar na direção da
médica, que está fazendo o parto das meninas.
— Oh, meu Pai, Cris! Elas estão vindo ao mundo... — Ergo meu
rosto, virando-o na direção da voz eufórica da minha sogra ao mesmo tempo
que Cristina.
O choro estridente se faz forte quando a médica retira a primeira bebê,
e aperto mais forte os dedos de Cristina, me encostando na lateral da cama do
quarto do hospital, sentindo meu coração parar de bater. A médica passa
minha filha para a enfermeira, que a enrola em uma manta, e logo em seguida
retira a outra.
— Elas nasceram! — sussurro, virando meu rosto para Cris, que está
com sua face chorosa toda molhada de lágrimas.
— Oh, meu Deus, elas nasceram, Ariel! — Beijo sua testa e esfrego
meu nariz no seu.
— Eu te amo, Cristina Miller. Te amo mais que tudo em minha vida.
— Uma lágrima rola pelo meu rosto, se juntando as dela, e seu sorriso se
expande em sua face.
— Obrigada por me dar o melhor presente da minha vida, Ariel. —
Sorrio para ela, beijando seus lábios.
— Não, meu amor, você foi o meu presente. Você foi a melhor coisa
que aconteceu na minha vida.
— Duas meninas saudáveis, mamãe e papai — a enfermeira fala,
alegre, fazendo com que eu me afaste de Cris, erguendo meu rosto para
minhas filhas.
— Cristo, elas são lindas... — Cristina sussurra, emocionada, assim
que a enfermeira arruma as meninas perto dela. — Oi, meus amores, eu sou a
mamãe... Aquele ali, babando em vocês, é o papai.
Meus joelhos se dobram lentamente, e fico ao lado da cama, com meu
olhar nublado pelas lágrimas, admirando cada tracinho delas. Ergo minha
mão e tapo minha boca, sentindo uma emoção imensurável me tomar, pelas
duas vidas que estão ao lado de Cristina. Estico meu braço e toco na
mãozinha lambuzada de uma delas, que chora. Sorrio, olhando para Cris.
Inclino meu corpo e deposito um beijo em seus lábios.
— Eu juro que sempre vou proteger vocês!
Cruzo meus braços em cima do peito, o estufando com orgulho,
olhando para o vidro do berçário enquanto admiro minhas filhas deitadas nos
berços, uma ao lado da outra. O sorriso bobo permanece em minha face desde
o segundo que eu saí da sala, sendo direcionado pela enfermeira a vir para cá.
Já faz quase duas horas que estou parado na frente da vidraça, encantado,
olhando minhas filhas. O som da respiração pesada ao meu lado, me faz girar
meu rosto para o desembargador, que está calado, com seus olhos presos nas
meninas. Estava tão absorto em contemplá-las, que nem notei a presença do
meu pai.
— Obrigado! — ele murmura, soltando o ar lentamente do seu peito,
mantendo seus olhos nas meninas.
— Agradeça à Cris, ela me obrigou a te avisar — respondo,
retornando minha atenção para o berçário, tendo um sorriso de orelha a
orelha a cada segundo que olho para elas.
— Obrigado mesmo assim — meu pai fala calmo, levando sua mão
ao bolso da calça, se aproximando do vidro. — Deus, elas são lindas...
— Claro que são lindas, são minhas filhas. — Dou um passo à frente,
ficando lado a lado com ele, sem conseguir desviar meus olhos delas.
— Se lembre que sua genética é a mesma que a minha, então, de
nada! — Fecho meus olhos e balanço a cabeça em negativo ao ouvir a
provocação dele.
— Você não vai me irritar hoje. Nada que falar vai conseguir me fazer
sair do sério — falo firme, tendo tanto orgulho das minhas filhas, sorrindo
com alegria para elas.
— Eu estava errado, meu filho.
Meu sorriso morre lentamente. Giro meu pescoço devagar, olhando
para meu pai, que me encara sereno.
— Não me diga que está morrendo e veio justo aqui, nessa
maternidade, querendo algum tipo de perdão, para poder fazer sua passagem
em paz...
— Não! Para seu desgosto, saiba que minha saúde está excelente.
Nunca estive me sentindo tão bem como agora.
Arqueio minha sobrancelha, estudando a velha raposa astuta e
ardilosa que é o desembargador.
— Está emocionado ou está passando por algum tipo de menopausa
da terceira idade? Porque, realmente, não me recordo quando foi a última vez
que você me chamou de filho, desembargador.
— Você tinha dezesseis anos na última vez que me chamou de pai —
ele me responde baixo, balançando a cabeça para os lados. — Me recordo
disso até hoje, foi quando você partiu para o reformatório.
— Eu não parti, você me obrigou a ir embora e me fez me referir a
você com títulos jurídicos.
— Achei que seria o melhor para você, Ariel. Eu sabia do seu
potencial, sabia que precisava passar por aquilo para se tornar homem.
Fecho meus olhos e nego com a cabeça, esmagando minha boca.
— Eu tinha dezesseis anos, era um garoto que estava aprendendo a
lidar com a vida. Um erro, eu cometi a porcaria de um maldito erro, e você
me sentenciou a seis meses em um reformatório! Você não deixou nem a
minha mãe ir me visitar...
— Mas eu fiz aquilo pensando ser o melhor para você. Você
precisava saber que toda ação tinha uma consequência.
— Oh, não vem com essa! Eu cometi um erro que qualquer
adolescente comete. Eu precisava do meu pai ao meu lado, e não da porra do
juiz Miller me sentenciando.
Quero gritar com ele, chutar seu rabo para bem longe de mim. Eu era
um adolescente besta, tinha pego seu carro às escondidas e ido para um show
em outra cidade. Quando estava voltando, fui parado em uma blitz. Meu pai
tinha dado queixa de roubo do seu veículo, mesmo sabendo que tinha sido eu
a pegar a merda do carro.
— Eu sempre fui o seu pai. Até naquele momento, quando bati o
martelo, eu estava ali, na sua frente, como o seu pai.
— Não, quem estava lá era o juiz Miller. E você, no fundo, realmente
desejava que eu fosse aquele merda inútil que você sempre me julgou ser,
mas você estava errado, eu criei minha vida sozinho, fiz meu nome indo para
bem longe de você. E pode até achar que eu sou um inútil por não ter
conseguido cuidar da minha própria família, por não ter protegido a minha
filha...
Viro meu rosto para o berçário, respirando fundo, sentindo toda raiva
partir assim que as vejo.
— Eu vou protegê-las, vou amar aquela mulher cada dia da minha
vida, e nada do que você pensa sobre mim vai me fazer fracassar.
— Eu sei, e eu tenho muito orgulho de você por isso. Tenho orgulho
do homem que você se transformou, do esposo que é, sinto orgulho do pai
que você foi para Dolly e do pai que você será para as minhas duas netas. Por
isso, volto a dizer, eu estava completamente errado.
Ouço sua voz ficar baixa, com a longa respiração dele sendo solta.
Meu pai e eu somos fluentes com as palavras, em conversações, diálogos,
palestras e argumentos, menos quando temos que nos comunicar entre nós
dois.
— Eu errei por ter sido duro com você. Errei ao sempre exigir o
máximo de você, até isso lhe transformar em uma cópia minha, e me odiei
por ter lhe afastado de mim. — Sua voz falha e ele respira fundo, soltando o
ar lentamente. — E a única coisa que posso dizer é que sou grato por você ser
muito melhor do que eu. Será um bom marido, um excelente pai, muito
melhor do eu fui para você, e muito melhor do que o meu pai foi para mim.
Você é o maior orgulho da minha vida, Ariel.
Viro meu rosto e olho para ele, enxergando o sorriso em sua face
enrugada enquanto admira suas netas.
— Elas vão gostar de ter você na vida delas — murmuro para ele.
Meu pai ergue seu braço e bate em meu ombro.
— E eu vou amar estar na vida delas e na sua. — Ele sorri, falando
baixo. — Elas se parecem comigo. — Ele vira sua face para mim, me dando
uma piscada.
— Não exagera, pai — o respondo debochado, ouvindo a gargalhada
alta que ele solta.
Meu pai me puxa para um abraço, dando leves tapinhas em minhas
costas.
— Parabéns, meu filho!
— Obrigado, pai. — Correspondo ao seu abraço, o apertando forte.
Me afasto dele e balanço minha cabeça em positivo, sorrindo para o velho,
nos virando de frente para as meninas.
— Já sabem quais serão os nomes delas?
— Já. — Sorrio, erguendo meu dedo e apontando para a esquerda. —
Aquela é Merediti. — Desvio meu dedo para a direita, olhando para ele. — E
essa é a Sofia. — Cris e eu passamos os últimos meses da gestação decidindo
quais seriam os nomes das meninas, e amamos Merediti e Sofia.
Meu pai respira fundo, ficando em silêncio, olhando para elas.

— Eu nunca vou cansar de lhe agradecer.


Giro meu rosto e desvio meus olhos das minhas filhas, que estão
adormecidas, cada uma amparada por um dos braços de Cristina, comigo
sentado ao seu lado na cama da maternidade, admirando minhas meninas.
— Sobre o quê? — sussurro para ela, esticando minha mão e alisando
sua face tranquila.
— Por ter me dado os melhores presentes de aniversário de toda
minha vida, doutor Miller — Cris murmura, sorrindo, virando sua face e
dando um beijo em minha mão, que alisa sua bochecha. — Por ter entrado
em minha vida.
Inclino meu pescoço e me aproximo do seu rosto, deixando nossos
olhos na mesma altura.
— Você que foi o meu presente, Cris. Um dos melhores presentes que
eu recebi em minha vida, babá McPhee. — Dou um beijo em seus lábios,
sorrindo ao ouvir os sons manhosos das pequenas em seus braços. Me afasto
dela e volto para a minha posição ereta, sentado ao seu lado, esticando meu
braço por cima do seu ombro e alisando a pequena cabecinha de Merediti.
Cris suspira, recosta sua cabeça em meu peito e segura o dedinho de
Sofia, que corresponde e aperta firme o polegar da mãe. Sorrio para minhas
meninas, sentindo uma paz que há muito tempo eu não sentia. Minhas três
chances de ser feliz: Cristina, Merediti e Sofia. Tive que ir do céu ao inferno
para, enfim, poder ter minha paz ao lado delas.
— Eu amo vocês, amo muito todas vocês. — Beijo a cabeça de Cris,
respirando com força, tendo o que mais importa em minha vida junto comigo.
— A gente também te ama muito, Ariel.
Agradecimentos

Muito obrigada à Cristina e Ariel, que me deram a honra de poder


contar suas histórias, que são tão comoventes quanto apaixonantes. Obrigada
a todas as noites em claro, a cada segundo que eles tagarelavam dentro da
minha cabeça, não silenciando até o último ponto final.
Obrigada a todas as colaboradas que ajudaram a enriquecer essa obra,
minhas revisoras e capista. Obrigada às minhas meninas, que amo de paixão
e que sempre estão ao meu lado: Halana Oliveira e Janaina da Silva.
Meu muitíssimo obrigada eterno para minha doçura de pessoa, Val
Gonçalves, a qual não me canso de agradecer.
E obrigada a você, maravilhoso leitor, por se permitir embarcar nessa
história!
Outras obras:
Primeira série:

KATORZE - LIVRO 1
PAOLO A RENDIÇÃO DO MONSTRO - LIVRO 2
PAOLO O DESPERTAR DO MONSTRO - LIVRO 3

ATENÇÃO: contém cenas eróticas e gatilhos que podem gerar desconforto. não indicado
para menores de 18 anos.

Quando um pesadelo deixa marcas. Quando em um dos piores momentos,


nasce uma luz para guia-la. Quando ela se apaixona por seu algoz e finalmente
tudo está na mesa, o desejo carnal e selvagem se revelam. Mas a ferida agora,
está aberta.
Vocês irão odiá-lo, cobiçá-lo e até mesmo deseja-lo. Conheçam Daario Ávila e
embarquem em uma aventura na Espanha, regada de erotismo e reviravoltas
de tirar o fôlego. Será que o príncipe encantado, pode se tornar um pesadelo?

Criado como um animal de estimação desde criança, entre a sarjeta e os


abatedouros da fazenda Ávila, Paolo se tornou o cão de ataque perfeito de
Joaquim Ávila, um animal feroz, sem remorso, sem empatia. Moldado pela dor
e degradação, é uma alma condenada e vazia, que sente gosto de liberdade
quando sua coleira invisível é quebrada. O destino, contudo, o leva, entre a
vida e a morte, pelas as águas turbulentas do rio, até os cuidados da pequena
Yara.
Em um ímpeto de desespero pela morte que o chama em seu leito, Yara
faz de tudo para salvá-lo, até o que não deve. A pequena boneca solitária só
não sabia que quem ela salvava não era apenas um forasteiro com faces
tristes, mas sim um monstro que traz em seus olhos tanta morte quanto o cano
do seu .38.
Yara entende de monstros. Teve seu caminho cruzado por um, que a
deixou marcada para sempre. Mas ali, diante da face do mal encarnada entre
os olhos marrons daquele forasteiro, que traz uma dor tão antiga, não é medo
que sente, mas sim sua luz, que se liga à escuridão dele.

Tudo nessa vida tem um preço, e Yara sabia disso quando salvou a vida
do monstro que entrou em seu caminho. Tendo que escolher entre o homem
que amava e os frutos dessa paixão que cresciam em seu ventre, partiu,
deixando-o sem olhar para trás. O que ela não sabia é que sua magia deixou
rastros, e agora algo muito pior vêm atrás dela.
Seu mundo desaba quando suas filhas são levadas por um mal maior, e
o destino brinca com a pequena bruxa, colocando-a frente a frente com o
homem que tanto assombrou suas lembranças por longos anos.
O monstro se perde assim que seus olhos pousam na pequena mulher
solitária que vê em seus sonhos, e que agora está em carne e osso na sua
frente. Algo dentro de Paolo desperta, puxando-o para ela cada vez mais, sem
entender o que os liga.
O Cão e a Bruxa estão de volta em mais uma batalha.
Yara lutará com toda sua força para ter suas filhas de volta. No meio da
sua jornada, precisará mostrar ao monstro o poder e a força da magia do amor,
e encarar a ira de cinco anos longe dos olhos tão sombrios quanto o portão do
inferno.
Poderá o cão de caça perdoar a bruxa que o jogou no limbo por cinco
anos, sem despertar o monstro que habita nele?
Um inimigo antigo uniu os irmãos Ávilas em uma derradeira vingança. Daario e
Paolo juntos, lado a lado, abriram as comportas do inferno, trazendo carnificina e sangue
para aqueles que machucaram suas famílias.
A cada percurso da caçada, em uma busca cruel e implacável pelas suas mulheres,
os monstros estavam famintos por morte e justiça, fazendo aliados poderosos e alianças
inquebráveis, deixando um rastro de corpos por onde passavam.
A pequena bruxa Yara encontrou forças para lutar pela sua sobrevivência e do seu
filho quando a destemida pantera Katorze cruzou seu caminho de uma forma inesperada.
As duas mulheres traziam fé em seus corações de que seus monstros iriam libertá-las,
afinal nem todo predador é fatal, mas todos os monstros Ávilas criados pelo cruel Joaquim
são assassinos.
História e conto Irmãos Falcon
Recomendando para maiores de 18 anos
Este livro contém descrição de sexo explícito e palavrões

Doty só queria uma coisa: achar o miserável que engravidou Tifany e chutar seu rabo até
Dallas.
A única coisa que Joe queria era dobrar o demônio de olhos negros que o tirou do sério,
fazê-la pagar por sua língua afiada e boca suja.
Uma proposta!
Sete dias!
E tudo foi para os ares!

Bem-vindo à Arena

Billi tinha traçado seu destino, já não era mais o menino delinquente, tinha se transformado
em um homem, foi atrás do seu sonho e criou seu mundo em cada touro que montou aos 32
anos.
Arena Ranger lhe trazia apenas um desejo, o grande touro Asteroide 8 segundo que valeria
sua carreira, mas o pequeno cometa que cruzou seu caminho. Fez o Cowboy mudar seus
planos.
Únicos

ATENÇÃO: CONTÉM CENAS ERÓTICAS E GATILHOS que podem gerar desconforto.


NÃO INDICADO PARA MENORES DE 18 ANOS.
Se me perguntarem se já era amor desde o início, garanto-lhe
com as minhas palavras salgadas pelas lágrimas que sim. Eu já o
amava antes do princípio, assim como no meio e fim. Nosso amor
mórbido e louco nos unia em nossa agonia chamada vida.
Se existia um inferno, eu iria para lá por ele, pois onde mais
dois pecadores poderiam descansar suas almas negras manchadas
pelos pecados da carne? E então, eu fui. Joguei-me de cabeça em seu
mundo. Conforme trazia Ben para mais perto de mim a cada sonho, a
cada parte dele que eu salvava, uma parte minha ficava presa em
seu labirinto. Em meu peito, onde batia um coração de uma menina
apaixonada, não importava em quantos pedaços eu teria que destruir
minha alma para salvá-lo, pois a loucura que o habitava era a mesma
que tinha morada fixa em meu coração.
Lizandra, essa sou eu, ou a sombra de quem eu fui um dia.

ATENÇÃO: CONTÉM CENAS DE SEXO E LINGUAJAR INAPROPRIADO PARA


MENORES DE 18 ANOS
Zelda estava preparada para tudo em sua vida: uma híbrida latino Afro-Americana com
sangue quente que desejava apenas ter uma chance para mostrar que não veio ao mundo
para brincar. Queria um lugar ao sol entre as indústrias de construção civil. O que ela não
imaginava, no entanto, ao aceitar o estágio na Indústrias Ozbornes, era que, junto com a
porta do seus sonhos ao mundo do negócios, também se abriria a porta dos desejos e
fantasias quente como o inferno: seus dois chefões em ascensão.
Quatro mulheres desesperadas por apenas uma noite de folga e por um segundo de
descanso ganham, misteriosamente, um sorteio relâmpago de rádio, que tem como prêmio
uma estadia nas suítes luxuosas do novo hotel da pacata cidade.
Cada uma tem sua história e seus segredos, mas todas trazem uma coisa em comum:
desejos reprimidos.
O Dia das Bruxas nunca mais será o mesmo para elas.
Não deixem de perder essa deliciosa noite de Halloween, principalmente se for uma
menina malvada.

Handrey, junto com seu irmão Jonny, participava ativamente de um grupo de


neonazistas violentos, pregando a supremacia branca. Seu destino mudou ao encontrar o
corpo do seu irmão junto a um homem negro dentro do seu apartamento, ambos sem vida.
Ele nutriu apenas ódio e autodestruição por catorze anos, jogado dentro da penitenciária
federal, almejando apenas uma chance de descobrir quem era o verdadeiro assassino do seu
irmão. Sua chance veio acompanhada de um pro bono misterioso, que lhe deu sua liberdade
provisória.
O homem passou a ver as coisas de uma maneira diferente ao se deparar com Eme,
uma stripper negra que o levou a questionar uma doutrina de uma vida inteira. Ele já não se
sentia mais à vontade com o grupo neonazista.
Quando corpos mutilados de mulheres negras e imigrantes começaram a aparecer
pelas ruelas do porto, assombrando todas as garotas de programa ao descobrirem que tinha
um assassino em série que matava por esporte, Handrey percebeu que mais alguma coisa
tinha escapado junto com ele do esgoto imundo que era seu passado.

Dylan Ozborne sabia que a pior época da sua vida era dezembro. Ainda não
acreditava que seu irmão havia o obrigado a ser o Papai Noel para o evento beneficente.
Elly poderia ter sido a boa menina o ano inteiro, mas deixou para ser a menina má
justamente três dias antes do Natal, indignada com o nada bonzinho e muito menos
velhinho Noel. Então resolveu se vingar do tirano e por fim lhe dar uma lição que nenhum

Sedrico Lycaios, mais conhecido pelas noites quentes regadas às promiscuidades de


Chicago, como uma divindade do prazer, é proprietário do clube peculiar, nada ortodoxo e,
sim, envolvente e pecaminoso: a Odisseia, onde proporciona todas as experiências
desejadas por seus clientes, para aplacar seus prazeres mais obscuros. Mas, como todo
semideus, Dom Lycaios tem sua fraqueza, e é entre as paredes do seu templo da perdição
que se vê sendo fisgado pela doce inocência de Luna, a dançarina exótica, tão silenciosa e
misteriosa, que o prende a cada movimento do corpo dela. Uma perfeita sugar baby, que
desperta o interesse do sugar daddy que ele traz aprisionado no canto mais obscuro do seu
ser. Luna não tem chances para escapar das manobras do implacável homem, que a envolve
em suas teias de aranha. Afinal, o prazer sempre fora o maior império de Sedrico.

Um amor além do tempo, do universo, do grande desconhecido. E se nada fosse o que


realmente é? E se entre seu mundo tivesse outro, onde magia e realidade se chocassem?
Onde uma maldição foi imposta, obrigando um príncipe do submundo a enxergar com
outros olhos a raça que ele julgava a mais inferior de todas. Onde fosse condenado a vagar
por eras e eras em busca de uma estrela solitária.
E se nada fosse o que é?
Maria Eloiza estava acostumada com a batalha diária que a lavoura tinha e com o
esforço sobre-humano que seu trabalho lhe trazia. Seguia batalhando mais uma vez, atrás
de outra usina, dando graças a Deus quando essa apareceu, mas nunca imaginou que o
canavial lhe traria mais do que já estava acostumada a ter, até se perder nos olhos mais
verdes que as plantações de cana.
Pedro Raia trazia o legado de sua família junto com ele. Mesmo renunciando aos
sonhos que tinha, aceitou voltar para casa quando foi convocado, cuidando de perto de cada
um que entrava em suas terras, pois nunca foi de ficar dentro de quatro paredes. Sua paixão
pela terra era antiga, desde menino trabalhava na lavoura. Gostava da terra em suas mãos,
sabendo que era dali que vinha toda sua essência. Mas sua vida mudou quando, entre mais
uma remessa de boias-frias, a pequena cabocla, com olhos assustados, lhe mostrou o mais
puro brilho de sua alma. Dois mundos, que andavam entre linhas finas, se chocaram. A
realidade de um contra a vida do outro.
A vida sempre foi puxada para Maria Rita, fazendo-a se tornar o alicerce da sua
casa e a moldando para ser a presença materna e paterna para suas irmãs. Não é de riso
fácil, e muito menos de ser dobrada por homem, mas algo muda em sua vida quando seus
olhos se cruzam com o peão chucro, Zeca Morais. Ele fará de tudo para laçar a mulher
endiabrada, que faz seu coração disparar. Um amor nasce sem freios entre os dois em meio
aos cafezais. E juntos terão que enfrentar um grande inimigo, que fará de tudo para acabar
com a vida de Zeca Morais.

Yane Rinna tem sua vida mudada da água para o vinho quando se torna testemunha
principal de um assassinato. Ela se vê obrigada a entrar em um disfarce para garantir sua
segurança até o dia do julgamento. E de uma stripper desastrada, inteiramente azarada, se
torna uma freira monitora de quatro adolescentes rebeldes. O que ela não imagina é que no
último lugar que poderia sonhar, o amor e o desejo puro estarão no ar. Dener Murati, o
vizinho aristocrata do convento, tem seu autocontrole testado por uma fajuta freira sexy,
nada santa, que invade sua residência para se refrescar na calada da noite, pelada, em sua
piscina. A pequena feiticeira que o encanta vai virar sua vida meticulosamente organizada
de cabeça para baixo.

[1] O crime do “colarinho branco” encontra-se relacionado a fraudes, uso de informações


privilegiadas, subornos e outras atividades praticadas principalmente por pessoas instruídas
culturalmente e financeiramente, e que, muitas vezes, detêm de cargos políticos ou
possuem influência no governo. O termo “colarinho branco” possui essa designação por
fazer referência às pessoas instruídas e influentes que geralmente vestem terno e camisa
social, dessa forma, uma caracterização atípica do que geralmente se tem de um criminoso.
[2] O Mai Tai é um coquetel à base de rum, licor de curaçao, xarope de orgeate e suco de
limão. É um dos coquetéis quintessencial da cultura Tiki.
[3] Uma pessoa que só faz o que quer, sem se preocupar com a opinião dos outros.
[4] Sanduíche de uma rede de lanchonetes.
[5] Uma rede de lanchonete, que vende lanches por comprimentos.
[6] É uma condição na qual uma pessoa está excessivamente e indevidamente preocupada
em ter uma doença grave.
[7] A ninfomania, também chamada de desejo sexual hiperativo, é um transtorno
psiquiátrico caracterizado pelo excesso de apetite sexual ou desejo compulsivo por sexo.
[8] Chamado primeiramente de "contrologia", o pilates é um tipo de atividade física que
busca o controle dos músculos do corpo, fortalecendo a musculatura e melhorando seu
tônus, além de conferir maior flexibilidade ao corpo.
[9] É uma medida, um número que expressa a capacidade intelectual de um indivíduo com
base em critérios de referência e comparações, estabelecendo uma relação entre sua idade
mental e cronológica.
[10] Nanny McPhee é um filme de 2005 baseado na personagem Nurse Matilda, de
Christianna Brand.
[11] Victoria's Secret (em português: "Segredo de Victoria") é uma marca de lingerie e
produtos de beleza fundada em 1977 por Roy Raymond.
[12] É um personagem de ficção da literatura britânica criado pelo médico e escritor Sir
Arthur Conan Doyle. Holmes é um investigador do final do século XIX e início do século
XX.
[13] Réu Primário é o termo utilizado no direito penal para determinar os acusados que
nunca foram sentenciados anteriormente.
[14] Registro de entrada.
[15] É uma medida jurídica para proteger indivíduos que estão tendo sua liberdade
infringida, é um direito do cidadão.
[16] Ou treinador pessoal, é um profissional da área de Educação Física que atua com seus
clientes de forma individualizada, elaborando e supervisionando treinamentos físicos
específicos para cada um.
[17] O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é um distúrbio de ansiedade que se
manifesta em decorrência de o portador ter sofridos experiências de atos violentos ou de
situações traumáticas.
[18] É uma marca italiana de moda, considerada um símbolo de luxo e status. Foi fundada
em 1913 por Mario Prada. É especializada em bolsas de couro, acessórios de viagem,
sapatos, perfumes e outros acessórios.
[19] Significa o modo de agir e, no mundo jurídico, é a expressão utilizada para
caracterizar a forma peculiar que um criminoso (ou vários) tem de agir.
[20] É um exame que avalia a mucosa do intestino grosso, sendo especialmente indicado
para identificar a presença de pólipos, câncer intestinal ou outros tipos de alterações no
intestino, como colite, varizes ou doença diverticular.
[21] Recursos humanos.
[22] Rolex S.A. é uma empresa suíça fabricante de relógios de pulso e acessórios com
sede em Genebra, fundada em 1905 por um alemão, Hans Wilsdorf. É considerada por
muitos como um símbolo de status social.
[23] Relativo ao comércio feito por atacado ou o que compra em grandes quantidades os
artigos de sua especialidade e os revende igualmente por lotes aos comerciantes do varejo
(diz-se comerciante). Aqui ele quis dizer que o vinho é barato e de qualidade ruim.
[24] Atenuante é aquilo que torna menos grave, mais tênue.
[25] É um ator, produtor de cinema e artista marcial norte-americano.
[26] Blade é um filme de terror norte-americano de 1998, dirigido por Stephen Norrington
e escrito por David S. Goyer. Baseado no super-herói da Marvel Comics de mesmo nome,
é a primeira parte da série Blade.
[27] O termo significa “acertar alguém na cabeça”. Para um jogador de FPS, fazer um
headshot é como marcar um gol na gaveta.
[28] O termo emprestado da computação, descreve um erro do próprio jogo. Um
personagem ficando preso em uma parede, por exemplo.
[29] Jogador.
[30] Dar match. Match é uma palavra em inglês que pode significar “combinação”, então a
expressão “dar match” seria o mesmo que combinar, formar um bom par com alguém.
[31] Gloria.
[32] Uma premiada cantora, compositora, atriz, produtora, supermodelo e empresária
norte-americana. É considerada pela crítica musical como a melhor cantora de todos os
tempos.
[33] Quando o sexo oral é executado, são a base do corpo do pênis e os testículos que
recebem estímulos pela fricção com os seios, sendo a glande estimulada pela boca. Essa
prática é também conhecida como "espanhola" em países como Itália, França, Portugal e
Brasil.
[34] Jack, o Estripador (em inglês: Jack the Ripper) é o pseudônimo mais conhecido para
designar um famoso assassino em série não identificado que atuou na periferia de
Whitechapel, distrito de Londres, e arredores em 1888.

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