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Entre permanências e transformações da cidade contemporânea:

confrontação entre Aldo Rossi e Rem Koolhaas


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Carolliny Domingos Sales (IC), Sandra Catharinne Pantaleão Resende (PQ), João Vitor Moura
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de Queiroz (IC).
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carollinydomingos@hotmail.com
Universidade Estadual de Goiás (UEG)

Neste trabalho discutem-se as publicações de Aldo Rossi e Rem Koolhaas, devido à reverberação de
suas ideias para a revisão crítica da arquitetura e do urbanismo na segunda metade do século
passado. Busca-se comparar o pensamento desses autores, a compreensão da produção
arquitetônica e as estratégias de intervenção urbana dos últimos quarenta anos. São apresentadas as
convergências e divergências entre eles, ressaltando as posturas assumidas frente à preservação do
patrimônio europeu e as mudanças provocadas pelos interesses do capital financeiro. Elegeu-se,
como objeto de reflexão as publicações: L’architettura della città de Aldo Rossi (2001) e Delirious New
York, de Rem Koolhaas (2008) a fim de identificar as percepções deles quanto à análise da forma
urbana. Rossi está vinculado às posturas historicistas da arquitetura frente ao “funcionalismo
ingênuo”, em que aponta as relações entre cidade histórica e memória coletiva, oferecendo um
método de análise da cidade sobre a qual deseja-se intervir. Já Rem Koolhaas, desloca-se do
arcabouço histórico europeu para “desbravar” a metrópole moderna, representada por Nova York
entre fins do século XIX até os anos 1940. Das transformações urbanas, Koolhaas, ainda que não
fosse seu objetivo, propõe possibilidades de análise, reunindo elementos capazes de descrever as
modernizações das cidades.

Aldo Rossi. Rem Koolhaas. Intervenção Urbana. Cidade histórica. Modernização. Forma urbana.

Introdução

Aldo Rossi e Rem Koolhaas são importantes vozes no panorama de revisão


crítica do Movimento Moderno, tendo a cidade como objeto de estudo e reflexão.
Esta pesquisa aborda, em específico, suas posturas críticas à medida que lançaram
novos olhares sobre a cidade construída e aquelas em vias de transformação.
Desde meados dos anos 1960, diversas posturas passaram a questionar as
posições de teorias prescritivas e normativas, respaldadas pela visão positivista e
apoiadas pelos ideais iluministas, propagadas pelos Congressos Internacionais de
Arquitetura Moderna (CIAMs). Dentre os vários questionamentos, emergiu com
maior representatividade o estudo da estrutura urbana, inicialmente influenciados
pelo estruturalismo. Ao longo dos anos 1960-1980 prevaleceu a visão de Aldo Rossi,
tendo em vista a memória coletiva e a forma urbana, como elementos necessários
para a definição de estratégias de projetação. Por outro lado, à medida que está
abordagem perdeu força, outras vozes destacaram-se, principalmente ao longo dos
anos 1980.
Conforme Retto Junior (2008), Aldo Rossi buscou estabelecer um método de
análise e leitura da cidade pela inter-relação entre arquitetura e cidade o que
permitiu-lhe formular uma espécie de tratado, despertando a consciência de que a
cidade analisada coincide com o lócus da arquitetura e da atuação prática. Vàzquez
(2004) complementa que sua proposta renovou os métodos de análise urbana, além
de reconhecer a importância dos tecidos urbanos consolidados.
No final dos anos 1970, Rem Koolhaas, na contramão dessa postura teórica,
lançou um novo olhar sobre as premissas da cidade moderna ao descrever e
interpretar as transformações da ilha de Manhattan na virada do século XIX para o
XX, visando demonstrar que a transformação morfológica no Novo Mundo era, de
fato, a manifestação da modernidade.
Em suas publicações Rem Koolhaas indica outras possibilidades de análise e
leitura das cidades pelo viés das modernizações e reestruturações que as cidades
sofreram, além de compreender a estrutura formal, analisar as questões sócio-
tecnológicas e econômicas que incidem sobre a morfologia urbana. Significa que
lança outras possibilidades de interpretação das cidades, sem contudo, engajar-se
em uma postura ideológica precisa. Aproxima-se de uma visão jornalística ao relatar
o impacto de determinados fatos sobre a forma urbana.
Apesar de antagônicos, podem ser apontadas aproximações entre os autores,
iniciado pelo posicionamento frente aos fatos urbanos. Para Rossi era importante
resguardar as características morfológicas da cidade histórica, reconhecer os
arquétipos por meio do método tipológico associado à preservação de suas formas
urbanas, considerando possibilidades de novos usos. Não obstante, Koolhaas, numa
abordagem menos ortodoxa, buscava identificar os fatores de transformação da
cidade, tendo como principal impulso as dinâmicas econômicas e as inovações
tecnológicas, por meio do levantamento de campo e a sistematização dos dados
coletados. Pode afirmar que ambos buscavam identificar as relações entre
arquitetura e cidade mas com objetivos diferentes: Rossi estabeleceu-a por meio da
memória coletiva; Koolhaas ressaltou a inversão de escalas.
Se de um lado a postura de Rossi contribuiu para alavancar a onda
preservacionista, a postura de Koolhaas ressaltou a desestabilização da forma
urbana mediante a própria modernidade. A aproximação desses arquitetos ocorre
pela leitura da cidade existente, negando a visão utópica do movimento moderno
quanto à construção de cidades ex-nihilo, estabelecendo possibilidades de leitura e
análise da cidade. Essa tornou-se uma estratégia recorrente para as intervenções
urbanas posteriores aos anos 1990, tendo em vista a coleta de dados e
reconhecimento dos aspectos que envolvem a configuração urbana, mesmo que as
divergências teóricas e ideológicas fossem muito distintas.
A presente pesquisa pontua as ideias de Aldo Rossi (1966) e de Rem
Koolhaas (1978), destacando suas interpretações quanto à morfologia das cidades e
à caracterização dos elementos de estruturação urbana. Pretende-se avaliar a
contribuição destes teóricos para o campo disciplinar da arquitetura e urbanismo
assim como verificar possíveis aproximações na fala de cada um deles.
Toma-se como ponto de partida, para esta pesquisa, a formulação de
tipos – elementos característicos das cidades sob o enfoque da história em Aldo
Rossi e sob o enfoque da destruição criativa em Rem Koolhaas.
Material e Métodos

Desenvolveu-se a leitura crítica das publicações selecionais, visando avaliar


as convergências e divergências entre os autores, em que tomam a cidade como
objeto de estudo. Considerou-se como cada autor desenvolveu critérios para
analisar, compreender e interpretar a cidade mediante suas permanências e
transformações. Em complementação, outras referências auxiliaram para aprofundar
as ideias e os métodos de projetação dos referidos autores. Entre elas, destacam-
se: “Inquietação Teórica e Estratégia Projetual" (MONEO, 2008) e “A Condição
Urbana Contemporânea na Perspectiva de Rem Koolhaas” (PANTALEÃO, 2016).
Estas publicações foram essenciais para melhor compreensão da inserção das
ideias de Rossi e Koolhaas no campo disciplinar e suas contribuições. Essas leituras
foram fundamentais para a realização de analogias entre eles.
Também identificou-se as abordagens tratadas em cada uma das
publicações o que permitiu assinalar as convergências e divergências entre os
autores. Rossi vê a cidade como objeto de estudo. Ao falar de arquitetura, ele não a
vê apenas como imagem, ou conjunto, mais sim como construção, a construção da
cidade no tempo; Koolhaas apresenta especulações imagéticas acerca das
transformações da cidade, num jogo de termos e conceitos metafóricos que
representam o real, exaltando uma perspectiva menos lógica daquela proposta por
Rossi.
Resultados e Discussão

A partir das leituras, foram elaboradas resenhas críticas e considerações


sobre essas publicações, caracterizando a postura de cada um dos autores, além de
visualizar as convergências e divergências. Esta divergência de pensamentos é
fundada pelo fato da realidade em que cada autor vivenciou: Aldo Rossi é italiano de
nascença, cercado pela história, o que lhe possibilitou a leitura da forma urbana
tradicional e sedimentada, desencadeando uma onda preservacionista de forte apelo
à história. Já Rem Koolhaas, apesar de ser holandês, foi influenciado pela dinâmica
da vida norte-americana, devido aos estudos na Universidade de Cornell e também
no Institute for Architecture and Urban Studies (IAUS), sediados em Nova York.
Koolhaas percebeu que em território americano as relações de tradição, memória e
identidade são menos frequentes permitindo a aplicação da “destruição criativa”, e a
revisão e ampliação dos ideários modernistas. Ao mesmo tempo, a combinação com
interesses econômicos levou-o a definir a cidade como culture of congestion:
adensamento e intensificação da vida urbana à medida que novas atividades
poderiam ser oferecidas, principalmente aquelas vinculadas ao entretenimento.
Devido ao contexto sócio-histórico, os dois arquitetos assumiram posturas
bem diferentes nas análises desenvolvidas sobre a alteração da estrutura edificada
na cidade. Rossi contribuiu para o desencadeamento de uma postura
preservacionista, ao contrário de Koolhaas, que ressaltou as transformações
urbanas a partir da ideia da destruição criativa corroborando para a reestruturação
econômica, inicialmente em Nova York.
As divergências também ocorreram pela época de formação de ambos os
arquitetos. Aldo Rossi iniciou sua carreira logo após a crise de ideais que se
desenvolveram nos últimos Congresso Internacional de Arquitetura Moderna
(CIAM’s), sendo influenciado pela postura historicista de Ernesto Rogers. Já Rem
Koolhaas foi influenciado pelo movimento tardo-modernista e pelo interesse em
relatar os fatos históricos que contribuíram para transformações das cidades.
A discussão de como reconstruir a Europa e a crise disciplinar dentro da
arquitetura levou Rossi a considerar o construído como objeto de análise com
ênfase ao reconhecimento dos arquétipos urbanos, levando-o a propor o método
tipológico como estratégia de intervenção às cidades históricas. Rossi acabou por
instituir uma narrativa das possibilidades de transitar entre a análise e os fatos
(MONEO, 2008), tendo em vista os dilemas de significado que a forma urbana
possibilitaria em confrontação ao “funcionalismo ingênuo”. Seus estudos estavam
apoiados no estruturalismo, reconsiderados pelo próprio arquiteto, abandonando em
certa medida, o caráter científico e aproximando-se de uma visão mais subjetiva.
Os últimos trabalhos de Rossi não são tanto o reflexo do construído, mas das
imagens. Se no início da sua carreira a construção era uma metáfora que lhe
permitia entender a cidade e a arquitetura, no começo de 1990 ele já nos
acostumara a ver o mundo como imagens. O que havia em sua arquitetura eram
imagens regidas pelo sentimento. (MONEO, 2008, p. 133)
Mas não podemos negar a repercussão do seu trabalho, principalmente
nas décadas de 1960-70, que serviu de inspiração para as novas gerações de
arquitetos e suas contribuições para as propostas de intervenção na cidade pré-
existente e a instituição da arquitetura como disciplina. Segundo Pantaleão (2016):
A proposta de Aldo Rossi foi importante para a renovação dos métodos de
leitura e análise das cidades, conferindo-lhe, como reporta Vázquez (2004),
uma continuidade aos discursos culturalistas (CHOAY, 1965) e foi bastante
disseminada ao longo dos anos de 1970 e 1980 como estratégias de
intervenção, principalmente em áreas preexistentes e em tecidos urbanos
consolidados (PANTALEÃO, 2016, p. 123).
Rossi tinha plena noção das alterações que estavam acontecendo. Apesar de
suas intensivas críticas à especulação da cidade e do patrimônio pré-existente, ele
percebeu a interferência brusca do capitalismo e da ação imobiliária, ameaçando a
forma urbana de longa duração histórica.
Ao mesmo tempo em que surgem na década de 1960 grupos de arquitetos
voltados ao historicismo, outros arquitetos assumiram posições antagônicas adeptos
às mudanças advindas do capitalismo e do uso da tecnologia (PANTALEÃO, 2016),
repercutindo em diferentes formulações teóricas, entre elas o tardo-modernismo ou
high-tech e o debate holandês como neovanguarda (MONTANER, 2007).
Entre os arquitetos filiados a essa postura, tem-se Rem Koolhaas, formado no
final dos anos 1970, inserido no contexto de globalização e capitalismo tardio. Entre
seus interesses, destaca-se caracterizar a essência da cidade moderna, sendo Nova
York objeto para que possa relatar o verdadeiro progresso. Segundo Moneo (2008):
[...] Nova York é uma é uma cidade moderna por excelência, construída
simplesmente sob a pressão da economia e submetida às forças de um
capitalismo desenfreado. Koolhaas se impõe a tarefa de exibir quais são os
resultados formais quando perdemos o respeito pelas linguagens e formas
convencionais e atendemos apenas as forças autênticas que modelam o
mundo moderno; a tecnologia e a economia (MONEO, 2008, p.284).
Koollhaas estuda o impacto da cultura de massa na cidade de Nova York,
ressaltando a aceitação dos americanos à vida urbana atrelada à congestão e à
densidade, conceitos abominados pelos arquitetos pós-modernistas europeus. Livre
das pressões preservacionistas europeias, analisa a paisagem nova-iorquina e se
encanta com o potencial do arranha-céu (como Le Corbusier) como protagonista da
cultura de congestão, destacando-se na morfologia da cidade moderna.
A arquitetura de Koolhaas é denominada “realista” pois toma a realidade como
modelo, sendo este a própria a cidade espontânea, fruto de um desenvolvimento
não controlado – protótipo que não se produziu em nenhum lugar com tanta potência
e energia como nas cidades americanas (MONEO, 2008, p.290).
Koolhaas resiste a qualquer tentativa de reduzir a arquitetura a processos de
classificação, adepto à livre interpretação dos fatos e da vida urbana construída por
diversos aspectos entre eles a arquitetura. Segundo Moneo (2008):
Koolhaas acredita que na cidade espontânea do século XX há estrutura, e
descobri-la é o que lhe interessa. Descobrir a estrutura latente da cidade
contemporânea e aprender a utilizar os mecanismos empregados por aqueles
que a constroem parece ser o propósito de uma obra (MONEO, 2008, p.290).
Para Koolhaas, o arquiteto é o responsável por dar vida a espaços capazes
de conter programas exigidos pela vida moderna. Também deseja que sua
arquitetura seja global, não relacionada com determinadas condições de lugar. Para
Pantaleão (2016, p. 142), Koolhaas retoma as ideias de cidade vertical ao constatar
a mudança de escala e as alterações entre arquitetura e cidade, prevalecendo a
primeira sobre a segunda na conformação do espaço urbano, o que designa pelo
neologismo Manhattanism.
A partir das ideias centrais, podemos ver o embate entre os dois arquitetos.
Rossi respaldado pelas formas geométricas cheias de significado, buscando definir a
relação entre estrutura urbana e tipos, considerando os ideais marxistas e de
preservação da paisagem; E Koolhaas abordando formas e programas mais livres,
vinculados às transformações da vida moderna sem fixar-se em quaisquer posturas
ideológicas.
Aldo Rossi é preservacionista, e seu foco é manter a imagem da cidade
europeia em seu formato original, ou seja, as permanências em sua longa duração
histórica. E Koolhaas parte de dados históricos para identificar as características da
cidade em cada contexto, ressaltando as transformações da forma urbana como
requisitos inerentes à modernização das cidades.
Se para Rossi a imagem e a iconografia representavam mecanismos de
reconhecimento da morfologia urbana, para Koolhaas a imagem da cidade torna-se
uma referência midiática, isto é, um edifício desgarrado de significados
preestabelecidos e suscetíveis às dinâmicas da vida contemporânea.
Aldo Rossi defende a ideia da cidade que cresce sobre si no tempo e que, ao
longo de sua construção permanecem os motivos originais, mas simultaneamente, a
cidade torna-os mais precisos e modifica os motivos de seu desenvolvimento. Já
Rem Koolhaas afirma que a estrutura urbana é um analogon do capitalismo mais
puro, onde os arquitetos encenaram seus milagres deleitando-se numa
inconsciência involuntária: a árdua tarefa de lidar abertamente com as pretensões,
ambições e possibilidades extravagantes e megalomaníacas da metrópole.
Essas questões reforçam o objeto de estudo presente nas duas publicações:
a cidade e sua arquitetura, em que a história é ponto fundamental para ambos. No
entanto, os fatos históricos são incorporados entre eles de modo diferente. Rossi
deposita na cidade histórica existente a rede de significados que a arquitetura é
capaz de transmitir por meio de suas formas; Koolhaas busca na coleta dos dados e
fatos históricos investigar as principais características da vida urbana, abordando
aspectos de diversas naturezas que envolvem a complexidade das cidades.
Os dois arquitetos exemplificam bem a dualidade de pensamentos que
percorre até os dias atuais e geram discussões sobre a interferência nas cidades
pré-existentes na Europa, que passam obrigatoriamente sobre as transformações do
mundo globalizado. No entanto, Koolhaas amplia os limites do mundo construído,
considerando a ocupação do Novo Mundo e, mais recentemente, outras regiões do
globo que até meados dos anos 1990 estavam à margem dos estudos urbanos.
Se Rossi reforça a história ocidental ao defender a preservação das cidades e
sua morfologia repleta de significados, Koolhaas desloca sua visão para as
contribuições da modernização americana para a arquitetura e urbanismo,
demonstrando que nem sempre as regras prescritivas são capazes de abarcar a
condição metropolitana recorrente em diferentes partes do globo.
Pode-se dizer que esse novo modo de construir americano, influenciou
arquitetos modernos franceses e alemães na proposição de soluções para a Europa,
via verticalização e adensamento. A Europa havia se tornado um continente
pequeno para a quantidade de habitantes e com pouco espaço para novas
construções, devido às suas riquíssimas e abundantes construções históricas
intocáveis. Segundo Pantaleão (2016, p. 101):
[...] A influência dos arranha-céus estadunidenses foi recorrente nos alemães,
que tentavam alterar o gabarito de Berlim, conforme aponta Mumford (2002).
O interesse nos arranha-céus ocorreu tanto pelo Le Corbusier quanto em
Ludwing Hilbeseimer e, depois, foi retomado pelas propostas denominadas
por Choay e tecnotopia. A cidade vertical poderia conter a expansão
horizontal, colocando-se como imagem do progresso. [...]
Em diversos momentos de reestruturação, houve um questionamento
recorrente: como reconstruir a Europa? E no entre guerras de como lidar com a
modernização e expansão das cidades históricas; e posterior à Segunda Guerra
Mundial, como manter o patrimônio cultural edificado. E, mais recentemente, como
manter a Europa competitiva num mundo globalizado? Os desafios assinalados para
a atuação profissional dos arquitetos urbanistas mostravam-se diversas. Capturar
tais dinâmicas e buscar nessas intepretações estratégias projetuais é um dos pontos
em comum entre os autores, mesmo que cada um assumisse abordagens distintas.
A relevância de Rossi é reconhecida, mas tornou-se limitada à medida que a
expansão das cidades ocorreu, além de reconsiderações sobre a atuação em áreas
ditas não históricas. Ao longo dos anos 1970-80, passou-se a discutir também a
importância das áreas urbanizadas desde fins do século XVI ao mesmo tempo que a
Europa buscava alternativas econômicas que foram vinculadas à valorização de seu
patrimônio histórico e cultural.
As transformações do mundo contemporâneo arrefeceram a visão de Aldo
Rossi e permitiu à Koolhaas a escrever sobre a influência do capital financeiro e a
nova organização de produção de bens de consumo, principalmente pela dilatação
das áreas urbanizadas no planeta.
A Europa necessitava de uma nova mola propulsora para alavancar sua
economia. Considerou-se o turismo como estratégia de voltar a atenção do mundo
para o continente, utilizando de sua história e edificações mais memoráveis como
bens suscetíveis à atração de investimentos e público. O desafio era como
reconstruí-la, considerando a relação entre o antigo e o novo, entre a preservação
do patrimônio e as intervenções necessárias?
A França na década de 1970 começou a estudar propostas para a
conservação do seu patrimônio pré-industrial. Segundo Pantaleão (2016, p. 129), “
[...] a atenção dos arquitetos e planejadores franceses estava nas megaestruturas e
na redescoberta da escala e da tipologia das cidades tradicionais [...]”.
O foco da França residia na restruturação econômica com a intervenção na
área antiga da cidade e a expansão da área periférica, sendo necessário até a
construção de novas cidades. Por meio de concursos públicos, o país se abriu para
jovens arquitetos em prol da inovação e propagação das ideias historicistas.
Segundo Pantaleão (2016, p. 130), essa postura francesa “[...] possibilitou o
entrecruzamento de diferentes engajamentos e posturas, fomentando a atuação
profissional por meio de concursos públicos de projetos de intervenção urbana e
inserção de megaestruturas tecnológicas [...]”. A autora complementa sobre as
influências do pensamento historicista na Espanha, tendo em vista o fomento de
políticas públicas de valorização de espaços públicos. As cidades passaram a ser
vistas como mercadorias, modificando o papel da história tornando-a um recurso de
destruição criativa e dinamização do capital especulativo.
Podemos perceber que esse contexto intensifica a necessidade de dinamizar
as cidades, que ora absorvem ideias e questionamentos dos anos 1960. Apesar das
ideias preservacionistas serem ainda muito fortes na Europa, a necessidade de
adequação à complexidade da vida contemporânea altera os objetivos finais, em
que tais abordagens afastam-se de seus objetivos em prol de alavancar a economia
do velho continente por meio de obras pontuais, com objetivo de valorização de
cidades estratégicas.
Muitas dessas obras tinham como finalidade a valorização da cultura,
memoria, tradições e morfologia local (MONTANER, 2001). Mas com a falta de
recursos, o Estado acabou aliando-se ao capital privado, levando ao distanciamento
dessas práticas mais locais para propostas globalizadas e midiatizadas. À medida
que esses investimentos se tornaram bastante populares e lucrativos, passaram a
trabalhar a favor das estratégias econômicas e políticas, tendo em vista a
especulação imobiliária e a criação da imagem global das cidades.
Considerações Finais

As ideias incitadas por Rossi e Koolhaas objetivam compreender o processo


de transformação do mundo na segunda metade do século XX. Hoje podemos
perceber que seus questionamentos foram válidos, contribuindo para novas
formulações teóricas ao campo disciplinar. Buscaram, cada um à sua maneira,
identificar as características de seu tempo histórico e o impacto na forma urbana.
A globalização promoveu uma nova configuração mundial, mais complexa, ao
ponto de abraçar mais de uma perspectiva teórica. As ideias preservacionistas e de
valorização dos patrimônios histórico-cultural europeu foram substituídas por uma
política empresarial urbana, de intervenções sucumbidas às leis do mercado
imobiliário, atreladas ao capital especulativo e investimentos globais.
No entanto, apesar de essa nova configuração global ter várias ligações com
as análises de Koolhaas, as ideias de Aldo Rossi e dos Neorracionalistas não foram
deixadas de lado, sendo referências para uma arquitetura de resistência às
transformações dos últimos quarenta anos.
Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Professora Sandra Catharinne Pantaleão Resende e ao meu


colega de iniciação João Vitor Moura de Queiroz, que foram essenciais para o desenvolvimento da
Pesquisa. Agradeço também a Universidade Estadual de Goiás pela bolsa concedida através do
CNPq – bolsa de IC. UEG.

Referências

KOOLHAAS, Rem. Delirious New York. Nova York: Monacelli Press, 1978.

KOOLHAAS, Rem; MAU, Bruce. S, M, L, XL. Nova York: Monacelli Press, 1995.

MALLGRAVE, Harry Francis; GOODMAN, David J. An Introduction to Architectural Theory: 1968


to the Present. New York: Wiley-Blackwell. 2011. MAROT, Sebastián (Ed.). The city in the city –
Berlin: a green archipelago. A manifesto. New York: Lars Müller Publishers, 2010.

MONEO, Rafael. Inquietação Teórica e Estratégia Projetual. São Paulo: Cosac & Naif, 2008.

MONTANER, Joseph María. Arquitectura y crítica. Barcelona: Gustavo Gili, 2007.

______. Depois do movimento moderno: arquitetura da segunda metade do século XX. Barcelona:
Gustavo Gili, 2001.

PANTALEÃO, Sandra Catharinne. Aldo Rossi e Rem Koolhaas, rupturas e continuidades discursivas.
Seminário Forma Urbana, Goiânia, 03 a 05 de Novembro de 2014. 21 p

______. A condição urbana contemporânea na perspectiva de Rem Koolhaas. 2016. 276 f. Tese
(Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade de Brasília, Brasília, 2016.

ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. 2 ed. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins
Fontes, 2001.

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