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MORFOLOGIA URBANA COMO INSTRUMENTO PARA

PLANEJAMENTO URBANO

FERREIRA, AMANDA. (1); ROSSIN, MARIANA S. (2);


LEMOS, ANA CAROLINA D. L. (3); FERNANDES, FABRICIO S. (4)

1. Universidade Federal de Juiz de Fora. Arquiteta e Urbanista.


Galeria Prefeito Álvaro Braga, 11/401, Centro, Juiz de Fora – 36010-280
amanda.ferreira@arquitetura.ufjf.br

2. Universidade Federal de Juiz de Fora. Mestranda em Ambiente Construído.


Rua Doutor Gil Horta, 30/303, Centro, Juiz de Fora – 36016-400
marianarossin.arq@hotmail.com

3. Universidade Federal de Juiz de Fora. Graduanda em Arquitetura e Urbanismo.


Avenida Presidente Itamar Franco, 1552/101, Centro, Juiz de Fora - 36016320
ana.lewer@gmail.com

4. Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage. Historiador, Pós-Graduado em Gestão do Patrimônio


Histórico e Cultural.
Rua Adayro Martins Rúbio, 450, Terras Altas, Juiz de Fora – 36073-234
fsfjf@live.com

RESUMO

O artigo a seguir tem como temática principal, o entendimento da relação entre Planejamento Urbano
e territorial das cidades brasileiras através da conservação de suas Paisagens Culturais. De acordo
com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN (Portal IPHAN), a definição de
Paisagem Cultural surgiu de um “processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida
e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores”. O conceito de Paisagem Cultural é
adotado pela UNESCO, desde 1992, como uma tipologia de reconhecimento dos bens culturais. Em
2009, o IPHAN, através da Chancela da Paisagem Cultural, regulamentou a Portaria nº 127, a qual se
tornou um instrumento de preservação do Patrimônio Cultural brasileiro.

Uma das maneiras de se compreender a evolução das cidades, através da forma urbana, se faz com
abordagem sobre a morfologia urbana, tais como utilizados pelas Escolas Inglesa e Italiana de
Morfologia Urbana, podendo ser empregados, facilmente, em contextos diferentes. De acordo com
PEREIRA COSTA e GIMMLER NETTO (2015), tais abordagens visam o entendimento das cidades
desde a escala arquitetônica até o traçado urbano, além da compreensão da forma de uso e
ocupação do solo que, em conjunto, geram uma determinada paisagem.

As cidades brasileiras se modificaram e, com o passar dos anos, se adaptam para atender às novas
demandas urbanas que surgem, gerando através do crescimento que, muitas vezes se faz de forma
desordenada e sem planejamento, acarretando na descaracterização da Paisagem Cultural presente,
além de, muitas vezes, também acarretar na perda do Patrimônio Cultural preexistente, o qual remete
à história de formação e consolidação do lugar e da cultura local. A necessidade de implantação de
um planejamento urbano sustentável e coerente, se dá devido a essas novas demandas de
crescimento urbano.

Este artigo analisa a compreensão dos estudos sobre a Morfologia Urbana para elaboração de
instrumentos de Planejamento Urbano e Territorial, a fim de organizar e gerir o espaço já
consolidado, salvaguardar o Patrimônio Cultural Material e Imaterial preexistente além do que irá se
formar para as próximas gerações. O entendimento da relação entre a Morfologia Urbana e sua
aplicação para Planejamento Urbano se faz com uma abordagem de legislações existentes,
especialmente as Leis de Uso e Ocupação do Solo e Planos Diretores, que juntamente com outras
legislações urbanas, tal como o Estatuto das Cidades, podem ser determinantes na composição do
planejamento e preservação da Paisagem Cultural e do Patrimônio Cultural Material e Imaterial. Por
fim, com este trabalho espera-se contribuir com uma reflexão sobre a importância do tema para um
melhor entendimento sobre as formas urbanas e o planejamento urbano ordenado e sua importância
para um desenvolvimento sustentável.

Palavras-chave: Paisagens Culturais; Patrimônio Cultural; Morfologia Urbana; Planejamento Urbano.

1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil

Belo Horizonte, de 10 a 13 de maio de 2017


Introdução

O artigo a seguir aborda a problemática da preservação da paisagem cultural e a


relação com o desenvolvimento urbano sustentável. O trabalho inicia-se com as diversas
conceituações do termo “Paisagem Cultural”, através das definições dadas por diversos
autores estudiosos do tema. A partir das definições do termo há a inserção da Morfologia
Urbana como forma de estudo e compreensão das paisagens urbanas. De acordo com suas
correntes, é possível estudar e definir as transformações urbanas ocorridas numa cidade e
assim, trabalhar com as influências e características peculiares ao lugar e sua necessidade
de preservação.

Uma das formas de preservação das paisagens se dá através da relação das


mesmas com as legislações urbanas existentes, fazendo com que tais legislações trabalhem
juntamente com instrumentos de preservação e, assim, fortalecendo a salvaguarda das
paisagens culturais e urbanas sem prejudicar o crescimento e desenvolvimento das cidades
de acordo com o mercado e a sociedade.

A Paisagem Cultural

O conceito de Paisagem Cultural é adotado pela UNESCO, desde 1992, mas a


preocupação com tal categoria veio antes, em meados do século XX, tendo como marco a
Convenção realizada em Paris, na França, em 1962, quando o documento gerado pelo
evento, chamado de Recomendação Paris Paisagens e Sítios, passou a considerar as
paisagens e os sítios como tipologias reconhecidas de bens culturais. Em 2009, o Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, através da Chancela da Paisagem
Cultural, regulamentou a Portaria nº 127, a qual se tornou um instrumento de preservação
da Paisagem Cultural Brasileira. A chancela tem como principal objetivo contribuir para a
preservação do patrimônio cultural atendendo ao interesse público e implica no
estabelecimento de pacto que pode envolver o poder público, a sociedade civil e a iniciativa
privada, complementando os instrumentos de promoção e proteção já existentes.

A paisagem cultural faz uma relação entre o patrimônio cultural e o natural de


determinado lugar, tornando assim, as relações entre os ambientes construído e natural
únicas, contribuindo para a preservação ambiental e das formas tradicionais das populações
que vivem nas áreas de interesse de preservação, amenizando, talvez, processos como
gentrificações.
Objetivando-se contribuir para ações de conservação das paisagens culturais
brasileiras, pesquisou-se diferentes conceitos sobre paisagem para melhor entendimento do
termo: “paisagem cultural”, em relação a diferentes abordagens encontradas. O termo
Paisagem Cultural é definido pelo IPHAN (Portal IPHAN) como um “processo de interação
do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou
atribuíram valores”. Uma paisagem cultural é o reflexo da sociedade local, portanto,
entende-se que a paisagem está intrinsecamente ligada a cultura herdada, como ressaltam
Sá Carneiro et al. (2009, p.129), "a cultura caracteriza a paisagem, desde as construções
evidentes até o patrimônio intelectual ali conservado". Com base nisso Ferriolo (2007, p.44)
apud Sá Carneiro et al. (2009, p. 129) destaca que "cada paisagem desvela uma cultura de
conteúdo material e imaterial", visto que seus valores e costumes estão inseridos no
ambiente em que esta se desenvolve.

Ainda sobre o termo paisagem, Strappa et al. (2003) destacam em sua obra "La città
come organismo" o termo sendo empregado no sentido de forma do território ou aparência
visível daquela estrutura de relações que liga os diversos estados físicos do processo
antrópico do solo natural, sendo este, de caráter individual, único e não repetível. A estrutura
do organismo se desenvolve por meio de processos históricos, que possuem determinadas
características, que se individua na transformação do solo, em um determinado espaço e
tempo, em função da variabilidade natural e histórica. Em resumo, as características de
cada local, geográficas e históricas, se conformam ao longo do tempo e geram paisagens
únicas. Nesse mesmo contexto, Moudon (1997), salienta que a cidade pode ser lida e
analisada através de sua forma física, que compreende sua forma urbana, sendo esta
definida a partir dos elementos físicos fundamentais: as edificações e seus espaços livres,
públicos ou privados, os lotes, os quarteirões e as vias. A compreensão da forma urbana se
dá em relação às escalas: o edifício e o lote, as vias e as quadras, a cidade e a região, e
está intrinsecamente ligada a história e as suas transformações ao longo do tempo.

Ainda, segundo Veras (2014):

A paisagem é produto de uma experiência emocional da


contemplação, da visão que recorta da natureza o território da vida
do homem. Neste sentido, a sua criação é uma operação cultural,
não necessariamente processada pelo intelecto, mas pela vivência

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de quem a constrói no curso da história. O que se atribui à
modernidade, não é então o encantamento do deixar-se abandonar à
paisagem, que também se manifestava em períodos anteriores,
como nos fala Simmel, mas a representação conscientemente
elaborada desta paisagem apreendida. (VERAS, 2014, p.81)

Já Macedo (1999) apud Pereira Costa e Gimmler Neto (2015, p.33) vê "a paisagem
como um produto e um sistema", levando em consideração as características variáveis de
cada ambiente, resultando assim, uma alteração morfológica a partir do processo de
ocupação do território.

Portanto, apesar da ampla discussão sobre o termo paisagem cultural e a grande


variabilidade de conceitos, há o entendimento de que a forma da cidade no qual está
inserida juntamente com as características culturais e históricas da sua sociedade
conformam tal terminologia, porém tais propriedades estão em constantes transformações,
como o resultado de alterações no meio físico realizadas pelo homem, ligada aos sistemas
socioeconômicos e políticos que ocorreram ao longo do tempo.

A Morfologia Urbana como método de análise das Paisagens


Culturais

Para analisar uma determinada paisagem cultural, a partir do processo de ocupação


e urbanização das cidades, pode-se utilizar a morfologia urbana, para o entendimento de
sua materialidade. O estudo morfológico busca através de determinados períodos analisar a
complexidade das cidades em detrimento das transformações ocorridas, com o intuito de
compreender as cidades contemporâneas e a evolução de suas paisagens. DEL RIO (1990)
entende que a morfologia urbana estuda o tecido urbano e seus elementos construídos,
formados a partir de sua evolução e das transformações ocasionadas pelos processos
sociais. A morfologia urbana deve ser vista como "o estudo analítico da produção e
modificação da forma urbana no tempo" (SAMUELS, 1986 apud DEL RIO, 1990, p.71),
juntamente com este conceito, Barbosa (2007) diz que:

A morfologia urbana permite analisar a relação existente entre os


espaços livres [...] e os espaços construídos formados pelas
edificações, materializados pela ação social. Neste sentido, torna-se
importante o conhecimento de que esta relação decorre tanto da
forma urbana, própria do lugar, como das normas e leis que elas
incidem. (BARBOSA, 2007, p.60)

Portanto, uma das maneiras de se compreender a evolução das cidades, através da


forma urbana, se faz com a abordagem sobre a morfologia urbana, tais como utilizados
pelas Escolas Inglesa e Italiana de Morfologia Urbana, podendo ser empregados,
facilmente, em contextos diferentes. De acordo com Pereira Costa e Gimmler Netto (2015),
tais abordagens visam o entendimento das cidades desde a escala arquitetônica até o
traçado urbano, além da compreensão da forma de uso e ocupação do solo que, em
conjunto, geram uma determinada paisagem.

Atualmente, conforme Moudon (1997), são reconhecidas pelo ISUF (International


Seminar on Urban Form) três principais correntes ou "Escolas de Morfologia Urbana":
Inglesa, Italiana e Francesa. Todas as escolas consideram como 'parcela' mínima, o lote
urbano e a edificação, sendo este, o ponto de partida para entender a forma urbana.

A Escola Inglesa de Morfologia Urbana tem o objetivo de desenvolver uma teoria de


construção da cidade, uma teoria mais descritiva de como planejar a cidade a partir da
investigação das transformações da forma urbana. O precursor desta escola é Michael
Robert Günter Conzen, geógrafo alemão que se dedicou ao estudo das formas urbanas.
(MOUDON, 1997) Tal estudo analisa o desenvolvimento da cidade, em períodos
morfológicos, sendo a forma em que as edificações foram construídas nos lotes e como
influenciaram na dinâmica da cidade, parâmetros que compõem um determinado tecido
urbano. M. R. G. Conzen configurou o processo de desenvolvimento, pelas denominadas
parcelas que representam extratos que se submetem e crescem sob determinados aspectos
urbanos. Como áreas da cidade que passam a existir em um dado momento e que
apresentam semelhanças, estrutural ou arquitetônica, e os relacionou ao plano de
implantação dos edifícios. Assim, num momento futuro, a cidade que se desenvolve, leva
características existentes e influenciam também na área já desenvolvida.

O método da Escola Inglesa de Morfologia Urbana utiliza de forma interdisciplinar a


paisagem, analisado-a através da investigação das mudanças e permanências. Todavia, o
resultado observado é que a ocupação e urbanização "são evidências materializadas e
objeto de análise da Morfologia Urbana", e o propósito desta morfologia é estabelecer uma
teoria sobre a conformação das cidades (PEREIRA COSTA et al., 2013, p.1). Como método
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de análise, foi proposta a visão tripartite, que consiste no estudo de três aspectos formais: o
plano urbano, o tecido urbano e o padrão de uso e ocupação do solo, sendo os dois últimos,
partes integrantes do plano urbano. Tais aspectos são analisados em função dos intervalos
de tempo que definem os períodos morfológicos, no qual os resultados destas análises
representam o processo de evolução da paisagem.

A Escola Italiana tem como principal objetivo investigar as tipologias edilícias e


desenvolver teorias de desenho arquitetônico e urbano, estudando o modo como as cidades
deveriam ser construídas, baseadas nas tradições históricas de construção da cidade a
partir das edificações. Saverio Muratori, fundador da Escola Italiana de Morfologia Urbana,
atuou como arquiteto e professor, elaborando estudos sobre o processo evolutivo das
cidades de Veneza e Roma, e utilizava-os como bases teóricas para as suas aulas de
desenho arquitetônico. De acordo com Pereira Costa e Gimmler Neto (2015), Muratori
desenvolveu sua prática profissional com reflexões a partir do particular para o geral, no
qual a consciência espontânea é a capacidade da população de reproduzir um tipo básico
de edificação enraizado pela cultura local. Segundo Moudon (1997), a Escola Italiana de
Morfologia Urbana tinha como expoentes Gianfranco Caniggia, Giuseppe Strappa, Aldo
Rossi e Carlo Aymonino.

Já a Escola Francesa iniciou-se no final dos anos 60 com os arquitetos Philippe


Panerai e Jean Castex e o sociólogo Jean-Charles Depaule, que fundaram a Escola de
Arquitetura de Versalhes em reação à arquitetura modernista. A Escola Francesa de
Morfologia Urbana tem interesse nos aspectos sociais das cidades, em escala arquitetônica
e urbana. São descritivos quando desenvolvem estudos morfológicos e tem como propósito
desenvolver uma teoria do projeto base sobre as tradições de construção da cidade. Ainda
utiliza-se da análise morfológica para identificar as bases do modernismo no desenho
urbano no século XVIII. (MOUDON, 1997)

Baseando-se na teoria das Escolas Inglesa e Italiana de Morfologia Urbana, é


possível analisar uma determinada paisagem e definir seus elementos estruturantes. Visto
que as paisagens estão em constante transformação e estão relacionadas a várias
atividades, sejam elas políticas, sociais e econômicas de uma determinada região, gerando
assim, a evolução da paisagem urbana, que é determinada pelas modificações e
permanências ocorridas com o passar dos anos, em determinados períodos morfológicos.
Como dito anteriormente, com a aplicação do método da visão tripartite, em cada período
morfológico, é possível compreender a evolução de uma determinada paisagem. Tal análise
inicia-se com a estrutura urbana atual e se retrocede em determinados períodos para que se
avalie a formação e a evolução da paisagem (PEREIRA COSTA; GIMMLER NETTO, 2015).
A partir daí são traçados elementos tidos como estratégicos para sua conservação,
utilizados em conjunto com instrumentos de planejamento urbano, tais como legislações
urbanas, Planos Diretores de Planjemanto e outros.

As Paisagens Culturais como partes dos Instrumentos de


Planejamento Urbano

As cidades brasileiras estão em constante tranformação e, com o passar dos anos,


se adaptam para atender às novas demandas urbanas que surgem através do crescimento
que, muitas vezes se faz de forma desordenada e sem planejamento, acarretando na
descaracterização da Paisagem Cultural presente, além de, muitas vezes, também acarretar
na perda do Patrimônio Cultural preexistente, o qual remete à história de formação e
consolidação do lugar e da cultura local. A necessidade de implantação de um planejamento
urbano sustentável e coerente se dá devido a essas novas demandas de crescimento
urbano, a partir do adensamento e expansão urbana.

Para Gimmler Netto (2014) as diferentes formas de ocupação e estruturação do


ambiente resultam nas maneiras, bem ou mal, sucedidas de urbanização, refletindo
diretamente na identidade de determinada sociedade. A análise conectada da paisagem
permite a leitura de suas qualidades ambientais, funcionais e estéticas, gerando,
consequentemente, artifícios para a elaboração de diretrizes para uma adequada
preservação.

O estudo da Morfologia Urbana, como já dito anteriormente, auxilia no entendimento


das dinâmicas físicas da cidade assim como suas transformações e interrelações com as
dinâmicas culturais e históricas. Mas, muito além de ser somente o conhecimento que tais
estudos possam trazer, a compreensão destas relações podem auxiliar num melhor
entedimento e leitura da cidade, como um todo, proporcionando um melhor planejamento
urbano, visando uma preservação da pré-existência e novas possibilidades de expansão do
território urbano para atender às necessidades da sociedade, de forma sustentável e
ordenada. Através das edificações tipo, pode-se identificar semelhanças em determinadas
áreas da cidade e, estas semelhanças auxiliam no entendimento de macro e micro áreas,

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acarretando em propostas de diretrizes que buscam melhorias e preservação para o local.
(PEREIRA COSTA; GIMMLER NETTO, 2015)

Com o planejamento urbano e territorial pode-se evitar problemas, acreditando numa


capacidade de conhecer processos que permitem decidir da melhor maneira possível os
rumos que as cidades brasileiras vão seguir. A necessidade do planejamento decorre da
existência de uma dimensão pública e coletiva da vida social e a existência de certo direito
de propriedade coletiva sobre bens que pertencem a todos. A preservação do patrimônio é
importante por promover o aumento do reconhecimento de que as áreas de valor patrimonial
possuem qualidade ambiental positiva, favorecendo processos de geração de renda e
emprego, além da contribuição para divulgar uma imagem positiva das cidades nos meios
de comunicação e extração de fluxos de consumidores e investimentos para as cidades.
Como é o caso da cidade do Rio de Janeiro, conhecida pelas suas exuberantes paisagens,
que em 2012 passou a ser a primeira área urbana no mundo a ser reconhecido o valor
universal da sua paisagem cultural e, em dezembro de 2016, recebeu da UNESCO o
certificado de Patrimônio Mundial pela sua Paisagem Cultural.

Figura 1 - Rio de Janeiro: Carioca Landscapes between the Mountain and the Sea

Fonte: UNESCO. 2016. Imagem de Silvan Rehfeld, 2009.

Uma forma de promover a preservação da paisagem cultural associada ao


desenvolvimento urbano sustentável se faz através de Planos de Preservação. O Plano de
Preservação atua sobre uma área ampla incluindo Áreas de Entorno de Bens Tombados e a
Zonas de Influências do Uso do Solo. Para submeter a condicionante da preservação
patrimonial deve-se levar em conta tendências de desenvolvimento urbano, com a finalidade
de evitar problemas futuros a partir de diretrizes e estratégias do Plano Diretor. O escopo do
Plano de Preservação deve regulamentar o entorno de uma área tombada ou a área onde
localizam-se os bens tombados, identificar carências de infraestrutura e serviços urbanos
existentes e intervir sobre processos e problemas que comprometem sua preservação, tais
como pressões que o desenvolvimento da estrutura de uso e ocupação do solo exercem
sobre a área de interesse a preservação gerando mudanças morfológicas que possam
desfigurar o patrimônio (MESENTIER, 2014), contudo, deve-se levar em consideração que a
conservação das paisagens não significa sua estagnação, mas sim um desenvolvimento
adequado sem que interfira em sua leitura como um conjunto, entre as edificações e o meio
em que estão inseridas.

Segundo Marra (2011), tanto o Plano Diretor quanto as legislações de uso e


ocupação do solo, devem observar as agressões e impactos causados aos patrimônios
locais. Assim, o trabalho entre Planos de Preservação e as legislações vigentes nas
cidades, conseguem uma coexistência harmônica, porém não é o que acontece atualmente
nas cidades brasileiras. Atualmente, os Planos Diretores são falhos quanto às coerências
em relação à preservação do Patrimônio Cultural e Natural das cidades e, na grande maioria
das vezes, não correspondem às Legislações Urbanas que, também, encontram-se muitas
vezes defasadas.

Considerações Finais

O termo Paisagem Cultural como já se sabe é recente no campo da Preservação do


Patrimônio Cultural, embora tenha grande relevância para o entendimento das dinâmicas
urbanas desde os primórdios até os dias de hoje. As paisagens guardam consigo
características das formas físicas, históricas e culturais das sociedades e suas cidades, por
isso a importância de sua compreensão, suas dinâmicas e sua salvaguarda, como parte do
patrimônio cultural do Brasil.

As legislações municipais, os planos diretores e planos de preservação deveriam ser


complementares e com o mesmo nível de importância para os municípios, mas o que se
nota, muitas vezes, é que tais instrumentos são desatualizados, outrora incoerentes com os
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dados de seus municípios e, finalmente, não são coerentes entre eles. Os planos de
preservação poderiam contribuir com as carências das legislações municipais, apontando
áreas passíveis de preservação, áreas com necessidades mais rígidas ou urgentes, áreas
para expansão urbana para novos empreendimentos e faixas de áreas intermediárias.

Conclui-se com esta investigação de que há necessidade de preservação e há


mecanismos para tal, porém, não há uma forma efetiva de relação entre formas de
preservação das paisagens culturais e urbanas brasileiras e um desenvolvimento urbano
eficaz e sustentável. Contudo, nota-se a necessidade de definir parâmetros específicos para
as políticas de patrimônio com vistas à conservação e gestão das paisagens brasileiras.

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