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Desindustrialização no Brasil: conceito, controvérsias e evidências.

Antonio Carlos Pereira França1

Júlio Cesar Ferreira Silva2

RESUMO: O presente artigo objetiva analisar o conceito de


desindustrialização e se ele se aplica ao Brasil. Ao percorrer
essa trajetória, enfatizar o debate que tal conceito enseja no
caso brasileiro e buscar evidências se há de fato uma
desindustrialização na economia brasileira ou não.

Palavras-chave: Desindustrialização; Desenvolvimento;


Crescimento econômico; Política econômica.

1. INTRODUÇÃO

O grau de desenvolvimento de uma economia está condicionado sempre a um


campo de visão de quem argumenta. O conjunto de hipóteses que validam uma
condição de economia madura não é consenso entre economistas. As discussões
sempre são influenciadas pelo que é valido incorporar na teoria e o que é irrelevante.
Um claro exemplo está na discussão que se faz acerca se o Brasil está passando ou
passou por um processo de industrialização ou não.

O Brasil começou a se industrializar há pouco tempo e graças a um conjunto de


políticas protecionistas dirigidas pelo Estado. O crescimento vertiginoso apresentado
ao
1
Graduando em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Maranhão
2
Graduando em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Maranhão
longo de 30 anos de formação bruta de capital fixo: crescimento da indústria, e não
parece razoável supor que após essa fase a indústria está declinando.

Não se compreende o Brasil ainda como uma nação desenvolvida e nem


sequer chegou a sua fase de maturidade industrial. No entanto, as forças econômicas
que levam ao crescimento econômico e ao seu desenvolvimento não são
continuamente positivas. A chamada desindustrialização prematura
(Bresser-Pereira,2008) conceitua
se com uma linha acadêmica que defende a tese de uma desindustrialização brasileira.
Por outro lado, espera-se critérios mais definidos e dados mais concretos para se
indicar a existência deste fenômeno.

Há evidências empírica, segundo economistas, que indicam como está


ocorrendo essa fase de desindustrialização além das hipóteses levantadas para
sustentar essa base. Grande destaque da discussão acadêmica reside no conjunto de
hipóteses que validam essa desindustrialização.

A discussão tem início dando o devido contexto aos argumentos dos autores:
reflexões acerca do período de reformas econômicas no Brasil. Após, comenta-se o
conceito de desindustrialização, o conceito chave desta denota a posição do autor.
Essa divergência de conceitos é discutida há décadas, contudo não há uma definição
exata e concisa de que se realmente o país está ou não em um processo de
desindustrialização e os fatores que levam a esse fenômeno.

Uns dos conceitos relacionam a perda da importância no valor adicionado no


processo de desindustrialização. Essa hipótese tem uma ampla aceitação por parte
dos pesquisadores. Alguns indicadores são utilizados para embasar esta posição,
como: valor adicionado no PIB, emprego, produtividade, nível de investimento,
exportações e importações da indústria.

O seguinte trabalho está dividido em 3 partes, a contar desta introdução. A


segunda parte, o desenvolvimento, dando início ao debate teórico e empírico,
ressaltando as visões dos autores. A terceira parte, a conclusão.
2. A (DES) INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRA

2.1. Conjuntura econômica brasileira e industrialização


A relevância da indústria no crescimento de uma economia foi destaque na
teoria de diversos autores: ROSTOW (1971), SMITH (1776). A observação destes
autores reside no potencial em que a indústria tem de elevar o padrão de
produtividade do trabalho, o papel das economias de escala e a melhoria dos padrões
de vida da
sociedade. Os países mais desenvolvidos são aqueles que possuem uma participação
muito elevada no valor adicionado na composição do PIB.

Smith (1776) já destacara os efeitos das manufaturas sobre a produtividade do


trabalho. A defesa desta tese é corroborada e difundida ao longo dos debates
econômicos. Rostow (1971) destaca em sua teoria das etapas do desenvolvimento
econômico, o papel do progresso técnico e a difusão de novas técnicas de produção.

A forte expansão da indústria conduz a uma relativa transferência de recursos


(Mão de obra e investimentos) dos outros setores. Rowthorn e Ramaswamy (1997)
destacam que o setor industrial é mais dinâmico e capaz de absorver uma parcela
maior de trabalhadores que o setor agropecuário. Em comparação ao setor de
serviços, os mesmos autores descrevem como os graus de produtividade de ambos
os setores que denotam o nível de emprego.

O desenvolvimento do setor industrial tende a ser mais rápido que o setor


agropecuário e via a vis ganhando mais importância no ritmo de crescimento do
Produto. Uma pesquisa feita por Bonelli (2005) sobre o percentual de participação de
cada setor no PIB brasileiro de 1900 até os anos 2000 revelou o crescimento do setor
manufatureiro no Brasil em relação aos de serviços e agropecuário. É possível
identificar no comportamento dos respectivos, o valor adicionado de cada setor no PIB
brasileiro a cada ano.
Figura 1- Valor Adicionado dos três setores no PIB de 1900-2000.
Fonte: Bonelli,2005
A perda no valor adicionado da agricultura é compensada pelo aumento
percentual da indústria no PIB. Uma das discussões acerca do processo de
desindustrialização está na relação entre o valor adicionado da indústria e o setor de
serviços. Enquanto a agropecuária perde terreno para o setor industrial, o de serviços
vai aumentado sua proporção, a sua tendência é aumentar o seu valor adicionado no
PIB.

Quando o país inicia o processo de industrialização brasileira com a política de


substituição a importação na década de 1940 observou-se nos anos vindouros o
crescimento muito rápido no produto, empregos e investimentos, exceto nos períodos
de crise. Giambiagi (2011) traz significativas reflexões sobre esse período ao advogar
sobre a execução desta política econômica que buscava a industrialização do país.

Durante o período de 1950-80, o Brasil cresceu a uma taxa média de


7,4% ao ano, e apenas em quatro ocasiões cresceu abaixo do marco
de 4%. Esse crescimento esteve associado a uma política de
substituição de importações, mas também a alguns episódios de
promoção de exportações, como por exemplo, ao longo do “Milagre”
(1968-73). Resumidamente, podemos dizer que as três principais
características do modelo de industrialização brasileira do pós-Guerra
foram: (1) a participação direta do Estado no suprimento da
infraestrutura econômica (energia e transportes) e em alguns setores
considerados prioritários (siderurgia, mineração e petroquímica); (2) a
elevada proteção à indústria nacional, mediante tarifas e diversos tipos
de barreiras não tarifárias; e (3) o fornecimento de crédito em
condições favorecidas para a implantação de novos
projetos.(Giambiagi,2011.pag. 133).
As reformas instauradas no fim de 1980 e início de 1990 caracterizou-se como
o desmanche das velhas políticas econômicas administradas do Estado e o início de
um pacote de medidas de reformas no ambiente de negócios que visava traçar o rumo
da economia do país ao desenvolvimento sustentável e a longo prazo,
concomitantemente, maior integração ao mercado internacional, além dos ajustes
fiscais do governo e a retomada do controle aos indicadores monetários. O período
marcado por grandes reformas de cunho Liberal: reformas Liberais, privatizações,
abertura comercial, a criação da moeda Real. A década de 1990 trouxe profundas
mudanças de políticas econômicas. A proposta de abertura comercial propôs um
modelo de crescimento e desenvolvimento para o país no longo prazo e o fim do
cenário de recessão que o país herdou do fim de 1980. A proposta visava maior
abertura comercial: fim das barreiras tarifárias, bloqueios de bens importados, maior
entrada de capital estrangeiro e aliado ao novo regime cambial- taxa de câmbio
flexível, onde trouxeram modificações na estrutura produtiva brasileira, principalmente
ao setor industrial. Economistas que defendem a tese da desindustrialização brasileira
advertem que o período em questão, iniciou uma forte tendência ao declínio da
participação da indústria no PIB. O aumento do grau de produtividade dos setores,
refletindo o grau tecnológico da nova estrutura, é sinal de um avanço de
desenvolvimento econômico moderno. Observou-se neste período alto desempenho
da indústria que incorporaram maior fator tecnológico na produção: ocasionando maior
produtividade e amplo mercado de trabalho. Porém, observou-se uma acentuada
queda nos preços relativos dos bens.

Os defensores da ideia da reestruturação produtiva identificam a


abertura comercial como a principal mola propulsora do recente
crescimento da produtividade brasileira, pois essa representou uma
quebra nas políticas estruturalistas predominantes no Brasil até
meados da década de 90. (Rossi J, Ferreira, 1999).

Em busca de promover maior equilíbrio na balança comercial e reduzir o déficit


nas transações correntes, além de minimizar o impacto da inflação, o Governo
provocava mini desvalorizações do câmbio, com intuito de aumentar a entrada de
capital estrangeiro e melhorar o nível de competitividade entre as exportações. No
entanto, nenhuma intervenção do governo na taxa de câmbio surtiu efeitos a longo
prazo no lado real da economia: o câmbio continuou sobrevalorizado. O mecanismo
de transmissão da taxa de câmbio é crucial para um crescimento sustentável do
produto na economia. O preço da moeda doméstica na década de 1990 dificultava o
crescimento das indústrias. A relação entre os termos de trocas desincentivou os
fluxos comerciais entre as nações. Bresser Pereira (2008) destaca o papel de uma
taxa de câmbio competitiva
sobre o desenvolvimento econômico que possibilite a expansão das exportações e dos
investimentos. O novo regime cambial instituído em 1999 trouxe significativas
melhorias em relação aos preços relativos na economia.

2.2. Conceitos, divergências e base empírica

Para entender o que alguns autores apontam como o processo de


desindustrialização brasileira é imprescindível que destaque os principais fenômenos
por trás deste conceito. Esta linha de pensamento aponta oito tipos de fenômenos na
economia para explicar a queda no valor adicionado da indústria na composição do
PIB.

• O processo de desenvolvimento econômico;


• Diferencial de produtividade;
• Elasticidade-renda das manufaturas;
• Especialização/terceirização;
• Nova divisão internacional do trabalho;
• Investimento;
• Mudança de orientação de política econômica;
• Doença holandesa;

2.2.1 Doença holandesa

Bresser-Pereira (2008) aponta como uma das causas mais pertinentes da


desindustrialização brasileira está no que os estudiosos do desenvolvimentismo
chamam de a Nova Doença Holandesa.

Defensores da tese de desindustrialização brasileira destacam as


consequências negativas da valorização cambial. Intitulada como a nova doença
holandesa, se trata da queda da atividade industrial e do seu crescimento por conta de
uma sobrevalorização que desencoraja o consumo doméstico por parte da demanda
interna e o desincentivo as exportações por parte dos estrangeiros.
Probably one of the most important reasons for this outcome is the
Dutch disease — that is, the chronic overvaluation of the exchange rate
caused by the abundance of cheap natural and human resources
compatible with a lower exchange rate than the one that would pave
the way for the other tradables industries. (Bresser Pereira, 2008).

Entende-se por Doença Holandesa a relação entre a taxa de câmbio apreciada


e os preços relativos dos bens commodities. Países ricos em recursos naturais podem
apresentar ótimos desempenhos de exportação quando a taxa de câmbio está
apreciada. A diferença entre os preços relativos dos bens industriais e agropecuários
traduzem a perda de valor adicionado do setor industrial.

Bresser-Pereira (2009) comenta que “A doença holandesa é fruto das rendas


ricardianas originais de recursos naturais baratos e abundantes, que em princípio, são
uma benção para o país, mas se transformam em uma maldição se o país não impede
a sobre apreciação da moeda nacional que vem com a doença holandesa.” No fim, as
restrições da alta do câmbio podem ser sentidas em todos os segmentos da economia,
não somente na indústria.

O país conseguiu expressivo crescimento do parque industrial nacional durante


a década de 1940 a 1980, exceto em períodos de crise (1945-1947, 1961-1964), dado
o caráter coercitivo da administração da taxa de câmbio. Após o processo de abertura
comercial e a mudança de política econômica, trouxe o abandono à administração da
taxa cambial.

Durante o período da década de 1990 observou-se uma forte apreciação da


taxa de câmbio capaz de transformar o parque industrial através da importação de
tecnologias. A adoção de uma taxa de câmbio flutuante, parte do que é conhecido
como tripé macroeconômico, fortaleceu o processo de desindustrialização brasileira
(Bresser
Pereira, 2009). O saldo de exportações das commodities nos primeiros anos do século
XX confirma a hipótese da existência da doença holandesa no Brasil.
Figura 2- Saldo (Exportação e importação) de commodities de 2000-2011.
Fonte: Bresser-Pereira,2008

Em outras palavras, o que Bresser-Pereira (2008) quer dizer é que a tese de


reprimarização da pauta exportadora fica evidente ao verificar a tendência crescente
de exportações de commodities no período de 2000 a 2011.

2.2.2. Produtividade, emprego e desenvolvimento econômico

Rowthorn e Ramaswany (1997) constroem uma narrativa que traz o processo


de desindustrialização com uma consequência técnica do quão bem sucedido é o
desenvolvimento econômico de uma nação. O que está por trás dos bastidores dessa
afirmação reside no aumento de produtividade dos fatores associados a indústria. As
indústrias conseguem incorporar maior fator tecnológico na sua produção do que os
demais setores. O ganho de produtividade com a especialização também desemborca
e fortalece a análise dos autores.

As consequências do aumento da produtividade revelam-se em dois aspectos


importantes na economia: a pouca absorção de Mão de obra e a diferença entre os
preços relativos entre os bens.

Quanto ao primeiro aspecto, é possível verificar através de uma pesquisa


realizada pelo IPEA com dados das pesquisas mensais e anuais das indústrias e do
RAIS/CAGED. As evidências empíricas comprovam o aumento da produtividade
industrial e a queda na participação do emprego total.
Figura 3- Participação % da Indústria no Emprego Total,1995-2009.

Fonte: Boneli e Pessôa,2010.

No gráfico, constata-se a queda da participação dos empregados na indústria


no Emprego Total. Em 1995 o setor absorvia mais que 20% do total de empregos e
declinou para um pouco mais de 18% no ano de 1998 e se estende em um patamar
de 18% a 19% nos próximos 10 anos. O gráfico não exauriu as evidências que
comprovem a desindustrialização brasileira e até mesmo não evidencia de forma clara
essa afirmação. Alguns motivos para que essa perda relativa tenha acontecido resida
no aumento absoluto de empregados nos outros setores e diminuiu a cota de
participação relativa do número de empregados do setor manufatureiro.
Figura 4- Taxas de crescimento da Produtividade Industrial no Brasil, 1991 a 2008.
Fonte: Bonelli e Pessôa,2010

A crescente produtividade das indústrias gera uma queda nos preços relativos
no setor e que é alimentado pela competição dos importados gerando aumento da
competitividade no setor industrial.

2.2.3 Elasticidade-renda das manufaturas

Uma evidência clara do desenvolvimento econômico das nações está no


crescimento da renda per capita. Países ricos apresentam um crescimento da renda
maior que os subdesenvolvidos e/ou em desenvolvimento. A evolução da renda per
capita incorpora certas preferências de consumo nos agentes. Os chamados efeitos
renda influenciam a demanda por bens de acordo com o grau de elasticidade de cada.

O efeito elasticidade-renda por bens industriais explica o fenômeno da


desindustrialização nas economias avançadas e uma maior participação da indústria
no valor adicionado nas atrasadas.

Segundo Clark apud Rowthorn e Ramaswany (1999) “a desindustrialização em


economias avançadas seria uma consequência natural do deslocamento da demanda
de manufaturados para serviços”.
A lei de Engel é citada em alguns trabalhos científicos para reafirmar o
deslocamento da demanda industrial para o de serviços. No entanto, não é possível
depositar toda a explicação da desindustrialização na mudança da demanda e
negligenciar as modificações na estrutura de emprego e na produtividade (Rowthorn e
Ramaswany,1999). A lei de Engel refere-se à mudança de preferências por bens à
medida que a renda aumenta. O que explicaria a evolução do valor adicionado da
indústria no PIB estaria condicionada em duas evidências:

• A maior absorção de Mão de Obra no período de expansão industrial, elevando a


renda dos trabalhadores e aumentando a demanda por meio do efeito
substituição positiva. Em economias em desenvolvimento a elasticidade renda
por produtos manufaturados é maior que 1.
• Por meio do crescimento da produtividade: a elevada produção gerando o
declínio dos preços relativos faz com que os trabalhadores consumam mais
bens manufaturados.

Não obstante, os mesmos fatores citados acima podem ser incorporados aos
argumentos do declínio da participação do valor adicionado da indústria no PIB e maior
proporção do setor de serviços na composição. Esta argumentação segundo alguns
autores, são frutos do desenvolvimento econômico e do aumento da renda per capita,
a explicação nestes mesmos dois pontos pode ser o seguinte:

• Em um estágio avançado das economias, a elasticidade renda da manufatura é


menor que 1. A demanda por bens industriais não cresce na mesma magnitude
da renda. O efeito substituição ele é maior para o setor de serviços, o que
explicaria que a curva (ver figura 1) da composição dos setores no PIB
apresenta uma queda no VAB da indústria, enquanto o setor de serviços vai
aumentando sua proporção.

2.2.4. Mudança na orientação da política econômica e investimento

Tregenna (2016) traz um debate conceitual acerca da desindustrialização que


não somente deva-se limitar ao já citado - a perda de participação no emprego total e
no valor adicionado do setor manufatureiro no PIB. Bluestone e Harrison apud
Tregenna (2016) resgatam a definição de que a desindustrialização se trata de um
“desinvestimento sistemático no núcleo de uma nação com indústrias de
transformação”.
O nível de investimento na indústria denota a formação bruta de capital fixo e o
desenvolvimento dos produtos. A questão que se assenta nas discussões sobre o
fenômeno da desindustrialização está na relação entre o nível de investimento e a
participação de produtos na pauta exportadora, nível de emprego e produtividade.
Assim, taxa de investimento positiva (negativa) elevará (diminuirá) os índices de
emprego e produtividade.

Mudança na orientação da política econômica: as políticas de liberalização


comercial e de desregulamentação financeira, preconizadas pelo chamado Consenso
de Washington, fizeram com que o setor manufatureiro de alguns países se reduzisse
prematuramente. Argumenta-se que muitas dessas indústrias estavam em seu estágio
inicial de desenvolvimento – indústria infante – e poderiam ter se desenvolvido à luz
das vantagens comparativas dinâmicas caso tais políticas não tivessem sido
adotadas. Ademais, alguns setores ineficientes poderiam se tornar paulatinamente
eficientes se o processo de abertura comercial tivesse sido adotado de maneira
seletiva e gradual (Dasgupta e Singh, 2006; Shafaeddin, 2005). Vale destacar ainda
que Palma (2005) denomina a doença holandesa latino-americana como um processo
de desindustrialização descendente, pois foram induzidas pela política
macroeconômica. Bresser-Pereira (2008) entende que a raiz deste problema é a
estratégia de crescimento com poupança externa que contempla, entre outros,
aspectos do referido consenso.

2.2.5 Nova divisão internacional do Trabalho

Foi explicado que a desindustrialização é senão fruto de uma maturidade


alcançada na indústria nos países desenvolvidos, algo natural do crescimento
econômico. Ao contrário do que se observa nos países industrializados, os países em
desenvolvimento não se encontram nesta fase. A indústria em uma economia em
desenvolvimento tende a seguir uma tendência crescente. Os níveis de investimento
crescem à medida que o mercado interno aumenta sua demanda por bens industriais,
atingindo a médio e longo prazo, também o mercado externo.

A nova divisão internacional preconiza a mudança no padrão de especialização


da produção de uma nação ou região e aos fluxos de bens entre parceiros comerciais.

As diferenças de custos entre países desenvolvidos e em desenvolvimento


levam a uma transposição de produção e de demanda. Primeiro, os custos de Mão de
obra são mais baratas em países em desenvolvimento do que países ricos. A
transferência de fábricas ou até mesmo o aparecimento de fábricas nesses países
disputam espaço no mercado de produção de bens, levando-se em conta a questão
dos preços relativos, o país com menor custo de produção poderá se sobressair e
aumentar suas exportações para os países ricos. A outra questão está relacionada a
taxa de câmbio, na maioria dos países em desenvolvimento a taxa de câmbio é
desvalorizada, isso faz com que o custo de oportunidade dos países ricos entre
produzir bens e importar se torna maior. Esses dois fatores trazem um risco aos
países industrializados: a queda do nível de produção, ocasionada pelo aumento da
importação e taxa de câmbio apreciada, tem reflexos nos níveis de empregos e
produtividade das industrias domésticas nos países ricos, o que levaria a um cenário
de desindustrialização, de acordo com o conceito de perda de valor adicionado do PIB
e da participação da indústria no Emprego total.

2.3. Controvérsias

Nassif (2008) desconstrói os argumentos de defesa da nova doença holandesa


e o fenômeno da desindustrialização no Brasil ao analisar a perda de valor adicionado
da indústria e ao sugerir cautela ao interpretar os dados. Nassif () comenta que “para
que a hipótese da desindustrialização manifestada pelos diversos focos da “nova
doença holandesa” seja válida para o caso brasileiro, uma parte expressiva dos
segmentos que constituem as indústrias com tecnologia intensiva em escala,
diferenciada e baseada em ciência deveria mostrar, simultaneamente, perda de
participação no valor adicionado e nas exportações totais da indústria”. Para levantar
esta hipótese Nassif (2008) analisa sobre três perspectivas:

• Composição do valor adicionado na indústria brasileira por tipo de tecnologia no


período 1996-2004 (em %);
• Exportações industriais brasileiras por tipo de tecnologia, taxas de crescimento
médias anuais e participação setorial (em %);
• Exportações: brasileiras segundo a intensidade tecnológica no período 1989-
2005, taxas de crescimento médias anuais e composição setorial (em %);

Nassif (2008) ao analisar os dados, concluiu que a queda de participação dos


produtos industriais, principalmente o de tecnologia intensiva, em relação aos de
recursos naturais nas exportações totais do país, não podem caracterizar um cenário
de desindustrialização, mas o que se pode afirmar é que existe uma mudança no
“padrão de especialização internacional”. A tese de uma reprimarização da pauta
exportadora, como consequência da nova Doença Holandesa, é algo que não se
confirma no Brasil, segundo Nassif (2008)

As evidências empíricas também não confirmam uma “nova doença


holandesa” no Brasil, seja porque não se verificou uma realocação
generalizada de fatores produtivos para os segmentos que constituem
o grupo de indústrias com tecnologias baseadas em recursos naturais,
seja porque não se configurou um retorno vigoroso a um padrão de
especialização exportadora em produtos intensivos em recursos
naturais ou em trabalho. (Nassif, 2008).

Squeff (2012) contribui a essa discussão ao argumentar que parte dos que
professam a tese da desindustrialização estão limitados conceitualmente e baseiam
quase que exclusivamente suas análises na participação do valor adicionado da
indústria no PIB.

Um dos pontos discutidos por Squeff (2012) sobre a industrialização reside


sobre a hipótese dos preços relativos, para isso ele analisa o comportamento dos
“deflatores implícitos da indústria em relação aos demais macro setores e a economia
com um todo”. O autor calculou o deflator da indústria e o deflator do PIB e a
participação da indústria no valor adicionado total para o ano de 1970 a 2009, para
explicar a contradição da hipótese.

Figura 5- Deflator da indústria e o deflator do PIB e a participação da indústria no


valor adicionado total para o ano de 1970 a 2009.

Fonte: Squeff,2012.
Squeff (2012) chega à conclusão de que a relação entre preços e perda de
valor adicionado é contraditória. Nas palavras de Squeff (2012):

Assim, por um lado, verifica-se que a indústria de transformação está


reduzindo sua participação no valor adicionado total de maneira quase
linear desde o final dos anos 1980, o que reforça a hipótese de
desindustrialização, no sentido pejorativo do termo, haja vista o
reduzido nível de renda per capita associado a este processo. Por outro
lado, há uma enorme associação entre os preços relativos da indústria
em comparação aos preços da economia como um todo e sua
participação no valor adicionado desde os anos 1970. Ademais, a
avaliação intraindustrial mostrou que os setores de maior conteúdo
tecnológico mantiveram sua participação no valor adicionado pela
indústria de transformação. Estas duas últimas evidências, por sua vez,
contradizem em alguma medida a referida hipótese. (Squeff,2012).

Outras questões são avaliadas por Nassif (2008) e Squeff (2012) para
identificar contradições nos argumentos dos autores que defendem a
desindustrialização. No entanto, as declarações aqui apresentadas ficam claras
acerca da posição dos autores e como analisam para o mesmo período evidências
empíricas que corroboram para desvalidar a tese da desindustrialização brasileira
prematura.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta de argumentação dos autores (Bresser-Pereira,2008; Bonneli e


Pessôa,2010; Rowthorn e Ramaswamy,1997) acerca do fenômeno da industrialização
compreende o debate conceitual e as evidências empíricas que corroboram com a
tese. A defesa dos autores se concentra em analisar sobre um recorte temporal a
conjuntura econômica e o seu desempenho, sobretudo o acompanhamento de
variáveis macroeconômicas e índices, para que uma possível integração do conceito
às evidências empíricas, seja compatível. As evidências empíricas são alvo de debate
quando as análises compreendem a uma análise parcial das causas e efeitos sobre a
indústria das principais variáveis estudadas (participação do emprego total,
produtividade da indústria, taxa de câmbio, saldo de exportação e importação, índice
de preços relativos). A análise parcial e não pormenorizada dos autores, constrói os
argumentos da tese da desindustrialização brasileira prematura.

A outra linha de autores (Nassif,2008; Squeff,2012) são pesquisadores que não


concordam com a tese da desindustrialização. Um dos debates realizados por eles
está na falta de clareza conceitual acerca do fenômeno estudado e a parcialidade em
que os defensores realizam suas pesquisas.
Não há um consenso entre economistas e pesquisadores da área de economia
industrial sobre um processo de desindustrialização que esteja ocorrendo no Brasil ou
não. As afirmações contemplam as divergências entre os autores.

A conclusão mais segura dessa análise é que os estudos observados fazem


parte dos debates econômicos recentes e nenhuma das visões deve ser julgada de
forma inequívoca.
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