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Renato Silveira - discente do Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural da Universidade do Estado da
Bahia (Pós-Crítica/UNEB) apresenta o trabalho supracitado sob a orientação do Professor Doutor Paulo César
Souza García. Endereço eletrônico: rsghiggi@gmail.com.
Revista Tempo Amazônico
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Nos centros acadêmicos existem vários estudos sobre a temática da tradição oral e da
cultura popular e como elas influenciam nos estudos, os quais antigamente eram oriundos dos
campos da antropologia, sociologia e etnologia, que eram dominados desde o século XIX pela
visão do folclore, que tem passado por muitas mudanças. Ressaltamos que os estudos das
culturas populares e tradições orais são aprofundados a partir do conceito do patrimônio
imaterial e dos estudos culturais que podem abranger muitas áreas. A demanda dessa produção
se distingue das demais, justamente, por contar com o auxílio dos professores, em sala de aula,
facultando a visão das culturas populares nos aportes e olhares sobre o campo de pesquisa.
Algumas práticas culturais precisam sair do loco para ter algum reconhecimento, assim, tem-se
maior conhecimento sobre a cultura em geral e as culturas populares em específico.
Assim o presente estudo obedece aos resultados em pesquisas em fase de processo
contínuo, portanto, o conhecimento produzido até o momento, balizará as direções futuras,
possibilitando a elaboração desta dissertação de mestrado do Pós-Graduação em Crítica
Cultural da UNEB/Campus II, positivado pela doutrina das professoras através dos discursos e 29
questionamentos das suas respectivas áreas em sala de aula. A Universidade nos fornece uma
dimensão do que teremos pela frente, logo, o auxílio das referências bibliográficas foram
indispensáveis para a confecção deste estudo.
As reivindicações ganham frente de mobilidade com os direitos humanos, da posição
das mulheres, dos negros e os direitos gays junto à nova proposta de rádio difusão laboratorial
acadêmica em ciências humanas (Rádio Web – UNEB (Campus II – Alagoinhas), buscando os
elementos linguísticos culturais da comunidade LGBTQI+ para entender e quebrar os
paradigmas comunicacionais modernos.
A história começa bem antes quando a luta por mais direitos e reconhecimento frente
a uma sociedade homofóbica, paulatinamente foi ganhando espaço no meio LGBTQI+, através
das paradas e, posteriormente, iniciou novo processo de comunicação pelas redes sociais; nas
últimas décadas os avanços tecnológicos surgiram como uma realidade que dá voz aos que até
então, eram invisíveis e mudos para essa mesma sociedade, que sempre os perseguiu em nome
de uma orientação sexual diferente da generalidade. Essa modernidade acelerou o processo de
inclusão, causando rupturas na forma de linguagem e comunicação.
As investigações no campo das ciências sociais ocorreram de forma estratégica onde
Nesse caso, tais avanços tecnológicos e sociais foram imprescindíveis para entender
os esboços deste trabalho, no modo de agir e compreender as diferenças biológicas sexuais que
são construções sociais oriundas do ranço patriarcal respaldadas pelo poder e diferenças de sexo
de uma cultura distorcida, machista e preconceituosa. O sucesso ao público LGBTQI+ se
destaca pela forma como a inovação da informação acontece, ou seja, é mais dinâmica por
propagar linguagens atuantes na cultura de gênero, raça, sexualidades e etnias. Por usar os
recursos modernos, nas paradas gays, associados à tecnologia das webs rádios por meio de
O que a autora quis dizer é que a música funciona como um instrumento configurador
de experiência utilizado pela (nesse estudo) comunidade LGBTQI+ que passa por alterações
orgânicas, anatômicas juntamente com forte opressão social, familiar, religiosos onde o
indivíduo se torna critico ou libertário de seu próprio tempo, espaço e segmento social.
Paralelamente, Lima diz que a música exerce um poder sobre as pessoas como veremos a seguir:
O que Lima nos alerta é que os que não se enquadram nos ditames da sociedade, atuam
de maneira performática, ou seja, um produto da sociedade dita o comportamento através de
convenções e conceitos, criando um novo modo cultural de agir. Para quebrar esse paradigma,
o homem/mulher cis deve pensar além de categorias onde o revolucionário se firme como
apreciação. A questão performática acena para o processo de construção linguística, abordando
o sistema como uma declaração do discurso limitado desse modo comportamental.
Ao problematizar o gênero como construção social em relação à masculinidade ou
feminilidade da cultura social, não se pode negar o domínio da heterossexualidade compulsória
e como tal normatizar as relações sociais e individuais entre as pessoas. Comparando o vínculo
da pessoa com o que gostaria de ser, o macho ser uma cópia é o mesmo que ser performático.
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A teoria queer rompe com esse binarismo, na forma de metáfora “cuir” do sistema normatizador
que se diz “dar” sentido das coisas, o fato de não parecer gay, implica no universo binarista.
Tornar-se um sujeito no campo da performatividade é construir o gênero no mundo cultural
homossexual, no estado devir deste sujeito, ele fluí, não precisa estar estático.
Nesse embate, os LGBTQI+ se utilizam dessas mesmas armas contra eles e
ressignificam o signo agora a seu favor, por meio de letras musicais como: “Calunia” (Ney
Matogrosso, 1983), “Ser um homem feminino” (Pepeu Gomes, 1983), “Homens e mulheres”
(Ana Carolina, 2006), “Obrigado não” (Rita Lee, 1997), “O tempo não para” (Cazuza, 1988) e
algumas internacionais como: "I Want to Break Free" (Queen, 1984), "It’s Raining Men" (The
Weather Girls, 1982), "Dancing Queen" (ABBA, 1976), "I Will Survive" (Gloria Gaynor, 1978),
"A Little Respect" (Erasure, 1998), "Y.M.C.A." (Village People, 1979) entre outras, são
verdadeiros hinos gays cantados por toda comunidade LGBTQI+.
É possível utilizar o pensamento de Zumthor (2010, p. 40) “a representatividade da
performance como é o caso das paradas gay em todo o país, bem como as webs rádios, as redes
sociais”, associa-se à ideia de performance de Butler quando os estudos entre oralidade e poesia
medieval, identificam a poesia oral como rito de linguagem, fazendo da comunicação um
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perder com o excesso de simulacro, ele se firmará como sujeito impossibilitando-o de fazer a
história e, neste caso, o simulacro se realizará encima das grandes narrativas que levam apenas
a reprodução. Conforme Hallbwacs (1990), ressignificar os acontecimentos através de marcas
tal como o nazismo e o fascismo das mídias controladoras (até hoje), ou seja, isto é, pensar as
demais e nem sempre explicitadas razões de como essa degradação consubstanciou-se,
sobretudo, no corpo.
De acordo com Barbero (2002, p. 119), “as alternativas de comunicação popular
devem ser unicamente marginais às grandes mídias, que não podem existir aquelas alternativas
que envolvem as grandes mídias, ou as mídias maciças”. O texto do autor pode ser utilizado
por dialogar com as pesquisas referentes à violência aos LGBTQI+, e à maneira como eles
respondem tais disparates na forma de protesto nas passeatas gay. Percebemos que não era mais
uma reprodução e sim uma terrível inovação na propaganda comunicativa, ao contrário do que
as novidades da linguagem e a forma como essa comunicação oferecem, as publicações dos
periódicos são doentias, aludindo à violência e a forma como ocorre vai de encontro a dignidade
dessas pessoas.
Para Thompson (1992) o jornalismo sério e isso inclui o modo como ocorrem as
entrevistas, acontece pela importância da averbação, onde o saber e memória são dignos ou não
de ser compartilhado, para isso é preciso que esses jornais tenham acesso à tecnologia e saber
O processo cria novos estilos de vida, novas culturas, muitas vezes baseados
em elementos de uma cultura amostrada e outra, como música rap que a
juventude negra brasileira incorpora em seus próprios projetos antirracistas.
O autor cita a música em seus diversos segmentos e o poder que ela tem sobre as
pessoas, não seria diferente nas músicas de uma parada gay e o seu estilo único de envolver e
ser usado como porta voz dos LGBTQI+. Ainda segundo Oliveira (1992), a música é um
fenômeno físico inserido as concepções culturais como uma interação social de acordo com o
comportamento aprendido, sob forma simbólica comunicacional entre um indivíduo ou um
grupo. O procedimento da Crítica Cultural é peculiar pela maneira como se apresenta e por ter
uma identidade própria que fortalece possíveis resultados e significâncias; quando trazemos
esses elementos à baila, visualizamos o desempenho dos corpos, estes sustentam e constroem
como via de fluência no sentido performático, nesse contexto só há uma saída que permite
decorrer o trânsito: o gênero não é performativo, ele é o foco da imagem onde é fabricado
O autor nos índica a fala, a música como algo usado por grande parte da comunidade
LGBTQI+ e os negros como ferramenta no combate à discriminação racial e sexual, tais eventos
são possíveis graças as mídias, como as redes sociais no sentido de dar voz e se fortalecerem.
Alós (2018) apud Wittig (2011, p. 438) quando diz que: “a sociedade heterossexual oprime os
LGBTQI+ e os que são marcados pela diferença que oprime mulheres e homens que se
encontram em posições de dominação”, assim a política de dominação refere-se à identidade
usada de modo depreciativo pelo feminismo, antirracismo e antiheterossexualismo, tudo em
concordância com a justiça social e os movimentos de esquerda que devem fazer frente a seus
desafios. As lutas sociais associadas à música têm o poder de transformaram o campo social da
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sexualidade. Segundo Pucci (2006, p. 8):
Há várias formas de sua expressão vocal que poderiam ser configuradas como
estilos ou gêneros musicais, se aplicássemos a classificação ocidental-
européia. Seriam mitos contados por pajés (wãwãnei), cantigas de amor
(kaharei), cantigas de mutirão (gamangaré), cantigas das almas (peixoei), que
fazem parte de ritos do povo Suruí e configuram um refinado sistema ritual.
Em vários casos, há palavras que não são compreendidas pelos mais jovens,
porque são arcaísmos; em outros casos, como numa linguagem mística, o som
de uma palavra importa mais do que o seu significado lingüístico, cuja
precisão semântica responde a um plano paralelo.
É justamente essa mística que pode-se atribuir ao encanto de um evento LGBTQI+ nas
grandes cidades, como é o caso das paradas gays, há ritmo, ordem, desejo, esperança, mesmo
numa batida estranha ao nosso idioma, todos falam a mesma linguagem, ou seja, a linguagem
e a performance do corpo demandando algo que acrescente e valorize as pessoas envolvidas
nesses eventos.
De acordo com Haesbaert (1997), o sujeito precisa rever as fronteiras e compreender
que num território ele tem poder, ele se desloca e por questão de logística, dentro desse território
ele pode não se sentir daquele lugar, ele pertence a um território de identidade que são
organizações políticas, ele é uma construção, nem todos seriam identidades culturais por causa
Uma das características da coletividade na música segundo Makl é a de que, nas artes
musicais negras há um drama individual e coletivo, ninguém é deixado sozinho, existe um
tecido cultural, todos participam, as pessoas não ficam sós, e mesmo com tanta variedade, isso
não apaga o individualismo, ele existe, mas a dualidade impera mais, portanto, é notório o papel
da linguagem e sua importância, mas é preciso ter cautela para não transformar o discurso em
uma armadilha de gênero. A exemplo podemos citar a música: “O canto das três raças” (Clara
Nunes, 1974):
Ninguém ouviu
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A letra da música representa uma forma de protesto na voz dos negros e dos índios, e
questiona qual o papel da identidade, como ela surgiu, e baseado nessas mazelas o país foi
forjado em cima de sangue e dor. Ao mesmo tempo, ela trabalha a batida sonora desses povos
oprimidos através da sua musicalidade, do seu ritmo para que com essa cadência, sirva de
contexto para as vozes não se calarem e protestarem por seus direitos, atualmente a comunidade
LGBTQI+ se utiliza dessas batidas na versão eletrônica.
Como mestrando em Pós-Crítica e na posição de pesquisador imagino que este estudo servirá
de referência para edificar novos caminhos às pessoas que sofrem preconceito por pessoas
próximas e principalmente, por colidirem com suas orientações sexuais, seu modo de agir, sua
maneira de se fazer presente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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