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Por Ocimara Balmant, estadao.com.

br, Atualizado: 15/5/2011 0:09

Emergentes, famílias das classes


D e E investem em escola
particular

Marcio Fernandes/AE

"Longe da rede pública. Gecielle Santos, de 6 anos, aluna do 1º ano do ensino


fundamental, observa parquinho da Escola Oliveira Ferreira, em Perus"

ESPECIAL PARA O ESTADO

No sobrado alugado, a aula de jazz acontece na garagem. A quadra foi


construída no quintal, onde ficavam os pés de frutas. Nos quartos, uns maiores
e outros bem pequenos, funcionam as salas de aula. Essa é a escola Oliveira
Ferreira, em Perus, a 30 quilômetros do centro de São Paulo.

A mensalidade do 1.º ano do ensino fundamental custa R$ 190, mais baixa do


que um curso de inglês em um bairro paulistano de classe média, mas do
tamanho que cabe no bolso dos moradores da região. Uma clientela que inclui
filhos de faxineiras e frentistas.

Depois da ascensão da classe C, é a vez da D investir na escola particular.


Pesquisa recente do Ibope Inteligência mostra que as classes D e E
representam hoje 1,6% nas estatísticas de gastos com educação no País. Uma
outra tabulação, do Instituto Data Popular, especializado em baixa renda,
mostra que 21% dos estudantes dos ensinos fundamental e médio da rede
privada pertencem às classes D e E.

É o caso de Gecielle Santos, de 6 anos, aluna do 1.º ano. Filha de empregada


doméstica e coletor de lixo, é a primeira da família a estudar em uma escola
paga (veja depoimento nesta página).
'A média de preços na periferia é de R$ 300. Esse novo público mora na
periferia da periferia e começa a ter a educação como o grande sonho de
consumo', explica Benjamin Ribeiro da Silva, presidente do Sindicato dos
Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (Sieeesp). Ele estima que a
taxa de inadimplência é a mesma de bairros ricos: 7%.

O esforço financeiro obedece a diversas razões: a preocupação com a


segurança, a ideia de que o ensino será melhor e, em alguns casos, a falta de
vagas em escolas públicas. 'A questão da segurança é a principal. O pai pensa:
'Lá meu filho não vai sofrer esse tal de bullying, não vai usar drogas'', diz
Renato Meirelles, diretor do Data Popular. 'Quanto ao ensino, mesmo com
dificuldade de avaliar se é bom ou ruim, os pais acreditam que é melhor.'

Uma volta pela cidade confirma a demanda. Assim como em Perus, escolas de
bairros da extrema zona sul, como Valo Velho, e da zona leste, como São
Mateus, funcionam no mesmo modelo: com mensalidades menores que R$ 200,
instaladas em prédios improvisados e crescendo conforme os alunos são
promovidos de série. A escola de Perus, por exemplo, oferece até o 6.º ano. Em
2012 vai oferecer o 7.º, para não perder os alunos.

Nesses colégios, o salário dos professores é padrão. Paga-se o piso da


categoria: R$ 845 por meio período. 'Tenho professores formados, mas também
dou oportunidade para quem tem o magistério e está na faculdade', diz Lidiane
Gonçalves Candeias, diretora e proprietária da Escola Crescer, que fica no Valo
Velho.

Apostilas. No colégio, que tem 160 alunos, a mensalidade do 1.º ano custa R$
158 e a diretora se orgulha de poder usar o material do Sistema Objetivo. Na
primeira tentativa, assim que adquiriu o colégio, em 2007, Lidiane não
conseguiu o credenciamento por problemas de estrutura. Após algumas
reformas, veio o aval: 'Aqui, nos Jardins ou em Alphaville, é tudo a mesma
coisa. Temos o mesmo material e os professores recebem o mesmo
treinamento do sistema'.

No prédio alugado, de três pavimentos de escadaria, Lidiane tem feito


melhorias pontuais: instalou câmeras em todas as salas de aula e, em breve,
vai inaugurar a brinquedoteca e a cantina. 'Mesmo sabendo que o filho está
seguro dentro dos nossos portões, o pai quer acompanhar. Muitos não têm
internet em casa, mas veem o filho pelo computador do trabalho.'

Concorrência. Além do olhar para dentro das grades bem trancadas, os donos
precisam estar atentos à vizinhança. 'A concorrência é cruel. Pegam meu aluno
na rua, perguntam quanto ele paga e oferecem mensalidade menor. Até
professores e funcionários são aliciados', diz Lidiane.

É a mesma preocupação que acomete André de Araújo Mendes, coordenador da


colégio Limiar, na região de São Mateus, zona leste. A escola existe há 16 anos
e tem visto a concorrência crescer. Com espaço para 130 alunos, está com 80
neste ano. Resultado da formatura dos estudantes do 9.º ano e da vizinhança
esperta. 'Nosso prédio não impressiona. Há pais que veem outro, com a
fachada mais bonita, e acaba escolhendo.'

Como é difícil baratear ainda mais a mensalidade (R$ 180 para o 1.º ano do
fundamental), a escola quer trocar o material do sistema Universitário por um
próprio. 'Não temos margem nenhuma na mensalidade. Então, tentaremos
diminuir o preço do material didático para não perder alunos e conquistar
outros.'

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