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MEMÓRIAS DE FÉ:

GÊNERO, ESCRAVIDÃO DOMÉSTICA E CRIADAGEM LIVRE NOS


TEXTOS DE MEMORIALISTAS E ROMANCISTAS NO PÓS-ABOLIÇÃO1

Maciel Henrique Silva2

Resumo:
O artigo discute textos de escritores e escritoras (romances, memórias e outros gêneros), com o objetivo
de compreender o comportamento trabalhadoras e trabalhadores domésticos, as práticas religiosas, bem
como as relações entre fé e mundos do trabalho doméstico nas últimas décadas da escravidão e no pós-
Abolição, nas cidades de Recife e Salvador.
Palavras-chave: gênero, trabalho doméstico, mundos do trabalho
Abstract:
This article discusses texts of male and female writers (novels, memoirs and other genres), in order to
comprehend the behavior of domestic workers, male and female, the religious practices, and the relation
between faith and domestic work worlds in the last decades of slavery and in the post-abolition period in
the cities of Recife and Salvador.
Keywords: gender, domestic work, world of work

Introdução
Escritoras/es brasileiros/as, memorialistas, construíram representações do
comportamento religioso de escravas/os domésticas/os e de criadas/os livres e libertos,
das últimas décadas da escravidão e dos anos pós-Abolição. Pretendo examinar essas
representações de homens e mulheres que projetaram suas expectativas a partir de
valores religiosos, e construir uma leitura das práticas religiosas das trabalhadoras/es
domésticas/os. Esse exame pretende incitar o debate sobre as relações entre senhores/as
e escravas/os domésticos, entre patrões e patroas e suas criadas/os, para avaliar em que
medida práticas e discursos religiosos eram partilhados e negociados para fins diversos.
Escravas e demais criadas adotavam práticas e ritos religiosos da família senhorial, da
família de seus patrões? Faziam leituras próprias das práticas católicas, ressignificando-
as? Pretas, pardas, crioulas e brancas adotavam práticas advindos de religiões de matriz
africana? Acionavam o sagrado como mecanismo de resistência cultural e social?
Criados homens também eram tidos por devotos?

1
Este texto é uma versão modificada de trabalho inédito apresentado no VI Simpósio Escravidão e
Mestiçagens: religiões e religiosidades (2012), em Vitória da Conquista, sob o título “Práticas religiosas
de escravas domésticas nos textos de memorialistas e romancistas dos anos pós-abolição”.
2
Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco.

137
Criadas recifenses, segundo José Lins do Rego, tinham fama de fazer feitiços
contra patrões, causando-lhes a morte; segundo romances de Mário Sette, durante as
missas, no interior das Igrejas e nas cercanias, as criadas aproveitavam para falar de
patrões maus pagadores, trocando informações preciosas sobre empregadores pouco
honestos em questões salariais.3 Em Salvador, lavadeiras libertas e escravas com
trânsito nos terreiros de candomblé, mediavam a relação entre os orixás e os brancos
sedentos de ajuda espiritual para resolver problemas terrenos.4 Portanto, o eixo de
minhas reflexões parte do modelo religioso senhorial católico para perceber nuances,
negações, superações e adoções desse modelo por parte dos trabalhadores domésticos.

Andar com fé eu vou: uso social do sagrado


A fé, o sagrado, as experiências religiosas em geral, o mundo mágico, não
estavam descolados da vida cotidiana de escravos, libertos e pobres livres no Brasil do
final do século XIX e início do XX. Em um complexo jogo de tensões, ritos católicos e
ritos do candomblé constituíam mecanismos eficazes de ascensão social, quando não de
resistência à condição subalterna. O sagrado era um recurso utilizado por africanos e
crioulos em sua relação com o mundo que os brancos imaginavam inventar sozinhos.5 O
jogo é complexo: brancos baianos protetores de candomblés recorriam ao sagrado para
“amansar” escravos tidos como “insolentes”. Por outro lado, escravos fugiam para
servir melhor a seus deuses do que a senhores terrenos.6 O feitiço corria solto, atingindo
brancos e pretos, livres e escravos. Escravas/os domésticas/os e criadas/os livres podiam
também demonstrar zelo sincero ou teatralizado pela fé católica, participar dos ritos
tradicionais e, com isso, ganharem a simpatia de senhoras e patroas mais devotas. Os
trânsitos e mobilidades culturais não têm uma única direção. Ao contrário, negras e
negros africanos, crioulas e crioulos, brancas e brancos de sobrados e de casas-grandes
poderiam esposar escolhas culturais imprevistas. Discursos e representações acerca da

3
Ver REGO, José Lins do. Doidinho. [1933]. 25ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1983, p. 55-
56; e SETTE, Mário. Seu Candinho da Farmácia [1933]. In SETTE, Mário. Romances Urbanos.
Recife: Ed. do Organizador, 2005, p. 140.
4
MARQUES, Xavier. O feiticeiro. Rio de Janeiro: Editora Leite Ribeiro, 1922, p. 145.
5
Por usos sociais de uma dada cultura, não entendo uma relação mecânica e funcionalista entre esquemas
culturais, de um lado, e as ações dos indivíduos, por outro. Penso, como Sahlins, que a cultura é mais bem
compreendida quando praticada, isto é, na ação, na performance dos praticantes. Praticantes que, em
geral, selecionam fragmentos de “sua” cultura em contextos situacionais, com motivações e projetos
próprios, o que pode até reinventar as próprias estruturas, ver SAHLINS, M. Ilhas de História. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003, p. 185-186.
6
REIS, João José. Domingos Sodré, um sacerdote africano: escravidão, liberdade e candomblé na
Bahia do século XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 157 e p. 186.

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fé e da religião costumam até ter um dado sentido de pureza, enquanto, todavia, revelam
práticas e interpretações bem mais diversas e, para alguns, inquietantes.7
A religiosidade católica, por meio de práticas costumeiras ou por meio de ritos
oficiais, pontuava muitos dos gestos e condutas da população brasileira nas últimas
décadas do Império e início da República. As mudanças políticas e sociais do período,
como a mudança do padroado régio para a separação entre Igreja e Estado, não
significaram, a rigor, uma descatolicização geral ou uma ampla laicização das
condutas.8 As famílias brasileiras adotavam posturas, senão rigidamente ultramontanas,
pelo menos marcadas pelo catolicismo popular, pela tradição secular, com os filhos
levando consigo “a medalha de Nossa Senhora ou de algum santo ao pescoço, à qual às
vezes se juntava uma figa ou um dente de jacaré contra o mau-olhado.”9 A República
nascente, legalmente laica, enfrentou forte resistência de associações católicas, de
educadores e educadoras que viam as mudanças em voga como sinal de desmoralização
crescente, como risco para a ordem como um todo – incluída aqui a ordem doméstica.
Senhoras consideradas virtuosas, como Amélia Rodrigues, Anna Ribeiro
Bittencourt, Inês Sabino, originárias do Recôncavo Baiano, algumas vindas de famílias
possuidoras de escravos, forjaram discursos moralizantes de teor católico que, por um
lado, execravam a escravidão; por outro, buscavam aparar arestas raciais e preconceitos
fundados na cor da pele. Inês Sabino anuncia Cristo como a voz que redimiu todos e
que chamou de “meu irmão!”: “Ao rico, ao pobre, ao cativo”. 10 Seu poema, publicado
em 1885 em homenagem ao aniversário da libertação dos escravos do Ceará, na revista
da Sociedade Ave Libertas, clube abolicionista fundado por mulheres pernambucanas,
transmite uma sensibilidade regional quanto ao tema da libertação dos escravos, com
uma linguagem marcada por imagens cristãs de bondade, perdão, fraternidade.
Em Pernambuco, Ignez Pessoa e Maria Amélia de Queiroz escreveram poemas e
usaram a oratória em nome da libertação dos escravizados. Libertação nomeada,
religiosamente, de redenção. Uma redenção de irmãos. Se o vocabulário religioso
prepondera em Ignez Pessoa, Maria Amélia mistura a esse vocabulário o discurso
político de fundamentos liberais e iluministas: “A escravidão, meus Srs., disse

7
PAIVA, Eduardo França. “Histórias comparadas, histórias conectadas: escravidão e mestiçagem no
mundo ibérico”. In: PAIVA, Eduardo França; IVO, Isnara Pereira (orgs.). Escravidão, mestiçagem e
histórias comparadas. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG; Vitória da Conquista:
EDUNESB, 2008, p. 14-25.
8
FREYRE, Gilberto. Ordem e progresso. [1957]. 6ª ed. revista. São Paulo: Global Editora, 2004, p. 802.
9
Idem, p. 182.
10
ALVES, Ívia. “Escritora baiana e a abolição”, p. 31. In: FERREIRA, Luzilá Gonçalves, et alii. Suaves
Amazonas: mulheres e abolição da escravatura no nordeste. Recife: EDUFPE, 1999, p. 17-40.

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Montesquieu, é tão contrária ao direito civil como ao natural. Qual a lei civil, que
impediria a um escravo de fugir a sua condição? Com a liberdade, a moral consolida a
religião, com a escravidão, a religião falseia a moral.”11 A escravidão não era só uma
instituição sem sustentação jurídica, era ainda uma instituição imoral, dentro da qual a
religião não poderia gerar bons frutos. Maria Amélia, com uma retórica mais bem
elaborada e complexa, fundamentava seus discursos abolicionistas em personagens
históricos, os “intrépidos heróis” pernambucanos, erguidos à condição de quase
semideuses.12 Ainda em Pernambuco, os sentimentos humanitários e “femininos”,
segundo Gonçalves, tomavam evidentes sinais cristãos. 13 O léxico religioso se encontra,
por exemplo, no excerto “Do rosário irisado da liberdade caiu mais uma Ave Maria
cadenciosa e cristalina.” Amor, caridade, verdade, consciência. Mulheres de grupos
médios estavam articulando uma incipiente participação na vida pública. A fé cristã, a
religião, a importância da figura da mãe na educação familiar, eram artefatos
importantes para justificar essa politização.
Algumas dessas mulheres construíram uma narrativa peculiar da escravidão,
quando se referiam à memória de suas próprias famílias. Era preciso humanizar o
cativeiro em suas casas para não entrar em contradição com o discurso abolicionista em
voga, e não prejudicar a construção de relações sociais harmônicas no contexto do
trabalho livre. Anna Bittencourt é, sem dúvida, o nome que mais se destaca como
escritora. Do presente vivido pela escritora já anciã, nas primeiras décadas do século
XX, emerge um passado místico-religioso-familiar que toma forma em cenas
patriarcais: “O cantar dos pássaros era o relógio que fazia erguer do leito toda a família.
Ao lado da sala, estava o oratório junto ao qual iam ajoelhar-se o chefe da família, a
esposa, as filhas e todos os escravos.”14 A escritora não deixa dúvidas: “todos os
escravos” eram socializados na fé católica. Em suma, não eram tratados como animais,
abandonados ao trabalho e à própria sorte. O chefe da família, avô da romancista,
assume o lugar de honra no rito e dá o exemplo. Anna Bittencourt recua seu discurso ao
final do século XVIII e primeira metade do XIX, quando “nesses tempos patriarcais,
existiam sólidas afeições entre o proprietário e seus agregados, originadas nestes pela
gratidão aos benefícios recebidos e naquele pelo sentimento natural que nos inclina

11
FERREIRA, Luzilá. “A luta das mulheres pernambucanas”, p. 65. In: FERREIRA, Luzilá Gonçalves.
et alii. Suaves Amazonas. Op. cit., p. 41-109.
12
Idem, p. 66.
13
Idem, p. 105.
14
BITTENCOURT, Anna Ribeiro. Longos serões do campo. 2 Volumes. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1992, p. 142 (primeiro volume).

140
àqueles que beneficiamos”.15 Sua família se encontra, então, em plena escravidão, mas
agindo com os princípios cristãos que amenizariam, segundo ela, os rigores da vida dos
escravizados. Por volta de 1920, contudo, embora no mesmo lugar, cenário rural
outrora romantizado, a situação se encontra mudada: “Hoje nem mesmo aí se goza desta
tranquilidade, porque a luta pela vida se tem generalizado por toda a parte.” 16
Há cenas ainda mais exemplares. O avô é lembrado como aquele que, com fé
firme, era o portador da “bênção patriarcal que nos lançava com a mão solenemente
estendida, que íamos, após, respeitosamente beijar.”.17 Também sua tia, Maria, mantinha
uma relação cordial com as escravas. Maria pediu que rezassem missas e novenas em
nome de sua alma, mas insistiu: “alforriem Josepha que, além de haver sempre me
servido bem, foi de extrema dedicação nos meus últimos trabalhos, velando todas as
noites ao pé de mim.” Maria, a acreditar na narrativa da mãe da escritora, também
“empregava” escravas costureiras e rendeiras para “confeccionar rendas de filó
bordado”, e, com o dinheiro, ajudava os pobres.18 Não fica claro, porém, a agência das
escravas nisso tudo. No primeiro caso, o de cuidar de sua senhora fielmente até a morte,
a relação é marcada por laços afetivos sustentados pela fé (fosse fé em Deus, fosse fé no
recebimento da alforria, ou ambas as coisas); no segundo, a ação de fé é unicamente da
senhora, que faz a caridade oculta por meio do serviço de escravas contratadas.
Mas é da mãe da escritora que surge o modelo mais perfeito de administração
doméstica pautada em princípios cristãos. Sua mãe jamais teria usado chicote ou
palmatória para castigar, e ela mesma teria citado para a filha fragmentos do texto A
Educação de Cora, do Dr. Lino Coutinho, para lhe guiar: “Nada mais feio do que ver a
mulher, que deve ser o símbolo da clemência e da piedade, armada de um instrumento
despedaçador da carne humana, a corrigir impiedosamente um escravo indefeso.” Era
também do conhecimento de D. Anna Maria da Anunciação o clássico livro americano
A cabana do pai Tomás, de onde recitava a máxima “Tratem-nos como homens, e eles
procederão como homens; tratem-nos como cães, e eles procederão como cães.”. Não
era obrigação da matriarca devota apenas conferir tratamento humano aos escravos. Era
preciso, além disso, aproximá-los da fé católica. A lembrança emocional da escritora
evoca a mãe sentada em uma cadeira baixa, de frente para o estrado em que as escravas
domésticas costuravam e faziam renda. A matriarca virtuosa, então, “falava-lhes
benevolamente, muitas vezes contando-lhes histórias, quase sempre tiradas da Bíblia,
15
Idem, p. 145, primeiro volume.
16
Idem, p. 167, primeiro volume.
17
Idem, p. 178, primeiro volume.
18
Idem, p. 24, segundo volume.

141
em que era muito versada.”.19 A escritora concorda. A pregação religiosa, seguida de
uma vida virtuosa e exemplar, seria suficiente para uma eficiente administração
doméstica. Segundo as lições deixadas pela mãe, os criados respeitariam mais a dona-
de-casa virtuosa do que a dona-de-casa autoritária e que usava de violências físicas.
A memorialista não tinha dúvidas de que era possível conviver harmonicamente
com servos domésticos bons e fiéis, dignos de confiança, porque ensinados e
doutrinados por senhores e senhoras moralmente superiores. Para demonstrar a verdade
dos princípios de gestão doméstica, conta que, pouco tempo antes da escrita de suas
memórias, morrera em sua casa, já idosa, a ex-escrava doméstica crioula chamada
Marciana, educada pelos “conselhos e exemplos de moral e virtude” transmitidos pela
matriarca, e que “Por sua honestidade e nobres sentimentos, além da alforria, mereceu
ser considerada como membro da família”. Marciana seria portadora de “Honra,
bondade, dedicação”. A escritora compara a crioula Marciana à sua ama-seca, a mulata
Geralda, que também portaria as mesmas virtudes. Uma senhora da família da
memorialista teria dito, reverberando o típico racismo brasileiro: “Geralda, você só por
engano da natureza saiu mulata e escrava; não conheço senhora branca de sentimentos
mais elevados que os seus.” Outra ex-escrava, chamada para “auxiliar as criadas de casa
em um trabalho a que eu assistia”, teria solicitado à escritora que lhe contasse histórias
bíblicas, como sua mãe fazia quando ela costurava. Histórias que ela, segundo a
memorialista, não só lembrava como compreendia o significado.20 Os exemplos dados
são suficientes para evidenciar que patrões nos primeiros anos do século XX,
preocupavam-se com a possível perda de autoridade moral no interior das famílias.
Anna Bittencourt está envolvida em uma cruzada social fundamentada em um
humanismo cristão, no sentido de forjar patrões melhores e criados livres obedientes no
pós-abolição. Essa cruzada reforçaria o ensinamento católico no lar e permitiria a
harmonia entre criados/as e seus “protetores”. A escritora é convicta de que o reforço do
catolicismo era o melhor antídoto contra a emergência de dramas domésticos.21
A educadora Amélia Rodrigues não pensava tão diferente. Nascida em 1861, em
Santo Amaro, Recôncavo Baiano, era filha de pequeno agricultor e Escrivão de Paz.

19
Idem, p. 32 e p.33, segundo volume. Não importa aqui que a autora de A cabana do pai Tomás,
Harriet Elizabeth Beecher Stowe (1811-1896), fosse filha de um pastor evangélico dos EUA. A
mensagem cristã de piedade, amor, fraternidade, as lições edificantes em si, seriam aplicáveis do mesmo
modo e com os mesmos resultados.
20
Idem, p. 33 e p. 34, segundo volume.
21
SILVA, Maciel Henrique. Domésticas criadas entre textos e práticas sociais: Recife e Salvador
(1870-1910). Tese (Doutorado em História), Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2011, p. 127-137,
p. 171.

142
Como Anna Bittencourt, a educadora e escritora esposava ideias políticas moderadas,
conciliando conquistas advindas das mudanças na condição das mulheres com o ideal
de família patriarcal, instituição de lugares sociais bem definidos para os gêneros, lugar
de exercício da educação cristã, sob responsabilidade feminina. Religiosidade cristã-
católica compreendida como antídoto de todo espírito revolucionário, anárquico, avesso
à ordem e à obediência. A mestra e ativista era uma humanista. A sua maneira, era
também feminista. Até porque o feminismo não pode ser compreendido como um
“bloco monolítico e homogêneo de discursos e práticas”.22
No livro Mestra e Mãe, publicado em 1898, há um silenciamento inquietante
sobre relações entre patrões e sua criadagem. Como contos morais que formam um todo
harmônico, as cenas fictícias ocorrem em um lugar distante de Salvador, no sertão
baiano, onde uma mestra bondosa se instala para cumprir sua missão civilizatória. Em
dado momento, contudo, menciona-se uma antiga mulher indígena que fora escravizada,
a “Cabocla Maria”. Não se diz se para serviço doméstico ou outro. A educadora utiliza a
imagem da cabocla para pregar seu humanismo cristão e construir um discurso contra
“os preconceitos de raça e de cor que separavam profundamente a classe dos escravos
libertos dos livres”. A própria cabocla vivia isolada porque as pessoas, demonstrando
ignorância do uso medicinal das ervas de origem indígena, consideravam-na feiticeira.
A educadora exalta as virtudes da cabocla laboriosa, humilde, vivendo numa singela
rocinha em uma casa pobre, mas limpa, ensinando sua filha “a trabalhar, a servir, a
obedecer a todos.”23 Escolher uma mulher do campo, uma “valente ex-indígena”, contar
uma “estória” exemplar daquela que agora era chamada de “ex-selvagem”,24 também
tem seu lado educativo para as mulheres ricas soteropolitanas, tidas por indolentes.
Nada muito diferente do teor dos contos, memórias e romances de Anna Bittencourt. A
lição que fica é que a “democracia cristã” deve prevalecer no trato dos subalternos, sem
atenção às características raciais. A obediência e a humildade dos subordinados era o
mínimo que se podia exigir do trabalhador modesto e sem ambição que não a de
cumprir uma vida de trabalho e serviço leal. As duas escritoras parecem ter encontrado

22
Como outras mulheres baianas e pernambucanas, as “atividades femininas com fins caritativos”
abriram um importante espaço público para troca de experiências e ideias, como bem compreendeu Rago.
Segundo ela, o “reconhecimento público” e a “existência pública” das mulheres, talvez só tivessem sido
possíveis através dessa socialização feminina em torno de temas religiosos e morais. Ver RAGO,
Elisabeth Juliska. Outras falas: feminismo e medicina na Bahia (1836-1931). São Paulo: Annablume;
Fapesp, 2007, p. 53 e p. 218.
23
RODRIGUES, Amélia. Mestra e mãe. Bahia: Livraria dos Dois Mundos Editora, 1898, p. 141-153.
24
Idem, p. 156.

143
uma fórmula fácil para eliminar dos lares conflitos de classe e de raça, uma muralha
religiosa contra ideias europeias, contra as então designadas “doutrinas socialistas”.25
O silenciamento em Mestra e Mãe no tocante à relação de trabalho doméstico é
apenas aparente. Não é uma fuga do tema da domesticidade. As leitoras, que seriam
educadoras (e também patroas), moças jovens e senhoras casadas, podiam se inspirar
nos exemplos da mestra que age, a todo instante, com espírito conciliador e pacificador,
orientando moralmente aos que fogem dos princípios cristãos. Não era assim que as
patroas deveriam tratar as criadas negras, mestiças, caboclas ou de qualquer origem? O
tom universalista do discurso pretende elidir considerações pejorativas ligadas à
qualidade/cor e à origem dos trabalhadores domésticos e postular que as patroas, para
serem dignas do trabalho leal de suas criadas livres, teriam de oferecer uma
contrapartida por meio de atos e falas orientadas para uma moral superior, educativa.
A luta das escritoras baianas e pernambucanas era no sentido de acomodar as
mudanças operadas pela Abolição da escravidão, pela proclamação da República e pelo
aporte de novas ideias europeias. Segundo Márcia Maria da Silva Barreiros Leite, essas
mudanças não alteraram significativamente os “padrões de sociabilidade” baianos,
marcadamente hierárquicos.26 De todo modo, sobre temas como amor, casamento,
família, domesticidade, as mulheres de elite e de extratos médios estavam esboçando
uma presença pública efetiva. No início do século XX, e mesmo antes, havia contatos
intelectuais importantes entre escritoras de Recife e da capital baiana. Em 1903, no
Recife, a revista O Lyrio divulgou o trabalho de Anna Bittencourt e de Francisca
Barreto Praguer, esta última a primeira médica do país. Barreiros Leite considera
Pernambuco um “pólo de contato” de intensa troca cultural com os baianos.27
“Levei-a, filialmente, à cova”28
Gilberto Freyre afirmou, e muitos depois dele, que os escravos domésticos se
distinguiam dos escravos das plantações pela maior “assistência moral e religiosa”
recebida.29 Batizados e casamentos eram estimulados, formando-se verdadeiras famílias
de escravos. Famílias que tomariam os nomes de seus senhores. Não disponho de dados
25
Idem, p.157-158. Para notar a proximidade entre as visões de Amélia Rodrigues e Anna Bittencourt,
ver RAGO, Elisabeth J. Op. cit., p. 220; as duas escritoras foram colaboradoras em importante revista
católica, A Paladina do Lar, publicada em Salvador entre 1910 e 1917. Ver LEITE, Márcia Barreiros.
Entre a tinta e o papel: memórias de leituras e escritas femininas na Bahia (1870-1920). Salvador:
Quarteto, 2005, p. 248 e p. 283.
26
Ver LEITE, Márcia Barreiros. Entre a tinta e o papel. Op. cit., p. 276.
27
Idem, p. 297-299.
28
Tomei de empréstimo essa frase terna do escritor Mário Sette. Ver SETTE, M. Memórias íntimas:
caminhos do coração. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1980, p. 61.
29
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. [1933]. 2º Tomo, 11ª ed. Rio de Janeiro: Livraria José
Olympio Editora, 1964a, p. 630.

144
para discutir o alcance desses casamentos sancionados pela norma no interior de casas e
sobrados, e não devo me arriscar a fornecer impressões. Mas posso dizer, avançado o
século XIX e com o crescimento urbano, que muitas criadas eram mulheres solteiras ou
amasiadas, algumas com filhos deixados em outra moradia ou levados consigo para o
ambiente de trabalho caso os patrões consentissem.30
Deixando o tema dos matrimônios para outro momento, pode-se partir para outras
pistas. O escritor pernambucano Mário Sette, descendente de família instruída, mas sem
grande fortuna, rememora momentos cruciais de sua vida. Homem marcado por
emoções e um romantismo todo peculiar, observava negros e pardos da cidade do
Recife e de sua casa, com aquele olhar ao mesmo tempo pitoresco e afável, quando não
com uma afetividade especial e, talvez, ingênua. 31 Ele parece convicto de que, em sua
casa, o “povo da cozinha”, como ele nomeava os criados, era parte integrante de sua
família, um “povo” que lhe trazia alegria, sentimento de estabilidade doméstica. Ele
transmite a sensação de integração e amizade real entre si e os “serviçais” tanto em seus
romances, quanto em suas memórias:
O meu “lá por dentro” era quase sempre no meio dos serviçais. Gostava de
ouvir histórias contadas pelas pretas velhas, ora sentado no colo, ora ao lado,
no chão. E a respeito de pretas, tive mais de uma ama-de-leite. Uma sinhá
Eufêmia de quem não guardei lembrança e uma sinhá Leonor que vim
conhecer já mocinho. Minha verdadeira mãe-preta foi, no entanto,
Sinh’Aninha. Ama seca, porém. Perdera a filha de bexigas ruins e fora lá para
nossa casa, transferindo para mim todo seu amor maternal. Adorava-me.
Dava-me banho, fazia-me as papas e os pirões de ovo, ficava junto de minha
cama até que adormecesse, vigiava-me constantemente os passos, suportava-
me as “judiarias” e... escondia-me as trelas.32
Relação cúmplice e íntima do menino Sette, que se insinua um tanto treloso, e
suas contadoras de histórias. Avesso a conflitos mais profundos, Sette gosta de falar
com simplicidade dos costumes, dos lugares, dos personagens fictícios ou reais, em tom
quase sempre amoroso. Agora sua avó, chamada suavemente de Dindinha, era quem, da
sala de jantar, “governava a casa, pois queriam poupar minha mãe das “inferneiras” com
as amas”. Porque sim, havia discussões, e Sette sugere que as amas dariam algum
trabalho à sua governanta, talvez não fazendo tudo exatamente do jeito como Dindinha
ordenava. Já Sette não dá ordens, é menino, é aprendiz que se entrega ao prazer de ouvir
as vozes do “povo” negro da cozinha. Não só por isso, mas talvez a expressão “lirismo

30
SILVA, Maciel Henrique. Pretas de honra: vida e trabalho de domésticas e vendedoras no Recife do
século XIX (1840-1870). Recife: EDUFPE; Salvador: EDUFBA; 2011.
31
O romantismo de Sette, salpicado de realismo, em parte é resultado de suas leituras de clássicos da
literatura francesa. Ele mesmo menciona autores como Michelet, Hugo, Zola, Maupassant e outros. Ver
SETTE, Mário. Memórias íntimas. Op.cit., p. 93; e ainda AGUIAR, Cláudio. “O patrono romancista”,
disponível em: http://www.mariosette.com.br/bio_claudioaguiar.shtml, acesso em 23/08/2012.
32
SETTE, Mário. Memórias íntimas. Op. cit., p. 24.

145
ingênuo” seja bem apropriada para um escritor de textos amenos.33 As histórias ouvidas,
a julgar pela recordação do escritor, não tinham o efeito de dissuadi-lo de práticas
católicas, de fomentar nele uma cosmovisão religiosa marcadamente “negra”, advinda
dos fundamentos do candomblé. Por sua vez, não parece que ele, Sette, ou seus
parentes, em suas Memórias, investissem na formação católica da criadagem.
Sinh’Aninha, ama do escritor, retorna em suas memórias como ente próximo, acariciado
religiosamente pelo quase filho:
Sinh’Aninha morreu em 1918, em casa de tia Iaiá. Levei-a, filialmente, à
cova, com o carinho com que ele [ela] tantas vezes me carregou. Ainda pôde
conhecer meus filhos e contar-lhes as histórias de que tanto gostava.
Boníssima Sinh’Aninha!34
Se os dependentes da casa permanecem longo tempo entre seus senhores,
convertidos em patrões, e choram os mortos da família para a qual trabalham, ao menos
Sette recorda, como gesto de reciprocidade, que ele também foi capaz de chorar por
alguém do “povo da cozinha”, alguém que viveu o suficiente para servir,
provavelmente, a diversas gerações da família. Sinh’Aninha é um tipo de mãe-preta,
sem leite, é verdade, mas com capacidade de criar várias gerações de meninos brancos.
Gesto religioso, de caridade para com a “Boníssima Sinh’Aninha!”.
No interior da casa, Sette não pinta o comportamento religioso das criadas,
embora insinue um comportamento pautado por valores cristãos, ou por uma bondade
naturalizada. Contudo, no romance Seu Candinho da Farmácia, quando os personagens
do bairro de São José, Recife, misturavam-se no contexto da procissão de Nosso
Senhor, na quinta-feira santa, as criadas podiam fazer o que muitos faziam: usar o
ambiente festivo, um tanto profano, para falar mal dos outros. No caso, falar mal das
patroas e patrões que davam “muito calote nas amas”, que usavam a polícia para
intimidar as empregadas que lhes cobravam ordenados atrasados, que tinham uma
postura sexual “assanhada”.35 Isso na própria Basílica da Penha. As criadas, ao
difundirem fofocas e piadas sobre os patrões em mercados públicos, mas também em
igrejas, reforçavam o sentimento de identidade do grupo, e ao mesmo tempo utilizavam
uma das artes possíveis contra a dominação dos patrões: a fofoca que atinge à honra;
uma arte de resistência.36

33
Ver BRUNO, Ernani da Silva. “O lirismo ingênuo do nordestino Mário Sette”, disponível em:
http://www.mariosette.com.br/evoc_lirismo.shtml, acesso em 23/08/2012.
34
SETTE, Mário. Memórias íntimas. Op. cit., p. 61.
35
SETTE, Mário. Seu Candinho da Farmácia [1933]. Op. cit., p. 140.
36
Ver FONSECA, Claudia. Família, fofoca e honra: etnografia de relações de gênero e violência em
grupos populares. 2ª ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004, p. 41-42; e SCOTT, James. Domination

146
De rezas e feitiços
Em 1964, Gilberto Freyre publicou um romance, por ele mesmo classificado de
“semi-novela”, com o título Dona Sinhá e o Filho Padre. Ambientado no mesmo bairro
de São José, do romance Seu Candinho da Farmácia, tem como marco cronológico as
três últimas décadas do século XIX e primeiras do XX. Freyre situa a semi-novela entre
dois marcos: as querelas religiosas entre a Igreja e a Monarquia, nos anos 1870, e os
anos posteriores ao fim do Segundo Reinado. O próprio romance tem a religião de Dona
Sinhá, devotíssima de Nossa Senhora, como tema. Ela quer a todo custo que seu filho se
torne padre. Para atingir esse objetivo, ela precisa cuidar o tempo todo para que sua
criada, Inácia, antiga escrava de confiança vinda do engenho, não influenciasse o
menino com histórias de Iemanjá. Na verdade, patroa e criada disputam suas influências
religiosas: a negra é devota de Iemanjá e ainda mantém a fala cheia de africanismos,
enquanto a senhora de engenho é fervorosa católica. Outro criado, chamado Amaro, já
age mais de acordo com a Sinhá, e mostra-se sabedor das rezas católicas.
Freyre, que dificilmente mereceria o rótulo de moralista, associa, nessa semi-
novela, a África ao pecado, ao lugar de impulsos primários, uma espécie de Id em que
os gestos são mais naturais. José Maria, na infância, sentia a influência da libido, da
pulsão sexual. Uma pulsão que, segundo o conceito freudiano, implica em associação
do homem ao mundo animal. Freyre sabe disso – ele leu certamente Freud para escrever
o romance.37 Ele relaciona a curiosidade do menino ao mundo africano incógnito:
Vinha-lhe às vêzes um desejo tão grande de conhecer a África, a gente de
Inácia, as águas de Iemanjá, que lhe parecia haver nesse desejo um quê de
traição à própria Mãe.
Seu pecado de brincar com a “tetéia” talvez tivesse qualquer coisa de pecado
africano. Feitiço. Mandinga. Quem lhe poderia trazer um pouco de luz sôbre
um assunto para êle tão escuro talvez fôsse Inácia. Inácia que às vezes olhava
para êle com uns olhos de quem lhe adivinhava mais a intimidade do que a
própria Dona Sinhá.38
O menino branco do romance freyriano não vai se esfregar luxuriosamente na
criada negra – ele já se sente em pecado, quando criança, só pelo fato de brincar com o
órgão sexual. É a criada, contudo, quem compreende os desejos infantis do menino, e

and the arts of resistance: hidden transcripts. Yale University Press, New Haven/ London, 1990, p. 18-
19.
37
Osmar Pimentel, ao apresentar Dona Sinhá ao leitor como obra “corajosamente inovadora”, afirmou:
“Não poderia ter sido escrita, é certo, sem o conhecimento prévio da imagem do homem segundo Freud.”
PIMENTEL, Osmar. “Uma estréia previsível”, p. XXVII, In: FREYRE, Gilberto. Dona Sinhá e o Filho
Padre – seminovela. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1964b; para o conceito de pulsão
como força biológica endógena e inata, ver MOUAMMAR, Christiane Carrijo Eckhardt. “A importância
da definição freudiana do conceito de pulsão sexual para a compreensão do conceito de sexualidade
humana”. In: Revista AdVerbum, 5 (2), Ago. a Dez. de 2010, p. 52-60.
38
FREYRE, Gilberto. Dona Sinhá e o Filho Padre. Op. cit., p. 36.

147
este sabe que só conheceria os mistérios de seu corpo de menino a partir dela. Apesar de
ser criada de confiança, Inácia era “Filha de escrava”, e de escrava Nagô. Quase que
Inácia nem aprendia a falar português direito, ou seja, era ainda africana. 39 Menino, José
Maria está perigosamente, na visão de Freyre, próximo da África, do desejo, das pulsões
de um continente todo ele pecado. Mas o romance não conduz o leitor para desenlaces,
para desfechos inesperados ou intuídos pelo leitor.
O autor de Casa-Grande & Senzala tolhe as expectativas para a mudança e reforça
o catolicismo ibérico, vindo da mãe zelosa e branca, matriarca como as primeiras que
aportaram ao Brasil. José Maria, assim, figura como personagem desprovido das
experiências negras e africanas formadoras de tantos outros meninos de sua época.
Experiências que Freyre considera abrasileirantes. O amigo do frágil José Maria, Paulo
Tavares, que nutria um amor platônico por ele, procurou envolver-se o máximo possível
com as criadas de sua casa quando de seu retorno da França, com ânsia de se
reabrasileirar. Mas em que sentido as experiências com a criadagem negra operam?
Religando o rapaz europeizado ao que há de “pré-intelectual”, de “mais intuitivo”, de
“instintivo”.40 Só as negras e negros mais africanos seriam, pelo discurso freyriano,
portadores dessas características de personalidade, e muitos deles não existiam mais nas
casas brasileiras depois de 1888. Freyre parece considerar negros e negras africanos, no
período próximo à Abolição, como exemplares de uma cultura em risco de extinção.
As criadas mais africanizadas emergem na ficção não apenas como portadores de
um desejo misterioso, de uma pulsão sexual perigosa para famílias católicas. A maior
proximidade com o sagrado, com os orixás, poderia também incutir medo entre os
brancos. No romance O feiticeiro, o escritor baiano Xavier Marques dá a entender que o
mundo do candomblé, em Salvador, não era um mundo à parte do mundo dos brancos.
Na verdade, os trânsitos culturais são intensos. Uma lavadeira escrava, chamada
Belmira, busca sua alforria empoderando-se, a partir do conhecimento dos feitiços,
perante pessoas dos extratos sociais médios na Salvador do século XIX. A ela recorre o
comerciante e Oficial da Guarda Nacional Paulo Bôto, homem que apadrinhava os
candomblés, tornando-se também cliente deles em caso de necessidades.
Belmira é a mediadora indispensável para a família de Bôto conseguir casar sua
filha com um bom partido. Em nome de Oxum, ela consegue arrancar do comerciante
alguns metros de tecido, novelos de linha, alfinetes. A lavadeira sabe que seu
conhecimento é valioso e oferece seus serviços sem pejo. Xavier Marques tende, quase
39
Idem, p. 28.
40
Idem, p. 111.

148
sempre, a demonizar a lavadeira escrava e sua astúcia, reverberando preconceitos de
parte da sociedade baiana que, sobretudo a partir dos anos 1850, passou a perseguir os
candomblés na cidade de Salvador.41 Em uma das várias incursões policiais aos
candomblés, o chefe de polícia, mais importante autoridade policial das províncias no
Império, relatou a prisão de um homem e de doze mulheres africanas no bairro da Cruz
do Cosme. Em petição dirigida ao chefe de polícia, as mulheres se apresentavam como
honestas lavadeiras que estavam na casa invadida para descansar do trabalho, comerem,
e então retornarem para suas moradias. Eram libertas africanas. Talvez nem todas
fossem lavadeiras de ofício, como a fictícia personagem de Xavier Marques. Mas era
um discurso necessário para, como de fato sucedeu, serem retiradas da cadeia. 42 Não
deixa de ser curiosa a escolha comum do ofício de lavadeira para designar as mulheres
africanas mais próximas do candomblé, tanto no romance, quanto na fala das africanas.
Ser lavadeira permitia uma mobilidade espacial nada desprezível para a apropriação e
difusão de práticas culturais diversas. As lavadeiras, escravas ou não, habitando longe
das casas dos clientes, podem mesmo ter se convertido em mediadores culturais,
alimentando o fascínio de homens e mulheres brancos pelos feitiços.43
No território social ao norte da Bahia, nos engenhos pintados pelo escritor José
Lins do Rego, e também na cidade de Recife, o discurso literário também é construído
por meio de imagens religiosas. As relações entre os personagens de Rego eram
marcadas por uma maior ou menor adesão aos valores tradicionais, religiosos,
costumeiros. O Deus cristão podia ser evocado pela antiga escrava cozinheira da casa-
grande, depois de 1888, para lamentar a ruína da sociedade escravista e patriarcal e a
perda do antigo lugar social, e esse Deus era também um modo de bramir sua raiva
contra os novos senhores do presente, que excluíam velhas escravas domésticas da vida
social da casa-grande, de suas funções antes indispensáveis; o respeito aos antigos
senhores de engenho também tinha algo de reverência divina, de submissão indiscutível,
naturalizada, dramatizada em bênçãos, choros, e sentida nos gritos de autoridade.
Contudo, uma das muitas formas pelas quais a mudança social opera na sociedade
brasileira irradiada a partir dos engenhos de açúcar, nas últimas décadas do século XIX

41
REIS, João José. Domingos Sodré. Op. cit., p. 38; e SILVA, Maciel Henrique. Domésticas criadas
entre textos e práticas sociais. Op. cit., p. 165-166.
42
REIS, João José. Domingos Sodré. Op. cit., p. 23-25.
43
Para outro contexto, e discutindo como saberes e técnicas tradicionais africanas subsistiram e marcaram
a cultura (técnicas de trabalho, por exemplo) nas Minas Gerais do setecentos, tendo africanos Minas como
mediadores culturais/passeurs culturels, ver: PAIVA, Eduardo. “Batéias, carumbés, tabuleiros: mineração
africana e mestiçagem no novo mundo”. In: PAIVA, Eduardo França; ANASTASIA, Carla Maria Junho
(orgs.). O trabalho mestiço: maneiras de pensar e formas de viver – séculos XVI a XIX. 2ª ed. São
Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH/UFMG, 2003, p. 187-207.

149
e no período seguinte, traz consigo um elemento religioso considerado corrosivo: o
feitiço. Não é só o avançar voraz das usinas que assusta e muda a configuração social.
Na mais dinâmica cidade de Recife, nas primeiras décadas da República, as criadas
podiam bradar com suas patroas em termos nada cristãos: “Perde no bicho e vem pra
cima de mim. Vá descontar no diabo!”.44 Tudo bem, a patroa em questão não passa de
uma mulher apenas remediada, não tão branca, e casada com um português sem
sobrenome tradicional na cidade. Mesmo assim, é uma ação de rebeldia mais incisiva.
Mas é mesmo no Recife onde as negras sabiam manipular a magia contra brancos,
e não relutavam em fazer uso dessa sabedoria. O romance Doidinho, escrito em 1933,
mesmo ambientado em Itabaiana, ensina isso. A educação recebida pelo menino Carlos
de Melo, no colégio dominado pelo velho Maciel, rigoroso mestre-escola, tinha
componentes religiosos diversos. Por um lado, o menino representa uma alma nada
cristã, cheia de defeitos a serem extirpados, quase sempre, na base do castigo físico
aplicado com golpes da palmatória. Mas essa formação escolar e religiosa cristã não
conseguiu evitar que o menino tivesse contato com uma das criadas da cozinha,
sabedoras de estórias de feitiços acontecidas no Recife. Sabedora porque ela seria de
Recife, ao contrário das dóceis e fiéis criadas do engenho Santa Rosa.
A negra sabia “histórias de feitiçarias de brancos castigados”. E o menino branco
escutava essas narrativas moralizantes. Em uma delas, contou a cozinheira que uma
família inteira morrera de bexigas, mesmo fugindo de Recife para Olinda. E arrematou
“Os brancos têm muita soberba.” Outra história mostra a sina de uma “pobre” negra que
era criada para todo o serviço na casa: cozinhava, lavava, tomava conta dos meninos.
Castigada “com malvadez” por uma senhora branca, a criada seguiu o conselho de
procurar um “catimbó”. Segundo Rego: “O mestre fez umas rezas. Deu o santo nela no
meio da sala. Caiu estrebuchando no chão como cachorro doente, babando raiva.”
Depois disso, a dona da casa começou a murchar, enfraquecendo a ponto de andar
sustentada pelos outros. Por fim, “Morreu beijando os pés da negra, pedindo perdão.”.45
Em todas as histórias contadas pela cozinheira do romance Doidinho, os brancos
recebem um justo castigo. O feitiço não seria lançado por simples maldade, e sim para
punir excessos de autoridade dos brancos. Normalmente doenças mortais acometem os
brancos soberbos e violentos, que não têm piedade dos negros e negras que lhes servem.
De todo modo, isso não acontecia no engenho Santa Rosa, e o escritor/personagem

44
REGO, José Lins do. O moleque Ricardo. [1935]. 16ª ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio
Editora, s/d., p. 13.
45
REGO, José Lins do. Doidinho. [1933]. 25ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1983, p. 55-56.

150
Rego, como Marques, também parece colocar a narrativa da cozinheira recifense no
campo da demonização. O menino-narrador vê a doméstica trazida do Recife como
portadora de um ódio que ele não compreendia:
O diabo da negra me arrastava para a cozinha, e enquanto lavava os pratos ia
batendo com a língua, contando os seus casos. Em tudo mostrava o seu ódio
aos brancos. Como era diferente das negras do Santa Rosa – da Vovó
Galdina, da Tia Generosa, para quem os seus brancos eram as melhores
cousas do mundo! No Recife era assim: os negros botavam feitiço nos
senhores, a bexiga matava famílias ricas. 46
Riqueza adquirida pela compra de escravos, ostentação de fortunas que
humilhavam os negros, castigos físicos infundados, tudo podia ser considerado motivo
para um feitiço. A vingança dos orixás vinha fazer a justiça e botar os brancos no
sofrimento físico e espiritual de depender, acometidos de doenças terríveis e incuráveis,
de negros e de negras. Os polos se invertiam com o efeito da magia.

Conclusão: as “heresias” de um empregado doméstico no Recife


Em 1910, Gregório Bezerra, já órfão, e com 10 anos de idade, chegou ao Recife
como empregado de uma família patriarcal, na segunda classe de um trem. O arranjo
tinha as mesmas orientações costumeiras: trabalhar em serviços leves, chamados pela
família de “servicinhos”, e receber educação básica de ler, contar e escrever. A família,
de mudança para o Recife, não queria, provavelmente, gastar demais contratando
criadagem potencialmente mais rebelde, mais experiente em negociar a relação de
trabalho. O futuro líder dos trabalhadores rurais tem, assim, uma infância muito
semelhante à de tantos outros meninos e meninas trazidos de regiões pobres, castigadas
pela fome, para uma cidade maior onde trabalhariam na dependência de uma família.
Como os personagens do romance Dona Sinhá, de Gilberto Freyre, ele também se
instalou no bairro de São José, na rua Augusta.
O rigor religioso cristão da avó, a fé da mãe, tudo isso comovia o menino. Algo de
religiosidade popular, de fé espontânea, de rezas cantadas para pedir proteção contra a
fome e as secas, de novenas comunitárias para pedir fartura, tudo isso consta na
memória de Gregório. Ele mesmo, em um gesto comovente, levara flores para a cova da
mãe em momentos em que passava na cidade em que ela estava enterrada. Portanto, em
uma família camponesa de finais do século XIX e início do século XX, era possível a
manutenção de vínculos sociais a partir de um fervoroso catolicismo tradicional,

46
Idem, p. 56.

151
sobretudo alimentado por mulheres da comunidade. Sua avó é descrita por ele como
“fanática” e “Católica até a medula”, mas ela não frequentava a Igreja.47
Contudo, ao ser transferido para uma cidade de grande porte, o gesto coercitivo da
família patronal de força-lo a rezar enquanto negligenciava a promessa de educa-lo,
causou no menino uma rebeldia e uma visão negativa desse tipo de fé, por ele
considerada, talvez depois, artificial e hipócrita. Ele não odiava a fé ou o catolicismo em
si. Ele odiava – ou odiou depois, e reelaborou suas memórias – a combinação entre
rezas fervorosas e memorizadas e a prática de injustiças contra os mais necessitados.
Em vários trechos de suas memórias, ele faz crer que a proteção patriarcal que ele,
enquanto menino, recebera, resumiu-se a isso: rezas memorizadas e restos de alimentos.
Sua impressão inicial da própria cidade não foi das melhores: pobres, aleijados, cegos,
idosos, muita gente “implorando uma esmola pelo amor de Deus.”.48
Havia na casa o filho de uma antiga escrava da família, que ainda era viva e o
visitava a cada dois meses trazendo sempre um presentinho para a família, como
gratidão pela família criar seu filho. A escrava liberta, na leitura de Gregório, era “uma
servil criatura, de riso espontâneo”.49 Como o ex-escravo Amaro, do romance Dona
Sinhá, também ele de “sorriso bom” e sabedor de rezas, como mostrei acima.50 Curiosa
proximidade de leituras: talvez com sinais trocados, com significados bem diferentes, o
riso aparece na construção discursiva de Bezerra e de Freyre. Aqui, talvez, para indicar
submissão justa; acolá para indicar submissão excessiva de um dependente da família
tradicional. Esse filho era o colega de Gregório Bezerra nos serviços domésticos. Mas
não só. A experiência de, por obrigação, rezar todas as noites após a ceia, conforme a
disciplina doméstica da casa, também era partilhada com o ex-escravo. Seu nome era
José, e seu padrasto não o queria em casa. Gregório, no texto de suas memórias,
chamava José de “O pretinho”. Em tom de piedade. Isso não quer dizer que ele fosse
realmente preto. Podia ser um mestiço. Mas o importante, para Gregório, é demarcar o
lugar social subalterno ocupado por José e ele na casa. Gregório, cuja cor não está
explícita, talvez fosse um desses tantos habitantes do interior pernambucano, de tez
branca, mas de um branco brasileiro. Mas seja pela pobreza em que nasceu em Panelas
de Miranda, seja pela condição de proximidade e semelhança no tratamento recebido
por ele e José, ele se percebe como “Colega de escravidão”. Se fosse no século XIX, e

47
BEZERRA, Gregório. Memórias (primeira parte: 1900-1950). [1979]. 3ª ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1980, p. 64 e p. 67.
48
Idem, p. 98.
49
Idem, p. 99.
50
FREYRE, Gilberto. Dona Sinhá e o Filho Padre. Op. cit., p. 5.

152
Gregório quisesse utilizar um termo africano, ele diria que era um malungo, ou seja, um
companheiro de José.51
Gregório, como Mário Sette, Gilberto Freyre, José Lins do Rego e outros, fala
pelo menino José. Ele é, nesse caso, a voz do “pretinho”, compreendido como um
continuador simbólico da escravidão. José, que só podia ser submisso na fala do
revolucionário, agradecia a Deus por estar naquela casa desde os quatro anos de idade,
porque “pelo menos tinha comida e dormida garantidas.” Já educação, nada. Nem para
ele, nem para Gregório. Mas enquanto este reclamava, fazia os serviços domésticos com
raiva e vivia revoltado, “Tudo para ele (José) era bom, nada reclamava, nada pedia. Foi
a criança mais obediente e mais delicada que conheci em toda a minha existência.” O
patriarcalismo, para Gregório, ainda mantinha sua força no início do século XX,
produzindo dependentes fiéis, vivendo sob a disciplina e o controle advindos de rezas,
de restos de comida e de uma cama para dormir. Já o revolucionário diz: “Eu, ao
contrário, sentia revolta contra as injustiças embora não soubesse expressá-la.”.52
A proteção patriarcal mostra-se falha. Na doença de José, diagnosticada como
uma varíola “da braba”, o menino, que se queixava para a família de dores na cabeça,
febre e bolhas no rosto, ainda assim foi obrigado a trabalhar vendendo alfenins. Teve de
voltar cedo porque não suportou. A família, após o diagnóstico, isolou-o como
“bexiguento” na casa, e demorou a hospitaliza-lo, provocando sua morte. Era Gregório
quem levava comida e dava-lhe o remédio. As rezas cobradas aos dependentes pela
família patriarcal, o rito exterior de fé, não se convertera em proteção efetiva, em
desvelo pelo menino que era praticamente o que, na época da escravidão, costumava-se
chamar de “cria da casa”. Gregório, agora com excesso de trabalho, resiste. Limpar os
penicos, enxugá-los, lavar banheiro, o piso, a privada, e isso duas vezes por dia. Ele
decide, propositadamente, não enxugar os penicos. Pior, quebrou, intencionalmente, um
deles, em um gesto, a seu modo, luddista.53
A família sequer avisou a pobre mãe da morte do filho. Ela, que também contraíra
bexiga, veio visitar José porque queria “dar a benção a seu filho”. A resposta da
matrona foi: “O menino morreu de varíola há mais de quatro meses, quando ainda
estávamos na rua Augusta.”.54 A essa declaração terrível, a mãe cai no choro. O consolo
veio em forma de ordem e repreensão: “Cale-se, mulher, ele morreu porque Deus quis,
51
CARVALHO, Marcus J. M. de. “O quilombo de Malunguinho, o rei das matas de Pernambuco”. In:
REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 407-432.
52
BEZERRA, Gregório. Memórias. Op. cit., p. 102.
53
Idem, p. 105.
54
Ibidem.

153
para que tanto berreiro?”. A ex-escrava, então, confronta a matrona, olha-a com firmeza
e diz: “Sinhá, sou mãe dele, num picisa bigá cum eu, não; vou imbola, me adisculpe.
E saiu para sempre.”.55
A saída para sempre não deixa dúvidas. Rompeu-se o vínculo patriarcal entre
senhores e dependentes. A negligência nos cuidados de saúde com o filho da
dependente – e cuidar da saúde era um dever tradicional inscrito nos costumes
paternalistas de base religiosa –, e a consequência da morte do menino, fizeram a liberta
abandonar a gratidão que demonstrara. Pedir para ela calar-se foi muito duro. Cenas
como essa se acumulam na memória de Gregório e o marcam em suas futuras ações
políticas. Seu lugar de fala não é o sobrado urbano ou a casa-grande. É um lugar social
inverso. Vem mostrar que o catolicismo de famílias senhoriais nem sempre resultou em
cumprimento de deveres morais para com dependentes. Ele, anos depois, trocará a
rebeldia simples e o ódio contra a injustiça pela luta política. Não foi, como lavadeiras e
cozinheiras recifenses e soteropolitanas dos romances de Marques e José Lins do Rego,
buscar poder e proteção nos orixás. Sua vingança foi entrar nas fileiras do Partido
Comunista Brasileiro e agir na esfera política e sindical. Para Gregório, que escrevera
suas memórias muito tempo depois do período aqui análisado, os subordinados não
deveriam assimilar a religião cristã como forma de submissão. Ele fora testemunha do
modo como a família patriarcal estruturava orações de modo a incutir a obediência cega.
Todavia, o discurso religioso de finais do século XIX também atuou, como
demonstrado, no sentido de fomentar caridade e deveres paternalistas entre patrões e
famílias tradicionais. As casas de família brasileiras de finais do século XIX e primeiras
décadas do século XX tinham que escolher entre reabilitar o paternalismo e a figura do
bom senhor, da boa e virtuosa senhora, ou perder o trabalho fiel e obediente dos
descendentes de escravos e livres pobres. Criadas e criados são, nos discursos da maior
parte dos memorialistas e romancistas, figuras importantes para o reforço do catolicismo
e da família patriarcal sob o trabalho livre. Gregório Bezerra, todavia, não gostaria de
colaborar com os vínculos tradicionais católicos dentro das famílias patriarcais. Outras
criadas e criados, por sua vez, exercitavam suas resistências por meio de diferentes
táticas de luta. Aderir à fé católica, realizar feitiços, fazer as duas coisas em tempos e
espaços distintos, justapondo e mestiçando práticas culturais diversas, foram caminhos
possíveis para amenizar os rigores de uma vida que, mesmo depois de 1888, continuava
a exigir táticas e negociações inventivas.

55
Idem, p. 106.

154
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Recebido em 23 de março de 2016. Aceite em 30 de junho de 2016.

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