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Resumo
O presente estudo busca compreender os aspectos culturais que permeiam o uso dos
dreadlocks na contemporaneidade, os elementos de sua construção identitária e as relações
de consumo vinculadas ao cabelo. Para tal, foi realizada uma pesquisa na internet com
usuários, ex-usuários e não usuários de dreadlocks, de diferentes regiões do Rio Grande do
Sul, recebendo 32 resposta. São utilizados os conceitos de juventude (DAYRELL, 2003),
cultura (CANCLINI, 1997), consumo (CANCLINI, 1995; 2012). Conclui-se com a
pesquisa que o uso dos dreadlocks se apresenta como significante de contestação, negação e
produção cultural.
Palavras-chave
Consumo; cultura; ressignificação; dreadlocks; híbridismo.
1 Introdução
A juventude contemporânea é marcada pelo desejo de convivência e interação em grupo, ao
mesmo tempo em que busca a personalização das suas relações (CANCLINI, 2012). Sua
busca por uma identidade social e pessoal em meio a uma sociedade com padrões de beleza
e de comportamentos moralmente estabelecidos faz com que esta juventude busque
incorporar hábitos alternativos de consumo e produção cultural, criando um ambiente
propício ao uso de símbolos culturais. Entre os hábitos consumidos está o uso dos
dreadlocks.
Os dreads, nattydreads ou jata (no hinduísmo), dentre outras denominações, são cabelos
enrolados em forma cilíndrica com seus mais variados estilos, construindo, dentro de um
universo estético, parte de uma identidade ligada a um discurso de resistência e de
contracultura. O resgate do penteado na contemporaneidade se deve a popularização do
Reggae a partir da década de 1960 através do Movimento Rastafári iniciado nos anos 30,
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Trabalho apresentado na IJ 7 – Comunicação, Espaço e Cidadania do XVII Congresso de Ciências da Comunicação na
Região Sul realizado de 26 a 28 de maio de 2016.
2
Bacharel em Comunicação Social - Hab. Jornalismo pela ULBRA/Canos, email: williaminlive@gmail.com
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Orientador do Trabalho. Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).
Professor do Curso de Jornalismo da ULBRA/Canoas, email: deivison_campos@hotmail.com
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Taylor, BR. (pág.1356).
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Sadhus: monges iogues hindus, está ligado à divindade Shiva, deidade relacionada à destruição, ao renascimento e
renovação. O simbolismo em torno do penteado também está ligado ao sagrado e traz consigo a renúncia pelo material.
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Usado por sacerdotes astecas (teopxqui), como símbolo sacro e de conhecimento (MEXICOLORE, s/d)
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A cultura, como observa Kellner (2001), “é uma forma de atividade que implica alto grau
de participação, na qual as pessoas criam sociedades e identidades”. No que se refere à
juventude, a década de 1950 é um marco importante de empoderamento dessa cultura. Em
um mundo devastado do pós-guerra, os jovens sobreviventes se aglomeram nas grandes
cidades, principalmente nas mais industrializadas como Londres e Nova York. Assim,
como previra Marx, houve um esvaziamento do campesinato, e a partir daí o moderno se
isolou do passado (HOBSBAWN, 1992, p.284).
Os elementos sociais antes fundamentados na moral religiosa das instituições tradicionais,
como a família patriarcal, na adoração ao traditionnel, nas artes, começaram a entrar em
crise diante de um mundo que caminhava para a globalização trazida pelo desenvolvimento
tecnocultural de massas. As comunidades de outrora deram lugar a sociedades anônimas, na
qual os sujeitos se relacionam e constituem identidades e múltiplos estilos (HOBSBAWN,
1992, p.333). Dayrell (2005, p.41) define estilo como “a manifestação simbólica expressa
em um conjunto mais ou menos coerente de elementos materiais e imateriais que os jovens
consideram representativos da sua identidade individual e coletiva”.
A consolidação do jovem como massa de trabalho contribuiu para a ampliação das esferas
de liberdade juvenil, modernizando os usos e costumes sociais, como a política: a
reivindicação do corpo, através da revolução sexual feminista, a ampliação do acesso à
educação, os cabelos compridos pelos homens, o jeans, por exemplo, causaram estranheza
ao passado e se espalharam pelo mundo moderno através da mídia (HOBSBAWN, 1992,
p.292; DAYRELL, 2005, p.30).
O rock, estilo diretamente derivado do Blues7 negro norte-americano (FLORY &
COVACH, 2005), foi popularizado pela juventude moderna em todo o mercado
globalizado, transformando-se em produto de uma cultura de consumo jovem, fomentada
pelo sistema de mídia. O gênero produziu um estilo peculiar de vestir, de se comportar,
tanto na produção quanto no consumo de bens simbólicos e identidade (DAYRELL, 2005,
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Dayrell (2005).
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A filosofia Satyagraha desenvolve a ideia de desobediência civil e protestos não-violentos. Pensada e empregada no
movimento de independência da Índia por Gandhi (1869-1948), idealizador do moderno estado indiano.
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Entre os pontos que o movimento hippie se distingue do rastafári está a relação destes com o sagrado. Enquanto o
primeiro está ligado a uma ideia de espiritualidade, o segundo está ligado a percepção de religiosidade. Entretanto, ao
serem capturados pela cultura de mídia, perdem seu caráter heterogênico, se homogeneizando.
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O garveysmo tem como foco fundamental a promoção da união e integração dos povos das diásporas africana no
mundo. Desenvolvida a partir da UNIA (Universal Negro Improvement Association), fundada por Marcus Garvey em
1914, na Jamaic, com cunho pan-africanista: defende a unificação socio-política e cultural do continente africano.
(MANGET-JOHNSON,2008)
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O primeiro álbum da banda nova-iorquina de punk Ramones foi gravado em uma semana ao custo de US$ 6,400,
enquanto se gastavam milhões em álbuns de anos (MCNEIL & MCCAIN, 2013).
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O preconceito social decorrente do uso, com cunho claramente etnofóbico, não atinge da
mesma maneira os usuários caucasianos, sendo um pouco mais tolerado. No entanto
organizada por uma cultura eurocêntrica clássica, o uso limita a juventude a uma colocação
na economia formal das cidades.
Sofro preconceito direto. Olhares de medo ao entrar em estabelecimentos,
não ser atendida em estabelecimentos. As pessoas não te levam a sério. O
esforço que precisa fazer para mostrar que é competente, por exemplo, é 5
vezes maior do que de quem não tem dreads. (resposta ao questionário)
Há relatos em disferentes povos, nas Américas, em Ásia e África, de que a cultura do dread
representa estágios da vida e ligações com o sagrado (ANGOLA, 2012; EGITO 2011).
Entretanto, o uso moderno dos dreadlocks tem no ratafarismo da Jamaica sua origem. O
movimento etiopianista pan-africano surge com Marcus Garvey em 1914, propondo o
emponderamento do povo negro jamaicano através do retorno à Àfrica. Nos anos de 1930,
o rastafarianismo inicia-se como uma religião messianica. Em tempo, adquire
características de um movimento de protesto contra a situação socioeconômica dos
jamaicanos negros. Marca da cultura Rastafári, o dreadlocks está ligado às escrituras
religiosas, a Bíblia12, referindo-se à separação do mundano. Relaciona-se igualmente em
seu uso contemporâneo a uma filosofia de vida simples, ou seja, afastada dos vínculos do
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BÍBLIA: Números 6:5 - “Durante todo o período de seu voto de separação, nenhuma lâmina será usada em sua cabeça.
até que termine o tempo de separação para o Senhor ele estará consagrado e deixará crescer crescer o cabelo da sua
baceça.” ;
Levítico 21:5 - “Não farão calva na sua cabeça, e não raparão as extremidades da sua barba, nem darão golpes na sua
carne.”
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Stabilishment: ordem ideológica, econômica e política que constitui uma sociedade ou um Estado.
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O valor de enfrentamento de dreadlocks foi debatido e iniciada por uma organização conhecida como Youth Black
Faith na Jamaica. Manget-Johnson, CA. "Dread Talk - ScholarWorks @ Georgia State University." 2008.
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"Explore - Cetic - Portal de Dados - CETIC.br." 2015. 21 Oct. 2015 <http://data.cetic.br/cetic/explore>
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de mídia massiva que constrói uma ideia de juventude através da pasteurização de símbolos
culturais (KERNELL, 2001).
O grau de instrução dos entrevistados é majoritariamente ensino médio. Do total, 20 deles
informaram cursar, ou ter concluído. Os que possuem graduação e pós contabilizam 10
indivíduos. Entre os indivíduos ocupados, oito trabalham no comércio, um com publicidade
e propaganda e dois com educação e saúde.
Levando em conta a idade média de 22 anos dos entrevistados e o nível de desemprego,
aproximadamente 28,5%, enquanto a média nacional entre os jovens de 18 a 24 anos no
Brasil é de 16,4%,16 pode-se relacionar o desemprego a duas questões: a necessidade de
formação superior; e o uso dos dreadlocks, ainda relacionado com falta de higiene.
Os usuários do penteado apontam sofrer preconceito na hora de conseguir um emprego
tradicional, pois barreiras simbólicas baseiam a decisão de contratação, levando-os,
algumas vezes, às novas alternativas econômicas. Como alternativas econômicas, o
artesanato e dreadmaker17, são realizados por cinco pessoas, sendo que uma delas também
exerce ocupação formal no mercado de trabalho.
Este circuito de economia alternativa apresenta marcas dos movimentos hippie e do punk. A
ideia punk “do yourself”, como forma de subversão dos modelos econômicos, através do
artesanato, que por sua vez é de característica hippie, como modalidade de ação do escape
social hegemônico como uma variante da atividade formal no trabalho (CERTAU, 1980).
Dessa maneira, essas contribuições estéticas e de técnicas, aliadas a tantas outras possíveis
através da globalização, cria o que Canclini (1997) chamada de “cosmopolitismo flexivel”
que, a partir do processo de hibridação, apropria-se de táticas de outras culturas como
empoderamento e fortalecimento de alternativas à realidade local.
Apesar de 80,65% de o grupo pesquisado ter hábitos onívoros, três destes (12%) apontam
para uma tendência de mudança de hábitos alimentares, buscando tornarem-se vegetarianos.
Esses, por sua vez, são 19,35% e buscam apropriar práticas alimentares e alguns outros
16
"IBGE: desemprego sobe mais entre jovens de 18 a 24 anos ..." 2015. 3 Nov. 2015
<http://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2015/06/25/ibge-desemprego-sobe-mais-entre-jovens-
de-18-a-24-anos-chegando-a-164.htm>
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aquele que faz dread
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Manget-Johnson, CA. "Dread Talk - ScholarWorks @ Georgia State University." 2008. p. 36 e 37.
<http://scholarworks.gsu.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1043&context=english_theses>
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5 Conclusão
Os aspectos culturais que permeiam o uso dos dreadlocks na juventude contemporanea são
a estética e o seu uso deste como símbolo contracultural de contestação. Os usuários
preferem buscar um consumo minimalista, que tem na internet o meio de sociabilidade e de
informação mais usual. Sua construção se dá a partir de rastros de estilos para a
representação de juventude, disponibilizados e vinculados à cultura de mídia que sofrem
por isso ressignificações de sentido a partir das experiências de cada indivíduo. O consumo
e a sua vinculação com o penteado está portanto ligado a uma cultura de juventude global,
que mantém como como referência a mensagem de paz, união e resistência ao
stabilishment.
Com a massificação do uso dos dreadlocks a partir doa anos de 1960, como referencial de
cultura jovem, o estilo nattydread torna-se sinônimo de resistência estética. O penteado se
consolida no imaginário jovem, como ferramenta de representação ideológica e política,
com diferentes níveis de consciência desta ação. Além disso, os aspectos sagrados
historicamente vinculados ao estilo, tanto no rastafarianismo, quanto nas sociedades antigas
pelo mundo, se transformaram na ideia da espiritualidade e não tanto em religiosidade.
O grupo pesquisado, com média de idade de 22 anos, desenvolve sua ambiência em torno
do processo de desenvolvimento tecnológico entre o analógico e o digital. A internet, como
meio de aproximação e de identificação entre pares com referências da cultura de midiática,
apresenta-se como principal ferramenta de construção do conhecimento e da percepção de
mundo dessa juventude. Isso não faz com que os encontros sociais em espaços públicos
sejam não tão frequentes; mas potencializam esses momentos através da tecnologia,
também em encontros em Sites de Redes Sociais, Facebook, ou aplicativos de chat, como o
Whatsapps, mantendo relações de produção e consumo cultural.
A opção pelo uso do estilo, por outro lado, dificulta a colocação para alguns dos
entrevistados no mercado economico tradicional. Esse preconceito em relação à estética
justifica, em parte, o nível de desemprego desses jovens, que é maior do que a média
nacional. Também como causa, observa-se que o nível de instrução da maioria é o ensino
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REFERÊNCIAS
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DAYRELL, Juarez. O jovem como sujeito social. Artigo na Revista Brasileira de Educação. Brasil;
2003.
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<http://www.touregypt.net/egypt-info/magazine-mag07012000-mag4.htm> Acesso em: out 2015.
FLORY, Andrew e COVACH, John. What’s that sound? : an introduction to rock and its history /
Andrew Flory, John Covach. — 3rd ed. New York: W. W. Norton & Company, Inc, 2006.
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http://scholarworks.gsu.edu/english_theses/44 Acesso em: nov 2015.
MCNEIL, Legs. Mate-me por favor: Legs McNeil e Gilian McCain; tradução de Lúcia Brito - 6ª
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http://www.mexicolore.co.uk/aztecs/aztefacts/priests-and-their-matted-hair Acesso em: out 2015.
TAYLOR, BR. Traditional ecological knowledge - religion and nature. 2008. (pág.1035; 1036;
1561). Disponível em: <http://www.religionandnature.com/ern/sample/Berkes--
TraditionalEcologicalKnowledge.pdf> Acesso em: out 2015.
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