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A ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS

FARIA, Itamar Teodoro de.1


ANDRADE, Lívia Souza2
SILVÉRIO, Natália3

RESUMO: Por meio de pesquisa bibliográfica, este artigo, objetivando dar destaque à
necessidade crescente de reflexões sobre a adoção por casais homoafetivos, discute a temática
– adoção por casais homoafetivos – relacionando-a aos novos arranjos familiares e à relação
da família e o Serviço Social.

PALAVRAS-CHAVE: Adoção; Casais homoafetivos; família; Serviço Social.

INTRODUÇÃO

Este artigo, partir de uma pesquisa bibliográfica, aborda a adoção por casais
homoafetivos. Tal abordagem passa pela consideração inicial sobre a relação da família e o
Serviço Social e tangencia os arranjos familiares. O objetivo é evidenciar que a temática tem
se mostrado mais e mais presente, demandando reflexões às Ciências Sociais e questionando à
própria sociedade um alargamento na sua capacidade de lidar com tal realidade.

1. FAMÍLIA E SERVIÇO SOCIAL

Com a falência de diversos modelos de Estado, em especial do Estado do


bem estar social, em diversos países, e com constantes crises, desconfianças e incertezas nas
diversas instituições, a família começa a readquirir uma centralidade nos debates. O Serviço
Social, como campo de estudo diretamente ligado aos paradigmas atuais da sociedade e cujo
objetivo passa pela concretude de ações, atividades e serviços sociais básicos, não poderia
estar de fora.
De acordo com Regina Mioto a “incorporação da família como referência na
política social brasileira reavivou o debate em torno do trabalho com famílias, que por muito
tempo ficou relegado a segundo plano no âmbito do Serviço Social brasileiro” (online, p.1).
Assim, podemos dizer que a família é um sujeito privilegiado tanto de estudo quanto de ação

1
Professor Mestre, docente da Fundação de Ensino Superior de Passos - FESP, campus associado à Universidade
do Estado de Minas Gerais – UEMG. E-mail: itamartfaria@yahoo.com.br
2
Acadêmica de Serviço Social – Faculdade de Serviço Social de Passos – FESP/UEMG.
3
Acadêmica de Serviço Social – Faculdade de Serviço Social de Passos – FESP/UEMG.
do Serviço Social.
O Serviço Social, todo ele constituído sobre a reflexão e a busca de formas
de, se não eliminar, ao menos abrandar as expressões da questão social, tem definido nos
últimos tempos a família como campo privilegiado de atuação. Não por outro motivo, grande
parte – se não a totalidade – das políticas de assistência social, cada vez mais integradas em
rede, tem seu foco na família. Tendo a família como base de atuação, intenta aumentar seu
alcance às outras esferas da sociedade.
Não se pode desconsiderar a complexidade da temática, mas antes é
fundamental um olhar mais apurado sobre as formas como se organiza a família e de que
maneira se configuram o relacionamento: internamente, entre os membros que a compõe, e
externamente, com as diversas esferas da sociedade. De acordo com Regina Mioto,
A família, nas suas mais diversas configurações constitui-se como um
espaço altamente complexo. É construída e reconstruída histórica e
cotidianamente, através das relações e negociações que estabelece
entre seus membros, entre seus membros e outras esferas da sociedade
e entre ela e outras esferas da sociedade, tais como Estado, trabalho e
mercado (online, p. 5).

É preciso estar atento, sobremaneira, às mudanças históricas pelas quais o


conceito de família vem passando e, também, como eles se relacionam com as especificidades
culturais e regionais, de acordo com a abordagem, a época e o lugar que se estuda. Para
Delma Borges, no “decorrer da história, o conceito de família foi sendo alterado em
consonância às mudanças ocorridas, tanto em seu interior quanto na sua relação com a
sociedade” (2008, online, p.13).
Considerando que o papel dos assistentes sociais está intimamente
vinculado a busca por respostas aos desafios da sociedade contemporânea, e que a família se
constitui com um dos principais âmbitos em que diversas questões sociais se refletem e por
ela são refletidas, é importante levantar alguns aspectos que permeiam tal debate.
No caso do presente artigo, busca-se trazer ao debate um levantamento das
novas configurações que a família assume, acompanhando as mudanças pelas quais vem
passando o mundo, globalmente, nas mais diversas áreas. Afinal, a família, segundo Regina
Mioto, “não é apenas uma construção privada, mas também pública e tem um papel
importante na estruturação da sociedade em seus aspectos sociais, políticos e econômicos”
(online, p.5).

1.1. Novos arranjos familiares


A família, como dito anteriormente, assume novas configurações
adequando-se e acompanhando as mudanças, nas mais diversas áreas, pelas quais vem
passando o mundo. Para Regina Mioto (online, p.6) merecem destaque as mudanças de
caráter econômico, que se relacionam ao mundo do trabalho, e as de caráter tecnológico,
“particularmente àquelas vinculadas ao campo da reprodução humana e da informação”. Ou
seja, o modo de produção que uma determinada sociedade assume, bem como seus produtos e
resultados, interferem e se relacionam com os modelos em torno dos quais a família se
organiza.
Ainda de acordo com a autora, contribuem para isso as “novas
configurações demográficas, que incluem famílias menores, famílias com mais idosos e
também das novas formas de sociabilidade desenhadas no interior da família. Uma
sociabilidade marcada pelo aumento da tensão entre os processos de individuação e
pertencimento” (MIOTO, online, p.6).
Uma destas novas formas de socialização é a união homoafetiva, que
começou a ganhar espaço em virtude das mudanças e revoluções que vem acontecendo desde
a metade do século XX. Desde a revolução sexual, na década de 60, passando pela
reivindicação dos direitos dos homossexuais em diversos momentos desde então, e resultando
em uma redução no preconceito – que, ainda assim, é muito grande – e um crescente aumento
nos direitos – em especial, na década de 1990, com a Organização Mundial de Saúde
deixando de considerar o homossexualismo doença – cada vez mais homossexuais assumiram
sua ‘opção’ sexual e, portanto, mais casais homoafetivos se constituíram.
Esse novo arranjo, que agora alcança o estatuto de familiar, representa um
salto considerável. No caso brasileiro, até a Constituição de 1988, somente era considerado
família aquela forma de socialização decorrente do casamento. Ou seja, até a muito pouco
tempo, somente se considerava família a união de homem e mulher com objetivo de
procriação, concentração e transmissão de patrimônio. Recuando um pouco no tempo,
percebemos que essa forma era a única acolhida como família pelo Código Civil de 1916.
Também percebemos que, mesmo no caso de união entre homem e mulher, se não houvesse
filhos, estabelecia-se certo preconceito. A impossibilidade de gerar os próprios filhos causava
constrangimento e, no caso de filhos nascidos fora do casamento, o constrangimento seguia:
filhos assim gerados eram tidos por “ilegítimos”, “bastardos”, podendo sofrer também
restrições sucessórias.
A realidade que a Constituição Cidadã buscou amparar extrapolara, já há
bastante tempo, o arranjo familiar até então tido como único. Foram consideradas entidades
familiares arranjos os mais diversos: marido, mulher e filho(s), a conhecida família
tradicional; mãe e filho(s) ou pai e filho(s), as chamadas famílias monoparentais; e outros
tantos decorridos de nascimentos e falecimentos de herdeiros e de pais (famílias compostas
apenas por irmãos, por primos, por tios e sobrinhos, avós e netos, etc.).
Outra transformação importante foi a emergência e reconhecimento da
união estável como entidade familiar. Nessa esteira, é preciso considerar que a pedra de toque
na definição de família foi migrando da questão biológica (a capacidade de gerar filhos) para
a questão afetiva (o afeto sendo o eixo de formação do arranjo familiar).

2. CASAIS HOMOAFETIVOS E ADOÇÃO

A homossexualidade ainda é objeto de grande controvérsia. Nas ciências


médicas, como nas outras, não se chegou a uma conclusão se é decorrente de opção ou se é de
origem biológica. Afastando as restrições impostas a partir de considerações religiosas, o que
se tem é uma realidade que esteve presente na história humana até onde os registros alcançam.
Essa realidade também está presente em outras espécies do reino animal. O que se pode dizer,
a propósito do entendimento dos especialistas, é que a homossexualidade trata-se de “mistura
de fatores, resultado de influências biológicas, psicológicas e socioculturais, sem peso maior
para uma ou para outra – nunca uma determinação genética ou uma opção racional.”
(ANTUNES, 2003, p.75).
Não é o caso, aqui, de discorrer sobre os porquês mas sim de considerar um
fato. Homossexuais, declarados ou não, estão presentes nas diversas esferas da sociedade e
são sujeitos de direitos e deveres tanto quanto todos os demais.
Diversos países já regulamentaram a união homoafetiva, sendo a Espanha o
caso mais recente. Alguns também já regulamentaram a adoção por esses casais.
Com as mudanças de paradigmas que transformaram o modo de se enxergar
e se estruturar a família, nada mais óbvio que as uniões homoafetivas reivindicassem o direito
de adotar crianças. Para Jane Maschio,
Ora, se a base da constituição da família deixou de ser a procriação, a
geração de filhos, para se concentrar na troca de afeto, de amor, é
natural que mudanças ocorressem na composição dessas famílias. Se
biologicamente é impossível duas pessoas do mesmo sexo gerarem
filhos, agora, como o novo paradigma para a formação da família – o
amor, em vez da prole – os "casais" não necessariamente precisam ser
formados por pessoas de sexo diferentes (2001, online).
Segundo Aline Verônica (2009, online), não existem restrições legais, no
Brasil, para a adoção por casais homoafetivos. Pelo contrário, a Constituição Federal tem em
seus artigos os fundamentos da cidadania e a dignidade da pessoa humana, bem como os
objetivos fundamentais, a construção de uma sociedade justa e solidária; a erradicação da
pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e a promoção do bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.
Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, também não “apresenta
nenhuma restrição à possibilidade de adoção por homossexuais, visto que, não faz menção à
orientação sexual do adotante, prescrevendo apenas, em seu artigo 42 que 'podem adotar os
maiores de 21 anos, independentemente do estado civil'” (VERÔNICA, 2009, online).
Mesmo com tais aberturas, presentes na legislação brasileira, a adoção por
casais homoafetivos ainda é um assunto complexo e delicado. Pode-se perceber, com um
breve levantamento bibliográfico, a quantidade de textos, artigos e monografias que tratam do
assunto. “Em relação ao instituto da adoção, existem poucas controvérsias, aparecendo
problema, entretanto, quando se trata da adoção por casais homoafetivos, visto que este tipo
de união ainda não é regulada pela legislação brasileira” (VERÔNICA, 2009, online).
A regulamentação dessa nova possibilidade – a adoção por casais
homoafetivos – está nos seus primeiros passos. Em 2010, foi autorizada por tribunal de justiça
a primeira adoção do tipo. Em abril de 2011, o Supremo Tribunal Federal, reconheceu a união
homoafetiva como entidade familiar.

2.1. Adoção
A palavra adoção, oriunda do latim adoptio, em nossa língua assumiu o
significado de “tomar alguém como filho”. Ultrapassando as variações na definição de
adoção, o que se tem como central é o estabelecimento de vínculo jurídico de filiação. Ou
seja, como ponto pacífico “todos os conceitos concordam que a adoção confere a alguém o
estado de filho, gerando um parentesco civil, desvinculado dos laços de consangüinidade
(VERÔNICA, 2009, online).
Os requisitos indispensáveis ao processo de adoção são fornecidos pelo
Código Civil, nos artigos 1.618 a 1.629, e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA,
Lei 8.069/90, nos artigos 39 a 52.
Alguns marcos dos percursos da adoção, na legislação brasileira, extraídos
de Verônica (2009, online), são:
- o Código Civil de 1916 (artigos 368 a 378) , que previa que apenas os maiores de cinqüenta
anos, e com diferença de idade de pelo menos dezoito anos em relação ao adotado poderiam
adotar, além do que restringia a adoção por duas pessoas somente poderia ocorrer quando se
tratasse de marido e mulher.
- a Lei nº 3.133, de maio de 1957, que trouxe a alteração de dispositivos relacionados à
adoção, reduzindo a idade mínima do adotante para trinta anos (e a diferença de idade entre
adotante e adotado, para dezesseis anos.
- o Código de Menores, de 1979, que, baseando-se na doutrina da situação irregular (a criança
e o adolescente tratados como objetos do Direito), voltava seus olhos estes indivíduos apenas
quando se considerava que estivessem vivendo de forma irregular na sociedade. No que diz
respeito à adoção, duas formas eram previstas: adoção plena e adoção simples. A adoção
plena, “caberia em favor do menor com mais de sete anos de idade se, no momento em que
completasse essa idade, já estivesse sob a guarda dos adotantes. Extinguia todos os vínculos
do adotado com a sua família biológica, mantendo-se apenas os impedimentos matrimoniais”.
A adoção simples “gerava um vínculo de efeitos limitados e sem total desligamento do
adotado da sua família de sangue”.
- a Lei n˚ 8.069, de 1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Esta
lei foi responsável por concretizar e expressar os novos direitos das crianças e adolescentes
que estavam assegurados pela Constituição Federal de 1988, estabelecendo o norte para as
regras de aplicação dos artigos 226 e 227 da Constituição e constantes dos Tratados
Internacionais de Proteção aos Direitos das Crianças, que foram ratificados pelo Brasil.
Respaldados na orientação legal prevista no art. 227 da CF e arts. 1º e 2º do
ECA, que reconhecem e asseguram a todas as crianças e adolescentes (de 0 a 18 anos de
idade), todos os direitos previstos na legislação brasileira, os procedimentos atuais de adoção
adotaram a teoria da proteção integral.
A Proteção Integral é a base que organiza todo o novo conjunto de
princípios e normas jurídicas que se voltam à efetivação dos direitos fundamentais da criança
e do adolescente, trazendo em sua essência a proteção e a garantia do pleno desenvolvimento
humano e reconhecendo a condição peculiar de pessoas em desenvolvimento e a articulação
das responsabilidades entre a família, a sociedade e o Estado para a sua realização por meio
de políticas sociais públicas. Está proposto que o direito deve garantir a satisfação de todas as
necessidades das crianças e adolescentes, não apenas no tocante aos aspectos penais de ato
praticado pelo ou contra o menor, mas, também, com relação ao seu direito à vida, à
educação, à saúde, convivência, lazer, liberdade, etc.
No que diz respeito instituto da adoção, o Estatuto da Criança e do
Adolescente alterou o regime anterior unificando as duas formas de adoção previstas (a plena
e a simples) para uma única forma. De tal modo, foi permitido que maiores de 21 anos
pudessem adotar, qualquer que fosse o estado civil, desde que com diferença de idade entre
adotante e adotado de pelo menos dezesseis anos. A idade máxima do adotado foi aumentada,
passando de sete para dezoito anos (na época do pedido). Ainda foi estipulado que a adoção
fosse deferida quando apresentasse reais vantagens para o adotado e tivesse motivos legítimos
como fundamento.
Em 2002, entrou em vigência o novo Código Civil. Este novo Código,
entretanto, no que se refere à adoção, apresenta-se apenas como norma complementar. Suas
normas apenas incidirão em caso de lacuna no ECA, e ainda assim, somente se não houver
incompatibilidade com os princípios fundamentais deste (VERÔNICA, 2009, online).

2.2. A adoção por casais homoafetivos

A partir da década de 90, do século passado, diversas parte do mundo


reconheceram a união homoafetiva, algumas garantindo o direito à adoção.
Em 1989, a DINAMARCA foi o país pioneiro em admitir o casamento
entre pares homoafetivos, garantindo-lhes todos os benefícios sociais,
porém proibindo a adoção de crianças. Logo após, em 1993, a
NORUEGA passou a permitir o registro oficial da união de pares
homoafetivos, oferecendo-lhes quase todos os mesmos direitos dos
parceiros heteroafetivos. Os parceiros podem compartilhar o poder
familiar, porém a adoção de crianças era expressamente proibida. Em
2002, autorizou a adoção de crianças, mesmo a dos filhos de
parceiros. Em 1994, a SUÉCIA promulgou a Lei de Parceria
Registrada, também não permitindo a adoção conjunta ou
individualmente de crianças. Porém, recentemente, a adoção passou a
ser admitida aos pares homossexuais, sendo que “o Estado não
autoriza o casamento, mas somente o registro de uma união civil.” A
ÁFRICA DO SUL foi, em 1996, o primeiro país a trazer expresso em
sua constituição a proibição da discriminação em razão da opção
sexual. Porém, ainda não reconhece o casamento entre homossexuais.
O registro de parceria homossexual foi permitido na ISLÂNDIA a
partir de 1996. Os parceiros podem partilhar a autoridade parental,
sendo feito da seguinte forma: com o registro da parceria,
automaticamente será concedida guarda conjunta do parceiro se o
outro já tinha a guarda na época do registro, o que será cessada com a
dissolução da parceria, ficando o pai biológico com a guarda
individual de seu filho. No ano de 1997, uma província do CANADÁ
reconheceu a possibilidade de homossexuais assumirem a tutela e
adotarem crianças. Em 1999, foi promulgada na FRANÇA uma lei
que criou o PACS – Pacto Civil de Solidariedade, que nada mais é do
que um contrato celebrado entre dois maiores de sexo diferente ou do
mesmo sexo, que tem por objetivo organizar a vida em comum,
visando principalmente o aspecto patrimonial. Em janeiro de 2000,
entrou em vigor na BÉLGICA uma lei que já havia sido aprovada em
1998, permitindo a união de pessoas do mesmo sexo. Não falava nada
em adoção de crianças. Ainda em 2000, no mês de setembro, o
Parlamento HOLANDÊS aprovou, por maioria absoluta (107 votos a
33), a lei que permite o casamento completo entre homossexuais,
dando direito também ao divórcio e a adoção de filhos. O par
homoafetivo poderá escolher entre a parceria registrada e o casamento
homossexual. Se a adoção for requerida por casal, ele deverá ser
casado (com coabitação de três anos, pelo menos), porém o
homossexual poderá adotar individualmente também. Esse país
sempre esteve na vanguarda dos direitos aos pares homoafetivos,
tendo a legislação mais liberal do mundo. Na ALEMANHA, em
dezembro de 2000, foi aprovada lei que concedia aos pares
constituídos de pessoas do mesmo sexo, direitos e deveres
semelhantes aos dos heteroafetivos. Passaram a ter direito de herança,
de usar o sobrenome do parceiro e ter uma pequena tutela sobre os
filhos que seus companheiros trouxessem para a relação, porém
continuou não sendo permitida a adoção de crianças. Para um país que
até os anos 60 criminalizava a homossexualidade, foi um grande
avanço. Em PORTUGAL foi aprovada a Lei das Uniões de Fato em
março de 2001, dando aos homoafetivos os mesmos direitos dos
heteroafetivos, menos o direito a adoção de crianças. Em junho de
2001, a BÉLGICA passou a permitir o casamento civil aos pares
homoafetivos (COSTA, online, p.29).

Na primeira década deste século, vários outros países reconheceram as


uniões homoafetivas. Estados Unidos (Califórnia, em 2002, autorizando a adoção; Flórida,
proibindo a adoção), Finlândia (2002), Argentina (2002), Bélgica (2003), são exemplos. Cabe
apontar que, nesses casos, à exceção da Califórnia, no EUA, a possibilidade de adoção pelo
casal homoafetivo foi vetada.

De acordo com o grau de liberdade e respeito conferido aos pares


homoafetivos os países podem ser agrupados:
O primeiro segmento, chamado de “modelo expandido” ou “liberal”, é
aquele que além de descriminalizar a relação homoafetiva, também
instituem programas de apoio a esse grupo de pessoas. São eles:
Holanda, Dinamarca, países mais evoluídos da União Européia,
Suécia, Noruega, Bélgica, Finlândia, Alemanha, estado americano da
Califórnia, etc. O segundo bloco, chamado de “modelo intermediário”,
talvez o maior deles, é aquele que se limitou a descriminalizar as
uniões homoafetivas, proibiu a discriminação, deferindo apenas
algumas prerrogativas como garantia dos direitos humanos, porém não
promove nenhuma iniciativa positiva de legalizar a união entre
pessoas do mesmo sexo. Em muitos deles há a discussão no Poder
Legislativo e a jurisprudência vem reconhecendo alguns direitos aos
pares homoafetivos. Os exemplos são: Brasil, Eslovênia, República
Tcheca, Austrália, Nova Zelândia, a maioria dos Estados americanos.
Na América Latina nenhum país possui legislação sobre a união civil
de pares homoafetivos, a não ser a recente lei de Buenos Aires, como
referida acima. A tendência atual dos países europeus é de reconhecer
os pares homoafetivos. Existe ainda o grupo mais radical, de extrema
repressão, chamado de “modelo conservador”, onde, até a atualidade,
é imposta a pena de morte pelo fato de ser homossexual, por ser
contrário aos costumes religiosos. Tratam-se dos países islâmicos e
mulçumanos. A Grécia e a Irlanda também consideram a
homossexualidade como ilícito penal (COSTA, online, p.32-3).

No Brasil, a efetivação das uniões homoafetivas segue caminhos tortuosos.


O Congresso Nacional ainda não legislou a respeito. Entretanto, o instituto da ‘união estável’
tem sido recurso usado para garantir certa segurança legal aos pares que dele fazem uso. A
despeito da omissão da legislação, o Poder Judiciário tem-se mostrado bastante inovador.
Amiúde a mídia expõe casos em que parceiros de mesmo sexo têm conseguido respaldo legal
para garantir direito à pensão, a uso de planos médicos, à herança, etc. Mais recentemente,
tem sido reconhecido, por tribunais de justiça, o direito de casais homoafetivos adotarem
(como casal) crianças.

Em 1995, a ex-deputada Marta Suplicy apresentou à Câmara dos Deputados


o Projeto de Lei nº 1.151/95, (nomeado Projeto de Parceria Civil Registrada entre pessoas do
mesmo sexo). Considerado um marco na sociedade, mormente no tocante à discussão da
homoafetividade no país, o projeto visava a conceder amparo aos optantes por este tipo de
parceria, com priorização da garantia dos direitos de cidadania.
De acordo com o Projeto de Lei, que por seis vezes já entrou em
pauta, mas ainda não foi à plenária, a união entre duas pessoas do
mesmo sexo seria reconhecida, civilmente, para assegurar os direitos
inerentes à propriedade, à sucessão, ao usufruto, assegurar benefícios
previdenciários, direitos de curatela, impenhorabilidade da residência,
direito de nacionalidade em caso de estrangeiros, possibilidade de
declaração no imposto de renda e composição da renda para compra
ou aluguel de imóvel. Nada foi dito em relação à adoção por casais
homoafetivos, no entanto, em seu substitutivo, esse instituto foi
vedado (VERÔNICA, 2009, online).

Em decisão inovadora, o Supremo Tribunal Federal (instância máxima da


justiça brasileira) decidiu, em 05 de maio de 2011, pela equiparação de direitos e deveres
entre casais heteroafetivos e homoafetivos. Nessa decisão, a união estável de pessoas do
mesmo sexo foi reconhecida como entidade familiar, regida pelas mesmas regras que se
aplicam aos casais heterossexuais.
Com esta decisão do Supremo, os casais homoafetivos têm reconhecido,
entre outros direitos, o de receber pensão alimentícia, de ter acesso à herança de seu
companheiro em caso de morte, de ser incluídos como dependentes nos planos de saúde, de
adotar filhos e registrá-los em seus nomes.

De agora em diante, as uniões homoafetivas serão colocadas ao lado dos três


tipos de família já reconhecidos pela Constituição: a família convencional (formada com o
casamento), a família decorrente da união estável e a família monoparental.Como entidades
familiares, as uniões de pessoas do mesmo sexo passam a merecer a mesma proteção do
Estado (O ESTADO DE SÃO PAULO, online)

No que se refere à adoção por crianças por casais homoafetivos, a se


considerar a legislação vigente, não existem restrições. Nem a Constituição Federal,
tampouco o Estatuto da Criança e do Adolescente, apresenta como requisito para a adoção a
‘opção’ sexual do adotante.

O enfrentamento aberto da questão pela Justiça Brasileira teve início


quando, ainda na década de 90 do século anterior, o juiz titular da 2ª Câmara Civil do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro, aprovou as primeiras adoções por homossexuais.

Tendo em mente que o preconceito contra homossexuais ainda é


significativo, um recurso muito utilizado, por ser mais viável, é a adoção por apenas um dos
parceiros (como solteiro). Uma vez consumada a adoção, a criança passa a viver com o casal,
sendo filha (por adoção) de apenas um dos parceiros.

Em 2006, na cidade de Catanduva, Estado de São Paulo, a Justiça reconhece


a adoção por casal homoafetivo, emitindo certidão de nascimento em que um casal
homoafetivo responde pela paternidade da adotada Seguindo no mesmo sentido, em Recife, o
Juizado da Infância e da Juventude já concedeu sentença favorável ao pedido de ação de duas
irmãs feito por casa homoafetivo masculino, residente em Natal/RN. No Estado do Acre, uma
juíza também deu sentença favorável à adoção de uma criança de um ano de idade. O mesmo
ocorreu na Justiça de Brasília (VERÔNICA, 2009, online).
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se pode apreender, a sociedade brasileira tem vivenciado situações


que até há pouco tempo eram inimagináveis. Pode-se dizer que muito se avançou em termos
da garantia de direitos fundamentais para diversos grupos até então marginalizados,
ignorados, quando não criminalizados.
Os diversos avanços não podem, contudo, encobrir que ainda vivemos
tempo de muito preconceito e muitos desafios a serem superados. Tabus têm sido quebrados,
debates de várias ordem alcançam ecos e resultados importantes, mas vozes contrárias a essa
abertura de direitos ainda se fazem fortemente ouvir. O Brasil é um Estado laico desde a
Constituição de 1891, mas em várias questões os valores religiosos se impõem aos clamores
de setores da sociedade.
A questão que se nos mostra como a mais importante é que o debate sobre
os nossos problemas e as possíveis soluções demanda serenidade e um empenho sincero na
busca por soluções. Se ainda são muitas as questões a serem resolvidas, ignorá-las não vai
lograr fazê-las desaparecer.
Palavras de ordem como justiça social, equidade, direito das minorias (as
quais são, paradoxal que seja, por vezes numericamente maiorias), reclamam, para além de
discursos bem intencionados, ações concretas. De modo geral, a legislação brasileira se
mostra das mais avançadas e esclarecidas.
Papel central do Serviço Social é a construção da consciência dos direitos
(bem como dos deveres) dos cidadãos. Não se ignora que a vida social implica na convivência
dos diferentes. Justamente por conta disso, faz-se premente a discussão sem ranços de todas
as questões que nos afligem. Preconceitos arraigados, visões retrógradas, comodismos
oportunistas precisam ser desnudados, combatidos e desconstruídos tendo se em vista uma
sociedade em que a vida digna, para todos sem restrições, seja uma realidade e não apenas um
desejo ou um discurso.

REFERÊNCIAS

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