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A ilusão biográfica
- “Essa propensão a tornar-se o ideólogo de sua própria vida, selecionando, em função de uma
intenção global, certos acontecimentos significativos e estabelecendo entre eles conexões
para lhes dar coerência, como as que implica a sua instituição como causas ou, com mais
frequência, como fins, conta com a cumplicidade natural do biógrafo, que, a começar por suas
disposições de profissional da interpretação, só pode ser levado a aceitar essa criação artificial
de sentido”. 184-185
-A ideia da vida como uma existência dotada de sentido começou ser questionada no mesmo
momento em que se passou abandonar a estrutura do romance como um relato linear. Daí
que produzir uma história de vida, tratar a vida como uma história, “talvez seja conformar-se
com uma ilusão retórica”. 185
- Bourdieu crítica as análises de “história de vida” que tendem a compreender a vida “como
uma série única e por si suficiente de acontecimentos sucessivos, sem outro vínculo que não a
associação a um "sujeito" cuja constância certamente não é senão aquela de um nome
próprio. 189. Para ele, o que chama de “acontecimentos biográficos”, devem ser considerados
como permanências e “deslocamentos no espaço social” estruturado, “nos diferentes estados
sucessivos da estrutura da distribuição das diferentes espécies de capital que estão em jogo no
campo considerado”. 190
- As trajetórias devem ser, assim, consideradas relacionados aos “estados sucessivos do campo
em que ela se desenrolou”, ou seja, ao “conjunto de relações objetivas que uniram o agente
considerado [...] ao conjunto dos outros agentes envolvidos no mesmo campo e confrontados
com o mesmo espaço dos possíveis”. 190