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Ortodoxia e Heterodoxia:
os debates e conflitos em torno das heresias nos primeiros
séculos
RESUMO:
Este artigo é resultado da defesa de monografia realizada na Universidade Federal do Pará sob a
orientação do Prof. Msc. Thiago de Azevedo Porto cujo título foi “Eusébio de Cesaréia e a História
Eclesiástica: um discurso identitário acerca da ortodoxia via alteridade das heresias” (2013). Com o
objetivo de verificar os processos formadores de identidade através do contexto de escrita da obraHistória
Eclesiástica do bispo Eusébio de Cesaréia,produzida nas primeiras décadas do século IV,pois a mesma
possui elementos que serviram como modelo para os textos hagiográficos posteriores. Essa obra foi o
ponto de partida para elaboração deste artigo, no qual será analisado mais precisamente um aspecto da
obra, no que concerne a análise de um discurso formador de identidade que se dá através da afirmação da
ortodoxia pela alteridade das heresias, buscando consolidar sua legitimidade.
Palavras- chave: Heresia, Ortodoxia, Identidade.
ABSTRACT:
This article is the result of the monograph defense held at the Federal University of Pará under the
guidance of Prof. MSc. Thiago de Azevedo Porto cujo title was "Eusebius of Caesarea and the
Ecclesiastical History: an identity discourse about orthodoxy via otherness of heresies" (2013). In order to
verify the formation processes of identity through the Ecclesiastical obra História writing context of the
bishop Eusebius of Caesarea, produced in the first decades of the fourth century, because it has elements
that served as a model for later hagiographic texts. This work was the starting point for the preparation of
this article, which will be analyzed more precisely one aspect of the work, as regards the analysis of a
trainer discourse of identity that is through the orthodoxy of the statement by the otherness of heresies,
seeking to consolidate its legitimacy.
Key words: Heresy, Orthodoxy, Identity.
1
Licenciada em História pela Universidade Federal do Pará. Mestranda do Programa de Pós-Graduação
em Linguagens e Saberes na Amazônia da UFPA Email: rosanabc87@gmail.com
2
Ao longo do trabalho, eventualmente, utilizaremos a sigla HE como substituto para História
Eclesiástica.
primeiros séculos, constituem uma base importante para analisar o discurso de Eusébio de
Cesaréia acerca das heresias na História Eclesiástica, objetivo principal destetrabalho.
As heresias tem sido uma temática muito discutida por diferentes autores,
principalmente com o advento de novas modalidades historiográficas, sobretudo a história
cultural, possibilitando um estudo acerca das relações que se estabeleceram entre heresia e
religiosidade. Surgem, portanto obras que dialogam com tal temática, que são mais
contemporâneas a nós, como Pequena História das Heresiasde João Ribeiro, publicada em
1989, e ainda História das Heresias (séculos I- VII): conflitos ideológicos dentro do cristianismo de
Roque Frangiotti, que aprofunda tais assuntos de forma a nos mostrar a diversidade de
posicionamentos contrários ao que estava sendo imposto pelo cristianismo primitivo.
O termo Heresia vem do grego (haíresis) que significa escolha, foi criado
historicamente e ganhando outros significados com o passar do tempo, na época
helenística tinha o sentido de doutrina ou escolha. Com o advento do cristianismo, a
palavra recebeu uma conotação pejorativa de “doutrina que está fora da Igreja”, ou seja,
contrária aos princípios da fé cristã3. A definição e aplicação deste conceito foi um
instrumento fundamental para a própria organização eclesiástica: definir quem eram os
hereges era uma maneira de demarcar o que era certo dentro da Igreja, ou seja, delimitar
um aspecto particular ou uma interpretação doutrinária como verdade, através da escolha
feita por determinados grupos cristãos ou individualmente4.
Essas escolhas sempre irromperam conflitos, controvérsias e desentendimentos
desde o inicio das comunidades cristãs, pois não era algo estável, o que fez com que uma
doutrina se sobressaísse sobre as demais. É interessante esclarecer que inicialmente as
heresias surgidas na Antiguidade eram de divergências teológicas, diferente das que surgem
na Idade Média prenunciando a Reforma Protestante do século XVI5.
A partir desse processo que envolveu escolhas, debates e conflitos, a Igreja foi
delimitando a doutrina tida como verdadeira, e a única a possuir a verdade revelada pelos
apóstolos, apontando nas demais o errado e denominando-as de heresias. O surgimento
das heresias não corresponde a uma visão pueril de que aos poucos a fé cristã tivesse sido
deturpada por falsas doutrinas, mas deve-se ao fato de que havia uma multiplicidade dos
testemunhos da fé, que resultaram em escolhas pessoais e na formação de comunidades
3
RIBEIRO JÚNIOR, João. Pequena história das heresias. Campinas, SP: Papirus, 1989, p. 19.
4
OLIVEIRA, Elisana Ribeiro; CRUZ, Rosana Brito da.Eusébio de Cesaréia e a História Eclesiástica:
um discurso identitário acerca da ortodoxia via alteridade das heresias.Alétheia – Revista de Estudos
sobre Antiguidade e Medievo Volume 2/2, julho a dezembro de 2011, p. 78.
5
BARROS, José D’ Assunção. Papas, imperadores e hereges na Idade Média. Petrópolis, RJ: Vozes,
2012. (Série A Igreja na História). p. 55.
segregadas, desviando-se da doutrina fiel aos princípios. Desta forma, com o passar do
tempo foi se afirmando a noção de ortodoxia, através da delimitação doutrinária e
dogmática de tudo o que se considerava verdadeiro em questão de fé.
Nesse sentido, a heresia está estritamente ligada com a evolução do poder
eclesiástico, ou seja, através do discurso propagado pela Igreja a respeito das práticas
heréticas é que está inserido o objetivo de se alcançar o poder. O poder, muito além de
gerar dominação, é o propagador do saber, das relações, do discurso, portanto quanto mais
forte ele é mais as heresias são identificadas, condenadas e perseguidas. Percebe-se isto a
partir do momento em que se dá a aliança entre Igreja Cristã e Império Romano, com
Constantino, que não só legitimou o cristianismo como também as perseguições feitas aos
hereges, que foram cada vez mais identificados e perseguidos por meios mais fortes e
coercitivos.
O herege não é designado “herege” senão porque alguém investido de poder
eclesiástico e institucional classifica suas práticas ou idéias como contrárias a uma ortodoxia
tida como verdadeira. Todo herético tornou-se tal por decisão das autoridades ortodoxas.
Ele é antes de tudo um herético aos olhos dos outros6.
As heresias, no entanto, sendo nomeadas como “desvios de conduta”, possuem
elementos positivos para a evolução da doutrina cristã e para aprofundar o mistério e
compreensão da fé, através de seus estudos. Sendo assim, são também consideradas como
ocasião de progresso no seio da igreja.
No judaísmo essas escolhas passaram a ser responsáveis pelas várias seitas que nele
existia, e com isso o termo recebe o significado pejorativo de heterodoxia, indicando quem
se afastava da verdadeira doutrina da tradição rabínica, sendo acusados de serem os
inimigos da fé.
6
DUBY apud BARROS, José D’ Assunção. Papas, imperadores e hereges na Idade Média. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2012. (Série A Igreja na História). p. 56.
7
RIBEIRO JÚNIOR, João. Pequena história das heresias. Campinas, SP: Papirus, 1989,p. 20.
Com o passar do tempo a Igreja buscou se fortalecer através das heresias, como uma
forma de reavivar a fé que muitas vezes se enfraquecia no âmbito da mesma. Assim como
no inicio do cristianismo, a Igreja sempre buscou se consolidar e legitimar seu poder
através das heresias, identificando nelas o errado e se afirmando como a verdadeira
doutrina. Quando passava por algum enfraquecimento, buscava se fortalecer identificando
outras heresias.
O cristianismo conheceu crises profundas, devido principalmente às interpretações
pessoais das sagradas escrituras no contexto do século IV, e ainda os mais diversos cultos
que tendiam para a capital do Império Romano. Havia diferentes tendências que afirmavam
serem os defensores da verdadeira fé, grupos cristãos seguiram determinadas propensões
religiosas à medida que iam recebendo a mensagem de Cristo, uma multiplicidade de
testemunhos da fé levou à formação de comunidades segregadas8. No interior desses grupos
surgiu o que ficou conhecido como heresias, a começar pela tendência judaizante na qual
havia um conflito entre judeus-cristãos e os recém-convertidos do paganismo que não
necessitavam passar pela circuncisão nem observar todas as práticas judaicas. Deveriam
apenas aceitar o monoteísmo e os mandamentos. Diante desse judaísmo heterogêneo
carregado de ideias cristãs e não- cristãs, que têm raízes pagãs, surgiram às chamadas
heresias judaicas.
8
Cf. STOCKMEIER,Peter; BAUER, Johannes B. Antiguidade In: LENZENWEGER, Josef etalli.
História da Igreja Católica. 3ed. São Paulo: Ed. Loyola, 2006, p. 24.
9
BRANDÃO, Helena HathsueNagamine. Introdução à análise do discurso. Campinas, SP: Editora da
Unicamp, 2004, p. 47.
O gnosticismo
1.Gnosticismo de tipo sírio
Saturnino (ou Saturnilo) (c.120)
Irineu, Adv. Haer. I.XXIX.1-2
10
BRANDÃO, op. cit., p.33-34.
11
MANDONI, Danilo. História da Igreja na Antiguidade. São Paulo: Edições Loyola, 2006, p. 101.
12
HILL, Jonathan. História do Cristianismo. São Paulo: Edições Rosari, 2008, p. 65.
13
Ibidem, p. 65.
potestades; o mundo, porém, e tudo quanto nele existe, foi feito por
anjos em número de sete...
O Salvador, conforme Saturnino, não nasceu, não teve corpo nem
forma, mas foi visto em forma humana apenas em aparência. O Deus
dos judeus, segundo ele, era um dos sete anjos. Visto que todos os
príncipes quiseram destruir seu Pai, Cristo veio para aniquilar o Deus dos
judeus e para salvar os que nele mesmo acreditassem. Esses são os que
possuem uma faísca da vida de Cristo. Saturnino foi o primeiro que
afirmou a existência de duas estirpes de homens formadas pelos anjos:
uma de bons e outra de maus. Tendo em vista que os demônios davam
seu apoio aos maus, o Salvador veio para destruir os demônios e os
perversos, salvando os bons. Mas, ainda segundo Saturnino, casar-se e
procriar filhos é obra de Satanás”14.
14
BETTENSON,Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: Aste, 2007, p. 77.
15
DREHER, Martin N. A Igreja no Império Romano. São Leopoldo, RS: Sinodal 1993. (Coleção História
da Igreja v. 1). p. 33.
16
STOCKMEIER,Peter; BAUER, Johannes B. Antiguidade In: LENZENWEGER, Josef etalli. História
da Igreja Católica. 3 ed. São Paulo: Ed. Loyola, 2006, p. 25.
Amor”17, em detrimento do Deus do Antigo Testamento, que para ele era cheio de ira. O
fato é significativo, pois mostra a força e a penetração do movimento gnóstico 18. Sua
afinidade com o dualismo gnóstico, na existência de um Deus justo e outro semelhante ao
Demiurgo, encontrou afinidade para tal doutrina no apóstolo Paulo, que segundo ele foi o
único que entendeu a revelação de Deus em Cristo19. Sua tentativa de separar do
cristianismo qualquer ligação com o judaísmo e suas tradições é uma das suas principais
características. Os principais elementos do marcionismo são:
Afinidades com o dualismo gnóstico: existência de um Deus justo e cheio de ira, Javé,
identificado com o demiurgo, e de um Deus de amor e de toda consolação, o Deus
do evangelho; o Deus bom assumiu um corpo aparente em Cristo; desprezo da
matéria.
Rígido antijudaísmo: separação do cristianismo de qualquer ligação com o judaísmo.
Repúdio integral do AT: AT e NT estão em plena contradição; rejeição da explicação
alegórica do AT.
Rigorismo ético: abstenção de todas as obras do Deus criador, especialmente o
matrimônio, a carne e o vinho20.
A Igreja proclamou-se diante de Marcião para recusar suas idéias: que o Antigo e o
Novo Testamento são normativos para seu ensino e ao declarar que o Deus do Antigo
Testamento, o criador, é o pai de Jesus Cristo, portanto a criação é e continua sendo a boa
criação de Deus21, e que todas as declarações devem partir dessa premissa. Podemos
perceber que a partir desse momento a Igreja instituiu seu primeiro dogma de fé, ou seja,
ponto fundamental e indiscutível da sua doutrina religiosa.
Outro movimento que se destacou foi o ebionismo, que se caracterizava por judeus-
cristãos que observavam a lei mosaica e reconheciam Jesus Cristo como Messias 22; porém
compreendiam que Jesus não era filho de Deus e sim um simples homem.
“Essa doutrina dos primeiros séculos de nossa era afirmava que Jesus
possuía apenas uma natureza, a saber, a humana. Ainda, de acordo com
esta heresia, também ensinava ser o Cristianismo uma mera continuação
do Judaísmo, no qual o Nazareno não tinha nenhum dos atributos
17
Idem, p. 26.
18
DREHER, Martin N. Op. Cit., p. 34.
19
DREHER, Martin N. A Igreja no Império Romano. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1993. (Coleção História
da Igreja v. 1). p. 35.
20
MANDONI, Danilo. História da Igreja na Antiguidade. São Paulo: Edições Loyola, 2006,p. 104.
21
Idem, p. 36.
22
RIBEIRO JÚNIOR, João. Pequena história das heresias. Campinas, SP: Papirus, 1989, p. 23.
23
SILVA, José Orlando da.A encarnação como a suprema hierofania: Releitura interpretativa do
cristianismo.Dissertação – Mestrado, Recife: UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO,
2012,p. 54.
24
JÚNIOR, João Ribeiro. Pequena história das heresias. Campinas, SP: Papirus, 1989, p. 23.
25
HILL, Jonathan. História do Cristianismo. São Paulo: Edições Rosari, 2008, p. 64.
26
MANDONI, Danilo. História da Igreja na Antiguidade. São Paulo: Edições Loyola, 2006, p. 121.
27
STOCKMEIER,Peter; BAUER, Johannes B. Antiguidade In: LENZENWEGER, Josef etalli. História
da Igreja Católica. 3 ed. São Paulo: Ed. Loyola, 2006, p. 62.
formularia a fé num único Deus e verbo divino, buscava-se, portanto confirmar que o
Filho pertence à esfera divina, indo contra a idéia ariana do logos ser uma criatura28. Eusébio
posteriormente justificou sua atitude a comunidade a qual pertencia, afirmando que havia
agido desse modo para conseguir a paz da Igreja, que pretendia o imperador.
É interessante averiguarmos os motivos pelos quais havia tantos bispos que estavam
seriamente divididos sobre a questão ariana, sabemos que muitos simpatizantes da doutrina
de Ário foram silenciados à força por ordens do imperador29.
Ário tinha muitos seguidores e mesmo com a sua condenação ao exílio, após o
concilio de Nicéia, a questão não estava encerrada e perdurou até o ano de 381. O
arianismo adentrou até mesmo na corte, especialmente por causa da irmã do imperador,
chamada Constância, que levou Constantino a adotar uma política mais flexível, permitindo
aos exilados, dentre eles Ário e Eusébio de Nicomédia, que inclusive se tornou de sua
intima confiança, que voltassem e readquirissem suas sedes. Talvez essa atitude de
Constantino se caracterize por interesses políticos já que os arianos eram a maioria nas
regiões orientais30.
Partindo da análise documental de tais questões, podemos presumir que Eusébio de
Cesaréia entendia a questão herética como uma ameaça ao cristianismo e a fé na verdade
professada pela Igreja. Podemos perceber o posicionamento arbitrário de Eusébio quando
se trata de escrever a respeito das heresias que surgiram na Antiguidade, e de qualquer
outro pensamento que fosse contra seus princípios dogmáticos, ou que se apresentasse
como negação da verdade original segundo seus preceitos. É importante ressaltar que não
era somente o bispo de Cesaréia que se posicionava dessa forma, pois ele fazia parte de um
grupo social, cujo pensamento convergia com seus posicionamentos, contudo deve-se
perceber que o significado da palavra “heresia” foi adquirindo novos matizes com os
desenvolvimentos medievais31.
28
Idem, p. 63.
29
HILL, Jonathan. História do Cristianismo. São Paulo: Edições Rosari, 2008, p. 81.
30
MANDONI, Danilo. História da Igreja na Antiguidade. São Paulo: Edições Loyola, 2006, p.129.
31
BARROS,José D’ Assunção. Papas, imperadores e hereges na Idade Média. Petrópolis, RJ: Vozes,
2012. (Série A Igreja na História). p. 57.
uma escola famosa dedicada à expansão do Cristianismo entre as classes mais cultas32.
Nesse contexto começa a se propagar o pensamento ariano (entre 318 e 381 d.C.) através
de cartas, homilias, canções sacras e escritos33. A Controvérsia Ariana pautava-se em torno
de uma definição bíblica legítima da relação entre Deus, o Pai, e o Filho.
Ário interpretou o Filho de Deus em um sentido subordinacionista, ou seja, estava
numa posição inferior ao Pai, que teria sido criado do nada. O logos, desse modo, teria sido
“produzido”, através da obra de criação do Pai, era uma criatura como outra qualquer.Os
pontos principais da doutrina ariana são: o Pai é o único não-gerado, não-criado, eterno e
sem princípio, o único que é a origem; é anterior ao Filho; portanto se o Pai gerou o Filho,
este passou a existir no tempo, consequentemente houve um momento em que o Verbo
não existia; o Verbo é pura criatura e mutável, podendo conquistar novas perfeições34.
É interessante observarmos que a controvérsia do arianismo surge no âmbito do
cristianismo, difundida por um sacerdote cristão. Portanto, o arianismo não se configurava
como desvio da tradição ou como construção de uma nova seita, mas no nosso ponto de
vista numa busca pela verdadeira essência de Cristo, em um consenso sobre a gênese da
doutrina cristã.
Ário apoiava-se nas seguintes premissas bíblicas: Pr 8,22 (Deus me criou), Mc 10, 18
(só Deus é bom) e 13, 32 (o Filho ignora o dia do julgamento), Jo 14, 28 (o Pai é maior do
que eu), 1 Cor 15,28 (o Filho será submisso ao Pai), Cl 1,15 (o primogênito de toda
criatura)35.
Constantino resolve intervir nos debates sobre a essência de Cristo e convoca um
concilio, denominado de Concilio de Nicéia (em 335) que reuniu vários bispos para que
fosse deliberada a questão ariana e outras que estavam em discussão na época. No concilio,
alguns bispos estavam preocupados com a unidade da Igreja, e outros com as distorções
dos dogmas e doutrinas cristãos36.
O grupo em torno de Ário contava com os bispos Eusébio de Nicomédia e Eusébio
de Cesaréia, as discussões teológicas se acirraram ainda mais por causa da formulação da fé
cristã proposta pelos arianos, originando resistências. Eusébio de Cesaréia propôs uma
profissão de fé da sua comunidade que professava a fé num único Deus, dessa forma
32
MANDONI, op. cit., p.121.
33
MANDONI, op. cit., p.122.
34
MANDONI, op. cit., p.122.
35
MANDONI, op. cit., p.123.
36
PAPA, Helena Amália.Cristianismo Ortodoxo versus Cristianismo Heterodoxo: uma análise político-
religiosa da contenda entre Basílio de Cesaréia e Eunômio de Cízico (séc. IV d.c.).Dissertação –
Mestrado, Franca : UNESP, 2009, p. 45.
O arianismo
1.Carta de Ário a Eusébio, bispo de Nicomédia (c. 321)
Teodoreto, bispo de Ciro (423-458), H.E.I.V
37
STOCKMEIER,Peter; BAUER, Johannes B. Antiguidade In: LENZENWEGER, Josef etalli. História
da Igreja Católica. 3ed. São Paulo: Ed. Loyola, 2006, p.63.
A partir dessa passagem Eusébio começa a tecer sua fala sobre as diversas heresias,
que ele aponta como sendo calunias contra a Igreja cristã. Nesse trecho Simão é apontado
como o precursor das heresias, que enganou até mesmo Filipe, que estava em Samaria para
evangelizar. Compreendemos que existe uma concorrência na pregação daquilo que se
acredita, Simão Mago é visto como o primeiro herege e o representante do demônio. É
interessante observarmos que nesse momento as querelas e as heresias em questão são
38
BETTENSON,Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: Aste, 2007, p. 82.
39
EUSÉBIO DE CESARÉIA. História Eclesiástica. (Trad. Wolfgang Fischer; rev. Maria Aparecida
Salmeron). São Paulo: Novo Século, 2002. Livro II: 11, p. 33.
A partir da leitura dessa passagem, podemos perceber que Simão é salientado como o
inimigo da fé cristã, aquele que trabalha para o mau, e como principal concorrente dos
apóstolos. Eusébio aponta Simão Mago como sendo aquele que incitado pelo demônio
propagou uma doutrina falsa para atrapalhar a ascensão da Igreja. Tudo que não é tido
como parte da Igreja Romana passa a ser demonizado, para o autor as heresias eram as
obras do mau.
Considerações finais
Como podemos observar ao longo do trabalho, existia toda uma trajetória de
movimentos considerados heréticos anteriores a vida de Eusébio e de discursos sobre esses
movimentos na tradição da Igreja. Portanto, quando ele fala das heresias ele se posiciona
em relação a essa tradição, sendo por ela influenciado. Nosso intuito neste artigo foi de
verificar os processos formadores de identidade através do contexto de escrita da obra
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