Na minha jornada cristã eu passei por diversos momentos onde tudo parecia desmoronar em cima das minhas costas, e o peso estava se tornando insuportável para alguém tão fraca e humana. O mundo me apresentou a magia de poder viver sem regras, culpa ou remorso por minhas ações, mas esqueceram de me alertar que essa mesma magia tinha validade e consequências. Eu como a maioria dos jovens cristãos que conheço nasci de um berço evangélico, e frequento uma igreja desde muito antes de falar minhas primeiras palavras. Meus pais se conheceram quando minha mãe era um pouco mais nova do que sou agora, me lembro deles contarem a história de um sábado de manhã, ensolarado talvez, meu pai em oração pediu que Deus apresentasse ali sua futura esposa, e o sinal de aprovação seria um sorriso. Isso mesmo, meu pai pediu que Deus mandasse uma mulher que possivelmente casaria com ele no futuro, e como prova disso ela teria que sorrir para ele. Sabe, fico pensando no quanto isso foi arriscado, mesmo sem que ele percebesse. Qualquer pessoa poderia sorrir, era um dia de culto matinal em uma igreja cheia de varoas valorosas e solteiras, mas por que minha mãe? Dentre tantas outras, por que ela? Essa se parece muito com uma história de amor, e até certo momento foi, mas existem coisas no oculto que mudam todo o enredo do que antes era perfeito. Quando minha mãe estava prestes a terminar o ensino médio descobriu que estava grávida, de sua primogênita, ela nunca me contou com detalhes como foi o momento em que isso aconteceu, mas uma coisa era fato, a vida dela mudaria a partir daquele momento. Principalmente porque ela teria que parar seus estudos e cuidar de uma criança sem preparo nenhum. Eles ainda não estavam casados, e aos olhos da igreja esse era um pecado do qual teriam que conviver. Sem estrutura emocional, material ou financeira eles tiveram que ir morar juntos, viverem uma vida totalmente forçada. Eu imagino que meus pais sonhavam em se casar, mas não assim, não tão cedo. E o apoio da família não ajudou muito em meio a essa situação. A gestação foi tranquila, um dia minha mãe até me contou historias de desejos loucos que ela teve, um em especial é bem engraçado. Ela sentiu muita vontade de comer uma manga rosa, mas atenção: estava fora de época, então meu pai teve que rodar o bairro atrás dessa fruta, quando ele finalmente conseguiu e ela comeu, no mesmo instante, quase que automático, vomitou tudo. Eu me lembro de poucos momentos antes do nascimento do meu irmão, eu sempre pedi para minha mãe que ela tivesse mais um filho, mesmo que eu negue quando me perguntam. A chegada dele trouxe muitas emoções, meu irmão nasceu com algo chamado: sopro no coração. Ele verdadeiramente foi um milagre da vida, de Deus. Recordo-me especificamente de um dia onde entrei em casa com meu pai, tudo escuro, ao entrar no quarto minha mãe estava lá, segurando meu irmãozinho no colo, aquele foi o primeiro momento marcante para mim, com a minha família. Meus pais sempre me contaram como a gestação do meu irmão foi complicada, dias no hospital, remédios, cirurgia e lágrimas, quando minha mãe lembra-se disso hoje, ela pode ver o quanto Deus agiu em nossa vida, na vida dele. Passamos metade da infância indo na mesma igreja que meus pais tinham se conhecido, eu até que gostava, era legal, mas não me preenchia. Acho que desde pequena sempre gostei de conversar com Deus sobre o mundo, e como minha vida era feliz. Não sei o que mudou, mas em algum momento eu me questionei se realmente estava feliz e a minha resposta foi o silêncio. Existem situações que estão além do nosso controle, se torna mais difícil quando você não tem idade suficiente para entendê-las. O casamento dos meus pais estava em crise, pela primeira vez eu vi minha mãe soluçar de chorar e passar noites acordadas esperando por qualquer sinal de que as coisas iriam ficar bem. Não havia falta de amor, ou ausência de paixão, mas tudo se tornou morno, rotineiro. As palavras se tornaram fracas e o tempo fez questão de mostrar isso, foi ai que meus pais se separaram, nada muito amigável. Não me lembro de quantos anos tinha da primeira vez, mas sei que não facilitei esse processo. Minha mãe sofreu, foi doloroso, e ver ela naquele estado me fez repensar que historia de amor dirigido por Deus terminaria assim. Eu a pintei como um monstro, mesmo vendo todo o seu sofrimento, eu me perdi nas incontáveis vezes em que defendi meu pai e impedi-a de seguir e viver livremente sua vida. Inclusive mãe, eu nunca pedi desculpas por isso, você sabe do que estou falando, então me perdoe. O lado bom de tudo isso é que mesmo na dor, minha mãe nunca se esqueceu do Senhor. Constantemente íamos à igreja desejando mais da presença de Deus e pedindo cura, libertação. Mas ainda assim, aquilo não me preenchia. Meu pai se mudou para outra igreja, mesma denominação, bairros diferentes. Eles voltaram? Sim, três vezes para ser exata. E dessa ultima vez decidimos mudar para a mesma igreja que ele já estava frequentando, agora eu com doze anos e meu irmão com oito. Era um pouco diferente, lá eu sentia mais a presença do espirito santo e não demorou muito para fazer amigos, aparentemente uma família restaurada. Estávamos felizes, até que não deu certo de novo... Minha pergunta era: O que Deus está fazendo? O que ele está preparando para nós? Maturidade Aos 13 anos eu descobri um pouco do que é a paixão, e como ela poderia me destruir. Foi um período de autoconhecimento e muito medo, eu estava vivenciando experiências que antes eram impensáveis para mim. Muitos dizem que a transição da infância para a adolescência é um marco essencial na vida de qualquer pessoa, e eles tem total razão. Meus pais, por motivos óbvios, não imaginavam o que eu estava sentindo e como esse sentimento era pesado demais para ser carregado no peito. Sempre fui o tipo de “poucos amigos, mas os melhores”, porém nem mesmo para eles eu contei. Eu não fazia ideia do quanto aquilo estava me ferindo, mas eu sabia que se falasse tudo se tornaria pior. As idas e vindas mexiam com todo o meu psicológico, presenciar um divorcio é ruim e ver as brigas após essa decisão interfere na mente de qualquer criança sem a mínima noção do que é cuidar de sua saúde mental. Tornei-me rebelde, não ouvia ninguém, não queria saber de estudar, minhas notas caíram e minha mãe frequentemente escutava coisas ruins sobre mim. Tudo ficou pior quando meu pai arranjou uma namorada, foi ali que a minha ficha caiu, nós não seriamos mais uma família, tinha acabado. Eu nunca simpatizei com o gosto dele para as mulheres, há quem diga que até espantei algumas. Era como uma proteção, se distrair com coisas fúteis para não ver a realidade. No começo eu ia vê- lo a cada 15 dias, contava como estava à escola, a igreja, o clube. Mas, tudo não passava de mentira. O diabo me apresentou diversas sensações e sentimentos, um deles foi à mentira. Tinha se tornado comum, primeiro era só “eu estou bem” e mais tarde eram historias criadas de quem eu nunca fui. O que não te contam sobre crescer dentro de uma igreja é como isso pode ser sombrio, me vi obrigada a acreditar em termos e regras de uma denominação cujo para tudo havia uma sentença, sei que aprendi muitas coisas e sou grata por isso. A grande questão é que eu não podia pensar por mim, e isso se tornou sufocante a ponto de me fazer esquecer-se de todos os momentos bons que tive com Deus. Chega um momento na vida de todo cristão onde nos questionamos sobre a existência Dele, e se Ele realmente está olhando por nós. Eu queria voltar no tempo e ser como a minha mãe era, confiar mesmo na dor. A terceira coisa que o diabo me apresentou foi: as influências, qualquer pessoa que já foi adolescente ou está nessa fase vai saber o que estou dizendo. Amizades ruins disfarçadas de “vamos naquela festinha?” “é só um beijo” “você é crente né? Não pode fazer nada legal” “igreja é perda de tempo” “tão nova, vai curtir” e etc... As mães tem um sexto sentido aguçado quanto a isso, pelo menos a minha sempre me alertou de quem era bom ou não para mim, na época eu pensei que ela fosse chata, quadrada e não gostei nada de ser proibida de fazer coisas e andar com certas pessoas, mas não havia nada do que eu pudesse dizer para mudar isso, então fazia escondido. O meu erro estava bem ai, desobedecer quem um dia passou por cima de tudo para me dar uma boa criação. Ela se questionava se realmente era uma boa mãe, porque eu estava agindo daquela maneira. Corta- me o coração todas as vezes que ela sentou na cama e me disse olhando nos meus olhos “o que eu estou fazendo de errado? Não sou boa o bastante?” sempre que eu errava, o mais revoltante é que minhas lágrimas eram falsas, e eu não sentia nada naqueles momentos. Até cogitei a possibilidade de ir morar com o meu pai achando que a vida que eu levava por dois dias a cada fim de semana era a vida perfeita. Eu fiz coisas das quais me envergonho, provei coisas que não são boas para mim e que não agradam a Deus. Relacionei-me afetivamente com pessoas que sugaram toda a minha energia, tudo o que ainda era bom em mim. Houve uma época, acho que próximo dos meus 16 anos. Eu queria sair da igreja, eu pensava que era porque não acreditava mais em Deus, mas o real motivo nunca foi esse, eu me sentia suja e culpada. As pessoas às vezes podem proferir palavras duras e difíceis de escutar, em qualquer lugar existe a fofoca, inveja, especulações sobre quem você é ou o que você faz, e eu sentia todas as vezes que pisava dentro daquela igreja esses mesmos olhos julgadores apontando para mim. Foi ai que aos poucos me afastei do meu propósito, dando as costas para Deus. Nesse intervalo de tempo minha mãe também parou de ir aos cultos, então era chato seguir esse caminho sozinha. Nos primeiros meses eu ainda conseguia esconder dos meus pais o que estava acontecendo, e ainda viver uma vida dupla. Mas, algo me perseguia por onde eu andasse o fato de que eu ainda me sentia vazia e nada tinha o poder de me preencher. Um ano depois eu decidi retornar a igreja, porque senti falta dos meus amigos e de Deus (ainda não sabia que ele está em todos os lugares, basta apenas buscar) minha mãe ficou tão feliz. Porém, nem tudo são flores, sabe aquelas influências lá do passado? Voltaram a me rodear e eu cai, mais uma vez, só que agora era pior, eu quis. Recordo de um dia minha mãe chegar do trabalho e dizer que queria conversar comigo, nós sentamos na mesma cama e ela me disse exatamente assim: “Eu estou cansada de falar com você, de tentar te entender. Eu não sei o que estou fazendo de errado, nem porque você insiste em continuar com essas atitudes. Só vou te dizer uma coisa, não precisa responder para mim, apenas pensa. Ou o mundo, ou Deus. Sei que não estou na posição de exemplo nesse momento, mas você tem que escolher, não dá para viver uma vida com um pé na igreja e outro fora, faça sua decisão, eu não vou interferir.” Minha mãe não deve fazer ideia do quanto essa conversa foi poderosa para mim, foi um divisor de águas, e eu sei que mesmo sem perceber Deus estava usando ela ali naquele momento para me trazer de volta à Ele. Então eu comecei a orar, constantemente, todos os dias, pedindo que ele me transformasse e me concedesse forças para tomar uma decisão que mudaria por completo a minha vida espiritual.