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Mas que currículo é esse?

Um pré-formatado, que
desconsidera o contexto e as diferenças que o
compõe? Certamente não, já que, segundo a
especialista em educação inclusiva Maria Teresa E.
Mantoan, a inclusão pressupõe “a garantia do direito
à diferença na igualdade do direito à educação”. É
justamente aí que entra o conceito de flexibilização
curricular.

O termo flexível indica oposição ao que é duro, fixo,


fechado. Assim, no contexto educacional, flexibilizar
significa garantir o direito à diferença no currículo.
Implica a busca pela coesão da base curricular
comum com a realidade dos estudantes, suas
características sociais, culturais e individuais –
incorporando assim também os diferentes modos de
aprender e as múltiplas inteligências presentes em
sala de aula. De modo que todos se reconheçam no
currículo e sejam protagonistas no próprio processo
educacional.

Ou seja, flexibilizações e adaptações curriculares não


são a mesma coisa. Mais do que isso, a diferença
entre ambas é basilar. A própria expressão
“adaptado” denuncia que se trata de um “remendo”,
uma mudança pontual, específica para alguns: os
“diferentes”. Como se os demais fossem todos iguais.
No artigo “Receita de inclusão?”, Fabio Adiron se
refere às adaptações curriculares como um modelo
de intervenção individualizado, baseado em “um
paradigma que define a deficiência das pessoas
como única causa de seus problemas de
aprendizagem”, no qual o currículo é definido pelo
déficit, o que ressalta as incapacidades e não as
possibilidades dos alunos. E pondera: “esse é um
problema ideológico, mais do que pedagógico, pois
está focado na homogeneidade e não na
diversidade”.

Todos querem saber qual é o maior empecilho para


que a educação seja, de fato, inclusiva (quando uso
essa expressão estou sempre pensando na
educação de todos. Educação das pessoas com
deficiência não tem nada de inclusiva. Inclusão, ou é
para todo mundo, ou não é). Não adianta dizer que
uma boa formação de professores seria o suficiente.
A infraestrutura física das escolas ajuda muito, mas
também não resolve nada de forma isolada.
Pedagogia genial não funciona com professores
medíocres. Projeto político-pedagógico
(PPP) exemplar não resolve questões sociológicas.

O maior problema da educação é a busca incessante


da receita de bolo que não falhe nunca. O bolo que
atenda a todos gostos, sirva para educar todos de
forma homogênea e que, principalmente, não
demande nem das famílias, nem dos estudantes,
nem dos professores, algum trabalho. Que não
obrigue as pessoas a pensar. Bolo de pacote,
comprado no supermercado, em que basta adicionar
leite e bater no liquidificador.

Mas educação se faz com seres humanos. Alunos,


famílias e professores. E quando esse negócio
chamado ser humano entra no processo, o bolo
desanda. Cada um deles é diferente de todos os
outros. Cada um assa em uma temperatura diferente.
Cada um dá ponto em um momento diferente.

Howard Gardner – aquele que mesmo das


inteligências múltiplas – costuma dizer
que nossas continuamos a preparar
crianças e jovens para viver no século
XIX.

“Remendos” que se revelam insuficientes, visto que


há alunos que continuam não aprendendo, e
contraditórios em relação aos pressupostos da
educação inclusiva, já que continuam fundamentados
na ideia de incapacidade a partir de características
individuais. Um exemplo disso é a redução do tempo
de permanência na instituição de ensino para alguns
estudantes com base em seus diagnósticos. Outro
remendo, bastante comum, é o das assim chamadas
adaptações curriculares – muitas vezes apontadas
como “a” solução diante do desafio de incluir alunos
com deficiência intelectual, autismo ou dificuldades
de aprendizagem.
Mas o que são, afinal, as adaptações curriculares?
Na maioria das escolas, essa expressão diz respeito
à redução do conteúdo para alguns estudantes sob a
alegação de que estes não têm condições de acessar
o currículo comum como os demais. Mas essa não é
a lógica da integração? A perspectiva inclusiva indica
o direito de acessar o mesmo currículo. Conforme
Daniela Alonso afirma no artigo “Desafios na sala de
aula: dimensões possíveis para um planejamento
flexível”, a inclusão implica em oferecer uma mesma
proposta ao grupo como um todo e, ao mesmo
tempo, atender às necessidades de cada um, em
especial daqueles que correm risco de exclusão em
termos de aprendizagem e participação. Ou seja, o
que pode (e deve) diferir são as estratégias
pedagógicas e aspectos como complexidade,
quantidade e temporalidade para acessar um mesmo
currículo.

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