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NECROPOLÍTICA E VIOLÊNCIA RACIAL NO BRASIL

Mozart Linhares da Silva


Introdução - problematização
O Atlas da Violência de 2019 aponta para dados históricos do aumento de mortes
causadas por homicídio no Brasil. Segundo consta,
os dados oficiais do Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da
Saúde (SIM/MS), em 2017 houve 65.602 homicídios no Brasil, o que equivale a
uma taxa de aproximadamente 31,6 mortes para cada cem mil habitantes. Trata-se
do maior nível histórico de letalidade violenta intencional no país (2019, p. 5).
Em 2017 a taxa de jovens assassinados foi de 69,9 para cada 100 mil no país. Ou seja,
35.783 jovens morreram por homicídio. Como mostra o Atlas, “homicídios foram a causa de
51,8% dos óbitos de jovens de 15 a 19 anos; de 49,4% para pessoas de 20 a 24; e de 38,6%
das mortes de jovens de 25 a 29 anos; tal quadro faz dos homicídios a principal causa de
mortes entre os jovens brasileiros em 2017” (2019, p. 25). Numa série de dez anos, entre
2007 e 2017, observou-se um aumento de 38,3% de homicídio de jovens (2019, p. 28). Em
recortes mais específicos, o Atlas mostra que a violência letal tem alvos majoritários, como
negros, população LGBTI+ e mulheres, nos casos de feminicídio (2019). As mulheres
aparecem com um crescimento significativo, em que pese a subnotificação (ALCANTRA et
al., 2016; BRASIL, 2018), “com cerca de 13 assassinatos por dia. Ao todo, 4.936 mulheres
foram mortas, o maior número registrado desde 2007” (ATLAS, 2019, p. 35). No caso da
população LGBTI+ salta aos olhos dos pesquisadores do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública o grau de subnotificação e disponibilização de dados. Segundo consta no Anuário
Brasileiro de Segurança Pública de 2019, “apenas 10 dos 26 estados e Distrito Federal
apresentaram os dados referentes a registros de homicídios dolosos contra população
LGBTI+” (AMPARO, 2019, p. 90). Dados de 10 estados que enviaram informações
solicitadas pelo Fórum de Segurança Pública mostram que de 2017 a 2018 os casos de
homicídio doloso contra essa população cresceram 10,1% (AMPARO, 2019, p. 91).
O recorte racial das mortes no Brasil nos revela o quanto o racismo precisa ser
entendido como fator fundamental para a compreensão da dinâmica da violência no país. O
Atlas da Violência apresenta dados significativos a esse respeito: “Em 2017, 75,5% das
vítimas de homicídios foram indivíduos negros (definidos aqui como a soma de indivíduos
pretos ou pardos, segundo a classificação do IBGE, utilizada também pelo SIM), sendo que
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a taxa de homicídios por 100 mil negros foi de 43,1, ao passo que a taxa de não negros
(brancos, amarelos e indígenas) foi de 16,0” (2019, p. 49).
Segundo pesquisas apresentadas por Bueno; Marques; Pacheco e Nascimento, em
artigo no Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, “a cor da pele da vítima, quando
negra, fez aumentar em 8% a probabilidade de vitimização por homicídio” (2019, p. 62). Os
autores destacam ainda que “o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade
Racial mostrou que a chance de um jovem negro ser vítima de homicídio no Brasil é, em
média, 2,5 vezes superior à de um jovem branco” (2019, p. 62). O Atlas aponta, nessa direção,
que “analisando apenas a variação no último ano, enquanto a taxa de mortes de não negros
apresentou relativa estabilidade, com redução de 0,3%, a de negros cresceu 7,2%” (2019, p.
49).
De todo esse quadro de violência nos interessa aqui olhar com atenção para a
participação do Estado, ou seja, a violência relacionada às intervenções policiais. Segundo
levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, publicado no Anuário Brasileiro de
Segurança Pública de 2019, “11 a cada 100 mortes violentas intencionais foram provocadas
pelas Polícias”, o que significa que 17 pessoas foram mortas por dia, totalizando 6.220
vítimas em 2018 (2019, p. 8).
Bueno; Marques; Pacheco e Nascimento também mostram o quanto a polícia tem
matado jovens. Isto é, a média de idade dos jovens mortos pela polícia é menor do que a
média de idade dos mortos por homicídio comum.
Enquanto jovens até os 29 anos representam 54,8% das vítimas de homicídio no
Brasil, esta faixa etária concentra 78,5% das vítimas de intervenções policiais com
resultado morte. Na faixa etária compreendida entre 20 e 24 anos é que se dá a
maior parcela da vitimização por intervenções policiais, com 33,6% das vítimas
neste estrato etário (2019, p. 63).
Esses índices de violência, sobretudo os números de homicídios, tem endereçamento,
mostram algo mais que a violência de um país. Eles mostram um “modelo”, uma biopolítica
que implica intervenção na população ou, mais especificamente, uma necropolítica que toma
por alvo certos grupos cujas vidas são desqualificadas. O que nos leva à pergunta: quem são
as pessoas mais vitimadas pela violência policial? Das pessoas mortas pela polícia 99,3% são
homens, 77,9 % tinham entre 15 e 29 anos e 75,4% eram negros (ANUÁRIO, 2019, p. 9).
Como chamam a atenção Bueno; Marques; Pacheco e Nascimento, “constituintes de cerca
de 55% da população brasileira, os negros são 75,4% dos mortos pela polícia. Impossível
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negar o viés racial da violência no Brasil, a face mais evidente do racismo em nosso país”
(2019, p. 62).
Em pesquisa realizada sobre a letalidade policial por Jacqueline Sinhoretto e Danilo
de Souza Morais, constatou-se que:
Tomando como referência o ano de 2011, calculando as taxas de mortos pela
polícia em ponderação com a população de brancos e negros de cada estado,
verificou-se que em Minas Gerais foram mortos pela polícia duas vezes mais
negros do que brancos. Em São Paulo, as taxas foram três vezes mais desfavoráveis
para os negros. No Rio de Janeiro, a polícia matou quase quatro vezes mais negros
do que brancos. Em todos os estados pesquisados, as vítimas da letalidade são na
sua maioria jovens, e a idade média entre os negros mortos é menor do que a dos
brancos mortos (2018, p. 18).
É importante ressaltar que o corte racial não pode deixar de apontar ainda que esses
jovens negros são, na sua imensa maioria, pobres e moradores de periferia ou comunidades.
É preciso fazer o corte racial da classe, nesse sentido. Pesquisa publicada no Atlas da
Violência de 2018, mostra que “analisando a correlação entre as condições de
desenvolvimento humano e as taxas de mortes violentas, em geral, nos municípios com
melhores níveis de desenvolvimento humano a taxa de homicídio tende a ser menor” (2018,
p. 11). Segundo a pesquisadora Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro da
Segurança Pública,
basicamente mostramos que municípios com melhores níveis de desenvolvimento – e aqui
falamos de habitação, educação, inserção no mercado de trabalho, dentre outros – também
concentram menores índices de homicídio. Ou seja, estamos falando de pobreza, mas
principalmente, estamos falando de vulnerabilidade econômica e de desigualdade (G1,
15/06/2018).
Em entrevista concedida a Martel Alexandre del Colle, publicada no site
“Justificando”, um policial relatou que: “estamos em uma guerra ideológica para matar
pobre” (COLLE, 2019). O policial afirma ainda que “somos treinados com o mantra bandido
bom é bandido morto, mas nunca vi policial executar deputado bandido, juiz que vende
sentença, senador chefe de tráfico” (COLLE, 2019). As frases enfáticas do policial remetem
para uma ação policial e uma justiça desiguais e, sobretudo, para uma política das vidas que
merecem ou não serem vividas (BUTLER, 2018a).

As pesquisas enfatizam que a população pobre é a maior vítima da violência e da


letalidade policial e dentre essa população os negros, sobretudo jovens, precisam ser
destacados. Como mostram Jacqueline Sinhoretto e Danilo de Souza Morais,
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Além da morte violenta causada por ação policial, o predomínio da vigilância


policial sobre jovens negros também é constatado pelas taxas de encarceramento.
Além de serem vítimas preferenciais dos homicídios cometidos no país, inclusive
por policiais, os jovens e os negros são mais encarcerados do que os brancos e do
que os adultos, a ponto de ser possível afirmar que o crescimento do número de
presos no Brasil (que foi da ordem de 74% entre 2005 e 2012) foi impulsionado
principalmente pela prisão de jovens e de negros (2018, p. 18).
Segundo Samira Bueno,
62,1% das vítimas das ações policiais em São Paulo entre 2013 e 2016 eram negros
e 33,9% brancos. (...) Enquanto os brancos representam 63,1% da população
paulista, 30% desta parcela é vítima da ação policial; já os negros, que representam
36,9% do total do Estado, são 66,5% das vítimas (2018, p. 79-80).
Os casos mais publicizados pela grande mídia sobre violência por agentes de
segurança pública (e o exército) em 2019 revelam esse quadro desolador de vulnerabilidade
de determinados grupos sociais, nomeadamente negros. Em abril o músico Evaldo dos Santos
Rosa, 51 anos, negro, foi morto depois de ter seu automóvel alvejado por 80 tiros disparados
pelo exército. Segundo matéria do El País, “Vídeos mostram a reação dos moradores, que
denunciavam ter uma família dentro do veículo, incluindo uma criança de sete anos” (EL
PAÍS, 08/04/2019). Em junho, a Menina Agatha Félix, de 8 anos, negra, foi baleada nas
costas, no Complexo do Alemão – RJ. Segundo divulgação do G1 Globo, “Moradores dizem
que não havia confronto e policial efetuou o disparo. PM nega acusação” (23/09/2019). O
mais recente caso ocorreu em 1º de dezembro de 2019, na comunidade de Paraisópolis, na
zona sul de São Paulo, quando uma ação da Polícia Militar matou 9 jovens com idade entre
14 e 23 anos, majoritariamente negros. Segundo noticiou a matéria da UOL sobre o caso,
“Vídeos mostravam policiais agredindo jovens frequentadores de bailes, por vezes em
situações nas quais as vítimas estavam totalmente dominadas; ou atirando bombas e
disparando balas de borracha a esmo contra o público” (UOL, 7/12/2019).
Pois bem, frente a esse breve levantamento e considerações iniciais, este texto visa
problematizar a violência no Brasil, nomeadamente a racial, trazendo como grade de análise
a perspectiva da biopolítica, na esteira dos estudos de Michel Foucault (1991, 2001, 2002,
2008a) e Agamben (2002, 2004), e necropolítica, conforme a análise de Achille Mbembe
(2019). O argumento central que defendo aqui é que a violência no Brasil, da forma como
historicamente foi endereçada, permite ser tratada como desdobramento de uma
necropolítica, de uma política de soberania, que decide, de fato, quem deve morrer e quem
pode viver.
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Poder soberano e necropolítica


Em entrevista a Felipe Betim, em matéria do El País, o sociólogo Renato Sérgio de
Lima faz a seguinte afirmação que tomo como ponto de partida:
Hoje, mais de 500 anos depois da chegada dos portugueses, impera a máxima
"bandido bom é bandido morto" na sociedade. "Crime existe em países ditos
desenvolvidos. Mas, ao contrário deles, não criamos uma ética pública em que
nosso limite é a não-violência. Ela nunca foi interditada nem ética nem
politicamente no país", acrescenta. Significa que a violência não só faz parte de
nossa história como também a toleramos. “Só que toleramos a violência sempre
com o outro, e com quem achamos que é matável”, completa (BETIM, 2019).
Percorrer a história da violência contra os mais vulneráveis no processo de construção
da história brasileira nos levaria a um longo e demorado percurso que nos remeteria ao início
da ocupação em 1500, nos obrigaria a revisitar os episódios da violência colonial, a
dizimação dos povos indígenas, a escravidão e as ditaduras do século XX. Não é razoável
pensar a violência no Brasil sem considerar, portanto, uma tradição autoritária e violenta
(SCHWARCZ, 2019). Quem foram/são os matáveis, as “vidas nuas” que durante todo o
processo de construção social brasileiro foram expostas à violência e à morte e sem que com
isso se produzissem culpados formais? Qual a relação entre essas vidas matáveis e a
indignação pública? Como essas indignações seletivas produzem e legitimam a necropolítica
ou o poder soberano de decidir sobre a morte desse Outro?
Essas questões, que evidentemente não serão respondidas na sua integridade nesse
espaço, servem para problematizar a ideia de biopolítica, conforme a analítica foucaultiana,
e nos conduzir para uma perspectiva mais atinente à necropolítica.
A reflexão de Achille Mbembe sobre a necropolítica é tributária da analítica de
Michel Foucault sobre a biopolítica. Michel Foucault tratou da biopolítica inicialmente na
conferência “Nascimento da medicina social”, proferida no Rio de Janeiro, em 1974. A
discussão aparece incipiente no último capítulo no volume primeiro de “História da
Sexualidade: a vontade de saber” ([1976] 2001) e com maior profundidade na aula de 17 de
março do curso de 1975-1976 no Collège de France, publicado posteriormente sob o título
“Em Defesa da Sociedade” (2002), bem como nos Cursos de 1977-1978 e de 1978-79,
também posteriormente publicados com os títulos “Segurança, território, população” (2008a)
e “O nascimento da biopolítica” (2008b), respectivamente.
Foucault desenvolve as análises sobre o biopoder como um deslocamento de ênfase
do poder disciplinar, estudado em “Vigiar e punir” ([1975] 1991). Trata-se do deslocamento
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(ou mesmo sobreposição) do poder centrado no corpo individual (ou numa anátomo-política
do corpo) para um espectro mais amplo do alvo do poder, direcionado ao corpo-espécie da
população. Segundo o autor: “depois da anátomo-política do corpo humano, instaurada no
decorrer do século XVIII, vemos aparecer, no fim do mesmo século, algo que já não é uma
anátomo-política do corpo humano, mas que eu chamaria de uma ‘biopolítica’ da espécie
humana” (FOUCAULT, 2002, p. 289).
Mas o poder disciplinar e a biopolítica precisam ser entendidos, ainda, como uma
forma de poder que se diferencia do poder soberano, centrado na figura do monarca. Seria
uma forma de governo posterior ao triunfo da soberania, como a encontramos em Hobbes,
por exemplo. Chloë Taylor afirma que ao analisar o biopoder, Foucault “traça a mudança do
poder clássico, jurídico-legal ou soberano para duas formas tipicamente modernas de poder,
o poder disciplinar e o biopoder, como uma mudança de um direito de morte para um poder
sobre a vida (...)” (2018, p. 58). Continua o autor apontando que
a disciplina pode, portanto, ser vista como biopoder ao visar o corpo individual,
enquanto outro nível de biopoder visa o corpo-espécie. ... Esses dois níveis de
poder estão necessariamente entrelaçados, uma vez que corpos compõem
populações e populações são compostas de corpos individuais (TAYLOR, 2018, p.
63).
É nessa sucessão da soberania à biopolítica que Foucault mostra uma nova relação
com a vida e a morte. Não se trata mais, como na soberania, de um poder que faz morrer e
deixa viver e sim de um poder que ao tomar a vida da população como um valor político faz
viver e deixa morrer (FOUCAULT, 2002). A biopolítica marca a entrada da vida no cálculo
político. É o momento em que a saúde, as taxas de morbidade, nascimento, densidade
populacional, epidemias, raça, entre outros, passam a ser alvo de um governo que quer
otimizar a vida, que quer promovê-la, valorizá-la. A biopolítica marca, ainda, a emergência
do capitalismo e suas formas de valoração do mundo, e a vida, nesse sentido, passa a ser
investida de valor. Segundo Foucault,
Dizer que o poder, no século XIX, incumbiu-se da vida, dizer pelo menos que o
poder, no século XIX, incumbiu-se da vida, é dizer que ele conseguiu cobrir toda
a superfície que se entende do orgânico ao biológico, do corpo à população,
mediante o fogo duplo das tecnologias de disciplina, de uma parte, e das
tecnologias de regulamentação, de outra. Portanto, estamos num poder que se
incumbiu tanto do corpo quanto da vida, ou que se incumbiu, se vocês preferirem,
da vida em geral, com o pólo do corpo e o pólo da população (2002, p. 302).
Nesse processo de cobertura da vida e do biológico pelo poder assistimos à
emergência do racismo de Estado. Contemporâneo ao nascimento do Estado-nação moderno,
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o biopoder faz da raça o constructo da ideia de população nacional. Se o racismo já existia


antes do Estado é preciso considerar que “o que inseriu o racismo nos mecanismos do Estado
foi mesmo a emergência desse biopoder. Foi nesse momento que o racismo se inseriu como
mecanismo fundamental do poder, tal como se exerce nos Estados modernos” (FOUCAULT,
2002, p. 304). O racismo de Estado elimina “não os adversários, mas os perigos, em relação
à população e para a população” (PELBART, 2011, p. 59). Nesse sentido a biopolítica faz
viver uns em detrimento de outros, anunciando que também há um poder soberano que decide
quem deve morrer para que outros vivam melhor e mais seguros. Foi desta ocupação que os
programas de eugenia se incumbiram a partir do final do século XIX (SCHWARCZ, 1993;
BLACK, 2003; STEPAN, 2005; DIWAN, 2007; SILVA, 2013).
As análises de Foucault findam em 1984, ano de sua morte. É evidente que a dinâmica
social e as transformações do poder de lá pra cá sofreram mutações significativas que seus
comentadores nos ajudam a problematizar.1 No caso, as contribuições de Agamben e
Mbembe me servem de suporte nesse texto.
Considerando a dinâmica da violência do racismo e como ele se institui nos
mecanismos de Estado, o conceito de homo-sacer de Agamben nos possibilita compreender
melhor o alcance dessa institucionalização a partir da ideia de soberania e excepcionalidade
(2002, 2004). Segundo Agamben, “soberania é a esfera na qual se pode matar sem cometer
homicídio e sem celebrar um sacrifício, e sacra, isto é, matável e insacrificável, é a vida que
foi capturada nesta esfera” (2002, p. 85). De toda a análise realizada pelo autor, nos interessa
reter, para os propósitos desse artigo, como funciona a secessão ente bios e zoé, entre vida
qualificável e vida desqualificável. Agamben se refere ao significado do termo povo na
tradição europeia como um indicativo da fratura interna na população pois, além de indicar
a compreensão mais ampla dos sujeitos constituídos politicamente, povo designa também os
pobres e excluídos. Segundo ele, “um mesmo termo denomina, assim, tanto o sujeito político
constitutivo quanto a classe que, de fato, se não de direito, é excluída da política” (2002, p.
172). Disso resulta dois pares categoriais e suas relações: a “vida nua (povo) e existência
política (Povo), exclusão e inclusão, zoé e bíos” (AGAMBEN, 2002, p. 173).

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Vale ressaltar também que os estudos inspirados em Foucault vêm operando um alargamento espacial analítico
importante, se deslocando do caso europeu, que é por onde Foucault se movimenta, e abrindo espaço nos
estudos sobre a África e a América Latina, bem como aos estudos decoloniais, o que tem contribuído, inclusive,
para uma crítica ao universalismo de caráter eurocêntrico que marca as pesquisas sobre a modernidade.
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Fica evidente que o poder soberano tem nesse par categorial um dispositivo
fundamental que o possibilita dizer quem deve morrer sem que com isso se cometa
assassinato e, vale dizer, provoque comoção social. Como afirma Mbembe, “na economia do
biopoder, a função do racismo é regular a distribuição da morte e tornar possíveis as funções
assassinas do Estado” (2019, p. 18). Mbembe propõe uma análise do terror moderno, da
violência e da política da morte a partir do evento da escravidão moderna. Para ele o
colonialismo, antes do Estado Nazista, inaugura a biopolítica. Lançando mão das análises de
Arendt, coloca que “a conquista colonial revelou um potencial de violência até então
desconhecido. O que se testemunha na Segunda Guerra Mundial é a extensão dos métodos
anteriormente reservados aos ‘selvagens’ aos povos civilizados da Europa” (2019, p. 32).
Aimé Cesáire, a esse respeito já colocava que “o que não é perdoável em Hitler não é o crime
em si, o crime contra o homem em si, senão o crime contra o homem branco, é a humilhação
do homem branco, e haver aplicado na Europa procedimentos colonialistas que até agora só
concerniam aos árabes da Argélia, aos coolies da Índia e aos negros da África” (2010, p. 21-
22).
Mbembe toma a plantation colonial como Agamben (2004) toma o campo, como um
modelo de Estado de exceção. Para ele, “em muitos aspectos, a própria estrutura do sistema
de plantation e suas consequências manifesta a figura emblemática e paradoxal do estado de
exceção” (MBEMBE, 2019, p. 27). E segue apontando que
no contexto da plantation, a humanidade do escravo aparece como uma sombra
personificada. De fato, a condição de escravo resulta de uma tripla perda: perda de
um ‘lar’, perda de direitos sobre seu corpo e perda de estatuto político. Essa tripla
perda equivale a uma dominação absoluta, uma alienação de nascença e uma morte
social (que é expulsão fora da humanidade) (MBEMBE, 2019, p. 27).
A vida qualificada como objeto, desqualificada politicamente e sua suspensão da
humanidade traduzem um “tipo social” em estado permanente de exceção, de vida nua. A
suspensão da humanidade do escravo liga sua condição social da escravidão à raça, no caso,
uma raça sub-humanizada, cuja vida é destituída de valor, é desumanizada. Como afirma
Butler, “há ‘vidas’ que dificilmente – ou, melhor dizendo, nunca – são reconhecidas como
vidas” (BUTLER, 2018a, p. 17). Nesse sentido Mbembe afirma que “a vida do escravo, em
muitos aspectos, é uma forma de morte-em-vida” (MBEMBE, 2019, p. 29).
Para o escravo a experiência cotidiana do estado de exceção é permanente. A
racialização do escravismo moderno faz transbordar este estado ao negro, ou seja, o racismo
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faz deslocar a desumanização do escravo para uma sub-humanização do negro. As teorias


raciais do século XIX não cansaram de tentar demostrar a inferioridade biológica e moral dos
povos não brancos, sobretudo negros (DARMON, 1991; GOULD, 1999; STEPAN, 2005).
São essas teorias que sustentaram a epistemologia do colonialismo. Além do mais, no
colonialismo, a ideia do selvagem, da desordem de povos que vivem apartados da lógica do
Estado-nação moderno, cria a possibilidade de uma relação distinta daquela estabelecida na
guerra entre dois Estados soberanos. É nesse sentido que o mundo colonial se torna uma
experiência ampla de exercício do Estado de exceção permanente, estado em que se coloca
em suspensão jurídica os direitos civis e a própria condição ou dignidade humana, tornando
legal o que é ilegal (AGAMBEN, 2004, p. 12). Como afirma Mbembe, “as colônias são o
local por excelência em que os controles e as garantias de ordem judicial podem ser suspensos
– a zona em que a violência do estado de exceção supostamente opera a serviço da
‘civilização’” (2019, p. 35).
A perspectiva biopolítica tomada como esteio analítico de Mbembe aponta para um
deslocamento fundamental para pensar o mundo colonial e pós-colonial e, com isso, mostra
que a biopolítica como arte de governar fazendo viver e deixando morrer não dá conta de
contextos em que a biopolítica opera pela lógica soberana do fazer morrer. A política da
morte, como traduzida pela necropolítica, atualiza a biopolítica foucaultiana e abre o caminho
para pensar o mundo pós-colonial e pós-abolição, como é o caso latino-americano e, no caso
aqui em destaque, o do Brasil. Como nos diz Fátima Lima,
“Necropolítica” fornece ferramentas para pensarmos a forma de constituição de
diagramas de poder não apenas nos contextos pós-coloniais de Áfricas, mas
também nos processos de colonização, neocolonização, descolonização e nos
traços de colonialidade que ainda imperam com força nos contextos latino-
americanos, caribenhos e brasileiros (2018, p. 26).
É nesse sentido que a analítica necropolítica
rompe as fronteiras dos países que passaram pelos processos de colonização e
neocolonização e assume uma importância analítica numa agenda mundial onde
podemos pensar em um devir negro do mundo onde a precarização da vida inclui
não apenas as populações negras, mas também os não negros empobrecidos e cada
vez mais precarizados (LIMA, 2018, p. 22).
Como afirmei no início deste artigo, a violência e nominalmente a violência de
Estado, historicamente constituída e estruturada no Brasil, tem alvos bem evidentes no corpo-
espécie da população. Como afirma Fátima Lima,
Assim, nos contextos brasileiros, o poder necropolítico se faz visível no sistema
carcerário, na população em situação de rua, nos apartheids urbanos nas grandes e
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pequenas cidades brasileiras, em dados relevantes, no genocídio da população


negra que em sua maioria é jovem e masculina, na eclosão dos grupos de
justiceiros, nos hospitais psiquiátricos, nas filas das defensorias públicas, nas
urgências e emergências hospitalares, entre tantos outros lugares (2018, p. 28).
Considerando os limites desse artigo, tomamos como eixo de análise o corte racial da
violência do Estado, mostrando uma tradição de violência e racismo que vem se desdobrando
desde o pós-abolição.

Racismo institucional/estrutural e necropolítica

Em 03 de setembro de 2019 os jornais noticiavam que um “Jovem negro (17 anos) é


amarrado nu, agredido e filmado em supermercado de SP. Imagens mostram um segurança
chicoteando adolescente após tentativa de furto de chocolate...” (GGN, 03/09/2019). A
notícia que chocou muitos também foi aplaudida por outros tantos. Visto que, como indica
Butler (2018a), o nosso horror moral, ou seja, aqueles por quem somos capazes de sentir
comoção, como um sinal de nossa humanidade é dividido implicitamente “entre aqueles por
quem sentimos um apego urgente e irracional e aqueles cuja vida e morte simplesmente não
nos afetam, ou que não consideramos vidas” (BUTLER, 2018a, p. 80-81). Não há como não
ver no corpo negro e nu recebendo chibatadas uma cena típica do período escravista, como
fora representada na clássica pintura “Pelourinho”, de Jean Baptiste Debret, de 1827.
Não há como não ver nessa cena bizarra o exercício da soberania. O rapaz que fora
torturado por roubar uma barra de chocolate engorda as estatísticas sobre a vulnerabilidade
de jovens negros no Brasil. Há uma tácita tolerância social com esse tipo de violência. A
seletividade da indignação social com a violência sofrida por determinados grupos sociais
espelha os próprios critérios utilizados pelo poder soberano ao decidir sobre a vida e a morte,
cujos desdobramentos podem ser evidenciados na forma como a sociedade, ao eleger aqueles
a quem a vida (desqualificada) fora negada, é seletiva também no enlutamento (BUTLER,
2019b). Se o racismo não esgota as explicações sobre a dinâmica da violência no Brasil, ele
certamente é um dos principais eixos problematizadores.
É praticamente inviável tratar do racismo no Brasil sem trazer para a discussão a ideia
de democracia racial. É, pois, na construção do chamado mito ou ideologia da democracia
racial – entendida aqui como um dispositivo de segurança – que a especificidade do racismo
no Brasil se constitui. E por que a democracia racial funciona como um dispositivo de
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segurança? Muito rapidamente, o dispositivo de segurança age não diretamente nos


indivíduos, mas agencia a população, governa pelo meio, pelo ambiente e conduz condutas
a partir da incitação, do desejo e da liberdade. Noutras palavras, os dispositivos de segurança
visam regular e controlar a sociedade em diversos aspectos. São estratégias normalizadoras
que, no caso da questão racial aqui tratada, visa normalizar o corpo espécie da população.
Foucault afirma que os dispositivos de segurança, entre outras coisas, “têm por função
modificar em algo o destino biológico da espécie” (2008a, p. 15). Entendo, nessa direção,
que os dispositivos de segurança podem agir como amortecedores de conflitos, no caso racial,
visando a diminuição dos riscos sociais. É nesse sentido que a democracia racial como
“ideologia” que prega a inexistência de racismo ou mesmo de conflitos raciais no Brasil atua
destituindo de valor a experiência racial ou racista do cotidiano. Mas há outro elemento
fundamental que nos ajuda a entender esse dispositivo. A democracia racial enquanto
narrativa antirracista nacional tem uma elaboração complexa que implica na maneira como
a miscigenação fora tratada no contexto pós-abolição. A miscigenação fora alçada à empiria
do antirracismo nacional, ou melhor, como prova da inexistência do racismo.
No contexto do final do período escravista e, principalmente, no pós-abolição, a
miscigenação se tornou central nas disputas de sentido sobre a nacionalidade brasileira. No
cerne desse debate estava o racismo científico que havia oferecido à ideia de raça uma
elaboração cientificamente aceita. Autores influentes que participaram dessa elaboração
deixaram suas impressões nada otimistas sobre a população brasileira. É o caso, para lembrar,
do suíço naturalizado norte-americano, Jean Louis R. Agassiz (1807-1873), e do Conde de
Gobineau (1816-1882), autor da obra “Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas”
(1858). Gobineau foi diplomata no Brasil, quando manteve estreita amizade com D. Pedro
II. Tanto Agassiz, que também viajou pelo Brasil, deixando uma obra significativa de seus
estudos por aqui, quanto Gobineau, execravam a miscigenação como degeneradora da raça e
civilização nacional. Agassiz afirmava que “do ponto de vista da fisiologia, uma boa política
é colocar todos os obstáculos possíveis ao cruzamento das raças e ao aumento dos mestiços”
(AGASSIZ, August 10, 1863, [1885] 2004. Trad do autor). Gobineau deixou observações
como essa: “Já não existe nenhuma família brasileira que não tenha sangue negro e índio nas
veias; o resultado são compleições raquíticas que, se nem sempre repugnantes, são sempre
desagradáveis aos olhos” (SOUSA, 2013, p. 22). O médico e antropólogo maranhense, que
12

figurou como o maior expoente da Escola de Medicina da Bahia, Raimundo Nina Rodrigues
(1862-1906), deixou extensa e importante obra sobre os negros. Autor, entre outras, da obra
“As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil” (1894), tributária da antropologia
criminal de Cesare Lombroso. Dentre as abordagens de Nina Rodrigues sobre a
miscigenação, está a ideia de uma “criminalidade mestiça [como] uma peculiaridade
nacional” (SCHWARCZ, 2012, p. 22). Ideia comum na época, compartilhada por exemplo,
pelo penalista Laurindo Leão, que afirmava que “uma nação mestiça é uma nação invadida
por criminosos” (SCHWARCZ, 1993, p. 167). Seguindo, portanto, uma orientação advinda
do racismo científico, a miscigenação era vista como impedimento civilizatório.
As elites brasileiras do pós-abolição enxergavam nessa avaliação um obstáculo que
deveria ser ultrapassado. Em meio às discussões entre eugenistas e sanitaristas, que marcaram
os anos 1910-20, uma abordagem heterodoxa sobre a miscigenação passou a ser propagada
e amplamente aceita pelas elites da época (SKIDMORE, 2012). Tratava-se de um movimento
de ideias que inclusive foram divulgadas no exterior pelo então diretor do Museu Nacional,
Batista de Lacerda, quando de sua participação no Congresso Universal das Raças, realizado
em Londres, em 1911, ocasião em que proferiu a palestra Sur les metis au Brésil. A tese
central dessa abordagem é que a miscigenação ao contrário de sua potencial degeneratividade
do corpo-espécie da população, deveria operar uma depuração da cor, ou seja, sendo o sangue
branco superior ao do negro, sucessivas misturas raciais, auxiliadas pelos fluxos imigratórios
de tipos eugenizados, levariam ao branqueamento dessa população. Segundo a avaliação de
Lacerda sobre esse processo: “provavelmente antes de um século a população do Brasil será
representada, na maior parte, por indivíduos de raça branca, latina, e para a mesma época o
negro e o índio terão certamente desaparecido (sic) desta parte da América” (1912, p. 94-95).
A miscigenação vai sendo tratada como antídoto à degeneração, torna-se o meio pelo
qual o corpo-espécie podia ser constituído, branqueado. Certamente essa é uma versão
inusitada da eugenia, mas ganhou corpo e passou a ser um elemento-chave no processo de
integração do negro na sociedade nacional nos anos 1930, quando os elementos da tradição
afro-brasileira passaram a ser incorporados na cultura, como na música, culinária, arte etc.
Nos anos 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas, assistimos à construção de uma narrativa
nacional que incorporará a miscigenação como “cimento constitutivo” da nacionalidade. E
nessa narrativa o negro podia ser incorporado, mesmo que seu virtual desaparecimento já
13

estava aí anunciado. Trata-se de uma in/exclusão, que os índices de incorporação à sociedade


moderna não cansam de mostrar como deficitário. Inclusão pela cultura, exclusão
socioeconômica. Direitos políticos, mas não direitos sociais. Toda narrativa daí depreendida
será estruturada na negação do racismo no Brasil, haja vista a mestiçagem, constituindo um
dispositivo de segurança capaz de impedir os conflitos a partir da anulação das polaridades
de cor. A mestiçagem anula a polaridade branco-negro. É o pardo que será o eixo norteador
dessa construção. E não deixa de ser interessante observar que mesmo sendo elevado à
condição de nexo identitário nacional o mestiço ou o pardo não galgaram significativa
diferença em termos de precarização socioeconômica em relação aos pretos (DAFLON,
2017).
Mesmo que o mestiço possa ter tido mais elasticidade no seu processo de mobilidade
social, o que Daflon mostra é que as hierarquias e o edifício racial permanecem relativamente
intactos (2017, p. 162). Feitas essas considerações, vale ressaltar ainda que a democracia
racial serviu para a manutenção de certos privilégios da branquitude ao subtrair a percepção
racial implicada nas desigualdades sociais além de assegurar o seu lugar de neutralidade
racial. O branqueamento, enquanto mecanismos de subjetivação, impelia os negros ao
branqueamento moral, estético e comportamental, como mostra o estudo de Domingues sobre
o caso dos negros de São Paulo (2002). Segundo o autor:
Ao assimilarem os valores sociais e/ou morais da ideologia do branqueamento,
alguns negros avaliavam-se pelas representações negativas construídas pelos
brancos. Era necessário ser um ‘negro da essência da brancura’. Por isso,
desenvolveram um terrível preconceito em relação às raízes da negritude. Aliás, a
recusa da herança cultural africana e o isolamento do convívio social com os negros
da "plebe" eram duas marcas distintivas dos negros "branqueados socialmente ...
(DOMINGUES, 2002, p. 576).
Esse é o funcionamento do dispositivo de segurança ao promover processos de
subjetivação associados à branquitude: destituir a possibilidade da percepção dos conflitos e
dissimetrias sociorraciais. Com esse mecanismo o racismo institucional e estrutural
(ALMEIDA, 2018) se torna pouco aparente, colocando a ênfase de casos de racismo a
iniciativas erráticas individuais. A democracia racial ao ser incorporada ao discurso oficial
de Estado desde os anos 1930 inoculou nas narrativas identitárias nacionais a impossibilidade
da aceitação do racismo. A ideia do não reconhecimento do racismo pelo Estado - e também
pelos indivíduos - contribui para a construção de uma visão social refratária à discussão sobre
os conflitos raciais ou mesmo sobre a implicação do racismo nas desigualdades sociais no
14

país. É nesse sentido que a democracia racial contribuiu, ainda, para tornar mais invisível, do
que normalmente é, o racismo institucional. Em síntese, o racismo institucional, por si, coloca
no centro das análises o racismo como mecanismo incrustrado nas instituições - públicas ou
privadas – agindo para além da “consciência” dos sujeitos sociais. Wieviorka lembra que, do
ponto de vista da análise sociológica, o risco de fechar a análise na institucionalidade do
racismo é perder de vista os atores sociais e fazer do racismo “um fenômeno abstrato, a
repousar aparentemente sobre mecanismos abstratos, sem atores” (2007, p. 33).
É fundamental tomarmos como eixo analítico o racismo institucional para
entendermos, por outro lado, como as instituições promovem processos de constituição dos
sujeitos, como os próprios atores sociais estão implicados nas instituições e estruturas sociais
mais amplas. Talvez o exemplo mais claro das implicações do racismo institucional seja
encontrado nas ações das forças de segurança. Como afirmam Cerqueira e Moura, “não é
difícil colecionar situações em que as abordagens policiais e o uso excessivo da força são
totalmente diferenciados quando as relações se dão com cidadãos negros” (2013, p. 5). E não
se trata aqui de casos individuais aleatórios, pois temos, como mostram os dados estatísticos,
uma seriação de ações repetidas, similares quando não idênticas compartilhadas por inúmeros
sujeitos institucionalizados. Mecanismos jurídicos, como os “autos de resistência” (e mais
recentemente a tentativa de ampliar o excludente de ilicitude), amparado pelo artigo 292 do
Código de Processo Penal, por exemplo, contribuem para a institucionalidade da violência
policial. Segundo Lemos et al, “os autos de resistência são efeitos de uma política criminal
orientada pela metáfora da guerra, cujos discursos de segurança pública produzem o inimigo
interno da sociedade que deverá ser eliminado em nome da segurança” (2017, p. 173). Trata-
se de uma política que visa autorizar e, no limite, estimular a letalidade. Para exemplificar
como os autos de resistência de fato se constituem como um dispositivo da necropolítica,
vale lembrar a pesquisa coordenada por Michel Misse no Rio de Janeiro:
o número de inquéritos de “autos de resistência”, arquivados por “exclusão de
ilicitude” a partir de 2005 alcança a cifra de 99,2% por cento de todos os inquéritos
instaurados. De todos os autos de resistência registrados em 2005, apenas 19
chegaram a ser tombados no Tribunal de Justiça até 2007 e desses, 16 vieram do
Ministério Público com pedido de arquivamento e apenas três com denúncias
(2011, p. 28).
Como afirma Lemos et al, “na prática, esses homicídios só seguem para apuração por
parte do Ministério Público quando ganham visibilidade midiática e contam com a pressão
popular, se não são arquivados” (2017, p. 172). É nesse sentido que Cerqueira e Moura nos
15

provocam: “Neste ponto, podemos tentar nos lembrar de tantas notícias sobre mortes
violentas de inocentes brancos e negros. Será que a repercussão, o impacto na mídia e a
reação midiática natural das autoridades é a mesma?” (2013, p. 14).
É importante dizer que a democracia racial, como dispositivo de segurança que
inclusive faz funcionar de forma efetiva e pouco evidente o racismo institucional, ao
interditar a admissão do racismo, produz uma sociedade incapaz de criar sensibilidades ou
ainda indignação frente às práticas cotidianas de racismo. A construção dos estereótipos
sociais cria as condições para a insensibilização e mesmo a autorização tácita de matar certos
grupos. Como afirma Lemos et al:
Olhar o jovem pelo lugar negativo, pela suspeita de que ele irá roubar, matar,
traficar, usar drogas, vagar ocioso, furtar, é uma maneira de forjar uma posição
subjetiva, um lugar social e institucional para ele e criar subjetividades como
modos de ser pela visão vingativa de que esses grupos devem receber punições
variadas, de sorte que a morte deles não causará revolta nem choro; apenas gerará
indiferença, já que eles foram privados, em primeiro lugar, de reconhecimento
positivo para, depois, serem enclausurados e/ou mortos, muitas vezes antes de
qualquer julgamento baseado na Constituição de 1988 (2017, p. 168-169).
Essas práticas de violência e letalidade, com anuência social (ainda que não
consensuada) faz com que esses grupos, nominalmente pobres e negros, vivam em
permanente Estado de exceção. São vidas nuas, não-enlutáveis, vulneráveis e desqualificadas
politicamente. Quando Foucault analisa a biopolítica e, nesse quadro analítico o racismo, ele
mostra que “a morte do outro não é simplesmente a minha vida, na medida em que seria a
minha segurança pessoal; a morte do outro, a morte da raça ruim, da raça inferior (ou do
degenerado, ou do anormal), é o que vai deixar a vida em geral mais sadia; mais e mais pura”
(2002, p. 305). É nesse sentido que o racismo, ainda segundo Foucault, assegura a função da
morte na economia do biopoder (2002, p. 308).
É preciso lembrar que o projeto de branqueamento do pós-abolição anunciava, de
certo modo, o desaparecimento de não-brancos da população brasileira. Eram os negros,
mestiços e indígenas considerados excedentes, verdadeiros entraves civilizatórios. O
abandono por parte do Estado, a insensibilidade social com esses segmentos da população,
majoritariamente pobres, é historicamente comprovado (LOBO, 2008; SCHWARCZ, 2019).
A percepção negativa que a branquitude construiu historicamente sobre negros, mestiços e
indígenas é traduzida na hierarquização do valor da vida no Brasil. Vidas pobres e negras
tem um valor depreciado comparado às vidas qualificadas, as vidas brancas e, sobretudo de
classe média. A imprensa não cansa de nos dar “bons” exemplos desse tipo de seletividade,
16

como já apontamos rapidamente acima. A necropolítica encontra nessa construção social um


esteio importante que a justifica e faz funcionar sem grandes comoções públicas. Não se faz
barricadas no Brasil pelos corpos caídos na periferia, não há indignação social frente às
chacinas e massacres de pessoas vulneráveis. O enquadramento, termo butleriano, é
responsável, por exemplo através da mídia, em como a “dor nos é apresentada” a partir do
que reconhecemos como humano e o “que será ou não uma vida passível de luto” (2018a, p.
100).
Toda a violência da era da escravidão pode, agora, ser acomodada num processo de
indiferença social quando não em rompantes de ódio. A forma como a sociedade lida com as
emoções e os sentimentos de solidariedade frente à violência sofrida por brancos e negros é
evidentemente seletiva. Em 24 de março de 2019 a Favela do Cimento, na Radial Leste de
São Paulo, foi destruída por um incêndio de grandes proporções. Em meio a tragédia, que
deixou 200 desabrigados (66 crianças) e uma pessoa morta, chamou a atenção “o fato de que
motoristas que circulavam pela região comemoraram o episódio com buzinas e gritos de
‘vagabundos’, direcionados aos moradores de lá” (BHAZ, 2019).
Como afirma Nilma Lino Gomes e Ana Amélia de Paula Laborne, “a cor da pele,
quanto mais escura, mais se torna uma marca que estigmatiza. A periferia e a favela como
locais de moradia, são suficientes para que o extermínio seja decretado” (2018, p. 4). As
autoras lembram também que
de acordo com a ONU, a pesquisa realizada pela Secretaria Especial de Políticas
de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e pelo Senado Federal, revela que 56%
da população brasileira concorda com a afirmação de que “a morte violenta de um
jovem negro choca menos a sociedade do que a morte de um jovem branco
(GOMES; LABORNE, 2018, p. 12).
Os exemplos poderiam ser multiplicados ad nauseam. É preciso olhar para o racismo,
e a tradição autoritária a ele vinculada (SCHWARCZ, 2019), bem como os efeitos do
dispositivo da democracia racial nos processos de subjetivação social para entender como a
necropolítica se ampara numa tradição que, de certo modo, é anterior ao próprio Estado. Se
quisermos, podemos recuar à época colonial e observar a forma com que escravos e pobres
eram percebidos socialmente (PELBART, 2018). Os corpos sempre foram hierarquizados no
Brasil, e essa verticalização produz, evidentemente, valores associados à condição social,
racial, regional e de gênero desses corpos. O necropoder se nutre de uma tradição, sempre
17

atualizada nos contextos autoritários, para renovar uma moralidade seletiva em relação ao
corpo-espécie da população.

Devir-negro do mundo e a afirmação da vida enlutável


Mbembe nos mostra que no contexto do neoliberalismo atual estamos vivendo o
devir-negro do mundo, ou seja, todas as iniquidades que por séculos marcaram a existência
precária dos negros tende, agora, a transbordar, se expandir para além dos negros (2017).
Conforme Pelbart, a necropolítica para Mbembe
é racializada, mas extrapola essa relação, na medida em que a negritude, por
exemplo, não é apenas uma condição subalterna reservada aos negros, já que é o
lote de sofrimento que pouco a pouco se estende para além dos negros. É o devir-
negro do mundo que abarca desempregados, descartáveis, favelados, imigrantes,
mas em contextos agudos podemos acrescentar: mulheres, gays, trans, drogaditos,
esquizofrênicos, etc (2018, p. 16).
Com isso não pretendo diluir a questão racial ou do racismo na emergência de
“novos” precários ou vulnerabilizados, mas apontar para uma possível destituição da ficção
do “ser branco universal”, cuja construção podemos identificar a partir do século XVI em
diante, sobretudo no Iluminismo. Vale destacar que esse “ser branco universal” se institui
como a ficção de um humano universal a partir da fabulação da raça, ou melhor, da
racialização do negro (MBEMBE, 2017). É nessa fabulação da raça que tem como palco o
colonialismo que se assiste à diferenciação radical entre o humano - branco e civilizado - e o
sub-humano – negro e bárbaro - que, vale notar, autoriza a transformação dos negros em
“homens-objecto, homens-mercadoria e homens-moeda” (MBEMBE, 2017, p. 12). O que
chamo a atenção, na esteira da reflexão de Mbembe, é para esse branco que sendo passível
de ser racializado, coloca em risco a própria humanidade que encarna, ou, noutra hipótese,
institui a humanidade enquanto comunidade em que as divisões raciais perdem sentido.
Quando a cesura entre quem deve morrer e quem deve viver opera incluindo entre os
não-enlutáveis os que até então eram humanos qualificados, despertamos para um fenômeno
que até agora fora pouco tensionado pela branquitude. É nesse sentido que a condição
precária dos não-enlutáveis não diz respeito somente a “eles” (zoé), mas implica no próprio
descomprometimento ético com a vida como um todo. No caso aqui, é à branquitude que
chamo a atenção. Quando a vida branca assumida como privilegiada pode ser açambarcada
pelo devir-negro ela é, igualmente, racializada, marcada por uma “identidade” até então
desnecessária e sem sentido. Sendo assim, quando a branquitude se pensa criticamente e se
18

coloca na condição de precariedade ela se vê exposta ao que Butler aponta como “as
dimensões frágeis e necessárias da nossa interdependência”, o que quer dizer enfaticamente,
que “ninguém escapa da dimensão da condição precária da vida social” (2018b, p. 154).
Populações escuras são menos enlutáveis, é evidente, mas o que assistimos, na esteira
das considerações sobre o devir-negro do mundo, é uma captura mais ampla da vida nua.
Conforme Butler,
de quem são as vidas que importam? De quem são as vidas que não importam como
vidas, não são reconhecidas como vivíveis ou contam apenas ambiguamente
como vivas? Essas questões partem do pressuposto de que não podemos tomar
como garantido o fato de que todos os humanos vivos carregam o estatuto de
sujeito que é digno de proteções e de direitos, com liberdade e um sentido de
pertencimento político; ao contrário, um estatuto assim deve ser assegurado por
meios políticos e onde ele é negado, essa privação deve se tornar manifesta (2018b,
p. 256).

É preciso descolonizar os processos de subjetivação que hierarquizam racialmente as


diferenças. Para Mbembe
Enquanto persistir a ideia segundo a qual só se deve justiça aos seus e que existem
raças e povos desiguais, e enquanto se continuar a fazer crer que a escravatura e o
colonialismo foram grandes feitos da “civilização”, a temática da reparação
continuará a ser mobilizada pelas vítimas históricas da expansão e brutalidade
europeia no mundo (2017, p. 297).
A aposta (ou utopia) de Mbembe é num comprometimento ético-político de exigência
de justiça. Segundo o autor,
neste contexto, é necessária uma dupla abordagem. Por um lado, é preciso
abandonar o estatuto de vítima. Por outro, é preciso romper com a “boa
consciência” e a negação da responsabilidade. Será nesta dupla condição que é
possível articular uma política e uma ética novas, baseadas na exigência de justiça
(2017, p. 297).
É nesse sentido a aposta de Butler ao propor a necessidade de todos nós nos
reconhecermos na condição de precariedade, isto é, numa relação de interdependência onde,
inclusive, poderia se constituir um espaço de resistência – “trazer à tona um novo modo de
vida, uma vida mais possível de ser vivida que se oponha à distribuição diferencial da
condição precária” (BUTLER, 2018b, p. 281). Movimentos contemporâneos antirracistas
como o “Black Lives Matter” (BLM), cujo lema é a “No justice, no peace!” podem ser
tomados como estratégico no deslocamento da afirmação da diferença para a afirmação da
comunidade humana. Segundo a Declaração de missão da BLM, “O Black Lives Matter está
trabalhando para um mundo em que a vida negra não é mais intencional e sistematicamente
19

direcionada à morte” (THE CONVERSATION, 2017). Mbembe, nessa perspectiva, coloca


que
O que teremos de imaginar será uma política do ser humano que seja,
fundamentalmente, uma política do semelhante, mas num contexto onde, é
verdade, o que partilhamos em conjunto sejam as diferenças. E são elas que,
paradoxalmente, depõe em comum. Tudo isso passa pela reparação, isto é, por uma
ampla concepção de justiça e de responsabilidade (MBEMBE, 2017, p. 297).
Pensar a semelhança não significa, portanto, suprimir as diferenças, mas, pensando
com Butler, fazer com que o luto possa ser universalizado, até porque, conforme a autora,
Se somente uma vida passível de luto pode ser valorizada, e valorizada ao longo
do tempo, então apenas uma vida passível de luto vai ser candidata ao apoio social
e econômico, à habitação, à assistência médica, ao emprego, ao direito de se
expressar politicamente, às formas de reconhecimento social e às condições para a
atuação política (BUTLER, 2018b, p. 257).
Mas frente a urgência da atualidade é preciso considerar outros efeitos do devir-negro,
nomeadamente no Brasil. Um dos efeitos pernósticos imediatos do alargamento dos
vulneráveis para além do componente racial é uma certa reativação do que antes tínhamos,
no Brasil, como o dispositivo de segurança da democracia racial, atualizado, nesse sentido,
numa narrativa em que o racismo se dilui, evapora e perde a potência da denúncia, deixando
correr livre a violência com seus dados colaterais administráveis pela biopolítica que deixa
morrer alguns para o ganho dos muitos. Assim é que o racismo de Estado encarnado na
necropolítica contemporânea pode aprofundar sobremaneira suas táticas de intervenção e
eliminação.

A tradição colonial e escravista que dá o tom da necropolítica tropical, conforme a


análise de Pelbart (2018), construiu uma sociedade intoxicada pela perversidade das relações
senhores-escravos que se revela na hierarquização do valor da vida. A desumanização
escravista e sub-humanização propalada pelas teses do racismo científico somam-se para
hierarquizar também o luto. É preciso enfrentar o passado escravista, entender sua extensão
histórica e sua memória para habitar o contemporâneo de forma intempestiva, desacomodada
e problematizadora. Uso a ideia de contemporâneo aqui no sentido atribuído por Agamben.
Para o autor, “a contemporaneidade, portanto, é uma singular relação com o próprio tempo,
que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distâncias, mais precisamente, essa é a relação
com o tempo que a este adere através de uma dissociação e um anacronismo” (2010, p. 59).
Nesse sentido estar plenamente de acordo com o seu tempo não é ser contemporâneo, esse
movimento exige afastamento. Não é, pois, habitando uma tradição colonial materializada
20

na sociedade atual, que nos ensinou a hierarquizar a vida e o luto, que teremos condições de
estranhar essas desigualdades afetivas e buscar, ainda que de forma precária, olhar para a
minha vida como a vida dos “outros”. A necropolítica no Brasil, como já disse acima, se
nutre de nossa seletividade, de nossa aceitação da morte do outro, daqueles que nutrem o
bando soberano. Mas, como menciona Butler, o reconhecimento dessa vida precária ou não-
enlutável “nos obriga a nos opor ao genocídio e a defender a vida em termos igualitários”
(2018b, 155).

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