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ETNOGRAFIA E EDUCAÇÃO:
RELATOS DE PESQUISA
2008
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Assim, acreditamos que a proposta de organizar um livro com estudos que elegeram a
Etnografia não apenas como uma técnica de pesquisa, mas como um aporte teórico que
possibilita o desvelamento dos espaços institucionais e das dinâmicas de interação
nesses espaços, pode vir a ampliar os olhares daqueles que no seu fazer cotidiano
possam estar em um movimento constante de reflexão sobre sua prática em benefício
da sociedade brasileira que utiliza os serviços públicos.
FOREWORD
Frederick Erickson
University of California, Los Angeles
Educational research has suffered from taking the familiar for granted. It
is assumed that "of course we know what teachers are, and what they do. Of
course we know what students are." Through such assumptions we overlook
the details of conduct and meaning that take place in the everyday life of
educational practice. And thus we tend to treat educational practice as a
"Black Box" -- we can see inputs to the box, in the form of resources, and we
can see outputs from the box, in the form of graduation rates and test scores,
but we don't get a clear picture of the processes inside the box that are
producing the outcomes.
The qualitative, ethnographic studies presented in this book help us get
inside the Black Box of educational practice. Through close observational
research and description the authors are able to show us the everyday practices
that produce educational outcomes. Marx said of scholarly inquiry "the
problem is not to understand the world but to change it." However, before we
can change an aspect of the world we first have to be able to see it.
Ethnography in educational settings, by making the visible the habitual conduct
of "standard operating procedures," shows us the structure points in
educational processes that need change. That is the major point of this book--to
make visible certain specific "spaces" within routine school and social practices
that can and should be changed.
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Texto 3: O ensino itinerante como apoio para a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais em classes regulares: uma análise etnográfica
Márcia PLESTCH; Rosana GLAT
Texto 10: Etnografia de uma atividade de educação não formal junto a rodoviários no
exercício da cidadania das pessoas com deficiência
Rafael Croitoru AZAMOR
1 Os termos racistas e raça serão encontrados neste capítulo porque são utilizados predominantemente pelos teóricos
aqui referenciados, entretanto, estamos nos referindo igualmente aos termos cor e etnia, embora tenhamos consciência
das implicações derivadas do uso destes conceitos, não pretendendo aqui aprofundar a questão.
2 “Os partidários da cultura da pobreza a identificam como causa própria da pobreza continuada. Exemplos: Desde que
a cultura da pobreza passou a existir ela tende a se perpetuar. As crianças faveladas, quando atingem seus seis, sete
anos de idade, usualmente já absorveram as atitudes e valores básicos de sua subcultura. A partir de então,
8
última com maior popularidade. Tais teorias são igualmente criticadas por ignorarem
o processo dinâmico, no qual os indivíduos não estão apenas vivendo em um
determinado meio social, mas também construindo suas realidades como atores de
suas histórias no mundo. Por sua abrangência ou por seu reducionismo, não
conseguem explicar o dinamismo do processo de produção do fracasso escolar, a partir
do interior da classe social a que pertencem os alunos e da possibilidade de
transformação social e política feita pela escola (FREIRE 1966, 1970). Daí a urgência de
novos referenciais teórico-epistemológico-metodológicos, o que se tem procurado
construir em nossas pesquisas, ao longo de duas décadas. Nestas pesquisas,
consideramos o fracasso escolar de alunos e alunas multirepetentes5 com dificuldades
educacionais no Ensino Fundamental, como objeto de estudo, e tentamos avançar na
explicação, utilizando novos instrumentos e contribuindo para a discussão de novas
teorias no Brasil.
Recentes estudos sobre o fracasso escolar (ALVES; ORTIGAO e FRANCO 2007;
PATTO 2004, 2005, 2006, 2007; BRAGANÇA, 2008, MATTOS 2007b; CARVALHO 2003,
2004) apontam para a necessidade urgente de pesquisa qualitativa para aprofundar a
análise da construção do chamado ‘fracasso escolar’ nas escolas públicas brasileiras
urbanas.
O fato de que a universalização do acesso à educação básica, iniciada nos anos
70 e, somente concretizada nos anos 906, não tenha ocorrido de forma coordenada com
a qualidade dos processos de ensino e aprendizagem, tem repercutido nos baixos
resultados da avaliação do desempenho dos alunos7.
8 O Programa Comunidade Solidária foi criado em 1995 visando o atendimento da parcela da população que não
dispõe de meios para prover suas necessidades básicas, em especial, o combate à fome e à pobreza. Esse programa se
tornou referência em torno da qual se criaram outras ações como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil –
PETI- em 1996, o Programa Nacional de Garantia de Renda Mínima –PGRM- em 1997, depois desdobrado em 2001em
dois programas, o de Bolsa Escola destinado a famílias com renda per capita de meio salário mínimo com crianças entre
6 e 15 anos freqüentando escola e o de Bolsa Alimentação destinado a famílias com renda per capita de meio salário
mínimo com crianças entre 6 meses e 6 anos de idade. Essas ações governamentais no campo social compõem “uma
rede de proteção social” que têm utilizado o setor educacional para sua viabilização e projeção. Há assim uma
ampliação instrumental das funções da escola mais com um sentido simbólico que permite ao Estado dissimular e
ocultar suas ausências e omissões em relação aos direitos sociais (ALGEBAILE 2004).
9 http://www.brasil.gov.br
10 A Classe de Progressão foi criada pela Portaria da Diretora do Departamento Geral de Educação - E-DGED de nº 2 de
13 de novembro de 2001, surgiu para romper com a repetência da primeira e da segunda séries, abrindo a possibilidade
de haver avanço para etapas seguintes (terceira série), reintegrando o aluno no percurso regular. Ela é formada por
alunos de vários níveis de conhecimento, desenvolvimento, de diferentes faixas etárias (9 ou mais) e de interesses. A
Portaria nº 15 da E-DGED de 13 de novembro de 2001 estabeleceu os critérios para organização de Classes de
Progressão, dividindo-as em - Classes de Progressão I, e Classes de Progressão II, de acordo com o nível de
aproveitamento na leitura e escrita. Essas classes teriam um número de trinta alunos por turma e incluiriam até dois
alunos com necessidades especiais.
11 Contextos nos quais, no Rio de Janeiro, por exemplo, se tem conhecimento, muitas delas são localizadas em zonas de
risco e são obrigadas a fecharem suas portas de acordo com as regras do crime organizado
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Realizada para fins de titulação em doutorado pela Universidade da Pensilvânia nos Estados Unidos da América e
publicada sob o título: Picturing School Failure: a study of diversity in explanations of “educational dificulties” among rural and
urban youth in Brazil. (Trabalho desenvolvido com apoio da CAPES).
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13 Foi realizada como um desdobramento da primeira pesquisa, no tocante à primeira conclusão: alunos fracassados no
interior da escola. A pesquisa foi publicada sob o título: Fracasso escolar: imagens de explicações populares sobre
"dificuldades educacionais" entre jovens de áreas rural e urbana do estado do Rio de Janeiro, Relatório final INEP, MEC,
1996. Contou com fomento: 1. PROPP-UFF - n.23069.002147/91, em 12/04/91, concluído em 20/07/92, recebeu em
30/08/91 a quantia de 500.000,00, em 30/07/92 a quantia de 2.000.000,00, em 30/10/93 a quantia de 20.000,00e 2.
Convênio INEP/UFF n. 36/92, publicado no DO de 7 de Jan. 1993, pág. 185. Termo aditivo publicado no DO de 6 de
maio de 1993, p.6042. A quantia de (Cr$ 217.702.000,00) repassado a Proplan/UFF para gerenciamento em acordo
firmado em maio de 1994 (Crn$ 800,00 - oitocentos cruzeiros novos).
14 Ver MATTOS Carmen Lúcia Guimarães de Mattos et al., Fracasso Escolar: Imagens de Explicações Populares sobre
"Dificuldades Educacionais" entre Jovens de Áreas Rural e Urbana do Estado do Rio de Janeiro, Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos, Brasília, DF, v. 73, n. 174, p. 361-379, maio/ agosto,1992.
15 Para esse grupo foi desenvolvido posteriormente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro o projeto “Tecnologia
Educacional para Jovens e Adultos: enfrentando o fracasso escolar, no período de 1995/1998. Resumo publicado pelo
INEP na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, DF, v. 74, n.177, p.437-463, maio/ agosto, 1993.
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16 Foram realizadas mais de duzentas horas de gravação em áudio e vídeo, envolvendo duzentos e dez participantes,
dentre eles cinqüenta e seis (56) alunos e cento e três (103) professores, sendo dois colaboradores. Contou-se também
com a participação direta de elementos da administração estadual e municipal.
17 Oficialmente, no Estado do Rio de Janeiro, os Conselhos de Classes foram instituídos nas escolas através do parecer
1367, de 19/02/1971 do Conselho Estadual de Educação, para o ensino público e particular. Geralmente cabia ao
Serviço de Orientação Pedagógica ou Serviço de Orientação Educacional a organização dos Conselhos de Classe em
conjunto com a Direção da escola, mas, cabia ao Diretor a liderança da reunião. O Conselho de Classe era uma reunião
de professores de uma escola ou turma com múltiplos objetivos, dentre eles: avaliar o aproveitamento dos alunos e da
turma como um todo; chegar a um conhecimento do aluno; promover a integração dos professores e de outros
elementos da equipe da escola. Era no Conselho de Classe que o professor percebia sua força e autonomia em relação
aos demais membros da escola. O professor era diretamente influenciado pelas mudanças ocorridas na escola durante o
período em que estava avaliando o seu trabalho na própria escola. Essa era uma oportunidade para que o professor
refletisse sobre o seu trabalho individual e sobre a turma de modo geral.
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18 Imagens Etnográficas da Inclusão Escolar: o fracasso escolar na perspectiva do aluno. Relatório Final FAPERJ/
PROCIENCIA/ UERJ AGOSTO/2008
19 A análise do atendimento/freqüência escolar deve ser qualificada levando-se em conta a adequação idade-série do
sistema educacional brasileiro, no qual a educação formal completa se encontra estruturada em um mínimo de quinze
anos de estudo: oito anos para o Ensino Fundamental, três anos para o Ensino Médio e um mínimo de quatro anos para
a Educação Superior. As idades consideradas adequadas a esses níveis de ensino são, respectivamente, sete a quatorze
anos (sendo sete anos na primeira série, oito na segunda, assim por diante); quinze a dezessete anos (quinze anos no
primeiro ano do Ensino Médio, dezesseis no segundo e dezessete no terceiro); e dezoito a vinte e quatro anos
(considerando as distintas durações de cada curso).
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sendo que no Rio de Janeiro todas as escolas da Rede Municipal de Ensino adotaram
essa proposta. Portanto, esta se tornou uma forte tendência entre as políticas de
educação pública frente às altas taxas de evasão e repetência na última década. Os
governos, com esses programas, encontraram uma “saída” para o problema do fracasso
escolar dos alunos sem, no entanto, disponibilizar recursos necessários. Ou seja, a
proposta era uma tentativa de melhorar as estatísticas de defasagem idade-série e de
exclusão escolar que, em 2007, representavam 25,7% no conjunto das séries do ensino
fundamental (IBGE, 2007). Apenas 45% dos estudantes entre 15 e 19 anos concluíram
os nove anos de escolaridade básica com as competências básicas e 22% do mesmo
grupo etário estavam fora da escola (HANUSHEK and WÖSSMANN, p.57, 2007, In
PUGGIAN, 2008).
A nova forma de organização escolar pela progressão em ciclos de formação,
nas palavras de Freitas (2004) apenas legitimou a exclusão social, através de “um
mecanismo dissimulatório de inclusão formal na escola que transmutou a exclusão escolar
objetiva (repetência, evasão) em exclusão escolar subjetiva (auto-exclusão entre ciclos, “opções”
por trilhas de progressão menos privilegiadas, trânsito formal sem domínio real)” (FREITAS
2004). Críticos à proposta da progressão, Freitas e Neubauer (2000), acreditam que a
mesma foi criada como um programa compensatório de natureza ‘inclusiva’, mas
acaba por legitimar novas formas de exclusão.
Portanto, a lógica da progressão seria avançar ou progredir o aluno de 15, 16, 17
anos de idade (defasado na série) que ainda está na segunda série e que poderia
progressivamente ir para a quarta ou quinta série. Após o professor junto com este
aluno ter trabalhado seus conhecimentos progressivamente, ou “acomodar” suas
avaliações de modo que esta tivesse sido registrada progressivamente de acordo com
desempenho do mesmo até que ele tivesse avançado em conhecimento de um modo
geral ele teria uma chance de progredir na série, dando saltos qualitativos
(FERNANDES, 2007). Dentro desta lógica, o programa de Classe de Progressão no Rio
de Janeiro, talvez tenha sido interrompido porque, sua prática foi invertida, ou seja, em
vez de promover o aluno, ela funcionou em forma de “tracking” (MEHAN, 1992) ou
alinhamento. Isso significaria reposicionar o aluno pela progressão de forma similar a
que era feita pelo sistema de reprovação uma vez que se reprovava o aluno na segunda
série (série equivalente a Classe de Progressão) e encontrávamos alunos que
“repetiam” a progressão por três, quatro e até cinco anos consecutivos.
As observações de sala de aula e os filmes etnográficos derivados das Classes
de Progressão do Ciep C nos mostraram a forma como os programas compensatórios
não têm promovido a regularização do fluxo escolar e sofrem uma “confusão
administrativo-pedagógica” onde a vítima é a criança e o jovem pertencente à Classe
de Progressão. Possivelmente uma explicação para essa “confusão” é que, a Rede de
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etária entre 11 a 16 anos, sabiam ler e escrever, com muitas dificuldades. Em outras
áreas do conhecimento, como Matemática, História, Ciências, eles eram considerados
muito fracos para o nível inicial (1º ano do Ensino Fundamental). Os demais não
atingiam os objetivos escolares para este nível, estavam no nível equivalente ao
segundo ano escolar, sendo que alguns já de idades entre 15, 16, 17 anos.
O fim da Progressão e a implantação dos Ciclos em todo o ensino fundamental
revelou que havia um enorme contingente de alunos com idade entre quatorze e
quinze anos que ainda não haviam passado do primeiro segmento, ou seja, ainda não
tinham sequer sido alfabetizados.
O encontro com esses alunos na Classe de Projeto, possibilitado pela pesquisa,
nos permitiu entender um pouco mais como essa exclusão acontece dentro do
cotidiano escolar. O Projeto que foi planejado para ajudar o aluno, oferecendo uma
maneira diferenciada de acompanhamento escolar com horário ampliado, formação
continuada para o professor, dentre outras propostas, acabou por encontrar os diversos
entraves dentro da escola, que o levaram a reproduzir as mesmas práticas já
naturalizadas no ambiente escolar, estigmatizando mais uma vez estes alunos.
Mas apesar dos problemas que esses alunos e alunas enfrentam na escola, o que
concluímos das três pesquisas realizadas é que eles continuam acreditando no poder
da educação formal para transformar suas vidas. Então, submetem-se às aulas
enfadonhas e inúteis, às múltiplas repetições de mesma série, à violência na sala de
aula, aos programas governamentais para corrigir a distorção idade /série - mas
permanecem na escola, porque ela é importante para eles. A magnitude real do
fracasso escolar pode ser expressa por uma das conclusões dessas pesquisas: aos vinte
anos, esses jovens podem não ter mais escolhas na vida. Afirmamos isso porque dos
quarenta e nove (49) jovens participantes da primeira pesquisa, pelo menos dezenove
morreram vítimas de crimes violentos. Portanto, um dos pontos mais generalizáveis
nesse trabalho é que “o fracasso escolar mata”.
Referências
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paulista. Em Aberto, Brasília: v. 6, n. 33, p. 11-16, jan./mar., 1987
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20 “Entre falas e encontros: tecendo fios sobre a prática médica” defendida em 1997 na Escola Nacional de Saúde Pública
(ENSP/Fiocruz)
21 Segundo Becker (1993), construtivismo significa a idéia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que,
especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância como algo terminado. Ele se constitui pela
interação do indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se
constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia, na bagagem hereditária ou no meio, de tal modo que
podemos afirmar que antes da ação não há psiquismo nem consciência, e muito menos pensamento. Freitag (1993)
afirma que o construtivismo parte do pressuposto epistemológico de que o pensamento não tem fronteiras; que ele se
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constrói, se desconstrói e se reconstrói. Construtivismo é, então, uma forma de conceber o conhecimento, sua gênese e
seu desenvolvimento e, por conseqüência, um novo modo de ver o universo, a vida e o mundo das relações sociais.
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Inserir foto 1
Nessa interação, o médico parece estar se ausentando da cena, com o olhar fixo no prontuário, e
a paciente tentando ganhar espaço colocando o cotovelo na mesa. Não há contato visual. Ambos
olham para o mesmo ponto, o prontuário.
Inserir foto2
Nessa interação, há contato visual, a médica inclinada para frente, demonstrando grande
interesse no paciente; este ainda parece timidamente tentar ocupar um espaço, também
ligeiramente inclinado para frente, com o cotovelo esquerdo na mesa.
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Inserir foto3
Na interação acima, a postura da médica sugere que ela está presente na interação; a paciente
está inclinada para frente, interessada no que a médica está dizendo.
Há contato visual.
Inserir foto4
Esta interação, com contato visual, sugere uma imagem - espelho, na qual médico e paciente
parecem estar em proximidade; os corpos paralelos e os gestos iguais.
Considerações finais
Referências
22 Trata-se da dissertação de mestrado da primeira autora, orientada pela segunda autora. Os resultados aqui
apresentados foram parcialmente publicados na Revista UNOPAR CIENTÍFICA Ciências Humanas e Educação (2006) e
na Revista Iberoamericana de Educación (2007).
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como para atuar diretamente com alunos em classes especiais, salas de recurso
ou professor itinerante, etc (BUENO, 1999a e 2001; GLAT & NOGUEIRA, 2002;
MENDES, 2002 & 2003; PLETSCH, 2005). É oportuno lembrar que o artigo 59 da
LDBEN de 1996 reconhece a importância da formação de professores
especializados para atender pessoas com necessidades especiais, em quaisquer
modalidades de ensino23.
Pela proposta de Bueno, combinar-se-iam o trabalho do professor regular
e a atuação do professor especializado, pois o generalista teria o mínimo de
conhecimento e prática com alunos especiais, enquanto o especialista teria
conhecimento aprofundado e prática sistemática no que concerne a
necessidades educacionais específicas. A formação pedagógica do especialista
deveria ser de caráter geral, com aprofundamentos específicos que permitiriam
um atendimento especializado. Antes de tudo, portanto, seria um professor,
encarregado de auxiliar e dar apoio ao professor regular.
As linhas centrais dessa proposta constam do Plano Nacional de Educação
(MEC, 2000), que aponta a integração entre professores da Educação Especial e
da educação regular como uma das ações necessárias para efetivação da
educação inclusiva.
Entre as modalidades de atendimento especializado que dão suporte à
inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em classes
regulares, destaca-se o Ensino Itinerante. Este serviço é constituído por um
professor que “presta assessoria às escolas [e orienta aos professores] regulares
que possuem alunos com necessidades especiais incluídos (...), [tendo] como
atribuição a produção de materiais pedagógicos necessários ao trabalho com
estes alunos. E, quando necessário, atende individualmente o aluno especial
incluído24 (SME/IHA/RJ, 1999, s/p).
Em recente pesquisa propôs-se como uma das alternativas para a
efetivação da inclusão educacional investimentos na modalidade de ensino
itinerante como suporte para rede regular com alunos incluídos (PLETSCH,
2005). A referida investigação foi realizada na Rede Pública Municipal de
Educação do Rio de Janeiro, tendo como objetivo geral analisar as
23 Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: (...) III - professores com
especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do
ensino regular capacitados para a integração [leia-se, inclusão] desses educandos nas classes comuns (grifos da autora).
24 O professor itinerante também presta atendimento educacional domiciliar para alunos com necessidades especiais
impedidos de freqüentar a escola (temporária ou permanentemente) por limitações físicas ou estado de saúde. Porém,
aqui será considerado apenas o trabalho realizado pelo professor itinerante em escolas.
34
O meu cotidiano é bem desafiante, pois cada caso é um caso, ou seja, cada realidade
escolar, cada necessidade especial, cada criança que é portadora de necessidades especiais
é uma (professora itinerante A).
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Cada sala de aula exige um jeito diferente de chegar para que eu possa atingir aquilo que
quero, que é a aprendizagem daquele aluno que está integrado [lê-se incluído]. Até
porque não posso chegar com visões pré-estabelecidas ou receitinhas de bolo, porque na
vida não se tem receitinhas de bolo e nas escolas também não se tem. (professora
itinerante A).
A itinerante do meu filho o acompanha desde o ano passado em outro colégio, e ela foi
muito importante, como é até hoje. Ela auxilia a professora dele, porque está sempre
acompanhando todas as dificuldades do meu filho e o que ele consegue fazer de melhor.
Está sempre em contato comigo (mãe de aluno especial incluído em classe regular).
1 Este trabalho é parte da dissertação - Controlar para quê? Uma análise etnográfica da interação entre professor
e aluno na sala de aula (2006) - orientada pela Profª Drª Carmen Lúcia Guimarães de Mattos pelo Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Proped/UERJ).
2 “A pedagogia é um esforço deliberado para influenciar os tipos e os processos de produção de conhecimentos
e identidades em meio a determinados conjuntos de relações sociais e entre eles. Pode ser entendida como uma
prática pela qual as pessoas são incitadas a adquirir determinado “caráter moral”. Constituindo a um só tempo
atividade política e prática, tenta influir na ocorrência e nos tipos de influência. Quando se pratica pedagogia,
age-se com a intenção de criar experiências que, de determinadas maneiras, irão estruturar e desestruturar uma
série de entendimentos de nosso mundo natural e social. O que estamos enfatizando aqui é que a pedagogia é
um conceito que enfoca os processos pelos quais se produz conhecimento” (GIROUX & SIMON, In MOREIRA
& SILVA, 1995, p.97).
44
3 O conceito de subliminar tem fundamentos na psicologia. Pode-se considerar subliminar um estímulo que,
embora não seja bastante intenso para que o indivíduo tome consciência dele, atua – quando repetido – no
sentido de alcançar um efeito desejado.
46
da professora da turma, nesse caso, ela não assumiria o risco por se tratar de
alunos que ela solicita que sentem a todo o momento.
O espaço da sala de aula é ocupado pelos alunos de maneira organizada e
de acordo com a orientação da professora. Mesmo que já tenham finalizado sua
tarefa ou estejam sentados, ela solicita que eles permaneçam em suas carteiras. A
disposição dos corpos na sala de aula implica numa adequação às normas
escolares, tais como sentados e executando as tarefas propostas; o contrário é
visto como rebeldia e é punido pelos gritos de ordem, expulsão da sala de aula
ou retirada da cadeira.
A análise realizada neste trabalho permitiu visualizar as características da
prática pedagógica em sala de aula ao direcionarmos nosso olhar para a relação
professor e aluno bem como o modo como esta se estabelece baseada no controle.
Questionamo-nos sobre para que o controle era exercido na escola, procuramos
compreender a sua natureza e o seu funcionamento podendo desencadear o
sucesso ou fracasso escolar de alunos e alunas pela vigilância do espaço escolar.
Ao final entendemos que o controle ocorre para que alunos e alunas sejam
mantidos de acordo com as normas escolares instituídas para educar pelo controle.
Os estudos de Foucault (1987), Goffman (2005) e Giddens (2005)
contribuíram para o entendimento sobre a relação da estrutura física das
instituições influenciando as interações que se estabelecem em seu interior. No
interior da sala de aula foi possível perceber que o controle é uma tentativa da
professora de conter os corpos dos alunos no espaço para a realização da tarefa,
mas que este é burlado pela turma para a execução de atividades mais agradáveis
do ponto de vista deles, tais como cantar e dançar pela sala de aula.
Foi possível perceber ainda nesse estudo que o intuito dos professores de
controlar os alunos através do corpo, das agressões, do espaço, do barulho e do
tempo é feito para que a tarefa seja executada pelos mesmos. Dessa forma, as
categorias encontradas em cenas rotineiras na sala de aula estudada estão
relacionadas ao cumprimento do ofício do aluno (PERRENOUD, 1994), o que
implica, necessariamente, no seu engajamento no trabalho escolar.
Acreditamos que o aluno vai para a escola para realizar a sua tarefa.
Sendo assim, o objetivo principal da permanência na sala de aula é o trabalho
escolar, que, portanto, é controlado pela professora em suas diferentes instâncias
pelo; corpo, agressão, espaço, barulho e tempo. Por isso a ocorrência elevada de
situações relacionadas ao corpo. Para Foucault (1987) os corpos dóceis
representam essa adequação ao trabalho, no nosso caso, ao trabalho escolar.
Quanto mais controle for exercido sobre os corpos mais os alunos estarão
executando suas tarefas. As agressões verbais e físicas representam neste estudo
51
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1997, vol.18, no. 43, p.46-57.
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52
Cleonice Puggian
4 Pesquisa financiada pelo Programa Alban (European Union Programme of High Level Scholarships for Latin
America), Cambridge Overseas Trust e, posteriormente, CAPES.
5 Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em 2005 as taxas
de evasão escolar eram de 7.5% para alunos na educação fundamental e de 15.3% para alunos no ensino médio.
54
José (14): Eu acho que eu era um péssimo aluno, mas eu dava pro gasto. Eu
sei que era um péssimo aluno porque eu só tirava nota baixa, fazia bagunça,
56
não respeita ninguém. Acho que na rua eu sou esperto, por andar sozinho,
por ter um contato… Nunca passei fome, e acho que nunca vou passar. Eu
fiquei na rua dois anos e meio, tia! Agora eu queria voltar para a escola e
arrumar um emprego.
José (14): Na escola a maioria dos moleques... Tipo, orgulho, tipo invejava os
moleques da quarta série, da quinta série. Eles fumavam cigarro, andavam
cheios de mulher, codãozão de ouro, celular. Ai, tipo… eu invejava eles, mas eu
sabia que eles eram do tráfico. Estudava, mas era envolvido com o tráfico. Ai,
na primeira oportunidade que teve eu me envolvi. Não sabia dar tiro nem nada.
Botaram a arma na minha mão e fiquei a noite toda na atividade, ai todo o dia
eu ia pra lá, todo dia eu ia pra lá. E no fim da semana eu recebia R$ 100,00.
Marcos (16): Eu ia para a praia com os moleques que eu conheci na escola.
Depois de um tempo a gente passou a ficar por lá mesmo.
57
Gilson (16): Eu acho que a escola é boa. A gente tem que estudar pra ser alguém na
vida. Sem estudar tu vai arrumar o quê? Não vai arrumar nada! Só vida do crime, só
roubo. Fora isso, sem estudar tu não arruma nada. Estudar pra ser alguém na vida.
A gente estuda pra ser alguém na vida. Eu quero mudar de vida, tia! Começar a
estudar, trabalhar, mostrar prá minha mãe que eu tô melhorando. Agora eu decidi
voltar a estudar porque na rua não dá não, tia! Muita polícia e se descuidar você
morre. Eu roubava também… roubava as coisas.
Ronaldo (16): Pô tia! Sem neurose! Eu não estou vendo nada para o meu fututo não!
Eu vejo assim, em outubro agora eu vou fazer dezessete anos, ano que vem eu já faço
dezoito, aí que eu estou fudido! Não tenho estudo, não tenho porra nenhuma! Com
dezesseis anos na cara e encarar essa barra daí… Zoar eu zôo mesmo, mas na hora de
fazer bagulho sério, eu faço.
Ronaldo (16): Agora eu estou indo para a escola, mas eu não contei para ninguém a
minha história. Tá maluco, ficar contando pros outros a minha história. Você acha
que eu vou chegar pros outros e dizer: _ E aí! Eu fui de pista. Ta maluco! Falo não,
tia! Aí tem uma garotinha bonitinha lá que senta atrás de mim… Aí eu vou falar que
eu fui de pista, aí vagabundo vai e explana prá ela, aí ela já não vai quer mais ficar
comigo. Os professores sabem que eu fui da pista porque eu fui matriculado por um
abrigo, e que vem de abrigo é? É ladrão, é maconheiro, é de pista, é aquilo. Eles me
tratam normal, vão me tratar diferente por que? Eu sou ser humano também, né?
Mas meu comportamento na escola agora é tranqüilo. Eu não falo com ninguém na
sala, a mesma coisa do curso, eu não falo com ninguém não.
Gabriel, por outro lado, aprendeu a burlar o sistema de avaliação tradicional
com a ajuda dos colegas de classe:
Marcos (16): Eu guardo os livros debaixo do colchão porque não tem outro lugar para
guardar. Na hora de estudar eu tiro a mochila e coloco os livros no colo para fazer o
dever. De vez em quando eu não consigo fazer dever porque aqui no abrigo não dá para
estudar. Uma vez eu tinha prova… eu comecei a ler e a chorar, porque eu estava
estudando no quarto e começou aquele tumulto… Eu tive que chegar e conversar com
os adolescentes. Eu fui pro quarto e comecei a chorar. Às vezes não dá para estudar em
casa, mas assim mesmo eu procuro estudar.
A trajetória de Marcos (Quadro 1), mostra que a reaproximação de alunos
marginalizados com a escola, apesar de ser uma possibilidade real, no
contexto investigado, ocorreu mais como resultado da auto-determinação do
adolescente (e do apoio de adultos) do que por ações inclusivas do sistema de
ensino.
3. O que adolescentes que viveram nas ruas nos ensinam sobre educação?
Dados indicam que as escola tem encontrado grande dificuldade em lidar com
alunos excluídos que, apesar das dificuldade, precisam e querem estudar. Em
uma conversa informal, uma das diretoras entrevistadas declarou que estes
alunos são vistos como mais um “problema” a ser resolvido pela escola:
Diretora: Uma mãe não conseguiu matricular o menino aqui. Onde ela levava com
aquela ficha, de aluno que parou de estudar, que tinha ido pro morro, ela era
rejeitada. Ela não conseguiu botar ele em lugar nenhum! Então você recebe um
aluno desse e tem vontade de dizer: “Não minha senhora! Volta outro dia”. Porque
você sabe que é um problema que você tá comprando. As pessoas têm medo… Se
disser que eles estão na boca de fumo e querem ser bandidos aí não vai conseguir
matricular mesmo! Aí veio com a ordem do juizado né, pra tentar uma matricula
aqui. Infelizmente, a gente é sempre escolhido, não sei o que é isso, meu Deus do
céu! Aí sobra pra mim [matricular os alunos excluídos].
À luz do debate atual sobre a melhoria da qualidade da educação no país -
avaliada por medidas estatísticas como o IDEB e por sistemas sofisticados
como SAEB e o PISA – as trajetórias de adolescentes que vivem e viveram nas
ruas, vistas de fora da escola, revelam a persistência de processos de exclusão
e a necessidade de pensarmos coletivamente sobre alternativas para o sistema
63
Educador Pedro: Como é que você vai tirar, dez, cinco anos de rua do menino em
um mês? Tem um ditado deles que é o seguinte: você pode até tirar tirar o menor da
rua, mas nunca vai tirar a rua do menor. E é assim. Eles crescem, formam família...
Eu sou um que mantem o sentimento da criança que um dia não teve nada. Isso
nunca vai ser tirado de dentro de mim. Não adianta. Não dá. Você vai trabalhar
com outras perspectivas, mas esse é o individuo que você está trabalhando!
Afinal, talvez a diretora e vários profissionais da educação não percebam que
o “problema” vai muito além do aluno. Escolas são espaços de contradição
que continuam, por um lado, reproduzindo desigualdades sociais, mas que,
por outro lado podem, subvertendo a ordem, criar novas possibilidades para
conscientização e transformação (Fine and Weis, 2003). A narrativa dos
participantes da pesquisa mostra que as escolas têm limitado possibilidades
de construção identitária, quando deveriam expandí-las, permitindo o
surgimento de novas narrativas do “eu”, como no caso de Marcos (Smyth and
Hattam, 2004). O desafio, então, é identificar e remover as barreiras para a
inclusão dos alunos marginalizados, através de ações integradas seja no
campo político, institucional ou pedagógico (Ainscow et al., 2006). Cabe
assinaliar que a melhoria das escolas públicas passa também pela formação de
professores e pela ação de docentes que sejam reconhecidos pelo seu valor na
formação da juventude brasileira (Ludke et al., 1999). Quando a pesquisa
educacional sai da escola, também nota-se a persistência de um modelo
institucional fechado em si mesmo, que não reconhece ou pouco colabora com
outras instituições. A ação integrada junto a redes de proteção à infância e
adolescência (Barker and Rizzini, 2006) torna-se fundamental para garantir às
crianças e adolescentes acesso e permanência no ensino básico, assim como o
direito à vida. Como já sugeria Freire (1972), a revolução, ou transformação
social, ocorre entre atores em intercomunicação, que juntos atuam para a
modificar suas condições existenciais, ou seja, sua realidade. Em suma,
quando conhecemos a experiência de Marcos e outros adolescentes que
viveram nas ruas, lembramos que um futuro diferente é uma construção
possível, que devemos construir juntos.
Referências Bibliográficas
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64
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Zaluar, A. (2005) Interventions, 7, 338-341.
66
6 Este trabalho é parte da Tese de Doutorado - “Arquitetura docente no Curso de Pedagogia: Dialogando com
Ciência e Arte nas práticas de formação em estágio supervisionado e museus” (2009) - apresentada ao Programa
de Pós Graduação em Ensino em Biociências e Saúde – Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz, orientada pela Profª
Drª Helena Amaral da Fontoura
67
7 Salvador Dali, nascido maio de 1904, em Figueres, na Espanha e falecido janeiro de 1989, na mesma cidade, foi
um importante pintor catalão conhecido pelo seu trabalho surrealista. As obras de Dalí chamam atenção pela
incrível combinação de imagens bizarras, como nos sonhos, com excelente qualidade plástica.
http://www.pitoresco.com.br/universal/dali/dali.htm
71
“Quando escolhia o curso era aquela insegurança. Não sabia o que fazer no vestibular,
mas queria área de humanas. Então pensei: Vou fazer isso mesmo (Pedagogia) se não for
depois eu mudo. Não sabia o que era Pedagogia. Perguntei às pessoas. Já fui me
identificando um pouco, gostando.” (Depoimento de Licenciando do 8° período do
curso de Pedagogia da FFP/UERJ realizado em entrevista)
“Até agora não tenho uma idéia formada porque optei por Pedagogia. Também pode ser
por ser mais próximo da minha casa. Eu tentei também biologia. Não tinha feito pré-
vestibular, pensei: _Vou me dedicar ao terceiro ano na escola, faço o vestibular e se não
passar, no ano que vem faço pré-vestibular e me dedico ao vestibular. Mas como passei na
Pedagogia, pensei:_ Qualquer coisa troco. Algumas pessoas têm este pensamento. Muitas
pessoas pensam assim. Só que comecei a gostar, a entender de Pedagogia e, se Deus
quiser, vou me formar.” (Depoimento de Licenciando do 8° período do curso de
Pedagogia realizado em entrevista)
8 A caracterização desta temática foi desenvolvida na dissertação “A Humana docência em formação: cultura e
imaginário dos alunos no curso de Pedagogia da FFP / UERJ”, em 2005, no Programa de Pós Graduação em
Educação da Universidade Federal Fluminense.
73
Nesta quarta-feira ainda tivemos acesso à agenda de vistas e pudemos anotar as datas dos
próximos grupos que virão ao museu. Assim, participamos do planejamento de uma
atividade para a recepção do grupo agendado para o dia 18 de agosto, próxima quarta-
feira. Sugeri que após a chegada do grupo ao pátio e a realização do ritual da rampa,
conduzíssemos os alunos para as exposições e fizéssemos a proposta de elaboração de uma
história oral coletiva. Chegamos a um consenso sobre a exposição do Grupo Casa 7 – a
história deveria ser contada pelos alunos no centro do salão principal, após a apreciação
das obras. (Fragmento de relatório final quando da conclusão do estágio no Mac
por Licenciando do 8° período do curso de Pedagogia da FFP/UERJ)
10 ‘As avenidas’ são uma metáfora construída por Edgar Morin no livro Ciência com Consciência (2001) para
abordar a condução do caminho a ser percorrido no desafio da complexidade.
78
Considerações finais:
Referências Bibliográficas:
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Cadernos CEDES, v.18 n°43, pp. 46-57. Dez. 1997.
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Éditions Nathan. 1992
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formação do professor. São Paulo. Cortez. 1990.
Gusmão, N M. Antropologia e educação: Origens de um diálogo.
Campinas Cadernos CEDES, v.18 n°43, pp. 8-25. Dez. 1997.
Mattos C. - Estudos Etnográficos da Educação: uma revisão de tendências
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Brasileiro – Alemão de Pesquisa, Educação, Saúde e Ambiente –
Habilidades e Perspectivas. UFJJ, Juiz de Fora, 2005.
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Vértice, Editora Revista dos Tribunais, Enciclopédia Aberta de Ciências
Sociais, v.5, p.68-80.1988.
Santos M. A natureza do espaço: técnica, tempo, razão e emoção. São
Paulo. Ed. Hucitec. 2ª ed. 1997.
80
12 Hélio, menino de doze anos, com Transtorno Autista, sujeito desta pesquisa, em processo de
inclusão por três anos em escola regular. Todos os nomes foram alterados.
81
13 O balanço a que nos referimos situava-se num pequeno gramado no pátio externo da escola, era muito
pequeno para uma criança de 12 anos, comportando apenas crianças de até 5 anos. Era baixo e enferrujado, com
uma das cadeiras faltando, o que o tornava desequilibrado para um dos lados. Era montado sob duas hastes
paralelas ligadas por uma série de folhas de ferro, formando uma pequena escada paralela ao chão.
82
Os colegas de classe
Por sua vez, Hélio nem sempre atendia às solicitações, mas permitia
14 Art. 3° Para os efeitos deste Decreto, considera-se: I - deficiência - toda perda ou anormalidade de uma
estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de
atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; II·- deficiência permanente - aquela que
ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter
probabilidade de que se altere; apesar de novos tratamentos; e III - incapacidade- uma redução efetiva e
acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou
recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações
necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida. (DECRETO No
3.298, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1999. Regulamenta a lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989).
87
dela, ela tem deveres, mas ela também tem os direitos" (Cristiane, em
entrevista, 17/05/2002).
Percebemos que, na interação com Hélio, a conduta pedagógica
flutuou entre estes dois tipos de amores, ou práticas.
mesa; no entanto, é nesta que ela se senta. A distância entre o que é dito e
o que é feito aumenta à medida que os minutos vão passando. Finalmente,
descumprindo sua oferta inicial, a professora, entrega pilots a Hélio.
Podemos supor que esta seja a educação da incoerência, ou mesmo pensar
que para lidar com alguém com tal estigma não se necessita de lógica.
Neste outro exemplo, novamente percebemos a aplicação de uma
atividade infantilizadora, a atitude permissiva perante um
comportamento inadequado e o desencontro entre o que é dito e o que é
feito.
0:27;56 – A professora oferece pilots a Hélio.
0:.28:25 - Hélio desenha no papel e na mesa.
0:28:47 - A professora chama a atenção de Hélio para não desenhar
na mesa.
0:29: 12 - Hélio desenha na mesa.
0:29:30 - A professora chama a sua atenção
novamente.
0:32:27 - Hélio desenha na mesa.
0:32:53 - A professora chama a atenção de Hélio e o ameaça: "Na
mesa não!, Não tô achando graça! Vou guardar o papel!”
0:33:30 - A professora reclama com Hélio "Não·tô achando graça! Vou guardar
o papel!"
0:34;13- Hélio desenha na mesa e ri. A professora diz: “Não tô achando graça!"
0:34;47 - Hélio desenha na mesa e ri. A professora diz: "Não tô achando graça!"
0:35:07- Hélio desenha na mesa e ri. A professora diz: “Não tô achando graça!"
0:35:22 - A professora fala: "Hélio está rindo, eu não tô achando graça!" .
0:37:55· A professora retira o pilot não o papel de Hélio, já que ele
continuou desenhando na mesa.
0;38:05 - A professora devolve um pilot e ameaça: "Desenha no papel
senão eu pego de volta!"
(Evento coletado em 01l03í02).
Referências:
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Seuil,1994. Trad.portuguesa: Razões Práticas.Celta, 1997.
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Senado Federal, 1988.
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Educativas Especiais. Brasília: Ministério da Justiça. Coordenadoria
Nacional para·Integração daPessoa Portadora de Deficiência - COROE,
1994.
CASTEL, R. Face à l'exclusion: Le modele francais. Paris. Ed.Esprit, 1991.
GOFFMAN, E,. A representação do eu na vida cotidiana. Tradução de
Mônica Célia Santos Raposo. 9aedição.· Petrópolis: Ed. Vozes, 1985.
HABERMAS, J. Os Pensadores. São Paulo, Editora Abril, 1983.
91
92
INTRODUÇÃO
02 10 12 16 19 X
02 + 10 = 12, a primeira seqüência pode ser essa... mas o que fazer com o
16? E o 19?
defendem. Uma possível explicação para isso estaria no fato de, como nos
provoca Boaventura (1996), ainda estarmos vivendo sob o paradigma
dominante das ciências, em que predomina a lógica quantitativa e
matemática, apesar da presença do paradigma denominado por
Boaventura de emergente. Prova disso, é a brincadeira utilizada no início
deste trabalho, em que grande parte das pessoas tenta somar, subtrair,
dividir etc. Baseando seus argumentos em exemplos e trocas de
experiência, os licenciandos estariam se colocando muito mais no campo
psicossocial do que no “científico” (de acordo com o paradigma
dominante) e, por isso, utilizariam estratégias para minimizar a adesão aos
seus argumentos.
Afirma esse autor não haver formação inicial, apenas formações contínuas,
na medida em que sempre partimos de aquisições anteriores. Argumenta
que:
Referências:
16 Este trabalho é parte da dissertação de Mestrado- sob o titulo: A reflexividade dos jovens do Ensino Médio sobre
o contraste tecnológico entre a escola pública e a sociedade; orientada pela Profª Drª Carmen Lúcia Guimarães de
Mattos pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(Proped/UERJ).
104
17 MARQUEIRO, P; BERTA, Ruben; SCHMIT, S. 21 anos depois, as lições dos CIEPs. Jornal O Globo 28
de maio de 2006.
18 Disponível em: <http://www.fundar.org.br/darcy_educa_ciep-gp_balancritico.htm> acesso em 12/09/2006.
105
[...] a televisão, e eles prometeram uma sala de informática, mas até hoje nada.
[...] não, que eu me lembre não, não tem não, só grupos de lamba aeróbica, teatro, só!
Ah, tinha que ter um funcionário pra cada setor. Algumas salas, não só uma, algumas salas de
informática, como eu disse, a quadra tinha que ser mais ou menos, tinha que ter umas redes, as
cercas, o muro de trás tinha que ser levantado, tinha que ser bem cercado, a limpeza lá..lá no pátio,
tinha que ser bem mais gramadinho, limpa, tinha que ter algumas lixeiras, mais lixeiras, tem só
uma. Um Brizolão desse tamanho tem só 3 lixeiras. Pô, que isso cara? Tinha que ter umas
10lixeiras por ai mais ou menos. Os micros, aulas, por exemplo, pelo menos, se tivesse 3 horas por
dia de aula sobre internet, estava ótimo, estava ótimo….é …é isso, é isso aí.
[...] ter fiscalização aqui, vendo a merenda, tudo, uniforme, os professores que tão faltando, ai
ninguém vê que é essa bagunça, entende?
Sala toda pintada certinha, sem nenhum arranhão, os quadro tudo em perfeita qualidade, as
carteiras, as mesas, a cadeira, tudo em perfeita qualidade de norma né, toda certinha sem
pichamento, os alunos também, né, tudo bom, nenhum aluno que possa quebrar a cadeira, pichar, a
quadra toda... boa e o vestiário grande, o chuveiro quente. Na aula educação física podia ter bola
que na maioria das vezes é nessa aula os alunos todinhos intera pra comprar bola. A gente ter
xérox de graça aqui, cada um dos alunos ter um computador, tipo assim, é, a turma ter uma sala, e
uma sala tipo assim, é, agora é hora, é a hora da gente aprender informática. A gente chega lá, ter
107
a sala certinha, limpinha, cada um com computador, professor bem qualificado, pra ensinar a
gente, ter paciência pra ensinar as pessoas. (Alunos)
Nas falas acima o que nos chama atenção são os desejos que os alunos
possuem de estudar numa escola que ofereça o mínimo de recursos básicos. Uma
escola, que além da tão sonhada tecnologia, contenha também, por mais incrível
que pareça: “Sala toda pintada [...], os quadro todos em perfeita qualidade, as carteiras,
as mesas, a cadeira, [...] limpeza [...] [computador [...]” (Alunos)
A preocupação com a falta de qualidade do ensino na escola XYZ é outro
problema apontado de forma unânime por esses alunos. Por estarem cursando o
Ensino Médio, possuem a preocupação com os desafios que os esperam após o
término do curso. Todos sonham em prestar exame de vestibular. Entretanto,
manifestam forte descontentamento com o colégio por não prepará-los para
ingressar na universidade. Ao mesmo tempo desejam que durante o curso de
Ensino Médio, a escola os deixe aptos a conseguir uma colocação no mercado de
trabalho.
Nesse ponto, o desejo dos alunos vai ao encontro de uma das formas de
articulação do Ensino Médio com a Educação Profissional de Nível Técnico
definida no Decreto 5154/04: a integração. Nessa modalidade, o aluno cursa em
uma mesma instituição o Ensino Médio e a formação profissional com matrícula
única, tendo como objetivo a preparação para o mercado de trabalho e o
prosseguimento dos estudos em nível superior.
Essa preparação profissional no Ensino Médio tem sido vista por alguns
especialistas em educação como uma imposição da realidade das camadas
desfavorecidas socioeconomicamente.
[...] tivesse uns professores mais dedicado, né, aquele professor que está sempre com você.
Meu sonho de consumo é aquele professor que te ajuda, entendeu? Você quer isso? Vamos
lá, que te ajudo. Meu sonho é ter professores bem dedicados aos alunos, dispostos a
ajudar, a ensinar, até mesmo nas minhas dificuldades de aprender.
[...] tivesse uma sala, como eu já falei uma sala de informática, um laboratório, vários
professores disponíveis, porque esse ano nós estamos sem professores, uns entraram em
greve, outros não tem. Tinham que ter todas as matérias, todos os recursos pra mim
utilizar, uma biblioteca imensa pra mim [...] Uma sala de vídeo, uma sala de teatro,
porque eu adoro teatro. Eh... um laboratório com todos os equipamentos disponíveis para
os alunos. Essa pra mim é uma escola perfeita com todas as matérias completas, um
ensino ótimo, excelente pra ter um novo preparamento para vida. (Alunos)
19 § 1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizados de tal forma que ao final do
ensino médio o educando demonstre:
I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna;
II - conhecimento das formas contemporâneas de linguagem;
III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania.
109
excluídos diante dessas “delimitações de corpos” que ocorre nas salas de aula
conforme descrita por Mattos (1994, p.3):
No interior da sala de aula admitimos a existência de um tipo de
“jogo” no qual observamos mecanismos por parte do professor
de valorização e desvalorização dos alunos. O comportamento
dos alunos passa a ser comparado, diferenciado, hierarquizado
baseado em normas sutis. A classe, obviamente heterogênea, é
classificada a partir de critérios homogeinizadores: os melhores,
os piores, os que trabalham, os da bagunça, os do fundo da sala,
os da patota. Os alunos participam ativamente desse jogo
percebendo o seu enquadramento enquanto membro de um
determinado grupo.
A aula deveria ser mais criativa. [...] não é você chegar encher o quadro de dever explicar, mais não
se aprofundar. Porque há casos de professores que não aprofundam no assunto. Eles deveriam se
aprofundar mais, mostrar de uma forma diferente pros alunos aquele determinado assunto. Uma
forma mais criativa, mais..., mais interessante. Eu aprendi, é claro, não no colégio, que a forma de
se tratar com jovem é mostrando pra ele, dá forma dele, o assunto. Mais tem professores que se
esquece que estão tratando com jovens. Não é só encher o quadro de dever, e falar, falar, falar que o
jovem vai entender, e que o jovem vai prestar atenção, ou que o jovem vai querer saber sobre
aquele assunto ou querer se aproximar. Eles têm que despertar o interesse do jovem. Os
professores, eles realmente não fazem isso. Aí no caso fica mais difícil para o aluno entender o
assunto, querer prestar atenção no assunto mesmo do interesse dele querer vir pro colégio. Aí os
professores estão mais... relaxados.
Não, nenhuma, atenção eles só dão atenção àqueles que estão mesmo interessado na matéria. E
aqueles que não estão nem aí, eles também não estão nem aí, eles não querem sentar quando acabar
a aula pra conversar com os alunos, falar que não é assim, que está errado. Eles querem que esse
aluno, desculpe a expressão, se dane!
Já neste ponto podemos observar que a carência vivida e percebida por
esses alunos, através de suas reflexividades, vai muito além da tecnológica.
Embora, que não há como negar a importância da disponibilização da
informática e do acesso à internet nas escolas para uso dos alunos. Pesquisas
como as da OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico- confirmam a importância do uso de computadores e da Internet nas
escolas, reforçando a necessidade de romper com o modelo de ensino tradicional
quando afirmam que o uso do computador e a Internet melhoram o desempenho
dos alunos nas habilidades de leitura e matemática (OECD, 2005).
Tentando garantir algum acesso à informação, e como não possuem
acesso regular às tecnologias da informática, os alunos da escola XPTO se dizem
espectadores assíduos de televisão. Eles apontaram-na de forma unânime como a
principal tecnologia utilizada para obter informação e lazer. Para eles a internet
só não é tão usada como a TV porque não possuem acesso diário a esta mídia,
pois acessar a internet requer investimento financeiro não disponível
frequentemente.
Nos seus depoimentos, abaixo, podemos perceber o quanto a TV faz parte
das suas rotinas diária.
110
Televisão é interessante, passa uma série de novidade, informações, a gente fica por dentro das
parada, futebol, então pô, globo esporte 13 horas, direto, então, é a televisão. Ah, dá uma cor…dá
um certo colírio aos nossos olhos. A maioria dos jovens da minha idade gostaria de ser jogador de
futebol, então quando passa assim, ehh... jogo do Real Madrid, Barcelona, esses time assim... a
gente se imagina, então, quem dera que fosse eu na jogada daquele cara que perdeu o pênalti, que
fez o gol bonito, a gente se imagina lá, é fica cheio de coisa na cabeça, entendeu? Um jogador de
futebol do Inter, do Juventus, são times estrangeiros, então seria emocionante, ta lá a gente
pensando, o olho fica brilhando, mais fazer o que, ehh... tamos aqui.
Com a televisão você se identifica mais, né. Você fica sabendo mais das coisas.
[...] poupa o seu tempo, você tem mais cultura vendo na televisão tudo que tá passando no RJ TV.
(Alunos).
20 Self: No que se refere à intenção do autor, são: “1. identidade, caráter ou qualidades essenciais de qualquer
pessoa ou coisa; 2. a identidade, personalidade, individualidade etc. de uma dada pessoa; o próprio de uma
pessoa enquanto distinta de todas as outras”. (WILEY, 1994, p.9)
112
Eu me sinto muito insegura, porque a sociedade, essa sociedade, eh, está evoluindo muito. Então,
assim, a escola tá me preparando, mas de uma forma diferente, entendeu? Não dessa forma de que
nós estamos falando, entendeu? Então, acho assim, eh, quando eu sair daqui eu vou me sentir
muito insegura, por que eu não vou ter tanto conhecimento sobre a sociedade que tá por vir, que já
tá aqui presente. Pelo fato de eu não ter estudado muito, sobre esse assunto, e não ter bastante
conhecimento. Pó, chega ali, tô ali competindo com aquela pessoa, a pessoa que deve ter muito
conhecimento. Com certeza eu vou ficar imaginado, poxa eu não vou conseguir, eu vou me sentir
insegura. Por que eu não sei tanta coisa sobre esse assunto, sociedade tecnológica, que tá no nosso
dia-a-dia. Eu acho que agente deveria ter muito mais conhecimento pra poder tá preparado pra
sociedade de qual nós estamos falando.
113
Eu acho que teria que ter mais tecnologia aqui na escola. Como os computadores, como DVD,
como uma televisão melhor, até tem televisão, mas a imagem fica ruim, entendeu? Agente teria que
ter som, caixa de som, ventiladores, eh, ventiladores... não, ar condicionado.
Eu vou fazer 17 anos, então eu penso muito como vai ser minha, vida fora da escola. Acabar o 3°
ano, ai... meu Deus, o que é que eu vou fazer? Eu me desespero, mas aí o fato de eu ter aprendido a
refletir melhor, eu penso, puxa eu vou procurar um emprego, pagar minha faculdade, me formar...
eh... ter uma profissão... eu poder comprar minhas coisinhas, ter minha casa.
Eu sou uma garota que sonho muito em ter minha vida sozinha eh, em ter minha responsabilidade
de trabalhar. Eu acho assim, que não vai ser fácil, a pessoa sair de dentro de casa, dos braços de pai
e mãe, que tá sempre ali contigo dano as coisas, pra procurar emprego. Eu acho assim que vai ser
uma nova fase, uma nova fase pra mim, por que não vai ter mais aquela de mamãe papai dá. Não...
vai ter que chegar lá, trabalhar, ganhar com o seu esforço.
[...] eles vão querer mais pessoas com nível de escolaridade maior do que a minha, porque tem mais
condições, tem condições financeiras melhores do que a minha, estudaram em colégios importantes
e fizeram cursos importantes, enquanto eu não tenho condições de fazer, eles vão preferir essas
pessoas que tem estudo.
[...] bastante sinais de trânsito que ta faltado muito, até pouco tempo teve vários acidentes ali na
esquina. Ontem mesmo morreu um garoto de acidente ali. O carro pegou ele de moto, se tivesse um
sinal, no caso, nas curvas não teria tanto acidente como tem agora. [...] Igualdade social pra todos
porque tem uma certa forma de desigualdade no bairro assim, na sociedade, por exemplo, posso dá
um exemplo? Eh... vamos supor que no nosso bairro, numa certa parte falte luz. Ali, demoraria
pelo menos um dia pra voltar, dois..., agora tem um outro lado, só que isso é real, tem um outro
lado que é a praça onde a socialite, são um pouquinho mais alta, eh..., meia-hora, dez minutos a luz
já tá lá, tudo iluminado normalmente. Só que no outro lado seria mais ou menos um dia pra luz
chegar. Então, certa desigualdade, o certo seria todos iguais, mas não, tem certa desigualdade.
(Alunos)
Neste bloco podemos perceber que todas as falas dos alunos demonstram
preocupações de ordens pessoais, profissionais e sociais. Suas dúvidas, seus
medos, ansiedades e inseguranças são conhecidos através de suas reflexividades
o que se revelou a partir de constantes interlocuções com as realidades externas.
Sentimentos como insegurança, preconceito, desigualdade e exclusão
foram expostos pelos jovens alunos durante as entrevistas. Ao mesmo tempo em
que se mostram animados com as tecnologias, parecem perceber que, por serem
socioeconomicamente desfavorecidos, estão cada vez mais distantes de poderem
contar com elas para ajudá-los a “melhorar de vida”.
Entretanto, ainda que apresentem um alto nível de reflexividade sobre
suas condições socioeconômicas, eles permanecem inertes no contexto social em
que vivem. Tal comportamento os impede da participação de importantes
movimentos que dizem respeitos às suas vidas. Essa conduta nos leva a refletir
sobre o que os estaria impedindo de reivindicar mudanças de postura diante de
tantas situações indesejadas.
Talvez, se tivessem acesso a informações claras sobre os seus direitos de
cidadãos, bem como garantia por parte do governo sobre estes direitos, poderiam
elaborar suas reflexões de maneira que surgissem possibilidades de mudanças
das suas condições de vida. Entretanto, nem o acesso a informação através de
114
outras mídias que não seja a TV e rádio, nem a garantia aos direitos de cidadania
são oferecidos a estes jovens. Neste sentido, de acordo com Candau (1995) a
escola, que deveria exercer um papel de humanização a partir da aquisição de
conhecimento e de valores para a conquista do exercício pleno da cidadania, tem
muitas vezes favorecido a manutenção do status quo e refletido as desigualdades
da sociedade, reforçando as diferenças entre ricos e pobres.
Referências bibliográficas
21
“Saber Sobre a Vida - Conduzindo a Multiplicação da Cidadania Sobre Rodas”, apresentada ao Programa de
Pós Graduação em Ensino em Biociências e Saúde – Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz, em 2006, financiada pela
CAPES e orientada pela Profª Drª Helena Amaral da Fontoura.
116
22
Produzido pelo CVI-RJ
124
Referências
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Amaral LA. Pensar a diferença/deficiência. Brasília: CORDE, 1994.
Brandão CR. A educação como cultura. São Paulo: Brasiliense, 1986.
Erickson F. What makes school ethnography 'ethnographic'? Anthropology & Educational
Quarterly 15 :51-66, 1984.
Ferrés J. Vídeo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
Fontoura HA. Entre falas e encontros: tecendo fios sobre a prática médica. Tese de Doutorado,
Rio de Janeiro: Fiocruz, 1997.
Fontoura HA. Video as a tool for evaluating and improving medical education. Annual Meeting
of The American Evaluation Association. Orlando, USA, 1999
Fontoura HA. O vídeo como instrumento de pesquisa. Caderno de ensaios e pesquisas do
Curso de Pedagogia da UFF, Niterói. Caderno 3, 2000
Fontoura HA. Desenvolvendo uma proposta de educação em saúde: como se tornar professor com
a ajuda da etnografia. Anais do VI Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, Salvador, BA,
p.100, 2000.
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Interdisciplinary Conference in Qualitative Methods. Edmonton, Canadá, 2001.
Fontoura HA. O vídeo na pesquisa em docência: a Didática em ação. Trabalho apresentado IV
Fórum de Investigação Qualitativa e III Painel Brasileiro/Alemão de Pesquisa – Mesa
Redonda Vídeo e Fotografia na Pesquisa Qualitativa – Juiz de Fora, 19 de agosto de 2005.
Fontoura HA, Mattos CLG. O uso de vídeo como instrumento de pesquisa na formação de
educadores. Trabalho apresentado no V Congresso Estadual Paulista sobre Formação de
Educadores. Águas de São Pedro, São Paulo, 1998.
Freire G. Casa Grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime de economia
patriarcal. Rio de Janeiro: Maia & Schmidt, 1933.
130
24 Por processo pedagógico entendemos o conjunto de ações utilizadas pela professora, intencionais ou não,
para que a aprendizagem do aluno sobre determinado conteúdo ou conceito seja alcançada.
133
25 O nome da escola e dos alunos foi modificado a fim de preservar a identidade dos participantes da pesquisa.
26 Embora os alunos afirmem que repetiram apenas uma vez a Classe de Progressão, existiam na turma alunos
cuja idade acusava a permanência na progressão por mais de um ano seguido, como era o caso dos alunos com
onze e doze anos de idade.
135
27 www.netedu.pro.br
137
além de ser uma ferramenta na construção do conhecimento pelo aluno está mais
ligada a necessidade de cumprimento do dever tanto da professora quanto do
próprio aluno. Ao aluno cabe realizar as tarefas escolares e à professora cabe
cobrar e verificar a realização dessa tarefa com vistas ao cumprimento de um
currículo mínimo referente ao grau de ensino em que leciona.
Assim, nos questionamos sobre a idéia de mudar de lugar estar
condicionada aos resultados esperados pela professora no tocante ao
cumprimento da tarefa pelo aluno, onde são utilizadas estratégias que não
valorizam a aprendizagem e o aproveitamento do tempo e espaço de sala de
aula.
Considerações Finais
Ao traçar as considerações finais desse estudo, entendemos ser
fundamental ressaltar as condições da escola básica pública e as condições de
trabalho as quais são submetidos os professores desta escola. A educação básica
tem sido marcada pelo descaso das autoridades frente às necessidades prementes
para o desenvolvimento de um ensino que se sustente no binômio qualidade-
quantidade.
Ao mesmo tempo em que o acesso e permanência a escola foi ampliado,
não houve garantia da qualidade de ensino (OLIVEIRA, 2007). As políticas
públicas educacionais descontínuas e sucessivamente substituídas são impostas a
escola e ignora a realidade vivida pelo professor no contexto de sala de aula. E a
profissão docente, por sua vez, vem padecendo de uma desvalorização que teve
seu início no regime militar e ainda hoje mostra os seus reflexos (FERREIRA,
BITTAR, 2006). Desvalorização traduzida, sobretudo, na baixa remuneração dos
professores. “O respeito que devemos como professores aos educandos dificilmente se
cumpre, se não somos tratados com dignidade e decência pela administração privada ou
pública da educação” (FREIRE, 2004, p.96). Não obstante, a pesquisa educacional
que se orienta, principalmente, pela abordagem etnográfica, ao estudar a sala de
aula na sala de aula, traz a tona os meandros dos processos que envolvem a
dinâmica de ensino e aprendizagem de uma perspectiva micro (ERICKSON,
1992), sem ignorar seu contexto macro, e sem a qual incorremos no erro de
proliferar discursos generalistas que tem como pano de fundo somente as
impressões sobre o espaço escolar.
Feitas essas considerações, apontamos as evidências observadas na sala
de aula locus desse estudo. Nesta sala nos deparamos, de um lado, com uma
professora que precisava cumprir o estatuto de sua profissão, qual seja, levar os
alunos a aprenderem os conteúdos escolares e de outro lado alunos que pareciam
não se adequarem ao modelo de ensino proposto. Este modelo era centrado na
140
Referências:
Pressupostos metodológicos
145
De acordo com nossa pesquisa, nas falas dos docentes nos Conselhos de
Classe, encontramos as reafirmações das situações onde o estigma é um
instrumento que contribui para o fracasso escolar e possivelmente para a
exclusão educacional.
Professora 1: Eu tenho dois analfabetos, que tem um, agora são semi, mas que um está no auxílio
com a Maria. (professora de reforço escolar), mas assim, não sabiam escrever nem o nome na
terceira série, tá? Então é assim, é, esses dois. Essas duas alunas receberam atendimento
especializado da minha parte, da parte da Maria (professora de reforço escolar). Agora, o restante
eu consegui desenvolver, sendo que tenho três alunos com tendências, quer dizer, classificadas,
TDAH, são pessoas influídas.
Professora 2: Wanderley é aquele caso, é, é, é.... Mara, quem continua saindo todo dia ao meio
dia. A Anita, ela é difícil. Mas, ficar com o Wanderley, aquele rapazinho, aquele aluno que pega a
Luana, largava todos os dias ao meio dia. Ela não (...) porque ela é uma boa aluna. Mas, ele nunca
quis nada com o estudo. Como eu cobro muito, ele deixou de vir às aulas, porque ele viu que ele não
consegue acompanhar. E quer fazer bagunça e eu não aceito fazer bagunça na sala. Então eu acho
que é até um problema, é... De ele não aceitar ficar na escola.
Esta segunda fala nos mostra outra marca colocada sobre este aluno que,
na perspectiva da professora, não quer aprender. A chamada bagunça dos alunos
tem se revelado em vários estudos (MATTOS, 1992; LAGE, 2004) que se realizam
no contexto de sala de aula como uma categoria que interfere diretamente no
sucesso ou no fracasso do alunado. Parece haver um consenso de que o aluno
bagunceiro ao não acompanhar a turma “sai” da escola. O problema parece estar
em uma não aceitação pelo aluno das regras estabelecidas pela escola e, portanto,
continua se insurgindo sobre as mesmas. Os que resistem são diferentes dos que
se adaptam, sem resistência, sem contestação, a esse processo de regularização
pela escola (GIROUX, 1997).
As Classes de Progressão, desta forma, segundo Mattos (2007),
representam mais uma política de enfrentamento ao fracasso escolar que não
obteve êxito com sua implementação na cidade do Rio de Janeiro. Segundo a
autora, esta medida, assim como tantas outras políticas de correção do fluxo
escolar, se tornou uma ação de descontinuidade e pouco eficaz frente à realidade
do Ensino Fundamental do país e em especial nesta cidade. As Classes de
149
Considerações Finais
“Eu sei de muito pouco. Mas tenho a meu favor tudo que não sei e –
por ser um campo virgem – está livre de preconceitos. Tudo o que
não sei é a minha parte maior e melhor: É a minha largueza. É com
ela que eu compreenderia tudo. Tudo o que não sei é que constitui a
minha verdade”. (Clarice Lispector)
Este texto abordou a temática da exclusão educacional que ocorre no
espaço da escola e em especial na sala de aula. Analisamos através de uma
perspectiva etnográfica que o fracasso escolar de alunos e alunas de uma escola
pública do Ensino Fundamental no Rio de Janeiro ocorre através de mecanismos
de estigmatização que atrela ao alunado que não aprende um marca indelével de
incapacidade.
Acreditamos desta forma que a pesquisa etnográfica contribui, pela
possibilidade de compreender a realidade, permitindo um diálogo constante
entre as diferenças e os seus significados (MATTOS & CASTRO, 2005c).
150
Referências:
29 Contingência é a condição de submissão dos desejos e expectativas de um indivíduo à sua realidade social.
Parte de uma situação de contingência é o indivíduo vivendo uma situação-limite e na expectativa de um
inédito-viável que vá transformar a sua vida e que lhe traga uma nova perspectiva diante, por exemplo, da
pobreza, miséria, do analfabetismo. (MATTOS & FACÍON, 2005, p.26).
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