Ser jovem em Portugal no primeiro quartel do século XXI não é
fácil. Não estou com isto a dizer que o foi noutros tempos e que o seja noutros lugares. Estou a dizer é que, pela primeira vez, desde o começo da modernidade, uma geração não terá um melhor nível de vida que os pais. Pensei muito nisto e, colocando os meus problemas pessoais de lado, reparei que talvez haja uma parte boa nesta questão, que nunca ouvi ninguém referir. O crescimento económico está a abrandar. É a única resposta. Para uma geração superar a outra, económica e materialmente falando, é preciso que o crescimento seja sustentado. Ora, estamos atualmente em posição de saber que os parâmetros pelos quais se avalia o crescimento e a evolução humanos têm de ser alterados. É a chatice de ter um planeta finito num sistema económico que não prevê a finitude. Quem sabe, as dificuldades pelas quais passamos sirvam para espoletar as alterações necessárias.
Em vez de pensarmos que somos uma geração cujas condições
de vida não ultrapassarão as dos seus progenitores, talvez pudéssemos ver a questão doutro ângulo: carregamos o peso e a possibilidade de uma verdadeira mudança. Talvez possamos vir a ser a geração que iniciou a sério o processo de transição de uma economia vertical para uma horizontal, uma economia baseada no lucro para uma economia de partilha de bens comuns. A internet das coisas - sobretudo dos transportes, comunicação e energia – pode vir a criar abundância onde antes havia escassez e tornar obsoletas as máximas de Adam Smith, que coloca o interesse individual acima do comunitário
Os millenials não sonham em ter casa própria e um grande
bólide, em ter um trabalho fixo e bem pago e uma rotina assente entre o emprego e vida pessoal. Esta geração quer experienciar a vida, viajar muito, conhecer povos e culturas distintos, e isso começa a ter consequências. E a tecnologia existe agora para potenciar essa mudança. No livro A Sociedade do Custo Marginal, Jeremy Rifkin elenca as várias razões, muitas comprovadas com factos e dados, que o levam a acreditar num mundo mais verde e abundante até aos meados deste século. Talvez seja difícil acreditar, mas o crescimento exponencial das tecnologias digitais é inegável e, brevemente, muito mais evidente (a lei de Moore continua exata). Que o mundo está num processo de mudança acelerada não há quaisquer dúvidas, a dúvida é se esta força derivada das gerações nascidas entre os anos oitenta e dois mil será adulterada pelo status quo. As reticências são muitas, mas as razões para ser confiante também existem se apresentam copiosas.
A minha geração apelidada de rasca e depois autodenominada
de à rasca cresceu numa bolha criada pelos pais, para nos proteger das vicissitudes que eles próprios passaram. Isso fragilizou-nos. Mas agora, finalmente, começamos a perceber como funciona o mundo sem esses filtros parentais, e a erguer- nos. Acredito que estaremos à altura do desafio. A economia partilhada já é um facto consumado (o que é a Uber ou a Airbnb?), a sensibilidade para com o ambiente também, basta ver o número de vegetarianos e veganos nessa faixa etária por exemplo, a liberdade de trabalho, com muitos jovens a trabalhar a partir do computador em qualquer lado do mundo, todas essas mudanças foram introduzidas por nós. Queremos melhorar o mundo. Consegui-lo-emos? É cedo demais para cantar vitória mas também não é tempo de perder esperanças. As dificuldades e vazio existencial por que estamos a passar podem dar à luz importantes inovações, já o começaram a fazer. E assim talvez passemos a ser a primeira geração de um sistema social, económico e político distintos, em vez de olharmos com tristeza para o vida que os nossos pais construíram e que não conseguiremos replicar.
O mundo pede coisas novas, é preciso que sejamos pessoas
novas. Como disse o recém-eleito presidente americano, Joe Biden, no seu discurso de vitória, não é só o exemplo da nossa força que conta, é sobretudo a força do nosso exemplo.