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Santiago Matos (MG), Vanessa Sousa (MG), Vinícius Moreno (MG), Wallace Oliveira
(MG), Yana Lizardo (MG), Kivia Costa (MG), Letícia Zampier (MG), Tamyres Lima
(SP), Guilherme Miranda (SP), Débora Araújo (SP), Nataly Santiago (SP), Julia
Louzada (SP), Jessy Dayane (SP), Julia Aguiar (SP), Rodrigo Sune (SP), Walisson
Rodrigues (SP), Emilly Firmino (SP), Elida Elena (SP), Thays Carvalho (SP),
Leonardo Paes Niero (SP), Lucio Centeno (SP), Miriam Martins (SP), Eline Ethel
(SP), David Martins (SP), Ezequiela Scapini (SP), Eliane Moura (SP), Juliane Furno
(SP), Pedro Freitas (SP), Igor Felippe (SP), Ronaldo Pagotto (SP), Iriana Cadó (SP),
Luma Vitória (SP), Olívia Carolino (SP), Thiago Duarte (SP), Thiago Henrique (
gaúcho) (SP), Leidiano Farias (SP), Nathalia Neiva (SP), Sophia Miranda (SP), Raul
Amorim (SP), Rafael Roxo (SP), Rafael Coelho (SP), André Cardoso (SP), Rafael da
Guia (SP), Lauro Carvalho (SP), Ygor Silva (SP), Tobias Pereira (DF), Ana Moraes
(DF), Katty (DF), Agata (DF), Olívio (DF), Jarbas Vieira (DF), Fabio Tinga (DF),
Cintia Isla (DF), Carla Lessa (DF), Adilson Miranda (DF), Patrícia da Silva (DF),
Francisco Nonato (DF), Aline Cortes (DF), Adda Luisa (DF), Márcia Silva (DF),
Leonardo Severo (BA), Alexandre Xando (BA), Allan Yukio (BA), Lorena Carneiro
(BA), Vitor Alcantara (BA), Guilherme Ribeiro (BA), Kleybson Ferreira (BA), Pablo
Bandeira (BA), Ingrid Moraes (Guiga) (BA), Julia Hirsgberg (BA), Itana Scher (BA),
Elder Reis (BA), Julia Garcia (BA), Rosalho da Costa Silva (CE), Lívio Pereira (CE),
Miguel Braz (CE), Joana Borges (CE), Joyce Ramos (CE), Pedro Silva (CE), Rogério
Babau (CE), Emille Sampaio (CE), Monyse Ravena (CE), Fabiano Sousa (CE),
Paulo Henrique (peaga) (CE), Eduana Santos (CE), Acácio Simões (CE), Gabriel
Campelo (CE), Allana Karyne S. Ferreira (CE), José Cleiton (CE), Alex Nascimento
(CE), Amanda Primo (CE), Thalita Vaz (CE), Thiago Nascimento (CE), Samanta
Forte (CE), Caroline Otavio (RJ), Maira Marinho (RJ), Breno Rodrigues (RJ), Alisson
Sampaio (RJ), Rafael Kritski (RJ), Carolina Dias (RJ), Bruna Ramalho (RJ), Darlan
Montenegro (RJ), Antonio Neto (RJ), Allanis Pedrosa (RJ), Lucilia Aguiar (RJ),
Leonardo Freire (RJ), Ana Gusmão (PE), Isa Gabriela (PE), Louise Xavier (PE),
Paulo Mansan (PE), Rosa Amorim (PE), Aristóteles Cardona (PE), Rani de
Mendonça (PE), Dennis (GO), Carolina Lima (RS), Milton Viário (RS), Enio Santos
(RS), Jorge Ramos (RS), Ronaldo Schaffer (RS), Carlinhos (RS), Luana Carolina
(PB), Marcos Freitas (PB), Gleyson Melo (PB), Daiane Araújo (PB), Felipe Baunilha
(PB), Deyse Araújo (PB), Ciro Caleb (PB), Joel Cavalcante (PB), Juliano Koch (PB),
Caroline Faria (PB), Barbara Zen (PB), Vera Fernandes (PB), Rafaela Carneiro (PB),
Ana Holanda (PB), Carlos Eduardo - Cazé (PB), Lucas Machado (PB), Yago Licarião
(PB), Antônio Carneiro (MT), Amandla Silva Sousa (MT) ................................21
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I. A Revolução Brasileira tem caráter democrático-popular e abre caminho para
o avanço ao socialismo.
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tarefas socialistas e capitalistas, ainda que as relações dominantes sejam,
nesta primeira etapa, predominantemente capitalistas de Estado.
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etapa na Revolução Brasileira dirigida pela burguesia nacional seria a
condição para implementar reformas capazes de desenvolver o capitalismo e
preparar o terreno para o socialismo. Essa análise e a estratégia dela
decorrente foram derrotadas historicamente com o golpe de 1964. Do
aprendizado histórico e da crítica ao etapismo, nasce o programa
democrático-popular.
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destruição do aparelho estatal burguês e sua suplantação por um Estado
revolucionário baseado na hegemonia do proletariado em estreita aliança com
as demais classes e setores populares. Esta ruptura histórica é insubstituível
em toda revolução verdadeira”.
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9. O conteúdo feminista do Projeto Popular costura as experiências
históricas de luta e de organização das mulheres com o objetivo de
tomada de poder pelas classes trabalhadoras. A formação social brasileira,
nascida da passagem do escravismo colonial ao capitalismo dependente,
explora e oprime de modo singular as mulheres e, sobretudo, as mulheres
negras, indígenas e da classe trabalhadora. Toda violência contra as
mulheres — seja ela moral, física, psicológica, obstétrica, patrimonial,
institucional/estatal. etc. — é o principal veículo de dominação patriarcal, que
intensifica a exploração do trabalho das mulheres, seja no mercado de
trabalho pela desigualdade salarial e pela atribuição de ocupações
precarizadas, seja pela imposição do trabalho reprodutivo e pela maternidade
compulsória, em regime de múltiplas jornadas. A criminalização do aborto, por
exemplo, vitima majoritariamente as mulheres negras e das classes
trabalhadoras, que morrem por não terem acesso à interrupção segura da
gravidez e que são perseguidas pelo aparato repressivo estatal e enfrentam
nessa estrutura a naturalização de seus corpos como propriedade masculina.
Desta forma, as lutas antipatriarcais - imbricadas ao nó de gênero, raça e
classe - são essenciais tanto para dar fim à exploração do trabalho produtivo
e do trabalho reprodutivo não remunerado e para cessar o rebaixamento do
valor da força de trabalho, quanto para garantir um acúmulo de forças ao
Projeto Popular, através de uma luta que assegure a formação e atuação das
mulheres negras, indígenas e trabalhadoras enquanto vanguarda política do
processo revolucionário. Para tanto, a socialização do trabalho reprodutivo e a
supressão de divisão sexual, racial e social do trabalho, e a garantia do
desenvolvimento das forças produtivas para a construção do socialismo, só
são possíveis com o feminismo.
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11. As lutas antirracistas do Projeto Popular são fundamentais para a
unificação das massas populares em oposição à ordem burguesa e para
o acúmulo de forças para a Revolução Brasileira. A revolução burguesa no
Brasil e, em especial, a Abolição foram marcadas pela conciliação entre os
interesses dos proprietários de terras, da burguesia nascente e da classe
média branca urbana. Foram negados aos trabalhadores negros livres e
recém-libertos o direito à terra, moradia, saúde, trabalho digno etc. Os ex-
escravizados passaram a compor um enorme exército industrial de reserva,
configurando o racismo como um grande mecanismo de extração de mais-
valia. A constante estigmatização e marginalização do proletariado negro
contribui para a intensificação da exploração do trabalho em toda a sociedade
e amplificam as demais violências, em especial contra as mulheres negras e
pessoas LGBTs. O genocídio da juventude negra e periférica e a política de
encarceramento em massa são as duas linhas mestras de atuação do aparato
repressivo do Estado burguês que promovem, em nome da propriedade
privada, a violência física e psíquica, a estigmatização e o preconceito contra
as populações negras e periféricas, favorecendo a penetração, em resposta,
de ideologias autoritárias no seio das classes trabalhadoras. O Projeto
Popular para o Brasil funde a luta antirracista aos interesses gerais das
classes trabalhadoras ao combater esse fundamento da ordem burguesa-
racista-patriarcal.
13. A luta em defesa do meio ambiente não pode estar dissociada da luta de
classes. Somente organizado em torno de um programa próprio sob
direção dos trabalhadores, o povo pode levar às últimas consequências
a defesa do meio ambiente. A resposta capitalista à crise ambiental é a
apropriação privada dos recursos naturais e sua subordinação ao processo de
acumulação de capital. Portanto, as alternativas que desassociam a questão
ambiental da luta de classes e do modelo econômico imposto pelo
imperialismo, como o “capitalismo verde”, não atacam a raiz do problema, que
é a dominação imperialista, do grande capital e do latifúndio, que,
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historicamente, impõem ao Brasil um papel primário-exportador no mercado
mundial.
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democracia; o poderoso movimento sindical de massas, pela base e dotado
de um programa democrático-popular foi a mola propulsora das conquistas
sociais inseridas na Constituição de 1988 e do avanço eleitoral do PT a partir
dos anos 1990, quando, então, a implantação do neoliberalismo foi
progressivamente dividindo e enfraquecendo esse movimento, que, a
despeito de ter nascido em oposição direta à estrutura sindical de Estado,
termina a ela integrado. Os governos petistas permitiram que o movimento
operário recuperasse sua capacidade de luta reivindicativa; mas, a prioridade
da luta eleitoral e a conciliação de classes em torno da frente
neodesenvolvimentista bloquearam a politização desse ascenso de lutas
econômicas: na última crise do governo Dilma, que culminou com sua
deposição, e no episódio da prisão arbitrária de Lula, o movimento operário
não compareceu às ruas para defendê-los. A derrota do neofascismo e uma
alternativa popular ao neoliberalismo somente serão possíveis com o retorno
das classes trabalhadoras ao centro da luta: é preciso preparar esse retorno e
as condições organizativas e políticas para as massas trabalhadoras dos
grandes centros urbanos assumirem o programa democrático-popular.
18. Nossa militância, ao lado dos movimentos populares, deve saber aliar a
resolução de problemas urgentes do povo com a agitação em torno do
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Projeto Popular para o Brasil. Com a derrota estratégica e a pandemia do
novo coronavírus, foram agravadas as condições de vida das camadas
estagnadas das classes trabalhadoras, lançando as organizações populares,
sindicais e partidárias às ações de solidariedade nos bairros. As ações
práticas e de solidariedade ajudam a criar uma base de confiança entre a
militância e os/as trabalhadores/as, em nossos territórios de atuação, em
vários estados. Nossa organização, contudo, participa de forma inconstante
nos rumos da política de solidariedade, o que abre sérias lacunas em
questões sobre onde se inserir, com qual intencionalidade, avaliar quais
experiências organizativas foram eficazes e quais não. As definições em
frentes e instâncias dispersas fragilizam o rico acúmulo organizativo que tais
ações podem proporcionar para o avanço do Projeto Popular. Nossas
ferramentas prioritárias para trabalho urbano, definidas na 5ª Assembleia
Nacional em 2017, seguem sendo o Levante Popular da Juventude e o MTD,
que devem ser potencializadas na atual conjuntura. Nas ações de
solidariedade podemos fortalecer a unidade do movimento sindical e popular,
contribuir para que o povo se organize para a resolução de seus problemas,
impulsionar os movimentos populares urbanos, aproveitando e
potencializando espaços organizativos nas comunidades. Para isso, é
imprescindível a nossa ação como partido.
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classes populares sob influência da frente neodesenvolvimentista. Nessa
trajetória, igualmente, aproveitamos as melhores condições sociais e
econômicas das classes populares para nacionalizar o Levante Popular da
Juventude, construir o Plebiscito Popular pela Constituinte, organizar a Frente
Brasil Popular e as lutas contra o golpe etc.
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reedição do neodesenvolvimentismo nas condições atuais aprofundaria não
as conquistas, mas os limites e o caráter conservador daquele projeto. Um
partido revolucionário deve se propor a superar tal horizonte na consciência
dos trabalhadores brasileiros.
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iii. Contra a tutela midiática, precisamos avançar na democratização da
mídia, combatendo os monopólios e fortalecendo meios de
comunicação estatais, submetidos ao controle social, e comunitários,
que contribuam com a auto-organização do povo.
iv. Contra a tutela judiciária da democracia brasileira, é preciso combater o
corporativismo, os privilégios e as conexões das cúpulas com as
classes dominantes; devemos lutar para popularizar e democratizar o
controle externo e o acesso ao aparato judiciário, com eleição
democrática de juízes; fortalecer a advocacia, as defensorias públicas e
os ramos judiciários especializados nos direitos sociais; no plano
político, é preciso enfrentar abertamente o judiciário sempre que tentar
interferir na soberania popular, a exemplo do papel cumprido durante a
ofensiva lavajatista e o golpe de 2016.
v. Contra a tutela militar, é preciso suprimir o Artigo 142 da Constituição
Federal e definir o papel constitucional das Forças Armadas como
exclusivamente de defesa contra eventual agressão de inimigo externo;
lutar para que a formação nas escolas militares se submeta ao sistema
universitário civil com a inserção de disciplinas obrigatórias de história
e ciências sociais; devemos lutar para desativar o aparelho repressivo,
desmilitarizar as polícias militares e combater repressão política; é
fundamental também combater a impunidade dos crimes da ditadura,
revisando a lei da anistia, que poupou os torturadores e seus
mandantes.
vi. Exigir a revogação das reformas trabalhistas e previdenciária e da
emenda do teto de gastos, combatendo o fiscalismo que penaliza o
povo em nome de uma "austeridade" estéril e desconectada dos
desafios do país. O reconhecimento previdenciário do trabalho
reprodutivo, de modo a garantir, independentemente de prévia
contribuição, aposentadoria por idade a todas as mulheres que não a
tenham por outros meios.
vii. A volta do Brasil para o mapa da fome e a inflação no preço dos
alimentos expressam, além da miséria que se amplia na mesma
medida que a riqueza de uns poucos, a nossa frágil soberania
alimentar. É preciso retomar os estoques públicos de alimentos,
promover a produção e distribuição de alimentos da pequena
agricultura familiar e acumular na luta pela mudança do modelo
agrícola de nosso país. A crise sanitária revelou a importância
emergencial e o potencial econômico e social de uma política
permanente de renda básica; devemos lutar para sua implementação
imediata, sem prejuízo de outros benefícios de prestação continuada.
viii. A política econômica deve servir aos interesses do povo, não à
valorização financeira e ao capital estrangeiro. É necessário abandonar
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romper com o "tripé macroeconômico" neoliberal e desenvolver novas
bases para uma política econômica voltada aos interesses do povo
trabalhador. A política externa deve se pautar pela soberania nacional
e a integração regional latino-americana. A gestão do Banco Central
precisa se subordinar ao interesse social, sendo fundamental revogar
sua autonomia e rever o objetivo restrito à busca da estabilidade de
preços.
ix. Lutar por geração de emprego e renda, por meio de frentes de trabalho
em serviços públicos emergenciais nas áreas de moradia, saúde e
educação, pela progressiva valorização do salário mínimo, que deve
garantir condições dignas para as famílias do povo trabalhador, e pela
redução da jornada de trabalho sem redução dos salários.
x. Devemos conquistar condições adequadas de trabalho (saúde e
segurança, ergonomia, jornada, ritmo do trabalho) para todos. Como
ensina o MTD, é preciso lutar pelo direito de trabalhar e para trabalhar
com direitos.
xi. Intencionalizar a histórica luta feminista e antirracista por “salário igual
para trabalho igual”, pela licença parental em substituição à licença
maternidade, pela educação continuada e escolarização completa para
mulheres e pessoas negras.
xii. Em defesa da autonomia e da liberdade de organização e luta da
classe trabalhadora; pela autonomia e liberdade sindicais, com o direito
dos/as trabalhadores/as de se organizarem livremente e em comissões
de empresas, com acesso às informações econômicas e contábeis das
empresas;
xiii. Pelo fortalecimento de espaços auto-organizados por e para mulheres,
que possibilite a construção da solidariedade no processo de
compreensão das raízes estruturais de sua exploração e dominação.
xiv. Lutar pela ampliação de mecanismos de participação popular direta,
tais como a iniciativa popular para legislar, consultas e referendos
populares, instrumentos de controle social dos agentes do Estado etc.
xv. Contra a hegemonia do grande capital bancário e do sistema
financeiro, avançar na oferta estatal de crédito acessível aos pequenos
e médios negócios, com especial ênfase na produção agroecológica e
industrial, visando o desenvolvimento produtivo.
xvi. Reformar a estrutura tributária brasileira visando aumentar a
arrecadação de impostos e distribuir a renda; deve-se romper com o
atual sistema regressivo, tributar o grande capital e a grande
propriedade imobiliária, a renda e o patrimônio, sobretudo as grandes
fortunas, e o consumo de luxo, para desonerar as classes populares
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(pequena e média burguesias, classes médias, campesinato e o
proletariado);
xvii. Em defesa dos biomas brasileiros e, em especial, da Amazônia, cada
vez mais devastados pela ofensiva da grande burguesia, em especial
de setores do agronegócio e do extrativismo mineral. É fundamental
interromper a escalada do desmatamento e da mineração predatória.
xviii. Um projeto soberano de nação exige a defesa do nosso território e do
nosso patrimônio natural e cultural. É preciso lutar pelo
desenvolvimento local e regional, pela demarcação das terras
indígenas e quilombolas, a preservação de suas reservas e
conhecimentos tradicionais, pela inclusão econômica dos povos e
comunidades tradicionais e pelo uso sustentável da terra e das águas.
xix. É necessário também defender a soberania sobre nosso patrimônio
natural, cuja utilização deve estar subordinada aos interesses
populares e ao desenvolvimento sustentável.
xx. Fortalecimento do SUS, seus princípios de universalidade,
integralidade e equidade e seu caráter público; lutar contra o seu
subfinanciamento e pelo aprofundamento da participação social; em
defesa de uma indústria farmacêutica pública e estatal, e pelo
fortalecimento de Práticas Integrativas Complementares; lutar pela
defesa da atenção integral a saúde da mulher.
xxi. Garantia de formação continuada e escolarização completa universal
em escolas e universidades com ensino de caráter público, estatal,
participativo, laico, gratuito e referenciado nas necessidades do povo
brasileiro.
xxii. Combate ao genocídio e à política de encarceramento em massa da
população negra e periférica. De imediato, lutar pelo fim da revista
vexatória imposta a familiares em visita prisional.
xxiii. Promoção do respeito à liberdade de crença e culto, sem distinção, ao
mesmo tempo em que se afirma a laicidade do Estado.
xxiv. Fortalecimento de políticas públicas de atendimento a vítimas de
violência, superando as limitações da Lei Maria da Penha e
fortalecendo estruturas dos CAPS (Centro de Atenção Psico-Social),
CRAM (Centro de Referência de Atendimento à Mulher) em todos os
municípios, e de casa abrigo “Casa da Mulher Brasileira” em todas as
capitais.
xxv. Socialização do trabalho reprodutivo a partir de estruturas públicas,
como lavanderias, refeitórios, creches e escolas em tempo integral etc.
acessíveis para toda a população; estabelecimento de licença parental
igualitária para homens e mulheres.
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xxvi. Em defesa dos direitos reprodutivos e da saúde da mulher, deve-se
avançar na promoção de educação sexual e de gênero e na
disponibilização gratuita e segura de métodos contraceptivos e de
interrupção de gravidez.
xxvii. Pelo fim da discriminação racial e sexual no trabalho, bem como das
diferenças salariais entre homens e mulheres, brancos e não-brancos.
xxviii. A luta contra toda e qualquer fobia de gênero e sexualidade que
reforçam a heteronormatividade; incluindo o fim de diagnósticos de
transtorno mental para mulheres transexuais e travestis;
xxix. Resgatar e celebrar a história de lutas do povo brasileiro, em especial
de mulheres, negros e indígenas invisibilizados pela historiografia
burguesa, fortalecendo a nossa auto-estima e identificação em torno de
um Projeto Popular para o Brasil.
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ix. Implementar o Programa Popular para a Juventude, que parte dos
dilemas da juventude trabalhadora e aponta os caminhos coletivos para
superá-los. Como afirmado na carta-compromisso do III Acampamento
Nacional do Levante Popular da Juventude, esse programa é uma
arma nas mãos da juventude para construção de força social para
transformar nosso país.
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Celso Aquino - SE, Ivan Siqueira – SE, Fabio Andrey - SE, Amélia Gomes - MG, Ana
Carolina Vasconcelos - MG, Ana Júlia Guedes - MG, Áureo Miguel - MG, Bruno
Diogo - MG, Débora Sá - MG, Derik Ferreira - MG, Doracy Karoline (Dorinha) - MG,
Douglas Fávero (Dodô) - MG, Fábio Garrido - MG, Frederico Santana Rick - MG,
Gabriel Reis Amaral - MG, Gabriela Cavalcanti - MG, Giselle Maia - MG, Isabella
Mendes - MG, João Guilherme Gualberto - MG, Joana Tavares - MG, Jonathan
Hassen - MG, Liliam Daniela dos Anjos - MG, Lucileia Miranda - MG, Luiza
Travassos - MG, Luiz Paulo Macedo Alves - MG, Luiz Paulo Siqueira - MG, Lorhana
Lopes - MG, Marco Gatti - MG, Nathália Ramos - MG, Paulinha Silva - MG, Paulo
Antônio - MG, Paulo Grossi - MG, Rafael Donizete - MG, Rawy Sena - MG, Rayssa
Neves - MG, Santiago Matos - MG, Vanessa Sousa - MG, Vinícius Moreno - MG,
Wallace Oliveira - MG, Yana Lizardo – MG, Kivia Costa – MG, Letícia Zampier - MG,
Tamyres Lima - SP, Guilherme Miranda - SP, Débora Araújo - SP, Nataly Santiago -
SP, Julia Louzada - SP, Jessy Dayane - SP, Julia Aguiar - SP, Rodrigo Sune - SP,
Walisson Rodrigues - SP, Emilly Firmino - SP, Elida Elena - SP, Thays Carvalho -
SP, Leonardo Paes Niero – SP, Lucio Centeno - SP, Miriam Martins - SP, Eline Ethel
- SP, David Martins - SP, Ezequiela Scapini - SP, Eliane Moura - SP, Juliane Furno -
SP, Pedro Freitas - SP, Igor Felippe - SP, Ronaldo Pagotto - SP, Iriana Cadó - SP,
Luma Vitória - SP, Olívia Carolino - SP, Thiago Duarte - SP, Thiago Henrique (
gaúcho) - SP, Leidiano Farias - SP, Nathalia Neiva - SP, Sophia Miranda - SP, Raul
Amorim - SP, Rafael Roxo - SP, Rafael Coelho - SP, André Cardoso - SP, Rafael da
Guia – SP, Lauro Carvalho – SP, Ygor Silva - SP, Tobias Pereira - DF, Ana Moraes -
DF, Katty - DF, Agata - DF, Olívio - DF, Jarbas Vieira - DF, Fabio Tinga - DF, Cintia
Isla - DF, Carla Lessa - DF, Adilson Miranda - DF, Patrícia da Silva – DF, Francisco
Nonato – DF, Aline Cortes - DF, Adda Luisa – DF, Márcia Silva – DF, Leonardo
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Severo - BA, Alexandre Xando - BA, Allan Yukio - BA, Lorena Carneiro - BA, Vitor
Alcantara - BA, Guilherme Ribeiro - BA, Kleybson Ferreira - BA, Pablo Bandeira -
BA, Ingrid Moraes (Guiga) - BA, Julia Hirsgberg – BA, Itana Scher – BA, Elder Reis –
BA, Julia Garcia - BA, Rosalho da Costa Silva - CE, Lívio Pereira - CE, Miguel Braz -
CE, Joana Borges - CE, Joyce Ramos - CE, Pedro Silva - CE, Rogério Babau - CE,
Emille Sampaio - CE, Monyse Ravena – CE, Fabiano Sousa - CE, Paulo Henrique
(peaga) - CE, Eduana Santos – CE, Acácio Simões – CE, Gabriel Campelo – CE,
Allana Karyne S. Ferreira – CE, José Cleiton – CE, Alex Nascimento – CE, Amanda
Primo – CE, Thalita Vaz – CE, Thiago Nascimento - CE, Samanta Forte - CE,
Caroline Otavio - RJ, Maira Marinho - RJ, Breno Rodrigues - RJ, Alisson Sampaio -
RJ, Rafael Kritski - RJ, Carolina Dias - RJ, Bruna Ramalho - RJ, Darlan Montenegro -
RJ, Antonio Neto - RJ, Allanis Pedrosa - RJ, Lucilia Aguiar - RJ, Leonardo Freire -
RJ, Ana Gusmão - PE, Isa Gabriela - PE, Louise Xavier - PE, Paulo Mansan - PE,
Rosa Amorim - PE, Aristóteles Cardona - PE, Rani de Mendonça - PE, Dennis GO,
Carolina Lima - RS, Milton Viário - RS, Enio Santos - RS, Jorge Ramos - RS,
Ronaldo Schaffer - RS, Carlinhos - RS, Luana Carolina - PB, Marcos Freitas - PB,
Gleyson Melo - PB, Daiane Araújo - PB, Felipe Baunilha - PB, Deyse Araújo - PB,
Ciro Caleb - PB, Joel Cavalcante - PB, Juliano Koch - PB, Caroline Faria - PB,
Barbara Zen - PB, Vera Fernandes - PB, Rafaela Carneiro - PB, Ana Holanda - PB,
Carlos Eduardo - Cazé – PB, Lucas Machado - PB, Yago Licarião - PB, Antônio
Carneiro - MT, Amandla Silva Sousa – MT.
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Sumário
Introdução.
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4.5. A centralidade da questão nacional.
4.6. Um programa que dispute os setores médios.
4.7. A contribuição dos movimentos do Campo Político para o Projeto Popular.
4.8. A construção do Projeto Brasil Popular.
4.9. O bicentenário da Independência em 2022, um país que insiste em nascer.
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“Na minha opinião, o defeito principal, o defeito básico, que torna
inaceitável este projeto é o próprio caráter do programa. Para precisar, ele
não é o programa de um partido dedicado à luta prática, mas uma
Prinzipienerklärung (Declaração de Princípios); é mais um programa
para estudantes (principalmente em sua parte mais importante, dedicada a
definir o capitalismo) e, além disso, para estudantes de primeiro ano, que
conhecem o capitalismo em geral, mas ainda não o capitalismo
russo”. Lenin (Observações ao segundo projeto do programa de
Plejánov. 1902).
25
INTRODUÇÃO
26
5. Se esses motivos não fossem suficientes ainda teríamos mais um: o debate
sobre o Projeto Popular para o Brasil sempre ficou com definições genéricas e
insuficientes. Ao apresentarmos o tema buscamos adentrar nos elementos de
conteúdo a partir de negativas: não é um programa de governo, não é um
apanhado de políticas públicas. Ainda seguíamos com negativas: o Brasil não
tem projeto e o que precisamos é construir um projeto de Nação, partindo de
referências importantes da nossa história e apresentando alguns conteúdos
mais óbvios e em torno dos compromissos da Consulta Popular.
27
inimigos imediatos e estratégicos da revolução. Na medida em que em cada
momento histórico, a luta de classes impõe um obstáculo concreto para o
desenvolvimento do processo revolucionário e a conquista do poder político
pela classe trabalhadora. Desse modo, cabe aos revolucionários e
revolucionárias, identificar em cada momento histórico, quais são as tarefas
políticas e reivindicações imediatas que possibilitam aglutinar forças políticas e
sociais, contra esse inimigo imediato.
11. Por isso, por mais importante que seja o programa, ele é sempre uma
referência que precisa ter vida e responder a um determinado período. Ou seja,
ele está submetido às transformações da realidade concreta, à correlação de
forças na sociedade, e ao nível de consciência da classe trabalhadora. Na
medida em que essa realidade se transforma significativamente é necessário
ajustar o programa do partido. Do mesmo modo, para atrair o apoio de parcelas
importantes da classe trabalhadora ou de seus aliados históricos, é possível
fazer concessões no programa, desde que essas concessões aproximem os
revolucionários da conquista do poder político. É neste sentido, Lenin afirma
que “a realização prática é mil vezes mais importante que todos os programas”.
12. Segundo Marta Harnecker, essa inclusive tem sido uma das maiores
dificuldades das organizações revolucionárias na América Latina: a
incapacidade de formular um programa que, partindo da realidade concreta,
consiga estabelecer as tarefas e objetivos imediatos que possibilite mobilizar as
mais amplas massas contra o inimigo imediato.
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e do mundo, ao mesmo tempo em que se empenha em cumprir com as
necessidades práticas mais imediatas”.
29
Parte I
30
ultrapassarão a si mesmas e serão indispensáveis para transformar
radicalmente todo o modo de produção”. Assim, a luta pelo poder político do
proletariado e a construção do programa político são interdependentes e se
retroalimentam. Além do mais, estas reivindicações combinam medidas
nacionais, democráticas, populares e socialistas num processo dinâmico
condicionado pela correlação de forças, pelo estágio de desenvolvimento das
forças produtivas, correlação de forças nacional e internacional dentre outros.
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regular e a comprometer a si próprios, bem como concentrar o maior número
possível de forças produtivas, meios de transporte, fábricas, ferrovias etc. nas
mãos do Estado. 2. Eles devem exacerbar as propostas dos democratas, que
de qualquer modo não agirão de modo revolucionário, mas meramente
reformista, e transformá-las em ataques diretos à propriedade privada; por
exemplo, quando os pequeno-burgueses propuserem adquirir as ferrovias e as
fábricas, os trabalhadores devem exigir que essas ferrovias e fábricas, sendo
propriedade de reacionários, sejam simplesmente confiscadas sem qualquer
indenização. Quando os democratas propuserem o imposto proporcional, os
trabalhadores exigirão o imposto progressivo; quando os próprios democratas
requererem um imposto progressivo moderado, os trabalhadores insistirão num
imposto cujas taxas se elevam tão rapidamente que ele acabará destruindo o
grande capital; quando os democratas reivindicarem a regulamentação da
dívida estatal, os trabalhadores exigirão a bancarrota do Estado. As
reivindicações dos trabalhadores devem orientar-se, portanto, sempre nas
concessões e medidas propostas pelos democratas”. Nesta perspectiva, o
Projeto Popular para o Brasil parte das medidas mais elementares necessárias
para a concretização da linha de massas e avança até as reformas estruturais,
sempre buscando aprofundar as mudanças e não se contentando com as
conquistas possíveis nos limites do capitalismo. Sempre reivindicando um
passo à frente do que a Burguesia pode conceder.
32
24. Em carta a Wilhelm Bracke, Marx critica o Programa de unificação da
Associação Geral dos Trabalhadores Alemães e o Partido Social Democrata
dos Trabalhadores ao afirmar que se trata de “um programa de princípios" ou
um “programa de compromissos”, afirmando que “cada movimento real é mais
importante que uma dúzia de programas”. Marx avalia que diante da
impossibilidade de se construir um programa superior ao anterior (o Programa
de Eisenach) seria “melhor ter firmado um acordo para a ação contra o inimigo
comum (...) até que tal programa possa ser preparado por uma longa atividade
comum''. Fica notório que o programa político não é definido à priori, é
dinâmico e vivo. Se assim não for, não podemos ter outra coisa que não seja
uma concepção maximalista do Programa descolada da análise concreta da
situação concreta.
28. Com essa abordagem queremos destacar que o debate do programa não é
uma filiação teórica, ou acolher as consequências de uma determinante
econômica. O Programa é parte da estratégia e adequado a cada período, as
contradições centrais da realidade, ao desenvolvimento da luta de classes, aos
objetivos estratégicos e ao sentido geral da revolução. Mais uma vez o tema
exige um marxismo vivo e criativo e não um conjunto de postulados e citações.
33
1.2. A questão do Programa na II Internacional.
32. Mas é nesse contexto que o marxismo se divide, e uma fração importante,
majoritária, passa a liderar com ênfase nas mudanças nos marcos do
capitalismo (reformas) e transformando esse caminho como o centro da luta.
Esse campo não compreendia a revolução como o centro da luta, para o qual a
estratégia, a tática, a organização e os métodos deveriam ser orientados. O
reformismo nasce como um campo dentro do marxismo, em nome do
marxismo, para negar o núcleo duro das concepções marxistas. Ou seja, o
reformismo nasce negando o marxismo em nome do marxismo.
34
34. Ainda na II internacional, o debate sobre o programa seguiu centrado nos
elementos da transição ao socialismo partindo da crise no centro do
capitalismo e do programa como medidas concretas para uma revolução
mundial. A chave de debate permanecia centrada nos países europeus e do
centro do capitalismo.
36. Após a experiência da revolução Russa, o debate passará por uma mudança
importante, ao se deparar com o desafio da revolução em um país atrasado,
uma formação pré-capitalista. Um exemplo, e o mais importante, foi o debate
sobre os rumos da revolução na Rússia e foi por esse debate que o tema do
programa passou a ser abordado como o conhecemos.
35
burguesia e passando, após avançar no desenvolvimento das forças
produtivas, para a etapa seguinte. Essa concepção de caráter da revolução e
do programa foi defendida por um dos mais importantes marxistas russos,
Georgi Plekhanov.
39. A segunda concepção era defendida por um setor ligado ao trabalho político
com o campesinato. A sua análise partia das transformações no campo, após
as revoltas camponesas ao longo da primeira metade do século XIX e o fim da
servidão e as reformas de 1861, que desmantelaram o sistema feudal e
promoveu uma distribuição de terras a partir de áreas coletivas de vida e
trabalho. Nessa concepção, a questão de uma sociedade atrasada e
essencialmente camponesa, foram considerados como um aspecto positivo, ou
seja, o que era identificado como um problema (ampla massa camponesa,
baixo nível industrial e de assalariamento, etc), foi tratado como um traço
positivo. Já que o campesinato russo, uma ampla maioria da sociedade, por já
viver em uma sociedade comunal, não passaria pelo processo nos termos do
desenvolvimento da Europa ocidental e EUA, mas por um caminho original e
próprio da sociedade russa, rumo ao socialismo. Por essa compreensão o
programa seria de transição ao socialismo sem qualquer etapa ou percurso
com reformas burguesas.
36
Revolucionários (SRs), posição mantida até agosto de 1917, quando essa
definição dos Bolcheviques foi modificada para a defesa da Reforma Agrária,
diferentemente da anterior defesa da nacionalização da terra sob controle do
Estado. A motivação por trás da defesa da reforma agrária era que o
campesinato, por razões históricas, culturais e sobretudo pela situação do
campo no capitalismo, tinha como centro da luta a conquista da terra e não a
terra passar dos grandes proprietários para o Estado. A alteração programática
dos Bolcheviques ocorreu por uma efetiva imposição desse setor a partir da
força real na luta. Com esse exemplo é possível dar ao tema do programa um
tratamento mais preciso e dinâmico.
37
condicionado pelo apoio direto dos países de ditadura proletária”. Esse
entendimento generalista que a IC tinha, sobre as formações sociais, de países
e nações tão díspares como Índia, Coreia ou Uruguai (e obviamente nosso
país) teve uma influência muito grande sobre as constituições dos programas
dos PC’s destes lugares. E teve consequências em relação a caracterização
das revoluções nestes países, da conceituação das classes sociais e,
consecutivamente, das alianças que deveriam ser realizadas para atingir seus
objetivos estratégicos.
45. Em países da América Latina, que não tinham passado pela sucessão dos
modos de produção da Europa (Comunal primitivo - Escravismo - Feudalismo -
Capitalismo) uma série de relações sociais no campo e tipos de apropriação da
terra foram vistas pela IC, como “semi-feudais” ou mesmo "feudais". Numa
tentativa forçada de adaptar as ideias presentes em programas, resoluções e
orientações gerais da IC à realidade latino-americana, assim influenciando
consideravelmente as caracterizações das formações sociais destes países
feitos pelos PC's e consecutivamente a construção de seus programas. Essa
maneira de interpretar o passado colonial e, portanto, os resquícios desse
passado no presente, influenciaram a criação de programas da maioria das
organizações políticas de viés marxista (não só o PCB), até praticamente os
anos 1970 (incluindo os da esquerda armada no Brasil e resto da América
Latina).
46. A estes países caberia realizar primeiro uma revolução de caráter democrático-
burguês, visto que estes tinham que ter certo desenvolvimento econômico e
social, só assim estariam “maduros” para prosseguirem para uma ”etapa”
socialista. Em realidade, o que se realizou foi adotar o programa e estratégia
defendida pelos derrotados em outubro, dessa vez em nome de Lenin,
conforme já tratado no ponto anterior.
38
48. Excetuando a Revolução Negra do Haiti, os processos de independência
ocorridos na América Latina não significaram uma transformação profunda da
antiga sociedade colonial. A independência não se fez completa. No caso do
Brasil, a transição pelo alto através da Casa de Bragança permitiu a adoção de
uma Monarquia Constitucional, e a manutenção de uma sociedade aristocrática
e escravista, com extrema concentração de riqueza e poder, às custas da
exclusão permanente do povo na dimensão social e democrática.
49. A ausência de um projeto de nação por parte das elites desses países, bem
como a incapacidade de promover uma integração nacional ou regional
autônoma, fará com que os países da América Latina sejam incorporados de
forma dependente ao espaço econômico, político e cultural das sucessivas
potências hegemônicas. Num primeiro momento, Portugal e Espanha, em
seguida Holanda, França e Inglaterra. E mais recentemente aos Estados
Unidos da América.
39
republicana liberal e a dinâmica economia agrário-exportadora encontram seu
limite em 1930.
55. Os cruciais anos vinte e trinta não culminaram com a libertação plena de
nenhum povo latino-americano, apesar dos esforços realizados, mas deixaram
conquistas extraordinárias com a inclusão da diversidade étnica e racial latino-
americana no pensamento e na cultura, o auge dos movimentos de
trabalhadores organizados, do nacionalismo popular e revolucionário, a difusão
das ideias socialistas e um campo novo de experiências e ideias sobre os fatos
reais das sociedades com vistas a processos de liberação nacional levando em
conta as especificidades da formação social e econômica desses povos.
56. Já nos anos sessenta, essas elaborações tiveram um salto de qualidade com
uma revolução que triunfou em 1959 relacionando a questão da libertação
nacional ao anti-imperialismo e à participação popular. As aspirações
profundas dos povos latino-americanos entrarem na história de sua construção
nacional, colocou-se concretamente no desfecho da Revolução Cubana que é
uma Revolução Socialista de Libertação Nacional.
40
57. “Em Cuba ficou demonstrada uma regularidade da revolução na América
Latina: a revolução que aqui amadurece é a revolução socialista. Ficou também
demonstrado em Cuba que não se pode ir ao socialismo, senão com bandeiras
democráticas anti-imperialistas. Que não se pode realizar até o fundo a
revolução democrática anti-imperialista, nem se pode defender suas conquistas
sem se atingir o socialismo. Dito de outra maneira: não se pode atingir o
socialismo senão pela via da revolução democrática anti-imperialista, mas
tampouco se pode consumar a revolução democrática anti-imperialista sem
atingir o socialismo. De maneira que entre ambas há uma ligação essencial
indissolúvel, são facetas de uma única revolução e não duas revoluções. Se
olhamos de agora para o futuro, o que se apresenta é a revolução democrática
anti-imperialista e que não se apresenta com uma revolução à parte, senão
como a realização das tarefas próprias da primeira fase da revolução
socialista”.
58. “Sendo assim, compreende-se melhor que não pode haver revolução sem
resolver a fundo o problema do poder e que não é necessário esperar que as
grandes massas tenham uma consciência socialista para conceber a tomada
revolucionária do poder. Em Cuba não havia consciência socialista
generalizada antes da vitória de 1° de janeiro de 1959. Parece-me que, se o
problema do caráter da revolução é enfocado desta maneira, a atividade dos
partidos revolucionários não pode deixar de ter em seu centro o problema do
poder”.
59. Ao explicitar essa dialética de que não se pode atingir o socialismo senão pela
via da revolução democrática anti-imperialista, mas tampouco se pode
consumar a revolução democrática anti-imperialista sem atingir o socialismo,
Schafik Handal (1930 – 2006) mostra qual é o lugar das bandeiras nacionais de
conteúdo democrático e imperialista, na luta pela transição socialista em países
Latino Americanos. O empenho de uma sociedade que se coloca em
movimento contra o imperialismo e por bandeiras democráticas nacionais,
necessariamente, cedo ou tarde colocará a luta pelo poder.
41
61. É importante salientar que o processo vivenciado no Brasil entre o final do
século XVIII e a primeira metade do século XIX não está dissociado das
mudanças globais em curso. A consolidação das revoluções burguesas, as
reformas educacionais, as lutas pela independência dos países americanos,
africanos e asiáticos, as lutas pelo fim da escravidão e as influências da
revolução haitiana em levantes populares e da independência das 13 colonias
da América do Norte, são parte deste processo contraditório que contribuiu na
consolidação das relações capitalistas globalmente.
42
elemento fundamental da sociedade brasileira até aquele momento. À época,
isto significou uma ruptura com representações do Brasil que viam a
escravidão como elemento secundário da vida nacional, que seria
representada pela política da Corte. Tinha como algumas de suas pautas o fim
formal da escravidãoa reparação material aos escravizados, a reforma agrária,
rápida industrialização do país, incluindo a importação de mão de obra
estrangeira.
43
Parte II
70. O período da década de 1930 foi uma das profundas recessões da economia
brasileira. É comum na literatura econômica a afirmação de que até 1930
houve crescimento industrial, mas só a partir de 1930 houve processo de
industrialização propriamente dito. A resposta da classe dominante à recessão
relacionada à crise de 1930 foi a política desenvolvimentista baseada no
Processo de industrialização por Substituição de Importações (PSI). Essa
política, diante de uma situação externa adversa (crise mundial no entre
guerras), passou a produzir internamente o que antes era importado pela renda
do café. Nesse processo o “projeto burguês” deslocou o debate da
“modernização” para uma discussão puramente técnica e reduziu o
“desenvolvimentismo” à “industrialismo”. Por outro lado, os anos vinte foram
marcados também por movimentos portadores de aspirações profundas do
povo brasileiro de se constituir como tal e afirmar sua existência enquanto povo
– nação. Entre eles, o Tenentismo e a Primeira Semana de Arte Moderna, que
pela arte repensou o povo, o Brasil, seus símbolos. E ainda, 1922 data a
fundação do Partido Comunista do Brasil. As questões nacionais nesse período
são traduzidas da perspectiva popular por meio da ANL (Aliança Nacional
44
Libertadora) que representou a disputa de projetos de sociedade naquele
momento.
73. A crise dos anos 1980 que projeta a estratégia democrático popular se verifica
novamente um embate dessa natureza. Na crise dos anos 1980, diante da
ruptura do financiamento externo, houve uma inserção dos países latino-
americanos na economia internacional, que passaram de países até então
absorvedores de recursos reais e financeiros do exterior para países que
transferem recursos para o exterior por meio do pagamento de juros e
amortizações da dívida externa. Então, estávamos diante de um cenário de
crise econômica com o ascenso da luta popular que forjou uma relação
dialética entre o quadro político em diálogo com o povo. Essa prática deu
origem a uma concepção de educação popular inspirada na pedagogia de
Paulo Freire e na Teologia da Libertação como práticas de trabalho popular. Do
caldo político desse tripé, junto a concepção do movimento pinça, articulando
luta institucional e luta de massas, surgem as Comunidades Eclesiais de Base
das Igrejas cristãs; a abrangente rede de movimentos populares e sociais
45
despontados nos anos 1970; o sindicalismo combativo; e, na década de 1980,
a fundação da CUT (Central Única dos Trabalhadores); da ANAMPOS
(Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindicais) e, em seguida,
da CMP (Central de Movimentos Populares); do PT (Partidos dos
Trabalhadores); e do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
75. Ao longo dos dois anos seguintes, novos esforços para ser considerado
membro pleno da IC, sendo reconhecido esse status no V Congresso da
mesma, em 1924. Justamente a partir desse congresso, com o processo de
"bolchevização", ou seja, um processo de maior controle do PCUS sobre a IC e
consecutivamente sobre os PC's à ela filiados, nota-se uma disciplina mais
rígida no interior do PCB e seus congressos seriam realizados após os
congressos da IC, o que definitivamente ocorre, com o II congresso do PCB em
meados de 1925. A partir desse processo, o partido passaria a estar mais
fortemente norteado pelas determinações do Comitê Executivo da IC e de suas
resoluções.
76. Podemos perceber isso de forma mais evidente com a aprovação do programa
da IC em seu VI Congresso, realizado em 1928. Países tão díspares como
Índia, China, Brasil e Argentina apesar das classificações diferentes (“coloniais
ou semi-coloniais” para uns e “dependentes” para outro grupo de países)
tinham basicamente tarefas similares. Estes seriam impregnados de
“resquícios feudais” ou “relações sociais feudais” e que as tarefas primordiais
seriam “a revolução agrária e, por outro lado, a luta contra o imperialismo
estrangeiro, pela independência e/ou libertação nacional. Estes dois pontos
básicos acompanharam programas do PCB, e de uma parte importante da
esquerda brasileira, ao longo do século XX.
46
77. O PCB, entre a década de 1920 e metade da década de 1930, ao analisar a
realidade brasileira e teorizar sobre sua formação social e a partir disto, traçar
quais seriam as tarefas necessárias da revolução brasileira, concluiu que o
caráter de nossa revolução seria "democrática-pequeno burguesa” e que
poderia se forjar através da constituição de um “Governo-Operário-Camponês”
que iniciaria um processo “de confiscação da terra , supressão dos vestígios
semi-feudais e liberação do país do jugo do capital estrangeiro.”
47
democrática e nacional-libertadora. Os comunistas deveriam lutar pela
implantação de “Governo Democrático de Libertação Nacional”, em que
haveria o confisco e a nacionalização de todos os bancos, empresas
industriais, de serviços públicos, de transportes e de energia elétrica, minas,
etc “pertencentes ao imperialismo” (norte-americano, em especial). Propunha
também o confisco das grandes propriedades latifundiárias, sem indenização, e
a entrega das terras aos camponeses; a imediata libertação do Brasil do jugo
imperialista; o desenvolvimento independente da economia nacional;
liberdades democráticas para o povo; a imediata melhoria das condições de
vida das massas trabalhadoras.
48
2.3. O programa na experiência do PT.
85. O programa, nos anos iniciais do PT, buscava articular três questões
fundamentais: a luta pelo fim da ditadura militar, as lutas econômicas dos
trabalhadores e um tema que, ao longo de toda a década de 80, constituiu a
verdadeira bandeira estratégica do partido, que é a incorporação dos
trabalhadores à democracia brasileira. Esse último ponto tinha como pano de
fundo as limitações à organização sindical, características do período
democrático 1946-64 e radicalizadas depois do golpe militar. A autonomia
sindical se configurava, nesse sentido, como o tema “estratégico” de maior
relevância para o PT, nesse período.
86. De uma maneira geral, podemos dizer que a questão programática, no PT dos
anos 80, esteve quase sempre subordinada à dinâmica da conjuntura, sem que
houvesse uma preocupação maior em debater que tipo de programa se fazia
necessário para conduzir a uma transformação na direção do socialismo. Não
poderia ser diferente, uma vez que, apesar de se declarar socialista, o PT não
se preocupou, naquele momento, em definir o que isso significava ou os
caminhos a percorrer na direção do socialismo.
49
se, explicitamente, que o PT deve ter um papel dirigente, em relação aos
trabalhadores, na luta pelo socialismo. A centralidade da questão do poder
para a presidência da República, a partir desse momento, se torna um aspecto
fundamental da trajetória do PT.
89. Assim, o programa deixa de ser um tema fundamentalmente reativo, como fora
até então, e se transforma em uma urgência para um partido que começa,
desde aquele momento, a se preocupar com a possibilidade de governar. A
conjuntura adversa dos anos 80 interrompeu aquilo que parecia se configurar
como um giro à esquerda na trajetória do PT e o partido acabou tomando um
rumo crescentemente eleitoralista. Mas o impulso do debate sobre a transição
ao socialismo se fez sentir por alguns anos, após 87.
93. Assim, as reformas tratadas como a questão central dos programas das
candidaturas petistas de 89 e 94 eram consideradas pelos elaboradores
desses programas (aprovados pelo partido) como parte de um processo de
transição ao socialismo. Essa transição não se esgotaria com a vitória de Lula
mas, ao contrário, teria nela o seu ponto de partida. A visão das reformas como
um processo articulado e em linha de continuidade com a construção do
50
socialismo mantinha o PT distante do esquematismo etapista do stalinismo e o
aproximava das distintas tradições revolucionárias do século XX.
94. Nas eleições seguintes, num quadro de recuo da esquerda no mundo inteiro e
também no Brasil, a ideia de transição perdeu força, mas o tema das reformas
continuou sendo fundamental. Com Lula eleito, as reformas também foram
deslocadas, em favor de um caminho mais pragmático e com um horizonte
mais rebaixado. É possível dizer que, assim como nos primeiros anos da
trajetória do PT, o programa, nos anos em que o partido esteve na Presidência,
esteve submetido à dinâmica da conjuntura, sem qualquer articulação com um
projeto de longo prazo. A conjuntura, no entanto, já não era aquela dos anos
80, caracterizada pela ascensão das lutas populares, mas a dos anos que se
seguiram à imposição do projeto neoliberal. Ou seja, uma conjuntura de
possibilidades mais limitadas.
96. As tensões com o tema do programa também têm como conteúdo o que foi
propagandeado como “marxismo-leninismo”, que nada mais era do que as
interpretações e posições hegemônicas no interior do Partido Comunista da
União Soviética (PCUS), que passou a adotar o programa derrotado da
revolução russa e então defendido por Plekhanov. O centro dessa linha era a
defesa de que o estágio do desenvolvimento nacional era determinante da
estratégia e consequentemente das alianças, e em razão disso, a revolução na
periferia do capitalismo seria burguesa e a aliança central com a burguesia
contra o imperialismo. Ou seja, a adoção da concepção programática derrotada
em 1917, porém feita em nome de Marx e Lenin.
51
sob hegemonia de Stalin. Isto é, uma separação entre a revolução
democrática, popular e nacional da revolução socialista, de modo a
compreender as alianças a partir de cada revolução e, portanto, dando
passagem para a proposta de aliança estratégica com a burguesia. O combate
a essa proposta oriunda de Plekhanov e derrotada com a revolução de outubro
é uma dupla farsa: a da origem, dando a proposta combatida por Lenin como
sendo a de Lenin; e a da crítica como sendo o PNDP sinônimo de aliança com
a burguesia.
99. A segunda linha crítica desse programa é oriunda dos setores que fazem uma
crítica ao processo da URSS como sendo, na parte ou no todo, resultado dos
erros cometidos pelos revolucionários. Dentre os erros, o tema do programa é
um deles, sendo considerada uma explicação dos limites do desenvolvimento
do socialismo na URSS - e, posteriormente, a ser aplicada como crítica à
China, Iugoslávia, Romênia, Hungria e a todo bloco do chamado “Leste
Europeu”, bem como às revoluções na periferia que não ruíram nos anos de
89-91: Cuba, China, Coreia do Norte, Vietnã, Moçambique e Angola. A crítica
parte de uma avaliação dos limites dessas revoluções.
101. A terceira das críticas é aquela gestada nas fileiras do chamado campo
“trotskysta” (mas não nas formulações de Trotsky). Essa crítica enfatiza o
desenvolvimento do capitalismo e do estágio da Revolução Burguesa,
fundamentando a definição de que a revolução burguesa foi concluída. A partir
dessa definição, esse campo vaticina que não há mais espaço para um
programa conciliador e associado a reformas parciais, as quais seriam
justificadas por uma incompreensão da revolução burguesa, uma fixação nas
tarefas inconclusas e até mesmo um objetivo explícito ou oculto em uma
aliança com as burguesias. Em resumo, é uma defesa de superação a partir da
realidade do desenvolvimento do capitalismo dentro do tema do programa.
52
102. Em comum, as três têm um problema: se o programa e o caráter da Revolução
não é nacional, democrático e popular articulada com a transição ao
socialismo, qual é o programa concreto?
103. Seguindo com a crítica aos limites PNDP: como o programa não é determinado
exclusivamente pelo grau de desenvolvimento do capitalismo brasileiro, mas
esse é um de seus elementos determinantes, as críticas ao PNDP não são e
nem foram capazes de apresentar um programa socialista com lastro nas lutas
sociais e de massa.
53
Parte III
54
d. O colonialismo: É o conjunto da herança colonial que se
manifesta nas estruturas da sociedade brasileira,
particularmente no modelo econômico dependente, nas formas
políticas de dominação de classe e no campo da cultura. Tudo
isso atualiza o capitalismo dependente como uma marca de
nossa formação social.
55
j. O Estado burguês no Brasil se constituiu estruturalmente de
forma restrita e formal, com sistemas políticos ao longo de sua
evolução que dificultaram a participação popular, a cidadania
política e social. Exerce uma violência de classe
institucionalizada sobre as classes populares. Diante de uma
burguesia sem projeto de nação, o desenvolvimento do
capitalismo dependeu de um Estado forte e centralizador, que
viabiliza a modernização conservadora cobrindo o déficit de
investimentos que deveriam ser feitos pela burguesia, pelo setor
privado.
106. O acúmulo de forças do projeto popular não objetiva viabilizar uma revolução
burguesa pelo fato de que as relações sociais capitalistas de produção já são
dominantes na formação social brasileira, além da dominação de classe da
burguesia já estar consolidada. Este é um legado fundamental de Florestan
Fernandes e que está na base do Projeto Popular. Não temos no atual
momento histórico uma revolução burguesa incompleta. A caracterização da
vigência de uma revolução burguesa incompleta está na obra de Nelson
Werneck Sodré na década de 1950 e correspondia também a uma formulação
da III Internacional para os países dependentes.
56
3.2. Interpretação da formação do povo brasileiro.
111. No lado da América que é banhado pelas águas do oceano Atlântico houve
uma maior escravização dos povos negros africanos, e o lado banhado pelo
oceano Pacífico teve, em sua maioria, a escravização dos indígenas. Afirmar
isso não é o mesmo que defender que o fator determinante tenha sido os
oceanos ou territórios ou geografia. As regiões do lado do oceano Pacífico e
Antilhas tiveram um predomínio da colonização espanhola, que teve início,
principalmente, com a exploração dos seres humanos escravizados para a
exploração de metais preciosos nas minas. Já a colonização portuguesa foi
iniciada pela exploração da monocultura para a exportação da matéria prima,
tendo como base o trabalho escravizado, principalmente dos povos negros
africanos.
113. Essa questão histórica é importante para que se perceba que desde o início da
colonização a escravização dos negros foi o pilar basilar da economia da coroa
portuguesa. De acordo com Jacob Gorender: “à mesma maneira que a
propriedade da terra é o fator socialmente decisivo de domínio da produção no
feudalismo e a propriedade do capital, no capitalismo, os contemporâneos do
escravismo tiveram a clara noção de que a propriedade de escravos constituía
o fator decisivo, o fator fundamental de domínio da produção na economia
existente no Brasil".
114. Com o intenso tráfico negreiro, que será mais bem aprofundado adiante, se
passou a desenvolver um modo de produção diferenciado, como afirma Marx:
“Quando se rouba o escravo, rouba-se diretamente o instrumento da produção.
Mas é preciso que a produção do país, para o qual se roubou, esteja
organizada de tal maneira que admita o trabalho dos escravos ou então (como
na América do Sul etc.) é preciso que se crie um modo de produção que
corresponda a escravidão (apud GORENDER, 2011, p. 85).
57
115. Para Marx, para se definir um modo de produção leva-se em conta as forças
produtivas e as relações de produção como se fossem uma unidade. Gorender
reafirma a concepção de Marx: “no que se refere à colonização do continente
americano, seria impossível compreender a escravidão sem estudá-la em
conjunto com as forças produtivas e sua organização fundamental: a
plantagem”.
118. No século XVIII, com a descoberta dos metais preciosos nas Minas Gerais, os
negros também foram os principais extrativistas. No campo havia ainda os que
trabalhavam na pecuária, na agricultura, etc. Existiam também os que eram
conhecidos como os negros de ganho, que eram os que geralmente viviam nos
centros urbanos consertando diferentes tipos de ferramentas, vendedores em
geral, barbeiros, servindo de mensageiros, trabalhando como prostitutas,
escravos carregando as fezes dos seus senhores para limpar a casa, etc. Ou
seja, a população negra estava presente na grande parte dos trabalhos
produtivos ou "improdutivos" da sociedade colonial. Em muitos momentos da
colonização portuguesa no Brasil havia, em termos percentuais, mais negros
escravizados do que a própria população "livre" no Brasil.
58
119. É nesse contexto, em que o ser humano escravizado passa a se tornar uma
propriedade e é "naturalizada" a coisificação do escravo. Muitos escravos eram
considerados, pelos seus donos, como iguais a qualquer outro animal diferente
deles. Ou seja, a transformação do ser humano em propriedade atuou como
uma alienação em relação à própria condição de ser humano, negando toda
sua subjetividade, sua capacidade intelectual, sua capacidade de projetar um
trabalho antes mesmo de realizá-lo e dentre tantas outras diferenças. Foi a
partir da ação de adotar o ser humano como uma propriedade que passaram a
utilizar a prática de marcar o escravo com ferro em brasa como se ferra o gado.
120. Como quase todas as propriedades, para adquiri-la deve-se comprá-la. Logo, o
escravo representava a soma pela qual foi comprado ou pela qual poderia ser
vendido. Foi assim que muitas vezes os escravos eram utilizados como
moedas de troca ou meio de circulação de mercadorias. No período colonial,
alugar um escravo para um determinado serviço era o mesmo que alugar uma
ferramenta ou um animal. Essa prática de alugar escravos chegou a ser uma
forma de investimento, através da compra de escravos destinados a render
sobre a forma de locação.
121. Com o passar dos anos, a propriedade de escravos foi cada vez mais
valorizada, e a quantidade de escravos em um determinado engenho era parte
substancial na reserva de bens dos caudillos. A evolução é evidente se tomar
como referência o valor representativo dos escravizados em relação aos outros
bens do engenho. Como evidencia Gorender: em 1635 existiam latifúndios que
o total do plantel de escravos equivalia de 14% à 18% dos bens do engenho;
em 1781 o valor do plantel passou a constituir de 25% a 30%; em 1850, antes
do fim do tráfico, esse valor girava em torno de 47%, e, após o fim do tráfico de
escravos, o valor do plantel passou a ser de 69% à 73% do inventário total do
engenho. Com isso, percebe-se que além do escravo ser o principal
trabalhador produtivo, o sujeito que tem o fruto do seu trabalho expropriado por
um sujeito dominador (branco), ele era considerado também, por ser uma
propriedade, como parte da força produtiva, ou seja, como um meio de
produção.
122. Além disso, a forma de geração de renda dos negros escravizados ia além de
sua capacidade produtiva ou improdutiva; o próprio tráfico de escravos era uma
das maiores fontes de lucros do comércio externo e interno de escravos. Em
1798 o preço global de escravos equivalia a 24% do total de exportação e
representou 23% do total de importação de "mercadorias" do Brasil. Assim, é
plausível afirmar que grande parte da renda nacional tinha como base a
circulação da mercadoria: seres humanos escravizados.
59
Gorender, “a sociedade colonial era uma rígida sociedade de castas - sem
deixar de ser sociedade de classes - enquanto a percorria de alto a baixo a
linha divisória entre escravos e homens livres. Exceção feita à geração que
alcançou o final abolicionista, a imensa maioria dos escravos morreu na
escravidão e os que obtiveram a condição de libertos precisaram carregar
consigo o estigma de um pecado original, tanto mais quando se faziam
reconhecer pelos traços raciais. Já no âmbito dos homens livres, vigorava uma
hierarquização estamental à qual, todavia, era imprescindível a sanção das
relações de mercado”.
60
ocultando as diferenças de classe, mas unificando determinados elementos
sociais que são capazes de levar uma revolução até o seu fim.
130. Do ponto de vista da questão racial, a análise do Darcy nos traz elementos
importantes para apreensão da particularidade do racismo no Brasil ou que
muitos vão chamar de racismo à brasileira.
61
132. Uma outra característica, extraída da leitura do Darcy Ribeiro, é a ação
sistemática das classes dominantes brasileiras de ocultar ou relativizar a
participação negra na formação da identidade nacional. Um exemplo disso são
as contribuições Gonçalves Dias e José de Alencar, financiadas pelo Estado
brasileiro durante o Governo Vargas, e a construção de uma identidade cultural
definida a partir da nossa constituição racial, na qual se destacava o elemento
branco e o índio, e relegava o elemento negro a uma posição de marginalidade
ou de invisibilização.
133. Essa elaboração de Darcy Ribeiro nos parece atual e nos ajuda em diversos
sentidos, mas, como vamos demonstrar mais adiante, é insuficiente.
Necessitando, pois, que seja complementada por outras referências que
ajudem a dimensionar melhor a compreensão do racismo estrutural no Brasil.
134. Lélia Gonzalez (1988) também vai identificar essas diferentes manifestações
do racismo e vai caracterizá-las como táticas diversas, visando, contudo, o
mesmo objetivo: exploração/opressão. Segundo ela, nos países de origem
anglo-saxônica, germânica ou holandesa, negra é a pessoa que tenha tido
antepassados negros (“sangue negro nas veias”). De acordo com essa
articulação ideológica, miscigenação é algo impensável (embora o estupro e a
violência sexual era amplamente praticado). Nessas sociedades, predominou o
racismo aberto, de tipo segregacionista, como o apartheid na África do Sul e as
leis segregacionistas nos Estados Unidos.
136. Nessa linha, outro importante pensador marxista brasileiro, Clóvis Moura, no
livro Dialética Radical do Brasil Negro (1994, p. 184), as classes dominantes no
Brasil transformaram um fator biológico (miscigenação/mestiçagem) em um
fator sócio-político (democracia racial). Ainda, segundo o autor, a mestiçagem
não é necessariamente um problema, a questão é como foi ordenada
socialmente essa população poliétnica e quais os mecanismos específicos de
resistência à mobilidade social vertical massiva.
137. Com isso, o autor faz um deslocamento importante sobre o tema e, assim
como colocamos no início do texto, apresenta a questão racial como uma
questão social e política. Logo, o foco não é exaltar ou negar a miscigenação
no Brasil, mas analisar os mecanismos concretos que fazem da questão racial
um mecanismo de produção e reprodução de desigualdades sociais.
62
138. É importante ressaltar que o projeto de colonização não se instalou em nosso
país sem oposição. Rejeitamos a ideia da passividade do povo brasileiro ante a
violência da colonização e da escravidão. E os autores que temos dialogado
até aqui fundamentam essa afirmação, assim como muitos outros. Desde a
chegada dos portugueses e em seu longo período de instalação no território
brasileiro, muitos foram os conflitos e as formas de luta e resistência que
assumiram as classes subjugadas.
63
ideologia do empreendedorismo e a responsabilização do trabalhador por sua
empregabilidade, intensificaram a fragmentação da classe trabalhadora,
rompendo com o pouco de seus laços de sociabilidade, sobretudo desde o
campo da produção.
145. Frente a essa nova complexidade das relações de trabalho, alguns elementos
podem facilitar o entendimento para compreender a classe trabalhadora,
escapando do sentido restrito do proletariado.
64
Tabela 1- Síntese de indicadores do mercado de trabalho - 2016 e 2020
65
subutilização. Estudos mostram que em períodos de crise a mão de
obra feminina por ser subordinada à dinâmica da divisão sexual do
trabalho é preferida em função da diminuição dos salários para a
recomposição da taxa de lucro.
66
expressões do capitalismo contemporâneo) tem intensificado esse
processo, com novas modalidades de contratação, ampliando a
precarização para o todo da classe.
h. A tabela 2 nos mostra que entre os ocupados há uma queda entre os que
estão empregados no setor privado com carteira assinada. Enquanto as
modalidades que configuram a informalidade (sem carteira assinada,
conta-própria, empregador, trabalhador familiar, trabalho doméstico sem
carteira) vêm crescendo.
67
carteira assinada, a maior participação é das mulheres negras, acima da
média, seguida pelas mulheres brancas, sendo de 5,6% e 5,4%. Os
homens negros e brancos tem uma participação de 2,8% cada.
148. Convém reforçar o impacto sobre a juventude negra nessa dinâmica, onde 71%
dos entregadores de aplicativos de bicicleta bikeboys) eram negros, 75% tem
até 27 anos e recebiam, em média, R$ 936,00 por mês numa estimativa de
nove a doze horas diárias de trabalho, sete dias por semana. Quanto mais
grave é a situação dos tipos e condições das ocupações, mais elas são
acessadas pela gigantesca maioria de jovens, com seus parcos ensinos
fundamental e médio sem acesso às universidades.
68
3.4. Classe burguesa, o bloco no poder e o regime político.
149. A classe burguesa não pode ser vista como um bloco homogêneo e coeso.
Existem disputas entre setores burgueses. Essas disputas podem ocorrer por
diversos determinantes como por exemplo: questões geográficas, interesses
setoriais, interesses ideológicos, pela relação estabelecida com o imperialismo.
Esses determinantes estão relacionados à conjuntura política e ao momento
histórico, ou seja, não são estáticos e nem exclusivos. Diversos elementos
podem influenciar nas disputas intra burguesas.
69
privatizações e concessões, ampliação de crédito subsidiado, redução das
tarifas de energia e o desoneração tributária. Essas medidas ficaram
conhecidas como a “nova matriz macroeconômica". Apesar disso, a Fiesp e
setores que defendiam a nova matriz macroeconômica construíram e apoiaram
o golpe em 2016.
156. A questão é: por que o fascismo reaparece no atual contexto histórico? Muitos
debates têm ocorrido sobre a atual conjuntura internacional e dentro do nosso
campo político temos acumulado alguns consensos em torno da decadência da
hegemonia absoluta dos EUA e o ascenso da China. Nesse quadro de
decadência, o imperialismo estadunidense se faz mais selvagem no sentido de
70
buscar manter sua hegemonia e uma das formas que isso se expressa é no
avanço do autoritarismo como uma forma de garantir “aliados” para sua área
de influência. O problema é que o atual cenário é menos favorável para os EUA
do que foi no período de disputa com a URSS. A China hoje exibe uma pujante
economia que se desenvolve em todos os sentidos - produtivo, tecnológico,
comercial, financeiro - e ainda tem um imenso mercado potencial interno e
regional, além de ter criado diversas iniciativas de parcerias de
desenvolvimento em diversas partes do mundo, inclusive com os Europeus
ocidentais que são os aliados estratégicos dos EUA. Na área militar, além de
construir sua própria Defesa, tem construido uma parceria estratégica com a
Rússia através da Organização Cooperação de Xangai e o próprio Vladimir
Putin afirmou ser uma construção para impor limites a OTAN. E vale o
destaque, debates sobre uma possível guerra direta entre essas potencias é
infrutífero porque é simplesmente inviável. Não ocorreu contra a URSS por um
simples motivo, caso ocorresse não restaria ser vivente para contar a história.
Essas questões postas, caso a história insista em se repetir, as guerras
ocorrerão em países aliados no sentido de avanços e defesas de posições.
157. Nesse contexto, em que os EUA não têm mais as condições de ser o motor
econômico que possibilita o transbordamento do desenvolvimento para outras
regiões, não restam muitas opções ao projeto atual do imperialismo
estadunidense a não ser investir em governos autoritários para submeter as
classes trabalhadoras dos diferentes países. Por isso precisam estabelecer a
Guerra Fria, para criar uma nova cortina de ferro que garanta regiões de
exploração/dominação e para tentar barrar o avanço chinês.
71
159. A questão é que quando algumas empresas se expandem outras perdem
mercado potencial ou real, tanto a nível nacional quanto internacional. No caso
desse âmbito, o Brasil estava deixando de apenas servir como uma fonte para
diminuir os custos de reprodução da classe trabalhadora dos países do centro
e começava a impulsionar as empresas brasileiras a disputar o mercado
internacional. Por esse motivo, além de atingir os governos petistas e
neutralizar politicamente setores burgueses, a Operação Lava Jato impactou a
economia brasileira e enfraqueceu as empresas brasileiras na concorrência
internacional.
72
163. A nível nacional, as frações burguesas financeiras estavam cada vez mais
sendo deslocadas por empresas financeiras hegemonizadas pelo Estado no
governo petista. Ao indicar a política de diminuição do spread bancário, os
bancos públicos forçaram os bancos privados a fazerem o mesmo movimento.
A questão é que mesmo dessa forma os bancos privados estavam perdendo a
corrida, mas não só os bancos, os próprios fundos de investimento.
164. Evidente que algumas frações burguesas vão ganhar em ambos projetos,
como é o caso do agronegócio, mas é evidente como uma parte das frações
burguesas nacionais perderam com o golpe, podemos ir para diversos ramos,
desde as grandes construtoras, grandes empresas da siderurgia (como era o
caso da Gerdau), de grandes empresas têxteis etc.
165. Como já identificado no tópico anterior, a Operação Lava Jato além de abrir
espaço para a reorganização do bloco no poder, logrou impactos importantes
no início de um novo ciclo de acumulação, de reorientação do papel do Estado
e de uma mudança qualitativa de relações com o imperialismo estadunidense;
167. A Operação Lava Jato impacta brutalmente dois dos três principais pilares
internos do desenvolvimento nacional. O setor da Construção Pesada, que
como vimos acima estavam não somente ocupando importante espaço de
acumulação no mercado interno mas galgando espaços no cenário
internacional é fortemente atingido no escândalo de corrupção e perde seu
ponto de apoio: as demandas da Petrobrás como principal empresa com poder
de compra e o acesso aos recursos do BNDES como forma de sustentação do
padrão de financiamento a juros subsidiados;
168. A Petrobrás opta por um cavalo de pau na sua estratégia de ser uma empresa
líder na mobilização da cadeia produtiva industrial nacional e, para se redimir a
leniência com a corrupção, reduz em 25% seu nível de investimento no Plano
de Negócios selado um ano após o escândalo. Menos investimento significou
menos demanda para as indústrias acessórias que atuavam a jusante da
73
cadeia produtiva e a proibição de contratar empresas envolvidas no escândalo
decretou a morte do setor de infraestrutura nacional;
169. A Lava Jato, nesse caso, não logrou esse conjunto de impactos na economia
brasileira como um erro de percurso, ou como resultado da forma deletéria com
que se mobilizaram os instrumentos da justiça - especialmente os acordos de
leniência - senão que como um elemento chave para compreender a operação
e a participação do imperialismo nesse momento, interessado em cercear
qualquer possibilidade de desenvolvimento de um setor industrial relativamente
autônomo e que, inclusive, atuava na construção pesada em países semi ou
embargados pelo imperialismo como Cuba e Venezuela;
173. O padrão de acumulação atual mantém elevadas taxas de juros ao capital não
mais via aumento da massa de lucro, como foi no período
neodesenvolvimentistas, em que crescia a massa de lucro com o crescimento
da economia, do consumo e dos salários, mas via taxa de lucro, que é
diferente. A taxa de lucro sobe no Brasil mesmo com a massa total de lucro em
queda. Por isso o setor produtivo, em grande medida, está coadunado com o
Bolsonaro e o seu liberalismo porque, a despeito da economia não crescer, a
taxa de lucro (lucro sobre o capital inicial investido) cresce, já que nosso setor
produtivo é muito intensivo em trabalho. Assim, se há elevado desemprego e
flexibilização das relações trabalhistas - especialmente as contratuais - a taxa
de lucro se expande;
74
174. Nesse contexto, as diferentes frações burguesas brasileiras vivem num
paradoxo. Ao mesmo tempo que tem seus custos reduzidos e seu consequente
aumento da taxa de lucro, convivem num cenário de redução da atividade
econômica como um todo. Dessa maneira, muitas frações burguesas se
encontram limitadas tanto pela elevação dos preços de outros recursos
produtivos (devido a queda da produção geral que gera escassez) quanto pela
dificuldade de encontrar um mercado consumidor interno para realizar a mais
valia (o próprio Marx afirma que o sonho de todo capitalista é que seus custo
diminuam e de seus concorrentes aumentem).
75
mais precisamente entre os anos de 1967 e 1973, a taxa média de crescimento
econômico do PIB foi de 10% ao ano. Nesse período foi mais "fácil" de criar
consenso na sociedade, porque além do caráter repressivo do Estado para
disciplinar a classe trabalhadora o ingresso de muitas pessoas ao mercado de
trabalho trouxe uma melhora da qualidade de vida da população. Entretanto, o
prometido investimento na indústria de base foi tímido diante das necessidades
de desenvolvimento do mercado de trabalho brasileiro e a economia estava
dependente de poupança externa e das multinacionais estrangeiras para
sustentar seu crescimento econômico. Com a quebra do padrão ouro dólar e a
crise do petróleo a nível internacional os impactos na economia brasileira foram
diretos. O déficit da balança de pagamentos em conta corrente acumulado
entre 1974 e 1978 foi de U$ 40 bilhões, esses foram financiados via conta
capital de grandeza semelhantes que gerou uma dívida que saltou de U$ 12,6
bilhões em 1973 para U$ 50 bilhões em 1979. Foi através dessa proposta de
inserção dependente na economia mundial que o Brasil conseguiu manter um
alto ritmo de crescimento econômico durante a década de 70 (1974 de 8,4%;
1976 de 10,3%; 1979 de 6,8%). Mas sabemos como essa história acaba. No
final do governo de Carter, os EUA iniciaram um processo de elevação da taxa
de juros com o objetivo de recentralizar capitais e recomeçaram um processo
de valorização do dólar (que foi mais intensificado no governo Regan). Nesse
sentido, os países que contraíram empréstimos a juros flexíveis e dólares
desvalorizados, tiveram que pagar suas contas com juros mais altos e o dólar
valorizado. A receita “perfeita” para desencadear a crise da dívida e da inflação
que atingiram diversos países da América Latina e entre esses estava o Brasil.
Os governos militares, mesmo com todo aparato repressivo, não mais
conseguiram criar consenso dentro da sociedade e precisaram sair da cena
política.
76
frações burguesas internas o que lhe dificulta construir consensos na
sociedade. Essas questões postas, nos permite afirmar que diferentemente do
período da ditadura militar que construiu um crescimento econômico, gerou um
maior consenso na sociedade e com isso nos imprimiu uma derrota histórica,
os governos Temer e Bolsonaro, apesar de impor uma derrota da estratégica
hegemonizada pelo ciclo Petista, não nos impôs uma derrota histórica.
181. Nesse cenário, caso o Bolsonaro sofra um impeachment ou saia derrotado nas
eleições de 2022, a classe trabalhadora necessitará exigir a revogação de
algumas medidas básicas para termos a possibilidade reativar a economia
brasileira. As duas primeiras medidas fundamentais para recuperar alguma
soberania econômica é através da revogação da autonomia do Banco Central e
77
da PEC do Teto de Gastos - Sem essas duas revogações não conseguiremos
ter um mínimo de autonomia no controle da moeda e dos investimentos para
alavancar a economia. Duas outras Reformas que precisarão ser revogadas é
a Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência – a recuperação da
capacidade de renda da classe trabalhadora depende principalmente dessas
duas revogações somado ao retorno da valorização do salário mínimo acima
da inflação. Precisaremos recuperar as estatais que fazem parte do patrimônio
público, que foram vendidas a preços abaixo do mercado e possuem grande
capacidade de dinamizar a economia como um todo – entre elas estão todas
as Refinarias da Petrobras, a BR Distribuidora, a Eletrobrás, os Correios e o
retorno ao antigo regime de partilha para os poços do Pré-Sal (com a Petrobras
sendo a operadora única). Além dessas questões, precisamos barrar a
implementação da Reforma Administrativa. Caso essa seja referendada
poderemos perder todas as garantias de seguridade social da nossa última
Constituição, assim como abriremos espaço para maior corrupção e
apadrinhamento político que se traduz em maior controle da burguesia sobre
as instituições públicas. Por fim, e não menos importante, devido ao aumento
da extrema pobreza e da fome no Brasil, será necessário reativar e fortalecer
mecanismos de transferências de renda como o Bolsa Família e o auxílio
emergencial.
182. Evidente que para implementar tais revogações dependerá de toda uma
correlação de forças de classes, inicialmente entre os/as parlamentares, e,
principalmente, na capacidade de força social organizada para disputar as
ruas. É importante ficar evidente que quanto mais tempo o governo Bolsonaro
passe no poder, mais tempo precisaremos para desfazer o que foi construído.
Caso ele consiga se legitimar novamente pela via eleitoral, poderá reagrupar
suas forças e estará mais forte. O que cria mais possibilidades para um
eventual fechamento de regime. Não será apenas a mudança de governo que
possibilitará uma nova correlação de forças de imediato, mas, minimamente,
nos permite romper o cerco ao qual estamos submetidos desde sua eleição.
Assim, teríamos mais possibilidades para desfazer o que o projeto neofascista
tem construído e melhores condições para organizar a classe trabalhadora.
78
Parte IV
184. Como já apresentado na primeira parte do nosso texto, Lenin afirmava que
“sem programa, o partido não pode existir como organismo político mais ou
menos íntegro, capaz de manter sempre uma linha em qualquer virada dos
acontecimentos”. A ausência de um programa próprio da Consulta Popular,
para o atual período histórico, tem feito muita falta para nossa construção
orgânica, particularmente de força social.
186. O fato é que seguimos sem conseguir atualizar e dar continuidade ao esforço
coletivo do “Opção Brasileira”. Continuamos, é verdade, reafirmando os cinco
compromissos (posteriormente seis) da Consulta Popular, mas tais
compromissos, ainda que importantes referenciais programáticos, não
constituem um programa, já que ele precisa de uma análise da sociedade de
classes que possibilite identificar os interesses e os projetos em disputa e os
demais elementos já apresentados.
79
187. Assim, podemos afirmar que desde 2004 que a Consulta Popular não tem um
programa político para o Brasil e nos limitamos a afirmar a atualidade do
Programa Nacional, Democrático e Popular articulado com o Socialismo (3a
Assembléia Nacional, 2007, MG).
189. Mais uma vez recorremos ao conceito de linha de massas como imprescindível
para a concretização do programa. A mensagem e as propostas programáticas
precisam chegar em milhões de trabalhadores e trabalhadoras de um país
continental. A linha de massas pressupõe uma tática de construção de força
social nos territórios, classes populares via instrumentos de luta como
sindicatos e movimentos populares, estudantes e demais setores, combinado
com a luta ideológica que permita a mensagem programática alcançar amplas
massas. O objetivo deste processo é dar um salto de qualidade na força social
organizada. Sem isso, o programa fica restrito a uma parte da vanguarda, sem
eficácia real na luta política. O programa não tem poder revelador por si só, ele
precisa de construtores e construtoras nos territórios e nos espaços de luta.
80
192. Como eixo orientador para o debate do conteúdo do Programa na Consulta
Popular, além de importantes construções que temos para fora, acreditamos
que devemos nos orientar na seguinte perspectiva:
81
ameaças da contrarevolução. É justamente este processo de conflitos e
rupturas que pode consolidar a conquista do poder. De forma que o estágio
democrático e popular da Revolução Brasileira possibilita tarefas socialistas
pautadas na propriedade social, no cooperativismo, no contínuo avanço do
poder popular, dentre outros, não sendo algo anterior ao socialismo como
defende o marxismo eurocêntrico. Assim, o Projeto Popular combina programa,
com força social de massas e a questão do poder.
194. Todos são desafios grandiosos e esperamos que nossa organização avance
para transformá-los em formulações concretas, enraizadas na organização,
com alcance de massas, coerência com nosso horizonte estratégico, com
capacidade de disputa da sociedade e de transformar o programa em força
real, viva e pulsante para a Revolução Brasileira.
4.2.1. Soberania.
82
sistema financeiro, a cessão de parcelas do território nacional como a base de
Alcântara e as faixas de fronteira, o desmonte das políticas de integração
regional e cooperação Sul-Sul são exemplos do aprofundamento da
dependência e do reforço do papel subordinado do Brasil no sistema
internacional.
4.2.2. Desenvolvimento.
83
subordinado às grandes potências e dinamizado pelo mercado mundial; o
desenvolvimento que busca reproduzir o caminho dos países centrais (que
para alcançar isso se valeram de guerras de rapina, neocolonialismo,
patrocínio de golpes e ações pelo mundo, domínio político dos sistemas
mundiais de regulação e mediação, predatórias do meio ambiente local e nos
países da periferia, baseados no consumismo e um modelo de vida
irrealizáveis no mundo todo etc). Esse caminho tem disputas estratégicas e
devemos incidir nesse rumo, orientado por um Projeto de Nação enquanto
parte fundamental da Revolução Brasileira.
4.2.3. Sustentabilidade.
84
das necessidades históricas do povo brasileiro. É urgente que a Consulta
Popular desenvolva iniciativas, mecanismos próprios e também se integre a
iniciativas existentes que promovam o debate e ações acerca da
Sustentabilidade, visto que o avanço da crise ambiental tende a pôr em risco
criar cenários preocupantes para a própria sobrevivência da classe
trabalhadora.
4.2.4. Democracia.
207. Ao longo da história os regimes democráticos nos países periféricos têm sido
marcados por uma concepção restrita de democracia, com golpes, aversão à
participação popular nos espaços políticos, além de um desencontro deliberado
entre democracia, desenvolvimento e direitos sociais. Para além dessa
configuração comum aos países de origem colonial, as democracias burguesas
e a tradição liberal atravessam hoje uma crise sem precedentes, que atinge até
mesmo os países centrais. As repercussões da crise econômica de 2008
abriram uma fissura nessa tradição liberal burguesa, ampliando o espaço
político para a emergência de um setor ultra-conservador que defende
abertamente a contenção de direitos e liberdades democráticas. Deste modo,
partidos de extrema-direita se tornaram vitoriosos em diversos países, incluindo
os Estados Unidos de Trump e o Brasil. A democracia restrita existente em
nosso país foi sendo desconstituída aceleradamente a partir do golpe de 2016.
O governo Bolsonaro só não avançou ainda mais em direção ao fechamento do
regime, pois a tragédia sanitária e econômica do país retirou parte majoritária
do apoio popular que a eleição de 2018 lhe conferiu. Além disso, diversas
forças sociais se uniram para contenção dos intentos golpistas e na defesa de
bandeiras democráticas.
85
4.2.5. Solidariedade.
209. O Brasil é um país rico, mas seu povo é pobre. O compromisso com a
solidariedade, concebida como um valor antagônico ao da competição do
capitalismo, onde cada um é impelido a aniquilar o outro. Concebida como uma
postura política de militantes que vão ao encontro de sua própria classe, para a
construção processual de uma inserção política ativa, orgânica e popular.
Inserções ativas no seio de diferentes frações da classe, porque compreende a
necessidade da (re)criação de espaços de participação real, capazes de
atualizar as formas orgânicas em sintonia com a dinâmica da vida concreta do
povo.
210. Solidariedade como valor e como dimensão pedagógica de uma práxis política
que atua no sentido do reconhecimento do gênero humano, no encontro com o
outro, em sua ampla diversidade, ao mesmo tempo em que denuncia e
desmoraliza o individualismo e a meritocracia em um intercâmbio vivo e tenso
entre diferentes formas de conhecimento, de experiências de resistências e de
rebeldias.
4.2.6. Feminismo.
212. Cientes de que o sistema capitalista tem como base uma estrutura patriarcal
assumimos o compromisso com o feminismo para dentro e para fora de nossa
organização, compreendendo a centralidade desta luta para a efetiva
emancipação humana e superação deste sistema. A classe trabalhadora não é
homogênea, é diversa, tem gênero, raça e sexualidade. Sob a lente da luta de
classes, entendemos que as relações sociais de classe se imbricam as
relações sociais de gênero e raça, sendo a opressão de gênero parte da
estratégia do capital para aumentar a exploração econômica e a dominação
política dos povos.
213. Por isso, faz-se necessário o caráter feminista e antipatriarcal estar presente
nos compromissos, na estratégia e no programa do projeto popular, não
somente por uma questão ética, moral e de valores, mas porque se relaciona à
86
forma de materializar se pensar o modo de produção, a organização do
trabalho e da vida social. Afinal, as relações patriarcais de exploração e
dominação são estruturantes da sociedade e não estão apenas no campo
ideológico. Ao longo da história o patriarcado se sustenta a partir de uma base
material determinante que é a divisão sexual do trabalho, sendo indispensável
a luta por sua superação, por igualdade de direitos, contra qualquer violência
de gênero e pela legalização do aborto, que são lutas essenciais para o povo
brasileiro.
214. Cabe salientar que assim como a classe trabalhadora não é uma massa
homogênea, tampouco o são homens e mulheres em sua sexualidade,
identidade de gênero, raça e classe. Por isso, é fundamental que nossao luta
feminista e antipatriarcal feminismo avance e incorpore na análise, programa e
prática os elementos da luta contra o racismo e contra a heterosexualidade
compulsória. Apontamos como papel da Consulta Popular contribuir para que a
esquerda brasileira supere seus limites ainda presentes no que diz respeito a
absorção do feminismo como parte de sua estratégia.
215. O feminismo popular para nós não é apenas uma bandeira de agitação, mas
um princípio a ser contido em nossa estratégia, com desdobramento na
construção de um programa e em diversas táticas, fortalecendo a auto-
organização, mas também o cultivando em todos os organismos e instâncias
da organização, . É necessário também que se faça presente na prática política
da militância. Por fim, devemos dar um salto de qualidade para a construção de
força social consolidada em torno do feminismo popular, seja a partir da frente
popular de mulheres, dos movimentos auto-organizados ou dos movimentos
mistos do nosso campo político.
87
195. Entendemos que até mesmo a construção de uma identidade nacional
supostamente universalista é uma fraude baseada no mito de uma suposta
democracia racial, que mais apaga os traços étnico-raciais de nossa formação,
que os incorpora. Está colocado que o compromisso com a igualdade étnico-
racial na luta antirracista é inadiável para Consulta Popular. O pacto histórico
pelo poder, estabelecido na consolidação das relações capitalistas no país,
necessita ser superado e assim o será quando enfrentarmos com a
profundidade necessária as raízes da questão racial e a consideramos o
quanto que ela é parte constitutiva da luta pela Revolução Brasileira.
197. Apesar disso, não conseguimos atuar de forma mais orgânica e permanente
junto ao movimento negro. Também enfrentamos dificuldades em compreender
de forma mais profunda a questão racial no processo de formação do povo e
da sociedade brasileira de forma coletiva, o que tem dificultado, inclusive,
situarmos adequadamente a luta antirracista em nossa estratégia e em nossos
compromissos políticos e organizativos. Neste sentido, para além da
necessária autocrítica sobre nossos limites e insuficiências no debate acerca
da questão racial no Brasil, é fundamental que possamos apontar os desafios
coletivos e identificar quais os passos necessários para o avanço da Consulta
Popular na luta antirracista nesse processo congressual.
88
c. O compromisso com a construção da paridade racial nas instâncias da
organização: Acreditamos que a Consulta Popular precisa expressar também
em suas instâncias a diversidade do povo brasileiro. Por isso, é necessário
avançar na formação de novos militantes e dirigentes, que para além de jovens
e trabalhadores sejam negros e negras, indígenas, etc, para que esses tenham
condições politicas e estruturais de contribuírem na condução da luta política
no país. Formando-os numa perspectiva integral e não apenas para um tema
específico.
194. O Brasil passa por uma profunda crise política, econômica e social, que coloca
a necessidade de um programa de emergência nacional com medidas de curto
e médio prazo, de caráter conjuntural e estrutural, que atendam os interesses
imediatos dos diversos segmentos da classe trabalhadora e organizem a força
social do projeto popular para o Brasil.
89
mudanças ao fracasso. O vanguardismo com o seu “programa máximo” pode
contribuir para o debate político-ideológico, mas não tem condições de
construir uma força social para as mudanças. O basismo, por sua vez,
consegue desencadear de forma espontânea lutas populares em torno de
reivindicações e obter conquistas, mas não acumula forças sequer para
perenizar as medidas mais elementares que demanda. Ambos são irmãos
porque são um fim em si mesmo e não contribuem para a construção do
projeto popular.
200. O Programa de Reconstrução Nacional deve incidir sobre cada uma dessas
contradições, a partir de propostas que possam ganhar musculatura política e
social para alterar a correlação de forças e viabilizar um processo de
mudanças. O movimento político na sociedade em torno do programa deve
ganhar corpo para tensionar o programa e a metodologia da campanha do
90
Lula. Posteriormente, empurrar o governo para fazer as mudanças necessárias
para que seja possível enfrentar a crise. Será um processo à quente de
construção e disputa com o campo reformista eleitoralista.
201. A revogação do teto dos gastos é a medida número zero para confrontar a
profunda crise da economia brasileira, que padece de problemas estruturais
que se agudizaram com a aplicação acelerada do programa ultraneoliberal
depois do golpe do impeachment. A revogação é importante para restituir ao
governo a capacidade de implementar um programa escolhido nas urnas.
91
sufrágio universal, abre uma oportunidade de retomar o debate sobre a tutela
das forças conservadoras sobre o processo de redemocratização nos anos 80.
205. O desmonte das políticas públicas nos últimos seis anos exige uma ação
imediata e acelerada para resolver a situação das milhares de famílias que
vivem em acampamentos e ocupações nas cidades e no campo para dinamizar
a atuação dos movimentos populares, que se constituem como uma força
popular no processo de mudanças sociais. Assim, todas as famílias
acampadas entrariam em projetos de moradia popular e de reforma agrária
para no prazo de um ano sair dessa condição. Além disso, retomar as políticas
para os agricultores que enfrentam dificuldades para produção e
comercialização, fortalecendo os programas de compras públicas.
92
b. Revogação do teto de gastos para retomar centralmente os
investimentos públicos e as políticas sociais. Construir uma
política fiscal adequada ao desenvolvimento nacional.
93
• O estudo da realidade brasileira. Seus problemas estruturais, sua
cultura e sua identidade. Isto permite uma dinâmica de constante
atualização do programa do Projeto Popular.
94
estratégia de acúmulo de forças, sobretudo nos médios e grandes centros
urbanos, em aliança com os movimentos do campo.
215. Para essa massa de desocupados precisamos defender uma proposta como
um sistema nacional de trabalho, alicerçado por um fundo público capaz de
financiar uma jornada social de trabalho. Jornada de trabalho social
remunerada através de um salário-mínimo e ou modelo de renda básica,
combinado com o desenvolvimento de cadeias produtivas voltadas para a
solução dos problemas históricos do povo brasileiro, orientadas pelo
associativismo e cooperativismo, coexistindo com outras formas de
organização da produção.
95
217. É preciso insistir na necessidade de transitarmos para uma concepção de
participação popular ativa e efetiva tanto na disputa e formulação das políticas
públicas, como na disputa pelo modelo de desenvolvimento. Assim, consolidar
uma concepção de desenvolvimento que combine a necessidade dos ganhos
de produtividade com a participação popular nas decisões estratégicas e na
construção cotidiana deste novo modelo. Esta mudança de lógicas implica na
disputa por conceber as políticas públicas e o desenvolvimento a partir de uma
concepção popular, onde o povo, ocupando diferentes espaços nas cadeias
produtivas e de serviços, poderão participar das decisões e rumos do país.
Quando falamos de um modelo de desenvolvimento que combine ganhos de
produtividade com participação popular estamos também considerando que
queremos políticas e bens públicos de qualidade que incorpore novas
tecnologias a serviço do bem-estar da população. Uma disputa que aprofunda
a democracia. Indo além da formulação da política pública e do tipo de
desenvolvimento a ser implementada pelo Estado, para assumir o papel de ser
parte na sua implementação.
96
medidas de geração de emprego e renda mediante instrumentos de
organização popular;
220. Essas são algumas das iniciativas que queremos construir para conjugar a
disputa programática, soluções para os problemas concretos do povo brasileiro
na atualidade, combinação das formas de luta, construção de uma atuação
unitária entre movimentos populares e sindicais e ampliação da força social
organizada. Consideramos que essas propostas que precisarão ser melhor
organizadas, contribuem para o desenvolvimento e avanço da identidade de
classe, através da compreensão de uma forma superior da solidariedade.
Condição para o acúmulo de forças que viabilize o Projeto Popular para o
Brasil.
222. Por isso temos uma posição ousada e que necessita de reafirmação. A questão
nacional advém de duas dimensões complementares. A primeira é a nossa
história como uma nação construída a partir do sistema colonial e baseada no
seu papel de servir como um grande negócio. E nesse percurso as classes
dominantes dessa terra foram constituídas como associadas ou, em outros
termos, como sócias menores. A segunda é pelo papel exercido pelo
imperialismo dos EUA para a perpetuação dessa condição na América Latina e
Caribenha e com muito destaque para o Brasil
97
classes dirigentes dos países centrais. Tal relação estrutural de dependência
continua sendo funcional ao imperialismo, no sentido de impedir que o Brasil se
complete como nação soberana.
224. Assim, a Revolução Brasileira deve completar esta nação inconclusa. Ou seja,
lutar para que o povo brasileiro tenha soberania política, energética,
internacional, ambiental, cultural, econômica e territorial, autonomia política e
cultural no sentido de solucionar nossa “crise de destino” e definir os rumos da
nação. Eis a questão nacional do ponto de vista do povo brasileiro.
226. Nos completaremos como nação pela via das reformas democráticas,
populares e nacionais, significa levar à frente uma luta anti-imperialista, na qual
a revolução nacional, popular e democrática e socialista constitui uma só, e não
duas revoluções. Inspirando-nos nas lutas de libertação nacional e no
nacionalismo revolucionário como elementos constituintes da tradição
revolucionária latino-americana e caribenha. A esquerda brasileira, ao contrário
de outras da América Latina, tem um certo déficit de consciência anti-
imperialista e pouco desenvolvimento do nacionalismo revolucionário.
Compreendemos que estes dois elementos precisam ser melhor trabalhados
no campo democrático e popular.
227. A questão nacional é uma arena em disputa, ou seja, ela pode ser deslocada
para os interesses da classe dominante. Ela é, portanto, historicamente
determinada. E por isso, faz-se necessário identificar a contradição que
impulsiona a questão nacional em cada período histórico.
228. No final do século XVIII, e primeira metade do século XIX, o elemento dinâmico
da questão nacional se manifesta pela “consolidação do território”, processo
pelo qual as classes dirigentes impõem a unidade territorial às custas do
massacre de revoltas populares. Na segunda metade do século XIX, o
elemento dinâmico da questão nacional passa a ser a luta para abolir a
escravidão, envolvendo amplos setores da sociedade brasileira. A revolução
abolicionista não se completou, sendo negado à população negra a reforma
agrária e os direitos sociais reivindicados. Naquele momento, estava
consolidado o imbricamento da questão nacional com a questão social. A
expressão desta questão social é a profunda desigualdade de classe e raça.
Este imbricamento da questão nacional com a questão social foi a contradição
fundadora da modernidade brasileira que impactaria na via de desenvolvimento
capitalista (revolução burguesa conservadora).
98
229. Por tudo isso, não é possível completar o Brasil enquanto nação soberana sem
enfrentar as profundas desigualdades sociais, da intensa exploração do
trabalho, além das opressões de raça, gênero, questões relacionadas à
igualdade e respeito à diversidade de orientações sexuais. Por isso são parte
fundamental da Estratégia e do Programa do Projeto Popular.
231. Entretanto, isto ainda requer uma árdua luta pelo desenvolvimento nos marcos
do capitalismo. Por isso, num momento em que a economia brasileira
passa por um processo de reconversão neocolonial, temos que formular desde
já sobre a necessidade de mudanças na política econômica, reindustrialização,
indústria 4.0, cadeias globais de valor, investimentos públicos, direitos civis e
sociais, dentre outros. Ao não enfrentarmos na Consulta Popular o desafio da
formulação sobre estes temas, abrimos espaços para a hegemonia de setores
reformistas no debate do desenvolvimento, ficando nossas formulações
restritas a uma certa concepção maximalista do Programa: ou seja, a reforma
estrutural é tudo, a política social e as melhorias cotidianas na vida dos
trabalhadores são reformismo, porque aos revolucionários não se elabora uma
linha para esses temas.
99
4.6 Um programa que dispute os setores médios.
233. O tema dos setores médios não se confunde com um desafio de organizar
esses segmentos ou em qualquer compromisso e rebaixamento na linha
mestra da centralidade do proletariado e classes populares. Mas também é
inegável que é um problema concreto a capacidade de disputa desses setores
para um processo de lutas contra os inimigos do povo brasileiro: o imperialismo
e a grande burguesia financeira. Por isso que o tema exige a determinação de
quem são os inimigos principais do Projeto Popular? A resposta não pode ser a
simples afirmação de que é a burguesia industrial, bancária e agrária.
234. Em resumo é um tema que nos remete a necessidade de construir força social
e isolar os inimigos principais da revolução. E se isso é um elemento
estratégico central, a disputa dos setores médios exigirá uma atenção especial.
A começar por definir melhor o que estamos tratando como setores médios. Ele
é composto por uma fração do proletariado e uma fração da burguesia e estão
no mesmo enquadramento por terem em comum três coisas: medo de perder a
sua condição, instabilidade econômica e modo de vida.
235. Ainda precisamos adentrar para definir esse setor. O tema não se confunde
com o debate de alianças, mas com a compreensão de uma heterogeneidade
no interior do proletariado e de uma fração da burguesia que tem forte
contradição com os inimigos principais do Projeto Popular.
237. A expressão é mais adequada do que “pequena burguesia”, por ser essa muito
adequada aos segmentos restritos da burguesia pequena, enquanto por
“setores médios” compreendemos segmentos dos trabalhadores e da
burguesia pequena. No interior desse bloco tem ao menos três ramos distintos:
a burguesia dos pequenos negócios (que exploram trabalho assalariado e
também trabalham); trabalhadores de pequenos negócios (são proprietários,
mas não exploram o trabalho alheio e trabalham); trabalhadores assalariados
com alto nível de escolaridade, de altos salários, com posições de chefia em
processos produtivos e com posições estratégicas em grandes empresas,
dentre outros.
238. Por isso esse tema precisa ser trabalhado como um componente estratégico e
esses distintos blocos que integram os “Setores médios” apresentam uma
100
posição política muito vacilante, instável e errática, embora em grande medida
sejam aliados sob hegemonia absoluta dos setores da grande burguesia e
verdadeiros inimigos do povo. Em geral são arrastados pela contrarrevolução e
a posição política foi trabalhada por Marx como “pequena burguesia”.
240. Na tradição do pensamento Marxista a classe não é definida apenas por uma
questão objetiva, mas por sua posição na luta. Por isso afirma no Manifesto
que “quando (as camadas médias) se tornam revolucionárias, isso se dá em
consequência da sua iminente passagem para o proletariado”. Lenin, por outro
lado, defendeu a composição com diferentes segmentos sociais de classes,
como os setores dos pequenos proprietários, mas quem mais avançou nessas
definições foi Mao, defendendo que o sucesso ou insucesso de uma revolução
nos países de formação econômica atrasadas seria definido pela capacidade
de disputa desses setores. O próprio Fidel foi também um defensor da
necessidade de disputar com esse amplo campo para o triunfo da revolução.
101
243. A Reforma Agrária é uma das bandeiras mais importantes da luta de classes
no Brasil e no projeto popular. O capitalismo no Brasil se desenvolve sem
Reforma Agrária, pelo contrário, desde a colonização o modelo é baseado no
latifúndio e hoje no agronegócio. Organiza-se povo em torno da bandeira da
Reforma Agrária com a profunda convicção de que no capitalismo a reforma
agrária não foi realizada e nem será em termos mais amplos, já que
pontualmente é uma luta com muitas conquistas e talvez uma das lutas de
maior êxito na luta popular no Brasil. Da perspectiva popular, apenas um
processo de transição ao socialismo pode resolver a justiça social e o acesso à
terra no Brasil. Desse modo, não se separa a luta por reforma agrária de uma
luta por superação do capitalismo. O caráter popular dessa reforma agrária
está baseado no seu atendimento às necessidades do povo e não das classes
dominantes, como na reforma agrária clássica. A superação da fome, a
geração de trabalho e renda e a preservação dos bens comuns ambientais dão
sentido a essa luta na atualidade. Diante das dimensões dramáticas da fome e
da crise ambiental essa luta ganha os contornos de uma necessária transição
ecológica.
244. A luta por direitos é a luta por acesso ao trabalho e renda, saúde, educação e é
parte de uma luta por igualdade. A garantia e ampliação dos direitos
elementares em países dependentes como o Brasil assume um caráter radical.
Mesmo nas Revoluções Burguesas, as liberdades democráticas e os direitos
políticos são conquistas das classes populares lideradas pelos trabalhadores. A
defesa do direito ao trabalho digno, a moradia, saúde, educação e a comer três
vezes ao dia representam bandeiras potentes e abordadas como radicais pelas
classes dominantes do Brasil. A defesa do trabalho com direitos e direito ao
trabalho é uma síntese do MTD e que no Brasil assumem uma amplitude
nacional, profunda e que é compreensível para o conjunto da sociedade.
102
246. A soberania energética formulada pelo projeto do Movimento de Atingidos por
Barragens (MAB) e a soberania na mineração, que se traduz – entre outros
temas – no ritmo de extração e nos locais onde se pode realizar a mineração,
organizados pelo Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM),
apontam os problemas relacionados ao tema do extrativismo mineral e foi um
primeiro passo para avançar na organização popular em torno dos efeitos
destrutivos que a mineração gera nas esferas política e jurídica: a relação de
subordinação aos mercados globais, o aumento da concentração de renda e da
propriedade fundiária; relações de poder nos territórios minerados formando a
situação de minério-dependência, que se traduz em hegemonia política e
econômica das mineradoras nesses territórios; expulsão de populações
tradicionais e consequente destruição de suas formas de produção e
existência; riscos de rompimento de represas de rejeitos; poluição sonora, das
águas e do ar; utilização intensiva de água, alterando a dinâmica hídrica
superficial e subterrânea; diminuição da disponibilidade de água de qualidade.
249. Além desses processos mais amplos a cada tempo a esquerda realizou
jornadas de formação, pedagogia, unidade e ação de massas com temas
relevantes para o debate nacional: sobre a dívida pública em 1999-2000; na
jornada contra a Alca em 2001-2004; sobre a Energia e a privatização da Vale
em 2006-2007; sobre o petróleo do pré sal em 2009-2010; sobre o Sistema
político Brasileiro em 2013-2014; e parte desses processos foram
103
acompanhados de verdadeiras consultas a população com os plebiscitos
populares e milhares de militantes percorrendo escolas, sindicatos, bairros,
associações, igrejas e espaços coletivos para discutir esses temas e organizar
os processos de coleta de votos sobre os temas de grande relevância pro
Brasil
251. Alguns acúmulos fruto da construção do Projeto Brasil Popular para nos ajudar
no debate programático são
104
elementares. Elaborar o conteúdo do Projeto Popular. Quais as medidas para
as distintas áreas da vida. Além dos acúmulos no âmbito do método de
construção. Generoso, pedagógico, efetivamente dialógico com a participação
popular, conformando materiais ricos para o trabalho de agitação e
propaganda. Para sermos militantes compartilhando a esperança, o rumo e os
desafios para um Projeto Popular. Que parta do concreto e articule as distintas
dimensões de um debate estratégico sobre o Brasil que tivemos, que temos e o
que teremos.
256. Essa versão da Independência começou a ser relida com Caio Prado Júnior
nos anos de 1930 e 1940, tratando a formação do Brasil como uma empresa,
estruturada no latifúndio, na monocultura e na mercantilização humana, com o
escravismo moderno. Uma formação toda voltada para fora e cujas terríveis
heranças coloniais seguem presentes nas estruturas sociais, econômicas,
políticas e culturais, as quais não foram alteradas quanto mais removidas
naquele processo. Nos anos de 1970 novos estudos, documentados, onde
começam a emergir elementos de que a Independência possa ter sido uma
guerra de libertação nacional, com conotações nacionalistas e populares, como
as que ocorreram na América Hispânica.
105
nacionalistas, em meio às transformações econômicas, onde a luta de classes
também se dava no sentido da colônia contra a metrópole, dos vassalos contra
o rei.
258. Nos anos de 1980 obras de Emília Viotti da Costa, Fernando Novais, Carlos
Guilherme Mota, irão aprofundar as teses de Caio Prado, localizando a
Independência como um processo que fez parte dos desdobramentos da crise
mundial do Antigo Regime europeu com todas as contradições desencadeadas
e inerentes a esse sistema, crise capaz de se afirmar uma nova classe
dirigente no Brasil, os grandes proprietários escravistas.
260. O debate sobre este momento crucial, que afetou as definições do que o Brasil
se tornou e também do que não se tornou, se torna mais vivo diante da
aproximação do bicentenário. Porém não se trata apenas de um resgate
histórico, de revisitar antigas e novas interpretações, embora esse exercício
seja necessário para irmos as raízes estruturais da formação da classe
dominante aristocrática rural, uma classe trabalhadora que em termos
históricos viveu muito mais tempo sob a precarização estrutural do trabalho,
sob a coerção e repressão, um estado subalterno na geopolítica mundial,
exportador de commodities e importador de manufatura na divisão internacional
de trabalho.
106
263. Por isso, trata-se da refundação nacional, trata-se de enfrentar os problemas
estruturais por suas raízes, trata-se de enfrentar esse modo de ordenar a
sociedade contra uma massa trabalhadora explorada e humilhada. Trata-se de
refundação nacional, porque só o poderá ser, através de um Projeto Popular,
construído e defendido pelo seu próprio povo que ao refundar seu país,
refundará a si próprio, acertando as contas com o passado e assumindo a
direção de seu futuro.
Comemorar a continuação
Do domínio colonial
Pois quem gritou no Ipiranga
Era da família real
Diga ao povo que fico
para ficar tudo igual?
Se mexeu e reagiu
Pois quem ficou no poder
Foi somente a classe rica
Que só queria exercer
Os benefícios da independência
Para só ela crescer
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Mas a dependência continua
A outro país imperialista
Urgente a necessidade
De uma grande construção
De um projeto nosso
Para a reestruturação
Garantido ao nosso Povo
O direito a decisão.
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Ter todo esse país
E sua rica natureza
Os nossos rios e mares
nossa terra, nossos ares
Servindo bem ao povo
e não a classe burguesa
A Consulta Popular
Já está em mutirão
Para combinar as lutas
da nossa população
Compartilhando o caminho
Rumo a Revolução!
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