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TUTÓIA-MA, 2022

EDITOR-CHEFE
Geison Araujo Silva

| CONSELHO EDITORIAL
Ana Carla Barros Sobreira (Unicamp)
Bárbara Olímpia Ramos de Melo (UESPI)
Diógenes Cândido de Lima (UESB)
Jailson Almeida Conceição (UESPI)
José Roberto Alves Barbosa (UFERSA)
Joseane dos Santos do Espirito Santo (UFAL)
Julio Neves Pereira (UFBA)
Juscelino Nascimento (UFPI)
Lauro Gomes (UPF)
Letícia Carolina Pereira do Nascimento (UFPI)
Lucélia de Sousa Almeida (UFMA)
Maria Luisa Ortiz Alvarez (UnB)
Marcel Álvaro de Amorim (UFRJ)
Meire Oliveira Silva (UNIOESTE)
Miguel Ysrrael Ramírez Sánchez (México)
Rita de Cássia Souto Maior (UFAL)
Rosangela Nunes de Lima (IFAL)
Rosivaldo Gomes (UNIFAP/UFMS)
Silvio Nunes da Silva Júnior (UFAL)
Socorro Cláudia Tavares de Sousa (UFPB)
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Capa: Adobe Stock / Geison Araujo


Diagramação: Beatriz Maciel
Revisão: Autor

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P745
Silva, Luiz Carlos Rodrigues da
Poesias enviesadas pelos tempos e espaços. / Luiz Carlos Rodrigues
da Silva – Tutóia, MA: Diálogos, 2022.

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Modo de acesso: World Wide Web
ISBN 978-65-89932-69-7

1. Literatura Brasileira - Poesia. 2. Literatura Maranhense. 3.


Tempo. 4. Espaço. I. Silva, Luiz Carlos Rodrigues da. II. Título.

CDD B869

https://doi.org/10.52788/9786589932697

contato@editoradialogos.com
www.editoradialogos.com
SUMÁRIO

8 Apresentação
10 Curriculum Vitae
11 Destroços
12 Soneto da Alma
15 Rio Mearim
18 Volúpia
19 Simples Poema
20 Egresso Existencial
22 Corpo
23 Insanidade Pueril
25 Em busca do Amor
26 Poesia Dominical
28 Socorro
30 Decisão
31 Confissão
32 Saudade Frágil
34 Assimetria do Ver
35 Meu Pai
37 Profundidade
38 Grito Social
40 O Bandolim do Tempo
42 Estilhaços
43 Retornar
44 Enigma
45 Razão Inquisidora
46 Epidemia
48 Sempre que Chove
49 Amor no Espelho
50 Ego
51 Labirinto
52 Sandália Enrijecida
54 Sertões Poéticos
55 Vielas do Tempo
56 Margens das Dúvidas
57 O Espelho
58 Anamnese
59 Anamnese do Mapa de Barra do Corda
61 Cartografia do Amor
62 Liberdade
63 Infausto
64 Resposta
65 Combate
66 Desejo do Ser
67 Abster do Sentir
68 Corda Bamba
69 Insanidade Poética
70 Incógnitica (In)decifrável
71 Enviesado
72 Autorrevelação
73 Rabiscos
74 Esquinas do Meu Interior
75 Profundidade
76 Exílio Etéreo
77 Desencontro Carnal
78 Dor Temporal
79 Confusão Temporal/Ontológica
80 Poema Despedaçado
81 Final
82 Sobre o autor
APRESENTAÇÃO

Este livro traz poesias viscerais e instigantes


que fazem refletir sobre tempos e espaços envie-
sados poeticamente. Está encharcado de angústias,
contradições e perplexidades próprias da existên-
cia humana. Problematiza de forma poética o tem-
po veloz, implacável, dilacerante, já presente em
Metamorfose, meu segundo livro de poesia, porém
mais realista nas poesias deste livro, que emula a
pujança das temporalidades mediadas pelas diver-
sas temporalidades humanas.
As poesias estão distribuídas em diversas temá-
ticas – angústia, medo, receio, insegurança, alegria,
ontologia, decisão - que se confundem e se com-
pletam com os tempos e espaços trafegando com a
poesia , com uma linguagem cifrada por uma rea-
lidade asfixiante, que é a própria existência etérea.
Os versos procuram fazer uma apologia da
existência na perspectiva da possibilidade de amar
o tempo. Amar intensamente o espaço em que vivo,
que por meio da poesia faz cultivar um amor solitá-
rio e estéril, como em um poema despedaçado.

8/ POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Poesias enviesadas pelos tempos e espaços é um
livro cativante e complexo, que pode levar o leitor
a uma aventura pelo tempo a partir do lugar do seu
eu. Mas é imprescindível compreender que o poe-
ta fala sempre mediado por metáforas e símbolos.
Será aconselhável e útil que o leitor mergulhe nesse
código poético para se deleitar com a confissão do
poeta em sua profundidade.
Trata-se de poesias enviesadas pelos tempos e
espaços!

Barra do Corda-MA, 01 de outubro de 2022


Luiz Carlos Rodrigues da Silva

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 9


CURRICULUM VITAE

Um poema e o esboço de um novo livro


enviesado pelo tempo e espaço
Estão expostos na minha mente em ebulição
Desnudando as minhas inverdades ancoradas
pelo gélido egoísmo.
Algumas palavras são sóbrias
Outras, plenas de insanidade e intoxicadas pelas
agruras da melancolia.
Mas elas estão presentes, as palavras.
Em alguns momentos são meramente bagunça
Na minha mente, nas minhas ideias, no meu
corpo eviscerado
Nenhum poema para ser lido
Pois permaneço tácito
Sóbrio, alinhado não sei a que e a quem!

10 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


DESTROÇOS

O cansaço provoca dor


E traz insatisfação
Tira a luminosidade dos olhos
Deixando tudo opaco e tênue na forma disforme

O barco da existência flutua


Em um sonho naufragado
Gerando o receio de um afogamento
Ou provocando morte por arrependimento
É nostálgico, mesmo por um breve tempo
Voraz como um tormento
A posteriori, vem por dentro
Inexato e ardente

Destroço profundo
Sentimento oriundo
Das efemérides frívolas

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 11


SONETO DE ANO NOVO

Inicia-se mais um ano na existência


incrivelmente percorrida
Vem com um ímpeto novo e com áurea de adora
Para vislumbrar algo bem parecido
com uma nova aurora
Bela, fulgurante, intrépida e com espaço para ser
apetecida.

Reaparece neste ano com uma certa


desconfiança sonora
E neste vácuo de tempo, com alma ferida
Mas é necessário proteger a gênese que gera a vida
E que faz retornar o aroma da esperança, agora.

Ano novo imerso em sonho e desejo de plenitude


Transformando o caos e a dor em nuances de beleza
E em acenos sinceros que fazem a vida ser virtude.

12 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Vivamos o ano novo fazendo malabarismo na
corda da certeza
Vivamos a temporalidade da paixão insólita da
vida em frenesi
Vivamos a vida em intensa sintonia com a frágil e
doce natureza.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 13


SONETO DA ALMA

Burilar na tua alma como burilo na galeria.


Confesso que às vezes, talvez, desconforto sinto.
Mas não deixo de acalentar o meu íntimo faminto
Que vai sorrateiramente fazendo uma “espia’!

Trêmula e desesperada, a minha mão fica fria


Com medo de tocar no pérfido absinto
E transitar em um terrível labirinto
E provocar uma estranha ventania.

Surgiu uma ventania fria e rouca


Desvairada, perdida, insana, tresloucada e louca.
Abalando a tua alma e gritando com uma touca.

Libertaram forças supremas.


Mas foram novamente presas em horrendas algemas
Trazendo à luz almas fortes como gemas.

14 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


RIO MEARIM

Inicio a minha jornada de 930 quilômetros bem


amena
Envolto em uma atmosfera sonolenta
Porém, decidido e resiliente
Para atingir o meu maior sonho
Que é na baía de São Marcos desaguar.

Tenho ciência que sou um utópico


Pois nasci na Serra da Menina
Adquirindo volume d’água, fui singrando montes
e serras
E me distanciando do meu nascedouro
Para no Atlântico, íntegro chegar.

Outrora, já fui mais caudaloso


Hoje sou violentado por ações antrópicas
Foram tantas que chegam a causar espanto
Não sou respeitado na minha maturidade
Mas trago no meu âmago a singeleza
Stop. Chega de me agredir.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 15


Volto o meu pensamento para onde nasci
Para reabastecer as minhas esperanças
O som agudo do meu sussurrar
Provocando uma miscelânea de gozo e de
decoro musical
No ato de desbravar os seixos leito abaixo
E destemido vou rolando, rolando e rolando.

Neste percurso não paro nem para dormir


Vou suscitando júbilo para uns
Para outros trago lágrimas
Mas tenho as minhas expertises
Assim, não se precipite
Quando de mim se aproximar.

Cuidem das minhas nascentes


Preciso terminar a minha jornada
Iniciada na Formosa da Serra Negra
Passando pela Princesa do Sertão
Terra de Melo Uchôa
Para finalmente o oceano, poder abraçar.
Contemplem todos e todas,

16 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


por alguns momentos
As minhas águas caudalosas e impetuosas
Não estou me vingando
Não tenho a intenção de provocar tristezas
Só desejo um dia poder voltar ao meu percurso
original
E continuar a minha jornada serenamente em
busca do mar.

Faço um pedido a todos e a todas,


como ato de singeleza
Respeitem a natureza com suas belezas
Também teçam sentimentos de respeito a mim
Que sou o Rio Mearim
E formo a maior bacia hidrográfica do Maranhão
E também flerto constantemente com o mar.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 17


VOLÚPIA

Volúpia extrema, posso tocar o teu rosto.


Deste toque me vem
Nas extremidades dos meus dedos,
a essência da intensidade
Que faço confusão com volúpia
Deixando-me encantado com as tuas curvas
De forma imensurável e inaudita
Volúpia extrema,
posso enroscar-me na tua boca
Alavancando labaredas de fogo
Imersas no período do cio,
mas de forma tão pueril
A saudade de mim vai me consumindo
Volúpia extrema, sem identidade,
toco em mim
Antes, marcado pela memória
Agora tragado por um momento
que não consigo lembrar.
Volúpia extrema que não toca
a extremidade do prazer.

18 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


SIMPLES POEMA

Ouso acreditar
Que todos os poemas provocam júbilo!
Também provocam o amor
Seja pela rima,
Seja pelo ritmo,
Seja pelo ímpeto das palavras
ou simplesmente por alguém
ou por alguma coisa
Que transitava aleatoriamente
Naquele lugar
Naquela hora inusitada!
Mas a vida despretensiosa
E desajeitada
Transformou tudo em palavra
Que se fez poesia!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 19


EGRESSO EXISTENCIAL

Sou um egresso inveterado.


Ando fugindo de muitas realidades
Fechando-me em mim
Sim, Fugindo de mim mesmo!

Ando cansado e cansando a existência!


Como escapar deste lugar insólito?
Como fugir do mesmo ser em gestação?
O ato de cansar é inescapável!

Meu ser inquieto procura-me


Mas ando sem orientação geográfica e magnética
Dificultando o processo do encontro
E talvez nunca me encontre.

Ser que se encontra em prisão domiciliar


Negando um ser que não é ser.
Viverei como um eterno egresso
Mas sem perder o liame de algo no passado!

20 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


RESTOS DA TARDE DE UMA MANHÃ

Levantei-me hoje muito tarde... algo insólito!


O Sol aquecia violentamente os telhados das
casas vizinhas.
Tentei amarrar os cadarços do velho sapato
Mas senti que a velhice chegara de forma
endoscópica.

Não tive forças suficientes para preparar o café


Nem para contemplar a paisagem matinal,
já era tarde!
Fiz os meus cumprimentos ao mundo de forma
contemplativa
Desta vez com a janela semiaberta!

Hoje também não terá a leitura do jornal


Vai ficar amarelado na porta da casa.
O velho terno embotado vai ficar inerte na cama.

Restos de um dia insólito em um amanhecer


tardio.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 21


CORPO

Seu corpo é estonteante


Como réstias de calor no vácuo do meu ser.

Seu perfume se alastra no meu espaço


Deixando-me confuso e imaginado coisas.

Seus lábios são carnudos


Gerando no beijo um prazer delirante.

Almejo que seu corpo seja eterno


Como eterno é o seu prazer.

Também busco aquele júbilo


Uma alegria na melodia, no verso, no canto...
Que, intangível, almeja
Antes que a morte chegue e leve seu corpo
para o além!

22 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


INSANIDADE PUERIL

No dia de amanhã...
Quero uma dose quádrupla de insanidade.
De preferência, sem gelo e sem limão
Para degustar em minha companhia solitária!

Reitero: uma dose quádrupla.


Sem gelo e sem limão.
Desejo ser servido na mesa de sempre.
Ela tem acompanhado os meus momentos insanos!

Almejo que o líquido desça até aos meus pés


trêmulos
Utilizando a minha garganta ferida
Pelos ecos sem som
E sem ouvidos para ouvir uma insanidade louca!

E se o líquido subir para o meu cérebro?


Aí está alojado o cerne da minha insanidade!
Devo perder a noção da minha loucura!
Ou até mesmo fundir sanidade com a insanidade.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 23


Começo a perceber que devo suspender a dose
quádrupla
E ficar sentadinho na minha cadeira
Saboreando o que resta da minha sanidade
Vivenciando intensamente a mais insana vida!

24 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


EM BUSCA DO AMOR

Tenho andado pelos céus


Navegado em altos mares
Conversei com poetas
Vislumbrei realezas
Tentando descobrir o que é o amor.

Brinquei com as crianças


Contemplei os teus olhos
Segurei as tuas mãos ressequidas pelo tempo
Fiquei extasiado com a flor desabrochando!

Deixei ser acariciado pelas tuas mãos de seda


Senti a dor de um espinho na carne do miocárdio.
Senti a vida suavemente tocando no meu rosto
Encontrei a beleza do amor
Na suscetibilidade do encontro com o mistério do
amor!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 25


POESIA DOMINICAL

As alegrias cotidianas
Cabem perfeitamente na minha poesia.
As tentativas de superar o stress imposto pela vida
frenética
São suavizadas na escrita desta poesia.
Também posso colocar nesta poesia:
As minhas angústias
Os meus sonhos mais tresloucados
A minha insanidade não revelada
A minha pele desfigurada pelo tempo
O sentimento mais intrépido pela vida
E o medo da morte repentina.

Na minha poesia posso serenamente colocar


As minhas mortes do dia a dia
O ato de renascer ferozmente
A detestável covardia do desamor
Em seus protocolos heterodoxos
Fingindo contemplar o sol
E cegando a luz da justiça.

26 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Na minha poesia
Posso colocar
Tantas coisas
E coisa nenhuma.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 27


SOCORRO

Ando preocupado com muitas coisas ultimamente.


Com a onda negacionista propagada por criaturas
acéfalas.
Com a indiferença que dilacera a dignidade do ser
humano.
Com os políticos que roubam a consciência dos
mais humildes com fake news.

Tenho receio de perder a noção de humanidade


em meio à pós-pandemia.
De não praticar a empatia.
De abandonar o barco da utopia.
De não sentir mais nada! Nem a revolta!

Por favor, alguém me estenda a mão.


A mão do sonho que continua em meio às
intempéries da História.
Por favor, suplico uma simples emoção!
Qualquer coisa que me faça acreditar na
humanidade.

28 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Que faça esta poesia vibrar de sentimentos e de
resistência.
E valer a pena ser poeta e escrever poesia!

Auspico caminhar em alguma rua que faça sentido


caminhar,
Talvez mesmo em um cruzamento insólito,
Um acostamento, uma encruzilhada,
Mas que faça acontecer o encontro da utopia com
novos rumos!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 29


DECISÃO

No dia de hoje resolvi tomar uma decisão:


Encarar e enfrentar
As minhas feridas
As minhas fragilidades e limitações.

No dia de hoje decidi:


Viver intensamente a efemeridade da existência
Expulsar as dores presentes no meu coração
E que sufocavam o meu peito há muito tempo!

Simplesmente decidi:
Sonhar em meio às minhas intempéries da vida
Sorrir com as minhas vidas!

Quando me dei conta, subitamente


Estava florescendo no âmago das minhas utopias
diárias!

30 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


CONFISSÃO

Confesso que ando desconfiado com “tude”


Altitude
Longitude
Latitude

Amplitude
Desvirtude
Finitude
Ilicitude

Decrepitude
Inquietude
Vicissitude

Tem ainda outros “tudes”


Porém, tenho apreço por perto

Bem perto

Assim, aperto!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 31


SAUDADE FRÁGIL

Lembrar-me de você dói tanto


Não consigo escapar desta dor
Nem espantar esse mal que sufoca!
Mesmo assim ainda vou escrever
Um verso sem rima, mesmo banal
Que fala em você
Recorda você
É recorrente entre nós!

Sobrou apenas réstias de lembranças do nosso


(des)encontro
Que fez nascer a escrita de uma crônica de amor
Sem vírgula, sem ponto de exclamação e sem
ponto final
Retrato de cores sem cor
Miscelânea de saudades frívolas
Fragilizadas pelo tempo
Mera crônica que não será publicada em nada.

32 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Ainda sofro de saudade
Mesmo pensando que tudo já passou
É melhor esquecer!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 33


ASSIMETRIA DO VER

Gostaria de poder fazer uma magia:


Era te ver de forma assimétrica
E eu te vi
Na imperfeição da beleza.

Ao te ver de silhueta
Como no sinal de Marilyn Monroe
E na beleza de Vinicius de Moraes
Me doeu profundamente
E como doeu!

Fui acometido de forma absurda


Por uma ansiedade frenética
Ao perceber
Que não possuímos mais
A reciprocidade do código do olhar!

34 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


MEU PAI

É acalentador rever no caleidoscópio da minha


mente
A imagem forte e meiga do meu pai, Sebastião
Rodrigues da Silva,
Fazendo tremer as lembranças da vida
No assoalho da minha existência.

É reconfortante recordar o seu jeito simples de


viver
Sem tantos conhecimentos acadêmicos
Mas cheio de sabedoria da vida
Pleno do valor dado ao trabalho com dignidade.

Hoje é lembrança que ficou


Viva no meu coração
E impregnou a minha conduta de filho
Em meio à sua ausência física.

Gostaria de lhe abraçar novamente e dizer


suavemente:

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 35


Te amo!
Mas tenho a convicção que o pai não morre,
Ele parte na frente
Pra preparar o caminho
E continuar protegendo a sua prole!

Meu pai...

36 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


PROFUNDIDADE

Sou
Um abismo desprovido de profundidade
Também não tenho parâmetros geográficos
Nem dimensões metafisicas!

Tenho
Um vazio que nada preenche
Um vazio de mim mesmo
Esvaziado pelo tempo e pelos vazios existenciais.

Carrego
Nos ombros metafóricos
Pecados não revelados
Virtudes não reconhecidas!

Vou tentando
Empurrar para o vazio
O bom e o ruim
Para preencher alguma coisa na vácuo!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 37


GRITO SOCIAL

Essa nação vive só do coração.


Sem razão, sem olhos e nem ouvidos críticos e
Atávico e indiferente ao cidadão e à cidadã
Que sofre desmandos e desmaios cotidianamente.

Quantas mortes físicas e emocionais sem solução


– Marielle Franco!
Manchas de sangue em todos os espaços
Quantos destinos traçados nos bastidores da
injustiça
Disfarçadas de boas intenções e pela volúpia do
poder
Com extrema insensatez nas sombras das ações
pensadas com maestria.

Jeitinho brasileiro que tem gerado morte


Naturalizado a corrupção
Transformando gente ética em interesseiro
Banalizando o certo e o errado.
Esse maldito jeitinho brasileiro

38 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Que tanto incomoda os que sonham este país
Mais justo e mais equânime.

Até quando seremos apenas futebol, samba e


novela
Ou simplesmente remela
Ou um barco sem leme
Ou um prisioneiro em uma cela injusta.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 39


O BANDOLIM DO TEMPO

Sozinho no tempo e perambulando no espaço


Olhando o bandolim da existência
Vou degustando cada hora que passa.

Hora de intenso amor, amiga.


Quando o teu semblante
Toca no meu
A tira gosto.

Se consentires
Vamos demorar mais um pouco
Neste divã improvisado
Em plena madrugada.

Nada deve ficar obscuro


Ao longo da noite intrépida e paciente.
E a salamandra exótica como testemunha
Tua figura. Tua guia.

40 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Vou ficando encantado
Desafiando o encanto.

Como o bandolim do tempo


Desconfiando!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 41


ESTILHAÇOS

Vou pesando a vida


Vou mensurando o tempo
Vou soprando o vento
Vou abrindo trincheiras.

O vento leve, leve e leve


O meu eu perdido e sacudido
O olfato desafiado pelo odor indefinido
O ranger dos dentes na presa.

Derretido
Detido
Desmentido
Dolorido

Estou enojado
Estou vilipendiado

Como o bêbado na esquina!

42 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


RETORNAR

A intenção de retornar para os teus braços


Vem me importunando continuamente.
Reencontrar-te na casa que nunca deixaste
Porque sabias da possibilidade do meu retorno.

Meu coração palpita em meio a esse turbilhão de


dúvidas
Como se estivesse embriagado do vinho do amor!
Retornar ou ir para mais longe
Nas mesmas ruas que tanto andaste.

Que loucura seria retornar


Sabendo que me espera naquele mesmo lugar!
Meu coração suplica
Pelos sons que rugem do mar em fúria.

Estou partindo
Enfermo e indeciso.
Lentamente na floresta
Que sussurra: retorne!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 43


ENIGMA

Não sei por onde anda a minha alma


Só sei que quero – se for possível – um pouco de
calma.

Contemplo – mesmo em tempo de Covid 19 – os


baluartes
Mas a minha grande paixão é a arte

Fico andando trôpego nos tênues passos do


andarilho
Para reprogramar o meu andar em novos trilhos

Vou reinventando a vida – em quarentena – a cada


légua
Pois não posso desistir e nem dá trégua

Vou me revelando como enigma no silêncio


E aos poucos me diluindo em um mar imenso.

44 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


RAZÃO INQUISIDORA

Ao terminar de escrever o meu poema


Emergiu a minha razão
Emitindo o seguinte protocolo:
“onde procuras a inspiração, poeta? “

Reli o poema já pronto


Olhei de forma fixa e incomodado para a minha
razão inquisidora
E respondi meio perdido:
Poesia em tempo de Covid-19 é algo surreal.

Como algo entre as pernas enrijecidas


Trazendo à mostra suas entranhas.
Repentinamente foi-se embora a inquisidora
Parecendo que tinha certa alergia à metáforas
surreais.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 45


EPIDEMIA

Almejo que a felicidade se alastre por todos os


continentes
Quero que as utopias se propaguem pela face da
terra
Em meio a um surto de esperança.

Almejo o declínio exponencial da depressão


Quero o decréscimo do suicídio
A demolição do sentimento de infortúnio.

Quero a descoberta da vacina que detenha o


coronavírus
Este vírus traiçoeiro
E que venha novamente o contágio da vida plena.

Almejo a extinção da exploração


Quero extirpar a anemia da indiferença
E afogar a agonia da desesperança.

46 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Almejo o tráfico da poesia que enaltece a vida
Que volte o abraço apertado em quem amamos
Quero novamente a epidemia do encontro
Quero – simplesmente – andar pelas ruas da
minha cidade tranquilamente.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 47


SEMPRE QUE CHOVE

Sempre que fica nublado


Sempre que chove
Sempre vem a nostalgia
De um tempo insólito
Que tudo parece fazer tanto tempo...
Em um tempo perdido intencionalmente
E o poema que escrevo por acaso
Tem no texto a data de ontem.

48 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


AMOR NO ESPELHO

Se sou amado intensamente e ternamente


Mais amado viverei no universo do meu ser
E mais destemido estarei ao lado do amor
correspondido.

Paradoxalmente, se não sou amado,


Como poderei continuar a existir?
Dia após dia...
Neste grande mundo de tristeza?

Só me resta – para estar (in)seguro- esquecer


também
Mas como esquecer o teu ser em meu ser?
Começo a tremer na escuridão da tua ausência!

Contemplo o espelho onde nos olhávamos até


então:
Só aparece um reflexo ofuscado
Não tem mais o seu reflexo.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 49


EGO

Essa minha parte freudiana ou lacaniana -não sei


Que nego compartilhar contigo
No quarto de espera
Na cama absorta de toque poético

Na cama sem lençol


No status de um corpo desfigurado
Pela legalidade de um paraíso ilegal
Que vai se configurando com a lama

Essa minha parte libidinosa freudiana

É violentamente cerceada
No interior do meu outro
Eu – rebuscado em uma obra de arte

Vai se diluindo em uma partitura

50 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


LABIRINTO

Hoje despertei transitando em um


labirinto
De questionamentos sobre tudo e todos.
Despejando um rio intermitente
de perguntas agudas
sabendo que vai desaguar
em um delta
De angústias e (in)certezas

Saudade
Sinceridade
Docilidade
Versatilidade

Vislumbrei tua
formosura
Diluída em uma
Taça de amargor.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 51


SANDÁLIA ENRIJECIDA

Aquela sandália esquecida embaixo da cama,


Cansada, envelhecida pelo tempo e tácita,
Não tem consciência que seu dono está prestes a
morrer,
Assim fica o tempo todo inerte.

Esta atitude não lhe exige muito ou quase nada,


Não se escuta ladainha de reclamação ou soluços
abafados,
Olhando para um lugar vazio da casa dia após dia,
O olhar mais intenso é para a porta escancarada e
com breves chiados.

Esta cena se repete e vai se repetir semana após


semana,
Com uma lenta e repetida agonia como
companhia,
Até que chegue o sono eterno na surdina.

52 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


A sandália vai continuar parada e enrijecida,
Sem poder narrar o que ela presenciou
silenciosamente,
Sem poder tirar do anonimato a história do seu
dono.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 53


SERTÕES POÉTICOS

Sentado silenciosamente na orla


E olhando as embaúbas solitárias
Sendo esgarçadas constantemente pelo vento
Me deixa o tempo todo inerte.

O mar e seus incontáveis barcos


Singrando as rotas aquáticas
Assume uma dimensão particular
Na paisagem que já é encantadora.

Sentado na orla
Vejo um barco que lança suas âncoras na
profundidade
Na exata profundidade das águas
Aproveito para lançar as minhas memórias.

54 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


VIELAS DO TEMPO

Vielas do passado...
Amo caminhar mentalmente pelo tempo que passou.
Teu refúgio me agasalha. Teu ímpeto me refaz.
Teu liquido amniótico me recompõe.
A miscelânea das vielas passadas e presentes
Vai reescrevendo um mapa com novas sendas
E tecendo um novo caminhar.

Amo contemplar a réstia de luz que vem ao presente


Redesenhando uma nova silhueta sem pressa
E se redescobrindo no caminhar.
Amo a temporalidade que avança e irrompe
Na trincheira da vida fortalecida
E na sutileza do refazer
Que viceja nos becos do passado
E se contorce nas vielas do tempo presente.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 55


MARGEM DAS DÚVIDAS

Vou impregnando o meu tempo atemporal


Com a intencionalidade moral e fachos duvidosos
do devir.
Vou encarando as mulheres e os homens do meu
espaço
E desvencilhando do ser e do estar um hiato no
vácuo!
Seja na rua ou ruela,
Seja na casa ou rancho,
Trancando a porta e abrindo o ferrolho
Da janela que reflete no espelho do canto.

Vou margeando as margens das dúvidas


E deixando o silêncio ausente
Nas cartas não lidas
Devido ao inverno chuvoso
Que dizem e emudecem ao mesmo tempo
Ressoando nas frendas soterradas das vozes.

56 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


O ESPELHO

Estou envelhecendo apegado ao tempo e ao vento


E diante do espelho vem à mostra
Realidade e ficção do que sou eu.

O espelho revela sutilmente os “outros “de mim


Com um fingimento escancarado da dúbia imagem
Deixando-me assustado, sozinho, perplexo,
Com as imagens refletidas em vários ângulos.

Será tudo isso a idade refletida no peso da luz tênue


do tempo?
Não conseguimos nos olhar a partir da nossa origem:
reflexos opacos!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 57


ANAMNESE

Quem me conheceu em tempos passados e alhures


Não me conhece mais, agora
Sou resultado de pedaços quebrados
ao sabor do tempo
Que foram sendo realocados em tempos diversos
e lugares inusitados
Reassumindo uma identidade de Homo Habilis.

Pra se assumir como poeta que hoje escreve


Com punhos cerrados sobre tudo e sobre nada
E de existir da forma que quer e deseja.

58 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


ANAMNESE DO MAPA DE BARRA DO
CORDA

Exploro o mapa de Barra do Corda


Como quem faz a anamnese mental
De um paciente no divã do psicanalista.

Observo a sutileza do tempo ao esculpir


Nas ruas da cidade
Características próprias e surreais.

Tantas ruas que presenciaram juras de amor


Tantas ruas que viram o que não pode ser revelado.
Casas que foram destruídas em nome do progresso
Destruindo também uma parte do passado
de uma cidade
Que um dia foi encantada e sonhada!

Ela continua sendo cortejada, mas também violentada:


Na degradação violenta dos seus rios Corda e Mearim
Na ausência de politicas públicas coerentes com o seu
povo

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 59


Na ausência de uma valorização do seu patrimônio
cultural e histórico
Que vai desfigurando o seu passado brilhante e
imponente!

O que faz esta Urbe tão especial?


Não tenho resposta! O que acontece entre o paciente
e o psicanalista
Não pode ser revelado aos quatro ventos do mundo
Mas respinga um pouco de magia
Naqueles e naquelas que ainda resistem por aqui!

60 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


CARTOGRAFIA DO AMOR

O amor é cartografado
(Em um oceano a céu aberto...)
Delimitando o falo
Que dilacera e dispersa
Envolto em agasalhos
E intempéries
Simbólicas ou não

(rota delineada nos meridianos e paralelos)


das naus não identificadas
em um mar aberto
singrando um caminho rasurado em hipóteses
em uma gama de sensações e sentimentos.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 61


LIBERDADE

Utopicamente imaginei
que a liberdade era oriunda da longevidade
Com o passar do tempo passei a imaginar
Que a liberdade era fruto da temporalidade
em um devaneio existencial imaginei
que a liberdade está agregada ao dinheiro
em desvario de grandeza acreditei
Que a liberdade vinha com a força e o poder
Depois a vida e os fatos da vida me fizeram perceber
Que a liberdade não vem de imaginação, seja ela qual
for
Também a liberdade não é um fato acontecido
Descobri que a liberdade é ir ao encontro daquilo
que me faz falta
Libertando-me do que tenho
Vislumbrei que a liberdade é possível

62 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


INFAUSTO

Deixar a cabeça em algum lugar desconhecido


e então tentar encontrá-la tenazmente
Nos lugares recentemente frequentados
Ou nos lugares não frequentados
talvez esteja escondida dentro da touca de banho do
dia anterior
ou – quem sabe – sobre o travesseiro da cama
desajeitada
ou também pode estar entre os joelhos enrijecidos
pelo tempo
Ou entre as mãos calejadas pelo sofrimento
E se estiver na casa demolida
De uma infância intensa
Sobre suas pernas descobertas
frias
ainda ...

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 63


RESPOSTA

A libido, em ti,
Não exclui o lado ruim de mim.

O ruim, no teu exalado desatino,


Não exclui parcialmente o meu lado clandestino.

E assim vou vivendo, enfim,


oscilando entre a libido, o tino e o ruim da
resposta.

A libido, em mim,
Sobre lençóis desajeitados
Inertes
Mirabolantes.

64 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


COMBATE

Mesmo em um dia bastante frio,


teimosamente o sol nasce
inexoravelmente a vida se apresenta
dividida em faces e interfaces
em um campo minado as plantas
também aparecem
mostrando o lugar para pisar e
escapar da detonação.

Num dia ensolarado também se combate


a avenida foi projetada para servir em partes
de forma admirável o sol no outro lado
do mundo, ilumina
mas no lado do mundo de cá a ausência de luz
domina.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 65


DESEJO DO SER

Almejo o desejável
o que não ainda não é
o que talvez nunca estará
a inviabilidade do ser
o impossível do desejar

Não desejo
o que já foi e é
o perecível pelo tempo
o que tem prazo de validade vencido
o que é visível e plausível

almejo fortemente
o que ainda será
atiçado pela volúpia do momento
o não praticável pela singularidade
o incrível ser no fazer do tempo

66 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


ABSTER DO SENTIR

Apesar de tudo, não me esqueço


Porém, não consigo me lembrar

Insisto em não querer esquecer-me


também insisto em não me lembrar

Acreditas?
quero simplesmente abster-me de sentir

Sim
abster-me de sentir
somente isso

isso é comigo
nada contigo.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 67


CORDA BAMBA

Existe o passado
Existe o presente
Existe a projeção do futuro

Entre as temporalidades
Existe um tênue
Liame
Uma espécie de fio
Que procura atar
A também
Tênue
Relação entre sonho e memória.

68 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


INSANIDADE POÉTICA

Contemplo-me no vácuo
E desconheço quem sou.
Estou insano, é clarividente,
Mas que insanidade é esta?

É uma dimensão do ser poeta?


É uma imanência do ethos desvarado?
Talvez seja uma incompletude
Da ideia de insanidade?

Não sei, mas sinto-me inerte


Na margem de algo inusitado.
Nasci meio tênue
Na relação entre sonho e memória.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 69


INGÓGNITA (IN)DECIFRÁVEL

Quem sou?
Quem não sou?
Quem serei e não sou?
É melhor nem tentar responder!
Eu sou uma incógnita plena de dúvidas.
Uma hora quero, tal hora não quero.
Tenho cortejado a incógnita que sou eu.
Apenas sou o que não serei.
Humano em exponencial humano.
Imperfeito em um universo perfeito.
Incógnita sem possibilidade de ser decifrado!

70 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


ENVIESADO

Em cada sacada
Um caso
Um vaso
Um desavisado
Um descamisado
Um desvairado
Um complicado
Um esclerosado
Um atrasado
Um coisado
Um coitado
Um brisado
Um assassinado
Um descompromissado
Em um país dopado.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 71


AUTORREVELAÇÃO

Fazendo o meu autorretrato


Utilizando a lapiseira como cinzel
Traço risco a risco
Singrando o que consigo descrever na
autorrevelação.

Às vezes me esculpo como ingênuo


Às vezes me apercebo como sábio
Ora emerge lembranças fictícias
Resvalando na minha redesenhada semelhança.

Afinal, o que estou querendo encontrar?


Realidades não existentes?
Sonhos em profusão e ebulição?
Em um ser opaco e imaterial?

Cinzel singrando e arranhando


Autorrelevando um rosto infante
E produzindo o que não esperava
No resultado final da lida que busco em
meu ser singrado!

72 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


RABISCOS

Tens praticado atitudes ariscas


Colocando a tua vida em risco
Escrevendo poesias com riscos
Fazendo com que me risca
E não me arrisco
Riscar-te dos meus rabiscos
Escritos em meu coração às margens do abismo.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 73


ESQUINAS DO MEU INTERIOR

Nas esquinas do meu interior


Esquecidas em meio ao tempo
Vou correndo
Com meus caprichos

No meu interior
Permanecem vivos e intensos
Com certa violência
Uivando em meio aos sons diários

Nas esquinas do meu interior


Sem medo e receio
Mesmo sozinho
Nunca estou só – existem outras esquinas para
transitar.

74 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


PROFUNDIDADE

Sou
Um abismo desprovido de profundidade
Também não tenho parâmetros geográficos
Nem dimensões metafisicas!

Tenho
Um vazio que nada preenche
Um vazio de mim mesmo
Esvaziado pelo tempo e pelos vazios existenciais.

Carrego
Nos ombros metafóricos
Pecados não revelados
Virtudes não reconhecidas!

Vou tentando
Empurrara para o vazio
O bom e o ruim
Para preencher alguma coisa no vácuo!

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 75


EXÍLIO ETÉREO

Noite imersa na insônia


Tateando o travesseiro inerte
Vazio de estupidez e silêncio mortal
Causando a insensatez de clamar
Por alguém ausente.

Vem o devaneio de imaginar


Uma mão distante
Da vida repensada
Na manhã cansada
Dizendo boa noite
A ninguém .

Exilio etéreo na insensatez!

76 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


DESENCONTRO CARNAL

A sua lembrança me persegue há séculos:


Está nos cantos da casa
Como algo assombrado
Causando arrepio intenso
E impulsionando-me a escrever um verso banal e
sem sentido
Para lembrar de você
Na casa onde fizemos o que não devíamos fazer:
O desencontro carnal em corpos etéreos.

Sobrou tantos pedaços de tempo


Escrito em um soneto de amor
Sem regra gramatical
Retratado por um pincel sem nexo num quadro
invisível
E sem inspiração
De nostalgias fúteis
Fazendo recordar fragilidades
Em papeis amarelados pelo nosso desencontro.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 77


DOR TEMPORAL

Vou amando o tempo que já se foi


Vou compreendendo o tempo que já não existe
E fazendo malabarismo sentimental com as dores
entre ambos!

O equívoco temporal é dialético:


O ontem se foi,
O hoje é imprevisível
O amanhã, sei lá –
A dor ficou saudosista e voou
E agora estou só no vazio!

78 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


CONFUSÃO TEMPORAL/ONTOLÓGICA

Aqui estou eu com saudade de alguma coisa


Em um passado não distante
Presente em um presente longínquo
Entrelaçado e enroscado no futuro
Na ilógica possibilidade do eu no devir.

Aqui estou eu com esperança no presente


Insano do passado ausente
A lógica do entretanto fracionado
Pois o presente sempre está flertando o futuro.

Afinal, onde está o passado?


E onde eu estou?
No futuro que não se avizinha?
Ou no presente que sempre escapole?

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 79


POEMA DESPEÇADO

À guisa de inefável despedaço


Fostes, ó poema, um pedaço de traço
Enroscado de forma vagarosa no destroço
E indiferente ao meu fausto em pedaço.

Poema que exala um coração exausto


E que não consegue revelar o holocausto
De um insano constrangido hausto
De um eco a peito aberto em seu encausto.

Ah! Não entendestes o meu poema


Diluído em um pouco de blasfêmia
Afigurado em um fonema
Para fugir em frangalhos da algema.

80 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


FINAL

Tergiversando sobre o inevitável final


Para fazer – enquanto há tempo – alguma coisa
que seja ideal
Independentemente do que seja o final
Vou realizar algo que seja surreal.

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 81


LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA nasceu
em Caxias, Maranhão, no dia 18 de maio de 1962
e reside em Barra do Corda, Maranhão. É casado
com Natividade Brasil da Silva e tem quatro filhos:
Adriana, Lázzare, André e Stéfanni. Avô de Victor,
Vinicius Luiz e Luna Ávila.
É graduado em História pela Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA) e em Filosofia pela
Faculdade Evangélica do Meio-Norte (FAEME).
Possui Pós-Graduação Latu Sensu em Docência no
Ensino Superior pela Universidade Cândido Mendes/
RJ; em Psicopedagogia Clínico-Institucional pela
FAEME/MA; em Mídias na Educação pela UFMA e
MBA em Gestão Escolar pelo IBMEC/RJ. Mestre em

82 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS


Ciências da Educação pela Universidad Politécnica
y Artística del Paraguay (UPAP). Mestre em Ensino
de História pela Universidade Federal do Tocantins
(UFT) e doutorando em Ciências da Educação pela
Universidad Autónoma de Asunción (UAA).
Como pesquisador, escritor e poeta é membro
do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Tecnologias
Digitais na Educação ( GEP-TDE)-UFMA, do Grupo
de Pesquisa em Humanidades Hominibus (IFMA),
Barra do Corda e do Projeto de Pesquisa: História
Medieval: textos e intertextualidades( UFNT),
campus de Araguaína/TO. É membro da Academia
Barra-cordense de Letras (ABCL), da Associação
Nacional de Escritores (ANE), da União Brasileira de
Escritores (UBE), da National Geographic Society
desde 2006, da Associação Nacional de História
(ANPUH), da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência ( SBPC), da Associação Nacional de Pós-
graduação em Filosofia (ANPOF), da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação (ANPED), da Associação Nacional de
Planetários (ABP) e da Associação Brasileira de
Geografia (ABG).

LUIZ CARLOS RODRIGUES DA SILVA / 83


Ingressou na carreira do magistério em 1980,
no Colégio Nossa Senhora de Fátima de Barra do
Corda, onde lecionou durante vinte e um anos. No
magistério público das redes Estadual e Municipal
foi ano de 2002, através de concurso público.
Exerceu o cargo de coordenador pedagógico dos
centros de ensino Wolney Milhomem e Arlindo
Ferreira de Lucena, de professor formador da área
de Identidade, Sociedade e Cultura do Programa
de Formação de Professores em exercício –
PROFORMAÇÃO, de Coordenador do Polo da
Universidade Aberta do Brasil (UAB) e Coordenador
do Departamento de Inovação da SEMED.
Como pesquisador, já escreveu e publicou
em revistas especializadas e em coletâneas
vários artigos científicos no campo da História
e da Educação. Publicou o livro Reminiscências
Filopoéticas ( São Paulo: Editora Recanto das
Letras, 2016) e Reflexões filosóficas em Tempos de
Crise ( Tutoia: Editora Diálogos, 2021). Coordena
também o Projeto Whatsppoesia

84 / POESIAS ENVIESADAS PELOS TEMPOS E ESPAÇOS

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