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A OBRA DE ANTONIO JOSÉ PONTE: TEORIA E PRÁXIS DE UMA RUINOLOGIA

Michelle Azambuja A. Mendes (UFRJ)

Este trabalho pretende apresentar um esboço da pesquisa que realizo sobre a obra
do escritor cubano Antonio José Ponte, especificamente no estudo de dois livros do escritor,
Un nuevo arte de hacer ruínas (2005) e La fiesta vigilada (2007), nos quais Ponte
desenvolve toda uma poética da ruína, em correspondência com o que ele mesmo chama
de uma Ruinologia. Discuto a ruína de José Antonio Ponte no âmbito maior de uma poética
dos vestígios (Walter Benjamin, Enmanuel Levinas, Paul Ricoeur, Zilá Bernd, Jeanne Maria
Ganebin e Jaime Ginzburg). A intenção é pensar como a expressão artística da ruína se
incorpora ao trabalho de reconstrução memorial, assim como à reescrita de uma historia
cultural recente, e como na práxis do autor, as ruínas são imagem poética, corpo verbal e
proposta conceitual.
O tema das ruínas se insere no pensamento sobre os rastros, os resíduos e os
vestígios memoriais, de maneira que pensar nas ruínas arquitetônicas que se multiplicam
em Havana é para Ponte pensar na ruína histórica, nas ruínas de um processo
revolucionário que a partir dos anos noventa começa a experimentar seu fim.
O resgate da teoria do rastro ou dos vestígios é relevante no estudo da obra de
Ponte, pois serve como pressuposto para entender sua interpretação da ruína da Havana e
sua apreensão estética, ao tempo em que também permite interpretar a ruína na perspectiva
alegórica proposta por Walter Benjamin.
Antonio José Ponte, autor cubano, nascido em Matanzas, em 1964, converte o
cenário arquitetônico da capital Havana em relatos poéticos, repletos de significações.
Ocupa-se da arquitetura colonial em desmoronamento para incitar a reflexão sobre as
ruínas e suas consequências morais e psicológicas
Em meados dos anos 80, Ponte começou a dar a conhecer sua obra, coincidindo
com um momento em que jovens artistas, escritores e intelectuais cubanos começavam a se
abrir ao mundo.
O universo literário na Havana dos 90 se transformava substancialmente no
chamado período especial em tempos de paz. Cuba passava por um momento de muitas
dificuldades econômicas e a crise da indústria de produção cultural era evidente. Não
obstante, mesmo com uma debilitada indústria editorial, em 1997 o autor publica o livro de
poesias intitulado Asiento en las ruínas, uma iniciativa argentino-cubana de grande tiragem.
Poderia se dizer que o ambiente literário e econômico cubano dos anos 90 promoveu a
carreira de Ponte, que se desenvolveu enquanto narrador e continuou publicando poesias e
narrativas, pelas Ediciones Vigía, uma pequena editora local, localizada em sua cidade natal
e, conhecida por seus livros feitos à mão.

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O desequilíbrio, a dúvida, o desconcerto e a busca de uma afirmação individual,
permearam as narrativas do autor. Em seus poemas a temática era recorrente, além de
levantar um material caótico e simbólico da realidade imediata, um lugar de percepções
transcendentes e simbólicas. Ponte também se dedicou ao trabalho como resenhista em
uma coluna fixa da revista Naranja Dulce sobre a cultura cubana do século XIX. Seus
artigos sobre poesia cubana e europeia apareciam com frequência em publicações literárias
mais proeminentes do país.
Desde então o autor consegue seu reconhecimento na literatura. Porém em 2003,
Ponte começa a demonstrar um evidente distanciamento da política da ilha, torna-se um
crítico profundo das estruturas burocráticas do sistema e é expulso da União de Escritores e
Artistas de Cuba. É assim que vai residir em Madrid.
Mesmo fora de sua terra natal, o autor continuou mantendo suas raízes e explora
com maestria a temática das ruínas em uma intensa relação metafórica com o sistema
Castrista.
Ponte ocupa-se da memória para manter viva uma história que permeia a vida dos
cidadãos cubanos: o declínio de um “império”, de uma ilha que vive submersa na
decadência e que criou uma arte nova de fazer ruínas, visto que Fidel Castro para legitimar
seu poder político e as invasões norte americanas, permite que a cidade tenha um aspecto
de bombardeio, sem nunca haver sido bombardeada.Além disso, há um outro pensamento
que se esconde por trás das ruínas, segundo o autor, que diz respeito ao poder que a ruína
exerce sobre cada súdito: a ele não é permitido mudar nada, nem a própria casa. É o
fracasso privado que garante o fracasso público, coletivo.
Hoje , as ruínas de Havana vendem, são exibidas das mais diversas formas, seja
para a reconstrução memorial, seja para a exploração turística. No entanto, é necessário
que se repense no exercício de toda essa destruição, visto que não é somente um bairro
que está arruinada e, sim todo um país.
Vivemos, como argumenta Andreas Huysen, uma época marcada pela sedução da
memória. Esse tema converteu-se em uma preocupação central nos estudos da cultura, da
sociedade, da história e da política nas sociedades ocidentais contemporâneas. No seu
célebre livro, Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos, mídia (2000), Huysen
reconhece a propensão do nosso tempo pela musealização, pela volta do retrô e pela
obsolescência.
Para o teórico Paul Ricouer (2004), a história tem uma relação direta com a memória,
pois a partir dos fenômenos mnemônicos, somos levados ao passado. Logo, construímos
imagens, gestos, símbolos, signos. Nesse sentido, presentifica-se o passado. Atualiza-se
aquilo que ficou na lembrança. O sujeito compõe em seu imaginário as imagens de uma
vivência que vem à tona, que se ocupa do estado real para ressurgir.

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É nessa direção que se insere meu interesse na reflexão contemporânea sobre a
ruína e, especificamente na obra de Antonio José Ponte, escritor cubano que articula e
centra sua poética na cidade de Havana e suas construções arruinadas. O autor intitula-se
um ruinólogo, visto que se apodera de elementos e vestígios deixados pelo tempo no
espaço geográfico e cria uma nova realidade. Nesse sentido, não modifica o que foi
deixado, mas utiliza-se com propriedade dos elementos da natureza que lhes são
oferecidos.
Atualmente alguns debates impulsionam o pensamento contemporâneo e dentre
eles, indubitavelmente, está o tema dos vestígios memoriais, no qual a obra do autor em
questão procura de forma particular explorar em sua hermenêutica da ruína.
O teórico Paul Ricouer (2004) define a memória a partir de um paradoxo entre a
presença e ausência e indaga sobre o enigma da imagem, elemento essencial nas análises
sobre os vestígios. Zilá Bernd (2010), na estela de Ricoeur, afirma que há autores das
literaturas das Américas que se utilizam de estratégias para construir o que se pode chamar
de memória longa ou de longa duração, com base na recuperação de vestígios oriundos de
memórias múltiplas em circulação no contexto crioulizado das Américas. Para Bernd, “no
entre-lugar entre memória e, de outro, o esquecimento e silencio, criam-se estéticas feitas
de vestígios culturais os mais diversos contextos”. (BERND, 2010).
Para Manuel Levinás (2001:70), os vestígios perturbam a ordem do mundo, visto que
mesmo quando escapam à presença, deixam um indício, um rastro. O vestígio, por sua vez,
não pode ser considerado um signo como outros, mas desempenha seu papel, ou seja, o
que distingue o vestígio do resto dos signos é sua significação, já que significa fuera de toda
intención de hacer signo y fuera de todo proyecto en el cual ella sería el objetivo. Tal
afirmativa é verificada por Elena Palmero González (2013), quando expressa, que o vestígio
tem que significar fora da intenção de significar, visto que não é criado, é deixado.
Ao refletir sobre a memória e seus vestígios, a teoria de Walter Benjamin articula
toda uma teoria dos rastros. Em sua obra El libro de los pasajes o autor ao teorizar sobre os
rastros, afirma que é a partir dos vestígios que nos apoderamos das coisas. Em uma
releitura de Benjamin, Palmero González (2013) afirma:
Me interesa retener de ella (la huella) dos detalles: el hecho de que la huella
actualiza lo acontecido, Ella no queda en el pasado, sino que es la aparición
próxima de algo que se ha dejado atrás y el hecho de que a través de la
huella, conocemos la cosa, o sea restauramos(…)

O resgate da teoria do rastro ou dos vestígios é relevante no estudo da obra de


Ponte. Serve como pressuposto para entender sua interpretação da ruína havanesa e sua
apreensão estética, ao tempo em que também permite interpretar a ruína na perspectiva
alegórica proposta por Benjamin. Em alguns de seus ensaios, o autor projeta um olhar
benjaminiano que se preocupa em resgatar e reparar simbolicamente uma dívida que vem
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do passado, uma utopia pendente do passado que se mostra por meio das diversas
passagens no presente, dos personagens em uma constante crítica ao que emerge do
passado e estabelece um vínculo com o presente psíquico e opressor.
Assim, pensar nas ruínas arquitetônicas que se multiplicam em Havana, é para
Ponte pensar na ruína histórica, nas ruínas de uma revolução, que a partir dos anos noventa
começa a experimentar seu fim e de alguma maneira, nas perdas do povo cubano. A
afirmação vai ao encontro do que disse Walter Benjamin, quando declara que na história, as
ruínas se unificam fisicamente no ambiente, o que revela sendo a alegoria de algo que vai
além da beleza e essa se realiza no reino do pensamento, o que as ruínas são no reino das
coisas.
As narrativas do autor permitem-nos reconstruir parte da história atual da ilha
caribenha. Em La fiesta vigilada, Ponte expõe a intensidade do regime castrista e as
proibições que o país passou a sofrer depois da revolução, além de apresentar uma
narrativa que mescla o ensaio, a autobiografia e as memórias. Em Un arte de hacer ruínas,
muito mais que explorar as ruínas arquitetônicas e revelar uma cidade subterrânea,
chamada de Tuguria, reconstrói a decadência humana, as ruínas que as pessoas levam por
dentro juntamente como o medo, a solidão e o insólito.
Segundo Ponte, na cidade de Havana há mais ruínas que Roma, porém com uma
diferença: as ruínas havanesas são habitadas e este fato pode levar-nos a uma reflexão
aguda, que fere como se fosse um sentimento venenoso. Ainda ressalta que a convivência
com a ruína é sempre trágica
Na década de cinquenta, Havana mostrava uma das mais impressionantes
arquiteturas no cenário latino americano. Embora, reduto de festas, e subordinada aos
Estados Unidos, a cidade causava inveja por apresentar um dos cenários urbanos mais
primorosos da América Latina e atraia olhares das mais diversas personalidades do planeta.
La fiesta vigilada, explora esse momento histórico de Cuba e o autor com maestria
consegue reproduzir fatos e falas de celebridades que visitaram a ilha nesse período.
Hoje, a ilha continua atraindo os mais diversos olhares, porém já não há o
encantamento daquela época e tão pouco personalidades exploram suas imagens no
cenário decadente e nostálgico em que se transformou a capital do país. O cenário
contemporâneo é explorado por outro viés: o da nostalgia, da decadência, da proibição e
das ruínas habitadas.
A memória dos tempos de fascinação permanece nas fotografias, nos registros
escritos, nos museus e no pensamento daqueles que viveram no período antes da
revolução cubana. A Havana de outrora vive no imaginário, nas conversas e principalmente,
nos escombros de edificações que caem a todo o momento.
Como um ruinólogo, Ponte retoma o passado e constrói suas narrativas. O autor joga

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com os acontecimentos do passado e cria uma história não exatamente fiel à história oficial,
mas que se insere na transitividade do tempo. Apodera-se dos fragmentos deixados no
ambiente externo e desenvolve sua escritura repleta de metáforas e significações. Utiliza-se
do mistério para refletir sobre a arte de escrever e as consequências negativas que este ato
pode acarretar ao sujeito.
O autor ressalta que em suas pesquisas encontrou em George Simmel, um ensaísta
alemão, a explicação plausível para as ruínas, pois o filósofo alega que o homem toma da
natureza as pedras, madeiras e elementos que existem para construir. Logo, a natureza
como uma forma de vingança, destrói o que o homem construiu e a isso se pode chamar de
equilíbrio.
O passado é elemento recorrente na obra do autor, e apresenta-se como uma
sombra nebulosa que persiste em existir e coabitar com os moradores de Havana, que
transitam entre os escombros de uma cidade carcomida pelo tempo. Não há pela parte de
Ponte a intenção de modificá-lo, porém a ruína, os resíduos desse passado conferem um
novo sentido ao fato narrado, um sentido humanístico: ao mesmo tempo em que um edifício
sofre o desmoronamento, o sujeito que vivia nele, também desmorona. O autor assinala que
ao pensar na cidade, pensa na situação atual do país e na metáfora da decadência dos
habitantes que de alguma forma também se converteram em ruínas.
Os discursos sobre a memória permearam a literatura na década de 60 do século
XX, como consequência da descolonização e dos novos movimentos sociais que buscavam
historiografias alternativas, que revisassem os modelos totalizadores modernos de fazer
historiografia. Já nos anos 80, os discursos da memória se intensificaram na Europa e nos
Estados Unidos, ativados pelo debate mais amplo do holocausto, que serviu como motivo
para que outros relatos fossem revisados, o que fortaleceu a preservação da memória.
As ruínas ao mesmo tempo em que podem trazer um sentimento de nostalgia,
também revelam uma insatisfação frente ao moderno, que segundo Zilá Bernd é o que se
pode chamar de vestígios: aquilo que se encontra nas ruínas de um passado e que persiste
na historia atual.
Autores cubanos, como Abilio Estévez, Pedro Juan Gutiérrez, Ena Lucía Portela,
Ronaldo Menéndez, Rolando Sánchez Mejías ou Leonardo Padura, em suas singularidades
estéticas, também utilizam a ruína como tema ou como contexto de suas obras. Ou seja,
que a ruína de Ponte não é um caso isolado, parece ser em uma poética geracional.
No discurso de Ponte revelam-se fragmentos da história cubana recente. Seu
discurso confessional e memorial aclara a vida cotidiana dos cubanos e a queda de uma
utopia social que se converteu em pedras e carência material.
Seguindo a mesma linha de pensamento, encontramos em James Buckwalter-Arias
um posicionamento muito pertinente que coloca a ruína frente ao humano. O teórico analisa

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as ruínas e as apresenta como algo que faz parte não só da parte física como da condição
humana. O autor reconhece que recuperar ou reconstruir um passado depende das
condições do presente:
La hipotesis de que recordar, recuperar o reconstruir un pasado cultural se
hace de acuerdo com expectativas y exigências contemporáneas. Las
historias, indivíduos y legados culturales que se eligen (y eligir siempre
significa desde luego , rechazar lo no elegido) rescatar la memoria cultural,
legados y figuras que han sido sistemáticamente reprimidos o marginados
es, desde luego, una tarea digna y necesaria por sí misma. (p. 56)

A obra de Antonio José Ponte, segundo Teresa Basile (2009), es una impugnación a
las políticas culturales del achique, al cierre cultural que amuralla la isla e insulariza a sus
habitantes, es una protesta ante el control y la vigilancia sobre la autonomía del escritor.
Na afirmativa de Teresa Basile, a obra de Ponte expressa de maneira declarada a
impugnação pelas políticas de seu país. Ele deixa transparecer o retrato do descaso e da
queda de uma cidade/ país, sob o domínio de uma política que oprime e isola.
Segundo o autor, caminhar pelas ruas de Havana é fazer uma viagem no tempo,
pois a cidade é um museu em ruínas. Havana é uma cidade bombardeada por um
bombardeio que nunca ocorreu.
Teresa Basile é categórica ao afirmar a relevância literária de Antonio José Ponte no
contexto latino-americano contemporâneo, ao tempo em que também coloca sua literatura
como representativa de um tipo de ficção que textualiza a perda, a desilusão, o derrube do
grandes projetos modernos:
Los textos del cubano Antonio José Ponte podrían ocupar un estante en una
imaginaria biblioteca latinoamericana del fin de siglo con sus derrumbes,
basurales, con el canteo de las perdidas acaecidas, con el esceptismo con
que se percibe “la misión de faro de todo el continente” conferida a la isla
desde su revolución. Ganan su proprio lugar junto a la escritura melancólica
y crepuscular del nocturno de Chile, o al abismo sacrificial al que cae una
generación entera de jóvenes latinoamericanos luego del Tlatelolco
(amuleto), en los relatos de Roberto Bolaño, o al lado de la narrativa del
uruguayo Amor Hamed, quien rastrea en el gran basural latinoamericano los
restos, fragmentos, souvenirs, fetiches devaluados de los ideales
sesentistas y eclipsados por un gran apagón, o junto a las perdidas batallas
en el desierto mexicano de José Emilio Pacheco. (BASILE, 2009)

A leitura das obras do autor, ainda, segundo Basile, permite que façamos uma
trajetória na década de 90 em Cuba e, possibilita que incursionemos no sombrio e difícil
período especial, para que consigamos ler as transformações, as voltas e as perdas no
desenvolver tardio da revolução dos anos 60. Essa recuperação do passado, da memória,
torna-se como um farol para escritores e intelectuais da América Latina. Porém, esse olhar
do autor não se limita somente aos anos 90, já que revisa os antecedentes e suas causas.
Aimeé Bolaños (2011) em A memória ferida na narrativa cubana atual aponta que na
atualidade a Literatura Cubana está valorizando a memória e toda sua carga identitária:
Como uma reserva identitária, que tem o poder de ressignificar os
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acontecimentos e a nós mesmos, apresenta-se a memória. Quando
rememoramos, com os movimentos de recuperação e reconfiguração,
fazemos da própria identidade e dos fatos históricos, eventos dinâmicos, em
incessante transformação. Em tal sentido, a ficção se torna um
extraordinário laboratório de formas do ser interior ao relatar um tempo
humano, no qual convivem memória e esquecimento. (p. 76)

O olhar de Ponte sobre Havana e suas ruínas, revela sua capacidade em meditar
sobre a arquitetura desgastada pelo tempo, que oculta as mais diversas memórias,
constitutivas de um presente. As alegorias da cidade funcionam na mesma perspectiva de
Proust ao pensar suas cronotopías: um espaço que toma a forma do tempo.
Tuguria, a cidade criada em Un nuevo arte de hacer ruínas explica o que o próprio
autor denominou chamar de Tugurización, que consiste na capacidade que tem uma cidade
extremamente povoada para fazer espaços dentro do espaço urbanizado e converter em
tugúrios a esses lugares, em que as pessoas vivem umas sobre as outras na limitação
espacial.
Trechos do conto elucidam a afirmação anterior:
Cuando necesitas aumentar el tamaño de tu casa y no hay patio donde
construir más, ni jardín que ocupar, ni siquiera balcón, cuando necesitas
ampliarte y vives con la familia en un apartamento interior, lo único que te
queda es elevar los ojos al cielo y descubrir que en tanta altura de techo
bien cabría otro piso, una barbacoa. Descubres, en suma la generosidad
vertical de tu espacio, que permite levantar otra casa allá adentro. (PONTE,
2005:56)

Los más viejos edificios de la ciudad llamaban atención de los tugures. No


pasaba mucho tiempo hasta que un primer tugur se iba a vivir al edificio
merodeado. Ese primero conseguía traer a otros y poco a poco lo llenaba
todo con su gente. Reunidos en el edificio (mientras más alto mejor y mejor
todavía mientras más soberbio), sacaban de una habitación chiquita cuatro
habitaciones de un piso hacían dos (…) Y parían sin piedad las mujeres
tugures, y llamaban cada vez a parientes lejanos. (PONTE, 2005:66)

A estudiosa Mercedes Serna (2009) em seu ensaio; Tuguria: ciudad de la memoria


aposta uma interpretação: En un arte de hacer ruínas, hay al menos, dos lecturas que se
entrecruzan y dan al cuento su sentido completo: la realista que informa de los cambios
demográficos de la Habana y la fantástica que trata de una ciudad subterránea llamada
Tuguria.(p.85)
A citação da autora pode ser comprovada com o fragmento:
De no salir inmediatamente, tendría que reconocer que allí existía una
ciudad muy parecida a la de arriba. Tan parecida que habría sido planeada
por quienes propiciaban los derrumbes. Y frente a un edificio al que faltaba
una de sus paredes, comprendí que esa pared, en pie aún en el mundo de
arriba, no demoraría en llegarle. (PONTE, 2005:72)

Embora mesclando a ficção e a realidade, o autor extrai da história recente vestígios


que são perceptíveis e identificáveis. Sua escrita revela um narrador centrado em seus
relatos pessoais e nas suas experiências políticas e sociais. O narrador confunde-se com o
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autor em seus ensaios autobiográficos.
Muito mais que descrever a vida difícil em meio a um sistema vigiado e autoritário, o
autor questiona o fazer literário de escritores cubanos na atualidade e levanta a questão da
atuação do escritor em um país que está entre ruínas e destroços. Problematiza também os
prós e contras da revolução cubana para os dias atuais.
Em uma entrevista a Ida Danciu (2009), o autor diz que o conceito do homem novo,
uma das ideologias dos socialistas, era principalmente um problema pedagógico e o
fracasso se deu por meio da impossibilidade do projeto, comparável com a intenção de
evangelizar a todo um povo convertendo-o assim em uma ideia pervertida em dogma.
Ressalta nesta mesma entrevista que o Estado funciona como único pedagogo, no
qual o professor consegue fazer sufocante a ideia de aula, a partir do momento em que não
se pode sair dela. É então uma aula que não termina. Uma sala de aula sem saída.
Segundo o autor, a obtenção de um homem novo pressupõe que o mal seja
totalmente exterminado de uma sociedade e, é necessário desconfiar das soluções totais
ainda quando apareçam guiadas por razões excelentes, pois tais soluções não podem
produzir mais que opressões totais.
Tanto em Un arte de hacer ruínas como em La fiesta vigilada, Ponte recupera com
palavras um passado e retoma aspectos políticos e sociais da cidade de Havana. Ao utilizar
as marcas físicas das ruínas insere em suas teorizações ensaios de teóricos que
fundamentam sua própria teoria: George Simmel e W.G.Sebald e usa a alegoria como forma
de exprimir as ruínas interiores: la arquitectura emprende el camino interior, se encierra en si
misma y termina por devorar sus posibilidades, por encontrar su ruína. (PONTE, 2001:161)
A obra de Antonio José Ponte é enigmática e plural. O autor não propõe apenas um
romance como monumento, nem como lugar desde o qual seja possível construir ou
reconstruir uma identidade cubana. Escreve a partir dos rastros de uma tradição e a
converte em poética, em uma teoria própria sobre as ruínas e lhes atribui significados e, as
agrega ao corpo de suas narrativas como espaços habitados por meio de relatos
confessionais.

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