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Repertório, Salvador, nº 20, p.235-252, 2013.

HARDCORE PARA UM
SONHO:
POÉTICA E POLÍTICA DAS
PERFORMANCES PÓS-
PORNÔS

Thiago Ranniery Moreira de Oliveira

RESUMO: Este artigo é um diário de notas de um es- ABSTRACT: This article is a diary of notes of a spec-
pectador, um composto de variações sobre as relações tator, a compound of variations on the relationship
entre estética e política no movimento da pós-porno- between aesthetics and politics in the post-porn move-
graia. Seu objeto: o insólito equipamento das perfor- ment. Its subject: the unusual equipment of the post-
mances pós-pornôs do coletivo espanhol PostOp. Uma porn performances of the spanish collective PostOp.
intimidade entre fatias de mundo que diicilmente se An intimacy between slices of the word that it is di-
encontrariam: o teatro e a pornograia. Suas perguntas: ficult to ind: the theater and the pornography. Your
o que pode o encontro entre a arte da performance e a questions: what can the meeting between performance
pornograia? Pode a pornograia dizer outra coisa sobre art and pornography? Pornography can say anything
os corpos sexuados e sobre si mesma? Pode a porno- about the sexual bodies and about itself ? Can porno-
graia compor uma poética e uma política do sexo? As graphy compose a poetic and a political of sex? The
performances do PostOp apropriam-se do pornográi- performances of PostOp appropriate the pornography
co para em um único e mesmo gesto deslocarem tanto of moving the images of thought of pornography as
as imagens de pensamento da pornograia como aquilo what counts in a political community as sexually visible.
que conta em uma comunidade política como sexual- In this movement, the performances radicalized both a
mente visível. Nesse movimento, radicalizam tanto uma sense of political theater as a performative dimension
noção de um teatro político quanto a própria dimensão of sexuality. A struggle of life and death for another
performática da sexualidade. Um luta de vida e morte imaginary of naked bodies and explicit sex gives ulti-
por uma outra vida imagética de corpos nus e do sexo matum to the sexed subject in an attempt to open the
para dar um ultimato ao sujeito sexuado na tentativa de bodies to the erotic affections of the world. This ight
abrir os corpos às afecções eróticas do mundo. Uma in the image is connected with the ability to survive on
luta na e pela imagem que tem a ver com a capacidade the basis of making the same tools to mark the world
de sobreviver com base na tomada dos mesmos instru- that marked the dissident sexualities as abjects and ab-
mentos para marcar o mundo que marcou as sexualida- normals.
des dissidentes como abjetas e anormais.

PALAVRAS-CHAVE: pós-pornô, performance, por- KEYWORDS: post-porn, performance, pornography,


nograia, política sexual, corpo. sexual political, body.
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Chumbo, ouro, prata, couro, aço, ferro, madeira, tornou-se o marco inicial das performances pós-
alumínio, madeira, borracha e argila; mas também pornôs, The Public Cervix Annauncement (SPRINK-
gelatina, pólvora, fogo, ácido, éter e bisturis; velas, LE, 1998; 2006). O convite de Sprinkle: explorar o
fogueiras, lâmpadas, lanternas e lampiões; ainda interior de sua vagina com a ajuda de um aparelho
batom, perucas, cabeleiras, corpetes, chicotes, laços ginecológico. O imperativo da máxima visibilidade
de cetim, pentes, pérolas, botas, agulhas e anzóis; dos corpos designados femininos estava, ali, redu-
e mais gêmeas, ninfetas, inquisidores, cachorros, zido ao absurdo.
cavalos, tatuagens; canções punks, ilmes, compu- PostOp é também um nome particular dentro
tadores, projetores, dildos, vibradores, brinquedos do território da medicina em língua: é a designação
eróticos, tacapes, chapéus plumosos, cordas, más- utilizada para se referir aos corpos transexuais de-
caras e focinheiras; quando não moscas, aranhas, pois de passarem pelas intervenções cirúrgicas de
lagartixas, cobras, sapos e besouros; sinos, urnas, resigniicação sexual. O grupo apropriou-se do ter-
cálices, jarras, vasilhas de líquido seminal, urina, fe- mo porque, de uma forma ou de outra, as pessoas
zes e saliva, tripas de porcos e ossos de boi; e ainda são constituídas por tecnologias muito precisas que
mais brita, cimento, asfalto, correntes e algemas. as deinem em termos de gênero, classe social, raça
Eis o insólito equipamento de uma performance pós- e sexo. As tecnologias do sexo3 – noção que desenvol-
pornô do coletivo espanhol PostOp. Uma intimidade ve a já circulante tecnologias do gênero na teoria
voluptuosa entre fatias de mundo que diicilmente feminista (LAURETIS, 1987) – se constituem em
se encontrariam: o teatro e a pornograia. Atrações uma série de montagens híbridas de saberes, ins-
estranhas, tensões eróticas, montagens inusitadas. trumentos, pessoas, sistemas de julgamento, edifí-
Nesse luxuriante encontro, mundos imprevisíveis cios, espaços e objetos que circulam por aí com
se instauram, povoados de seres sui generis: obras de certos pressupostos e objetivos sobre a sexualidade
arte sexualmente vivas. humana, fabricando as diferenças sexuais e as na-
O coletivo multidisciplinar espanhol PostOp turalizando (PRECIADO, 2002; 2004). São essas
nasceu em 2003 durante a Maratona Pós-Pornô, tecnologias que possibilitam as diferentes inscri-
na cidade de Barcelona1, Espanha. PostOp é um ções performativas de gênero e sexualidade. Nes-
dos, não muitos, porém impertinentes, coletivos se impertinente regime sexopolítico, a pornograia
feministas que, em diferentes inscrições estéticas e evidentemente não pode deixar de soar como uma
teóricas2, tem investido em romper o hímen epis- regulação heteronormativa de práticas sexuais, sen-
temológico dos debates sobre política da sexuali- timentos, amores, corpos, processos identitários,
dade e pornograia, na constituição de um outro parte signiicativa de todo um processo de norma-
território, um híbrido de teatro e sexo, batizado de lização da sexualidade na cama da vida.
pós-pornograia. Originalmente formulado pelo artis- Uma permissão para uma nota biográica se faz
ta holandês Wink van Kampen para descrever um necessária, aqui, para a exposição de uma posição
tipo de produção audiovisual que continham ele- epistemológica no qual este artigo se inspira. Ao
mentos pornográicos, mas cujo objetivo não era seguir aquilo que Peter Sloterdjik (1998) chamou
masturbatório e, sim, de crítica política, o termo de intelectualidade corsária, ele sequestra intelec-
foi utilizado em 1990 pela prostituta e atriz pornô tualmente linhas de força dos feminismos que têm
Annie Sprinkle para apresentar a performance, que pensado “as relações e desigualdades globais (...)
dando centralidade (...) ao jogo complexo das re-
lações de classe, raça/etnicidade, gênero, naciona-
1
As informações sobre o PostOp utilizadas nesse artigo es- lidade e orientação sexual” (ALDEMAN, 2007, p.
tão disponíveis na website do coletivo. As performances aqui 400), de forma contextualizada, e a partir daquilo
citadas estão também abertas para acesso em vídeo online no
site do grupo. Disponível em: www.postop.esp. Acesso em:
maio de 2011.
2
Um instigante panorama da produção cênica e performáti- 3
O sentido do termo tecnologia é, deinitivamente, inspirado
ca espanhola dentro do marco aqui exposto pode ser encon- na obra de Michael Foucault. Ver, especialmente, Foucault
trada em Costa1 (2003). (1993).
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que Haraway (1996) chamou de saberes situados “alacrônico”: aquele que resulta da prática de falar
ou Spivak (2009) de saberes subalternos. Contudo, do “outro” colocando-o em um tempo diferente
esta não foi uma escolha deliberada por vontade ou do tempo daquele em que se está falando. Segundo,
estilo. Ao caminhar pelas ruas de Barcelona seguin- para o imperativo epistemológico de que desde já
do as produções do PostOp e estabelecendo conta- estávamos – eu e o PostOp – diferentemente situa-
to com os membros do coletivo, na tentativa fazer dos em lugares e que só podemos narrar, pesquisar
uso delas para "problematizar a relação estabele- ou estudar qualquer coisa a partir de pontos de vis-
cida com o mundo, com o outro e consigo mes- ta especíicos (GROSSBERG, 1997). O que pode
mo [...], condição fundamental para que se possam ser compreendido no sentido literal e metafórico,
abrir novas saídas mais positivas e mais saudáveis ou seja, tanto como um lugar geográico especíico
para o exercício da liberdade e a invenção da vida” quanto como uma localização imaginada, política e
(RAGO, 2002, p. 15), aprendi como minha aloca- mental (COSTA2, 2003). Na minha tarefa de lançar
ção política num mundo social que produziu a re- um olhar sobre a poética e política das performan-
ferência maior de suas características, sua índole e ces pós-pornôs a partir da produção do PostOp era
vocação em torno da sexualidade1, me situava em preciso ressaltar aquilo que se tem chamado “de
um lugar paradoxal. No que pese também a difícil capacidade geopolítica de ler e escrever” (FREID-
tradução do termo postop e de muitas das referências MAN, 1998) como uma prerrogativa metodológica
que o coletivo invocava, escapáveis ao imaginário para salientar os elementos de apropriação de con-
da “sexualidade brasileira”, a minha formação te- ceitos, ideias e teorias. Ideias e conceitos que jamais
órica nos estudos queer norte-americanos2 quando são totalmente puros ou nativos, emergem de lu-
o grupo colocava-se em uma relação especial com gares sempre já saturados por outros lugares e te-
os teóricos queers espanhóis3, também deslocou e orias (CLIFFORD, 1997). O que levava a me loca4
recolocou parte das minhas categorias analíticas. -lizar, em última questão, na inserção de um espaço
Essas séries de dicotomias alertavam, primei- de mediação cultural, deslocando tanto as teorias
ro, para a necessidade de evitar o reforço do que como as próprias performances que me dedicava a
Jonnanes Fabian (1983) conceituou como discurso analisar – o que também implicava deslocar a mim
mesmo –, denunciando que produzir conhecimen-
1
to é uma forma multiplamente geocentrada.
Ciência, intelectualidade e sexualidade, como ressalta Mar-
Ao andar pelas praças públicas de Barcelona,
gareth Rago (2006), sempre se constituíram em um campo de
tensão na sociedade brasileira. Para, um aprofundamento do ao deparar-me diante de performers travestidas
lugar social da sexualidade no Brasil, ver Parker (1993). de cachorros e cavalos com dildos presos à cabeça,
2
Nas palavras do sociólogo Steven Seidman (1996, p. 13), a penetrando-se com aqueles objetos de borracha,
teoria queer é um estudo “daqueles conhecimentos e daquelas alguma outra coisa estava ali em jogo. Estética e
práticas sociais que organizam a ‘sociedade’ como um todo, política se cruzavam em um horizonte imaginati-
sexualizando – heterossexualizando ou homossexualizando
vo, sinalizando o lugar que a pornograia e a arte
– corpos, desejos atos, identidades, relações sociais, conheci-
mentos, cultura e instituições sociais”. Para uma introdução da performance5 ocupam em termos de sexualida-
dos principais tópicos de debates, conferir Miskolci (2009;
2012) e Lopes (2001).
4
3
No Brasil, “O quinteto fantástico do queer”, como chama Marcia Ochoa, antropóloga norte-americana de origem
Larissa Pelúcio (2012), estaria centrado nas teorizações de Ju- colombiana, joga com o termo “loca” que em muitos países
dith Butler, Eve Sedgwick, David Halperin, Beatriz Preciado latino-americanos serve para se referir às “bichas”, assim
e Michel Warner. Certamente, Preciado e Butler apareciam como no Brasil se usa o “bicha louca”, para assumir sua
como interlocutoras importantes para o coletivo. Contudo, posição teórica (OCHOA, 2004).
5
Javier Saez, Sergio Carrascosa e David Cordóba, teóricos es- O termo “arte da performance” é, daqui por diante, usa-
panhóis bem menos conhecidos na literatura queer no Bra- do para se referir a performance enquanto objeto artístico
sil, também apareciam como importantes interpelações do delimitado para marcar uma diferença no uso do termo em
trabalho do grupo. Para uma amplitude das incorporações relação às outras áreas de pesquisa em ciências humanas e
e deslocamentos do queer na América Latina e no Brasil, ver sociais, especialmente para diferenciá-lo do uso do termo
Miskolci e Simões (2007); Pereira (2012), Viteri (2008) e Vit- performance dentro da teoria queer. Para uma discussão so-
eri et al (2011). bre os conceitos de performance e performatividade desde
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de. O que acontece quando as performances Las estética e política no pós-pornô. Começo, assim,
perras do Apocalipse, BDSM, Oh-Kanaã, Esperando mi por um arrolamento das imagens de pensamento
macho, que incorporam esta cartograia analítica, circulantes da pornograia de modo a perguntar
mostram-se insatisfeitas com a impostura política que tipo de inserção e deslocamento de linguagem
e estética da pornograia? Pode, pois, uma resigni- o pós-pornô pode compor. Sigo apontando o que
icação política e estética da pornograia resignii- sinalizam as linhas de encontro entre arte da perfor-
car as experiências sexuais? O que aconteceria se mance e pornograia nas cenas do PostOp em ter-
aplicarmos a noção de profanação (AGAMBEM, mos de experimentação estética. Inspirado naquilo
2007) à própria pornograia não para fulminá-la que Jacques Ranciére (2009) chamou de partilha do
por colonialista, exorcizar seu exotismo ou minar sensível, uma distribuição sobre o visível e dizível
seu campo intelectual, mas para fazê-la dizer outra em uma comunidade política, exploro a partilha de
coisa? Ou seja, podemos desativar a pornograia e sexualidade e a repotilização do teatro mobilizada
aprendermos a brincar com ela, devolver a porno- nas performances. Por im, sugiro que imagem de
graia ao uso dos corpos sexuados? Pode a arte da corpo e que olhar de espectador são demandados
performance fazer da pornograia um novo uso? O no acontecimento das performances pós-pornôs.
que muda quando esse excêntrico tema é tomado No percurso, se entrecruzam em os ziguezagues e
como uma prática de sentido em continuidade com ecos de um trajeto analítico inacabado, com partes
a arte da performance? O que nos diz e nos mostra que podem soar repetitivas ou desiguais, tanto na
a relação entre arte da performance e pornograia? forma como no andamento. Mais próximas de en-
Pode a pornograia dizer outra coisa não só sobre saio altamente inlamáveis, possuem uma certeza
os outros corpos sexuados – pois isso a pornogra- lúdica de que o que estava se escrevendo era ape-
ia não poderá deixar de fazer – mas outra coisa nas uma montagem singular, parcial e provisória.
sobre si mesma? Perguntas que movem essa escrita
e não seguem no sentido de apresentar, qualiicar e Escrever sobre sexo, escrever o sexo: carto-
caracterizar as performances pós-pornôs. grafando as imagens da pornograia
O material do PostOp serviu-me mais para des-
locar e problematizar algumas notas em torno de Pornograia! Quem nunca ouviu essa palavra ser
uma poética e uma política da pós-pornograia. evocada em uma roda de conversas entre amigos,
Tudo o que direi nada mais é que uma série de em um debate televisivo ou mesmo em um debate
pontuações, uma associação livre de ideias anota- acadêmico? Poderá, contudo, haver uma deinição
das à margem de meu caderno de campo enquanto possível de pornograia sem perder de vista os seus
assistia às cenas do coletivo. Reelaboradas, essas espaços de circulação? Certo que não. A multipli-
notas produziram quatro variações, sem pretensão cidade de objetos colocados em ação pela própria
nenhuma de esgotamento da questão ou da “en- pornograia tem imposto uma diiculdade de de-
crenca de gênero”6 sobre o entrelaçamento entre inir uma unidade analítica seja ela qual for para
o termo (COSTA, 1987). A amplitude do debate
acadêmico a partir de distintos territórios discur-
a ilosoia da década de 1950, sua expansão para os estudos sivos também torna uma deinição de pornogra-
literários na década de 1980 e para os de gênero na seguinte, ia difícil e passível de maniqueísmo (COELHO
consultar Bal (2002)). No campo dos estudos teatrais, ver
NETO, 1983; ATTWOOD, 2002). As imagens de
Carlson (2009).
6 pensamento da pornograia inscrevem-se numa
Evoco aqui o termo "encrenca" para uma tradução delib-
erada do título da obra de Judith Butler (1990), Gender Trouble imensa ambiguidade, inluenciada por tradicionais
– traduzido no Brasil como Problemas de Gênero (BUTLER, formações discursivas cientíicas e institucionais.
2003). Combinado com o termo gênero, ele permite evocar Poderá mesmo soar a alguns como um escape frí-
uma duplicidade, que tanto parece expressar melhor o que
gênero faz conosco, no sentido de produção de corpos in-
teligíveis que faz gênero e sexualidade sejam colocados, para
além de simplesmente nos trazer 'problemas', como permite impõe a performance como gênero das artes cênicas e do
explorar as ciladas que esta dimensão performativa do gênero espetáculo.
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volo e desnecessário para a arte da performance poderiam senão apresentar signiicações estáticas
quando a experiência modernista de política e de e simplistas, dando forma e encorajando relações
teatro conduziram as formas teatrais ao teatro de de dominação e opressão, acabando por produzir,
protesto, ao teatro político ou mesmo, mais recen- inevitavelmente, efeitos diretos e quantiicáveis so-
temente, a uma performance ativista – panorama bre seu público.
amplamente mapeado por Marvin Carlson (2009) Essas imagens de pensamento do pornô se avo-
e Robert Brustein (1967). A palavra pornô possui lumam discursiva e politicamente em torno dos
um incrível poder, tão plástico como uma posição debates do feminismo contra a pornograia, algo
de Kama Sutra e tão efêmero como um gozo, de que se conheceu pelo nome de guerras feministas
designar o estatuto midiático de qualquer repre- do sexo ou feminismo anti-pornô e pró-censura3.
sentação de sexualidade, não apenas em relação a A pornograia seria o modelo ideal e máximo para
outras formas de comunicação, mas também por explicar a opressão política e sexual das mulheres,
oposição a todas as parcelas da produção cultural deinindo-se unicamente por ser uma das mais de-
não consideradas como sexualmente explícitas. gradantes formas de violência simbólica contra elas
Uma cartograia possível das imagens de pen- (CICLITIRA, 2004). O potencial da palavra por-
samento da pornograia dá logo a ver as linhas da nograia compreenderia uma evidente expressão
crítica literária apostando na distinção – nem sem- da dominação masculina, feita por homens para
pre bem sucedida, como fazem questão de notar – homens, num continunn da cultura heterossexista.
entre erotismo, obsceno e pornográico1. Quando Toda a indústria sexual não teria espaço para existir
muito, se aposta no estatuto potencialmente trans- fora da superestrutura do patriarcado e a porno-
gressivo da literatura erótica (MORAES, 2003; graia não poderia ser outra coisa que não uma ma-
2004). A imagem de pensamento da pornograia nifesta expressão da dominação masculina, icando
é a letra suja dos corpos, dos sexos e dos prazeres. impossibilitada de negociar o seu signiicado e ou-
De um outro lado, as linhas da crítica cinematográ- tras possibilidades de agenciamento. Quando nos
ica, na perspectiva mercadológica e da produção deparamos, contudo, com uma performance do
das imagens de corpos nus e do sexo, atolam as PostOp, certamente, podemos inverter ou perverter
imagens de pensamento do pornô em uma arqui- as perguntas em torno da pornograia. Mais atenta
tetura monolítica. A própria coisa pornográica à multiplicidade das experiências sexuais – em lar-
tornou-se o emblema máximo da cultura do lixo, ga medida enfatizada pelo legado recente da teoria
comercial e ofensiva, por oposição à cultura erudi- queer, herética tanto do ponto vista político quanto
ta e do bom gosto2. A indústria sexual teria feito do cientíico – mas também aos perigos evidentes dos
sexo produto de entretenimento, “o cativeiro eró- atos de “normalização normativa” (PAASONE;
tico na cultura de massa” (KOVEL, 1991, p. 165) NIKUNEN; SAARENMAA, 2007, p. 7), as per-
e, nem quando se trata daquilo que fazemos entre formances sinalizam para uma outra pergunta: não
quatro paredes, ou onde cada um nós preferir, não estaríamos com a (in)deinição da pornograia sob
estamos livres do mercado. Sem falar, é claro, das essas linhas de signiicação privilegiando o refor-
aproximações que se detêm no exame das implica- ço de categorias reguladoras da ordem estética e
ções legais e jurídicas da pornograia (LANDINI, moral dos conteúdos explicitamente sexuais (WI-
2004). O pornográico teria extrapolado, claramen- LKIN, 2004; JUDGES, 1995)?
te, o tom de todos os discursos sobre perversão em A própria determinação da coisa pornográica
nossas sociedades. Seus textos e suas imagens não sob a insígnia da suspeita traz consigo o complexo
jogo cultural moderno que classiicou, hierarquizou
1
Para uma amplitude do debate entre pornograia e litera-
tura, conferir principais discussões em Bataille (1987; Freire 3
O movimento que confrontava pornograia aos direito
(2000). Sontag (1991) e Steiner (1982). civis das mulheres foi encabeçado, principalmente, pelas
2
Com uma produção consideravelmente mais vasta, con- feministas Andrea Dworkin, Diana Russel e Catherine Mack-
ferir principais discussões sobre pornograia e indústria cin- innon. Para conferir os principais argumentos, ver Dworkin
ematográica em Abreu (1996); Dyer (1992); Ogien, (2007). (1981); Russel (1992) e Mackinnon (1993).
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e qualiicou os comportamentos sexuais (RUBIN, social da pornograia tem sido ressaltado na vida
1998) segundo um binarismo conhecido de vilões nossa de todo o dia (VANCE; 1995)5, nada é em
e mocinhos, boas e más práticas sexuais, em um si essencialmente pornográico. A pornograia não
conto de fadas. De todas as formas da produção é uma coisa, uma entidade delimitada e evidente,
cultural, a pornograia tem concentrado a maior soa mais como um efeito que funciona em contex-
parte das atenções sociais e políticas, certamente tos históricos e negociações culturais especíicos,
porque sua violência material pode ser supericial- regulando a existência de determinados objetos e
mente mais evidente, logo, à luz da longa tradição, corpos (KENDRICK, 1995; ARCAND, 1993). Se
digamos, conservadora, mais eminentemente re- a pornograia não pode ser fechada em si mesma,
produtível em uma sociedade como a nossa. Con- nem em um tipo de suporte especíico, se puder-
tudo, se começarmos por concordar com a tradição mos ampliar o “escrever sobre a vida das putas”
história que faz da pornograia um discurso especí- - tradução literal do vocábulo grego pornographos
ico da modernidade ocidental nascido da fornica- (MORAES; LAPEIZ, 1984) - a diferentes formas
ção da cultura de massas com o discurso obsceno de escritura, e a própria noção de escritura a toda
(LEITE, 2000; HUNT, 1999; ROUSSEAU; POR- forma de suporte, marca ou material de interação
TER, 1999), podemos repensá-la não tanto como de linguagem (DERRIDA, 2001), as fronteiras que
perversão marginal, mas como elemento essencial separam a pornograia de outras representações
da produção moderna do corpo e da sexualidade. da sexualidade parecem-nos, hoje, cada vez menos
Mais do que um simples e pervertido desvio da claras. Seus conteúdos, suas relações ou formas de
vida sexual, a pornograia é elemento ativo na sua consumo são cada vez menos insuicientes para
criação, produção e regulação. Enquanto expres- distingui-la de outras formas da indústria cultural.
sões culturais desprestigiadas, as representações da Se, como sugere Linda Williams (1989), a por-
sexualidade têm constituído um terreno fértil para nograia é imagem incorporada, imagem que se faz
o cultivo de discursos institucionais e cientíicos, corpo, o poder de signiicação do pornô tornou-se,
enraizados no pressuposto da inevitável corrupção hoje, mais complexo e dinâmico. Parte considerá-
ou ofensa da susceptibilidade dos espaços públi- vel da linguagem e da iconograia classicamente as-
cos. Todas essas linhas de signiicação do pornô sociada à pornograia, considerada obscena e suja
dizem mais sobre os medos relativos à corrupção até pouco tempo atrás, fora do alcance da higiene
da suscetibilidade pública da vida sexual e menos sexual de todo o dia, migrou para outras formas
sobre os conteúdos propriamente ditos da porno- da cultura – a sexualização da cultura (ATTWOOD,
graia (ATTWOOD, 2002). À medida que a porno- 2006; MCNAIR, 2000) ou a pornograicação do mains-
graia ascende, seja como objeto de crítica literária, tream (MCNAIR, 1996). Em uma orgia global a
cinematográica, feminista ou cultural, como um céu aberto, a pornograia não é simplesmente uma
suposto objeto mais ou menos independente, suas indústria cultural dentre outras, tornou-se o para-
(in)deinições tendem, entretanto, mais a produzir digma de toda a indústria cultural (PRECIADO,
do que descobrir os sentidos dos seus regimes de 2008). Muito do mundo do pornô entrou na cul-
visibilidades e dizibilidades.
Será possível, daqui por diante, ao invés de
nos mantermos restritos aos estudos dos meios sociais, para as diferentes temporalidades e para a pluralidade
de matrizes culturais” (MARTIN-BARBERO, 2002, p. 55).
pornográicos – o suporte fílmico ou literário,
Tal proposição permitiria acentuar de que modo as perfor-
por exemplo - deslocarmos nossos exercícios de mances pós-pornôs articulam a pornograia, crítica a coloni-
olhar o pornográico para seus espaços e tempos zação do desejo, ativismo social e experimentação estética no
de mediação4? Quando o próprio o signiicado interior de práticas culturais.
5
Etnograias da sexualidade têm destacado o signiicado da
pornograia em práticas e experiências homeróticas (TRE-
4
Sigo, aqui, as proposições de estudos de mediação cul- VISAN, 2000; GREEN, 2001; PARKER, 2002; BENITEZ,
tural de Jesus Martin-Barbero, para quem “o eixo do debate 2008, VALE, 2000), na construção das corporalidades e mas-
deve se deslocar dos meios para as mediações, isto é, para cunilidades (REGES, 2004) e nos cenários éticos e políticos
as articulações entre práticas de comunicação e movimentos da indústria capitalista brasileira (BENITEZ, 2009).
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tura mainstrem pela publicidade, televisão, cinema, nível do Porn Tube ou qualquer outro “site especia-
música e Internet, embora muito dessa produção, lizado em pornograia” utilizando o acrônimo para
precisemos admitir, continue sendo orientada para Bondage e Disciplina, Dominação e Submissão,
os homens. Pode, contudo, a pornograia falar ou- Sadismo e Masoquismo como palavra de busca,
tra língua? Pode a pornograia torna-se estranha em excetuando-se por um certo ar underground que as
sua própria linguagem? Pode a pornograia fazer- performances invocam. Como airma o produtor
se estrangeira em espaços e tempos nos quais não de pornô David Friedman, em entrevista dispo-
foi evocada, mas para os quais pode se voltar? nível em McNeil e Osborne (2005), a exploração
pornográica contemporânea, entendida como
Holocausto das fadas, contos de fodas: per- consumo audiovisual, é uma extensão dos espetá-
formance e pornograia culos populares de circo, dos freak shows, das fei-
ras de jogos e dos parques temáticos – os mesmo
Imagem 1: BDSM elementos apontados por Marvin Carlson (2009)
Uma atriz está nua amarrada ao teto por uma corrente. como constitutivos da arte da performance. Não
Uma atriz corpulenta travestida de torturadora e masca- seria estranho supor que a pornograia poderia ser
rada chega à cena. Uma sessão de chicoteamento se sucede considerada como um dos âmbitos performativos
intercalada com outros exercícios: pregadores de roupa no das artes do espetáculo que foram relegados ao os-
bico dos seios, pregos para arranhar a pele, beijos e mordidas tracismo e a ilegalidade durante os séculos XIX e
pelo corpo. XX.
Entretanto, as performances pós-pornôs do
Imagem 2: Esperando mi macho PostOp, ao contrário do funcionamento político da
Duas atrizes fazem sexo em praça pública. Não há ór- pornograia atual, reinscrevem os espaços e tem-
gãos sexuais em jogo. Em uma bancada, uma dona de casa pos do sexo nas territorialidades do mundo pú-
só de calcinha corta legumes à espera de alguém. Uma outra blico, intervindo diretamente sobre o que conta aí
atriz chega de bermuda e camiseta. Elas se penetraram, en- como sexualmente visível, ou sexualmente viável.
tre beijos e lambidas, com os legumes e verduras disponíveis São artefatos políticos justamente porque intervêm
na bancada. sobre aquilo que pode ser visto em uma comunida-
de pública, avançam sobre a ordem de quem pode
De onde vem a performance pós-pornô e para ser visto e do que pode ser visto em termos de
onde vai a arte da sexualidade? A pergunta aplica-se sexo. Só que as performances pós-pornôs fazem
do mesmo modo à humanidade: vasto tema! Não mais do que simplesmente retirarem a pornograia
se tem uma ponta de io por qual se deve começar das casas, das festas ou mesmo das telas dos com-
a puxar. Neste caso, a sexualidade não é nem mes- putadores, enim, dos espaços regulados e destina-
mo um io, é um tecido de muitos ios cruzados dos a sua produção e circulação para a lançarem
e em cruzamento. Impossível seguir o traçado de diretamente nas ruas – muitos outros artefatos cul-
todos; puxando três, quatro, já se faz uma paisagem turais já se empenham nessa empreitada. Nas cenas
sexual na trama do tempo. Certamente, há um efei- do PostOp, não vale o sexo soft que a nossa parca
to quando atores e atrizes fazem sexo na imagem educação sexual torna normal na gramática da se-
teatral, mas a performance pós-pornô é deinida xualidade. Ainal, que possibilidade de mobilização
por um processo de comunicação, que não se alte- é produzida quando falamos apenas do papai e ma-
ra de maneira fundamental pela mera exposição do mãe em termos de sexualidade no mundo público?
sexo em público. Só quando a imagem do sexo se O pornográico só consegue mesmo escandalizar
encontra em um relação complexa com a realidade quando deixa de obedecer a regras e convenções de
corporal começa propriamente uma estética pós- um gênero menor, perturbando a zona de tolerân-
pornô da arte da performance. cia que cada cultura reserva às fabulações do sexo
Em termos de preenchimento da cena, por (MOARES, 2003). Em realidades culturais como
exemplo, parece haver pouco ou nenhuma diferen- a nossa, na qual a mais básica educação sexual é
ça entre a performance BDSM e um vídeo dispo- ainda fonte de embaraços institucionais e familia-
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res, os anormais escapam para encontrar a produ- formas de fazer sexo e das relações de gênero que
ção da arte performática e fazer dela seu espaço de estas propõem.
ação política. Hardcore1 para um sonho radical. Ainda que certamente a pornograia promova o
Não, contudo, devemos procurar nas perfor- reforço das iguras dominantes de gênero e da se-
mances pós-pornôs uma pretensa naturalização xualidade, as performances pós-pornôs do PostOp
das sexualidades dissidentes, nem simplesmente não deixam de nos lembrar que a pornograia pode
desfrutá-la como uma forma de transgressão per- progressivamente abrir caminho a novas possibili-
versa e avassaladora. Frente à introdução da mo- dades de existir. As práticas de BDSM são esco-
ral que esvaziou o jogo teatral do mundo público lhidas não por um respeito estético pelo exótico,
(SENETT, 1998), frente à individualização moder- mas exatamente porque inventam novas possibili-
na da cultura heterosexista marcada pela distinção dades de prazer quando se utilizam de certas partes
público/privado (SEDGWICK, 2008), o PostOp estranhas do corpo, erotizando todo o corpo, nas
se põe no lugar de desenvolver micropolíticas de situações mais inabituais. Isso signiica que as pró-
sexualidade baseadas na auto-experimentação para teses, os elementos plásticos, os dildos, os vibradores
resistir à normalização e criar novos planos de ação e os químicos possibilitam a ação das performan-
e subjetivação política. Se abaixo da aparente indi- ces e constituem uma estética por meio de ações
ferença dos nossos espaços públicos democráticos, mediadas. A mescla formal de arte da performan-
como detectou Eve Sedwick (1985), subjaz um re- ce, recital de poesia, cabaré, dança, teatro, práticas
lação constitutiva entre homofobia e homoerotis- audiovisuais e de vídeo-criação, artes plásticas com
mo – o espaço público caracteriza-se ao mesmo pornograia BDSM em um espaço público aborda,
tempo pela exclusão da feminilidade e da homosse- assim, a heteronormatividade2 e a construção do
xualidade e do prazer derivado destas segregações sexo e do gênero para tornar o fazer cênico uma
–, o sexo em público é aquele que abre brechas, atividade de investigação subversiva. Uma busca
fendas, rachaduras para a transformação das nor- estética ligada à relexão crítica e, que baseada em
mas sociais que necessitam que este se entenda a noções de corporalidade ou torção e distensão cor-
sexualidade de forma tão sólida e estática. Uma re- poral transforma cenas, imagens e espaços, mesmo
presentação de sexualidade adquire o estatuto de que para isso a performance enquanto arte precise
pornograia, justamente, quando põe em marcha se auto-suprimir – as performances não se preocu-
pública aquilo que se supõe privado (PRECIADO, pam em termos de reinamento artístico – e pró-
2008). As performances pós-pornôs reterritoriali- prios performances, por consequência, precisem se
zam, pois, o uso sexual dos espaços públicos: as sacriicar isicamente – são comuns as intervenções
pornotopias – constituição de espaços pornográ- cirúrgicas, a manipulação para deformar órgãos se-
icos potentes e a pornograicação dos espaços de xuais, as cisões e perfurações no corpo. Enquanto
circulação de corpos (PRECIADO, 2004). Fazem a produção destas formas de sexualidade levada à
este movimento à custa de questionar os códigos cabo por exclusões do espaço público, uma realida-
estéticos, políticos e narrativos que tornam certos de que constitui tipos de sexualidades periféricas, a
corpos e certas formas de fazer sexo como visí- teatralização da pornograia irrompe como um te-
veis e que, por tabela, patologizam práticas sexuais atro de subjetivação: um sistema heterogêneo, um
dissidentes, na tentativa de manchar a honra das campo cuja relacionalidade se dirige tanto ao espa-
ço da pornograia como as normas de sexualização

1
Na tradução espanhola do livro The Secrets Museum, de Wal-
2
ter Kendrick (1995), foi acrescentada uma nota explicativa Heteronormatividade é entendida, aqui, como aquelas in-
sobre o signiicado da expressão hard core, que designaria na stituições, estruturas de compreensão e orientações práticas
atualidade, a pornograia ‘dura’ por oposição à pornograia que não apenas fazem com que a heterossexualidade pareça
‘suave’ ou soft core. O tradutor justiica a inclusão da nota coerente – ou seja, organizada como sexualidade – mas tam-
porque o título do capítulo original Hard at the core (Duro ao bém que seja privilegiada e seja projetada como um objetivo
centro, literalmente), é um jogo de palavras intraduzível para ideal ou moral, como o fundamento da sociedade (BER-
o espanhol. LANT, WARNER, 2002).
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que as performances questionam. A estética pouco SEIDMAN, 1996). Essas teorizações alertaram
depurada e as técnicas pouco trabalhadas se equi- para a icção política da sigla LGBT1, quando em-
libram, portanto, com um discurso crítico elabora- pregada para se referir ao conjunto da população
do, que propõe outras formas de vida e denuncia a que vivencia sua sexualidade em desacordo com
perseguição histórica e atual das minorais sexuais. as convenções culturais dominantes (JAGOSE,
Suas práticas demonstram, ademais, que se po- 1991). A política de identidades referendada por
dem elaborar pautas próprias de fabricam, produ- essencialismos remetia a relações binárias e fazia
ção e encenação. A produção do PostOp sinaliza, as- uso de categorias naturalizadas e universalizantes
sim, uma repolitização da arte da performance que que tendem a apagar as diferenças. Tal operação
faz com categorias sexuais sirvam para não serem não só ontologizaria um grupo político, histórico
subsumidas pelas formas de produção da indústria e socialmente delimitado como acabado e genera-
cultural da pornograia como para que as próprias lizado na experiência social cotidiana, como igno-
categorias cênicas possam romper com os moldes ra, quando não coíbe, as possibilidades de cruzar
hegemônicos de pensar e fazer um teatro político os limites do sexo e do gênero, bem como silencia
ou de protesto. O encontro da arte da performance a contestação das técnicas e tecnologias de esta-
com a pornograia radicaliza tanto uma noção de bilização das experiências sexuais e generiicadas
um teatro radical quanto a própria dimensão per- dominantes. Na mesma linha que deslocou radical-
formática da sexualidade. A sexualidade é sempre e em mente o sujeito de enunciação ao se reapropriar do
todo caso uma performance (SPRINKLE, 2001; PRE- insulto inglês queer - que em português se aproxi-
CIADO, 2008), um devir, um modo de tornar-se, maria dos insultos como viado, bicha, sapatão, mas
uma obra de arte viva. Não existiram roteiros se- também estranho, pervertido e tarado (LOPES,
xuais pré-dados, mas as icções sexuais que guiam 2001; PEREIRA, 2012) - e fez dele um espaço de
nossas vidas seriam construídas em cena, são per- ação política2, as performances pós-pornôs do Pos-
formáticas, só existem se fazendo, são encenação tOp reapropriam-se do discurso pornográico no
e artiicialidade (BULTER, 1990). No centro dessa desejo de inventar imaginários sexopoéticos e criar
perversão, está a pornograia que combinada com estratégias que ponham em questão aquilo que pa-
a fabulação imagética e a experimentação radical rece o mais óbvio: o sujeito sexuado.
do corpo traduz uma luta de vida e morte em que
aqueles que eram produzidos como objetos abje-
tos, nos termos de Judith Butler (2004), do saber 1
De acordo com Regina Facchini (2005) a sigla GLBT
médico, psiquiátrico ou antropológico, ou os anor- (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros, no qual estão
mais de Michel Foucault (2006), tentando sobrevi- alocados travestis e transexuais), atualmente renominada de
ver com base na tomada dos mesmos instrumentos LGBT, surgiu como contraponto à sigla GLS, percebida, pelo
para marcar o mundo que marcou as sexualidades movimento social, como algo que é atribuído "de fora" por
uma visão heterossexual e com pouco apelo político. Esta
dissidentes como abjetas e anormais, com as ou-
sigla tem se visto em meio a disputa de várias formulações
tras. marcadas por relações de poder, expressas em termos de
conlito ou de aliança, e que estão diretamente relacionadas à
A sacanagem do lado de dentro: partilhas produção, ao uso e à difusão de diferentes formulações para
de sexualidade o sujeito político do movimento.
2
De acordo com Regina Facchini (2005) a sigla GLBT
(Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros, no qual estão
As performances pós-pornôs do PostOp inten-
alocados travestis e transexuais), atualmente renominada de
tam levar até as últimas consequências um projeto LGBT, surgiu como contraponto à sigla GLS, percebida, pelo
político que no inal da década de 1980 reagiu con- movimento social, como algo que é atribuído "de fora" por
tras as, até então, chamadas políticas de identidades uma visão heterossexual e com pouco apelo político. Esta
gays e lésbicas e suas demandas de integração aos sigla tem se visto em meio às disputas de várias formulações
marcadas por relações de poder, expressas em termos de
marcos culturais da sociedade heteressoxual do-
conlito ou de aliança, e que estão diretamente relacionadas à
minante - aquilo que conhecemos pelo nome de produção, ao uso e à difusão de diferentes formulações para
teoria queer (BUTLER, 2002; SEDGWICK, 2004; o sujeito político do movimento.
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Não existe, entretanto, nenhum impulso nas subalternas de sexualidade –, explorando os espa-
performances pós-pornôs para a produção de uma ços de suas diferenças, formados negativamente e
teoria total da sexualidade; o que existe é a exibi- positivamente a partir de misturas e divisões. As
ção de uma experiência íntima das fronteiras da performances pós-pornôs põem em suspeita exata-
sexualidade, sua construção e desconstrução. É a mente a robustez e a transportabilidade da partição
experiência que permite contar a história do sujei- ontológica que nos alimenta. Quando a máxima do
to, de como os sujeitos são constituídos e não o dispositivo da sexualidade, como sugere Michael
contrário (SCOTT, 1996). Em outras palavras, é a Foucault (2004), pode ser traduzida em dizes com
experiência sexual que constitui a pessoalidade do quem fazes sexo e te direis quem és, as performances
sexo, o sexo da pessoa, a pessoa sexuada. Ressaltar pós-pornôs embaraçam a pergunta: quem é você?
essa dimensão performática da sexualidade, sua in- Ou ainda, quem sexualmente é você? Hoje, mais
corporação e materialização nos corpos por meio do nunca, a ciência, a antropologia, a medicina, a
de regimes de imagens, permite apreender que se psicanálise, a sociologia, a sexologia, a pedagogia,
um sujeito igura na experiência sexual é porque as políticas públicas, a imprensa, todos querem sa-
ele nela constituído. O sujeito da experiência se- ber sobre as “minorias sexuais”. Pedem que falem,
xual não é base nem produto, mas a possibilidade que se confessem, que negociem, que expliquem,
permanente de um processo de re-signiicação e que digam quem são e o que querem. As condi-
reconstituição permanente a partir de uma elabo- ções desta vontade de saber do sexo dos anormais,
ração de uma narração performativa coletiva, em entretanto, estão reguladas, de antemão, em quem
que a efetividade das narrativas sexuais, como, cer- tem o poder para escrever sobre essas vidas, coi-
ta vez, arguiu Ken Plummer (1995), depende da siicá-las, classiicá-las, documentá-las, convertê-las
habilidade para contá-las e da constituição uma em objetos (OLIVEIRA, 2011). As performances
audiência para ouvi-las. O que as performances pornôs se negam a tudo isto. Acabou-se o diálogo
pós-pornôs colocam em prova é a capacidade de consensual e a informação. Só vale o terrorismo, o
que qualquer prática sexual e qualquer imagem ou pornoterrorismo. Através do terror que pode causar
história a ela associada possa ser contada. Não por- um corpo não normativo, um ato sexual não le-
que se quer chegar ao sonho colorido da paridade gitimado, uma exposição pública de uma conduta
e equidade da igualdade política3, mas porque, sua sexual depravada em uma sociedade na qual as ex-
exposição cênica constitui um efeito de exposição periências sexuais são reguladas e normalizadas.
das estruturas de normalização do desejo em que a Suas escrituras reinscrevem que a política do
sexualidade está implicada. sexo não se faz mantendo a engenharia e arquitetu-
As performances fazem exatamente do estig- ras das nossas casas intactas, quando, sem dúvida,
ma, não um motivo de vergonha, que pesa sobre o espaço público tornou-se uma grande casa. Não
os corpos pornográicos, mas um espaço de subje- teria sido essa uma das grandes lições das ondas fe-
tivação política para viajar constantemente entre os ministas? O espaço público como o lugar do amor
submundos da sexualidade – ou entre as expressões romântico de brancos corpos masculinos e femini-
nos, aquilo que aprendemos a chamar de homem
e mulher que, juntos, serão felizes para sempre e
3
Poucas dicotomias, entre tantas que marcam as discussões povoarão a terra com seus ilhos: o sonho idílico
nos feminismos, provocaram impasses teóricos tão calorosos da cultura heterossexista (SEDGWICK, 1998). Só
quanta as levantadas pelo par diferença/igualdade. Para a his-
que há uma inindável quantidade de corpos e par-
toriadora feminista Joan Scott (2005), contudo, a discussão
sobre igualdade/ diferença tende a reproduzir justamente a celas de corpos que não pode, ou ainda que se re-
dicotomia que se pretendia romper. Longe de descaracterizá- cusam, funcionar dentro da lógica deste dispositi-
la, as performances pós-pornôs, deslocam os termos não para vo. Há corpos sexuais em performance que a todo
que a diferença seja usada para uma igualdade como ponto tempo expõem os problemas do sexo da política.
de chegada da política, mas que a igualdade seja convertida
Estes corpos em transe não são ainda reconhecidos
em ponto de partida da exposição de uma diferença política,
para tanto somente um exercício de ver e uma prática estética como participantes da comunidade política, mas já
torna possível essa colocação. criaram a fratura, a partir da qual outras imagens
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sexuais, outros dramas pornográicos terão que experiência artística. É neste campo de lutas que se
ser inventados, postos em performances. É em um formam as “consciências de fronteiras”, para icar-
único gesto que as performances pós-pornôs es- mos com os termos de Glória Anzaldúa (2001).
cancaram o dano da política sexual, uma política No teatro, aquele que atua, o ator, estaria sem-
criadora de seus personagens sexuais normais e pre escondido, oculto, apagado na performance de
anormais, e ao mesmo tempo abrem a cena da qual seu personagem. A egopolítica do personagem do
participam. Do mesmo modo como a teoria queer teatro ocidental tende a privilegiar o mito de um
tornou-se uma análise dos processos de categori- “eu” não situado no palco (CASE, 1996). O lugar
zação social e não o estudo de uma ou outra “mi- etnicorracial, de sexualidade ou de gênero e o sujei-
noria” sexual, o uso do pornográico não coincide to enunciador encontram-se sempre desvinculados.
com o consumo utilitarista e pós-colonial da por- A quebra da ligação entre o sujeito da enunciação e
nograia. A política das performances pós-pornôs o lugar etnicorracial/sexual/de gênero que ocupa
não está, deste modo, simplesmente em qualquer gera um mito que oculta não só aquele que fala
coisa que funcione em um contexto de relações como também o lugar geopolítico e corpo-político
sexuais existentes. Uma performance pós-pornô e das estruturas de poder que partir do qual o su-
sua política só poderiam existir como um processo jeito se pronuncia (GROSFOGUEL, 2008). Daí,
desestabilizador, um exercício estético que rompa porque faz sentido estarmos diante das próprias
com a ordem do dia, com suas conigurações de prostitutas, dos próprios atores e atrizes pornôs,
espaço e tempo de possibilidades, impondo-lhes das próprias sexualidades disparatadas fazendo
uma partilha sexual inaudita. pornograia com seus próprios corpos nos espaços
Levam a sugerir, ao contrário de um retorno na- urbanos. Essas experiências sexuais servem como
turalista do sujeito sexuado, uma maquinação de vetores de desconstrução, desmontadas, expostas
distintas naturezas sexuais, de distintas ontologias, radicalmente e reduzidas ao absurdo elas expõem:
distintos modos de ser e estar no mundo sexual- não a anormalidade de certos tipos de sujeitos, mas
mente, junto ou separado. O binômio natureza/ a anormalidade política da heteronormatividade
cultura, regulador primeiro e último da sexualidade para, no mesmo movimento, inscrevem-se como
e dos corpos, instaurador da cultura sexual moder- potências de reinscrição da vida da sexualidade.
na (SEDGWICK, 2008; PRECIADO, 2002), per- Torna-se, assim, ilusório para essas performan-
de, aqui, seu sentido. Não porque retornamos a um ces fazerem referências a um sujeito sexualmente
polo especíico da natureza, mas porque a natureza anormal ou mesmo muitos anormais que pudes-
da sexualidade aparece como processo de produ- sem falar através dela. O que elas expõem são uma
ção artiicial, uma encenação, uma performance. A heterogeneidade e uma multiplicidade dimensional
ambigüidade e a indecidibilidade que acompanham de experiências sexuais, as quais tratam de subje-
a performance pós-pornô têm o efeito de perturbar tividades precárias construídas no marco de uma
os binarismos culturais. Não apenas o sujeito auto- violência ética e política que as constituíram. As-
ritário e coerente das representações hegemônicas sim, no lugar de reivindicar a posição de represen-
de sexualidade e pornograia é questionado, mas tante de anormais que ouve a voz deles e os fazem
também se invoca outros sistemas simbólicos para aparecer, ecoada nas insurgências heroicas contra
recuperar e recodiicar os múltiplos nomes que a opressão, as performances pós-pornôs buscam
não se encontram contidos dentro dos registros expor a estratégia de heterossexualização da cul-
hegemônicos ocidentais da sexualidade. As per- tura como cerceamento da resistência mediante a
formances pós-pornôs fundem a instabilidade das imposição de um regime de imagens que tona o
fronteiras identitárias e culturais com as próprias irrompimento das sexualidades não normalizadas
fronteiras do artístico e do cênico, onde não há de antemão desqualiicáveis esteticamente.
reducionismos possíveis, mas tensões postas pelo Libertadas, assim, da posição de basear a políti-
desconforto e desaios de serem apontadas como ca em uma posição supostamente privilegiada com
inadequadas – seja para luta política do movimento relação à expressão da opressão sexual e ainda bem
LGBT, por exemplo; seja para a consagração como longe de uma pretensa pornograia politicamente
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correta (GREGORI, 2004), podemos vislumbrar uma estratégia estética e retórica como também
possibilidades de potenciação dos corpos e dos em um método político. Entretanto, este não é um
desejos. Sem poder mais contar com nenhum so- processo de imposição política frente aos escân-
nho original relativamente comum, nem com uma dalos do sexo em público, sem que seja constituti-
simbiótica natural que prometa uma proteção da vamente um processo ao mesmo tempo de cons-
separação masculina e hostil, somos inscritos em trução e de agenciamento. Entre a normalização
um jogo de imagens sexuais que não tem nenhuma da pornograia e a resistência pós-pornográica, as
leitura inalmente privilegiada nem sequer uma his- performances desmontam teatralmente a retórica
tória de salvação. Contudo, também não estamos que dominam a representação pornográica e des-
em direção a uma sociedade em que se aboliu ou vela os mecanismos teatrais e visuais que constro-
se perdeu toda memória das diferenças sexuais e em o corpo e o sujeito da sexualidade.
do lugar do pornográico, tampouco diante de uma É esta, deste modo e, sobretudo, uma luta na
pretensão de abolir a distância que nos separa das imagem, um luta contra imagens sexuais únicas que
formas de vida sexuais impuras. As performances traduziriam todo o signiicado de forma perfeita.
pós-pornôs fazem da distância que nos separa das Por isso, as performances pós-pornôs insistem no
formas sexuais disparatadas, um novo uso: não o ruído e na poluição, arracando visualidades poéti-
da abjeção política, mas o da política da abjeção. cas de formas sexuais impuras. Não se trata mais de
Como artefato estético que só existe na negocia- nos proteger da pornograia, antes de tudo porque
ção entre performer e audiência constituída histó- a descodiicação e a experiência da representação é
rica e culturalmente (CARLSON, 2009), portanto sempre um trabalho semiótico aberto, do qual não
a partir da distância operadora entre espectador há porque se prevenir. Trata-se de alcançar a pós-
e performer com a qual se deve negociar e fazer-se pornograia como um exercício de tencionar as re-
uso (RANCIÈRE, 2010), a arte da performance lações e tensões entre natureza e cultura, privado e
pós-pornô – sinalizam as experiências cênicas do público, do singular e do comum, da política e do
PostOp – brinca com o perigo e sacaneia o corpo sexo. Não à custa de resolvê-las, ainda que dialeti-
social do lado de dentro. Em lugar de entender as camente, em totalidades cada vez mais amplas, mas
sexualidades disparatadas como patologias psicoló- há de se atacar por dentro da ordem que garante a
gicas, elas invertem e pervertem o foco: a normali- consistência e materialidade de seu discurso, traçar
zação e seus efeitos são, agora, patologias políticas. linhas de fuga que fazem da sexualidade uma obra
Estamos muito, assim, mais próximo de uma de criação artística. Eis os giros políticos da estética
espécie de gagueira sexual imposta ao discurso pós-pornô. O que emerge daí? Um domínio onde
pornográico, forçado a dobrar-se sobre si mes- tudo é possível a um corpo sexuado, as conexões
mo, tornado estranho em sua própria língua para sem im, as disjunções sem exclusividade, as con-
inventar outras formas públicas, compartilhadas junções sem nome, enim, a orgia. Holocausto das
e coletivas, de sexualidade que superem o estreito fadas nestes contos de fodas.
marco da pornograia dominante e o consumo se-
xual normalizado. Podemos começar a entender, Emancipação do ânus: a imagem do corpo
pois, a enunciação da pós-pornograia do PostOp sexuado
como um momento de resistência pela criação
estética dentro de um amplo processo de produ- Imagem 3: Oh-Kanaã
ção de experiências e subjetividades no interior do Estacionamento de uma galeria de arte, em Barcelona.
atual regime de disciplinamento sexual. O que as Atores e atrizes usam diversos apetrechos de couros, incluin-
performances pós-pornôs põem na rua não é uma do uma focinheira cobrindo os rostos. Entram de quatro,
simples teatralização das sexualidades dissidentes, furiosos e indomáveis, cada um deles portando uma coleira
mas o jogo performático da política sexual na ten- presa a longas correntes seguramente mantidas por algumas
tativa, ainda que sem garantias, de inscrever outras gordas senhoras mascaradas e armadas de chicote, certamen-
imagens sexuais no corpo de uma comunidade po- te uma Dominatrix. São cavalos? Cachorros? Bestas-feras?
lítica. As imagens pornográicas se constituem em Nunca se saberá. A orgia começa: atrizes com dildos na
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cabeça penetram nos ânus dos rapazes, outras se masturbam quais nossos olhos e outros órgãos estão submeti-
com vaporizadores, rapazes fazem sexo oral nos dildos das dos na vida cotidiana. A forma de existência sexual
gordas senhoras enquanto são chicoteados. dos corpos implica uma territorialização precisa do
corpo, da boca, da vagina, da mão, do pênis, do
Na última parte deste artigo, tomarei uma ou- ânus, da pele que assegura uma relação entre iden-
sada licença para pensar a constituição do corpo tidade de gênero e produção de certos órgãos, lo-
nas performances pós-pornôs. Ao sistema discipli- gicamente em detrimento de outros, como órgãos
nar das tecnologias de gênero e do sexo que mar- sexuais. O corpo sexuado é construído em torno
cam e pesam sobre os corpos, as performances do de um tubo com dois orifícios: a boca que emite
PostOp oferecem outras imagens que fazem girar signos públicos e um ânus impenetrável, fazendo
o dispositivo da sexualidade a im de potencializar girar em torno deles territórios existenciais que
o corpo – movimento que gostaria de chamar de adquirem posições de corpos sociais privilegiados
emancipação do ânus. Mais do que um órgão abjeto, (PRECIADO, 2008). O que as performances pós-
um tipo de imagem constantemente evocada nas pornôs denunciam é o axioma moral que faz dos
performances. Se o olhar pornográico é convoca- órgãos sexuais literalmente ob-scenos, isto é, fora de
do na pornograia com o objetivo de uma mastur- cena, cujo valor não poderia ser transformado em
bação planetária multimídia (PRECIADO, 2008), arte.
o espectador está longe de se constituir como um Se as performances põem em xeque a sexuali-
espectador voyeur passivo. Como regime de pro- zação do corpo, dessexualizando os órgãos sexuais
dução audiovisual e performativa, a pornograia e sexualizando o corpo em alhures, é justamente
está envolvida na produção de saberes e usos dos por reconhecer que o espectador é também um
prazeres corporais, convocando um exercício de performer do sexo que este também tem seu corpo
ver corpos e formas sexuais. É a esse olhar ativo inscrito em experiências sexuais reguladas – o olho
e masturbatório que uma performance pós-pornô do cidadão adulto, homem branco heterossexual, e
lança um ultimato sexual. Não porque as perfor- seu pensamento straight, na fórmula clássica de Mo-
mances rompam com a noção de espectador, os nique Wittig (1987). Daí, porque seu olhar, como
convertendo em atores, na tentativa de eliminar a metáfora do seu corpo, precisa ser desconectado
distância que separa o espectador dos performers. e desmontando, seu olho precise ser convertido
Ao contrário, elas só se sustentam se convocarem em ânus, curto-circuitando a organização biológica
a distância que separa espectador e performers, e, e política do corpo. Enim, se o sexo é uma per-
por consequência, o olhar pornográico. A inten- formance política, o investimento das performan-
ção principal não parece está no público que senta ces do PostOp é para fazer gaguejar os sistemas de
e reage, nem que ele se levante de seus assentos raciocínios que regulam nossos corpos sexuados,
transformado; está, sobretudo, na inserção de um sua organização e os usos de seus desejos. Se há
ponto de inlexão no olhar metido entre o corpo alguma emancipação em vista é para levar nossas
e alma, que seu olhar enquanto corpo e enquanto experiências sexuais contra si mesmas, para abrir-
pensamento participe da manifestação que está ali mos os corpos para que atravessem lorestas de
sendo elaborado. dildos, mãos, vaginas, pênis, ists, sucções, abdu-
As performances jogam, deste modo, o olhar ções, algemas, velas, agulhas, cones, cabos. Corpos
do espectador diante de imagens de outros corpos sem órgãos, diriam Deluze e Guattari (1997), ór-
fazendo sexo, de modo a aventurá-lo por conexões gãos sem corpos, acrescentariam as performances.
insuspeitadas e imprevistas com as estruturas de A pós-pornograia, aqui, emerge ao mesmo tempo
normalização da cultura. Parece ser ingênuo, con- em que uma poética propõe reterritorialização do
tudo, acreditar que o coletivo pós-pornô intente corpo e reorganiza a relação entre órgãos e produ-
uma comunidade de “porras-loucas sexuais”, recu- ção de prazer. O que resulta estranho é que esta re-
perando a maré neoromântica do sonho dos anos espacialização do prazer produz um agenciamento
de 1970. Sua inscrição se volta para desnaturar os do corpo que escapa a economia heterossexual e
regimes de visibilidades e dizibilidades sexuais aos reprodutiva que conecta pênis e vagina. Para tor-
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nar o corpo essa espaço problemático e potente, o em um giro epistemológico. Desloca também, por
PostOp oferece a imagem de um corpo como um tabela, a imagem de que um órgão como o ânus ou
grande orifício vazado, aberto às afecções eróticas qualquer outro posso funcionar como deinidor de
do mundo, um grande ânus escancarado a todos os um prática sexual ou de um certo tipo de sujeito
tipos de penetrações. Ânus Solar – dizia o título da que a mantém – o ânus de um gay ou mesmo o que
performance pós-pornô de Ron Athey1. um gay entende por ânus, por exemplo. Com efei-
Porque exatamente o ânus? O ânus é um ór- to, se todo o movimento do pós-pornô é uma in-
gão duplo e ambíguo. É uma grande metáfora do vestida política, não há um relativismo absoluto na
controle dos sistemas social, mas, ao mesmo tem- estética pós-pornô, justamente em função de sua
po, nossa grande potência de ação (SAEZ; CAR- postura política. A posição politizada, que aparece
RASCOJA, 2011). É o primeiro órgão privatizado, com e nos pós-pornôs, inclusive sua antecedência
colocado fora do campo social, aquele que servirá pela partícula “pós” precisam enfrentar, aqui, seus
como modelo para toda posterior privatização do próprios limites3. Sua mobilidade aponta para um
corpo (DELEUZE; GUATTARI, 2004). Privatiza-
ção que se torna um passo essencial para instaurar
o disciplinamento moral sobre o corpo. Contudo, 3
Ema uma instigante análise sobre pós-feminismo e a morte
o ânus como centro de produção de prazer e saber do feminismo, Hawkesworth (2006) aponta alguns mecanis-
não tem gênero, não é nem masculino nem femini- mos e estratégias que tornam problemático o termo pós. No
no, produz um curto-circuito na divisão sexual ge- que pese as distinções entre pós-pornograia e movimento
neriicada. A imagem do ânus também nos recorda feminista, a autora ressalta, por exemplo, um fervor midiático
pelo termo pós-feminismo que não parece ter seu correlato
incessantemente da fragilidade do nosso corpo,
com a pós-pornograia, mas entendendo a íntima conexão en-
centro de passividade primordial, lugar abjeto por tre eles, uso alguns dos seus argumentos para apontar os lim-
excelência, próximo do detrito. Uma fragilidade que ites do termo pós-pornograia. Primeiro, que pós-pornograia
não é tanto uma doença, uma patologia, mas um pode evocar uma certidão de obtido para a pornograia usual.
lembrete da abertura do corpo às forças do mundo. O que, de fato, não só é uma inverdade – o mercado pornográ-
ico nunca futurou tanto nos últimos anos – como tende, de-
Um corpo é um grande sistema aberto, necessita
liberadamente, a obscurecer o modo como formas e práticas
permanentemente de intercâmbios de energia, in- deste mercado têm migrado para outras formas da cultura, col-
formação, provação, força, matéria (DELEUZE, onizando desejos e corpos. Ademais, a escrita desse obituário
2002). Anus is a open scar - dizia o título da perfor- não deixa de evocar o movimento de pós-pornograia como
mance do ativista gay Warbear2. A emancipação do unívoco e idealizado, desconsiderando estratégias multilocais
de crítica artística a pornograia ou de criação de outras esté-
ânus que propõem as performances do PostOp é
ticas das sexualidades que podem ou não coadunar com o mo-
um exercício de transmutar o corpo sexuado em vimento pós-pornô. Segundo, dentro o imaginário do termo
um ânus, um grande ânus aberto e em cópula. Per- pós, ele torna-se um marcador de tempo assim como de es-
tencer ao mundo invoca o desejo e é neste desejo paço, sugerindo uma sequência temporal na qual a pornograia
que reside muita da paixão do pós-pornô. teria sido transcendida, ocluída e ultrapassada por um movi-
mento que é tanto mais atento às dinâmicas sociais contem-
A produção de um olhar intensivo como o exigi-
porâneas como que veio promover sua redenção. Quando a
do pelas performances pós-pornôs precisa mesmo pornograia vira coisa do passado, as inovações do pós-pornô
desaiar, minar, perturbar a distribuição hierárqui- poderiam ser lidas, assim, como um banimento da própria
ca dos órgãos no organograma anatômico do dis- pornograia. Um paradoxo que deixaria claro que os limites
curso médico em que está situado o espectador. O do sexualmente viável podem ser redesenhados para sustar o
efeito político de qualquer presença artística que elege o ques-
mesmo contra qual o PostOp mobilizou a existência
tionamento de modos dominantes da cultura sexual. Dentro
de suas performances ao dar nome ao seu coletivo dessa estrutura, a pós-pornograia produziria, ao seu modo,
harmonia social e a restauração dos valores tradicionais, já que
permitiria a todos os membros da comunidade lorescerem de
acordo com suas inclinações "naturais". Por im, todos aqueles
que tomam a pornograia como objeto de arte performática
1
Disponível em: http://www.youtube.com/
watch?v=NQzI9oVOcT4. Acesso em: nov. 2011. são, então, recolados no espaço político por uma exclusão vital
2
Disponível em: http://vimeo.com/6118497. Acesso em: de sua potência estética através da qual a comunidade política
nov. 2011. reconigura seus limites.
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movimento que resiste a tendência de ixar, esque- ples presença agrega a dor e o prazer dos relegados
matizar, organizar, classiicar e estabilizar a frag- à condição de anormais, situando sua arte tanto de
mentação e luidez do pensamento e da existência. um ponto de vista político como estético dentro de
Alinha também uma crítica às preocupações artís- várias dimensões marginais. Falar de performance
ticas com a sexualidade à custa de qualquer reco- pós-pornô não é, portanto, apenas dar voz (ou vi-
nhecimento do desejo pela identidade estanque e sibilidade) àquelas e àqueles anormais que foram
moralmente aceitável. privados de voz ou se fazerem visível. Mais do que
A poética e política de uma performance do Pos- isso, elas vêm participar do esforço para prover ou-
tOp são, assim, mais imediatas, mais francas, mais tra gramática, outra estética, outras referências po-
carnais, mais agarradas às necessidades básicas de líticas que não aquelas imagens de sexo e sexuadas
uma gente que anda com o corpo pelo ares, ex- que aprendemos a ver como as “verdadeiras” e, até
cluídas do espaço de signiicação política. Não dar mesmo, as únicas dignas de serem aprendidas, res-
nada e roubar tudo que o sistema social despeja so- peitadas e usadas nos debates políticos e culturais
bre os corpos. Como disse, certa vez, Guy de Ho- sobre sexualidade. O resultado desta confrontação
cquengheim (1972, p. 72), “o buraco do meu cu é é a produção de uma estética pós-pornográica em
revolucionário”. Não seria, ao inal das contas, essa que se põem em manifesto os dispositivos polí-
uma das funções do pornográico? Não só de fazer ticos que nos constituem como corpos sexuais e
toda uma sintomatologia do presente, mas também generiicados.
o de negar o real para suspendê-lo e estranhá-lo
(DELEUZE, 2009), o real dos sonhos e da vida, REFERÊNCIAS
dos corpos e do sexo, da loucura e da paixão? As
performances pós-pornôs constituem um corpo ADELMAN, Miriam. A Voz e a Escuta: encontros
que olha pelo ânus. Uma prática cênica que almeja e desencontros entre a teoria feminista e a sociolo-
ambiciosamente um corpo em seus orifícios como gia contemporânea. Florianópolis: Blucher Acadê-
capaz de absorver tudo, apoderar-se de todas as mico. 2009.
imagens pornográicas, sem ter que, com isso, dar ABREU, Nuno Cesar. O olhar pornô. Campinas:
nada em troca. O que interessa, aqui, é a possibi- Mercado das Letras, 1996.
lidade do ânus signiicar um modo de olhar como AGAMBEN, Giorgio. Profanações. São Paulo: Boi-
um mesmo corpo pode funcionar como um abrigo tempo, 2007.
de várias sexualidades e da multiplicidade sexual. O ARCAND, Bernard. El Jaguar y el Oso hormiguero:
corpo no pós-pornô não precisa dar nenhum tipo antropología de la pornografía. Buenos Aires: Edi-
de sinal que chegou a algum lugar no inal de uma torial Nueva Visión, 1993.
jornada ou de um gozo, que chegou a algum tipo ATTWOOD, Feona. Reading porn: the paradigm
de igualdade sexual como ilusão de um futuro, que shift in pornography research. Sexualities, n. 5, v. 1,
chegou a ser alguém no inal de uma experiência p. 91-105, 2002.
sexual – ainal esse “alguém” está sempre por se ATTWOOD, Feona. Sexed up: theorizing the sexu-
fazer, esse corpo está sempre por vir. alization of culture. Sexualities, v. 9, n. 77, p. 77-94,
Novamente é necessário retornar a fórmula: a 2006.
sexualidade é uma performance, um modo de tor- BAL, Mieke. Travelling concepts in the humanities: a
nar-se, um devir, e trata-se de alimentar a existên- rough guide. Toronto: University of Toronto Press,
cia sexual de uma comunidade com imagens que a 2002.
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