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FLORIANÓPOLIS - SC
2009
MELISSA HAAG RODRIGUES
FLORIANÓPOLIS – SC
2009
R696i
CDD: 371.32
MELISSA HAAG RODRIGUES
Banca Examinadora:
Orientadora: ________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Neli Klix Freitas
CEART - UDESC
Avaliadora: ________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Sandra Regina Ramalho e Oliveira
CEART - UDESC
Suplente: ________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Lúcia Batezat Duarte
CEART - UDESC
The propose of the Master's degree dissertation research was to identify and analyze the
mediator role of the didactic book for the child, having as aim associations among images,
words and learning. Through the relationship of the child with his/her didactic book we try
to identify the relation among its visual quality, its content and the possibility of mediate
the process of building knowledge. Up to the description of the didactic book in Brazil, it
was possible to observe the modifications through which it has gone through the time, as
well as the building of the childhood concept and the interactions of the child with the
book in the school. Studying the important conceptions of Vygotsky theory as
development, learning, mediation, levels and areas of development, social interactions and
culture it was observed that the didactic book through associations between images and
words, acts as a helpful external stimulation system, so acting as a real mediator for the
child. Together with the theoretical research was performed a field work at a State School
in the city of Brusque/SC: were interviewed two 4th grade teachers of the secondary school,
one being the class teacher and the other the art teacher, and also held a focus group with
eight students of that same class. Up to the analysis and interpretation of the data
collected, it was possible to observe important topics, as interactions among images,
words and learning; the visual communication that the didactic book contains, implicit
important aspects in the complex scheme that integrates perception, visual
communication, images, words and learning in the child. It is highly important in that
dynamic the importance of visual quality and the graphic of the book. These questions
contribute for a reciprocity relation between the book and the child, so the conclusion is
that the didactic book is an important mediator element in the building of knowledge. If
the visual communication of the didactic book is suitable, if the subjects are seen based on
such associations between images and words, the child is able to get it in a more
satisfactory, and mainly in a pleasant way the school knowledge.
Fig. 1 - Capas dos volumes que compõem o Guia do Livro Didático 2007 ................................ 22
Fig. 2 - Como funciona a escolha dos livros didáticos no Brasil ..................................................... 23
Fig. 3 - Capa e página de rosto do livro Através do Brasil.................................................................. 29
Fig. 4 - Capa do livro didático Conjuncções: notas elucidativas e exercícios práticos................. 31
Fig. 5 - Capa do livro Casa de Maribondos.............................................................................................. 31
Fig. 6 - Capa do livro didático História do Brasil ................................................................................... 32
Fig. 7 - Capa do livro didático Estudos Sociais....................................................................................... 32
Fig. 8 - Capa da cartilha No Reino da Alegria.......................................................................................... 33
Fig. 9 - Quadro O Reverendo Randall Burroughs e seu filho Ellis, 1769............................................ 41
Fig. 10 - Capa e página do livro Orbis Sensualium Pictus................................................................... 52
Fig. 11 - Detalhe da página do livro Orbis Sensualium Pictus........................................................... 52
Fig. 12 - Capa do livro Zang Tumb Tumb ................................................................................................ 67
Fig. 13 - Poema Desabar............................................................................................................................... 67
Fig. 14 - Capas dos livros didáticos do Projeto Pitanguá da Editora Moderna.......................... 69
Fig. 15 - Capa do livro didático Matemática do cotidiano & suas conexões.................................. 87
Fig. 16 - Páginas 8 e 9, início da 1ª. unidade do livro de Matemática ........................................... 88
Fig. 17 - Páginas 16 e 17 da 1ª. unidade do livro de Matemática................................................... 89
Fig. 18 - Páginas 24 e 25 da 1ª. unidade do livro de Matemática................................................... 90
Fig. 19 - Páginas 18 e 19 da 1ª. unidade do livro de Matemática................................................... 91
Fig. 20 - Capa do livro didático Projeto Pitanguá: Português............................................................ 92
Fig. 21 - Páginas 14 e 15 da 1ª. unidade do livro de Português...................................................... 93
Fig. 22 - Páginas 12 e 13 da 1ª. unidade do livro de Português...................................................... 94
Fig. 23 - Páginas 6 e 7, início da 1ª. unidade do livro de Português .............................................. 96
Fig. 24 - Páginas 20 e 21 da 1ª. unidade do livro de Português...................................................... 97
Fig. 25 - Ilustrações que aparecem ao longo da 1ª. unidade........................................................... 97
LISTA DE TABELAS
INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................................................13
Capítulo 4 - METODOLOGIA..........................................................................................................................................73
4.1 Percurso metodológico.......................................................................................................................................73
4.2 Procedimentos de coleta dos dados..............................................................................................................76
4.3 Procedimentos de análise dos dados ............................................................................................................77
14
Através dessas informações buscou-se identificar as relações entre o livro didático e
a criança, perceber questões importantes como interações entre imagens, palavras e
aprendizagens, bem como a comunicação visual que o livro didático contém, aspectos
importantes implícitos na complexa trama que integra percepção, comunicação visual,
imagens, palavras e aprendizagens na criança.
15
- Capítulo 1 -
O livro didático é ainda um dos recursos mais utilizados nas escolas de muitos
países e há muito tempo discute-se sua importância nos processos de ensino e
aprendizagem, implícitos na construção do conhecimento. Pode-se entender atualmente
por livro didático os que contém o conteúdo básico de uma determinada disciplina e que
são publicados para fins educativos, mas sua definição pode se tornar bem mais complexa
devido à sua natureza. De acordo com Bittencourt (1998, p.71) o livro didático é antes de
mais nada uma “mercadoria”, que sofre diversas interferências em seu processo de
produção e comercialização; é um “depositário dos conteúdos escolares”, sistematizador
dos currículos, onde ocorre o deslocamento e adaptação do saber acadêmico para o
escolar; é também um “instrumento pedagógico” que mostra como os conteúdos devem
ser trabalhados; e por último é um “veículo portador de um sistema de valores, de uma
ideologia, de uma cultura”. Pode ser definido também como um produto cultural
composto, híbrido, que se encontra no “cruzamento da cultura, da pedagogia, da
produção editorial e da sociedade” (STRAY, 1993, p. 77-78).
Em outra perspectiva, Lajolo e Zilberman (2003, p. 120-121) contribuem dizendo:
[...] o livro didático é o primo-pobre da literatura, texto para ler e botar fora,
descartável porque anacrônico [...] Por outro lado, ele é o primo-rico das editoras:
as primeiras e as mais antigas já o incluíam em seus catálogos, e as atuais e mais
modernas sonham com dispor de um ou mais títulos [...] A vendabilidade do
didático é certa, conta com o apoio do sistema de ensino e o abrigo do Estado, é
aceita por pais e educadores.
16
- Capítulo 1 -
1
Jan Amos Comenius (1592-1670) foi um professor, cientista e escritor checo.
17
- Capítulo 1 -
18
- Capítulo 1 -
2
Decreto-lei nº 93 de 21/12/1937, determinado pelo Presidente da República Getúlio Vargas, por iniciativa do
ministro da educação Gustavo Capanema. Fonte: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.
action?id=103227>.
3
O Decreto-lei nº 1.006 de 30/12/1938, determinado pelo Presidente da República Getúlio Vargas, estabeleceu
também as condições de produção, importação e utilização do livro didático. Fonte:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=34467>.
4
O Decreto-lei nº 8.460, de 26/12/1945, determinado pelo Presidente da República José Linhares, consolidou a
legislação sobre as condições de produção, importação e utilização do livro didático. Fonte:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=30359>.
19
- Capítulo 1 -
Esta comissão tinha como objetivo coordenar as ações referentes à produção, edição e
distribuição do livro didático e pretendia distribuir gratuitamente 51 milhões de livros no
período de três anos. Em relação a este acordo houve diversas críticas por parte de
educadores brasileiros. Segundo Romanelli (1978, p.213 apud FREITAG et al., 1989, p. 15):
5
O Decreto nº 77.107, de 4/2/1976, determinado pelo Presidente da República Ernesto Geisel,
dispôs sobre a edição e distribuição de livros textos e deu outras providências. Fonte:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes. action?id=123251>.
20
- Capítulo 1 -
Alguns fatos que marcaram o PNLD foram a redução da distribuição dos livros até a
4ª série do ensino fundamental devido à limitações orçamentárias em 1992 e a posterior
resolução de 1993 que veio estabelecer um fluxo regular de verbas para a aquisição e
distribuição do livro didático. De forma gradual a distribuição dos livros foi normalizada a
todo o ensino fundamental público.
Para que o livro didático chegasse às escolas foram feitas inúmeras tentativas,
porém só com a extinção em 1997 da FAE e com a transferência integral da política de
execução do PNLD para o FNDE é que se iniciou uma produção e distribuição contínua e
massiva de livros didáticos.
6
O decreto nº 91.542 de 19/8/1985, determinado pelo Presidente da República José Sarney, instituiu o
Programa Nacional do Livro Didático, dispôs sobre sua execução, além de outras providências que entraram
em vigor no ano letivo de 1986. Fonte: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.
action?id=218965>.
21
- Capítulo 1 -
Fig. 1 - Capas dos volumes que compõem o Guia do Livro Didático 20078
7
Estas resenhas são elaboradas por especialistas, de universidades públicas, selecionados pela Secretaria de
Educação Básica (SEB/MEC), responsável pela avaliação pedagógica, que analisam as obras, conforme
critérios divulgados em edital.
8
Fonte: <http://portal.mec.gov.br/seb/index.php?option=content&task=view&id=377>. Imagem adaptada.
22
- Capítulo 1 -
A escolha dos livros é feita pelos professores das escolas públicas de todo o país,
por meio do Guia do Livro Didático. Eles têm a oportunidade de escolher os livros de sua
preferência para serem trabalhados pelo período de três anos, sendo que o livro escolhido
só poderá ser substituído por outro título no próximo PNLD. São escolhidas duas opções
de títulos por disciplina e, se a primeira não conseguir ser negociada com os detentores
dos direitos autorais e editores, a segunda passará a valer. Os professores de uma mesma
disciplina precisam chegar a um consenso sobre a escolha do livro pois a mesma obra
valerá para toda a escola.
De acordo com o FNDE (2008) não há repasse de recursos para a aquisição dos
livros, pois é realizada de forma centralizada, uma vez que o próprio fundo executa
diretamente os programas. Depois de efetuada a compra, eles são enviados aos estados,
municípios, entidades comunitárias e filantrópicas e entidades parceiras do Brasil
Alfabetizado9.
Além do PNLD, o governo federal executa outros dois programas relacionados ao
livro didático para prover as escolas das redes federal, estadual e municipal e as entidades
parceiras do programa Brasil Alfabetizado: o Programa Nacional do Livro Didático para o
Ensino Médio (PNLEM) criado em 2004 e o Programa Nacional do Livro Didático para a
Alfabetização de Jovens e Adultos (PNLA).
9
Programa criado pelo MEC em 2003 que capacita alfabetizadores e alfabetiza cidadãos com 15 anos ou
mais, que não tiveram oportunidade, ou foram excluídos da escola, antes de aprenderem a ler e a escrever.
10
Fontes: Ministério da Educação, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e Associação Brasileira
de Editores de Livros. Imagem adaptada pela autora a partir de gráfico da revista Época n° 492 de 22/10/07.
23
- Capítulo 1 -
11
A Fundação Dorina Nowill para Cegos, situada em São Paulo, oferece programas de tratamento aos
deficientes visuais, além de proporcionar o acesso à cultura e informação através dos serviços que presta
gratuitamente como a produção de livros em Braille que são distribuídos também para centenas de escolas,
bibliotecas e organizações de todo o país. Fonte: <http://www.fundacaodorina.org.br>.
12
O Instituto Benjamin Constant, situado no Rio de Janeiro, foi criado pelo Imperador D.Pedro II em 1854.
Atualmente é um centro de referência para questões da deficiência visual: possui uma escola, capacita
profissionais, assessora escolas e instituições, realiza consultas oftalmológicas à população, reabilita, produz
material especializado, impressos em Braille e publicações científicas. Fonte: <http://www.ibc.gov.br>.
13
Dados da pesquisa publicados na revista Época n° 492 de 22 de outubro de 2007.
24
- Capítulo 1 -
14
O Sistema de Controle de Remanejamento e Reserva Técnica (Siscort), criado em 2003, tem por finalidade
auxiliar as redes públicas de ensino fundamental a remanejar os livros didáticos distribuídos pelo PNLD.
25
- Capítulo 1 -
15
A portaria nº 2.678 de 24/09/2002 aprovou o projeto da Grafia Braille para a Língua Portuguesa e
recomendou o seu uso em todo o território nacional, a partir de 1° de janeiro de 2003. Fonte:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/txt/grafiaport.txt>.
16
Fonte: <http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=livro_braille.html#historico>.
26
- Capítulo 1 -
de Dados LIVRES, este projeto tem a finalidade de recensear os livros didáticos brasileiros
produzidos desde 1810 e disponibilizar as informações pela Internet17. O LIVRES é
ampliado constantemente por meio de pesquisas que analisam o livro didático em seus
diferentes aspectos, desde os conteúdos das diversas disciplinas, o processo de produção
e história das editoras, a memória e usos dos livros em salas de aula. Este projeto de
pesquisa conta também com intercâmbio com outros centros de pesquisa do Brasil e do
mundo.
17
Site do Projeto Livres: <http://paje.fe.usp.br/estrutura/livres/>.
27
- Capítulo 1 -
18
CHOPPIN, 2004. O artigo História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte se originou da
comunicação feita no XXII Congresso do ISHEE em Alcalá, Espanha e foi publicado originalmente na revista
Paedagogica Histórica, v. 38, n. 1, 2002 , p.21-49.
28
- Capítulo 1 -
Em relação ao seu aspecto visual, conforme Santos e Oliva (2004), o livro era
organizado e sóbrio, não se distanciando muito do padrão da época. Na introdução os
autores afirmavam que as ilustrações deviam servir como pretexto para mostrar a
realidade e, nesse sentido, procuraram construir uma coerência entre a imagem e o texto.
A primeira edição do livro apresentava um grande e diversificado conteúdo iconográfico
ao longo de seus 82 capítulos, com 68 ilustrações, divididas entre fotografias, cartões
postais e desenhos.
O livro escolar Através do Brasil assim como tantos outros na época, os considerados
“bons”, eram impressos, na maioria das vezes, em Paris, devido à falta de máquinas
adequadas para impressão no país. Muitos editores adaptavam máquinas de imprimir
jornais para imprimir livros, o que comprometia a qualidade do produto. As gráficas se
ocupavam da produção de livros apenas no tempo ocioso, pois o foco principal era a
impressão de jornais, revistas e almanaques. A questão do preço e da qualidade favorecia o
envio de material para impressão no exterior.
O responsável por uma verdadeira revolução no setor gráfico brasileiro foi Monteiro
Lobato - escritor, editor e adaptador - que mudou o perfil da indústria editorial em apenas
sete anos (FEIJÓ, 2005). O contexto em que ele se encontrava era o de um mundo abalado
com o início da Primeira Guerra Mundial que causou impacto na indústria nacional, uma
vez que as importações vindas da Europa foram comprometidas. Este fato ocasionou um
19
Fonte: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=didaticos01>.
29
- Capítulo 1 -
A importância do aspecto visual dos livros lançados pela sua editora era tamanha
que chegou a culpar uma capa pelo fracasso das vendas. Para ele, que tinha um
pensamento diferente do vigente na época, o livro era uma mercadoria como qualquer
outra e, como tal deveria atrair a atenção do leitor/consumidor. A apresentação gráfica dos
seus livros, com capas ilustradas e coloridas, fugia do padrão dos demais, que
apresentavam capas amarelas e tipográficas. Para ele “planejamento industrial, criação
artística e comércio com objetivo de lucro não eram atividades estanques, não estavam
separadas por barreiras intransponíveis” (FEIJÓ, 2005, p.463).
A preocupação com a materialidade do impresso abrangia também a categoria dos
livros didáticos. Debus relata que Lobato, na Revista do Brasil, em 1919, avaliou
positivamente a qualidade educativa do livro didático Prossigamos, de Luiz Rubano, porém
criticou a qualidade do impresso: “má impressão, mau papel, má distribuição, e sobretudo,
[...] desenhos dos menos adequados, se é que a isso possa chamar-se desenhos”. Para o
escritor-editor, fazer livros para crianças era coisa séria e era preciso trabalhar não só com
“inteligência e coração, mas com uma elevada argúcia e cuidado” (DEBUS, 2004, p.46).
30
- Capítulo 1 -
Fig. 4 - Capa do livro didático Conjuncções: notas Fig. 5 - Capa do livro Casa de Maribondos21
elucidativas e exercícios práticos20 Autor: João do Norte, Ed. Monteiro Lobato, 1921
Autor: Leonardo Pinto, Ed. Monteiro Lobato, 1922
Lobato observou também que o livro escolar tinha um retorno garantido sobre o
investimento realizado e iniciou a produção desta mercadoria. Antes disso já havia
inaugurado um procedimento, que se tornou comum às editoras, e que possibilitava uma
grande divulgação e aproximação com as escolas: enviava gratuitamente livros para as
instituições. Foi com Lobato que o livro de leitura para a escola finalmente se nacionalizou:
“livros escritos por um brasileiro, para crianças brasileiras, editados e impressos no Brasil,
distribuídos de forma massificada (para os padrões da época) e fartamente consumidos
pelo público escolar” (FEIJÓ, 2005, p.462).
Um aspecto que influenciou fortemente a mudança no modo de produção do livro
infantil foi o aumento do número de estudantes. Aos poucos ocorreu uma
profissionalização em relação aos escritores e em todo o restante da produção, e foi
constatada a importância do projeto gráfico no gênero infantil (LAJOLO, 2001). O livro
tornou-se um produto rentável para todos os envolvidos no processo.
Já o manual escolar iniciou sua transformação em livro didático justamente a partir
da década de 1960, quando as características do livro foram se adaptando à nova realidade
escolar, com a democratização do ensino. Até este período estes livros sofreram poucas
alterações e permaneceram muito tempo no mercado, sem uma linguagem de acordo
com as faixas etárias às quais se destinavam. Alguns sinais mais visíveis da transformação
do livro didático foram:
20
Fonte: <http://paje.fe.usp.br/estrutura/livres/>.
21
Fonte: <http://www.monteirolobato.tur.br/jbml.htm#3>.
31
- Capítulo 1 -
a mudança de formato, pois grande parte dos livros possuía 14x18cm e passaram a
ter 21x28cm;
o aspecto visual das capas que, de austeras e rígidas, passaram a oferecer um visual
mais direcionado ao público escolar, com ilustrações e imagens;
a encadernação passou a ser feita mecanicamente;
a capa teve como acabamento a plastificação;
e a qualidade do papel sofreu uma melhoria significativa, bem como a qualidade de
impressão.
Fig. 6 - Capa do livro didático História do Brasil 22 Fig. 7 - Capa do livro didático Estudos Sociais23
Autor: Rocha Pombo Autores: Ricardo de Moura Faria, Antônio Marum,
Editora Melhoramentos, 1ª. ed., 1918 Gleuso D. Duarte, Tânia M. Guimarães
Formato: 14x18cm Editora Lê, 4ª. ed., 1979
Formato: 21x28cm
Belmiro (2000) relata que, no fim da década de 1960, o livro didático começou a
apresentar um pouco mais de cor em seu interior, além do preto-e-branco, e tons de terra,
meio amarronzados, meio alaranjados ou avermelhados eram utilizados em algumas
imagens. Também surgiu a cor nas letras dos subtítulos, no sublinhado das palavras, das
frases e em boxes de textos para destacar definições ou conceitos.
Outro aspecto que foi bastante explorado a partir desta época foi a ilustração -
inicialmente impressa na cor marrom. Belmiro (Ibid.) explica que, no decorrer das décadas
seguintes, houve uma melhora significativa na qualidade das imagens em livros de
literatura, diferentemente das ilustrações dos livros didáticos, muitas delas “imaturas e
22
Fonte: <http://paje.fe.usp.br/estrutura/livres/>.
23
Fonte: GATTI JÚNIOR, 2004.
32
- Capítulo 1 -
24
Fonte: <http://espacoeducar-liza.blogspot.com/2009_02_26_archive.html>.
33
- Capítulo 1 -
modelo, opção do governo militar, foi utilizado por quinze anos, sendo que sua concepção
pedagógica tinha como base o behaviorismo25, que foi criticado por não permitir o
desenvolvimento do raciocínio, da criatividade e da reflexão crítica por parte dos alunos.
Diante do papel que o livro didático ocupava no processo escolar no fim da década
de 1990, o governo brasileiro, na posição de maior comprador deste tipo de livro, iniciou
um processo de avaliação que ocasionou diversas melhorias nas coleções didáticas de
todas as áreas disciplinares, incluindo o apuro da qualidade gráfica, de impressão e da
linguagem e conteúdo utilizados pelos autores. Segundo Gatti Júnior (2004) os livros
didáticos destinados ao ensino fundamental começaram a ser impressos a quatro cores
somente neste período, porém os destinados ao ensino médio, salvo exceções, ainda eram
impressos em duas cores. Hoje as editoras brasileiras já possuem a experiência de que um
trabalho gráfico de má qualidade pode comprometer o sucesso de uma coleção.
Como visto no histórico, foram criadas em diversas épocas comissões ou comitês
com a finalidade de avaliar a qualidade dos livros didáticos produzidos pelas editoras. De
acordo com Freitag (et al., 1989) no início, a intenção era apenas autorizar ou não o uso do
livro na rede pública, e somente mais tarde estas comissões passaram a avaliá-lo e
selecioná-lo.
25
Na abordagem behaviorista, surgida no começo do século XX, o ensino pode ser um processo programado,
com uma clara definição dos objetivos a serem alcançados, onde pode-se verificar se foram atingidos ou não.
34
- Capítulo 1 -
É na escola que a criança inicia sua vida de leitor, na maioria dos casos. Uma
imensidão de letras que antes eram apenas formas e desenhos, ganham significado. A
leitura se introduz no cotidiano, alargando a visão do mundo e das coisas. A partir daí
35
- Capítulo 1 -
começa a se construir um relacionamento com a palavra escrita e com os livros, que pode
se concretizar em uma relação de afeto ou desafeto. Felizmente, em muitos casos, a leitura
torna-se fonte de lazer e prazer, que se estende para além do período estudantil.
Os materiais didáticos entraram no ambiente escolar brasileiro logo após a
Independência, quando as autoridades viram a necessidade deste apoio pedagógico e
começaram a sua produção. Com o advento da República, a preocupação com o alcance
dos livros e da leitura começou a ir além dos limites escolares.
Entretanto, na primeira metade do século XX, a presença dos livros ainda não era
um fato constante na vida dos brasileiros, tanto dentro, quanto fora da escola. A
nacionalização do livro escolar estava começando, a indústria editorial estava em
desenvolvimento, e os editores ainda não eram brasileiros. Naquela época os livros eram,
como ainda continuam sendo, mercadoria cara. Somava-se a este fato a pouca intimidade
e interesse do povo pelos livros e pela atividade da leitura. A explicação para isto talvez se
baseie na chegada tardia da imprensa ao Brasil, em 1808, enquanto que na Europa a
imprensa já era uma conquista bem antiga – a Bíblia de Gutenberg data de 1445. Além
disto a introdução da imprensa foi um ato isolado, já que não houve a criação de
instituições e instrumentos necessários à difusão dos produtos impressos como escolas,
bibliotecas, livrarias, jornais e editoras na época do Brasil Colônia (LAJOLO; ZILBERMAN,
2002).
Foi a partir da década de 1930, durante o governo Vargas, quando houve uma
ampla reforma do ensino, que a base escolar se expandiu e afetou de modo positivo o
mercado de livros didáticos. Pela primeira vez, graças às políticas públicas e ao câmbio
desfavorável às importações, o livro escolar produzido no Brasil chegou a custar bem mais
barato do que o concorrente estrangeiro. Os livros didáticos portugueses, por fatores de
mercado e decisão do próprio Estado, saíram das escolas brasileiras, dando total espaço
aos livros nacionais (FEIJÓ, 2005).
Quanto ao uso do livro didático na rotina em sala de aula, há que se ter em mente
que ele pode ser usado de inúmeras formas, mas quem determina estas formas
primeiramente é o professor. No decorrer das aulas é o professor que precisa pensar
amplamente na interação, no diálogo e em desempenhar um papel ativo e crítico, em
relação às propostas do livro didático. Da mesma maneira, o professor deve sempre
considerar as possibilidades e usos diferenciados que um livro didático permite, como
36
- Capítulo 1 -
[...] o livro didático não deve ser tomado como vilão, mas sim como parte da
solução, [...], pois o livro didático durante as décadas de 1970 a 1990, foi utilizado
como paliativo para problemas de boa parte do professorado, que consistiam, em
síntese, na falta de qualificação e de tempo para preparação de suas aulas.
Aparentemente sempre foi cômodo, barato e seguro para o governo, do ponto de
vista político, distribuir livros, pois agindo dessa forma o governo não precisava
investir diretamente nas escolas; agradava aos setores industriais e evitava ter que
agir junto aos cursos deficientes de licenciatura oferecidos por boa parte das
faculdades que se espalhavam pelo país à época. (GATTI JÚNIOR, 2004, p.200).
37
- Capítulo 1 -
38
- Capítulo 2 -
No senso comum cultiva-se uma imagem da infância como sendo a melhor fase da
vida, onde o tempo passa devagar, o dia é permeado de alegria e diversão, sem as
preocupações ou angústias do mundo adulto. Porém basta uma breve reflexão, ou melhor,
uma recordação do que é visto nos noticiários, para esta visão de mundo encantado,
perfeito e feliz desmoronar. A infância é vivida de modo diferente por diferentes tipos de
crianças.
A valorização que se tem hoje da infância e o reconhecimento da criança como
sujeito social despertou o interesse de diferentes áreas e fez com que se tornasse objeto de
estudo, constituindo um campo temático de natureza interdisciplinar.
Ao investigar os significados da palavra infância, de acordo com os dicionários da
língua portuguesa vê-se que a palavra diz respeito ao período de crescimento, no ser
humano, que vai do nascimento à puberdade. Já para o Estatuto da Criança e do
Adolescente é considerada criança a pessoa até os doze anos incompletos.
Etimologicamente a palavra infância vem do latim infantia e refere-se à incapacidade de
falar.
Porém, a idade cronológica não é suficiente para caracterizar a infância. Ariès
(1981) a situa como produto da história moderna, firmando-se como uma categoria social
construída recentemente na história da humanidade. Para o autor, o sentimento da
infância, que corresponde à consciência da particularidade infantil, isto é, o que distingue a
criança do adulto, não existia na sociedade medieval. A criança não era percebida com
necessidades diferentes das do adulto. Assim que adquiria uma certa independência de
sua mãe ou ama, ingressava no mundo dos adultos e “não se distinguia mais destes” (Ibid.,
p.156). Devido à alta taxa de mortalidade infantil nesta época, era recomendado às mães
não criar laços afetivos com seus filhos, e sim manter um distanciamento e um sentimento
de indiferença para com eles, dada a sua fragilidade e possibilidade de perda. Era
responsabilidade das amas criar a criança desde o nascimento até aproximadamente os
cinco anos, quando já apresentavam alguma autonomia. A partir de então já podiam
freqüentar o mundo adulto, fazendo parte de festas, reuniões e do trabalho. O serviço
39
- Capítulo 2 -
doméstico era ensinado encaminhando-se a criança para morar na casa de outras famílias.
Este tipo de aprendizagem era destinado a todas as crianças, independente da classe social
de sua família e era, na visão da época, a única forma de educação para a vida adulta.
Posteriormente, nos séculos XVI e XVII, começou a surgir no meio familiar das
camadas mais abastadas da sociedade, uma concepção de infância centrada na inocência e
na graciosidade infantil. Ariès afirma que, provavelmente, a maneira de ser das crianças
pequenas sempre encantou mães e amas, mesmo que não expressassem estes
sentimentos. No entanto, em determinado momento, os adultos deixaram se envolver
pelo prazer dos gestos e brincadeiras dos pequenos, passando a ter uma atitude mais
carinhosa em relação a eles. O autor chama esta passagem de o primeiro sentimento da
infância, um sentimento superficial, que se caracterizava pela “paparicação” pois, “a
criança, por sua ingenuidade, gentileza e graça, se tornava uma fonte de distração e
relaxamento para o adulto” (1981, p.158).
Já um segundo sentimento, de “moralização” originou-se por volta do século XVII
fora do núcleo familiar. Os eclesiásticos e teóricos, preocupados com a disciplina e a
racionalidade dos costumes, não viam as crianças como distrações agradáveis, mas sim
como criaturas frágeis, que necessitavam de cuidados especiais e disciplina. A fim de
proteger e educar para a vida adulta passaram a orientar os pais por meio de manuais
escritos. Outra mudança tem ligação com os amplos laços de parentesco do poder feudal,
vinculados às grandes propriedades, que se enfraqueceram, uma vez que o Estado
moderno viu no modelo de família nuclear sua base de sustentação, o que o levou a
promover este tipo de estrutura. Há, portanto, o início de um maior envolvimento dos pais
com a educação e criação dos filhos trazendo, deste modo, a criança para o ambiente
privado do lar e da família.
O século XVIII trouxe para a família, além destes dois sentimentos, a preocupação
com a higiene e a saúde física. Também houve mudança na forma de educar as crianças.
Elas deixaram de aprender a vida diretamente do universo adulto e passaram a freqüentar
o ambiente escolar. Entre outros objetivos, a escola veio cumprir um papel de ligação entre
a criança e o mundo, veio suprir uma lacuna referente à sua socialização, já que sua vida
agora era isolada do âmbito exterior, restringindo-se basicamente ao ambiente privado do
lar e ao contato com sua mãe.
40
- Capítulo 2 -
A criança, que antes ocupava um lugar sem importância, recebeu uma posição
central dentro da família, inaugurando deste modo a construção da infância moderna. A
família transformou-se e tornou-se em um lugar de afeição entre os cônjuges e entre pais e
filhos, fato que não existia antes. Essa aproximação ocasionou uma preocupação com a
privacidade e com diversos aspectos da vida familiar, o que deu início à construção da
família moderna.
A origem de um sentimento da infância e a valorização do modelo de família
nuclear aconteceu primeiramente nas camadas superiores da sociedade e aos poucos foi
sendo incorporado pelas camadas inferiores. Esta parcela da população estava
acostumada a deixar suas crianças aos cuidados de instituições mantidas pelo poder
público ou religioso, e o casamento não era visto como uma necessidade para suas vidas. A
solução foi estimular o matrimônio e o cuidado com as crianças por meio da valorização do
papel da mulher dentro do núcleo familiar. A idéia propagada consistia em que, para uma
família, mesmo que proletária ascender, era necessário que a esposa trabalhasse em suas
funções do lar e no cuidado com os filhos (ZILBERMAN, 2003).
Estas transformações coincidiram com o fim do sistema feudal, momento em que a
classe burguesa começou a construir e divulgar seus valores tais como a valorização da
vida urbana, a distinção entre o público e o privado, da casa e do trabalho, da infância e da
26
Disponível em <http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Zoffany_2.jpg>.
41
- Capítulo 2 -
idade adulta. Entre os valores burgueses houve ainda a valorização da formação pessoal,
que tinha por objetivo qualificar o sujeito por seus próprios méritos, o que determinou
uma ênfase à cultura e ao ensino. É a partir desta época também que a escola se expandiu
e se aperfeiçoou a fim de preparar a criança para a vida adulta e protegê-la contra as
agressões do mundo (ZILBERMAN, 2003).
Este período, em que aconteceu a Revolução Industrial, também foi marcado pelas
obras de pensadores como Locke27, Rousseau28 e os primeiros românticos. John Locke
defendeu a teoria de que o conhecimento derivava da prática, de onde afirmava que a
mente de uma criança se comparava a uma tábula rasa, a uma folha de papel em branco,
que só a experiência poderia preencher. Jean Jacques Rousseau defendeu a idéia da
criança pura e ingênua, que já nascia com uma natureza boa, da necessidade de respeitá-la
e de ser educada sobretudo em liberdade, já que em sua visão a infância tinha formas
próprias de ver, pensar e sentir. As concepções românticas da infância mudaram um pouco
a noção de Rousseau, pois viam as crianças como portadoras de uma sabedoria e uma
sensibilidade estética apurada, que necessitavam de condições favoráveis para seu pleno
desenvolvimento.
O século XIX trouxe a idéia da criança sem valor econômico, porém com um grande
e inestimável valor emocional, idéia que perdura até os nossos dias. Foi neste período que
surgiu o kindergarten, idealizado e posto em prática por Froebel29 no início da década de
1840, que contribuiu para a ruptura dos limites entre o público e o privado, escola e
família, e teve como uma das conseqüências uma maior liberdade feminina, pela
possibilidade do trabalho fora do lar.
A difusão e o acesso à escola para todos promoveu a institucionalização da infância
e da escola pública. Para se chegar à construção moderna da infância houve um trabalho
de separação do mundo adulto e de institucionalização das crianças. A criação das creches
e da escola pública também teve um papel decisivo para essa separação, uma vez que até
então, as escolas conventuais e os colégios religiosos eram indistintamente freqüentados
por crianças e adultos (SARMENTO, 2005).
Para Ariès (1981) a consciência da particularidade infantil é conseqüência de um
longo processo histórico. A infância de hoje é uma criação de um tempo histórico e de
27
John Locke (1632-1704), filósofo inglês.
28
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) filósofo suíço.
29
Friedrich Froebel (1782-1852) pedagogo alemão.
42
- Capítulo 2 -
condições socioculturais determinadas. A partir disso, pode-se refletir que a infância muda
com o tempo e conforme os diferentes contextos sociais, econômicos e geográficos. Por
esta razão pode-se afirmar que as crianças de hoje são muito diferentes das de épocas
passadas, e certamente o serão das que estão por vir nos próximos séculos.
Ariès situa o início de um sentimento de infância dentro do contexto europeu. No
entanto, em terras brasileiras, na visão de Kuhlmann Jr. (1998) este sentimento já estava
presente no século XVI, quando os jesuítas criaram uma estratégia de catequese para as
crianças indígenas, trazendo crianças órfãs portuguesas para serem mediadoras nesta
relação. Houve também a elaboração do Ratio Studiorum - Plano de Estudos dos jesuítas,
que introduziu e consolidou um sistema integrado para seus colégios, estabelecendo
classes separadas por idade e introduzindo as disciplinas, o que se tornou o primeiro
sistema educacional unificado do mundo.
Entretanto, um verdadeiro cuidado com a infância no Brasil parece ter começado
somente no século XIX, tornando-se mais intenso nos séculos seguintes. Um aspecto
marcante presente desde o início da colonização do país é a diferenciação entre as crianças
segundo sua classe social, fato que liga a história da infância ao preconceito, à
desigualdade, à exclusão, à exploração e ao abandono. Estes traços, que podem ser vistos
ainda hoje, acompanham a história do Brasil desde o período colonial e reforçam a
diferença pela desigualdade, seja na questão da distribuição de terra, de renda ou do
conhecimento (FROTA, 2007). Foi criado inclusive um termo para designar a criança
desamparada, o chamado menor. Esta expressão apareceu no Código de Menores de 1927
e designava uma faixa etária associada às crianças pobres. Com o tempo, o menor passou a
ser visto como aquela criança vinda de uma família desestruturada, em situação de risco
social, com possibilidade de se tornar um marginal e, assim, colocar em risco a si mesmo e
a sociedade. A solução encontrada foi entregar a responsabilidade do menor ao Estado
que, com o propósito de melhorá-lo, acabou institucionalizando-o. Esse procedimento
apenas reforçou o preconceito e construiu uma categoria à margem da sociedade,
passando a ser vista como uma ameaça real e tornando essas crianças menos crianças.
Somente em 1990 com o Estatuto da Criança e do Adolescente, o termo menor foi abolido,
e a criança foi definida como um sujeito de direitos, possuidora de necessidades
específicas devido ao seu desenvolvimento, e que deve receber uma política de atenção
integral a seus direitos construídos social e historicamente.
43
- Capítulo 2 -
44
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30
PINO, 2000, p.46.
31
Jean Piaget (1896-1980) biólogo e psicólogo suíço.
32
O nome Vygotsky é encontrado na bibliografia existente escrito de várias formas como Vygotsky, Vigotski,
Vygotski, Vigotskji, Vigotskii, Vigotsky. Neste trabalho optou-se por empregar a grafia Vygotsky adotada por
grande parte das publicações brasileiras.
45
- Capítulo 2 -
outros teóricos deste campo. Vygotsky não deixou uma teoria acabada, sistematizada, mas
possibilitou a abertura de várias linhas de pesquisa, que foram desenvolvidas por outros
pesquisadores. Van der Veer e Valsiner (2001) afirmam que a principal contribuição de
Vygotsky para a psicologia foi ter rompido limites criados artificialmente entre áreas
relacionadas da cultura humana e reunido conhecimentos de diferentes áreas.
A abordagem de Vygostky integrou em uma mesma perspectiva, o homem
enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e ser social, enquanto membro da
espécie humana e participante de um processo histórico. Isto fica explícito nas três idéias
centrais do pensamento de Vygotsky, conforme Oliveira (2006):
O homem, na visão de Vygotsky, se constitui como sujeito a partir das relações que
estabelece com outros homens. As funções psicológicas superiores, típicas do ser humano
como a inteligência lógica, a memória, a percepção, a imaginação e a criatividade, tem sua
base biológica, mas também são construídas individualmente, ao longo da vida.
Em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem, Vygostky afirma que estes se
relacionam desde o nascimento da criança em um movimento dialético, onde um
pressupõe o outro, ao mesmo tempo que se negam (ZANELLA, 2007). O desenvolvimento
não faz um caminho em linha reta, mas sim enfrenta imprevistos, evoluções e involuções,
fazendo parte do processo de maturação do organismo individual. Entretanto é o
aprendizado, que só ocorre devido ao contato da pessoa com um ambiente cultural, que
oferece as condições e estimula os processos internos de desenvolvimento. Deste modo, a
interação social é fator indispensável, pois propicia situações de aprendizagem, que
conseqüentemente auxiliam o desenvolvimento.
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47
- Capítulo 2 -
entre outros aspectos, o que torna as interações complexas. O livro, tanto o didático
quanto qualquer outro, pode ativar uma zona de desenvolvimento proximal.
Outro conceito fundamental no pensamento de Vygotsky é a mediação. Segundo
ele, nossa relação com o mundo não é direta, é sempre mediada. Temos uma relação
indireta com a realidade. Encontrar esta definição na obra de Vygotsky é uma tarefa
bastante difícil, dado que não se trata de um conceito, mas de um pressuposto que norteia
todo seu pensamento. Pode-se dizer que a mediação não se trata de um ato em que
alguma coisa se interpõe. É um processo, a própria relação, e não precisa necessariamente
da presença física do outro, ou seja, não é a corporeidade do outro que estabelece a
relação mediatizada. A mediação ocorre por meio dos signos e dos instrumentos.
Vygotsky, ao afirmar que a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas
essencialmente mediada, propõe a integração de diferentes processos e de conceitos
implícitos na cognição e no desenvolvimento humano. As funções psicológicas superiores
apresentam uma estrutura tal que “entre o homem e o mundo real existem mediadores,
ferramentas auxiliares da atividade humana” (OLIVEIRA, 2006, p.27).
Vygostky (1984) assinala para os instrumentos e para os signos que têm papéis
diferentes no processo de mediação. A importância que Vygotsky atribui aos instrumentos
encontra apoio na filiação teórica do autor aos postulados marxistas. Em seus escritos
ressalta a importância do trabalho, que está na base da sociedade humana.
48
- Capítulo 2 -
ações concretas, como fazem os instrumentos. Entretanto, o uso dos instrumentos permite
que se evidencie gradativamente um sistema de estímulos externos auxiliares, importantes
na aprendizagem e no desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Estas são
indispensáveis nos processos de internalização, possibilitando a estruturação de
representações e de articulações mais complexas entre as mesmas, ampliando também
processos internos de mediação (VYGOTSKY, 1984).
Os sistemas simbólicos possibilitam a articulação dos signos em estruturas
complexas. Estas estruturas incluem as representações mentais, que substituem os objetos
do mundo e, nessa dinâmica, a linguagem possui um papel fundamental (Ibid.)
Essas possibilidades de operação mental não constituem uma relação direta com
o mundo real fisicamente presente; a relação é mediada pelos signos
internalizados que representam os elementos do mundo, libertando o homem da
necessidade de interação concreta com os objetos de seu pensamento. [...] as
representações mentais da realidade exterior são, na verdade, os principais
mediadores a serem considerados na relação do homem com o mundo.
(OLIVEIRA, 2006, p.35).
Molon afirma que a presença corpórea do outro não garante a mediação. Sem a
mediação dos signos não há contato com a cultura. A autora retoma Vygostky explicando
que, contudo, ao longo do desenvolvimento do ser humano, os processos de mediação
também sofrem transformações, uma vez que o indivíduo deixa de necessitar de marcas
externas e passa a utilizar signos internos, ou seja, as representações mentais substituem
os objetos do mundo real. Os signos internalizados ficam registrados como elementos que
representam objetos, eventos ou situações (MOLON, 2000).
As funções psicológicas superiores se constituem por meio de atividades mediadas
pelo uso de ferramentas, tanto físicas quanto representacionais. Os instrumentos
mediadores físicos, como as ferramentas, modificam o meio físico e o sujeito da ação. Os
representacionais, como os signos, modificam a relação do homem consigo mesmo e com
os outros homens. O objetivo dos signos é
49
- Capítulo 2 -
Muitas vezes, escolhia livros pela capa. Havia momentos de que me lembro ainda
agora: por exemplo, ver as sobrecapas dos Rainbow Classics [...] e ficar deliciado
com as encadernações estampadas que estavam por baixo [...]
Alberto Manguel33
A diferença dos livros de literatura infantil para os livros didáticos é grande. No caso
dos livros didáticos há a divisão dos assuntos por faixas etárias, os conteúdos são divididos
por disciplinas, com contornos nítidos, organizados num grau crescente de dificuldade,
divididos em tantos anos letivos, transmitidos de forma objetiva a indivíduos com, mais ou
menos, as mesmas características e no mesmo estágio físico e neurológico. Já os livros de
literatura infantil contém um discurso subjetivo, ficcional e poético, não didático (não
utilitário) por princípio. O primeiro nunca é lido de uma só vez, e muitas vezes é lido de
forma coletiva, em voz alta. O segundo convencionou-se ler de modo individual, em
silêncio e de uma só vez. Porém, ambos possuem uma semelhança: compartilham um
mesmo lugar, a escola.
33
MANGUEL, 1999, p.20.
50
- Capítulo 2 -
51
- Capítulo 2 -
34
Fonte: <http://imaginarymuseum.org>.
35
Fonte: <http://imaginarymuseum.org>.
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53
- Capítulo 2 -
É inevitável que, com todo o manuseio, qualquer livro acabe provocando uma
experiência afetiva, boa ou ruim, no aluno-leitor. Desde nossas primeiras impressões do
livro, na primeira infância, antes da alfabetização, que eram somente a respeito de sua
forma, cores, figuras ou o som do folhear as páginas, até chegar ao momento onde todos
esses componentes passaram a ter outros significados, tudo causa uma experiência que
será acumulada ao longo da vida.
O livro é um objeto no sentido genérico, uma coisa que pode ser apreendida pela
percepção ou pelo pensamento. Sendo material e ocupando um lugar no espaço,
tem nas três dimensões a principal característica de ser um corpo físico
matemático. Como corpo, portanto, possui a propriedade de causar impressões e
estímulos nos seres humanos. (SILVEIRA, 2001, p. 122).
54
- Capítulo 2 -
permeados pelos sentimentos, sendo que esses acontecem a partir dos e nos
processos volitivos. A função psicológica que potencializa as demais é a vontade.
(MOLON, 2000, p.8).
O prazer de se relacionar com os livros não é algo que apareça de uma hora para
outra. Cabe aos adultos responsáveis, pais e professores, auxiliar a criança a descobrir o
que o livro tem a oferecer, seu potencial. Explorá-lo em todos os sentidos – pela forma e
pelo seu conteúdo – é uma maneira de fazer a criança ganhar intimidade com um objeto
tão rico em significados, verbais e visuais.
A integração dos aspectos cognitivos e afetivos do ser humano foi encontrada por
Vygostky (2005) justamente no significado/sentido da palavra. La Taille (1992, p.81) refere
que na concepção de Vygostky o significado de cada palavra possui uma conexão entre os
aspectos cognitivo e afetivo: o significado propriamente dito e o sentido. O sentido é a
soma de todos os eventos psicológicos que a palavra desperta na consciência. “É um todo
complexo, fluido e dinâmico. O significado é uma das zonas do sentido, a mais estável e a
mais precisa” (VYGOSTSKY, 1984, p.125). Assim, uma palavra adquire sentido no contexto
em que surge, podendo alterar este sentido quando o contexto se modifica. Buscar o
significado quer dizer encontrar a razão que permite relacionar as coisas entre si e, dessa
forma, conhecê-las. É dizer o que elas são, conferir-lhes outra forma de existência, o que
inclui, ao mesmo tempo, a palavra e o pensamento (PINO, 2000).
Assim como a linguagem verbal, a linguagem visual é polissêmica, unindo os
aspectos verbal, visual e material. A comunicação visual de qualquer livro pode possuir um
significado compartilhado por um grupo, através do uso de uma linguagem visual comum,
além de uma ampla gama de sentidos. É a reunião de texto e imagem e a organização
destes elementos na página que servem de estímulo, de sedução para a leitura,
especialmente em livros infantis. Em um livro o conjunto dos aspectos visuais, as imagens,
o texto, a forma física, podem transmitir inúmeros significados e conseqüentemente
produzir uma interferência, boa ou má, na leitura. A criança, no plano intrapsicológico, lida
com o sentido das palavras e das imagens, faz relação com suas vivências afetivas. As
associações entre palavras e imagens trazem para a criança inúmeras e ricas possibilidades
de sentidos. Até pelo fato de que, no pensamento, tudo se transforma em imagem.
Palavras, símbolos abstratos, existem sob a forma de imagens auditivas ou visuais na nossa
consciência. Conforme Damásio (1996, p.134) “se não se tornassem imagens, por mais
passageiras que fossem, não seriam nada que pudéssemos saber”.
55
- Capítulo 2 -
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- Capítulo 3 -
As palavras antes de serem lidas, são vistas. E antes de chegar às palavras a criança
primeiramente tem o contato visual com o livro, o objeto, que já comunica mesmo
fechado, por meio de sua capa, de sua materialidade. O aluno ao abrir um livro é atraído
primeiramente pelas imagens37 e é a partir delas que a leitura começa. É pela percepção
que se tem da sua materialidade, de sua aparência, que o livro começa a se formar diante
do leitor. O corpo físico do livro já é expressivo porque é capaz de comunicar, seja através
do visual, do verbal ou de ambos. A leitura e o entendimento ocorrem posteriormente,
depois de uma aproximação com o objeto livro.
É o aspecto físico e material do livro - que se faz presente por meio das formas, das
cores, das imagens - o primeiro estímulo ao desejo de decifrar e interpretar o código das
palavras. Uma vez aberto o livro observa-se o tipo de letra, a diagramação, os espaços e a
qualidade de suas imagens e ilustrações. Todo o conjunto, o texto, a imagem, os tipos, a
qualidade do papel, a encadernação, a forma e o peso será prejudicado se um dos
aspectos for menosprezado. Em se tratando de livro didático para o ensino fundamental
das séries iniciais (1° ao 5° ano), um produto destinado ao público infantil, a qualidade do
texto é obviamente imprescindível, porém a questão visual é tão importante quanto o
conteúdo. O autor pode preparar um excelente texto, mas se este não for bem projetado
em sua dimensão material, muito se perderá. O Guia do Livro Didático (2007, p.26) fala que
36
READ, 1986, p.62.
37
Neste trabalho o termo imagem além de considerar a forma visual e não-verbal de representação, abarca
também diversas formas de ilustração, o desenho, a fotografia, a reprodução de recursos pictográficos, e a
idéia de que um texto também pode constituir-se como imagem.
57
- Capítulo 3 -
Porém nota-se que, no aspecto verbal dos livros didáticos infantis há marcas de
fortes tendências pedagógicas. Em muitos livros didáticos percebe-se uma linguagem
artificial, um estereótipo da expressão verbal infantil e esquemas narrativos simplistas.
Lajolo (1982) fala que, nos livros didáticos, a opção feita inclui formas mais comuns de se
apresentar o conteúdo por serem tidas como mais comunicantes.
58
- Capítulo 3 -
processo de internalização dos significados da interação social, promovida por meio dos
materiais fornecidos pela cultura. A apropriação da cultura acontece por meio do
movimento entre as funções interpsicológicas e as funções intrapsicológicas. Tudo o que
está no sujeito existe antes no social, interpsicologicamente, sendo que, quando é
apreendido e modificado pelo mesmo, passa a existir no plano intrapsicológico,
internamente (VYGOTSKY, 2007). O processo vai se construindo de fora para dentro. Deste
modo a criança vai aprendendo e se modificando, reconstruindo internamente uma
atividade externa, como resultado de processos interativos que se dão ao longo do tempo.
Partindo deste ponto de vista, a escola tem um papel de destaque em relação ao
desenvolvimento humano. É o lugar onde acontecem diversas situações de interação e,
conseqüentemente de aprendizagem. Naturalmente em todos os lugares podem ocorrer
estas situações, mas é no ambiente escolar que a criança tem uma convivência rica e uma
variedade de relações interpessoais com colegas da mesma idade, mais novos, mais
velhos, com adultos mais experientes e com diversos tipos de expressões da cultura visual,
que vão interferindo em sua zona de desenvolvimento proximal, promovendo
transformações, favorecendo aprendizagens.
Essas interações que o indivíduo estabelece com as pessoas que o cercam, seja na
escola ou em outro ambiente, exercem, portanto, papel fundamental no
desenvolvimento humano, pois é a partir da apropriação das significações
socialmente produzidas que as funções psicológicas se constituem (ZANELLA,
2007, p.96).
59
- Capítulo 3 -
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- Capítulo 3 -
entre imagem e texto, formas, cores, enfim toda comunicação visual do impresso,
necessita ser observada, especialmente em relação à sua capacidade mediadora. A
estrutura de cada página, sua comunicação visual, funciona como um conjunto de signos,
uma ferramenta psicológica que tem a função de mediar a relação do aluno com o
conteúdo, com o objeto livro e auxiliar na aprendizagem. A comunicação visual do livro
didático atua como um sistema de estímulo externo auxiliar, que pode aumentar a eficácia
da atividade do aluno, principalmente em uma faixa etária onde o uso dos signos externos
predomina. Conforme Vygotsky “o estímulo auxiliar é um instrumento psicológico que age
a partir do meio exterior” (2007, p.40).
A comunicação visual do livro didático deve ser vista como um aspecto positivo
pois, de acordo com Lins “aumenta sua quantidade de informação e as possibilidades de
leitura, aumentando o interesse e, conseqüentemente, o consumo de livros de uma
maneira geral” (2004, p.47). Deve-se observar que o aspecto visual é o que mais chama
atenção e causa impacto ao primeiro contato. Para as crianças é extremamente importante
pois, além de auxiliar a tradução e compreensão do conteúdo, convertendo ou ilustrando
visualmente conceitos abstratos, a mediação que provoca é essencial para a experiência
visual e para a memória. A percepção visual também influi no desenvolvimento emocional
da criança e a torna, conforme o significado de suas experiências, mais ativa, independente
ou auto-confiante. É a percepção que tem do objeto, neste caso do livro, que faz com que a
criança apresente reações emocionais, como por exemplo, a vontade de se relacionar com
ele, ou não.
A variação das características físicas do livro didático é limitada em termos de
formato, tipo de papel e aplicação de recursos gráficos, devido a várias questões, inclusive
do custo. Contudo, a comunicação visual deveria apostar na criatividade, mas infelizmente
não é o que se percebe geralmente. Alguns títulos são pouco estimulantes em relação ao
seu aspecto gráfico. Se o visual for comparado com alguns livros de histórias, o livro
didático torna-se desinteressante. Um fato a ressaltar é que, quando pequena, a criança
lida com o livro como se fosse mais um brinquedo. Entretanto, com o passar do tempo, a
criança percebe que o livro vai se modificando no formato, corpo de letra, números de
páginas, quantidade de texto, entre outros. O aspecto lúdico, muitas vezes, vai se
perdendo e, com isso, o prazer da interação criança e objeto, principalmente ao entrar para
61
- Capítulo 3 -
a escola. Ele sai dos horários de lazer e passa a ser visto como uma obrigação, maçante
muitas vezes. O que não necessariamente deveria ser assim.
Em relação à aprendizagem com o livro didático, pode-se pensar sobre o conceito
de zona de desenvolvimento proximal e ampliá-lo, dado que seu foco são as transações
sociais. Zanella (2007) esclarece que Vygotsky não deixou especificado que modos de
auxílio social os professores deveriam oferecer às crianças e que constituiriam ativadores
da zona de desenvolvimento proximal. O autor menciona “colaboração e orientação, bem
como o fornecimento de assistência às crianças via demonstração, questões norteadoras e
introdução dos elementos iniciais de solução da tarefa” (Ibid., p.112). O livro didático como
um todo pode constituir-se em um ativador da zona de desenvolvimento proximal para a
criança, pois termina operando como um espaço mediador, o ‘outro’ que possui mais
conhecimento. Nessa relação que se constitui, entram em jogo questões afetivas, onde a
comunicação visual pode influenciar, e de confiança nas informações contidas no livro. O
aluno, quando usa seu livro didático em grupo, na escola ou sozinho em casa, para
solucionar dúvidas ou compreender um conteúdo, está interagindo, se apropriando e
internalizando significados socialmente produzidos. Deste modo, a zona de
desenvolvimento proximal pode ser caracterizada também pelo “sujeito envolvido em
atividade colaborativa num contexto social específico” (Ibid., p.115).
Aprofundar a questão da mediação que a comunicação visual do livro promove
levanta pontos como a apresentação do conteúdo de forma criativa, organizada e
interessante, o estímulo ao estudo e a compreensão do conteúdo. A criança pode adquirir
assim, de maneira mais satisfatória e principalmente prazerosa, os conhecimentos
escolares, facilitando a construção do conhecimento e ampliando o potencial pedagógico
do livro. Pode-se referir, então, que o livro didático é um mediador pedagógico para a
criança na escola. Na obra de Vygotsky a mediação é um processo que permeia seu aporte
sobre desenvolvimento e aprendizagem. Não se trata de um conceito, mas de um processo
que também possibilita a internalização. Retomando Martins (2005) mediar é também
proporcionar acesso.
62
- Capítulo 3 -
Não despreze a qualidade gráfica, pois muitas vezes ele será o único livro que a
criança tem em casa. É bom que seja bonito e agradável. E não tenha receio de
escolher livros (didáticos) de ponta.
Marisa Lajolo38
38
Fonte: PRADO, Ricardo. Os bons companheiros. Revista Nova Escola, São Paulo, ed. 140, mar. 2001.
63
- Capítulo 3 -
64
- Capítulo 3 -
naturalmente, levam estas referências para a escola, pois refletem aspectos dos seus
contextos socioculturais e da época em que vivem.
O próprio livro didático deve ser visto como um artefato da cultura visual. Vale
esclarecer que, para Hernández (2000) fazem parte da cultura visual não apenas os objetos
considerados canônicos, mas sim todos aqueles que
Deste modo, o livro didático se insere na cultura visual, tanto pela sua forma física,
sua materialidade, quanto pelo seu conteúdo visual. Bittencourt (1998) assinala um
aspecto interessante sobre os livros didáticos observando que estes foram os principais
divulgadores das artes visuais, dada à constante utilização de obras de arte vinculadas às
disciplinas, principalmente a de História. Assim sendo, as imagens que o livro didático
disponibiliza acabaram se tornando referências para que as crianças construam suas
próprias imagens e significados, já que o contato com objetos de arte não é tão acessível a
todos.
Um dos desafios que os professores têm que enfrentar em sala de aula consiste em
comprometer-se com as imagens e com a tecnologia do mundo contemporâneo
trabalhando-as a partir de uma análise cultural, do juízo moral e da reflexão. Pode-se
utilizar as imagens da cultura visual como uma ligação entre campos de conhecimento,
pois elas permitem conectar e relacionar para compreender e aprender. E esta ligação
entre os vários campos de conhecimento é facilitada no ensino fundamental, pois o
professor pode permitir que as áreas se incorporem umas às outras, fazendo com que seus
alunos criem relações entre as diversas disciplinas. Por meio de estratégias é possível trazer
para dentro da escola o universo visual que está fora da escola, para decodificá-lo,
reinterpretá-lo e transformá-lo. Ou mesmo explorar o que já se encontra na escola: muitos
livros didáticos trazem em seus conteúdos itens que fazem parte do repertório cultural
infantil, tais como contos, lendas, fábulas, crônicas, poemas, verbetes de enciclopédia,
textos de divulgação científica, notícias, reportagens, anedotas, reproduções de pinturas,
fotografias, cartuns, charges e histórias em quadrinhos, além de materiais gráficos do
65
- Capítulo 3 -
cotidiano, como capas de CD, de filmes, cartazes, folhetos, gráficos, tabelas, calendário,
ingressos, cardápios, cheques, notas fiscais, anúncios, sumários de revista, entre outros.
Esta variedade que o livro didático oferece é particularmente útil uma vez que, na
realidade brasileira vem-se constatando que, tanto professores quanto alunos, os tem
como principal fonte de informação impressa, estando este fato ligado às populações
onde o acesso a bens culturais e econômicos é menor. Apesar dos avanços tecnológicos,
tais como o acesso à Internet, dentre outros, a formação e a construção do conhecimento,
com base em diferentes aprendizagens, particularmente a aprendizagem escolar, ainda
acontece em torno do livro didático. O próprio Guia do Livro Didático (2007, p.25) diz que
“o livro didático, em qualquer disciplina, é um instrumento fundamental (às vezes
praticamente único) do acesso da criança popular à leitura e à cultura letrada.”
O livro didático interessa igualmente a uma história da leitura porque ele, talvez
mais ostensivamente que outras formas escritas, forma o leitor. Pode não ser tão
sedutor quanto as publicações destinadas à infância (livros e histórias em
quadrinhos), mas sua influência é inevitável, sendo encontrado em todas as
etapas de escolarização de um indivíduo [...]. (LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p. 121).
Somente porque alguma coisa é legível, não significa que esteja comunicando;
[...] Alguns títulos tradicionais de livros, enciclopédias, ou muitos livros que os
jovens jamais apanhariam numa prateleira, poderiam ser tornados mais atraentes.
[...] Você pode ser legível, mas que emoção está contida na mensagem?
David Carson39
A imagem e a escrita, desde os tempos mais antigos, sempre tiveram uma estreita
ligação, uma vez que as primeiras formas de escrita eram baseadas em pictogramas e
desenhos, como observa Gombrich “[...] imagens e letras são na verdade parentes
consangüíneos” (1999, p.53). A linguagem escrita é, portanto, também uma linguagem
gráfica, onde pode-se escrever com variados tipos de letras, com diferentes formas,
tamanhos, cores, pesos e contrastes.
39
CARSON; BLACKWELL, 1995, n.p. tradução livre da autora.
66
- Capítulo 3 -
não se presta atenção à letra em si, porque nela o traço perde a visibilidade que
tem no desenho. (WALTY et al., 2001, p.15-16).
40
In: HOLLIS, 2000, p. 36.
41
In: WALTY et al., 2001, p. 56.
67
- Capítulo 3 -
68
- Capítulo 3 -
leitura, entre outras coisas. Porém estas preocupações não devem ser exclusivas deste tipo
de livro. Os livros destinados ao público adolescente e adulto, bem como os didáticos,
também precisam deste cuidado, pois o aspecto visual sempre será decisivo para a
comercialização e aceitação, independente da faixa etária.
No caso de projeto de livros, a atividade ainda é povoada de formalidades e
tradições. Especificamente, no mercado de livros didáticos as páginas tem uma
comunicação visual quase que padrão e algumas capas tem imagens questionáveis em
relação ao conteúdo. Entre os livros didáticos da 4ª. série, abordados nesta pesquisa, há
casos em que as imagens, a diagramação, a escolha dos tipos ou do número de páginas é
feita em função do livro pertencer a alguma coleção e não em função da necessidade de
expressão de cada livro em particular (Fig. 9). Porém existem inúmeras técnicas utilizadas
na direção de arte que permitem unificar visualmente uma coleção e mesmo assim
expressar a particularidade de cada livro, cada disciplina.
69
- Capítulo 3 -
O design de livros tem sido dominado pelo aspecto clássico das páginas em
equilíbrio absoluto [...]. Porém, por maior que seja a segurança e a confiabilidade
que a técnica harmoniosa do design nivelado pode oferecer, propiciando, como
no caso dos livros, uma configuração de composição visual que não interfere com
a mensagem, a mente e o olho exigem um estímulo. A monotonia representa
para o design visual uma ameaça tão grande quanto em qualquer outra esfera da
arte e da comunicação. A mente e o olho exigem estímulos e surpresas, e um
design que resulte em êxito e audácia sugere a necessidade de aguçamento da
estrutura e da mensagem (DONDIS, 2007, p.118).
Não posso conceber um bom designer gráfico que não possua algumas
informações de História da Arte. Não só designers gráficos, mas muitos outros
profissionais de áreas similares poderiam ser mais eficientes se conhecessem,
fizessem Arte e tivessem desenvolvido sua capacidade analítica por intermédio da
interpretação dos trabalhos artísticos em seu contexto histórico.
70
- Capítulo 3 -
42
Camada protetora que, aplicada às páginas, resulta em um acabamento parecido com a plastificação.
43
Quando o miolo do impresso é grampeado com dois grampos. Ex.: revista Veja.
44
Quando o miolo do impresso é colado à capa, em toda extensão da lombada Ex.: revista Info-Exame.
71
- Capítulo 3 -
Neste ponto pode-se perceber o paradoxo exposto pelo edital: que as ilustrações
devem ser “claras, precisas, de fácil compreensão” e também “intrigar, problematizar,
convidar a pensar, despertar a curiosidade”. Poderia uma imagem ser ambas as coisas?
72
- Capítulo 4 -
Capítulo 4 - METODOLOGIA
45
O roteiro das entrevistas encontra-se no Apêndice A.
73
- Capítulo 4 -
Tempo de
Tempo de
Entrevista 2 Nome48 Idade atuação nesta Escolaridade
Magistério
escola
Licenciatura em Artes Plásticas
Professora Especialização em Fundamentos
Ingrid 55 anos 10 anos 3 anos
de artes Estéticos e Metodológicos do
Ensino de Arte
46
O roteiro do grupo focal encontra-se no Apêndice B.
47
Nome fictício.
48
Nome fictício.
74
- Capítulo 4 -
49
Nomes fictícios.
50
O modelo do Termo de Consentimento está presente no Apêndice C.
75
- Capítulo 4 -
Inicialmente foi feita uma visita à escola para obter a permissão necessária para a
efetuação da pesquisa. Optou-se por uma escola pública pelo fato de fazer parte do PNLD
e, desta forma, receber os livros didáticos do governo federal.
A Escola Estadual Pe. Lux tem matriculados, no ano letivo de 2009, 641 alunos
distribuídos em 25 turmas entre o ensino fundamental e o médio. Localiza-se no bairro de
Azambuja, bairro turístico e próximo ao centro, de classe média, no município de Brusque,
Santa Catarina. A escola atende crianças e adolescentes também de bairros vizinhos e é
comum terem alunos vindos de escolas de outras cidades.
Optou-se por focar a pesquisa de campo em uma turma da 4ª. série (5º. ano) do
ensino fundamental basicamente por dois motivos. O primeiro foi o fato de este ser o
último ano em que há apenas uma professora para todas as disciplinas - o que facilitaria a
entrevista, já que a educadora teria a possibilidade de tecer comentários e comparações a
respeito de todos os livros utilizados pela classe. O segundo motivo foi a faixa etária das
crianças, mais adequada a este tipo de pesquisa, pela maior facilidade em expressar idéias.
Outra preocupação foi realizar a pesquisa de campo no final do ano letivo de 2008,
quando as crianças já teriam tido bastante contato com os livros didáticos.
As entrevistas foram realizadas separadamente, primeiro com a professora de artes
e no dia seguinte com a professora da classe51, conforme disponibilidade de ambas, em
sala reservada, na própria escola. Durante as entrevistas foram feitas perguntas pertinentes
à escolha dos livros didáticos, seu uso no cotidiano e seus aspectos visuais (os livros
51
As entrevistas foram realizadas nos dias 28 e 29 de outubro de 2008 e tiveram a duração de 45 minutos.
76
- Capítulo 4 -
52
O grupo focal foi realizado no dia 6 de novembro de 2008 e teve duração aproximada de 50 minutos.
53
A entrevista realizada com a professora de artes não foi analisada, uma vez que não utiliza o livro didático
no ensino de artes nesta escola.
77
- Capítulo 4 -
Em relação aos livros didáticos foi feita uma análise particular da comunicação
visual e gráfica, chamada pelo edital do PNLD de “aspectos gráfico-editoriais”. Com base
nos dados surgidos do grupo focal determinou-se a amostra de livros didáticos,
78
- Capítulo 4 -
Para fundamentar esta análise particularmente nos itens projeto gráfico, imagens e
tipografia recorremos às contribuições de White (2006) sobre tipos, imagens e projeto
54
Edital disponível em <ftp://ftp.fnde.gov.br/web/editais_licitacoes/edital_pnld_2007.pdf>.
79
- Capítulo 4 -
gráfico, Lupton (2006) sobre letra, texto e diagrama e Williams (2005) sobre tipografia e
planejamento visual. Todos fazem considerações pessoais em suas obras, baseados em
suas experiências profissionais, uma vez que não há uma ciência rigorosa, conforme
aponta Munakata (1999), e há discordâncias entre autores da área sobre certos aspectos
técnicos, como o uso, ou não, de tipos sem serifa56 para obras destinadas às crianças.
55
Foram realizadas adaptações ao texto original do edital.
56
Serifas são pequenos traços localizados nas extremidades das hastes das letras. Existem famílias
tipográficas com (ex: Times New Roman) e sem serifas (ex: Arial).
80
- Capítulo 5 -
81
- Capítulo 5 -
82
- Capítulo 5 -
alunos que, lá no livro didático, na sala, é mais fácil do que pesquisar na internet. Irene
adverte os alunos que às vezes o conteúdo lá no livro está bem mais resumido do que na
internet. No livro o assunto está resumido e no computador tem que procurar em vários
lugares. Segundo a professora, o livro didático favorece a compreensão dos conteúdos,
ajuda os alunos a entender melhor o assunto, completa e complementa, tem um papel de
intermediar a aprendizagem dos conteúdos.
Sobre a relação entre as crianças e a leitura, a professora revelou que poucos tem o
hábito de ler, e que isso afeta na hora de interpretar um texto, quando há muita
dificuldade e é necessário a ajuda dela. Ela disse que os alunos acham que ler é um sacrifício
e a maior dificuldade é a leitura. Frisou que a leitura exige concentração e que isto é difícil
para as crianças hoje, pois eles querem ganhar tudo pronto, não querem mais pensar. Irene
explica para eles que o texto muitas vezes precisa ser lido e relido, uma vez que nem
sempre se entende de primeira. A professora faz leituras coletivas em voz alta e percebe
que eles se distraem facilmente, principalmente quando já passou a vez de ler do aluno e
ele acha que não precisa mais acompanhar. Comentou que essa falta de atenção e o pouco
interesse pela leitura é um problema bem sério desta geração, e que antigamente era
diferente, pois o acesso aos livros era difícil. Neste ponto lembrou de sua infância, de sua
vida escolar no primário, em uma cidade muito pequena do interior, quando sua
professora, a única que possuía livros, passava todo o conteúdo no quadro porque não
havia livro de nenhum tipo para os alunos. A rotina consistia em copiar o texto do quadro
para o caderno, para então ler e estudar. Irene revelou que naquela época a gente rendia
bem mais do que nossos alunos hoje em sala de aula, onde cada um tem o seu livro. Relembra
a ocasião em que sua professora levou um livro de literatura para a sala e foi uma festa e a
cada dia havia um sorteio para saber quem levaria o livro para casa. Apontou a diferença
para os dias atuais onde há muitas opções de divertimento ao alcance das crianças como a
televisão, o computador, aparelhos de som que eles falam um monte de nomes, mas eu não
sei nada daquilo...
83
- Capítulo 5 -
crianças conseguem ler bem a imagem do que o conteúdo mostra e parece que eles tem mais
habilidade em ler a imagem do que a gente. Em relação ao visual dos textos, comentou que,
em geral, os livros apresentam um corpo de letra grande, que facilita a leitura das crianças
– que reclamam quando o corpo da letra é pequeno. Outro ponto que observou, além do
corpo da letra pequeno, é o texto amontoado, com pouco espaço entre as linhas – fatores
que tornam a leitura cansativa segundo sua opinião.
O livro didático mais interessante, no aspecto visual, segundo a professora Irene, é
o de Geografia, que se diferencia dos outros por ser bem colorido, ter muitos mapas,
seguido do de Ciências, que tem boas ilustrações. As características que lhe chamam
atenção no livro Projeto Pitanguá: Geografia são a organização interna, com o conteúdo
bem distribuído: os alunos gostam bastante.
Sobre o interesse dos alunos pelos livros didáticos a professora contou que o
aspecto visual é importante para as crianças, que são atraídas e gostam de livros bem
ilustrados. Citou como exemplo o livro Projeto Pitanguá: Português que é um livro com
poucas ilustrações, e é o que eles menos gostam. As imagens não são muito claras, não são
chamativas. Irene contou que o que chama a atenção de imediato dos alunos quando vão
iniciar a leitura de um texto são as imagens. Primeiro é a figura e ali eles já fazem um
comentário, o que está mostrando... e continuou dizendo se as imagens são claras você pode
trabalhar um assunto ou um texto só em cima das imagens. Comentou também que nos
livros didáticos aparecem imagens e textos retratando a diversidade de contextos, pessoas
e culturas.
84
- Capítulo 5 -
deveres ou para estudar e Luigi acrescentou que raramente a gente leva para casa. Juliano
contou que tem gente que esquece e não devolve e Natanael disse que sabem que precisam
usar com cuidado os livros didáticos.
Sobre a importância dos livros didáticos para estudar e entender os assuntos, todos
responderam ao mesmo tempo que ajuda e Joana salientou que ajuda bastante. Quando
indagados para que serve o livro didático, as respostas foram abrangentes. Edgar disse
para poder educar os alunos, Luigi para a gente aprender e Natalie que toda escola tem que
ter.
Em relação aos livros e à leitura, Joaquim e Natanael revelaram ter livros didáticos
antigos em casa e a maioria disse ter algum livro de literatura em casa. Quando
perguntados se gostavam de ler, responderam em uníssono: sim. Porém, aos poucos,
apareceram respostas individuais como a de Raquel que lê às vezes, de Joana que diz ler
bastante e já saber até de cor e de Natalie que diz ler toda noite e já leu todos os livros que
tem. As meninas comentaram que gostam de ler revistas e Joaquim disse que raramente lê
jornal ou revista. Edgar falou que tudo o que leu achou legal e Joaquim disse não lembrar do
que leu - ao serem perguntados sobre algum livro que acharam interessante.
85
- Capítulo 5 -
a capa conta alguma coisa sobre o livro, mas a gente também não pode julgar o livro pela
capa. Natalie completou dizendo que a capa pode ter alguma coisa a ver, mas não é o que
explica dentro.
Em relação às palavras e especificamente ao tamanho das letras que os livros
didáticos apresentam, Raquel e Natanael disseram que são muito pequenas, do que
Natalie discordou e falou que para ela estava bom. Luigi comparou com a letra do caderno
e disse que no livro a letra é maior: Depende do texto. Alguns tem partes maiores e menores.
Quando é maior ajuda a ler. Edgar afirmou que letra miudinha não entende e Natanael
contou que uma vez não entendeu a letra porque era pequena e tirou 8. Vários falaram que
acham que tem muito texto por página, principalmente o livro de Português.
Sobre as imagens que aparecem nos livros didáticos, Natanael disse que são
bonitas, principalmente nos livros de Ciências e Geografia, mas tem livros que os desenhos
são ruins. Contaram que no livro de Português tem reproduções de pinturas, no que
Raquel disse Portinari eu já estou cansada de ver e lembraram que no livro de História
também tem. Perguntadas se as imagens ajudam a entender um texto, a maioria falou, ao
mesmo tempo, que ajuda a entender. Luigi afirmou que o desenho me ajuda a entender o
que o texto está falando. A gente lê o título e vê o desenho. Falaram que o livro de Matemática
tem mais desenhos. Raquel falou que sem imagens não iria entender nada e Joana
concordou que realmente seria difícil entender.
Quanto ao livro didático preferido para estudar Joana, Raquel, Natalie, Joaquim e
Juliano disseram gostar mais do de Matemática por razões como porque a gente aprende
mais sobre contas e porque a gente precisa na vida, se quisermos ser alguma coisa. Luigi e
Edgar disseram preferir o de Geografia: o primeiro por gostar de estudar os planetas e o
segundo por gostar de mapas. Natanael disse preferir Ciências porque explica o corpo do
ser humano. Nos depoimentos pôde-se constatar que o livro didático de Português não é
citado entre os mais interessantes visualmente, nem entre os preferidos para estudar.
Por fim, em alguns momentos durante a atividade, muitas crianças falavam ao
mesmo tempo, empolgadas. Esse foi um dos motivos da escolha da técnica do grupo focal
- para que as crianças não se sentissem intimidadas. As crianças se mostraram à vontade,
umas mais falantes, outras mais tímidas, porém ao longo da atividade todas tiveram a
oportunidade de falar e expôr sua opinião.
86
- Capítulo 5 -
Matemática do cotidiano & suas conexões: este foi apontado como o livro preferido
entre os estudantes, tanto no aspecto visual, quanto na disciplina preferida para
estudar;
Projeto Pitanguá: Português: este livro não foi mencionado entre os alunos, tanto no
aspecto visual, quanto na preferência na hora de estudar. O resultado coincidiu com
a opinião da professora, que revelou que este é o livro didático que a turma menos
gosta.
O livro Matemática do cotidiano & suas conexões, da editora FTD, tem como autores
Antonio José Lopes Bigode e Joaquim Gimenez. Um breve resumo da organização interna
do livro é descrito no Guia do Livro Didático 2007:
87
- Capítulo 5 -
Cada livro é formado por nove unidades, que têm como eixo temas do cotidiano.
Os conteúdos das unidades são desenvolvidos em seqüências de atividades,
agrupadas por tópicos e intercaladas com textos informativos ou explicativos. As
atividades são de diversos tipos, como desafios, jogos, pesquisas, exercícios de
fixação e outros. Etiquetas marcam algumas das atividades: Em grupo,
Experiência, Desafio, Pesquisa e Criatividade. Ao fim de cada unidade, temos as
seções: Já sei fazer – com atividades para reconhecer, fixar e auto-avaliar os
conteúdos; Calculando de cabeça – com situações de cálculo mental e de
estimativas; e Revistinha da Matemática – com uma atividade lúdica; e as
subseções: Construindo; Você sabia?; Vamos ler ou Dica de Leitura. [...] O livro da
4ª série contém um resumo dos conteúdos tratados e sugere que o aluno faça seu
próprio resumo (BRASIL, 2006b, p.165).
Sobre o aspecto visual do livro há na seção Avaliando do Guia um texto falando que
“a coleção apresenta, ainda, grande diversidade de representações matemáticas, pois a
linguagem simbólica, desenhos, fotos, gráficos e tabelas estão presentes em toda a obra”
(BRASIL, 2006b, p.169).
Análise visual
1ª. orientação: o texto principal deve estar impresso em preto e títulos e subtítulos devem
apresentar-se numa estrutura hierarquizada, evidenciada por recursos gráficos.
88
- Capítulo 5 -
Esta primeira orientação é observada nesta obra. Todos os textos estão na cor preta,
a maioria sobre fundo branco e alguns sobre fundos de cores claras, porém sem prejudicar
a legibilidade.
Os títulos aparecem sempre na parte superior da página, alinhados à esquerda, o
que é recomendado por White (2006) pois são as áreas mais valorizadas da página dupla,
onde as pessoas mais olham. Os títulos estão destacados por meio de um recurso gráfico,
para hierarquizar a informação. Para Lupton (2006, p.94) a hierarquia “ajuda os leitores a
localizarem-se no texto, sabendo onde entrar e sair e como selecionar algumas de suas
ofertas”. Para auxiliar nesta hierarquia e diferenciar as seções são utilizadas cores: a seção
de atividades tem títulos realçados com retângulos nas cores verde e amarelo (fig. 14), as
seções Já sei fazer! tem títulos sobre retângulos laranjas e Calculando de cabeça utiliza
retângulos roxos.
Já as páginas finais da unidade possuem um fundo verde claro e a última um fundo
azul claro. Este recurso provoca uma quebra do ritmo visual por meio de um leve contraste
de cor e tem como objetivo chamar a atenção do leitor para um conteúdo diferente, bem
como ajudar a organizar as informações (WILLIAMS, 2005).
2ª. orientação: a impressão não deve prejudicar a legibilidade no verso da página. É desejável
que textos mais longos sejam apresentados de forma a não desencorajar a leitura, lançando-se
mão de recursos de descanso visual.
Em relação aos textos, pode-se observar ao longo da unidade o uso de um tipo sem
serifas, suave, de espessura fina (light), que dá leveza à página e contrasta com o colorido
das imagens. Um recurso utilizado nestas páginas é o uso de boxes coloridos que servem
para separar as atividades e dar uma quebra entre os textos, deixando-os mais leves,
organizados e interessantes visualmente. White (2006) expõe que os boxes servem para
destacar pontos importantes, dar coesão e personalidade e tornar a página mais viva e rica.
Eles são utilizados também para dividir a página em elementos, pois “as pessoas são
atraídas por tudo o que parece curto e fácil” (Ibid., p. 171).
3ª. orientação: o texto e as ilustrações devem estar dispostos de forma organizada, dentro de
uma unidade visual; o projeto gráfico deve estar integrado ao conteúdo e não meramente
ilustrativo.
Pode-se observar nesta primeira unidade do livro, vários recursos gráficos como
ilustrações, fotos e boxes coloridos que funcionam integrados ao texto, e contribuem para
a compreensão do enunciado e do problema proposto. Deste modo podem auxiliar a
aprendizagem infantil, já que nesta idade, como mesmo comentou a professora, eles são
bastante visuais. Uma aluna, Raquel, observou que sem imagens não iria entender nada. As
imagens procuram informar tanto quanto o texto e não são apenas decorativas. Estão de
acordo com o que White afirma
As imagens são disparos rápidos sobre o cérebro e as emoções. Por outro lado, as
palavras requerem tempo para serem lidas, absorvidas e compreendidas. São
90
- Capítulo 5 -
Uma questão interessante é que, mesmo o livro didático tendo sido ilustrado por
vários profissionais, observa-se uma preocupação em seguir um estilo, a fim de propiciar
uma unidade visual. Outro item que propicia uma unidade visual é o quadriculado que
aparece nas margens externas das páginas, que remete aos cadernos usados em
matemática. Williams (2005, p.48) explica que “para que todos os elementos da página
tenham uma estética unificada, conectada e inter-relacionada, é preciso que haja ‘amarras’
visuais entre os elementos separados”. Neste caso, a repetição do fundo quadriculado e do
estilo das ilustrações é um esforço consciente para unificar todos os elementos visuais.
White (2006, p.12) fala que “as imagens envolvem o observador por meio da
emoção e da curiosidade”. Além disso, para as crianças a imagem auxilia a compreensão do
conteúdo como revela a fala de Luigi: o desenho me ajuda a entender o que o texto está
falando. Nestas páginas as ilustrações, além de despertar a curiosidade, tem por objetivo
auxiliar a compreensão do conteúdo. A ilustração da esquerda mostra um menino e uma
91
- Capítulo 5 -
menina em uma situação de diálogo – que dá uma pista para resolver a questão seguinte.
A ilustração da direita, um labirinto, atrai a atenção em um primeiro instante, seja pela
variedade de cores ou pela disposição assimétrica na página e convida o aluno a resolver o
problema.
Quanto à diversidade étnica da população brasileira, as imagens mostram pessoas
com várias características diferentes, como olhos orientais, pele negra e cabelos ruivos,
fugindo do estereótipo da criança branca de cabelos loiros.
Quanto aos aspectos visuais o Guia traz somente que “trata-se de livros de boa
qualidade, com diferentes recursos visuais” (Ibid., p.218), sem dar maiores especificações.
92
- Capítulo 5 -
Análise visual
1ª. orientação: o texto principal deve estar impresso em preto e títulos e subtítulos devem
apresentar-se numa estrutura hierarquizada, evidenciada por recursos gráficos.
Esta primeira orientação também é observada nesta obra. A maioria dos textos está
na cor preta sobre fundo branco, exceto alguns títulos e subtítulos coloridos. Em toda a
unidade há apenas algumas ocasiões em que textos pequenos na cor preta estão sobre
fundos de cor pastel, o que não ocasiona prejuízo da legibilidade.
Este livro, diferente do de Matemática, trabalha com seções e subseções e portanto
com títulos e subtítulos. Os títulos das seções caem aleatoriamente no espaço da página:
às vezes estão na parte superior, outras no meio e outras na parte inferior, o que White
(2006, p.7) não recomenda pois “o alto da página precisa ser controlado, porque se torna
parte de uma corrente visual”. Em relação ao destaque dado aos títulos, estes formam uma
composição com um fundo retangular e uma ilustração e seu tamanho é apenas um pouco
maior do que o restante do texto. Os subtítulos também são pequenos e discretos, na cor
azul. White (Ibid.) diz que quem folheia deve conseguir entender do que se trata o
conteúdo por meio do título e do subtítulo, que devem ser visíveis e informativos. A
compreensão da estrutura hierárquica fica um pouco prejudicada, pois estes recursos
visuais tornam-se discretos no conjunto da página, que possui muito texto.
As escolhas tipográficas também não auxiliam na apresentação de um conjunto
interessante. Williams (2005, p.123) esclarece que a tipografia é o material básico de
93
- Capítulo 5 -
2ª. orientação: a impressão não deve prejudicar a legibilidade no verso da página. É desejável
que textos mais longos sejam apresentados de forma a não desencorajar a leitura, lançando-se
mão de recursos de descanso visual.
94
- Capítulo 5 -
compridas, é a imposição do formato grande pelo PNLD. Ao projetar livros para crianças,
White recomenda:
Divida tudo em pedaços que caibam na boca: o intervalo de atenção deles é curto
e mudar de foco depressa é algo que eles fazem o tempo todo. Unidades de uma
só página são consideradas longas demais. (2006, p. 239).
Uma fonte suave, arejada, com bastante espaço entre as letras (entreletra) e entre
as linhas (entrelinha) cria uma ‘cor’ e uma textura bastante suaves. Uma fonte em
bold e sem serifa, pouco arejada, cria uma cor escura, com uma textura diferente.
(2005, p. 166).
Observa-se que o emprego do negrito (bold) no texto destas páginas provoca essa
cor escura. Isso se percebe em páginas com muita massa de texto e poucas ou nenhuma
imagem. A monotonia do cinza não atrai os olhos, além de causar certa confusão, fazendo
com que a página torne-se desinteressante, e não incentive a leitura. Para melhorar o
aspecto destas páginas poderiam ser utilizados os chamados recursos de descanso visual,
mencionados na orientação. Alguns artifícios poderiam ser usados como a diminuição da
largura dos blocos de textos, o uso de boxes coloridos para organizar visualmente as
atividades, ilustrações integradas ao texto, entre outros. As crianças percebem a questão
do uso da cor para destacar elementos, como na fala de Luigi quando diz que a cor ajuda a
organizar as atividades.
3ª. orientação: o texto e as ilustrações devem estar dispostos de forma organizada, dentro de
uma unidade visual; o projeto gráfico deve estar integrado ao conteúdo e não meramente
ilustrativo.
95
- Capítulo 5 -
96
- Capítulo 5 -
Segundo a professora, este livro tem poucas ilustrações e é o que eles menos gostam.
Fala que as imagens não são chamativas, não atraem a atenção dos alunos. Como dito no
item anterior, a maioria das ilustrações desta unidade tem a função mais de decorar do que
auxiliar na compreensão do texto, como é o caso mostrado na Fig. 23. Em um mundo
saturado de imagens, não é qualquer tipo de ilustração ou foto que desperta a curiosidade
infantil. A localização e o tamanho das imagens no conjunto da página também não
favorecem uma melhor integração com o texto. White (2006) sugere construir a página em
torno de um ponto focal, dar um destaque significativo à imagem, para criar um impacto e
desse modo capturar o leitor.
Em relação à representação da diversidade étnica, pode-se observar no detalhe da
Fig. 24, uma predominância de ilustrações retratando crianças de pele clara e poucas
negras, orientais ou de outra etnia. Ao se elaborar um livro didático deve-se ter em mente a
diversidade cultural e evitar a todo custo a tendência à uniformidade.
57
Imagem editada pela autora.
97
- Capítulo 5 -
Neste item são analisados os dados obtidos através da entrevista com a professora,
do grupo focal com as crianças e dos aspectos visuais dos livros didáticos, buscando-se
estabelecer relações entre as informações obtidas e o conteúdo teórico estudado
anteriormente, o que caracterizamos como interpretação dos dados.
A ampla utilização dos livros didáticos gera discussões sobre a autonomia do
professor em sala, além de questões que vão desde a padronização metodológica até a
ideologia subjacente ao conteúdo. No cotidiano da sala de aula o professor o emprega
devido à facilidade para organizar e desenvolver suas aulas, porém há uma preocupação
quando o livro se torna o único material consultado e seguido na rotina escolar. Na
entrevista, a professora da classe fez questão de contar que não trabalha somente com o
livro didático em sala, que busca outras fontes para enriquecer a aula, pois em sua opinião
ele deve ser usado como algo a mais, algo para somar.
Sobre a importância dos livros didáticos no cotidiano, tanto a professora quanto os
alunos falaram que ajuda, que facilita o estudo. A professora também observou que o
contato com os livros didáticos é uma maneira de os alunos desenvolverem o hábito da
leitura, pois a escola ainda não tem uma biblioteca montada. As crianças, quando
questionadas se gostavam de ler, primeiramente responderam que sim, para logo depois
metade do grupo revelar que não gostava tanto assim, conforme a professora havia
revelado em sua entrevista. Como a própria professora confessou, a escola fica responsável
por muitas coisas, inclusive por fomentar o interesse e o contato com a leitura, uma vez
que cada vez menos as famílias se preocupam em desenvolver este gosto em suas
crianças. Muitas questões estão implícitas neste processo: a presença da televisão e de
outros meios de comunicação no cotidiano das crianças, que permanecem “ligados” e
“conectados”; os momentos de conversa, de troca verbal, parecem ter diminuído no dia-a-
dia das famílias, onde as imagens da “telinha” prevalecem; muitas famílias não cultivam o
hábito de falar sobre o que a televisão mostra e a criança faz suas próprias interpretações.
Por outro lado, em muitos lares, os pais lêem pouco, há poucos livros, quando há. As
crianças ouvem histórias por meio de CD’s e DVD’s, aparelhos comuns em muitos lares.
Porém, este procedimento, em muitos casos, substitui os momentos de contação de
histórias, nos quais existe interação direta entre o contador e a criança - nos lares, entre
98
- Capítulo 5 -
pais e filhos. Muitos pais não conhecem os livros didáticos de seus filhos, ou apenas os
manuseiam, sem incluir conversações e questionamentos. Trata-se de algumas
considerações que possibilitam diferentes problematizações sobre o papel e a importância
do livro didático para a criança.
A professora apontou também que a televisão e o computador competem com o
livro pelo interesse da criança e este último geralmente sai perdendo. Compara a sua
infância, quando havia poucos livros e eram valorizados pelas crianças, com a geração
atual, que tem maior acesso aos livros porém não tem tanto interesse. Pode-se relembrar
Sarmento (2005) quando diz que o lugar da infância na contemporaneidade é um lugar em
mudança, já que é historicamente construída, onde as práticas sociais e o estilo de vida são
continuamente atualizados nas interações sociais. Diz também que os novos brinquedos e
tecnologias mudaram o espaço-tempo lúdico das crianças, geraram novas linguagens e
desejos de consumo, nem sempre compreendidos pela geração mais velha, como quando
a professora diz eles falam um monte de nomes, mas eu não sei nada daquilo...
Esta comentou que acredita que o livro didático, particularmente por meio de seu
aspecto visual, auxilie os estudantes na compreensão do conteúdo, uma vez que observa
uma facilidade por parte deles em lidar com as imagens. Inclusive, de acordo com a
professora, são as imagens que despertam os primeiros comentários e histórias, antes
mesmo de iniciar a leitura do texto. Pode-se perceber neste relato a vinculação existente
entre imaginação e emoção da qual fala Vygotsky (2003). A criança, ao ver uma imagem
que lhe interessa e lhe diz respeito, logo é tomada por sentimentos particulares,
lembranças de situações vividas ou qualquer recordação em relação a ela e, a partir daí, a
imaginação é influenciada, e muitas vezes verbalizada. Em relação a este fato Walty (et al.,
2001) afirma que as imagens carregam significados culturais, afetivos, entre outros e
permitem leituras múltiplas, funcionando como um hipertexto58.
Para a professora, o aspecto visual é importante para as crianças, que são atraídas e
gostam de livros bem ilustrados. Citou como exemplo o livro Projeto Pitanguá: Português
que é um livro com poucas ilustrações, e é o que eles menos gostam. As imagens não são muito
claras, não são chamativas. Pode-se observar na análise visual deste livro que realmente há
poucas ilustrações, e muitas de tamanho pequeno. O aspecto visual não chega a motivar, a
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“Conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes
de gráficos, sequências sonoras, documentos complexos que podem ser eles mesmos hipertextos.” (LÉVY,
1993 apud WALTY et al., 2001, p. 117).
99
- Capítulo 5 -
servir de estímulo para o interesse dos alunos, que vivem saturados por imagens da cultura
visual.
A relação entre palavra e imagem, bem como de formas e cores é percebida pela
criança, como se nota na fala de Luigi quando diz que a cor ajuda a organizar as atividades.
Mostra que há uma consciência dos elementos visuais que ajudam na organização da
página e como este aspecto facilita no entendimento do conteúdo. Quanto mais os
elementos da página se relacionarem de maneira clara e organizada, melhor orientarão o
leitor através do texto, fazendo com que ele compreenda a mensagem. Luigi ressalta a
importância da relação entre palavra e imagem quando fala que o desenho ajuda a
entender o que o texto está falando. A gente lê o título e vê o desenho.
A importância da imagem nos livros é evidenciada e talvez até exagerada na fala de
Raquel: sem imagens eu não iria entender nada. Pode-se entender por imagem, não só as
ilustrações e as fotos, mas também a letra, que é um desenho, principalmente para as
crianças. Deste modo o texto verbal também é imagem, pois ganha forma por meio do
desenho da letra, a tipografia - “a cara da linguagem” como afirma Lupton (2006). Na idade
das crianças da pesquisa, 10 anos, o tamanho um pouco maior da letra é importante para a
compreensão, como revela a fala de Edgar: letra miudinha eu não entendo. Outra questão
que afeta negativamente a percepção dos alunos é o excesso de texto na página, onde foi
citado como exemplo o livro Projeto Pitanguá: Português, que tem muitas páginas onde a
imagem que o texto forma é a de um bloco cinza e pesado, com ilustrações pequenas e
que não auxiliam na compreensão do texto. As páginas parecem abarrotadas, cansando o
pequeno leitor antes de começar a ler. Nele a interação entre palavras e imagens é limitada
pelo fato de as imagens, na maioria das vezes, cumprirem uma função apenas decorativa,
deixando assim de construir um significado mais amplo com o texto. O livro não foi citado
por nenhum aluno, nem na questão do aspecto visual mais interessante, nem na questão
do livro didático de que mais gostavam de estudar. Na fala de Martins (2005, p.17)
“tocamos e somos tocados por aquilo que nos pode causar imenso prazer ou uma
dolorosa sensação de mal-estar e não-saber, que muitas vezes nos afugenta”.
O livro didático que a maioria dos alunos citou como sendo o mais bonito e com o
qual mais gostam de estudar, Matemática do cotidiano & suas conexões, trabalha a questão
da palavra e da imagem diferente do livro de Português. As imagens se relacionam
intimamente com o texto, são significativas, contribuem para a compreensão das
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- Capítulo 5 -
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- Considerações Finais -
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Houve uma época em que os livros didáticos eram pouco interessantes visualmente
e, geralmente, os de Português e de História possuíam mais imagens e os de Matemática
tinham uma “diagramação enfadonha” como relata Martins (2005). O aspecto visual de um
livro se faz pela combinação da tipografia, das imagens, de boxes, espaços, cores e
composição, que tem por objetivo comunicar uma mensagem, traduzir graficamente o
conteúdo. E como pôde-se perceber neste estudo, as crianças são efetivamente afetadas,
positiva ou negativamente pelo aspecto visual das páginas dos livros didáticos.
Os livros didáticos de hoje apresentam em suas páginas uma grande quantidade de
imagens da cultura visual, aquelas com as quais as crianças convivem em seu cotidiano.
Além disso, o próprio livro didático faz parte da cultura visual que, conforme Hernández
(2000) é interdisciplinar, busca referenciais da arte e de inúmeras áreas e se organiza em
relação a seus significados culturais. Hernández (Ibid., p.141) cita que, para vários autores,
inclusive Vygotsky, a aprendizagem é uma “relação entre a construção da subjetividade
individual e a construção social da compreensão.” Esta construção, a interação com outros
sujeitos, com o meio ambiente, com os objetos que nos cercam, com a cultura e com a
sociedade da qual fazemos parte resulta em conhecimento, construído internamente, e
que está em constante desenvolvimento.
Por outro aspecto, abordar o livro didático como artefato da cultura visual
possibilitou vê-lo como resultado de múltiplos fatores – político, cultural, entre outros - e
estudá-lo em seu contexto social e histórico. Pôde-se observar suas transformações físicas
e de conteúdo, de produção e de distribuição ao longo do tempo e melhor entender o que
ele representa atualmente. Em relação à produção do livro didático, foi visto o quanto seu
desenvolvimento é complexo e quantos profissionais são envolvidos. São autores,
professores, ilustradores e editores que elaboram este material didático e que devem ter a
consciência da importância da materialidade, da experiência visual para a construção do
conhecimento em qualquer fase de aprendizagem infantil.
Ao estudar conceitos relativos à criança, como a infância, desenvolvimento e
aprendizagem, pôde-se entender as relações entre criança, livro e leitura e como estimular
o contato com o livro, particularmente o livro didático, objeto de estudo desta dissertação
de mestrado. Despertar a curiosidade, aguçar a imaginação e o interesse pelo livro e pela
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- Considerações Finais -
leitura são caminhos para que esse encontro possa sempre ser prazeroso e fonte de
aprendizagem, e não um encontro cansativo e monótono. Viu-se também que pode haver
uma relação afetiva entre criança e livro. O modo como as crianças abraçaram e
disputaram o livro didático de matemática – no qual palavras e imagens interagem -
demonstrou isso. Quando a relação entre palavra e imagem é estreita se enriquecem os
significados e os sentidos da leitura e a compreensão é facilitada, pois são duas linguagens
trabalhando em prol de um mesmo objetivo: comunicar com eficiência e atrair o leitor para
o conteúdo por meio da forma.
Neste ponto entende-se, com base nas idéias de Vygotsky (2005, 2007), que o livro
é um mediador entre a criança e o conhecimento porque integra imagens e palavras, e
que, o aspecto visual, a qualidade gráfica, facilita esta mediação, oportunizando a
construção de conhecimentos.
A partir da análise e interpretação dos dados coletados foi possível perceber
questões importantes, como interações entre imagens, palavras e aprendizagens; a
comunicação visual que o livro didático contém, aspectos importantes implícitos na
complexa trama que integra percepção, comunicação visual, imagens, palavras e
aprendizagens na criança. Estas questões contribuem para uma relação de reciprocidade
entre o livro e a criança, concluindo-se que o livro didático é um importante elemento
mediador no processo de construção de conhecimentos. Se a comunicação visual do livro
didático se apresentar adequada, se os assuntos forem abordados com base nestas
associações entre imagens e palavras, a criança pode adquirir, de maneira mais satisfatória
e, principalmente, prazerosa os conhecimentos escolares.
O contato adequado com o livro didático na escola favorece a formação de hábitos
de leitura, além das aprendizagens, mas estes temas dependem também da valorização do
livro didático pelo professor. Certamente, não se trata de uma única possibilidade. Há
outras atividades escolares que ampliam as propostas do livro didático, estimulando novas
combinações. Estas considerações emergiram da pesquisa realizada, a partir da entrevista
feita com a professora. Os alunos, na pesquisa, demonstraram um papel ativo na análise do
livro didático: escolheram um como o preferido (por maioria), e deixaram de nomear outro
(o mais “rejeitado”). Estes pontos, dentre outras informações obtidas, são indicativos do
envolvimento das crianças nas relações com as diferentes experiências na escola. No caso
desta dissertação, o foco é o livro didático. As crianças mostraram afetividade, interações e
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- Considerações Finais -
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- Considerações Finais -
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- Apêndices -
APÊNDICES
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- Apêndices -
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- Apêndices -
Srs. Pais,
Gostaria de obter sua permissão para que seu filho(a), estudante deste colégio, possa
participar e contribuir para uma pesquisa de mestrado. O objetivo desta pesquisa é
descobrir qual a percepção que as crianças tem da comunicação visual dos livros didáticos
e se ela contribui como mediadora entre o aluno e o processo de construção do
conhecimento no ensino fundamental.
Participar desta pesquisa é uma opção. Caso aceite que seu filho(a) participe desta
pesquisa gostaria de esclarecer que:
• a etapa da coleta de dados (entrevista com grupo de crianças) será gravada em vídeo,
porém este material será usado somente para fins de transcrição de texto;
• as imagens não serão divulgadas em nenhum meio de comunicação;
• as crianças não terão seus nomes divulgados na pesquisa (identidade preservada).
Certa de poder contar com sua autorização, coloco-me à disposição para esclarecimentos.
Melissa Haag Rodrigues – pesquisadora.
Mestrado em Artes Visuais da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC.
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