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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

INSTITUTO DE LETRAS E LINGUÍSTICA


CURSO DE TRADUÇÃO

MARCO ANTONIO SANTOS ROCHA DE SOUSA

ANÁLISE DA TRADUÇÃO DO TEXTO DRAMÁTICO PARA ENCENAÇÃO:


“THE BEST BROTHERS”
PROCESSO ARTÍSTICO DE CRIAÇÃO E QUESTÕES ÉTICAS LEVANTADAS

Uberlândia/MG
2021
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MARCO ANTONIO SANTOS ROCHA DE SOUSA

ANÁLISE DA TRADUÇÃO DO TEXTO DRAMÁTICO PARA ENCENAÇÃO:


“THE BEST BROTHERS”
PROCESSO ARTÍSTICO DE CRIAÇÃO E QUESTÕES ÉTICAS LEVANTADAS

Projeto de Monografia apresentada ao Curso de


Tradução do Instituto de Letras e Linguística da
Universidade Federal de Uberlândia, como
requisito parcial para a obtenção do Grau de
Bacharel em Tradução.
Orientadora: Professora Dra. Marileide Dias
Esqueda

Uberlândia/MG
2021
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1. Introdução

A tradução de textos dramáticos para encenação se difere de outras áreas da tradução


especialmente porque seu resultado não será única e exclusivamente lido, como na tradução
literária, ou visto, como na legendagem. Ela se aproxima da tradução para a dublagem, pois
também será “encenada” por atores, mas se diferencia desta porque não possui o suporte
audiovisual do texto fonte, propiciando ao tradutor maior liberdade para adotar um projeto de
tradução que se distancie do texto a ser traduzido.
É importante também compreender que o texto dramático para encenação é parte de um
processo. O texto será o pontapé inicial para que a montagem e encenação da peça possam
acontecer, ou seja, o trabalho não acaba quando a tradução é concluída, ele só acaba quando a
peça é encenada em um local específico, em um contexto social específico e apresentada para
um público específico que irá ao seu encontro e participará deste encontro ativamente.
Isso faz com que a tradução de textos dramáticos para encenação dê ao tradutor a
oportunidade de tomar certas liberdades, por ser parte ativa de um processo em construção, mas
também traz uma série de desafios. As implicações éticas dessas liberdades e as
estratégias/ferramentas utilizadas para driblar esses desafios serão abordados nesse trabalho
através do estudo de caso da tradução da peça “The Best Brothers” realizada por mim em 2021
para que possa ser encenada em 2022 pelo Cia Líquida (companhia de teatro de Uberlândia).
A peça “The Best Brothers” é de autoria de Daniel MacIvor, um escritor e ator canadense,
e foi escrita e encenada em 2012 no “Stratford, Shakespeare Festival Studio Theatre” em
Stratford, Canadá. A comédia trata da morte de uma senhora Bunny Best e de como os seus
filhos, Hamilton Best e Kyle Best, que até então não eram tão próximos, terão que conviver e
lidar com os eventos desencadeados pela morte da mãe. Hamilton e Kyle são pessoas
completamente diferentes, eles têm personalidades diferentes, estilos de vida diferentes e,
principalmente, orientações sexuais diferentes. Os irmãos não costumavam ter uma relação tão
próxima, mas, depois da morte da mãe, serão obrigados a conviver um com o outro e esses são
os dois principais assuntos abordados pela peça, a morte da mãe e as diferenças entre os irmãos.
A tradução dessa peça é um desafio porque a liberdade tradutória neste tipo de material
(tradução de texto dramático) e a sensibilidade dos temas (morte, características pessoais) traz
à tona uma gama de possiblidades e questionamentos: a tradução deve ser localizada no Brasil
ou no Canadá? Os nomes dos personagens devem ser traduzidos? O tradutor deve tomar a
liberdade de abordar o assunto orientação sexual a partir de um viés mais “moderno” e
atualizado? A referências culturais devem ser mantidas ou traduzidas? A mensagem/tema/mote
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da peça pode ser “traduzida” para que reflita uma realidade cultural e social diferentes? Todos
esses questionamentos não devem ser analisados através de um viés puramente técnico, devem
também ser analisados por um viés ético, principalmente porque a ética utilizada e as escolhas
tradutórias são guiadas pelas vivências e experiências do tradutor.
O processo de tradução de uma peça teatral não deixa de ser a criação de uma obra artística,
e, por esse motivo, uma das metodologias escolhidas para analisar a tradução foi a crítica
genética, uma abordagem pela qual a gênese de uma obra é analisada utilizando fragmentos da
criação deixados pelo autor, para que possamos levantar hipóteses sobre o processo de criação
utilizado, suas etapas, suas escolhas, o que guiou o autor por essas escolhas.

2. Objetivos

Objetivo Geral
O objetivo geral desta monografia é analisar a tradução de um texto dramático para o
teatro utilizando os recursos metodológicos da crítica genética com foco na intencionalidade do
tradutor ao realizar a sua tradução e nos impactos éticos que as suas escolhas trazem para o
texto e para o público.

Objetivos Específicos
1. Analisar e comentar os desafios da tradução realizada por mim do texto dramático The
Best Brothers para o português;
2. Documentar o processo tradutório através da metodologia da crítica genética;
3. Discutir a intenção do tradutor e como ela influencia as escolhas do processo tradutório
a partir de um ponto de vista ético.
Anexadas a este projeto constam as cessões de direitos de tradução e encenação da peça,
bem como de uso para fins de elaboração de trabalho científico. (ANEXOS 1 e 2).

3. Justificativa

Esta pesquisa justifica-se pelos argumentos que se seguem:


• Do ponto de vista científico, a tradução de textos dramáticos tem
características específicas que a diferencia de outras modalidades mais
conhecidas, e essas características foram pouco analisadas até o momento
nos Estudos da Tradução. Parecem escassos os estudos sobre sua recepção
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imediata; forte ligação com momento histórico/social; e liberdade que o


tradutor possui em realizar as suas escolhas tradutórias. Além disso, as
etapas, processos e desafios da tradução de textos dramáticos para o teatro
ainda são pouco conhecidos. Neste caso, a crítica genética parece configurar-
se como uma boa ferramenta metodológica para documentar e descrever as
etapas desse processo;
• Do ponto de vista social, pode-se afirmar que a liberdade que o tradutor
possui ao realizar uma tradução deste tipo pode contribuir imensamente para
a sua visibilidade, pois é através dessa liberdade que se admite que o tradutor
possui intencionalidade em sua tradução e poderá externalizar e deixar essa
intencionalidade clara nos seus paratextos;
• Do ponto de vista pessoal, o tema da peça (morte, família, questões
LGBTQIA+) me interessa muito e o processo de tradução me trouxe um
grande desafio: como adequar o tema da peça à nossa realidade atual, ao
momento histórico/social em que vivemos?

4. Referencial Teórico

Cruz (2019, p. 3) trata da definição do texto dramático, o que o diferencia de outros


tipos de texto, retratando também a questão da tradução do texto dramático para a página ou
para a cena. Cruz (2019, p. 6) também argumenta sobre as questões específicas da tradução
desse tipo de texto: sonoridade, ritmo, marcas de oralidade.
Guimarães (2004, p. 1) trata do espectador implícito na tradução do texto dramático,
também discorre (2004, p. 3) sobre as noções básicas de dramaturgia necessárias para a tradução
do texto dramático.
Silva (2005, p. 4) aborda as subjetividades do autor e tradutor, do tradutor como sujeito
da tradução, e também (2005, p. 8) da imediata decodificação dos textos dramáticos quando são
encenados.
Salles (2008) trata da crítica genética, apresenta seus pressupostos, a demarcação do
campo, dá um exemplo de crítica genética em ação e fala também da implicação dos estudos
genéticos.
Esqueda (1999) aborda a relação entre as teorias da tradução e a questão da ética, assim
como Alves (2021) expõe sobre a ética da igualdade e a ética da diferença nos Estudos da
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Tradução. Também Castelões (2007) afirma que a ética da responsabilidade é aquela “que se
aplica na política, [...] aquela que vale para quem age politicamente” (2007, p. 2).

5. Perguntas de pesquisa

Quais os desafios específicos da tradução de textos dramáticos para o teatro?


Como poderemos traduzir esta peça em específico? Quais desafios ela traz?
Como os desafios foram superados no caso desta tradução? (Tanto os desafios da tradução
de textos dramáticos quanto os desafios dessa peça em específico?)
Como acontece o nascimento de uma obra artística? Por quais processos ela passa até que
seja concluída? Como se dá o processo de criação artística?
Até que ponto as subjetividades do tradutor e sua intencionalidade afetam as suas escolhas
tradutórias?
Quais são as implicações éticas dessas escolhas tradutórias?

6. Metodologia

Este trabalho adota uma pesquisa exploratório-descritiva, que visa a partir da análise da
tradução da peça “The Best Brothers” e de seus documentos (glossários, anotações de pesquisa,
tabelas de referências) descrever o processo tradutório e buscar respostas ou possíveis respostas
para as perguntas de pesquisa levantadas.
Antes de tudo é preciso contextualizar e caracterizar a especificidade da área onde esta
tradução se insere. Essa contextualização será realizada com a ajuda de definições como as de
Cruz (2019), que diferencia da tradução do texto dramático para a página de para a encenação:

“Quando a intenção é fazer uma tradução para a cena, devemos ainda lembrar
que a montagem de um texto teatral traduzido, acontece, via de regra, em outro
lugar e outro tempo, o que implica lidar com questões culturais, convenções
teatrais, entre inúmeros outros fatores.” (2019, p.6)

Cruz também elenca uma série de características típicas desse tipo de texto como
sonoridade, ritmo e marcas de oralidade. Guimarães (2004) também elenca uma característica
específica do texto dramático para encenação, para a dramaturgia:

“[A]s relações, no texto dramático, são estabelecidas diretamente pela


intervenção do autor, através da divisão em cenas e atos, pelas didascálias,
pelas relações temporais e espaciais, que ele próprio define, etc, que
determinam, em grande parte, o ritmo da peça.” (2004, p.3)
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Não só por lidar com questões típicas da dramaturgia, como elenca Guimarães, mas por
lidar com questões culturais, como citou Silva (2005), que a subjetividade do tradutor/autor é
muito importante e deve ser levada em consideração, pois:

“O tradutor não é apenas aquele que tenta resolver problemas, é também aquele
que os cria, e ao criar problemas ele se inscreve como sujeito na tradução, e é
nesse sentido que traduzir é também uma forma de escrita.” (Silva, p.149)

Como principal ferramenta de análise, foi escolhida a Crítica Genética, que, como
afirma Salles (2008, p.8), “[traz] consigo, desde seu surgimento, a possibilidade de explorar um
campo mais extenso, que nos levaria a poder discutir o processo criador em outras
manifestações artísticas.”
A peça já havia sido traduzida por mim, mas não só o resultado final, peça traduzida,
será analisado, os documentos auxiliares criados durante o processo de tradução (glossários,
anotações de pesquisa, tabelas de referências) e as diferentes versões criadas por mim também
serão analisadas, pois, nas palavras de Salles (2008, p.10), estes documentos são “o testemunho
de suas variações ao longo das escrituras, isto é, um material que oferece aos pesquisadores
uma fonte de estudo que os livros acabados não são capazes de fornecer.”
A análise utilizará a crítica genética como metodologia e os documentos auxiliares,
junto com a obra final, como base para a realização das análises, mas será preciso escolher um
foco, um tema que irá guiar as análises. O tema escolhido são as mudanças realizadas, por mim,
na qualidade de tradutor e suas implicações éticas, que dentre elas podemos listar:

• Alterações relacionadas à localização geográfica da peça e nomes de lugares;


• Alterações nos nomes dos personagens;
• Alterações das referências culturais (datas comemorativas, nomes de
produtos, esportes, animais);
• Alterações relacionadas a questões sociais (classe social, referências à
estereótipos sociais de sexo, ausência ou presença de deficiência, orientação
sexual e expressão de gênero).

As alterações serão também analisadas por uma perspectiva ética. Esqueda (1999, p.3)
explora diferentes visões de linguagem que acabam por nortear e definir o que seria ético para
alguns teóricos da tradução: um exemplo seria a visão logocêntrica da linguagem que ignora
circunstâncias históricas, ideológicas e culturais, presando pela não interpretação e não
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interferência do tradutor, visão contraposta pelos teóricos que entendem que toda linguagem é
intrinsicamente interpretada, e portanto recriada por quem a consome: “a ética do tradutor está
ligada à sua interpretação, ao seu conhecimento de vida, às circunstâncias socioculturais a que
pertence” (Esqueda, p.52).
Outro aporte teórico que será utilizado para analisar a ética do tradutor em relação às
alterações será o de Alves (2021) que trata da ética da igualdade e da ética da diferença, nas
quais a ética da diferença se aproximaria da visão logocêntrica apresentada anteriormente
enquanto a ética da igualdade seria “uma ética pós-moderna, que promova a visibilidade de
tradutores(as) e permita aos(às) leitores(as) avaliarem a coerência entre a proposta construída
na política tradutória e a forma que o texto traduzido efetivamente assume”.

7. Cronograma

ETAPAS Mês de execução 2021

dezembro janeiro fevereiro março abril

Revisão dos objetivos e perguntas de pesquisa

Revisão do referencial teórico

Revisão da metodologia

Escolha dos excertos da tradução a serem


analisados

Análise dos excertos e documentos utilizando


crítica genética e o referencial teórico sobre
ética

Conclusão e preparação da versão final do texto


e da apresentação pública da monografia

Apresentação pública da monografia

Revisão final da monografia


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Referências

ALVES, Daniel Antonio de Sousa. Tradução e Ética: Sobre ética da tradução como uma
prática social de reflexão consciente. In: Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras
- UFPel, v. 24, n. 1. Pelotas, 2021.

CASTELÕES de Oliveira, Maria Clara. Ética ou Éticas da Tradução? In: TradRev.11085.


Rio de Janeiro, 2007.

CRUZ, Claudia Soares. Tradução teatral – entre teoria e prática. In: Urdimento,
Florianópolis, v. 2, n. 35, p. 263-280, ago/set, 2019.

ESQUEDA, Marileide D. Teorias de tradução e a questão da ética. Mimesis, Bauru, v. 20,


n. 1, p. 49-55, 1999.

GUIMARÃES, Maria Helena. A tradução para teatro. In: Polissema: revista de letras do
ISCAP, Porto, v. 4, p. 59-70, 2004.

SALLES, Cecilia Almeida. Crítica genética: Fundamentos dos estudos genéticos sobre o
processo de criação artística. 3ª edição. São Paulo: Editora Educ, 2008.

SILVA, Alexandra Moreira. Do outro lado do Atlântico: Um diálogo sobre Teatro,


Tradução e Tradução de Teatro. In: Cadernos de Literatura Comparada – Teatro em
Tradução, Porto, v. 12/13, p. 148-162, dez, 2005.
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Anexo 1

RE: Performance Rights Request


Marco Antonio <mrochadesousa@gmail.com> Sat, Jul 24, 2021 at 9:22 AM
To: Meaghan Denomme <meaghan@ggagency.ca>
Cc: Katie Bartninkas <katie@ggagency.ca>, Marileide Dias Esqueda <marileide.esqueda@ufu.br>

Thank you so much Meg,

We'll submit our application and we'll keep you updated on the result. I hope we get the
approval for the funding and move on with the negotiations of the royalty fee to translate and
stage the play in 2022. =)

Besides our plans to stage the play, I am getting a degree in Translation at the Federal
University of Uberlândia and in my end-of-course written paper I want to discuss the translation
of theatre plays.
I am advised by Professor Marileide Dias Esqueda (in copy) and I want to know if I may use
small excerpts of the play to exemplify some possible translations choices if the play were
translated from English to Portuguese.

My faculty is very strict when it comes to copyright and in no way they would allow me to use
even small excerpts without consent.

Thanks in advance,

Marco Antonio Sousa


Project Management | Translation and Subtitling

+55 034 99149-9834


Uberlândia / MG - Brasil
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Anexo 2

RE: Performance Rights Request


Meaghan Denomme <meaghan@ggagency.ca> Sun, Jul 25, 2021 at 10:31 PM
To: Marco Antonio <mrochadesousa@gmail.com>
Cc: Katie Bartninkas <katie@ggagency.ca>, Marileide Dias Esqueda <marileide.esqueda@ufu.br>

Sounds good, thanks Marco! Best of luck with the funding.

Yes, we can grant use of small portions of the script for educational purposes in your thesis.
Thank you for checking in!

All the best,

Meg

Meaghan Denomme, Literary Agent

250 The Esplanade, Suite 304

Toronto, ON M5A 1J2

p: 416-928-0299 x5

www.ggagency.ca

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