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G 7-8 COMUNIDADES

CURUÇA-MIRIM E PALHAL
Panorama: Comunidades Quilombolas de Oriximiná e a mineração de bauxita
JUQUIRIZINHO JUQUIRIZINHO JUQUIRI
JUQUIRI

JAMARI MOURA JAMARI MOURA


CURUÇA CURUÇA
BOA VISTA BOA VISTA
PALHAL PALHAL

ATIVIDADES DE
MINERAÇÃO

Mapa de localização aproximada das Comunidades quilombolas Mapa da área com autorização de lavra da bauxita (em
de Oriximiná: Boa Vista, Moura, Palhal, Curuça, Juquiri, vermelho). As demais áreas encontram-se em fase de
Juquirizinho e Jamari prospecção (estudos e análises).

Fonte: Instituto Socioambiental – ISA. Terras Indígenas no Brasil. Disponível em: https://terrasindigenas.org.br/. Acesso: 03 mar.
2022.

Situação fundiária: Curuçá-Mirim e Palhal são comunidades do Território Quilombola Alto Trombetas II, que
inclui ainda Juquiri Grande, Juquirizinho, Jamari, Moura, Nova Esperança e Último Quilombo, que está em
processo de regularização no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Com a expansão
das atividades de mineração sobre o território de uso comunitário, os quilombolas dessas duas comunidades
relatam possíveis impactos que possam afetar seus modos de vida e suas práticas agroextrativistas, como se
pode verificar a seguir:
Relatos:
1. “A gente tem um projeto aí com a mineração. Lá no platô [parte alta da Flona Saracá-Taquera, onde a
empresa expandirá suas atividades de mineração], o trabalho da gente é assim: onde eles estão
desmatando, estão tirando a bauxita, aí a comunidade entrou em contato com ela logo [...] porque a
gente se beneficia com a copaíba que é tirada de lá. [...] a gente fez um projeto antes de eles
desmatarem, de tirarem a copaíba. A gente faz um inventário, plaqueia as árvores da copaíba para
comprovar como a gente trabalha naquela área. Aí passa de dois em dois meses, é nessas duas
comunidades, [vai uma comunidade, aí passa [dois meses], vai a outra. Assim a gente tem esse projeto
de trabalho na copaíba, para provar para eles [empresa mineradora} que a gente trabalha mesmo lá.”
(Curuça-mirim)
2. “Eu acho que o que pode acontecer, o que está acontecendo é um benefício para as comunidades. A
bauxita que vão tirar desse platô está beneficiando as comunidades. Se não fosse essa bauxita aí, eles
não iam fazer isso nas comunidades. A mineração, depois que ela for embora, também as comunidades
não vão mais ter esse benefício. Porque a gente mora aqui, bem dizer na frente da mina da bauxita,
então, as comunidades ficam na frente e eles estão por trás tirando, aí eles beneficiam as comunidades.
O benefício é o que eles põem na mão das comunidades, que é uma base de 22 mil [reais], então, a
comunidade vê o que ela quer. Aqui o que nós pedimos foi: um motor de luz, para trocar esse aí, maior;
pedimos um motor de centro, uma lancha, que às vezes a gente não espera o que está para acontecer,
acontece alguma emergência; uma casa de farinha que precisa, que tem uns roceiros que têm a roça e
para fazer uma farinha é o dia todinho, então, nós pedimos esse material para ver se facilita mais. Então,
cada ano eles estão dando esse benefício e a comunidade pede o que é preciso. É de ano em ano, do
começo de 2014 para cá. A cada ano tem esse dinheiro para as comunidades. Aí a comunidade escolhe
o que quer. Não é assim de dizer que eu vou dar dinheiro para a senhora... Vê o que a comunidade quer,
faz o projeto e faz o lançamento para ver se dá de comprar.” (Curuça-mirim)
3. “Fizeram coisa de plantar semente, fazer um plantio, fizeram [a empresa mineradora]. Mas, como o
pessoal que trabalha com a copaíba diz, na capoeira não dá copaíba, só na mata virgem. Elas estão
crescendo, mas não como deveriam porque ela tem que estar numa média [de idade] bem avançada
para dar o óleo... e nem todas as copaibeiras dão óleo. Tem umas que são secas, tem umas que já estão
ocas. Vai custar muito [tempo] até elas ficarem grossonas para ter o óleo.” (Curuça-mirim)
4. “O que ela [a empresa mineradora] fizer lá... vai ter muito [impacto] na saúde dos quilombolas porque
com certeza vai ter algo impuro que vem para o rio, que mesmo eles tendo o cuidado, mesmo assim,
polui os rios, que eles poluíram o lago do Batata [lago próximo ao Porto Trombetas que ficou poluído e
assoreado após o despejado do rejeito da mineração ao longo das décadas de 1980 e 1990]. Vai atingir
a saúde dos quilombolas. O rio vai ficar poluído, a gente não vai ter uma água tratada, vai beber essa
água poluída, vai adoecer o pessoal.” (Curuça-mirim)
5. “Hoje essas pessoas estão tirando copaíba, por exemplo, mas tem outros que estão se formando, estão
se levantando. Do que eles vão viver? Daqui a pouco a Mineração vai embora. O prazo para ela estar
aqui dentro é até 2046. Esses que estão vindo agora, do que eles vão viver na situação que está? Isso é
uma coisa que a gente tem que pensar. Agora eu preciso sustentar minha família. Os meus netos que
estão vindo também vão precisar sustentar a deles sem precisar sair daqui.” (Curuça-mirim)
6. “A gente vai para lá [trabalhar na empresa de mineração], a gente não está acostumado a ser
empregado, está acostumado a trabalhar dez dias na copaíba e volta. O copaibeiro ganha mais de que
um salário da mineração. O emprego, ele acaba tirando a cultura das pessoas que poderiam viver da
situação [...]. Se ele vai daqui para a Mineração atrás de emprego, não é que ele goste, é porque ele está
sendo obrigado porque ele precisa de emprego para ele. É diferente de ele ter uma geração de renda
do próprio local dele porque ele não sai de lá para cuidar daquilo que é dele.” (Curuça-mirim)
7. Contaminar os lagos, os igarapés, encher de resíduos de bauxita. A destruição dessa montanha lá que
eles querem fazer, se descer para o igarapé vai atingir a gente aqui, por que o igarapé fica em cima. Tudo
que for feito lá vai descer para o rio, não tem como desviar e aí piora mais do que já está. (Palhal)
8. O desmatamento lá na área da mineração. Ela desmatou bastante. Eles jogaram um castanhal lá na Serra
do Almeida, jogaram um castanhal todinho na terra. Esse impacto de lá deu para dois ou três igarapés.
O igarapé estava ruim, deu para lá o impacto. O impacto é o que a gente vem sentindo muito, porque,
nessas serras todinhas que eles vêm desmatando, dá muita copaibeira. Esse pessoal aqui do Jamari,
Curuçá, é onde eles iam tirar copaíba, lá nessas serras. (Palhal)
9. Eles entram, vão derrubando as matas, vão derrubando as árvores grandes, outro vem quebrando os
paus, explode a terra para tirar o minério, tem as escavadeiras, e com esse barulho todo, qual é o animal,
o bicho do mato que vai ficar perto, o pássaro que vai ficar perto desse barulho desse todo? Eles se
assustam, eles estão acostumados com tranquilidade dentro do mato, com silêncio. Até o ser humano
andando sozinho, quando a caça vê, um bicho vê, ele não fica, não vem, não fica perto. As caças, antes
eles iam aqui atrás, aqui mesmo. Só era sair daqui, encontrava na beira do mato, aí já pegava, matava
uma cotia, pegava um veado, um porco-do-mato, pegava um jaboti. Agora não. Meu pai passou o dia
todinho, semana passada, andando aí para trás, no mato mesmo, fechado. Não conseguiu, não via a
caça, aí ele chegou e ficou triste. Eu disse: Papai o senhor matou alguma coisa? Ele: “Não minha filha,
nem vi, nem vi nada”. Aí ele disse: “As coisas estão ficando difíceis”. A gente fica conversando entre a
gente, família lá em casa. Aí eu disse: Poxa, papai, está ficando difícil mesmo a situação aqui, peixe está
desaparecendo, tracajá esse ano ninguém não comeu um sequer, a caça o senhor vai e já não consegue,
e era uma coisa tão fácil. Eu não sei, com mais esses... vão abrindo mais essas minas aí para trás, eu não
sei como vai ficar a situação, só a gente esperar para ver o que vai acontecer! (Palhal)
10. A gente acha que é invasão, o pessoal invade muito e vai acabando. Os moradores daqui não, não
acontece isso, a gente não pega, não enche uma saca de tracajá, porque tem o Ibama aí. A gente sabe
que não pode, então a gente não faz. Nós moradores, temos aquela facilidade, de quando você... Ah eu
quero comer tal coisa! Eu vou lá, eu sei que é rápido e eu pego só aquilo que eu preciso para minha
alimentação, pronto! Mas agora não acontece isso. Antes eu colocava uma malhadeira, eu pegava um
peixe, rapidinho. E se não tirasse logo, estragava peixe, mas hoje em dia não é mais assim. Como eu
estou falando, em relação ao tracajá, a gente sabe que é proibido, mas a gente, morador daqui pega
um, come. Antes era assim, agora não; nem se você quiser, você não consegue. Acabou, não tem dentro
do lago, não sei o que aconteceu. Eu acho que tudo isso são os impactos que vão acontecendo no rio.
Ou enche demais, ou vaza demais, e eles vão para outros lugares, procurar outros lugares e vão saindo
daqui. (Palhal)

Fonte dos relatos: Figueiredo, Wilmara Aparecida Silva (coord.) Estudo do componente quilombola das
comunidades localizadas no entorno da Mineração Rio do Norte – Relatório Geral. Combuca Norte:
Santarem/PA, 2017. Disponível em: https://cutt.ly/qPSZaCa. Acesso: 22 fev. 2022.

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