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Com o rompimento, a mineradora também foi responsável pela morte do rio Paraopeba,
que hoje se encontra completamente contaminado com metais pesados em função do
contato com os rejeitos, e por uma série de outros impactos, como a desestruturação
econômica e social de Brumadinho e região. Uma mancha forte e irremovível na imagem
da Vale, que antes mesmo do crime em questão, já não gozava de grande prestígio
perante a opinião pública em função de inúmeras outras violações que havia cometido
no Brasil e no exterior, com as que tiveram maior ressonância estando atreladas à mais
um rompimento de barragem de rejeitos, no caso, em Mariana (MG).
Fato é que além dos 150 dias do crime, na última terça-feira também se completaram 150
dias de impunidade, uma vez que a população sobrevivente, mas também atingida
(familiares de vítimas e pessoas que perderam tudo com o caos social e econômico que
se instalou em Brumadinho), encontra-se à própria sorte, sem qualquer apoio da Vale.
Um descaso!
Todavia, mesmo com a gigantesca sombra que hoje paira sobre a mineradora, há quem
ainda lute com todas as forças para tê-la por perto, operando em seu território. Um
equívoco? À primeira vista pode parecer que sim, porém, por vezes tratam-se de
contextos extremamente complexos, que somente podem ser entendidos quando
direcionamos nossa lente de análise para a dependência econômica e social que os
territórios minerados possuem do setor.
Ourilândia do Norte possui parte significativa do seu território composta por Terras
Indígenas (TIs) dos povos Xikrin e Mebêngokrê/Kayapó e no dia 17 de junho de 2019,
cumprindo decisão judicial expedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região
(TRF1), a Vale suspendeu todas as atividades no Onça Puma justamente porque o
desembargador Antônio Souza Prudente, ao julgar um processo movido pelo Ministério
Público Federal (MPF), entendeu que o projeto estava impactando de forma significativa
os indígenas que vivem na área de influência do mesmo. Mais detalhadamente, desde
2012 a Vale vem sendo alvo de ações judiciais movidas pelo MPF, que pouco tempo após
o início da operação de lavra no Onça Puma, começou a denunciar as violações
praticadas pela mineradora em Ourilândia do Norte e região que estão recaindo sobre as
populações indígenas, com a principal delas sendo a contaminação do rio Cateté, que
corta a TI Xikrin do rio Cateté, com metais pesados, o que vem provocando uma série de
doenças e até mesmo má formação fetal entre indígenas Xikrin, diretamente impactados,
e Kayapó, impactados de forma indireta, conforme interpretação do tribunal.
Porém, mesmo com a suspensão total das atividades no complexo Onça Puma tendo
ocorrido somente há poucos dias, como dito antes, desde 2012 o MPF vem movendo
ações contra a Vale em função dos impactos provocados pelo projeto sobre os povos
Xikrin e Kayapó e a empresa, por sua vez, sofrendo constantes derrotas na justiça,
inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF). Assim sendo, a decisão proferida pelo
TRF1 mencionada acima consiste na 6ª vez em que a justiça brasileira determinou a
paralização das atividades no Onça Puma (e na 3ª decisão proferida pelo TRF1).
Fazendo um pequeno resgate, em 26 de fevereiro de 2019, após análise de uma ação civil
pública movida pelo MPF, o TRF1 determinou a paralização imediata das operações no
complexo Onça Puma, ordem que foi descumprida pela mineradora, conforme
denunciaram organizações indígenas e apuraram peritos convocados pelo tribunal em
questão, durante visita feita ao projeto de mineração. Em função disso, o desembargador
já mencionado determinou que a empresa deveria pagar multa diária de R$ 100 mil reais
por descumprimento da ordem judicial, aumentando-a, depois de nova resistência da
Vale em cumprir a determinação, para R$ 200 mil/dia Fato é que em 14/06/2019, o MPF
soltou uma nota afirmando que a usina de processamento de níquel seguia operando
normalmente e o TRF1 endureceu e fez a Vale paralisar de fato todo o complexo de
mineração.
Se por um lado, a determinação do TRF1 significou justiça feita para os povos indígenas
Xikrin e Kayapó, que há muitos anos estão sofrendo com as violações cometidas pela
Vale no sul e sudeste do Pará. Por outro, a paralização do complexo Onça Puma vem
sendo profundamente sentida por parcela expressiva da população não indígena de
Ourilândia do Norte e região, que hoje se encontra fortemente dependente do setor
mineral.
Trata-se de um cenário que tem gerado muita incerteza em Ourilândia do Norte e que
tem feito o município cair em uma profunda depressão econômica e social. São os
reflexos da dependência do setor mineral, que é capaz de produzir situações
verdadeiramente contraditórias, como o clamor popular pelo “retorno” da Vale à região,
mesmo em um cenário onde muitos, mundo à fora, dariam tudo para tê-la bem longe.
Lembremos de Brumadinho.
Foi o que aconteceu há duas semanas atrás, no dia 12 de junho, quando um grupo de
manifestantes, sob influência da elite local de Ourilândia do Norte e região (fazendeiros,
empresários, entre outros), fez um bloqueio na PA-279, que conecta Xinguara à São Félix
do Xingu, exigindo que o judiciário revesse sua posição e liberasse a retomada da lavra
no projeto Onça Puma. Obviamente, acusando os povos Xikrin e Kayapó de serem
contra o “desenvolvimento” e não olhando para as violações cometidas pela Vale contra
os indígenas em questão, que de fato foram a causa da suspensão do projeto.
A situação confrontada em Ourilândia do Norte deixa evidente que não importa quantas
vezes a empresa será demandada judicialmente não iremos jamais avançar [já estamos
no limite do tolerável] com a subserviência à mineração industrial sem rever o modelo
mineral em sua fase senil, sem de fato construirmos outras prerrogativas, que instaure
outro modelo de mineração. A ruína territorial e de suas civilizações não deve ser a
nossa única sorte!
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30/06/2019
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