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Atingidos e Atingidas pela Vale

“A atividade mineral é uma das atividades


que mais mata. E o Brasil é o país que
mais mata”

Doenças, morte e descaso: por dentro da vida dos trabalhadores da mineração

Como vivem – e morrem – os trabalhadores da indústria mais letal do país.

Em Itabirito no final de 2014, quando a barragem da Herculano Mineração não resistiu


ao excesso de rejeitos depositados pela companhia e, ao romper, matou três operários.
Adilson Aparecido Batista foi um deles. Quatorze dias antes, ele havia avisado a
empresa de que a barragem estava sob risco, mas foi ignorado.

Em 2015, quando a barragem da Vale de Fundão, em Mariana, desabou, 14 das 18


vítimas fatais eram funcionários da companhia. Em Brumadinho, o número total de
trabalhadores mortos em decorrência do crime ainda é desconhecido, mas já se sabe que
uma grande parte dos 142 mortos e 194 desaparecidos é de funcionários diretos e
terceirizados.

O Brasil de Fato conversou com três especialistas sobre as condições de trabalho nos
projetos de exploração mineral que operam no país. O quadro desenhado por eles é de
descaso com as vidas humanas que sustentam os lucros bilionários das empresas do
setor.

“A atividade mineral é uma das atividades que mais mata. E o Brasil é o país que mais
mata. O acidente de trabalho de Brumadinho é o maior acidente de trabalho do mundo.
E o pessoal até agora fica nessa firula: se é acidente, se é crime ou se é desastre. É as três
coisas juntas e muito mais”, disse Marta Freitas, uma das entrevistadas.

Cotidiano

Lourival Andrade começou a trabalhar na Vale em sua cidade-natal, Itabira (MG), no


ano de 1970. Hoje ele faz parte da Ação Sindical Mineral, que reúne os sindicatos
mineiros do país e foi criada para pressionar por um Marco Regulatório da Mineração
que oferecesse proteção aos trabalhadores e às comunidades afetadas pelo setor.

“Existe um estudo feito pela CNI [Confederação Nacional da Indústria], que a gente
assistiu. [Ele mostra que] o pior clima organizacional entre as 15 principais atividades da
economia brasileira é o da mineração. Esse clima ajuda a criar o segmento que tem mais
acidentes, mais adoecimentos, mais mortes de todos os setores da economia”, conta.
“Você tem que fazer mais rápido, mais efetivo, trabalhar em muito maior risco, tudo pra
ser bem barato”.

O dia a dia inclui a exposição a uma jornada de trabalho exaustiva e muitas vezes ilegal,
combinada com um ambiente que mistura carregamento de peso, vibração, ruídos,
máquinas pesadas e risco de desabamentos.

Andrade relata o efeito desse ritmo de trabalho na vida ao fim do expediente, nos
hábitos e vícios dos mineiros: “O que acontece quando você sai da mina? A mina tá
ligada diretamente ao boteco, ao bar, ao posto de saúde: É o ansiolítico, o Dorflex, o
relaxante muscular. Ou à boca: especialmente [com o] uso de cocaína”

Quase nenhuma fiscalização

“A gente fiscaliza a mineração dentro das nossas limitações, porque não temos gente
suficiente. O número de auditores está baixíssimo. Pior que a gente só a Agência
Nacional de Mineração, que não tem quase ninguém. A gente não consegue fiscalizar as
barragens todas, não tem jeito”, conta Parreiras. “O número de auditores que [temos]
agora é o mesmo que a gente tinha em 1994, e a multa máxima é de R$ 6.000 por
infração”
“A Organização Internacional do Trabalho considera a legislação regulamentar brasileira
a melhor do mundo, só que ela não é aplicada pela grande maioria das grandes
mineradoras”, diz Lourival de Freitas. “Nós somos a melhor província mineral do
mundo, mas de legislação mais frouxa, de fiscalização mais frouxa, de preços baratos das
pessoas.”

Futuro

“As perspectivas são muito ruins. O CEO [presidente executivo] da empresa está lá
ganhando dinheiro, não tem envolvimento com as pessoas, não se sente responsável. Ele
tem que atender a [demanda por] produção e remuneração do capital. Pelo que estou
vendo na maioria das minas, na Agência Nacional de Mineração, como está o poder
institucional, eu lastimo e acho que vai piorar. [Os acidentes e as mortes] estão
aumentando”, diz Lourival Andrade.

A colega dele, Marta de Freitas, encerra apontando um futuro de ainda mais tragédias:
“Lamento dizer que não aprendemos a lição com Mariana, com a Hidro, com a
Herculano, e teremos outras Brumadinhos pela história”.

Marcos Hermanson | Brasil de Fato

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08/02/2019
Notícias

mineração, morte, Trabalhador


Publicado por atingidospelavale

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