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LUDOTERAPIA CENTRADA NA CRIANÇA

GESTALT-TERAPIA E CRIANÇAS
Profª. Ma. Ana Celi Pallini
CRIANÇAS
O MITO DA INFÂNCIA FELIZ

Quando pensamos na infância como um período em


que se vive no mundo das fantasias e dos sonhos, como
um período feliz, de alegria e de despreocupação,
podemos nos deparar com a realidade de que essa
vivência de infância pode não corresponder à vivida por
todas as crianças que conhecemos e às vezes, não
corresponde à nossa própria história de infância
QUEM É A CRIANÇA QUE NOS CHEGA?
POR QUÊ?
DA PARTE DE QUEM?
Na maioria das vezes a busca Frequentemente associado a uma
pela psicoterapia vem da parte queixa específica (principalmente para
de terceiros “mudança de comportamento”)
“criança problema”
A. B.

C. D.
A criança da concepção do outro As linhas de comunicação
x (verbais e não-verbais)
A criança que se apresenta
LUDOTERAPIA CENTRADA NA
CRIANÇA
Ludoterapia Centrada na Criança

Chamada por diversos nomes assim como aconteceu com a ACP

• Ludoterapia Não-Diretiva (Axline, 1947/1984, 1969/1993),

• Ludoterapia Centrada no Cliente (Dorfman, 1951/1992),

• Ludoterapia na Abordagem Centrada na Pessoa (Garcia, 2002),

• Ludoterapia Centrada na Criança (Branco, 2001; Landreth,

1991/2002; Brito, 2008; Cochran, Nordling & Cochran, 2010; VanFleet,

Sywulak & Sniscak, 2010)


CABE AO TERAPEUTA NESSA RELAÇÃO:

01. 04.
Não adequar a “fala” da criança ao que compreendemos
Escutar as necessidades da própria criança como familiar ou identificável, mas estabelecer
e ter uma resposta empática comunicação a partir de vias que são “estranhas”, dos
significados que ela mesmo dá

02. 05.
Utilizar o próprio corpo como instrumento terapêutico para
Afastar-se do movimento de entendimento racional e responder ao chamado da criança, em suas experiências
explicativo da criança, para ser “tocado” pela sua lúdicas no atendimento
própria chegada e chamado

03. 06.
Abster-se de análises, julgamentos, Não englobar a infância nas ideias de “preparação para
interpretações sobre o Outro a idade adulta” ou qualquer outra noção, não buscando
encaixá-la num ideal de funcionamento
Por mais que tentemos acessar o mundo
da criança, que consigamos entrar em sua
brincadeira e em seu mundo de fantasia, não nos
igualaremos, ela não será como o terapeuta e o
terapeuta não será como ela
OS PRINCÍPIOS DE AXLINE

Virginia Mae Axline foi a principal idealizadora da

Ludoterapia Centrada na Criança (que não tinha esse nome

inicialmente).

Estabeleceu 8 princípios básicos para a ludoterapia.

A ludoterapia é um segmento da Psicologia que trata de

terapia com crianças utilizando jogos, desenhos, fantoches, e

outras brincadeiras através das quais a criança se expressa.


As três atitudes facilitadoras podem ser identificadas
também nos princípios, mas, elas não parecem com esses
nomes!

Empatia Congruência Aceitação positiva incondicional


OS 8 PRINCÍPIOS
RAPPORT
o relacionamento a ser estabelecido com a
criança deve ser cálido (amoroso) e amigável,
mas de forma não excessiva

ACEITAÇÃO
evitar juízos de valor (tanto positivos, quanto negativos). A
aceitação é de tudo o que a criança expressa no atendimento.
O terapeuta deve ser calmo e amigável, nunca impaciente

PERMISSIVIDADE
propiciar liberdade para uma expressão
completa dos sentimentos por parte da criança,
intervindo o menos possível**

IDENTIFICAÇÃO E REFLEXO
Reconhecer/captar todos ou a maioria dos sentimentos
expressos pela criança, refletindo-os para possibilitar a esta
uma visão maior de si
OS 8 PRINCÍPIOS
RESPEITO
manter um profundo respeito pela criança e sua capacidade
de lidar com seus próprios problemas quando lhe é dada a
oportunidade, tenta tornar compreensível para a criança que
ela é responsável por si CRIANÇA NA DIREÇÃO
A criança guia o caminho, o terapeuta assume uma postura
absolutamente não-diretiva, não emitindo opiniões nem
sentimentos, nem qualquer outra coisa que sugira orientação
diretiva
PROCESSO GRADATIVO
o processo é gradual e não deve ser apressado; é singular. O
terapeuta deve ter “prontidão” e esperar a expressão dos
sentimentos da criança. Elas podem apresentar-se em ritmos
diferenciados. Não fazer comparações!
LIMITES DA REALIDADE

os limites apresentados na psicoterapia devem ser mínimos,


restringindo-se ao material da sala e à integridade física do
terapeuta e da criança
Tudo o que escutamos da vivência do cliente não é mais do que
a representação e a percepção que temos do que o cliente
vivenciou. Estar com a criança exige que o terapeuta esteja
atento à forma como ela se apresenta na relação, verificando
com ela, se o que ele percebeu da brincadeira foi o que, de fato,
ela expressou.
OS “PAIS” (responsáveis)

a presença dos pais (responsáveis) é importante no atendimento,


desde que a escuta deles não impeça ou atrapalhe o terapeuta de
ouvir ao chamado da criança
Tanto os pais/responsáveis, quanto a
criança que será atendida, serão contemplados de forma
individual e em suas relações uns com os outros.
OS “PAIS” (responsáveis)

Os pais/responsáveis, via de regra, são os porta-vozes que


apresentam a criança – na percepção deles – e a queixa que a
traz para um atendimento psicoterápico.

É importante que o terapeuta entre em contato com a


dinâmica familiar, tal como vivida pelos pais/responsáveis,
entendendo como os membros dessa família se relacionam,
tomando como base as dimensões substancial e relacional.
OS “PAIS” (responsáveis)

O primeiro atendimento geralmente é realizado com os


pais/responsáveis e é o momento em que se apresenta o contrato
terapêutico, no qual estão sinalizados os dados “concretos” (dia e
horário das sessões, honorários, faltas, reposições, dentre outros), bem
como os dados referentes ao sigilo profissional e à necessidade de
parceria entre os pais/responsáveis e o terapeuta em benefício da
criança atendida.
OS “PAIS” (responsáveis)

No período em que a criança estiver em atendimento,


também acontecem as sessões de devolutiva para os
pais/responsáveis, nas quais são apresentadas para eles as
percepções do terapeuta sobre o caso/processo da criança,
assim como promove-se a escuta das percepções deles acerca
dos atendimentos.
Reafirma-se também a questão do sigilo!
PAUSA PARA O CÓDIGO DE ÉTICA

1. condutas e responsabilidades do psicólogo a serem tomadas no


acompanhamento psicoterápico (estendidos para os
atendimentos infantis):

“Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicológicos,


informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo
profissional [...] Informar, a quem de direito, os resultados decorrentes da
prestação de serviços psicológicos, transmitindo somente o que for
necessário para a tomada de decisões que afetem o usuário ou
beneficiário (Conselho Federal de Psicologia, 2005, p. 8)”
PAUSA PARA O CÓDIGO DE ÉTICA

2. Acerca do sigilo das informações prestadas pela criança


atendida:

Art 9º É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de


proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas,
grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional [...]

Art 13. No atendimento à criança, ao adolescente ou ao interdito, deve


ser comunicado aos responsáveis o estritamente essencial para se
promoverem medidas em seu benefício (Conselho Federal de Psicologia,
2005, p. 13).
PERGUNTA
A que outro responder?

Aos pais/responsáveis, que pagam pelo


atendimento, ou à criança?
OS “PAIS” (responsáveis)

Do ponto de vista deontológico (filosofia moral), mesmo que ela não tenha solicitado,
a CRIANÇA é o cliente e não os pais.

Há um contrato estabelecido com os pais/responsáveis, e anteriormente explicitado,


que coloca a criança em evidência. Ela é o “Rosto” a quem temos de responder
prioritariamente, apesar da necessidade de resposta aos pais/responsáveis.

Desde o início dos atendimentos até as sessões de devolutiva, os pais/responsáveis


são informados, de maneira clara, que o cliente é a criança.

Também apresentamos a importância do trabalho conjunto, dos pais/responsáveis e


do terapeuta, em benefício da criança.
OS “PAIS” (responsáveis)

Portanto, é a ela (criança), que devemos habilidade de resposta


(responsabilidade).

Faz parte dessa responsabilidade para com a criança que as percepções


apresentadas pelo terapeuta aos pais/responsáveis sejam as mínimas
necessárias para que estes saibam como o processo está se desenvolvendo.
Assim como implica ter de solicitar aos pais o que for necessário, em benefício da
criança.
HABILIDADES DO LUDOTERAPEUTA

01.
ESTRUTURAÇÃO
à criança são apresentadas as primeiras
02. amostras de que a relação terapêutica é 04.
diferenciada das demais relações.
ESCUTA EMPÁTICA LIMITES DO SETTING
o terapeuta comunica à criança a a criança será aceita e poderá experienciar a
compreensão e a aceitação do que ela liberdade para ser ela mesma e explorar seus
apresenta, vendo as coisas pelo ponto de sentimentos durante a brincadeira.
vista da criança e colocando de lado seus Há uma liberdade e um ambiente de segurança,
sentimentos e pensamentos. propiciados pelo terapeuta, para as expressões
03. de sentimento da criança.

BRINCADEIRA IMAGINÁRIA
completa abertura à forma como a criança queira
representar a sua perspectiva, sentimentos e experiências. A
participação do terapeuta na brincadeira, encenando o papel
sugerido pela criança, sugere a disponibilidade para estar no
mundo que a criança quiser apresentar.
GESTALT-TERAPIA COM
CRIANÇAS
Alguns aspectos gerais

• Entrevista com pais/responsáveis


• Entrevista/contato inicial com a criança
• O brincar e o processo terapêutico
• Técnicas
• Devolutivas com os pais
• Competências Gestalt-terapeuta infantil
• Questões fundamentais
Entrevista inicial com responsáveis

Com ou sem a presença da criança????

Opiniões controversas
Entrevista inicial com responsáveis

Violet Oaklander (1980), uma das principais precursoras da Gestalt-terapia com


crianças, defende a ideia de se contar com a presença da criança, juntamente com os
pais na entrevista inicial, com a justificativa de aliviar as fantasias da criança em
relação ao que de fato está errado, pois afirma que ela tem sempre uma noção muito
mais agravada da queixa do que esta realmente é.

Aguiar (2005) e Cornejo (1996) discordam, dizendo não ser oportuno entrevistar os
responsáveis diante da criança, pois é possível que a sessão se estruture em torno da
necessidade familiar como um todo, gerando uma demanda da qual a família não têm
consciência e não está preparada a enfrentar, até porque buscaram inicialmente a
psicoterapia para o filho, e não para eles individualmente ou para a família.
Entrevista inicial com responsáveis

É preciso deixar claro desde o início que o terapeuta não é o “salvador” da


criança e que o processo girará em torno da própria necessidade da criança
que aparecer.

A “queixa” trazida pelos pais vai ser observada a partir do que aparece, mas
trabalharemos com possibilidades reais e não de forma a atender as fantasias
ou expectativas dos responsáveis.

As informações sobre a criança (história de vida: concepção, gestação,


desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo, social) são importantes, mas, não
guiam o processo, nem a visão do psicoterapeuta sobre aquela criança.
Entrevista inicial com a criança
O psicoterapeuta infantil precisa necessariamente gostar de brincar,
gostar de criança, estar disponível e aberto às influências da natureza
espontânea e sincera do universo infantil.
Entrevista inicial com a criança

O principal objetivo da entrevista inicial com a criança é, sem


dúvida, o estabelecimento de um vínculo, por meio do qual a
criança se sentirá segura para mostrar como está se relacionando
com o mundo, com o outro e consigo mesma.

Deve ser não estruturada, pois jamais se sabe a “figura” que irá
emergir, e a criança precisa ser acolhida na forma em que se
apresentar, seja ela calada, desafiadora, colaboradora ou agressiva.
Entrevista inicial com a criança

O terapeuta precisa estar totalmente presente ao encontro, aberto ao


contato de forma cuidadosa e respeitosa com a individualidade da criança e
dos pais, intencionando uma relação horizontal, na qual não há exercício de
poder nem imposição do seu saber sobre a percepção interna e externa.

Em GT a criança precisa ser aceita, respeitada e acolhida, no entanto de


maneira nenhuma isso diz respeito à permissividade ou ausência de limites. As
regras referentes ao espaço terapêutico precisam ser respeitadas,
considerando o valor e significado que encerram em si mesmo, e não por
simples deliberação do psicoterapeuta.
IMPORTANTE
O psicoterapeuta não deve tentar seduzir a criança se ela se negar
a entrar na sala de atendimento. Não deverá fazer promessas, nem
tampouco agir como “animador de festa”, pois a decisão de entrar
para a sala de atendimento deverá ser da criança.

Porém, diante de tal situação, uma descrição fenomenológica de


algumas características do atendimento e o oferecimento de opções
para a criança podem ser válidos.
Exemplo: se apresentar a criança, dizer que realiza atendimentos
em uma sala, que gosta do trabalho que realiza, e perguntar se ela
não gostaria de entrar para conhecer a sala.
Contato inicial com a criança
Estando dentro da sala de atendimento, havendo condições para tal:

• apresentar a sala, os recursos,


• investigar se a criança sabe por que veio a um consultório
psicológico,
• estabelecer o contrato com ela, inclusive no tocante aos critérios
de integridade física dela, do terapeuta e da sala.

Fora essas recomendações, ser econômico nas intervenções e


dispor-se a acompanhar a criança fenomenologicamente, de acordo
com a forma que ela escolher se apresentar.
O brincar e o processo terapêutico

A forma genuína de expressão da criança é o brincar, por isso, no


atendimento psicoterapêutico infantil e, inclusive na entrevista inicial,
o lúdico é utilizado como principal via de acesso ao seu mundo
interno, por intermédio da ludoterapia.

Esperar que uma criança fale abertamente sobre suas dificuldades


pode ser frustrante para o psicoterapeuta, além de caracterizar-se
como uma incumbência exagerada para a criança, colocando o
vínculo em risco.
Experimentos (técnicas)

Os experimentos (técnicas), assim como no atendimento com


adultos, também são utilizados na experiência do brincar e são
facilitadores dos processos de autopercepção e de vínculo da criança.

Troca de papéis
Contagem e formação de histórias
Desenhos, pinturas
Teatro
Precisa surgir da própria
Música e expressão corporal
experiência e não ser previsto
antes
IMPORTANTE

A criança é um ser de potencialidades e seu “sintoma” é a


forma de expressar que algo não vai bem, mas que não a
reduz, limita ou define.

O sintoma é apenas a parte de um todo articulado,


complexo e dinâmico que emerge, momentaneamente, como
figura de acordo com a necessidade do organismo.
Devolutiva com os pais
A criança deve saber o que vai ser falado e devolvido para os pais em relação
ao seu processo e, se ela quiser e for possível, pode estar junto nesses momentos.

São devolvidos aspectos essenciais do processo, evoluções clínicas, sinalizadas


necessidades de ações externas quando identificadas/expressadas na relação e
pela própria criança, e dados gerais, bem como são acolhidas as percepções dos
mesmos sobre o processo.

Não precisa ocorrer em um momento específico (ex. final, quinzenalmente, mês


a mês), a temporalidade pode ser decidida junto com a criança e com os pais, ou
mediante alguma necessidade advinda da própria criança.
Competências Gestalt-terapeuta infantil

A atuação do terapeuta deverá estar pautada, acima de


tudo em suas atitudes e em sua forma de ser. Sendo assim, o
terapeuta deve ser autêntico.

Algumas habilidades necessárias: compreensão,


disposição, respeito, presença e humor.

Conhecimentos necessários: é imprescindível que o


profissional possua profundo conhecimento da Gestalt-
terapia, dos pressupostos filosóficos, conceitos de
desenvolvimento e sua teoria.
5 questões fundamentais

✓ Trabalhar a família

✓ Envolvimento da escola e outros contextos que fazem

parte da vivência das crianças

✓ Disponibilidade emocional, mental e física

✓ Envolver a criança

✓ Considerar o sintoma como algo que tem uma função

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